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Universidade de São Paulo
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Trabalho Final de Graduação
ano letivo de 2012

CAMINHO, ÁGUA E PAISAGEM
A nova orla fluvial de Manaus

Flávia Garofalo Cavalcanti
Luis Antonio Jorge [orientador]
AGRADECIMENTOS
Ao orientador

À Universidade de São Paulo e à Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo pelas oportunidades
oferecidas nestes seis anos de graduação.
Luis Antonio Jorge

Aos professores e
membros da banca

Fábio Mariz Gonçalvez, pelas inúmeras conversas,
conselhos, dicas e apoio desde o primeiro ano
da FAU. Karina Leitão com quem tive o prazer
de compartilhar idéias e risadas neste último e
complicado ano.

Aos amigos queridos

Diogo Bella, Victor Berbel, Isadora Marchi,
Gabriela Mamade, Paulo Catto irmãos que me
acompanharam desde o estúdio 1. Marcia Trento,
Lais Matiusse e Max Heringer que estiveram
comigo em Manaus.
Ao Pedro Veloso, pelo carinho, pelos abraços
nas horas de angústia, e por ter acompanhado
de perto este trabalho contribuindo para o seu
resultado final.
Cristina Grobe, arquiteta, radicada em Manaus
com quem tive valiosas conversas.

À minha familia

DEDICATÓRIA

Pai, Cláudio, por me incentivar a ir mais longe
e estar do meu lado sempre. Mãe, Beth, pela
compreensão em todos os momentos e, pelo
esforço dedicado na minha educação.

Á todos que acreditam em uma cidade mais
humana e democrática.
4
Encontro dos Rios Negro e
Solimões e a cidade de Manaus.
Imagem: Google Earth.

5
Rio Negro. Rio-Mar.
Foto: Fábio Mariz. 2012.

6
SUMÁRIO

Apresentação
1. Amazônia
	
1.1 Situação Geográfica
	
1.2 O caminho dos rios e os núcleos urbanos
	
1.3 O movimento das águas: registros
2. Amazonas - Urbanização
	
2.1 Metropolização
	
2.2 Região Metropolitana de Manaus - RMM
3. A margem direita do Rio: Iranduba, Careiro da 		
			
Varzea e Manacapuru
	
3.1 A vida sobre as águas: registros
4. A margem esquerda do Rio: Manaus
	
4.1 Da fundação ao apogeu da borracha
	
4.2 Marcos Urbanos
	
4.3 Entre tempos 1920 - 60
	
4.4 Zona Franca de Manaus
	
4.5 Análises da situação atual
		4.5.1 Transporte
		4.5.2 Habitação
		
4.5.3 Espaços Públicos
5. A terceira margem do Rio: Nova orla fluvial de Manaus
	
5.1 Aproximação da área central
	
5.2 Diretrizes
	
5.3 Implantação geral da proposta
		5.3.1 Porto
		5.3.2 Mercados
		
5.3.3 Parque Fluvial
		
5.3.4 Quadras Mistas
		
5.3.5 Nova Configuração Viária
	
5.4 Novo zoneamento proposto
6. Referências Bibliográficas

7
A imensidão do Rio Negro.
Foto: Lais Matiusse. 2012.

8
Barco Recreio atracado no
muro da avenida Beira-Rio.
Foto: arquivo pessoal. 2012.

9
Caminho Flutuante sobre o Rio.
Iranduba.Foto: Fábio Mariz. 2012.

10
APRESENTAÇÃO

“...o desenho da cidade é o que expressa
de modo efetivo e também simbólico,
como nenhum outro, a capacidade do
homem para formalizar e imprimir
uma outra configuração à natureza
enquanto lugar, onde representa a sua
presença desejada no universo.” Mendes
da Rocha in Delijaicov , p.10, 1998.

Este trabalho final de graduação apresenta idéias de
projeto para a orla do Rio Negro e o desenho da cidade
de Manaus, estado do Amazonas. Estrutura-se a partir
das problemáticas urbanas de Manaus, tendo o Rio
Negro e seus igarapés como norteador da relação
cidade/ambiente construído - água/ ambiente natural.
O recorte escolhido foi a área central da cidade, à beira
do rio, e seus equipamentos urbanos: porto público,
mercado municipal, igreja matriz e igreja dos remédios,
preocupando-se também com a presença da habitação
como insumo necessário à vivacidade do espaço público.
A escolha da cidade de estudo, Manaus, e da escala
de intervenção, projeto urbano, foi incentivada por
uma vontade pessoal de alargar minhas fronteiras e
conhecimentos sobre meu próprio pais, O olhar, que
ultrapassou os limites paulistanos, procurou compreender
o que é uma cidade de 2 milhões de habitantes à beira do
Rio Negro, como se dá a relação dos habitantes com a
sua cidade, com o seu Rio, e como a gestão pública do
espaço urbano responde às necessidades presentes no
território manauara.
Entende-se por Projeto Urbano um projeto físicoespacial das estruturas que organizam os espaços
urbanos e metropolitanos, projetos que se apresentam
como uma intervenção direta e única na cidade.
Entende-se também que as infra-estruturas de
uma cidade devem ser projetadas para, mais do que

11
viabilizar um serviço específico, como a comunicação
territorial no caso do sistema viário, colaborar para a
criação de lugares adequados à vida urbana e imagens
referenciais na paisagem, contribuindo assim para o
surgimento de identidades urbanas e, consequentemente,
para uma relação afetiva dos habitantes com suas
cidades.¹ Em suma, as cidades devem ser projetadas
para as pessoas.
O trabalho parte de um estudo macro - região
amazônica, sua situação geográfica e condicionantes
como o ‘movimento das águas’, para aproximarse gradativamente da cidade de Manaus e suas
problemáticas urbanas. Neste percurso observou-se
a configuração da Região Metropolitana de Manaus,
identificando importantes diferenças entre a cidade-sede
e as cidades vizinhas como Iranduba, Careiro da Varzea
e Manacapuru. Diferenças que nos mostram como
Manaus um dia foi em relação ao Rio Negro, contato
direto e franco com suas águas, e como essa relação se
transformou nos dias atuais. A partir dessa comparação
foi possivel compreender melhor o espaço intra-urbano
manauara, analisando temas como transporte, habitação
e espaços públicos.

manauara e de suas atuais políticas públicas.
Portanto, o percurso deste trabalho tem a intenção
de traçar um panorama sobre Manaus, sua história
e evolução, e convergir para um ponto central, local
do projeto proposto, a orla fluvial urbana do centro de
Manaus.
O projeto proposto entra no âmbito da requalificação
urbana de zonas centrais. Entende-se por requalificação
a atribuição de qualidade à um espaço que a perdeu,
nesse caso a área central de Manaus perdeu sua grande
qualidade: proximidade com as águas do Rio Negro e
igarapés. Pode-se dizer também revitalização urbana,
uma vez que o intuito é de retornar à vida a orla fluvial
central de Manaus, reviver a relação água-cidade perdida
no tempo.

Neste estudo ficou clara a existência de dois momentos
distintos da cidade de Manaus. O primeiro, em um
tempo passado, no qual a cidade e seus habitantes
olhavam o rio, tinham suas águas como balizadoras do
caminhar, do trabalhar, do habitar. O segundo momento,
que se extende até o tempo presente, rompe com essa
relação, afasta o rio do ambiente edificado da cidade
através de aterros e avenidas, uma infra-estrutura
que avançou sobre o espaço das águas e escondeu de
nossa vista o Rio Negro. Considerando que este cenário,
instituido e consolidado pela urgência do capital,
anulou em diversos trechos a natureza de Manaus, seu
verde, suas águas e seus hábitos, é que se coloca uma
visão crítica e propositiva do espaço urbano da cidade
Imagem página ao lado:
Igapós. Foto: Marcel
Gautherot, 1955.

__________
¹ BRAGA, Milton L. Infra-estrutura e projeto urbano. Tese de doutorado
apresentado à FAUUSP. São Paulo. 2006. p. 10-11.

12
1. AMAZÔNIA

13
macizo cordillerano

macizo guayanas

pendiente 1 o/oooo

1.1 SITUAÇÃO GEOGRÁFICA

macizo brasilia

Enquanto Belém configura-se como a fachada atlântica
de toda a Amazônia Brasileira, Manaus é a verdadeira
capital da rede urbana amazônica, que se extende muito
além das fronteiras brasileiras. Instalada exatamente
entre a Amazônia Ocidental e a Oriental, num ponto do
principal eixo de navegação fluvial do Brasil, a cidade
macizo cordillerano
de Manaus é uma espécie de elo entre a navegação
fluvial do interior e as grandes rotas marítimas de longo
pendiente 1 o/oooo
curso. Possui, por essa razão, uma situação geográfica
absolutamente privilegiada em face das extensões
amazônicas e do gigantesco quadro da hidrografica
local.²

100

200

PORTO VELHO
200

A região geoeconomica da Amazônia localiza-se entre o
Maciço das Guianas ao norte, o planalto central ao sul, e
a Cordilheira dos Andes à oeste (ver mapa 1). Configurase como a principal bacia hidrográfica da América do Sul,
100
e a maior do mundo. Apesar dos recursos abundantes é
a região de menor densidade demográfica, contando em
média com 4,12 hab/km² (dados do IBGE para a região
200
Norte do pais de acordo com o censo de 2012).

100

Dessa forma a região se apresenta como um vasto
PORTO VELHO
território com uma rede urbana dispersa conectada
principalmente pela modal hidroviário no qual o regime
200
dos cursos d’água condicionam a mobilidade de pessoas
e cargas. Nesse sentido observamos que o fluxo de
passageiros da Região Norte do Brasil caracteriza-se
como deslocamentos longos e heterogênios ao longo
100
do ano, ao contrário da Região Sudeste, onde uma
rede urbana bem estruturada e escalonada garante
deslocamentos curtos e homegênios. Em média, os
deslocamentos no Norte envolvem 102 Km, enquanto no
Sudeste, os mesmos deslocamentos equivalem à 38 Km.
Assim, ao contrário de São Paulo, é possivel observar que
no Amazonas, Manaus destaca-se pela centralidade que
PORTO VELHO
MANAUS
exerce no estado e pelo espraiamento da área capiteneia.³
__________
² AB’SABER, Aziz Nacib. A cidade de Manaus: primeiros estudos. Editora
Beca-Ball. São Paulo. 2010. p. 111-112.
³ IBGE. Região de influência das cidades. Rio de Janeiro. 2008. p. 163.

MANAUS
200

100

100

200

SANTARÉM
3 situações geográficas na Amazônia. Rondônia, Amazonas e
Pará. Base: Google Earth. Elaboração da autora.

14
ORINOCO

6,5%

AMAZONAS

DA PRATA

2,5%

36%

POPULAÇÃO
SUL-AMERICANA
ORINOCO

5,5%

DA PRATA
18%

AMAZONAS
35%

SUPERFÍCIE OCUPADA
Mapa 1: América do Sul com destaque para
a Amazônia legal e sua bacia hidrográfica.
Elaboração da autora.

Dados: Wikipedia.
Elaboração da autora.

15
1.2 O CAMINHO DOS RIOS E OS NÚCLEOS URBANOS
A extensão da bacia hidrográfica amazônica favoreceu a
penetração de colonizadores europeus na região. Foram
os rios, em especial o Amazonas, que mostraram os
caminhos e os sitios de melhor situação geográfica. As
datas de fundação das principais cidades nos revelam
o percurso dos portugueses que romperam fortemente
a linha de Tordesilhas norte-sul avançando na direção
oeste (ver mapa 2).
Ainda hoje o modal hidroviário configura-se como o mais
importante na região, principalmente no transporte de
cargas. O sistema hidroviário atua como a espinha dorsal
da amazônia enquanto o sistema rodoviário atua na
comunicação periférica da região e desta com as demais
regiões sul-americanas (ver mapa 3).

Explica-se assim o fato de que a maioria desses núcleos
urbanos, por mais de dois séculos, não dependeu de
nenhuma rota terrestre, mas tão somente dos rios de
planície e de uma história econômica ligada intimamente
à navegação.

modal hidroviário

Mapa 3: sistemas de
circulação na região norte
da América do Sul. Ao lado
comparação esquemática
do modal hidroviário espinha dorsal, e modal
rodoviário - periférico.
Elaborado pela autora.

modal rodoviário

Embora Manaus tenha seu núcleo urbano a 20 km da
confluência entre o Rio Negro e o Solimões, comportase perfeitamente como uma cidade fluvial de confluência.
Além disso, apesar de estar a pouco mais de 1600 km
de Belém, é um porto fluvial continental perfeitamente
entrosado com as rotas de cabotagem e transatlânticas.
Por essas caracteristicas a cidade de Manaus não
se configura como um ponto terminal da navegação
amazônica, nunca foi o “fim” de nenhuma viagem, pelo
contrário, é uma etapa central e obrigatória, comandando
as ligações entre a circulação atlântica em face das mais
distantes linhas fluviais do interior da América do Sul.

DISTÂNCIAS Km
Manaus - Belém	

1606

Manaus - Santarém	

739

Manaus - Porto Velho	 1239
Manaus - Macapá	

1289

Manaus - Boa Vista	

756

Manaus - Rio Branco	 1445

16
Mapa 2: Principais cidades Amazônicas.
Elaboração da autora.

Boa Vista

S. Gabriel da
Cachoeira

Macapá
Óbidos

BELÉM

MANAUS
1669
Tabatinga

Tefé

IQUITOS
1757

Porto Velho
Rio Branco

17

Parintins

SANTARÉM
1661

1616
1.3 O MOVIMENTO DAS ÁGUAS: REGISTROS

Manacapuru. Cachoeira do Castanho.
Vazante.Foto: acervo pessoal. 2010.

18
Praia de Açutuba na vazante.Proximidades
de Manaus.Foto: Isadora Marchi. 2010.

19
Manaus. Igarapé dos Educandos na vazante.
Foto: acervo pessoal. 2010.

20
Manaus. Rio Negro no periodo de vazante.
Foto: Isadora Marchi. 2010.

21
Careiro da Varzea. Vazante.
Foto: acervo pessoal. 2010.

22
Praia de Açutuba. Vazante.
Foto: Isadora Marchi. 2010.

23
Manacapuru. Vazante.
Foto: Acervo Pessoal. 2010.

24
Manaus.Praia de Ponta Negra. Vazante.
Foto: Acervo Pessoal. 2010.

25
Manaus. Igarapé de São Raimundo no periodo de cheia.
Foto: acervo pessoal. 2012. Página ao lado recortes
de jornais eletrônicos de diversos sites de notícias.

26
27
Imagem página ao lado: Igarapé de
Manaus. Foto: Fabio Mariz.

28
2. AMAZONAS - URBANIZAÇÃO

29
2.1 METROPOLIZAÇÃO
A intensa urbanização que vem ocorrendo no Brasil,
especialmente a partir de 1950, tem sido acompanhada
por um processo de metropolização, processo este
que consiste na integração de território a partir de
uma cidade-núcleo, configurando um espaço urbano
ampliado, em que se compartilha um conjunto de funções
de interesse comum.
O processo de urbanização brasileiro começou na primeira
metade do século XX e intensificou-se a partir de 1950,
quando a indústria tornou-se o setor mais importante
da economia nacional, momento que representa a
passagem de uma economia agrário-exportadora para
uma economia urbano-industrial. Mas foi somente na
passagem da década de 1960 para 1970 que a população
urbana superou a rural. Desde então essa tendência se
acentuou e a população urbana superou a marca dos 80%
nos anos 2000.4
A transformação de país agrário e rural para um país
urbano industrial trouxe mudanças no cenário político,
econômico e social. A cidade passa a ter predomínio
sobre o campo, sendo que os principais interesses
econômicos e a maior força de trabalho do país estão
localizados no meio urbano. Era o nascimento do Brasil
moderno, gerando um desenvolvimento econômico e
social com fortes desequilíbrios regionais.
A primeira fase de nosso processo de metropolização
foi caracterizada por um modelo de crescimento urbano
extensivo, gerando um desenho do território semelhante
a uma mancha de óleo com um centro e uma periferia
de forma tentacular em contínua expansão. Em geral,
essa expansão seguiu os eixos viários, onde existia uma
pequena oferta de infra-estruturas básicas e serviços
urbanos. Assim, o modelo de organização do espaço
baseava-se na existência de um centro e uma periferia,

__________

4 Observatório das Metrópoles

definindo uma forma específica de apropriação social,
econômica e política do território. O centro concentrava as
principais atividades econômicas, públicas ou privadas,
as infra-estruturas urbanas e as áreas habitacionais
de mais alto nível de renda. A periferia, formada por
meio de invasões, loteamentos populares, conjuntos
habitacionais, servia para abrigar a massa da população
migrante, de baixa renda.
Surge uma rede de hierarquização entre as cidades, ou
seja, um sistema de relações econômicas e sociais em
que umas se subordinam a outras. As cidades não estão
mais isoladas e estabelecem relações entre si de forma
hierárquica, considerando a importância e a influência
econômica, cultural e social, que cada uma exerce
sobre as demais. Essa hierarquização alimenta ainda
mais o processo migratório, num ciclo de alimentação
contínuo. Estima-se que entre 1960 e 1980 mais de 43
milhões de brasileiros migraram das zonas rurais para
os aglomerados urbanos.
O período seguinte foi caracterizado pela verticalização
de áreas residenciais bem localizadas relativamente às
infra-estruturas e aos serviços. Os bairros tradicionais
de baixa densidade e alta qualidade ambiental foram as
principais vítimas da intensa verticalização.
Este período, alimentado pelo crescimento do interesse
imobiliário, significou um permanente e diferenciado
processo de valorização/desvalorização da terra urbana
com a geração de novas centralidades. Esse mais
recente modelo de metropolização atingiu fortemente
os centros históricos, abandonados por quase todas as
atividades de prestígio do setor comercial e de serviços
e deixando de ser áreas residenciais da classe alta. Na
periferia pobre criou-se um ambiente urbano precário,
denso, quase sem serviços e equipamentos coletivos
e com insuficiente infra-estrutura, gerando enormes
problemas ambientais.

30
A forma de ocupação espacial do território metropolitano
criou uma distribuição física profundamente desigual em
termos de moradia, renda, oferta de serviços e de infraestrutura urbana. O Brasil tornou-se território urbanizado
de modo fragmentado, com grandes problemas de
adequação ambiental e pouco articulado no seu espaço
intra-urbano.
Com a configuração deste cenário são criadas
ferramentas de administração pública na tentativa de
se administrar esses espaços cada vez mais complexos.
Durante a ditadura militar institucionalizou-se a criação
de Regiões Metropolitanas com o intuito de viabilizar a
integração, planejamento e o desenvolvimento conjunto
de áreas que apresentam tais complexidades. Neste
momento, cabia somente à União a regulamentação de
regiões metropolitanas. Assim, na década de 1970, 9
capitais, juntamente com a cidades por elas polarizadas,
tiveram suas regiões metropolitanas instituídas.
Num segundo momento, de abertura estatal, a partir
da constituição de 1988, os estados passaram a ter
autonomia na institucionalização de RM. Ocorre um
significativo decréscimo do poder federal como indutor
e coordenador do ordenamento territorial brasileiro.5 O
fortalecimento dos estados e municípios como gestor dos
espaços trouxe consigo uma certa imprecisão quando da
criação de novas RM.
Neste segundo momento são criadas 26 regiões
metropolitanas no país, cada uma com características
próprias, desde portes diferentes e distintos graus
de importância econômica nos contextos estadual e
nacional, como arranjos urbanos distintos, com ou sem a
ocorrência de conurbação.

__________

5 EHNERT, Alexandre Ricardo Von. A Região Metropolitana de Manaus

e as Migrações Pendulares. Dissertação de Mestrado apresentada à
FFLCH USP. São Paulo. 2011.p. 34 - 39.

31

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas
Constituições e leis que adotarem, observados os
principios desta Constituição.
§ 3°. Os Estados poderão, mediante lei
complementar, instituir Regiões Metropolitanas,
aglomerações urbanas e microregiões, constituidas
por agrupamentos de municípios limítrofes, para
integrar a organização, o planejamento e a execução
de funções públicas de interesse comum.
Art. 25 da Constituição Federal de 1988.
2.2 REGIÃO METROPOLITANA DE MANAUS - RMM
Dentro da rede de cidades brasileiras, Manaus comparece
como o 12° maior centro urbano, sendo considerada
uma metrópole regional apesar de não constituir uma
aglomeração urbana conurbada, como as demais 11
metrópoles.

São barcos recreios, voadeiras, rabetas, canoas, batelões
e até mesmo cruzeiros que movimentam as águas
amazônicas. Da área portuária de Manaus partem
embarcações para vários destinos, dentro e fora do
estado, dentro e fora do país.

Segundo o IBGE (2008), Manaus controla uma das redes
de maior área, 19% da área do país, e de menor densidade,
2,2 hab/km², correspondendo a 1,9% da população do
Brasil e 1,7% do PIB Nacional. A cidade de Manaus
concentra a maior parte da população e do PIB de sua
região metropolitana, 47,3% e 75,5%, respectivamente.
Tal concentração tem como efeito grande disparidade no
PIB per capita, que é de R$ 10,4 mil para o total da região,
correspondendo R$ 16,5 mil a cidade de Manaus, e R$ 4,8
mil aos demais municípios. A rede de influência da RRM
abrange apenas os Estados do Amazonas e de Roraima,
sendo composta pela Capital regional Boa Vista, e pelos
Centros sub-regionais de Parintins e Tefé.

Na RMM é possível observar que um grande número de
pessoas migra em direção à sede, Manaus, para trabalho
e estudo, partindo de todos os municípios, porém
devido às distâncias internas há uma variação tanto
quantitativa quanto qualitativa nos fluxos apresentados.
A principio é possível distinguir três grupos de municípios
considerando a relação metropolitana com Manaus
devido à distância em relação à sede – 1. Municípios
com baixa integração metropolitana, localizados a mais
de 150 km de distancia de Manaus, 2. Municípios com
média integração metropolitana, localizados a menos de
110 km de distância; 3. Municípios com alta integração
metropolitana, com áreas urbanas separadas da sede
apenas por cursos de rio (ver mapa 5). Nos municípios
dos dois primeiros grupos o fluxo populacional em
direção à Manaus apresenta-se com pulso semanal. Já
nos municípios do terceiro grupo a predominância do
fluxo é diário, caracterizando um movimento pendular.
Há, portanto, integração populacional entre todos os
municípios da RMM e a sede, Manaus. Sendo o principal
motivador a busca por trabalho e a formação acadêmica,
esta última inexistente ou insuficiente no restante dos
municípios.

Assim temos a Região Metropolitana de Manaus
como a maior região metropolitana brasileira, com
grandes diferenças internas nos ritmos e graus de
desenvolvimento municipal. Seu tecido urbano não
se apresenta de forma contínua, conurbado, mas sim
esparso por uma grande área florestal, onde juntos os
municípios possuem uma área superior a 100 mil km². A
cidade de Manaus é o ponto centralizador deste cenário.
Os demais municípios, possuem ritmos de vida menos
intensos aonde é possível ver atividades e ocupações que
um dia também fizeram parte da capital, mas que foram
paulatinamente anulados pela urgência do capital.
Como já foi dito, a RRM se conecta ao restante do
Brasil e da América latina principalmente, através de
hidrovias e aeroportos. A via fluvial ainda é o modelo
predominante de integração dentro da região amazônica.
Os barcos que chegam em Manaus apresentam portes
e funções variadas. Pelos rios da região é realizada a
maior parte do transporte de cargas e passageiros.

Desde 2011 a RMM conta com a Ponte Rio Negro na
ligação Manaus – Iranduba. São 3595 metros sobre o
Rio Negro que possibilitam a conexão rodoviária dos
dois municípios o que dá nova vantagem locacional à
Iranduba, município que espera receber nova infraestrutura, investimentos e população, aonde já é possível
sentir a presença de empreendimentos imobiliários de
alto padrão e o interesse de diversas instituições, entre
elas a UEA - Universidade Estadual do Amazonas que
fará um novo campus no município.
32
Mapa 4: Porção ocupada pela Região metropolitana de Manaus no Estado do Amazonas. Elaboração da autora.
N
sem escala

33
Cartazes de Empresas de Navegação colocados no muro da Av. Beira-Rio. A grande “rodoviária fluvial”. Manaus. Foto: acervo pessoal. 2012.

34
NOVO AIRÃO
PRESIDENTE
FIGUEIREDO

NOVO AIRÃO
RIO PRETO DA EVA

MANAUS
MANACAPURU
IRANDUBA

ITACOATIARA

CAREIRO DA
VARZEA

N
sem escala

Mapa 5: Região Metropolitana de Manaus. Elaboração da autora.
Baixa integração: municípios com a sede à mais de 150 km de Manaus
Média integração: Municípios com a sede à menos de 110 km de Manaus
Alta integração: Municípios separados de Manaus apenas por cursos d’água.
35
Imagem página ao lado: Iranduba.
Foto: acervo pessoal, 2012.

36
3. A MARGEM DIREITA DO RIO:Iranduba, Careiro da Varzea e Manacapuru

37
3.1 A VIDA SOBRE AS ÁGUAS: REGISTROS

A intenção destas páginas é registrar o modo de vida ribeirinho, a vida sobre as águas.
Na margem direita do Rio Negro, lado oposto à Manaus, encontramos cidades onde é
possivel vivenciar uma intensa relação dos habitantes com as águas do Rio. São formas
de vida que um dia também fizeram parte de Manaus, mas hoje estão cada vez mais
escondidas na capital amazonense.
Especialmente nas regiões interioranas, os barrancos, ribeiras, embocaduras, calhas,
várzeas, paranás e lagos dão forma a um multiforme rendilhado liquido que além de
nortear o rumo das vidas, marca os locais de origem atuando como uma referência que
identifica e localiza os sujeitos.
Na Amazônia, excetuando (talvez) as metrópoles Belém e Manaus, é o rio, o paraná,
a boca, o lago, que contém as cidades, municípios, vilas e distritos, e não o contrário.
Mais do que sobrepujá-las por suas dimensões, estes cursos fluviais se sobrepõem
como marca cultural, mediadora de vivências cotidianas, fonte de trabalho, moradias,
lazer, memórias, portos de chegadas e partidas.
É neste espaço mediano, o terreno de várzeas, que tradicionalmente habita e trabalha
o caboclo ribeirinho, coexistindo entre as terras firmes aos fundos de sua janela e o
rio que corre a frente de sua porta. O ribeirinho amazônico sabe que sazonalmente
(em média de seis em seis meses) suas várzeas serão inundadas pelas águas, daí
a importância das palafitas, da praticidade do tapiri, à base de palha e madeira leve,
facilitando o deslocamento para a terras mais secas e das suas construções flutuantes:
jiraus, marombas e casas aonde podem temporária ou definitivamente morar e
mercadejar.
Nas paginas seguintes são expostos retratos desse vivenciar ribeirinho nos municípios
de Iranduba, Careiro da Varzea e Manacapuru, vizinhos à capital e cidade-sede, Manaus.

38
Casas Flutuantes. Iranduba.
Foto: Marcia Trento. 2012.

39
Crianças na beira de um flutuante.
Iranduba. Foto: Lais Matiusse. 2012

40
Habitar. Transportar. Brincar.
Iranduba. Foto: Lais Matiusse. 2012

41
42
Olhar o Rio. Pés na água.
Na margem do Rio Negro.
Imediações de Manaus.Foto:
Marcel Gautherot. 1944.
Págia ao lado, Iranduba.
Foto: Fábio Mariz. 2012.

43
Atrancando a canoa no flutuante.
Iranduba. Foto: Fábio Mariz. 2012

44
Vendendo o peixe na beira do rio.
Iranduba. Foto: Fábio Mariz. 2012.

45
Nadando. Iranduba.
Foto: Lais Matiusse. 2012.

46
A conversa na beira d’agua. Manacapuru.
Foto: acervo pessoal. 2010.

47
“Tira uma foto nossa?” Meninas brincando em um flutuante. Iranduba.
Foto: acervo pessoal. 2012.

48
A brincadeira, o jogo, o lazer em contato com o Rio. Iranduba.
Foto: acervo pessoal. 2012.

49
Imagem página ao lado:Vista aérea do
centro de Manaus. Foto: Fabio Mariz, 2012.

50
4. A MARGEM ESQUERDA DO RIO: Manaus

51
4.1 DA FUNDAÇÃO AO APOGEU DA BORRACHA
Manaus surge no mapa meio século após a fundação de
Belém, quando os portugueses passaram a explorar os
sertões amazônicos do Rio Negro. Aos expedicionários
portugueses seguiam os missionários na realização da
catequese, tentando agrupar índios de diversas nações
amazônicas. Na década de 1660 excursões espanholas
e holandesas se intensificaram na região, o que levou a
construção da Fortaleza da Barra de São José do Rio Negro
em 1669 a fim de servir de base para a defesa portuguesa
do Rio Negro. Assim, com alguns grupos indígenas e
alguns brancos se iniciou o povoamento do lugar, que
recebeu diferentes denominações referenciando sempre
à fortaleza ou à barra do rio, sendo comuns os termos
Fortaleza do Rio Negro, Fortaleza da Barra, Lugar da
Barra ou Barra do Rio Negro. São José do Rio Negro
permaneceu por muitos anos como um pequeno lugarejo
de beira-rio, onde vegetava uma população de índios
aldeados e de uns poucos soldados sem nenhuma função
militar importante. A futura cidade de Manaus era ainda
uma simples etapa de longos roteiros fluviais.
Os números mais antigos do vilarejo remontam ao ano
de 1774 quando o Lugar da Barra contava com 220
6
habitantes. Mais de um século depois de sua fundação
o crescimento do Lugar da Barra era lentíssimo. Nessa
data a fortaleza já não passava de uma sombra dos
tempos iniciais da dominação portuguesa na Amazônia. A
tensão entre diferentes expedições nos rios amazônicos
já não existia mais e as modestas bases intermediárias
dos portugueses perderam a sua função. Neste período
o Forte da Barra foi desarmado e nada restou da sua
presença na paisagem urbana de Manaus.
Ao se iniciar o século XIX, a região do Amazonas estava
mergulhada no marasmo e na decadência. Alguns poucos
edifícios públicos marcavam a paisagem, mesmo assim
__________

6 AB’SABER, Aziz Nacib. A cidade de Manaus: primeiros estudos. Editora

Beca-Ball. São Paulo. 2010. p. 114. Todos os dados populacionais desta
página seguem a mesma referência.

eram construções modestas cobertas de palha e
sustentadas por paredes de pau-a-pique. As ruas não
eram calçadas e tinham nos igarapés seus limites
naturais.
Em 1832 o Lugar da Barra é elevado à condição de
vila, assumindo a denominação de Vila de Manaós. A
esta altura a vila contava com aproximadamente 3 000
habitantes, haviam duas igrejas, a Matriz de Nossa
Senhora da Conceição com uma praça em frente e o forte
ao lado, e a igreja Nossa Senhora dos Remédios, menor
e muito simples.
No ano de 1852 o Amazonas foi elevado à categoria de
Província e a cidade de Manaus passou a ser a capital.
Em 1859 através das palavras de um viajante inglês
percebemos que a cidade pouco avançou em sua
estruturação, sofrendo de uma escassez crônica de todos
os gêneros de primeira necessidade. Nas redondezas
de Manaus não se produzia farinha em quantidade
suficiente, e a maioria dos produtos era importada. Tudo
o que se necessitava era adquirido por altos preços. De
acordo com o censo de 1858, a população da cidade era
estimada em 4500 habitantes.
Sobre este período são importantes as observações
do casal Agassiz que participava de uma expedição
cientifica. Quando o casal visitou a cidadezinha em 1865
possuía ela todos os defeitos urbanos e sociais de um
povoado amazônico, minúsculo e segregado, nascido de
um aldeamento de índios e à sombra de uma simples
fortaleza de soldados. Sobre Manaus Elizabeth Agassiz
reconhecia que a construção da igreja da Matriz estava
muito bem localizada no alto de uma colina da onde se via
a imensidão do Rio Negro, e seria digna de nota se algum
dia concluíssem sua construção. Elizabeth ressalta ainda
que a situação da cidade, na junção dos rios Negro e
Amazonas, fora uma das mais felizes escolhas, pois
apesar do comercio insipiente naquela época seria sem
dúvida um grande centro de comércio e navegação.
52
Planta da cidade de Manaus de 1852. Fonte: Biblioteca nacional.

53
Em 1889 com a proclamação da República no Brasil,
encerrava-se o sistema monárquico no pais, iniciando
uma nova fase na política brasileira, e no Estado do
Amazonas desponta um período de prosperidade
econômica. Nesta data Manaus atingiu 10 000 habitantes
(note-se que Belém já possuía 50 000 habitantes, São
7
Paulo 65 000 e Rio de Janeiro - Distrito Federal - 500 000).
Mais do que as transformações políticas e sociais do fim
do século XIX no Brasil, foi a transformação econômica
ligada ao advento do ciclo da borracha que veio beneficiar
Manaus, tanto no seu desenvolvimento demográfico
como urbanístico.

Do inicio da República, 1889, ao fim do ciclo da
borracha, 1920, a população de Manaus saltou de 10 000
habitantes para 75 000.8 Nesta data o aspecto visual da
capital do Estado do Amazonas estava completamente
transformado. Manaus tornara-se uma cidade moderna,
com aparência europeia, servida por melhoramentos e
serviços típicos das prósperas e modernas sociedades,
experimentavam-se as delícias do consumo num delírio
característico da belle époque e ostentava-se uma
aparente situação de riqueza e progresso.
Esta época de prosperidade foi justificadamente
denominada de período áureo da borracha, atribuindose ao ciclo econômico as causas das transformações
efetuadas na região.
Guardadas as devidas proporções, aconteceu com
Manaus um pouco daquilo que se passou com São Paulo,
mais ou menos durante a mesma época. São Paulo, à
sombra do desenvolvimento econômico do café, cresceu
desmesuradamente, controlando a um só tempo a
expansão ferroviária, a imigração estrangeira e uma

indústria crescente. Manaus, cresceu sob o impulso
de uma economia de coleta extensiva, dependendo
de correntes de imigração interna (principalmente
nordestinos) e de um mecanismo de circulação lento
ligado exclusivamente aos rios. A exportação do café
paulista e da borracha amazônica reduziam o déficit do
país na relação cambial, e os recursos provenientes da
comercialização desses produtos contribuíam para a
reforma e embelezamento das capitais desses estados
assim como as grandes obras realizadas na capital
federal.
Foi exatamente entre 1890 e 1920 que o organismo
urbano de pequeno lugarejo do século XIX veio a ganhar
ares de metrópole, chamada neste momento de Paris
dos Trópicos. Junto com São Paulo e Rio de Janeiro era
considerada uma das cidades mais belas e movimentadas
do Brasil.
No entanto, a atualização de Manaus aos padrões
urbanos vigentes implicou na adoção de modelos que
se sobrepujaram às suas características naturais.
Foi preciso repensar e redefinir o espaço urbano,
modificando o antigo traçado de ruas, alargando avenidas
e urbanizando-se praças. Com esse intuito ignorou-se a
topografia do lugar, igarapés foram aterrados e colinas
niveladas. Se por um lado melhoravam as condições de
comunicação, higiene e transporte, por outro, interferiase na geografia, modificavam-se cursos d’água e
impunham-se novos costumes e vestimentas.
Manaus alardeava com orgulho todas as civilidades de
qualquer cidade europeia. Politicamente a cidade estava
ligada ao Rio de Janeiro, capital federal, comercialmente
dependia de Londres principal importador da borracha, e
culturalmente tentava se aproximar de Paris.

__________

7 Histórico demográfico do município de São Paulo - prefeitura.sp.gov.

br. IBGE - População das Capitaes dos Estados do Brazil - da série
Estatísticas Históricas do Brasil - ibge.gov.br.
8 Mesquita, Otoni. Manaus: História e Arquitetura 1852 - 1910. Editora
Valer. Manaus. 1999.

54
Imagem 1: Igarapé do Espírito
Santo, aterrado para dar passo
à Avenida Eduardo Ribeiro.
Foto: Coleção Jorge Herrán.
Sem data.
Imagem 2: Casas à beira do
Igarapé do Aterro, que deu
lugar à Avenida Floriando
Peixoto. Foto: Coleção Jorge
Herrán. Sem data.

“ Terras altas e baixas; casas
nos oiteiros e à beira da água.
Ora rua, ora igarapé, ali uma
estrada, aqui uma comprida
ponte de madeira; junto à
margem um vapor; perto dele
uma canoa do Amazonas;
numa porta boceja uma cara
branca; perto daí, banha-se
um menino fusco; e assim
tudo gira, pára, anda e nada
confusamente em Manaus.”
Robert
Ave-Lallemant,
1859, no texto de José
Aldemir de Oliveira: Espaçotempo de Manaus, 2008.

55
Planta da Cidade de Manaus. 1913. Já podemos ver as intalações do Porto ( 2 plataformas flutuantes) e as novas Avenidas Eduardo
Ribeiro e Floriano Peixoto no lugar dos antigos igarapés. Fonte: Biblioteca Nacional.

56
Mercado Público Adolpho Lisboa. Fachada para a Rua dos Barés. Fonte: Postais de Alain Croix - Coleção Jorge Herrán.

57
4.2 MARCOS URBANOS
Enquanto a cidade se expandia com a abertura de
novas vias principalmente no eixo norte, marcos se
cristalizavam na paisagem urbana de Manaus. A igreja
da Matriz junto com a Igreja dos Remédios são duas
construções da época provincial mas que ganharam novo
fôlego e destaque nos anos da borracha. Junto a elas
temos o Mercado de Ferro Adolpho Lisboa finalizado na
primeira década do século XX e o Porto Manaus Harbour
cujas obras iniciaram em 1899. Além desse conjunto, que
estabelece franca relação com o Rio Negro, temos, como
arremate final do ciclo da borracha, a construção do
Teatro Amazonas, símbolo de dominação e riqueza.

A primeira Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição
de origem jesuítica datada de 1695 passou por diversas
transformações até chegar aos dias de hoje. No ano
de 1858 foi completamente reconstruída devido à um
incêndio que ocorrera anos antes. Durante todo o período
provincial sua construção e manutenção são marcadas
por diversas dificuldades devido, principalmente, à
falta de mão-de-obra e materiais. Foi a primeira obra
arquitetônica de Manaus e a mais importante do período
provincial. Durante as obras de embelezamento da cidade
no ciclo da borracha a Igreja ganhou nova atenção com
a implantação de seu jardim aos moldes do paisagismo
inglês, inclusive com a instalação de um chafariz de ferro
trazido do Reino Unido. Porém, nesta mesma época
a praça e a igreja são destituídas de dois elementos
importantes do seu entorno. O primeiro foi em 1893 com
a aterramento completo do igarapé do Espirito Santo que
margeava uma das laterais da praça para a posterior
implantação da Avenida Eduardo Ribeiro.
Num segundo momento a ponta da praça que outrora
alcançava o rio é barrada pela construção dos edifícios do
Porto. Assim, das escadarias da Matriz aonde se podia ver o
Rio Negro e observar os viajantes que chegavam e partiam,
com a construção do Porto, a paisagem é barrada, o Rio

Negro é afastado e tudo que enxergamos é um
desarranjado conjunto de edifícios, muros e grades.

A Igreja Nossa Senhora dos Remédios é, junto com a
Igreja da Matriz, um dos templos religiosos mais antigos
de Manaus. Sofreu varias reformas no século XIX e no
inicio do século XX, com a contratação de um arquiteto
italiano, transformou-se totalmente, mantendo, contudo,
sua relação de proximidade com as águas do Rio Negro.
O primeiro registro que se têm da capela de Nossa
Senhora dos Remédios é de 1818. Quando a Igreja Matriz
inicia seu processo de reconstrução devido ao incêndio
a Capela dos Remédios passa a substituí-la nos cultos
religiosos. Os moradores da província, porém, reclamam
da distância em que estava localizada a capela e no
acesso que durante a época de cheias do Rio Negro só
era possível através de canoas. Fatos que evidenciam o
crescimento da cidade e sua relação intrínseca com o Rio
Negro.
Após a execução do projeto do arquiteto italiano Filintho
Santhoro na primeira década do século XX, a igreja passou
a apresentar um aspecto mais elaborado, revelando
maior preocupação formal e imponência.

Desde os primeiros anos da província, a construção de
um mercado para a capital parecia despertar a atenção
dos administradores públicos. Somente depois de duas
tentativas frustradas é que se construiu o Mercado de
Ferro Adolpho Lisboa.
Os primeiros registros da necessidade de uma casa de
mercado datam de 1853. Porém, o Mercado Adolpho
Lisboa assim como o conhecemos hoje só teve sua
construção iniciada em 1882. Nas falas do presidente da

58
província à época o local “tinha o grande inconveniente de
apresentar um declive bastante sensível para a margem
do Rio Negro”, por isso já nessa data foram feitas obras
para nivelar o terreno em uma cota mais alta.
O edifício foi inaugurado em julho de 1883, mas a
construção da fachada da Rua dos Barés, lado oposto ao
Rio Negro, foi contratada somente em 1902 e concluída
em 1906. O mercado apresenta duas fachadas totalmente
distintas, uma voltada para o Rio Negro e outra para a
Rua dos Barés.
O conjunto é composto por quatro pavilhões: o principal,
que é central e maior, dois laterais, o pavilhão do peixe à
esquerda e da carne à direita, e um posterior chamado de
pavilhão da tartaruga.
Fotografias do período 1893-99 mostram que até o
inicio do século XX a fachada principal do mercado era
aquela voltada para o Rio Negro. Nesta porção, em plena
área das praias de estiagem, situa-se “o desarranjado
e formigante cais das barcas, barcaças e canoas que
abastecem o entreposto. Durante a vazante, a rampa
arenosa se alarga, enquanto durante as cheias o nível
das águas encontra-se no alto do paredão dos fundos
do mercado” como nos descreveu Aziz Ab’Saber em sua
visita à Manaus no ano de 1953, e completa “barracas de
madeira, cobertas de folhas, ocupam temporariamente
e sazonalmente as rampas laterais, como que num
extravasamento incontrolável do organismo movimentado
do mercado na direção do rio e do ar livre.”

No conjunto das funções urbanas desempenhadas por
Manaus ocupa lugar de destaque a função comercial e
daí a importância de seu porto.
A falta de um porto amplo e bem equipado na capital
do Amazonas comprometeu por muitos anos a
economia da região. Dentre as constantes reclamações
governamentais, repetiu-se por muitos anos a falta de

59

condições nos serviços de embarque e desembarque de
mercadorias na cidade.
Durante todo o período provincial e mesmo nos dez
primeiros anos da República Manaus contou unicamente
com rampas e trapiches instalados no litoral da cidade,
que nas épocas de seca apresentavam grande dificuldade,
pois o Rio Negro baixava sensivelmente o nível de suas
águas, impedindo que os barcos aportassem nas rampas.
Frente à essa situação foi aberta em 1899 a concorrência
para a construção do novo Porto de Manaus, cuja as obras
só se iniciaram em 1902 pela empresa inglesa Manaus
Harbour Limited. A implantação do porto pelos ingleses,
com sua plataforma flutuante acompanhando o nível das
águas do rio, significou para a sociedade do início do
século XX, um movimento de modernidade que, somado
ao auge da borracha, desenvolveu poderoso comércio em
Manaus. O balanço das atividades econômicas na área
portuária destacava a vida dos manauaras, tornando
o local um ponto de encontros, onde famílias inteiras
passeavam nos fins de semana e se deslumbravam com
as chegadas e saídas de navios.
A construção do Porto de Manaus no inicio do século
XX com material importado e dirigido por uma empresa
inglesa criou um marco na paisagem urbana e fluvial de
Manaus. A orla da cidade ficou marcada por uma imensa
maquinaria de ferro e concreto, inicio de uma separação
(cidade-horizonte fluvial) que iria se agravar anos mais
tarde.
Sobre esse fato nos escreve o viajante Paul Le Cointe em
1922: “O conjunto das construções portuárias não poderia
em caso algum ser estético, mas ele possui um grande
inconveniente – que poderia ser evitado em parte por um
melhor agrupamento dos edifícios – que é de esconder
completamente a vista do rio e dificultar a ventilação dos
quarteirões ribeirinhos, que são os mais frequentados e
movimentados de Manaus.”9
__________
9 AB’SABER, Aziz Nacib. A cidade de Manaus: primeiros estudos. Editora

Beca-Ball. São Paulo. 2010. p. 119.
Vista da Igreja Matriz a partir do Rio Negro. Anterior à construção do Porto.
Catraias animam as águas do rio. Foto: Coleção Jorge Herrán. Sem data.

60
A Paris dos Trópicos. Bazar com nome francês.
Foto: Coleção Jorge Herrán. 1902.

61
62
Nesta página: Rua Henrique Martins. Centro de Manaus. Foto: Coleção Jorge Herrán. 1902.
Página ao lado: Teatro Municipal do Rio de Janeiro - inicio da construção 1905. Teatro
Amazonas - inicio da construção 1884. Teatro Municipal de São Paulo - incio da construção
1911. Fotos: panoramio.com
63
Igreja Matriz, sua praça e escadaria.
Ao fundo Teatro Amazonas.
Foto: Coleção Jorge Herrán. 1901.
Porto Manaus Harbour. Foto:
Coleção Jorge Herrán. Sem data.
Bonde 53 da Manaus Tramway. Foto:
Coleção Jorge Herrán. Sem data.

64
No inicio do século XX, a cidade de Manaus despontava como um dos centros de
prosperidade e riqueza no país, graças aos excedentes gerados pela exploração da
borracha na Amazônia. Naquele momento, a aparência da cidade e a efervescência de
suas ruas, com bares e cafés de nomes franceses criavam a ilusão de uma prosperidade
que duraria para sempre. A cidade se transformava, a politica de embelezamento
modificava a paisagem urbana e determinava novos comportamentos.
Neste período o aspecto da capital tornou-se a grande preocupação dos administradores
que promoveram consideráveis modificações na estrutura natural de Manaus –
somente neste período 4 igarapés do centro da cidade deixaram de fazer parte da
paisagem urbana.
A modernidade foi traduzida na cidade pela substituição, a madeira pelo ferro, o barro
pela alvenaria, a palha pela telha, o igarapé pela avenida, a carroça pelos bondes.
Certos comportamentos eram condenados enquanto outros elogiados, acentuava-se
ainda mais a preocupação com alguns aspectos construtivos da cidade, proibindo-se a
construção de casas cobertas de palha e determinando-se, por exemplo, que todas as
construções deveriam ser rebocadas.
Neste movimento econômico a relação de complementaridade entre a cidade e o rio
é deixada em segundo plano. O rio deixa de ser a extensão da vida da cidade para ser
apenas a possibilidade de ir e vir das riquezas geradas pela borracha. A contemplação
da antiga cidade em relação ao rio e atividades que antes eram corriqueiras – lavar
a roupa, apanhar água, pescar – o rio como berço geográfico de um assentamento
humano cede à movimentação pesada das embarcações que vinham dos seringais e
para eles iam. O resultado dessa conjuntura de inserção ao capital internacional foi o
inicio da produção de um espaço urbano ensimesmado, que negará continuamente os
recursos naturais que tem a sua volta.
Principalmente durante a administração de Eduardo Ribeiro (1892 – 1896) impôs-se
uma nova aparência à cidade, estabelecendo-se uma nova ordem social. Era, sem
dúvida, um rito de passagem, despiam os farrapos da grande aldeia e vestiam-na uma
indumentária de cidade europeia. Forjava-se a Paris dos Trópicos, com sua morte
prematuramente anunciada.

65
4.3 ENTRE TEMPOS 1920 - 60
Em 1920 estava definitivamente confirmada a falência da borracha na região. O primitivo
sistema extrativista fora derrotado e não dispunha de recursos capazes de acompanhar
a rapidez e a qualidade da produção asiática. A Amazônia despedia-se de sua fase áurea
e mergulhava numa estagnação econômica que manter-se-ia por várias décadas. O
setor de obras públicas foi o primeiro a sentir os reflexos da crise, a sua paralisação foi
a primeira medida dos governantes, situação que perduraria durante toda a primeira
metade do século XX.
Durante todo esse período Manaus foi a própria imagem do abandono. A partir da
derrocada da borracha, uma população ribeirinha do interior do estado chega com
maior intensidade à cidade, enquanto investidores estrangeiros e forasteiros vão
embora. Manaus é novamente alvo de imigração, porém de uma população pobre que
fugia dos seringais esvaziados. É essa mesma população que trará novamente à cidade
a sua característica anfíbia, meio terra, meio água.
São anos de marasmo econômico, paralisando o desenvolvimento econômico de
diversos setores. As construções sofrem com a ação do tempo, a falta de energia
elétrica passa a ser constante comprometendo o funcionamento dos bondes que são
por fim substituídos pelos ônibus, e as redes de água e esgoto tornam-se insuficientes.
No ano de 1940 Manaus conta com 108 000 habitantes chegando a 340 000 na década
de 1960. Cresce uma população sem amparo do poder público, mas é nessa falta de
apoio que o ribeirinho mostra a força do seu conhecimento, a criatividade de suas
soluções e a beleza de sua natureza. Manaus volta a ser uma cidade identificada com
a sua localização, seu berço geográfico – o Rio Negro. Dessa vez não pela imponência
do dinheiro, mas pela maneira simples e barata que flutua nas águas do Rio Negro
através de barcos e casas. Entre 1920 e 1960 vemos nascer a Cidade Flutuante, uma
aglomeração de aproximadamente 2000 casas flutuantes que avançavam sobre o Rio
Negro, num emaranhado de troncos e tábuas de madeira, abrigando comércio, serviços
e residências, com seus 12 000 moradores.10

__________

10 SOUZA, Leno José B. A Cidade Flutuante de Manaus: rediscutindo conceitos. Artigo publicado na revista

AEDOS. UFRGS. 2010. p. 152.

66

Retratos da cidade flutuante.
Fotos: Otoni Mesquita no livro
Manaus História e Arquitetura.
“ Ele me levara para um boteco na
ponta da Cidade Flutuante. Dali
podíamos ver os barrancos dos
Educandos, o imenso igarapé que
separa o bairro anfíbio do centro
de Manaus. Era a hora do almoço.
O labirinto de casas erguidas sobre
troncos fervilhava: um enxame de
canoas navegava ao redor das casas
flutuantes, os moradores chegavam
do trabalho, caminhavam em fila
sobre as tábuas estreitas que
formavam uma teia de circulação.
Os mais ousados carregavam um
botijão, uma criança, sacos de
farinha; se não fossem equilibristas,
cairiam no Negro. Um ou outro
sumia na escuridão do rio e virava
notícia.”
Milton Hatoum. Dois
Irmãos, pag. 120.

“ Vendia de tudo um pouco aos
moradores dos Educandos, um
dos bairros mais populosos de
Manaus, onde ergueram palafitas
à beira dos igarapés, nos barrancos
e nos clarões da cidade. Manaus
cresceu assim: no tumulto de
quem chega primeiro.” Milton
Hatoum. Dois Irmãos. pag. 41.

67
Mercado ribeirinho e casas
flutuantes no Rio Negro. Fotos:
Marcel Gautherot, 1944. Livro
Norte, publicado pelo Instituto
Moreira Salles em 2009.

68
69
70
Palafitas nas imediações
de Manaus e o transporte
de produtos. Fotos: Marcel
Gautherot, 1944. Livro Norte,
publicado
pelo
Instituto
Moreira Salles em 2009.

71
4.4 ZONA FRANCA DE MANAUS
O cenário brasileiro muda. A Amazônia é apontada cada vez mais como o elo frágil
da soberania nacional. Despovoada, desconectada, desamparada. Desde a segunda
guerra mundial os discursos políticos à respeito da região norte se intensificam e a
partir dessas premissas a Zona Franca de Manaus é idealizada no ano de 1957 com a lei
3173/57 quando é criado o Porto Livre. São 10 anos de gestação dessa proposta até que
em 1967 através do decreto-lei 288 regula-se a implantação do programa de incentivos
fiscais para o estabelecimento de um polo industrial, comercial e agropecuário na
região.

Nesta página: Notícia do jornal A
Crítica, anunciando o desmonte da
Cidade Flutuante. Página ao lado:
Conjunto Habitacional Multifamiliar
para Quadra Típica constante no
anexo do plano diretor de Manaus de
1967. Arquivo: acervo Cristina Grobe.

Novo fôlego, novo afluxo de dinheiro, e com isso novos investimentos no planejamento
urbano da cidade que se tornará sede de importantes indústrias nacionais e
internacionais, receberá aeroportos e rodovias, e assistirá a um crescimento
demográfico novamente elevado. O lema era ‘integrar para não entregar’.

“Subimos pelas ruas dos Educandos;
na avenida Beira-Rio vimos, lá
embaixo, o vazio do porto da
Escadaria, antes ocupado por um
aglomerado de palafitas.
	
‘Sabes onde eles estão?’,
perguntou Mundo.
	
‘Eles quem?’
	
‘Os moradores da beira
do rio. Foram jogados no outro lado
da cidade. A área foi desmatada,
construíram umas casas...Sobrou
uma seringueira. Quer dizer, o tronco
e uns galhos, a carcaça.” Milton
Hatoum, CINZAS DO NORTE, p. 143.

O ano de 1967 é marcante na história manauara. Novo plano diretor, novos empregos,
novos eixos de crescimento urbano. Porém para tratar desse novo momento velhas
estratégias são postas em prática e a cidade torna a dar as costas para suas águas. O
Plano Diretor de 1967 projeta uma cidade que nunca aconteceu, além de desconsiderar
a presença dos moradores flutuantes.
A Cidade Flutuante, ao lado do Porto Público de Manaus, porta de entrada da cidade,
incomoda, perturba a paisagem do novo capital que desembarca em Manaus. Sua
derrubada é executada no ano de 1967, ano que marca também o início da construção
de conjuntos habitacionais em zonas cada vez mais afastadas do centro, nas direções
norte e leste principalmente.
Apesar do desmonte dos flutuantes, o centro continua a ser uma área de comércio popular
onde a população da cidade vem se abastecer de produtos alimentícios. Até a década de
1990 se torna cada vez mais famosa e movimentada a Feira da Escadaria dos Remédios.
Na boca do Rio Negro, em frente à antiga Igreja dos Remédios, encontrava-se a Feira da
Escadaria, onde regatões de diversos municípios do Amazonas vinham vender seus
produtos. Eram frutas, peixes, verduras e ervas comercializadas em barracas ou nas
próprias canoas com os pés na água. O centro se consagra como zona comercial
popular, comportando em sua história uma variedade de ocupações – Cidade Flutuante,
Feira da Beira da Praia do Mercado, Feira da Escadaria, Feira da Banana, e por último
Feira Manaus Moderna.
Na década de 1990 essa área enfrenta nova reordenação com o projeto Manaus
Moderna, uma avenida de 5 km de extensão para a ligação do porto com o Distrito
Industrial. Porém a área em questão é um espaço de ocupação antigo e, portanto,
remodelá-lo significou enfrentar as experiências e formas de ocupação que nele se
72
73
RESERVA DUCK

PARQUE MUNICIPAL
DO MINDU

PARQUE DOS
BILHARES

UFAM

N
sem escala

Página ao lado: evolução da mancha urbana, da fundação ao século XX. Base: PMM. Elaborado pela autora.
Nesta página: mapa 7 - Limite do perímetro urbano do Município de Manaus e a mancha urbana atual com destaque
para a primeira ocupação feita pelos portugueses. Base: Planta Cadastral da Cidade de Manaus. Elaborado pela autora.
consolidaram, ou seja, as formas de morar e habitar, mas
principalmente, os modos de trabalhar e comercializar
das feiras que ali se constituíram.
Assim, da mesma forma que a Cidade Flutuante sofre
violento desmonte, a Feira da Escadaria é também
derrubada para dar lugar à larga Avenida Beira-Rio
ou Avenida Manaus Moderna. É a última intervenção
da administração pública no local, que através de um
aterramento de grandes proporções distanciou as águas
do Rio Negro em mais de 150 metros, criando um grande
paredão que acompanha toda a orla central de Manaus.

1669 - 1920

É um espaço que guarda muito pouco de sua antiga
identidade, a avenida apartou definitivamente o
Mercado Adolpho Lisboa do Rio Negro, a Igreja dos
Remédios nunca mais avistou as águas que batiam na
sua escadaria, e a Igreja Matriz ilhou-se no seu próprio
jardim, hoje gradeado, com entrada controlada e envolto
por um transito intenso de ônibus que chegam e partem
do Terminal que leva seu nome.
Além disso, o Mercado público ganhou 2 anexos, galpões
metálicos construídos justamente neste solo criado, que
reforçam ainda mais essa separação terra-água. Eles
são chamados de Feira da Manaus Moderna, fazem a
frente fluvial da cidade mas não compõem um conjunto
urbanístico identificável e significativo.
1920 - 1960

Manaus está inserida em uma natureza abundante, mas
insiste em voltar-lhe as costas, recusando o diálogo e
fantasiando-se de ‘modernidades’.
Em poucos anos Manaus crescera
tanto que Mundo não reconheceria
certos bairros. Ele só presenciara o
começo da destruição; não chegara
a ver a ‘reforma urbana’ do coronel
Zanda, as praças do centro, como a
Nove de Novembro, serem rasgadas
por avenidas e terem todos os seus
monumentos saqueados.” Milton
Hatoum, CINZAS DO NORTE, p.258.

1960 - 1980

75
Mapa 6: Imagem aérea do centro de Manaus
com destaque para os edifícios citados no
texto. Base: Google Earth. Elaborado pela
autora.
1 Igreja Matriz e Praça
2
3
4
5
6

Porto Público de Manaus:
Armazenagem de carga
Embarque/ Desembarque passageiros
Alfândega
Ministério dos Transportes/ Marinha
Plataformas Flutuantes

IGARAPÉ DE
SÃO RAIMUNDO

7 Mercado Público Adolpho Lisboa
8 Igreja dos Remédios e Praça
9 Área ocupada pela Cidade Flutuante e Feiras
10 Teatro Amazonas
11 Avenida Floriano Peixoto
12 Avenida Beira-Rio
13 Galpões da Feira da Manaus Moderna

2

3
6

localização do recorte. sem escala.

76
10

1

11

4

5
7

8

12
13

13

IGARAPÉ DOS
EDUCANDOS

9

77
4.5 ANÁLISES DA SITUAÇÃO ATUAL

Longe de um tempo passado, Manaus encontra-se plenamente inserida no ciclo
de reprodução do capital internacional. Ao mesmo tempo em que ocorreram as
mudanças com a construção de novos equipamentos urbanos e redes de comunicação,
possibilitando a circulação de pessoas e objetos, há a desarticulação de fluxos
pretéritos. Não apenas os eixos desaparecem, mas desarticulam-se algumas
atividades. Pretende-se mostrar como as dinâmicas espaciais, estruturadas a partir
de uma infra-estrutura imposta pela urgência do capital, anulam em muitos trechos a
natureza de Manaus. Considera-se que o cenário urbano atual não se configura como
um lugar adequado à vida urbana, não constrói imagens singulares e referenciais da
paisagem manauara e, portanto, não contribui para uma relação afetiva dos habitantes
com a sua cidade.
Habitação, trabalho, lazer e transporte. Serão estes os temas estudados aqui para
esclarecer como se dá a vida na cidade de Manaus do ano 2000. Focaremos a região
central, núcleo de desenvolvimento da cidade, porém a análise de todo o perímetro
urbano será necessária para se compreender como o centro não é apenas um ponto no
mapa, mas sim um conjunto vivo de instituições sociais e de um cruzamento intenso
de fluxos sejam eles, produtos, pessoas ou ideias. Como tal acredita-se que o desenho
urbano do centro de Manaus, pode expressar de modo efetivo e, sobretudo, simbólico,
a capacidade do homem amazônico em formalizar uma outra configuração à natureza,
o lugar da sua moradia, do seu trabalho e do seu lazer.

78
4.5.1 TRANSPORTE
“Toda aglomeração, desenvolvida
precisamente
para
gerar
a
aproximação, gera afastamento. A
aglomeração em um único ponto é
impossível; logo alguém será obrigado
a se afastar. Quem? (...) Surgem, então,
os deslocamentos espaciais regulares
e socialmente determinados e disputas
ocorrem por localização em função
do domínio ou controle do tempo e
energia gastos nos deslocamentos
espaciais.” VILLAÇA, 2001, p.238.

Transporte caracteriza-se como uma infra-estrutura
urbana que dá suporte à vida habitual do homem,
portanto, trata-se de uma infra-estrutura difusa, que
deve estar presente em todas as regiões de um ambiente
urbano. Morar, trabalhar e se divertir dependem desse
suporte, assim a infra-estrutura de transporte esta
presente no dia-a-dia de toda uma população, seja na
forma individual ou coletiva. Por esse mesmo motivo a
infra-estrutura de transporte de uma cidade pode ser
identificada como a própria imagem dessa cidade. Paris,
por exemplo, é fortemente identificada através de sua
rede metroviária.
Manaus, ao contrario de Paris, possui uma única opção
em transporte coletivo: ônibus. Fortemente assentada
sobre o modal rodoviário, Manaus construiu um espaço
intra-urbano com grandes desníveis sociais, a exemplo
do que acorreu em diversas cidades brasileiras no século
XX.
A evolução do transporte público de Manaus, faz parte
de um quadro abrangente que percorre todo o país. O
declínio do transporte de passageiros sobre trilhos,
especialmente os bondes – veículos leves sobre
trilhos – pode ser observado dentro e fora do Brasil na
primeira metade do século XX. A explosão da indústria

79

automobilística (e de outras indústrias a ela ligadas
como fabricantes de pneus, combustíveis e acessórios)
esteve decisivamente ligada ao processo de substituição/
sucateamento do modal ferroviário para o modal
rodoviário, principalmente nas capitais.
Manaus contará com o sistema de bondes até 1957, ano
que a empresa inglesa Manáos Tramway deixará de atuar
definitivamente na cidade. Após o fim do ciclo extrativista
da borracha, não somente a infra-estrutura de transporte
deixará de receber investimentos, a iluminação pública
também passa a sofrer com constantes quedas de
energia. Durante a década de 1940 os bondes começam
a operar de forma reduzida para a economia de energia,
quando não paravam por completo. A frota de veículos se
torna cada vez menor e de pior qualidade. Os bondes que
representaram por vários anos o símbolo de uma fase
de desenvolvimento, constituindo orgulho referencial
para os habitantes de Manaus, chegaram à década de
50 com seu maquinário desgastado, favorecendo assim
a introdução de outra modalidade, numa fase de euforia
nacional pelo sistema sobre rodas. Nesse mesmo
impulso, avenidas são abertas e pontes construídas
alcançando localidades cada vez mais distantes do
centro, muitas das quais contavam até então com
pequenas canoas que subiam os igarapés. As chamadas
catraias eram pequenas embarcações cobertas por uma
lona, que conduziam entre 15 e 20 pessoas. Seu condutor,
o catraiero, é uma figura que quase não existe mais.
Sua catraia não sobe mais os igarapés, impedida pelos
aterramentos e pontes, e ele, o catraiero, foi substituído
pelo motorista dos ônibus. Os igarapés não são mais as
vias de comunicação da cidade.
No Brasil todo, o ônibus corresponde a 95% do transporte
coletivo utilizado e em Manaus essa é a única opção
de transporte público. São seis terminais urbanos
espalhados pela cidade, dois deles na região central da
cidade, destacando-se o Terminal da Matriz (T0).
No entanto, os ônibus correspondem a somente 2% da
frota de veículos da cidade, responsáveis pelo transporte
de 56% da população. Enquanto os automóveis
particulares correspondem à 71% da frota transportando
12% dos habitantes de Manaus.
A sobrecarga não se dá somente dentro dos ônibus, mas
também nas vias por onde passam. Há um claro anel na
circulação da cidade, com a preponderância de 2 eixos:
centro – norte e centro – leste, dois eixos de expansão do
crescimento urbano. É visível o afunilamento em direção
ao centro, concentrando em uma pequena área da
cidade, uma quantidade enorme de veículos, disputando
o espaço das vias com ambulantes e pedestres, gerando
maior desconforto aos usuários, maior degradação do
ambiente, e constante insatisfação de todos.

Tempos de viagem distintos: via ônibus e via barco. Fonte:
conversa com moradores. Elaborado pela autora.

O fluxo centro – norte hoje é o que apresenta maior volume
de veículos e pessoas em Manaus. É neste eixo que estão
concentrados importante equipamentos urbanos além
de importantes conexões como a saída para a BR 174
e AM 010, o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes,
a Rodoviária, a futura Arena Amazônia, além de forte
comércio e presença de edifícios institucionais. Em
segundo lugar, mas não menos importante está o eixo
centro – leste. A zona leste (nordeste ,sobretudo) é a que
apresenta hoje maior concentração populacional, com
o surgimento de inúmeros conjuntos habitacionais nas
bordas da Reserva Ducke, limite do perímetro urbano.
O centro de Manaus catalisa todas as atividades. Chegar
e sair da cidade, acompanhar alguém que vai viajar
de barco, ou ir buscar um parente que está chegando,
estudar, comercializar, rezar, assistir à uma ópera, beber
com os amigos, comer um bom tambaqui na brasa.
O centro da cidade é sem duvida a área que mais atrai
viagens.

Gráfico Frota/modo de transporte X usuários. Fonte: PMM.

80
AM-010
BR-174

RESERVA DUCK

T3

T4

AEROPORTO INTERNACIONAL
EDUARDO GOMES

T5

UFAM

T1
T0

Mapa 8: Carragamento do Transporte Público.
Fonte: PMM. Elaborado pela autora.
81

T2
Quantidade de
linhas de ônibus
0 - 25
25 - 50
50 - 75
75 - 100
100 - 150














4.5.2 HABITAÇÃO
Cearenses, paraenses, maranhenses e ribeirinhos dos
mais diversos rios amazônicos aportaram à Manaus. A
cidade cresceu em população e em extensão, chegando à
ocupar 26km no sentido leste-oeste, e 21km no sentido
norte-sul (limites do perímetro urbano). Casas de taipa
ou de madeira, telhados de palha ou de zinco, casas sobre
palafitas ou mesmo flutuantes. São habitações informais
que contrastam em cor, número e forma com a cidade
legal, suas torres residenciais e condomínios fechados.
Dispondo unicamente de recursos próprios para
a construção de sua moradia, grande parte dessa
população migrante buscou no seu próprio saber as
técnicas para a realização desse empreendimento. Desde
a derrocada da borracha, a expansão das habitações
sobre igarapés passou a fazer parte da paisagem urbana
de Manaus como um processo natural de evolução dos
tempos. Diariamente pessoas transitam pelas ruas do
centro ou em bairros distantes, onde os aglomerados de
palafitas e os igarapés poluídos parecem imperceptíveis
ao cotidiano de quem não está inserido em tal condição
de pobreza social.
As várzeas, baixadas, ribeiras e igarapés da cidade foram
tomados pela falta de investimentos em habitação de
baixo custo o que impediu o acesso à terra por grande
parte de população que fugia da estagnação econômica
do interior do Estado do Amazonas. O mesmo acontece
nos dias de hoje com a ocupação dos limites do perímetro
urbano de Manaus nos extremos norte e leste da cidade
(ver mapa 9), onde vive atualmente a maioria da população
com difícil acesso à equipamentos públicos de saúde e
educação. Cada vez mais longe do centro a ocupação da
cidade se guiou pelos corpos d’água, mais uma vez os rios
foram os principais elementos de orientação na produção
do espaço urbano, condicionantes de uma organização
habitacional que deve lidar com uma paisagem mutante,
ora cheia, ora vazante.

Assim, ao contrário da cidade legal, organizada em
ruas, lotes e alinhamentos, dividida em zoneamentos de
forma regular e legítima, a cidade informal das palafitas
e flutuantes guarda em sua paisagem características
únicas, formas de relacionamento com o meio natural
e social particulares e nesse ponto torna-se uma
paisagem rica, exuberante, cheia de cores, sons e
cheiros. É uma paisagem que se esconde do olhar
desatento, pois encontra-se nos miolos de quadra, ao
longo dos igarapés que recortam os quarteirões. Mesmo
escondida esse tipo de habitação persiste e se mantém
presente na cidade de Manaus tanto em sua área central
como nos bairros mais distantes.
Ao longo do século XX, esse tipo de ocupação foi
continuamente combatido sendo alvo de programas
e projetos que culminaram com a remoção dessas
populações ribeirinhas para longe da área central,
esvaziando o centro e ampliando os limites territoriais
de Manaus com a interiorização pelas terras firmes,
num modelo de ocupação mista, entre as intervenções
planejadas pelo Estado (conjuntos habitacionais) e
ocupações espontâneas. Como exemplo mais forte desse
processo temos o desmonte da Cidade Flutuante no ano
de 1967 com a consecutiva construção do Conjunto de
Flores e Conjunto Costa e Silva na região norte da cidade.
Hoje a mesma politica pode ser observada e mais
conjuntos, ao estilo ‘cidade tiradentes’ são construídos
no extremo norte da cidade, um exemplo importante é o
Conjunto Nova Cidade, ultimo bairro no sentido norte e
hoje um dos mais populosos de Manaus.
Com um modelo pré-estabelecido pelas agências
multilaterais de desenvolvimento, o governo do Estado
do Amazonas pôs em prática o Programa Social e
Ambiental dos Igarapés de Manaus - PROSAMIM – no
ano de 2006, alterando a dinâmica habitacional do centro
da cidade, substituindo antigas práticas por um novo

82
cenário artificial e reproduzindo as mesmas politicas
do século XX. Remoção de famílias, aterramento de
igarapés, construção de conjuntos habitacionais de
qualidade inferior que desestruturam atividades e fluxos
antes comuns entre os habitantes das áreas atingidas, a
exemplo das catraias citadas anteriormente.11
O Prosamim ignora a paisagem onde se instala, uma
paisagem natural rica e socialmente complexa, onde
há vazão para diversas atividades e deslocamentos.
São lugares pobres, mal acabados, cheios de sons e
ruídos de rádios e televisões. São lugares que tem
tudo para promover a desordem e o desafeto. Mas, ao
contrário, podemos identificar parcerias, cumplicidades
e solidariedades. A medida que as águas avançam nas
cheias todos se unem na subida dos assoalhos e das
pontes de madeira, são novas camadas que se sobrepõem
àquelas alagadas pelo rio, camadas estas construídas
pela ajuda mutua e pelo esforço coletivo.
As janelas não tem cortinas, mas as portas e paredes
pintadas revelam não apenas o que foi possível fazer,
mas também o belo para os moradores. As palafitas
e flutuantes contam com eletrodomésticos, antenas
parabólicas e outras comodidades. Aqui e ali é possível
ver um vaso com flores, uma conversa na porta de casa e
uma vendinha que abastece as redondezas. Descobremse cores, gestos, esconderijos e amplitudes, lugares em
que a vista se perde na riqueza dos detalhes. Há esquinas,
reentrâncias, caminhos largos e estreitos, pontos de
encontro, onde é possível parar o barco, abastecer ou
descarregar a mercadoria e onde a conversa se faz
presente. Lugares que dão vazão as brincadeiras das
crianças.
O Prosamim desconsidera essa paisagem e a substitui
por um cenário homogeneizante, onde a água desaparece
__________

11 BEZERRA, Arliene A. N. Habitação e ação pública na contemporaneidade:

um estudo de caso na área central de Manaus. Dissertação de mestrado
apresentado à FFLCHUSP. São Paulo. 2011.

83

sob a avenida, os esconderijos e reentrâncias dão lugar
ao descampado do espaço público vazio de vida, de
encontro e de conversas. Foi a necessidade de adequação
desses ambientes socialmente construídos em benefício
da cidade contemporânea, uma cidade genérica. Produto
de uma administração e não obra de produção social,
coletiva e democrática. O centro da cidade de Manaus com
as obras do Prosamim e a reforma da Manaus Moderna
passa a ser reproduzido não mais como expressão do
desenvolvimento histórico da sociedade, mas sim como
ação técnica planejada por algum administrador.
Enquanto o centro da cidade passa pelos novos
investimentos do Prosamim na bacia dos Educandos e
posteriormente na bacia de São Raimundo, a classe de
maior poder aquisitivo busca a beleza natural da Ponta
Negra. Uma praia fluvial, aos moldes da Barra da Tijuca
do Rio de Janeiro, ou da Praia de Boa Viagem no Recife,
afastada quase 15km do centro, onde proliferam torres
residenciais de alto padrão com vistas para o Rio Negro,
e condomínios fechados com marinas particulares. Esta
área também passa por uma ampla reestruturação
urbana com a implantação de um parque beira-rio ao
longo de toda a extensão da avenida Coronel Teixeira.
Nesse ponto, afastado do centro, o Rio Negro volta a
ser valorizado elevando o preço dos imóveis e serviços
circundantes. Processo inverso do que ocorre no
centro da cidade onde há grande quantidade de imóveis
desocupados, acarretando no completo esvaziamento
da região central nos fim de semana e feriados, quando
o comércio e serviços estão fechados, evidenciando o
completo desequilíbrio de Manaus quando comparamos
a oferta de infra-estrutura e empregos com as áreas de
concentração habitacional.
RESERVA DUCKE

NOVA
CIDADE

CIDADE
DE DEUS
CIDADE
NOVA
PONTA
NEGRA

JORGE
TEIXEIRA
NOVO
ALEIXO
DISTRITO
INDUSTRIAL 2

DISTRITO
INDUSTRIAL 1

POPULAÇÃO / BAIRRO DE MANAUS
1 827 - 12 053

CENTRO

12 054 - 28 288
28 289 - 53 370
53 371 - 75 832

Mapa 9: População / Bairro
Fonte: PMM. Elaborado pela autora.

75 933 - 121 135

84
(1)

(2)

(3)

(4)

Imagens 1 e 2: Foto aérea da Ponta Negra e vista do chão. Fotos: Quapá e acervo pessoal.
Imagens 3 e 4: Foto aérea da Praia de Boa Viagem no Recife e vista do chão. Fotos: panoramio.com.

85
(1)

(2)

(3)

(4)

Imagens 1 e 2: Conjunto Habitacional Nova Cidade na Zona Norte de Manaus. Adentrando no espaço da floresta. Foto: SOS Archives.
Imagem 3: Conjunto Cruviana, Boa Vista - Roraima. PAC - Minha Casa Minha VIda. Imagem 4: Conjunto Habitacional Rio Verde - São
Paulo. Fotos: panoramio.com.

86
Bairro Nova Vitória. Zona Norte de Manaus. Foto: SOS Archives. 1999.

87
Bairro Nova Vitória. Zona norte de
Manaus. Foto: SOS Archives. 1999.

88
Palafitas. Igarapé de São Raimundo.
Foto: Acervo pessoal. 2012.

89
Palafitas. Igarapé de São Raimundo.
Foto: Lais Matiusse. 2012.

90
A cidade genérica. PROSAMIM.
Foto: acervo pessoal.

91
4.5.3 ESPAÇOS PÚBLICOS/LIVRES - LUGAR DE LAZER E LUGAR DE TRABALHO
As infra-estruturas urbanas de menor porte são tão
antigas quanto as próprias cidades. Ruas, largos,
praças, passarelas e pontes são estruturas urbanas
presentes desde a origem da cidade de Manaus e
aquelas que, mesmo com sucessivas modificações, mais
permaneceram no seu ambiente urbano.
A Rua dos Barés, a Avenida Sete de Setembro, a Praça
da Saudade, Praça da Matriz, a Rua Eduardo Ribeiro são
espaços públicos por excelência, lugar de animação e
sociabilização cotidiana, signos da memória e, portanto,
de valor cultural. Além do lugar da conversa e do
encontro, são também o espaço do comércio, da troca,
da pechincha, justamente pelo movimento que possuem
com a passagem de pedestres e com a descarga de
mercadorias no porto improvisado da Manaus Moderna.
As ruas e praças do centro de Manaus são tomadas
pelo comércio formal e informal, são as mais variadas
mercadorias que tomam as calçadas seja na extensão
das próprias lojas seja nas barracas de ambulantes.
Frutas, peixes e sementes que podem ser comprados
diretamente do barco que atraca nas costas do Mercado,
no muro branco da Manaus Moderna. Sem nenhuma
burocracia ou infra-estrutura o centro de Manaus
se coloca como lugar do comércio, do movimento,
do abastecimento. No passado era tomado pela elite
manauara, hoje com a nova mobilidade territorial que
expandiu os eixos da metrópole criando novos pontos de
interesse (como a Ponta Negra, por exemplo) o centro
passou a ser frequentado pelas camadas populares que
invadiram as ruas e calçadões, ligaram seus rádios com
as mais variadas músicas, e fizeram deste espaço público
o seu ganha-pão.
O mesmo acontece com os igarapés, principalmente os
igarapés dos Educandos e São Raimundo que rodeiam o
centro da cidade. São espaços do ir e vir de embarcações
que possuem as mais diversas finalidades e tamanhos,
podem encostar no ‘quintal’ de uma casa atendendo
pessoalmente os fregueses, trazem mercadorias dos

mais distantes pontos do Amazonas para trocar ou vender
rio acima, levam famílias inteiras que vem se abastecer
nas feiras do centro.
As ruas do centro de Manaus, assim como os seus
igarapés, apresentam além de seus usos correntes,
reminiscências de usos urbanos passados. São lugares
que possuem estreita relação com a água e dependem
dela para o seu acontecimento. Não é difícil ver grupos
de pessoas que esperam um barco chegar ou partir por
que nele estão parentes queridos, ou mesmo ribeirinhos
de outros rios da Amazônia que vem à Manaus comprar
mercadorias que eles só encontram aqui. A água é o lugar
do encontro e da despedida, do chegar e partir, e são
nesses acontecimentos, no olhar daqueles que buscam
alguma pista no Rio, que vislumbramos o significado
dessa frente fluvial, desses cursos d’água que teimam
em compor o tecido urbano de Manaus.
Esses encontros, cidade – água, são espaços
multifuncionais, possuem uma variedade de usos,
participantes e usuários. Mesmo em igarapés tomados
por palafitas e flutuantes, onde o uso habitacional
pode parecer o único, há uma infinidade de atividades
sobrepostas. Cabelereiros, creches, bares, restaurantes
e mercadinhos compõem esses bairros sobre as águas.
Já o conjunto habitacional, o bairro residencial distante,
as áreas de estacionamento e o próprio automóvel
criam espaços monofuncionais. Primeiramente com
a obra da Manaus Moderna, num momento de intensa
fragmentação do espaço urbano, onde o sistema viário
foi projetado como um sistema de funções limitado ao
fluxo de veículos automotores para a ligação do Porto à
zona industrial, e atualmente com o projeto PROSAMIM,
onde edifícios puramente habitacionais são implantados
com o tamponamento dos igarapés, atestando uma forte
tradição da administração pública de desprezo dos rios e
sobrevalorização do sistema viário, Manaus se reveste de
um discurso excludente que despreza a possibilidade de
integração que o Rio Negro e seus igarapés representam,
92
a possibilidade de criação de um sistema.
Considerando ‘sistema’ como um conjunto das partes
ou etapas que encadeiam-se de modo coordenado para
atingir um determinado fim, a exemplo do sistema de
abastecimento de água, podemos afirmar que Manaus,
assim como outras cidades brasileiras, não possui um
‘sistema de espaços públicos livres’.12 Os espaços livres
de Manaus nunca chegaram a formar um conjunto
dotado de intencionalidade. Cada igarapé, cada praça,
rua, calçadão ou parque valem por si sós, não promovem
a integração do território. Eles simplesmente acontecem
na cidade, e dependendo de sua localização são mais ou
menos frequentados. Não são vistos como um conjunto,
uma rede, e nos projetos atuais, como o PROSAMIM,
continuam a fragmentar o espaço urbano.
Seria possível revegetar as margens ocupadas? Construir
habitações que possibilitem adequações, subtrações
ou adições para diferentes usos conforme a vontade de
seus moradores? Possibilitar a navegação em igarapés
para a livre circulação de mercadorias e pessoas ou para
a simples recreação? Criar espaços públicos tratados?
Vivificar a memória do Rio e da própria cidade de Manaus?
Decidiu-se sempre pelo não.
No entanto, o centro de Manaus e seus espaços livres,
com sua frente fluvial e igarapés, continuam vivos no
caminhar dos pedestres, nas mercadorias das feiras
e ambulantes, e no atracar dos barcos. São espaços
fragmentados e degradados que continuam cheios de
gente e acenam para a possibilidade dessa integração.
Espaços onde o pedestre é o protagonista. Não é preciso
ter dinheiro para desfrutar desse ambiente, onde a
manifestação da vida pública se dá por completo, onde
todos podem contemplar a vista do Rio Negro e sentir-se
parte dessa comunidade urbana.
__________

12 BARTALINI, Vladimir. Os córregos ocultos e a rede de espaços

públicos urbanos. Arquitextos. Vitrúvios. São Paulo.2009.

93

Barco atracado nas costas de uma casa no Igarapé de São
Raimundo. Foto: Marcia Trento. 2012. Familia em uma
pequena embarcação atracada na Avenida Beira-Rio com
diversas frutas a bordo. Foto: Acervo pessoal. 2012.
A secura da Avenida Beira-Rio.
Foto: acervo pessoal. 2012.

94
À espera. O muro da Avenida Beira - Rio e sua estreita calçada é o unico lugar aonde
podemos ver o Rio e os barcos que chegam e partem. Foto: acervo pessoal. 2012.

95
A água para se refrescar no calor. Meninos nadando no
Igarapé de São Raimundo. E homem pulando no Rio
Negro, próximo ao Mercado Adolpho Lisboa. Foto 1:
acervo pessoal. 2012. Foto 2: Marcio Melo tirada em 28
de maio deste ano.

96
O burburinho do mercado. Barraca de bananas e o sobe e desce da carga/descarga de
produtos dos barcos que atracam no muro da Avenida Beira-Rio. Foto 1: Fábio Mariz.
2012. Foto 2: acervo pessoal. 2010.

97
Imagem página ao lado:maquete
eletrônica do projeto.

98
4. A TERCEIRA MARGEM DO RIO: Nova orla fluvial de Manaus.

99
5.1 APROXIMAÇÃO DA ÁREA CENTRAL: DADOS DE PROJETO

100
101
EDIFICAÇÕES DE INTERESSE HISTÓRICO
A imagem da página anterior delimita a área de estudo, uma porção da região central
da cidade de Manaus, que nos proporcionará os dados de projeto. Como já foi visto,
é a área de ocupação mais antiga da cidade, e portanto um local que guarda ainda
significados/identidades que perduraram no transcorrer do tempo (ver seção ‘marcos
urbanos’). É o caso dos Edifícios de Interesse Histórico (mapa 10).
O centro de Manaus é pontilhado de edifícios históricos, alguns particulares, como
restaurantes, lojas, ou escritórios, e outros públicos, de acesso livre como o Teatro
Amazonas, a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, o Mercado Público Adolpho
Lisboa, e a Pinacoteca do Estado do Amazonas, antigo quartel da Polícia Militar do
Amazonas. Há ainda edifícios públicos mas de acesso controlado como o Palácio da
Justiça (em frente ao Teatro Amazonas), o Hospital Santa Casa de Misericórdia e o Grupo
Escolar D. Bosco, que apesar de não serem acessíveis a todos possuem um interesse
paisagístico inegável. Esses edifícios estão espalhados pelo centro de Manaus e muitos
deles encontram-se abandonados, em ruinas, escorados para não desabarem, apesar
do tombamento por órgãos de preservação. Além disso, não formam um circuito ou
percurso para o pedestre que poderia facilmente percorrer à pé esses pontos da cidade.
(1)

(3)

(2)

Legenda Edifícios Públicos de Acesso Livre:
1. Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição
2. Alfândega
3. Mercado Público Adolpho Lisboa
4. Igreja Nossa Senhora dos Remédios
5. Centro de Artes Chaminé
6. Palácio Rio Negro
7. Museu do Homem do Norte
8. Pinacoteca do Estado do Amazonas
9. Biblioteca Pública de Manaus
10. Teatro Amazonas
11. Igreja de São Sebastião
12. Biblioteca Municipal João Bosco Pantoja
13. Palacete Eduardo Ribeiro
14. Paço Municipal
15. Palácio Rio Branco
16. IPHAN

(4)

Imagens que mostram duas situações distintas:
abandono e cuidado. Fotos 1 e 3: construções
históricas abandnadas próximo ao Porto. Fotos
2 e 4: Palácio da Justiça e Alfandêga. Acervo
pessoal. 2012.

102
Mapa 10: Edifícios de Interesse
Histórico. Elaborado pela autora.
Edifícios Públicos de acesso livre
Edifícios Públicos de acesso
controlado

12

Edifícios Particulares

11
10
13

9

14
15

7

1

16

6
8

2
4

3

103

5
ÁREAS VERDES
Apesar de estar inserida em uma imensidão verde, a cidade de Manaus não possui
uma significativa arborização urbana. Ao contrário de outras cidades brasileiras, como
Maringá e Goiânia, Manaus não encontra em seus parques e praças um elemento que
compõe a identidade manauara. Se é possivel associar qualidade de vida ao padrão de
qualidade do ambiente urbano, e sendo as praças, parques e caminhos arborizados,
ou seja, a própia arborização urbana a imagem que representa de imediato os espaços
públicos, observamos, entristecidos, a péssima qualidade de vida que o habitante
manauara possui.
Na região central da cidade, aqui analisada, as praças existentes são remanescentes
de um tempo passado e por isso estão sempre relacionadas à algum edifício histórico.
Exemplos importantes dessa relação são a Praça da Matriz, a Praça dos Remédios,
a Praça do Congresso em frente ao Instituto de Educação do Amazonas, a praça
Heliodoro Balbi em frente à Pinacoteca do Estado e a Praça D. Pedro II em frente ao
Paço Municipal.

Legenda Áreas Verdes:
1. Praça da Matriz.
2. Praça Tenreiro Aranha
3. Praça Hiliodoro Balbi
4. Praça dos Remédios
5. Parque S. Jefferson Peres
6. Praça São Sebastião
7. Praça do Congresso
8. Praça da Saudade
9. Praça D. Pedro II

Desde a implantação do Prosamim, o centro da cidade conta também com o Parque
Senador Jefferson Peres. O parque foi implantado na primeira fase do programa que
teve início em 2006, e circunda o famoso Palácio Rio Negro.
Apesar de importantes essas áreas verdes não formam um sistema articulado através
de ruas bem cuidadas e sombreadas, e por isso o pedestre não identifica essas
áreas como um conjunto, ou um percurso que possa ser conhecido numa agradável
caminhada.

(1)

(2)

Terreno vazio e abandonado (foto 1) ao lado da
Praça D. Pedro II (foto 2). Acervo pessoal. 2012.

104
Mapa 11: Edifícios Públicos de
Interesse Histórico, Áreas verdes e
locais ociosos. Elaborado pela autora.

8
7

6

9
3
1

5

2

4

105
TECIDO URBANO
Por meio da análise do tecido urbano existente buscamos identificar e classificar os
padrões de parcelamento predominante por quadra, objetivando a caracterização
fundiária e como consequência, a qualificação da morfologia urbana. Para caracterizar
a composição do território, foram determinadas três categorias para classificar a
trama fundiária: 1- lotes pequenos (menores que 500 m²) 2 - lotes grandes (maiores
que 1500 m²) e 3 - misto (onde há a presença das duas categorias anteriores sem que
haja o predomínio relativo de alguma delas).
A primeira categoria, onde as quadras possuem a predominância de lotes pequenos,
caracteriza um parcelamento do tipo tradiocional misto (comercial e residencial),
representando a primeira forma de ocupação do território manauara. Já a segunda
categoria agrupa as quadras onde se identifica a predominância de lotes definidos como
grandes. Essas quadras, indicadas em vermelho, localizam-se justamente na porção
mais próxima do Rio Negro. São quadras que resultaram das transformações ocorridas
durante o século XX, que levaram a cabo reformas urbanas de cunho rodoviarista, como
o projeto da Manaus Moderna que criou a larga Avenida Beira-Rio. Dessas intervenções
resultaram lotes de grandes proporções que representam um cisma entre a antiga
ocupação do centro de Manaus, formada por lotes pequenos, e a frente fluvial do Rio
Negro.
Além disso se compararmos os locais ociosos apontados no mapa anterior veremos que
as áreas desocupadas de maiores dimensões localizam-se justamente nas quadras
apontadas em vermelho onde há predominância de lotes grandes.
A análise destes dados possibilita o reconhecimento da composição do tecido urbano
existente, relacionando-a com as dinâmicas de produção do ambiente urbano, de modo
a evidenciar conexões mais próximas entre a estrutura fundiária da região central da
cidade de Manaus e as reformas urbanas postas em práticas durante todo o século XX.
Este mapeamento permite também compreender quais são os impactos diretos no
território causados pelas transformações impostas por novas matrizes fundiárias
no tecido consolidado, alterando ou até mesmo eliminando relações urbanas antes
comuns como ver/sentir o Rio.

Imagem aérea aproximada das quadras
apontadas
com
predominância
de lotes grandes. É possível ver a
utilização de terrenos vazios como
grandes estacionamentos a céu
aberto. Google Earth.

106
Mapa 12: Padrão de Parcelamento
predominante por quadra. Elaborado
pela autora.
Lotes grandes
Misto
Lotes pequenos

107
Mapa 13: Identificação do sistema
viário existente. Elaboração da autora.

Avenida Sete de Setembro

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Avenida Sete de Setembro

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Rua Visconde de Porto Alegre

Avenida Getúlio Vargas

Avenida Eduardo Ribeiro

Avenida Epaminondas

Avenida Ramos Ferreira
SISTEMA VIÁRIO
A idendificação e análise do sistema viário da região central de
Manaus foi fundamental para a tomada de decisões do projeto
urbano proposto neste trabalho final de graduação.
Nesta porção da cidade é possível identificar velhas e apertadas
ruas coexistindo com novas e largas avenidas. É o caso da Rua dos
Barés em contraponto à Avenida Beira-Rio. Antigamente a Rua
dos Barés era a última rua antes do Rio Negro. As construções
que ali estavam, como o Mercado Público Adolpho Lisboa,
tinham como limite uma rampa formada pela própia inclinação
do terreno que era banhado pelo Rio. Hoje, como o mapa ao lado
nos mostra, existe a Avenida Beira-Rio que afastou as águas
do Negro dessas construções, e ainda configura-se como uma
Avenida que não possui nenhuma árvore, nenhum local de estar
para o pedestre, projetada unicamente para o carro.
Outra observação importante é o conjunto formado pelas
Avenidas Epaminondas, Floriano Peixoto e Getúlio Vargas. Como
o mapa 14 mostra esse é o conjunto de avenidas com maior
carregamento de tráfego desta região da cidade, o que explica
a presença do Terminal de Ônibus da Matriz, também apontado
no mapa 14. São Avenidas largas (entre 15 e 20 metros de leito
carroçável) onde o trânsito desordenado de veículos (não existem
faixas exclusivas para ônibus) e a calçada exígua dificultam o
caminhar do pedestre. Além disso a Avenida Floriano Peixoto
e sua continuação, a Av. Getúlio Vargas são o resultado do
tamponamento do Igarapé do Aterro (ver foto página 55).
A Avenida Eduardo Ribeiro foi projetada ainda no período da
borracha sobre o antigo Igarapé do Espírito Santo que passava ao
lado da Igreja Matriz. É uma avenida desenhada com uma clara
intensão paisgística ao ser coroada com a Praça do Congresso
e o edíficio art deco do Instituto de Educação do Amazonas.
Por ser uma avenida de difícil saída para o veículos, possui
um transito mais leve e dessa forma o número de pedestre
é maior. Mesmo assim a avenida ainda possui calçadas pouco
generosas e insuficiente arborização. Nesta avenida as vagas
de estacionamento para carros sâo à 45°, e muitas vezes ficam
vazias, espaço esse que poderia ser usado pelos pedestres.

109
LEGENDA
Vias de pedestres (calçadões)
Vias de trânsito leve - somente veículos particulares
Vias de trânsito moderado. Possuem até 10 linhas de
ônibus.
Vias de trânsito intenso. Até 30 linhas de ônibus.
Vias de trânsito pesado. Não possuem linhas de ônibus
porém o tráfego de caminhões e carretas (veiculos
pesados em geral) é intenso durante todo o dia e noite.
Vias de trânsito muito pesado. Possuem mais de
100 linhas de ônibus, alem da presença de veículos
pesados. Trânsito desorganisado e congestionado
durante todo o dia.
pontos de ônibus
Terminal de Ônibus da Matriz

Saída do Terminal da Matriz. Foto: acervo pessoal 2012.
110
Mapa 14: Carregamento do Sistema
Viário. Elaboração da autora.

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1
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Mapa 15: A cidade de Manaus e o
movimento do Rio Negro. Cheia e
Vazante. Elaborado pela autora.

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8
CHEIAS E VAZANTES
Como não poderia deixar de ser, o movimento das águas do Rio Negro, mostrado no
mapa anterior e nos registros do capítulo 1, é um importante dado de projeto. São seis
meses de cheia e seis meses de vazante, correspondentes ao periodo de chuvas (de
dezembro à maio) e à seca (de junho à novembro). Neste ciclo as águas do Rio Negro
podem variar mais de 15 metros de altura. Até hoje a cota máxima da água registrada
na cidade de Manaus foi de 29,77 metros no ano de 2009 e, a cota mínima registrada
foi de 13,63 metros em 2010. Dessa forma adota-se a cota de 30 metros como a cota
segura para a cidade de Manaus.13
A medida que as águas baixam uma grande porção de terra aflora à superfície e,
portanto, chegar ou sair de barco torna-se muito mais difícil. Na região central de
Manaus, devido à presença dos mercados e feiras a movimentação de barcos é grande.
No periodo da seca a carga e descarga de alimentos e outros produtos é mais custosa
e demorada devido a distância que deve ser percorrida à pé e à altura que precisa ser
vencida através de um zigue-zague de rampas estreitas e muito inclinadas.
Os periodos de cheia e vazante estão intimamente relacionados com a questão da
drenagem urbana. No mapa anterior, além de registrar as cotas máxima e mínima
das águas do Negro estão marcados também os igarapés que sofreram intervenções e
hoje ou estão canalizados, tamponados ou mesmo aterrados e assim deixaram de fazer
parte da paisagem urbana de Manaus. São eles:
	
Igarapés Aterrados no século XIX (ciclo da borracha):
	
1. Ig. Ribeira das Naus
	
2. Ig. do Espírito Santo
	
3. Ig. do Aterro
	
4. Ig. da Bica do Monte Cristo
	
	
Igarapés canalizados século XXI:
	
5. Ig. de Manaus (trecho Parque Prosamim Se. Jefferson Peres)
	
6. Ig. Bittencourt
	
7. Ig. Mestre Chico
	
8. Ig. do Quarenta
	
9. Ig. da Cachoeirinha
	
	
Igarapés tamponados e margens compactadas para construção de habitação 	
	
em solo criado - Prosamim:
	
10. Ig. de Manaus (trecho Parque Residencial Manaus - Prosamim)
	
11. Ig.do Mestre Chico
__________
	
13 Dados do Porto Público de Manaus. www.portodemanaus.com.br

114
Esquema do movimento das águas
- cheia e vazantes. Elaboração da
autora.

+30m
Área de risco

115
5.2 DIRETRIZES
O estudo da região central da cidade e suas dinâmicas urbanas levou à escolha do recorte
de intervenção proposto, a orla fluvial do centro de Manaus (mapa 16), acreditando que
está porção do território manauara possa voltar ao imaginário de sua população como
um local de referência para o lazer, para o habitar, para o estar, para viver.
Trata-se de um conjunto de decisões que interferem no espaço, no traçado viário e
nos fluxos de veículos, na disposição e no caráter de equipamentos públicos e nos
parâmetros de uso e ocupação do solo. O objetivo primeiro é retornar o Rio ao centro
das atividades ali consolidadas, além de criar uma identidade visivelmente una para a
sequência de espaços, momentos e fatos urbanos que vão do Porto Público de Manaus,
na extremidade do Igarapé de São Raimundo, ao Igarapé dos Educandos. Proporcionar
percursos nessa frente fluvial que sejam legíveis, seguros, confortáveis e convidativos.
A reestruturação da orla fluvial de Manaus consistiu no exercício de optar por um modo
de construção do ambiente urbano que tenha no desenho das águas o seu fio condutor.
Busca-se a partir da reincorporação do Rio Negro ao território urbano, sustentar a
água como elemento fundamental do viver manauara, ribeirinho. Ao recuperar a
associação entre cidade - ambiente construído - e água - ambiente natural - abre-se a
possibilidade de criação de lugares de uso múltiplo, capazes de fortalecer a coletividade
ao despertar a multiplicidade de apropriações dos habitantes com sua cidade.
Para isso foi preciso desenhar uma infra-estrutura que proporcionasse novamente o
encontro do homem com as águas do Negro, uma infra-estrutura ‘de chão’ , ‘de piso’,
que possibilite o caminhar até a beira do rio, seja na época de cheia, seja na vazante. Um
subir e descer das águas em consonância com a cidade, e não contra ela, como acontece
nos dias de hoje. Que este movimento das águas seja um espetáculo à céu aberto, que
a dança do ir e vir dos barcos possa ser vista por moradores e visitantes a qualquer
época do ano, que a carga e descarga de produtos possa animar constantemente essa
frente fluvial com cheiros, cores e sabores da região amazônica. A frente fluvial como
espetáculo cotidiano para o pedestre, para o ciclista, para o cidadão não-motorizado.
Todas as medidas adotadas possuem um objetivo comum: substituir a cidade hostil
ao pedestre e marcada pela segregação socioespacial, por uma cidade mais humana
e democrática, onde prevaleçam os espaços de encontro e convivência. Este projeto
urbano deseja que esta nova configuração espacial possua qualidade ambiental aliada
à vitalidade das ruas e dos espaços de uso coletivo, promovendo a urbanidade.
Para que tal objetivo fosse alcançado foi preciso repensar a mobilidade urbana do
centro de Manaus. Acredita-se que a prioridade dada ao veículo motorizado e indivídual
como hoje acontece nessa região deve ser alterada para se conquistar um espaço
116

Pontos Focais da área de projeto:
1. Porto Público de Manaus
2. Terminal de ônibus da Matriz
3. Igreja da Matriz e Praça
4. Av. Eduardo Ribeiro
5. Alfândega
6. Mercado Público Adolpho Lisboa
7. Igreja dos Remédios e Praça
8. Galpões das Feiras
9. Acesso dos barcos
10. Quadras ociosas
11. Rua Pedro Botelho e Rua Dr.
Almínio (conexão com o Parque
Prosamim Jefferson Peres).
12. Av. Floriano Peixoto
Mapa 16: Recorte da área de
intervenção. Elaboração da autora.

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A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro
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A nova orla fluvial de Manaus: reconectando a cidade ao Rio Negro

  • 1. Universidade de São Paulo Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Trabalho Final de Graduação ano letivo de 2012 CAMINHO, ÁGUA E PAISAGEM A nova orla fluvial de Manaus Flávia Garofalo Cavalcanti Luis Antonio Jorge [orientador]
  • 2.
  • 3. AGRADECIMENTOS Ao orientador À Universidade de São Paulo e à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo pelas oportunidades oferecidas nestes seis anos de graduação. Luis Antonio Jorge Aos professores e membros da banca Fábio Mariz Gonçalvez, pelas inúmeras conversas, conselhos, dicas e apoio desde o primeiro ano da FAU. Karina Leitão com quem tive o prazer de compartilhar idéias e risadas neste último e complicado ano. Aos amigos queridos Diogo Bella, Victor Berbel, Isadora Marchi, Gabriela Mamade, Paulo Catto irmãos que me acompanharam desde o estúdio 1. Marcia Trento, Lais Matiusse e Max Heringer que estiveram comigo em Manaus. Ao Pedro Veloso, pelo carinho, pelos abraços nas horas de angústia, e por ter acompanhado de perto este trabalho contribuindo para o seu resultado final. Cristina Grobe, arquiteta, radicada em Manaus com quem tive valiosas conversas. À minha familia DEDICATÓRIA Pai, Cláudio, por me incentivar a ir mais longe e estar do meu lado sempre. Mãe, Beth, pela compreensão em todos os momentos e, pelo esforço dedicado na minha educação. Á todos que acreditam em uma cidade mais humana e democrática.
  • 4. 4
  • 5. Encontro dos Rios Negro e Solimões e a cidade de Manaus. Imagem: Google Earth. 5
  • 6. Rio Negro. Rio-Mar. Foto: Fábio Mariz. 2012. 6
  • 7. SUMÁRIO Apresentação 1. Amazônia 1.1 Situação Geográfica 1.2 O caminho dos rios e os núcleos urbanos 1.3 O movimento das águas: registros 2. Amazonas - Urbanização 2.1 Metropolização 2.2 Região Metropolitana de Manaus - RMM 3. A margem direita do Rio: Iranduba, Careiro da Varzea e Manacapuru 3.1 A vida sobre as águas: registros 4. A margem esquerda do Rio: Manaus 4.1 Da fundação ao apogeu da borracha 4.2 Marcos Urbanos 4.3 Entre tempos 1920 - 60 4.4 Zona Franca de Manaus 4.5 Análises da situação atual 4.5.1 Transporte 4.5.2 Habitação 4.5.3 Espaços Públicos 5. A terceira margem do Rio: Nova orla fluvial de Manaus 5.1 Aproximação da área central 5.2 Diretrizes 5.3 Implantação geral da proposta 5.3.1 Porto 5.3.2 Mercados 5.3.3 Parque Fluvial 5.3.4 Quadras Mistas 5.3.5 Nova Configuração Viária 5.4 Novo zoneamento proposto 6. Referências Bibliográficas 7
  • 8. A imensidão do Rio Negro. Foto: Lais Matiusse. 2012. 8
  • 9. Barco Recreio atracado no muro da avenida Beira-Rio. Foto: arquivo pessoal. 2012. 9
  • 10. Caminho Flutuante sobre o Rio. Iranduba.Foto: Fábio Mariz. 2012. 10
  • 11. APRESENTAÇÃO “...o desenho da cidade é o que expressa de modo efetivo e também simbólico, como nenhum outro, a capacidade do homem para formalizar e imprimir uma outra configuração à natureza enquanto lugar, onde representa a sua presença desejada no universo.” Mendes da Rocha in Delijaicov , p.10, 1998. Este trabalho final de graduação apresenta idéias de projeto para a orla do Rio Negro e o desenho da cidade de Manaus, estado do Amazonas. Estrutura-se a partir das problemáticas urbanas de Manaus, tendo o Rio Negro e seus igarapés como norteador da relação cidade/ambiente construído - água/ ambiente natural. O recorte escolhido foi a área central da cidade, à beira do rio, e seus equipamentos urbanos: porto público, mercado municipal, igreja matriz e igreja dos remédios, preocupando-se também com a presença da habitação como insumo necessário à vivacidade do espaço público. A escolha da cidade de estudo, Manaus, e da escala de intervenção, projeto urbano, foi incentivada por uma vontade pessoal de alargar minhas fronteiras e conhecimentos sobre meu próprio pais, O olhar, que ultrapassou os limites paulistanos, procurou compreender o que é uma cidade de 2 milhões de habitantes à beira do Rio Negro, como se dá a relação dos habitantes com a sua cidade, com o seu Rio, e como a gestão pública do espaço urbano responde às necessidades presentes no território manauara. Entende-se por Projeto Urbano um projeto físicoespacial das estruturas que organizam os espaços urbanos e metropolitanos, projetos que se apresentam como uma intervenção direta e única na cidade. Entende-se também que as infra-estruturas de uma cidade devem ser projetadas para, mais do que 11
  • 12. viabilizar um serviço específico, como a comunicação territorial no caso do sistema viário, colaborar para a criação de lugares adequados à vida urbana e imagens referenciais na paisagem, contribuindo assim para o surgimento de identidades urbanas e, consequentemente, para uma relação afetiva dos habitantes com suas cidades.¹ Em suma, as cidades devem ser projetadas para as pessoas. O trabalho parte de um estudo macro - região amazônica, sua situação geográfica e condicionantes como o ‘movimento das águas’, para aproximarse gradativamente da cidade de Manaus e suas problemáticas urbanas. Neste percurso observou-se a configuração da Região Metropolitana de Manaus, identificando importantes diferenças entre a cidade-sede e as cidades vizinhas como Iranduba, Careiro da Varzea e Manacapuru. Diferenças que nos mostram como Manaus um dia foi em relação ao Rio Negro, contato direto e franco com suas águas, e como essa relação se transformou nos dias atuais. A partir dessa comparação foi possivel compreender melhor o espaço intra-urbano manauara, analisando temas como transporte, habitação e espaços públicos. manauara e de suas atuais políticas públicas. Portanto, o percurso deste trabalho tem a intenção de traçar um panorama sobre Manaus, sua história e evolução, e convergir para um ponto central, local do projeto proposto, a orla fluvial urbana do centro de Manaus. O projeto proposto entra no âmbito da requalificação urbana de zonas centrais. Entende-se por requalificação a atribuição de qualidade à um espaço que a perdeu, nesse caso a área central de Manaus perdeu sua grande qualidade: proximidade com as águas do Rio Negro e igarapés. Pode-se dizer também revitalização urbana, uma vez que o intuito é de retornar à vida a orla fluvial central de Manaus, reviver a relação água-cidade perdida no tempo. Neste estudo ficou clara a existência de dois momentos distintos da cidade de Manaus. O primeiro, em um tempo passado, no qual a cidade e seus habitantes olhavam o rio, tinham suas águas como balizadoras do caminhar, do trabalhar, do habitar. O segundo momento, que se extende até o tempo presente, rompe com essa relação, afasta o rio do ambiente edificado da cidade através de aterros e avenidas, uma infra-estrutura que avançou sobre o espaço das águas e escondeu de nossa vista o Rio Negro. Considerando que este cenário, instituido e consolidado pela urgência do capital, anulou em diversos trechos a natureza de Manaus, seu verde, suas águas e seus hábitos, é que se coloca uma visão crítica e propositiva do espaço urbano da cidade Imagem página ao lado: Igapós. Foto: Marcel Gautherot, 1955. __________ ¹ BRAGA, Milton L. Infra-estrutura e projeto urbano. Tese de doutorado apresentado à FAUUSP. São Paulo. 2006. p. 10-11. 12
  • 14. macizo cordillerano macizo guayanas pendiente 1 o/oooo 1.1 SITUAÇÃO GEOGRÁFICA macizo brasilia Enquanto Belém configura-se como a fachada atlântica de toda a Amazônia Brasileira, Manaus é a verdadeira capital da rede urbana amazônica, que se extende muito além das fronteiras brasileiras. Instalada exatamente entre a Amazônia Ocidental e a Oriental, num ponto do principal eixo de navegação fluvial do Brasil, a cidade macizo cordillerano de Manaus é uma espécie de elo entre a navegação fluvial do interior e as grandes rotas marítimas de longo pendiente 1 o/oooo curso. Possui, por essa razão, uma situação geográfica absolutamente privilegiada em face das extensões amazônicas e do gigantesco quadro da hidrografica local.² 100 200 PORTO VELHO 200 A região geoeconomica da Amazônia localiza-se entre o Maciço das Guianas ao norte, o planalto central ao sul, e a Cordilheira dos Andes à oeste (ver mapa 1). Configurase como a principal bacia hidrográfica da América do Sul, 100 e a maior do mundo. Apesar dos recursos abundantes é a região de menor densidade demográfica, contando em média com 4,12 hab/km² (dados do IBGE para a região 200 Norte do pais de acordo com o censo de 2012). 100 Dessa forma a região se apresenta como um vasto PORTO VELHO território com uma rede urbana dispersa conectada principalmente pela modal hidroviário no qual o regime 200 dos cursos d’água condicionam a mobilidade de pessoas e cargas. Nesse sentido observamos que o fluxo de passageiros da Região Norte do Brasil caracteriza-se como deslocamentos longos e heterogênios ao longo 100 do ano, ao contrário da Região Sudeste, onde uma rede urbana bem estruturada e escalonada garante deslocamentos curtos e homegênios. Em média, os deslocamentos no Norte envolvem 102 Km, enquanto no Sudeste, os mesmos deslocamentos equivalem à 38 Km. Assim, ao contrário de São Paulo, é possivel observar que no Amazonas, Manaus destaca-se pela centralidade que PORTO VELHO MANAUS exerce no estado e pelo espraiamento da área capiteneia.³ __________ ² AB’SABER, Aziz Nacib. A cidade de Manaus: primeiros estudos. Editora Beca-Ball. São Paulo. 2010. p. 111-112. ³ IBGE. Região de influência das cidades. Rio de Janeiro. 2008. p. 163. MANAUS 200 100 100 200 SANTARÉM 3 situações geográficas na Amazônia. Rondônia, Amazonas e Pará. Base: Google Earth. Elaboração da autora. 14
  • 15. ORINOCO 6,5% AMAZONAS DA PRATA 2,5% 36% POPULAÇÃO SUL-AMERICANA ORINOCO 5,5% DA PRATA 18% AMAZONAS 35% SUPERFÍCIE OCUPADA Mapa 1: América do Sul com destaque para a Amazônia legal e sua bacia hidrográfica. Elaboração da autora. Dados: Wikipedia. Elaboração da autora. 15
  • 16. 1.2 O CAMINHO DOS RIOS E OS NÚCLEOS URBANOS A extensão da bacia hidrográfica amazônica favoreceu a penetração de colonizadores europeus na região. Foram os rios, em especial o Amazonas, que mostraram os caminhos e os sitios de melhor situação geográfica. As datas de fundação das principais cidades nos revelam o percurso dos portugueses que romperam fortemente a linha de Tordesilhas norte-sul avançando na direção oeste (ver mapa 2). Ainda hoje o modal hidroviário configura-se como o mais importante na região, principalmente no transporte de cargas. O sistema hidroviário atua como a espinha dorsal da amazônia enquanto o sistema rodoviário atua na comunicação periférica da região e desta com as demais regiões sul-americanas (ver mapa 3). Explica-se assim o fato de que a maioria desses núcleos urbanos, por mais de dois séculos, não dependeu de nenhuma rota terrestre, mas tão somente dos rios de planície e de uma história econômica ligada intimamente à navegação. modal hidroviário Mapa 3: sistemas de circulação na região norte da América do Sul. Ao lado comparação esquemática do modal hidroviário espinha dorsal, e modal rodoviário - periférico. Elaborado pela autora. modal rodoviário Embora Manaus tenha seu núcleo urbano a 20 km da confluência entre o Rio Negro e o Solimões, comportase perfeitamente como uma cidade fluvial de confluência. Além disso, apesar de estar a pouco mais de 1600 km de Belém, é um porto fluvial continental perfeitamente entrosado com as rotas de cabotagem e transatlânticas. Por essas caracteristicas a cidade de Manaus não se configura como um ponto terminal da navegação amazônica, nunca foi o “fim” de nenhuma viagem, pelo contrário, é uma etapa central e obrigatória, comandando as ligações entre a circulação atlântica em face das mais distantes linhas fluviais do interior da América do Sul. DISTÂNCIAS Km Manaus - Belém 1606 Manaus - Santarém 739 Manaus - Porto Velho 1239 Manaus - Macapá 1289 Manaus - Boa Vista 756 Manaus - Rio Branco 1445 16
  • 17. Mapa 2: Principais cidades Amazônicas. Elaboração da autora. Boa Vista S. Gabriel da Cachoeira Macapá Óbidos BELÉM MANAUS 1669 Tabatinga Tefé IQUITOS 1757 Porto Velho Rio Branco 17 Parintins SANTARÉM 1661 1616
  • 18. 1.3 O MOVIMENTO DAS ÁGUAS: REGISTROS Manacapuru. Cachoeira do Castanho. Vazante.Foto: acervo pessoal. 2010. 18
  • 19. Praia de Açutuba na vazante.Proximidades de Manaus.Foto: Isadora Marchi. 2010. 19
  • 20. Manaus. Igarapé dos Educandos na vazante. Foto: acervo pessoal. 2010. 20
  • 21. Manaus. Rio Negro no periodo de vazante. Foto: Isadora Marchi. 2010. 21
  • 22. Careiro da Varzea. Vazante. Foto: acervo pessoal. 2010. 22
  • 23. Praia de Açutuba. Vazante. Foto: Isadora Marchi. 2010. 23
  • 25. Manaus.Praia de Ponta Negra. Vazante. Foto: Acervo Pessoal. 2010. 25
  • 26. Manaus. Igarapé de São Raimundo no periodo de cheia. Foto: acervo pessoal. 2012. Página ao lado recortes de jornais eletrônicos de diversos sites de notícias. 26
  • 27. 27
  • 28. Imagem página ao lado: Igarapé de Manaus. Foto: Fabio Mariz. 28
  • 29. 2. AMAZONAS - URBANIZAÇÃO 29
  • 30. 2.1 METROPOLIZAÇÃO A intensa urbanização que vem ocorrendo no Brasil, especialmente a partir de 1950, tem sido acompanhada por um processo de metropolização, processo este que consiste na integração de território a partir de uma cidade-núcleo, configurando um espaço urbano ampliado, em que se compartilha um conjunto de funções de interesse comum. O processo de urbanização brasileiro começou na primeira metade do século XX e intensificou-se a partir de 1950, quando a indústria tornou-se o setor mais importante da economia nacional, momento que representa a passagem de uma economia agrário-exportadora para uma economia urbano-industrial. Mas foi somente na passagem da década de 1960 para 1970 que a população urbana superou a rural. Desde então essa tendência se acentuou e a população urbana superou a marca dos 80% nos anos 2000.4 A transformação de país agrário e rural para um país urbano industrial trouxe mudanças no cenário político, econômico e social. A cidade passa a ter predomínio sobre o campo, sendo que os principais interesses econômicos e a maior força de trabalho do país estão localizados no meio urbano. Era o nascimento do Brasil moderno, gerando um desenvolvimento econômico e social com fortes desequilíbrios regionais. A primeira fase de nosso processo de metropolização foi caracterizada por um modelo de crescimento urbano extensivo, gerando um desenho do território semelhante a uma mancha de óleo com um centro e uma periferia de forma tentacular em contínua expansão. Em geral, essa expansão seguiu os eixos viários, onde existia uma pequena oferta de infra-estruturas básicas e serviços urbanos. Assim, o modelo de organização do espaço baseava-se na existência de um centro e uma periferia, __________ 4 Observatório das Metrópoles definindo uma forma específica de apropriação social, econômica e política do território. O centro concentrava as principais atividades econômicas, públicas ou privadas, as infra-estruturas urbanas e as áreas habitacionais de mais alto nível de renda. A periferia, formada por meio de invasões, loteamentos populares, conjuntos habitacionais, servia para abrigar a massa da população migrante, de baixa renda. Surge uma rede de hierarquização entre as cidades, ou seja, um sistema de relações econômicas e sociais em que umas se subordinam a outras. As cidades não estão mais isoladas e estabelecem relações entre si de forma hierárquica, considerando a importância e a influência econômica, cultural e social, que cada uma exerce sobre as demais. Essa hierarquização alimenta ainda mais o processo migratório, num ciclo de alimentação contínuo. Estima-se que entre 1960 e 1980 mais de 43 milhões de brasileiros migraram das zonas rurais para os aglomerados urbanos. O período seguinte foi caracterizado pela verticalização de áreas residenciais bem localizadas relativamente às infra-estruturas e aos serviços. Os bairros tradicionais de baixa densidade e alta qualidade ambiental foram as principais vítimas da intensa verticalização. Este período, alimentado pelo crescimento do interesse imobiliário, significou um permanente e diferenciado processo de valorização/desvalorização da terra urbana com a geração de novas centralidades. Esse mais recente modelo de metropolização atingiu fortemente os centros históricos, abandonados por quase todas as atividades de prestígio do setor comercial e de serviços e deixando de ser áreas residenciais da classe alta. Na periferia pobre criou-se um ambiente urbano precário, denso, quase sem serviços e equipamentos coletivos e com insuficiente infra-estrutura, gerando enormes problemas ambientais. 30
  • 31. A forma de ocupação espacial do território metropolitano criou uma distribuição física profundamente desigual em termos de moradia, renda, oferta de serviços e de infraestrutura urbana. O Brasil tornou-se território urbanizado de modo fragmentado, com grandes problemas de adequação ambiental e pouco articulado no seu espaço intra-urbano. Com a configuração deste cenário são criadas ferramentas de administração pública na tentativa de se administrar esses espaços cada vez mais complexos. Durante a ditadura militar institucionalizou-se a criação de Regiões Metropolitanas com o intuito de viabilizar a integração, planejamento e o desenvolvimento conjunto de áreas que apresentam tais complexidades. Neste momento, cabia somente à União a regulamentação de regiões metropolitanas. Assim, na década de 1970, 9 capitais, juntamente com a cidades por elas polarizadas, tiveram suas regiões metropolitanas instituídas. Num segundo momento, de abertura estatal, a partir da constituição de 1988, os estados passaram a ter autonomia na institucionalização de RM. Ocorre um significativo decréscimo do poder federal como indutor e coordenador do ordenamento territorial brasileiro.5 O fortalecimento dos estados e municípios como gestor dos espaços trouxe consigo uma certa imprecisão quando da criação de novas RM. Neste segundo momento são criadas 26 regiões metropolitanas no país, cada uma com características próprias, desde portes diferentes e distintos graus de importância econômica nos contextos estadual e nacional, como arranjos urbanos distintos, com ou sem a ocorrência de conurbação. __________ 5 EHNERT, Alexandre Ricardo Von. A Região Metropolitana de Manaus e as Migrações Pendulares. Dissertação de Mestrado apresentada à FFLCH USP. São Paulo. 2011.p. 34 - 39. 31 Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os principios desta Constituição. § 3°. Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir Regiões Metropolitanas, aglomerações urbanas e microregiões, constituidas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. Art. 25 da Constituição Federal de 1988.
  • 32. 2.2 REGIÃO METROPOLITANA DE MANAUS - RMM Dentro da rede de cidades brasileiras, Manaus comparece como o 12° maior centro urbano, sendo considerada uma metrópole regional apesar de não constituir uma aglomeração urbana conurbada, como as demais 11 metrópoles. São barcos recreios, voadeiras, rabetas, canoas, batelões e até mesmo cruzeiros que movimentam as águas amazônicas. Da área portuária de Manaus partem embarcações para vários destinos, dentro e fora do estado, dentro e fora do país. Segundo o IBGE (2008), Manaus controla uma das redes de maior área, 19% da área do país, e de menor densidade, 2,2 hab/km², correspondendo a 1,9% da população do Brasil e 1,7% do PIB Nacional. A cidade de Manaus concentra a maior parte da população e do PIB de sua região metropolitana, 47,3% e 75,5%, respectivamente. Tal concentração tem como efeito grande disparidade no PIB per capita, que é de R$ 10,4 mil para o total da região, correspondendo R$ 16,5 mil a cidade de Manaus, e R$ 4,8 mil aos demais municípios. A rede de influência da RRM abrange apenas os Estados do Amazonas e de Roraima, sendo composta pela Capital regional Boa Vista, e pelos Centros sub-regionais de Parintins e Tefé. Na RMM é possível observar que um grande número de pessoas migra em direção à sede, Manaus, para trabalho e estudo, partindo de todos os municípios, porém devido às distâncias internas há uma variação tanto quantitativa quanto qualitativa nos fluxos apresentados. A principio é possível distinguir três grupos de municípios considerando a relação metropolitana com Manaus devido à distância em relação à sede – 1. Municípios com baixa integração metropolitana, localizados a mais de 150 km de distancia de Manaus, 2. Municípios com média integração metropolitana, localizados a menos de 110 km de distância; 3. Municípios com alta integração metropolitana, com áreas urbanas separadas da sede apenas por cursos de rio (ver mapa 5). Nos municípios dos dois primeiros grupos o fluxo populacional em direção à Manaus apresenta-se com pulso semanal. Já nos municípios do terceiro grupo a predominância do fluxo é diário, caracterizando um movimento pendular. Há, portanto, integração populacional entre todos os municípios da RMM e a sede, Manaus. Sendo o principal motivador a busca por trabalho e a formação acadêmica, esta última inexistente ou insuficiente no restante dos municípios. Assim temos a Região Metropolitana de Manaus como a maior região metropolitana brasileira, com grandes diferenças internas nos ritmos e graus de desenvolvimento municipal. Seu tecido urbano não se apresenta de forma contínua, conurbado, mas sim esparso por uma grande área florestal, onde juntos os municípios possuem uma área superior a 100 mil km². A cidade de Manaus é o ponto centralizador deste cenário. Os demais municípios, possuem ritmos de vida menos intensos aonde é possível ver atividades e ocupações que um dia também fizeram parte da capital, mas que foram paulatinamente anulados pela urgência do capital. Como já foi dito, a RRM se conecta ao restante do Brasil e da América latina principalmente, através de hidrovias e aeroportos. A via fluvial ainda é o modelo predominante de integração dentro da região amazônica. Os barcos que chegam em Manaus apresentam portes e funções variadas. Pelos rios da região é realizada a maior parte do transporte de cargas e passageiros. Desde 2011 a RMM conta com a Ponte Rio Negro na ligação Manaus – Iranduba. São 3595 metros sobre o Rio Negro que possibilitam a conexão rodoviária dos dois municípios o que dá nova vantagem locacional à Iranduba, município que espera receber nova infraestrutura, investimentos e população, aonde já é possível sentir a presença de empreendimentos imobiliários de alto padrão e o interesse de diversas instituições, entre elas a UEA - Universidade Estadual do Amazonas que fará um novo campus no município. 32
  • 33. Mapa 4: Porção ocupada pela Região metropolitana de Manaus no Estado do Amazonas. Elaboração da autora. N sem escala 33
  • 34. Cartazes de Empresas de Navegação colocados no muro da Av. Beira-Rio. A grande “rodoviária fluvial”. Manaus. Foto: acervo pessoal. 2012. 34
  • 35. NOVO AIRÃO PRESIDENTE FIGUEIREDO NOVO AIRÃO RIO PRETO DA EVA MANAUS MANACAPURU IRANDUBA ITACOATIARA CAREIRO DA VARZEA N sem escala Mapa 5: Região Metropolitana de Manaus. Elaboração da autora. Baixa integração: municípios com a sede à mais de 150 km de Manaus Média integração: Municípios com a sede à menos de 110 km de Manaus Alta integração: Municípios separados de Manaus apenas por cursos d’água. 35
  • 36. Imagem página ao lado: Iranduba. Foto: acervo pessoal, 2012. 36
  • 37. 3. A MARGEM DIREITA DO RIO:Iranduba, Careiro da Varzea e Manacapuru 37
  • 38. 3.1 A VIDA SOBRE AS ÁGUAS: REGISTROS A intenção destas páginas é registrar o modo de vida ribeirinho, a vida sobre as águas. Na margem direita do Rio Negro, lado oposto à Manaus, encontramos cidades onde é possivel vivenciar uma intensa relação dos habitantes com as águas do Rio. São formas de vida que um dia também fizeram parte de Manaus, mas hoje estão cada vez mais escondidas na capital amazonense. Especialmente nas regiões interioranas, os barrancos, ribeiras, embocaduras, calhas, várzeas, paranás e lagos dão forma a um multiforme rendilhado liquido que além de nortear o rumo das vidas, marca os locais de origem atuando como uma referência que identifica e localiza os sujeitos. Na Amazônia, excetuando (talvez) as metrópoles Belém e Manaus, é o rio, o paraná, a boca, o lago, que contém as cidades, municípios, vilas e distritos, e não o contrário. Mais do que sobrepujá-las por suas dimensões, estes cursos fluviais se sobrepõem como marca cultural, mediadora de vivências cotidianas, fonte de trabalho, moradias, lazer, memórias, portos de chegadas e partidas. É neste espaço mediano, o terreno de várzeas, que tradicionalmente habita e trabalha o caboclo ribeirinho, coexistindo entre as terras firmes aos fundos de sua janela e o rio que corre a frente de sua porta. O ribeirinho amazônico sabe que sazonalmente (em média de seis em seis meses) suas várzeas serão inundadas pelas águas, daí a importância das palafitas, da praticidade do tapiri, à base de palha e madeira leve, facilitando o deslocamento para a terras mais secas e das suas construções flutuantes: jiraus, marombas e casas aonde podem temporária ou definitivamente morar e mercadejar. Nas paginas seguintes são expostos retratos desse vivenciar ribeirinho nos municípios de Iranduba, Careiro da Varzea e Manacapuru, vizinhos à capital e cidade-sede, Manaus. 38
  • 39. Casas Flutuantes. Iranduba. Foto: Marcia Trento. 2012. 39
  • 40. Crianças na beira de um flutuante. Iranduba. Foto: Lais Matiusse. 2012 40
  • 41. Habitar. Transportar. Brincar. Iranduba. Foto: Lais Matiusse. 2012 41
  • 42. 42
  • 43. Olhar o Rio. Pés na água. Na margem do Rio Negro. Imediações de Manaus.Foto: Marcel Gautherot. 1944. Págia ao lado, Iranduba. Foto: Fábio Mariz. 2012. 43
  • 44. Atrancando a canoa no flutuante. Iranduba. Foto: Fábio Mariz. 2012 44
  • 45. Vendendo o peixe na beira do rio. Iranduba. Foto: Fábio Mariz. 2012. 45
  • 46. Nadando. Iranduba. Foto: Lais Matiusse. 2012. 46
  • 47. A conversa na beira d’agua. Manacapuru. Foto: acervo pessoal. 2010. 47
  • 48. “Tira uma foto nossa?” Meninas brincando em um flutuante. Iranduba. Foto: acervo pessoal. 2012. 48
  • 49. A brincadeira, o jogo, o lazer em contato com o Rio. Iranduba. Foto: acervo pessoal. 2012. 49
  • 50. Imagem página ao lado:Vista aérea do centro de Manaus. Foto: Fabio Mariz, 2012. 50
  • 51. 4. A MARGEM ESQUERDA DO RIO: Manaus 51
  • 52. 4.1 DA FUNDAÇÃO AO APOGEU DA BORRACHA Manaus surge no mapa meio século após a fundação de Belém, quando os portugueses passaram a explorar os sertões amazônicos do Rio Negro. Aos expedicionários portugueses seguiam os missionários na realização da catequese, tentando agrupar índios de diversas nações amazônicas. Na década de 1660 excursões espanholas e holandesas se intensificaram na região, o que levou a construção da Fortaleza da Barra de São José do Rio Negro em 1669 a fim de servir de base para a defesa portuguesa do Rio Negro. Assim, com alguns grupos indígenas e alguns brancos se iniciou o povoamento do lugar, que recebeu diferentes denominações referenciando sempre à fortaleza ou à barra do rio, sendo comuns os termos Fortaleza do Rio Negro, Fortaleza da Barra, Lugar da Barra ou Barra do Rio Negro. São José do Rio Negro permaneceu por muitos anos como um pequeno lugarejo de beira-rio, onde vegetava uma população de índios aldeados e de uns poucos soldados sem nenhuma função militar importante. A futura cidade de Manaus era ainda uma simples etapa de longos roteiros fluviais. Os números mais antigos do vilarejo remontam ao ano de 1774 quando o Lugar da Barra contava com 220 6 habitantes. Mais de um século depois de sua fundação o crescimento do Lugar da Barra era lentíssimo. Nessa data a fortaleza já não passava de uma sombra dos tempos iniciais da dominação portuguesa na Amazônia. A tensão entre diferentes expedições nos rios amazônicos já não existia mais e as modestas bases intermediárias dos portugueses perderam a sua função. Neste período o Forte da Barra foi desarmado e nada restou da sua presença na paisagem urbana de Manaus. Ao se iniciar o século XIX, a região do Amazonas estava mergulhada no marasmo e na decadência. Alguns poucos edifícios públicos marcavam a paisagem, mesmo assim __________ 6 AB’SABER, Aziz Nacib. A cidade de Manaus: primeiros estudos. Editora Beca-Ball. São Paulo. 2010. p. 114. Todos os dados populacionais desta página seguem a mesma referência. eram construções modestas cobertas de palha e sustentadas por paredes de pau-a-pique. As ruas não eram calçadas e tinham nos igarapés seus limites naturais. Em 1832 o Lugar da Barra é elevado à condição de vila, assumindo a denominação de Vila de Manaós. A esta altura a vila contava com aproximadamente 3 000 habitantes, haviam duas igrejas, a Matriz de Nossa Senhora da Conceição com uma praça em frente e o forte ao lado, e a igreja Nossa Senhora dos Remédios, menor e muito simples. No ano de 1852 o Amazonas foi elevado à categoria de Província e a cidade de Manaus passou a ser a capital. Em 1859 através das palavras de um viajante inglês percebemos que a cidade pouco avançou em sua estruturação, sofrendo de uma escassez crônica de todos os gêneros de primeira necessidade. Nas redondezas de Manaus não se produzia farinha em quantidade suficiente, e a maioria dos produtos era importada. Tudo o que se necessitava era adquirido por altos preços. De acordo com o censo de 1858, a população da cidade era estimada em 4500 habitantes. Sobre este período são importantes as observações do casal Agassiz que participava de uma expedição cientifica. Quando o casal visitou a cidadezinha em 1865 possuía ela todos os defeitos urbanos e sociais de um povoado amazônico, minúsculo e segregado, nascido de um aldeamento de índios e à sombra de uma simples fortaleza de soldados. Sobre Manaus Elizabeth Agassiz reconhecia que a construção da igreja da Matriz estava muito bem localizada no alto de uma colina da onde se via a imensidão do Rio Negro, e seria digna de nota se algum dia concluíssem sua construção. Elizabeth ressalta ainda que a situação da cidade, na junção dos rios Negro e Amazonas, fora uma das mais felizes escolhas, pois apesar do comercio insipiente naquela época seria sem dúvida um grande centro de comércio e navegação. 52
  • 53. Planta da cidade de Manaus de 1852. Fonte: Biblioteca nacional. 53
  • 54. Em 1889 com a proclamação da República no Brasil, encerrava-se o sistema monárquico no pais, iniciando uma nova fase na política brasileira, e no Estado do Amazonas desponta um período de prosperidade econômica. Nesta data Manaus atingiu 10 000 habitantes (note-se que Belém já possuía 50 000 habitantes, São 7 Paulo 65 000 e Rio de Janeiro - Distrito Federal - 500 000). Mais do que as transformações políticas e sociais do fim do século XIX no Brasil, foi a transformação econômica ligada ao advento do ciclo da borracha que veio beneficiar Manaus, tanto no seu desenvolvimento demográfico como urbanístico. Do inicio da República, 1889, ao fim do ciclo da borracha, 1920, a população de Manaus saltou de 10 000 habitantes para 75 000.8 Nesta data o aspecto visual da capital do Estado do Amazonas estava completamente transformado. Manaus tornara-se uma cidade moderna, com aparência europeia, servida por melhoramentos e serviços típicos das prósperas e modernas sociedades, experimentavam-se as delícias do consumo num delírio característico da belle époque e ostentava-se uma aparente situação de riqueza e progresso. Esta época de prosperidade foi justificadamente denominada de período áureo da borracha, atribuindose ao ciclo econômico as causas das transformações efetuadas na região. Guardadas as devidas proporções, aconteceu com Manaus um pouco daquilo que se passou com São Paulo, mais ou menos durante a mesma época. São Paulo, à sombra do desenvolvimento econômico do café, cresceu desmesuradamente, controlando a um só tempo a expansão ferroviária, a imigração estrangeira e uma indústria crescente. Manaus, cresceu sob o impulso de uma economia de coleta extensiva, dependendo de correntes de imigração interna (principalmente nordestinos) e de um mecanismo de circulação lento ligado exclusivamente aos rios. A exportação do café paulista e da borracha amazônica reduziam o déficit do país na relação cambial, e os recursos provenientes da comercialização desses produtos contribuíam para a reforma e embelezamento das capitais desses estados assim como as grandes obras realizadas na capital federal. Foi exatamente entre 1890 e 1920 que o organismo urbano de pequeno lugarejo do século XIX veio a ganhar ares de metrópole, chamada neste momento de Paris dos Trópicos. Junto com São Paulo e Rio de Janeiro era considerada uma das cidades mais belas e movimentadas do Brasil. No entanto, a atualização de Manaus aos padrões urbanos vigentes implicou na adoção de modelos que se sobrepujaram às suas características naturais. Foi preciso repensar e redefinir o espaço urbano, modificando o antigo traçado de ruas, alargando avenidas e urbanizando-se praças. Com esse intuito ignorou-se a topografia do lugar, igarapés foram aterrados e colinas niveladas. Se por um lado melhoravam as condições de comunicação, higiene e transporte, por outro, interferiase na geografia, modificavam-se cursos d’água e impunham-se novos costumes e vestimentas. Manaus alardeava com orgulho todas as civilidades de qualquer cidade europeia. Politicamente a cidade estava ligada ao Rio de Janeiro, capital federal, comercialmente dependia de Londres principal importador da borracha, e culturalmente tentava se aproximar de Paris. __________ 7 Histórico demográfico do município de São Paulo - prefeitura.sp.gov. br. IBGE - População das Capitaes dos Estados do Brazil - da série Estatísticas Históricas do Brasil - ibge.gov.br. 8 Mesquita, Otoni. Manaus: História e Arquitetura 1852 - 1910. Editora Valer. Manaus. 1999. 54
  • 55. Imagem 1: Igarapé do Espírito Santo, aterrado para dar passo à Avenida Eduardo Ribeiro. Foto: Coleção Jorge Herrán. Sem data. Imagem 2: Casas à beira do Igarapé do Aterro, que deu lugar à Avenida Floriando Peixoto. Foto: Coleção Jorge Herrán. Sem data. “ Terras altas e baixas; casas nos oiteiros e à beira da água. Ora rua, ora igarapé, ali uma estrada, aqui uma comprida ponte de madeira; junto à margem um vapor; perto dele uma canoa do Amazonas; numa porta boceja uma cara branca; perto daí, banha-se um menino fusco; e assim tudo gira, pára, anda e nada confusamente em Manaus.” Robert Ave-Lallemant, 1859, no texto de José Aldemir de Oliveira: Espaçotempo de Manaus, 2008. 55
  • 56. Planta da Cidade de Manaus. 1913. Já podemos ver as intalações do Porto ( 2 plataformas flutuantes) e as novas Avenidas Eduardo Ribeiro e Floriano Peixoto no lugar dos antigos igarapés. Fonte: Biblioteca Nacional. 56
  • 57. Mercado Público Adolpho Lisboa. Fachada para a Rua dos Barés. Fonte: Postais de Alain Croix - Coleção Jorge Herrán. 57
  • 58. 4.2 MARCOS URBANOS Enquanto a cidade se expandia com a abertura de novas vias principalmente no eixo norte, marcos se cristalizavam na paisagem urbana de Manaus. A igreja da Matriz junto com a Igreja dos Remédios são duas construções da época provincial mas que ganharam novo fôlego e destaque nos anos da borracha. Junto a elas temos o Mercado de Ferro Adolpho Lisboa finalizado na primeira década do século XX e o Porto Manaus Harbour cujas obras iniciaram em 1899. Além desse conjunto, que estabelece franca relação com o Rio Negro, temos, como arremate final do ciclo da borracha, a construção do Teatro Amazonas, símbolo de dominação e riqueza. A primeira Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição de origem jesuítica datada de 1695 passou por diversas transformações até chegar aos dias de hoje. No ano de 1858 foi completamente reconstruída devido à um incêndio que ocorrera anos antes. Durante todo o período provincial sua construção e manutenção são marcadas por diversas dificuldades devido, principalmente, à falta de mão-de-obra e materiais. Foi a primeira obra arquitetônica de Manaus e a mais importante do período provincial. Durante as obras de embelezamento da cidade no ciclo da borracha a Igreja ganhou nova atenção com a implantação de seu jardim aos moldes do paisagismo inglês, inclusive com a instalação de um chafariz de ferro trazido do Reino Unido. Porém, nesta mesma época a praça e a igreja são destituídas de dois elementos importantes do seu entorno. O primeiro foi em 1893 com a aterramento completo do igarapé do Espirito Santo que margeava uma das laterais da praça para a posterior implantação da Avenida Eduardo Ribeiro. Num segundo momento a ponta da praça que outrora alcançava o rio é barrada pela construção dos edifícios do Porto. Assim, das escadarias da Matriz aonde se podia ver o Rio Negro e observar os viajantes que chegavam e partiam, com a construção do Porto, a paisagem é barrada, o Rio Negro é afastado e tudo que enxergamos é um desarranjado conjunto de edifícios, muros e grades. A Igreja Nossa Senhora dos Remédios é, junto com a Igreja da Matriz, um dos templos religiosos mais antigos de Manaus. Sofreu varias reformas no século XIX e no inicio do século XX, com a contratação de um arquiteto italiano, transformou-se totalmente, mantendo, contudo, sua relação de proximidade com as águas do Rio Negro. O primeiro registro que se têm da capela de Nossa Senhora dos Remédios é de 1818. Quando a Igreja Matriz inicia seu processo de reconstrução devido ao incêndio a Capela dos Remédios passa a substituí-la nos cultos religiosos. Os moradores da província, porém, reclamam da distância em que estava localizada a capela e no acesso que durante a época de cheias do Rio Negro só era possível através de canoas. Fatos que evidenciam o crescimento da cidade e sua relação intrínseca com o Rio Negro. Após a execução do projeto do arquiteto italiano Filintho Santhoro na primeira década do século XX, a igreja passou a apresentar um aspecto mais elaborado, revelando maior preocupação formal e imponência. Desde os primeiros anos da província, a construção de um mercado para a capital parecia despertar a atenção dos administradores públicos. Somente depois de duas tentativas frustradas é que se construiu o Mercado de Ferro Adolpho Lisboa. Os primeiros registros da necessidade de uma casa de mercado datam de 1853. Porém, o Mercado Adolpho Lisboa assim como o conhecemos hoje só teve sua construção iniciada em 1882. Nas falas do presidente da 58
  • 59. província à época o local “tinha o grande inconveniente de apresentar um declive bastante sensível para a margem do Rio Negro”, por isso já nessa data foram feitas obras para nivelar o terreno em uma cota mais alta. O edifício foi inaugurado em julho de 1883, mas a construção da fachada da Rua dos Barés, lado oposto ao Rio Negro, foi contratada somente em 1902 e concluída em 1906. O mercado apresenta duas fachadas totalmente distintas, uma voltada para o Rio Negro e outra para a Rua dos Barés. O conjunto é composto por quatro pavilhões: o principal, que é central e maior, dois laterais, o pavilhão do peixe à esquerda e da carne à direita, e um posterior chamado de pavilhão da tartaruga. Fotografias do período 1893-99 mostram que até o inicio do século XX a fachada principal do mercado era aquela voltada para o Rio Negro. Nesta porção, em plena área das praias de estiagem, situa-se “o desarranjado e formigante cais das barcas, barcaças e canoas que abastecem o entreposto. Durante a vazante, a rampa arenosa se alarga, enquanto durante as cheias o nível das águas encontra-se no alto do paredão dos fundos do mercado” como nos descreveu Aziz Ab’Saber em sua visita à Manaus no ano de 1953, e completa “barracas de madeira, cobertas de folhas, ocupam temporariamente e sazonalmente as rampas laterais, como que num extravasamento incontrolável do organismo movimentado do mercado na direção do rio e do ar livre.” No conjunto das funções urbanas desempenhadas por Manaus ocupa lugar de destaque a função comercial e daí a importância de seu porto. A falta de um porto amplo e bem equipado na capital do Amazonas comprometeu por muitos anos a economia da região. Dentre as constantes reclamações governamentais, repetiu-se por muitos anos a falta de 59 condições nos serviços de embarque e desembarque de mercadorias na cidade. Durante todo o período provincial e mesmo nos dez primeiros anos da República Manaus contou unicamente com rampas e trapiches instalados no litoral da cidade, que nas épocas de seca apresentavam grande dificuldade, pois o Rio Negro baixava sensivelmente o nível de suas águas, impedindo que os barcos aportassem nas rampas. Frente à essa situação foi aberta em 1899 a concorrência para a construção do novo Porto de Manaus, cuja as obras só se iniciaram em 1902 pela empresa inglesa Manaus Harbour Limited. A implantação do porto pelos ingleses, com sua plataforma flutuante acompanhando o nível das águas do rio, significou para a sociedade do início do século XX, um movimento de modernidade que, somado ao auge da borracha, desenvolveu poderoso comércio em Manaus. O balanço das atividades econômicas na área portuária destacava a vida dos manauaras, tornando o local um ponto de encontros, onde famílias inteiras passeavam nos fins de semana e se deslumbravam com as chegadas e saídas de navios. A construção do Porto de Manaus no inicio do século XX com material importado e dirigido por uma empresa inglesa criou um marco na paisagem urbana e fluvial de Manaus. A orla da cidade ficou marcada por uma imensa maquinaria de ferro e concreto, inicio de uma separação (cidade-horizonte fluvial) que iria se agravar anos mais tarde. Sobre esse fato nos escreve o viajante Paul Le Cointe em 1922: “O conjunto das construções portuárias não poderia em caso algum ser estético, mas ele possui um grande inconveniente – que poderia ser evitado em parte por um melhor agrupamento dos edifícios – que é de esconder completamente a vista do rio e dificultar a ventilação dos quarteirões ribeirinhos, que são os mais frequentados e movimentados de Manaus.”9 __________ 9 AB’SABER, Aziz Nacib. A cidade de Manaus: primeiros estudos. Editora Beca-Ball. São Paulo. 2010. p. 119.
  • 60. Vista da Igreja Matriz a partir do Rio Negro. Anterior à construção do Porto. Catraias animam as águas do rio. Foto: Coleção Jorge Herrán. Sem data. 60
  • 61. A Paris dos Trópicos. Bazar com nome francês. Foto: Coleção Jorge Herrán. 1902. 61
  • 62. 62
  • 63. Nesta página: Rua Henrique Martins. Centro de Manaus. Foto: Coleção Jorge Herrán. 1902. Página ao lado: Teatro Municipal do Rio de Janeiro - inicio da construção 1905. Teatro Amazonas - inicio da construção 1884. Teatro Municipal de São Paulo - incio da construção 1911. Fotos: panoramio.com 63
  • 64. Igreja Matriz, sua praça e escadaria. Ao fundo Teatro Amazonas. Foto: Coleção Jorge Herrán. 1901. Porto Manaus Harbour. Foto: Coleção Jorge Herrán. Sem data. Bonde 53 da Manaus Tramway. Foto: Coleção Jorge Herrán. Sem data. 64
  • 65. No inicio do século XX, a cidade de Manaus despontava como um dos centros de prosperidade e riqueza no país, graças aos excedentes gerados pela exploração da borracha na Amazônia. Naquele momento, a aparência da cidade e a efervescência de suas ruas, com bares e cafés de nomes franceses criavam a ilusão de uma prosperidade que duraria para sempre. A cidade se transformava, a politica de embelezamento modificava a paisagem urbana e determinava novos comportamentos. Neste período o aspecto da capital tornou-se a grande preocupação dos administradores que promoveram consideráveis modificações na estrutura natural de Manaus – somente neste período 4 igarapés do centro da cidade deixaram de fazer parte da paisagem urbana. A modernidade foi traduzida na cidade pela substituição, a madeira pelo ferro, o barro pela alvenaria, a palha pela telha, o igarapé pela avenida, a carroça pelos bondes. Certos comportamentos eram condenados enquanto outros elogiados, acentuava-se ainda mais a preocupação com alguns aspectos construtivos da cidade, proibindo-se a construção de casas cobertas de palha e determinando-se, por exemplo, que todas as construções deveriam ser rebocadas. Neste movimento econômico a relação de complementaridade entre a cidade e o rio é deixada em segundo plano. O rio deixa de ser a extensão da vida da cidade para ser apenas a possibilidade de ir e vir das riquezas geradas pela borracha. A contemplação da antiga cidade em relação ao rio e atividades que antes eram corriqueiras – lavar a roupa, apanhar água, pescar – o rio como berço geográfico de um assentamento humano cede à movimentação pesada das embarcações que vinham dos seringais e para eles iam. O resultado dessa conjuntura de inserção ao capital internacional foi o inicio da produção de um espaço urbano ensimesmado, que negará continuamente os recursos naturais que tem a sua volta. Principalmente durante a administração de Eduardo Ribeiro (1892 – 1896) impôs-se uma nova aparência à cidade, estabelecendo-se uma nova ordem social. Era, sem dúvida, um rito de passagem, despiam os farrapos da grande aldeia e vestiam-na uma indumentária de cidade europeia. Forjava-se a Paris dos Trópicos, com sua morte prematuramente anunciada. 65
  • 66. 4.3 ENTRE TEMPOS 1920 - 60 Em 1920 estava definitivamente confirmada a falência da borracha na região. O primitivo sistema extrativista fora derrotado e não dispunha de recursos capazes de acompanhar a rapidez e a qualidade da produção asiática. A Amazônia despedia-se de sua fase áurea e mergulhava numa estagnação econômica que manter-se-ia por várias décadas. O setor de obras públicas foi o primeiro a sentir os reflexos da crise, a sua paralisação foi a primeira medida dos governantes, situação que perduraria durante toda a primeira metade do século XX. Durante todo esse período Manaus foi a própria imagem do abandono. A partir da derrocada da borracha, uma população ribeirinha do interior do estado chega com maior intensidade à cidade, enquanto investidores estrangeiros e forasteiros vão embora. Manaus é novamente alvo de imigração, porém de uma população pobre que fugia dos seringais esvaziados. É essa mesma população que trará novamente à cidade a sua característica anfíbia, meio terra, meio água. São anos de marasmo econômico, paralisando o desenvolvimento econômico de diversos setores. As construções sofrem com a ação do tempo, a falta de energia elétrica passa a ser constante comprometendo o funcionamento dos bondes que são por fim substituídos pelos ônibus, e as redes de água e esgoto tornam-se insuficientes. No ano de 1940 Manaus conta com 108 000 habitantes chegando a 340 000 na década de 1960. Cresce uma população sem amparo do poder público, mas é nessa falta de apoio que o ribeirinho mostra a força do seu conhecimento, a criatividade de suas soluções e a beleza de sua natureza. Manaus volta a ser uma cidade identificada com a sua localização, seu berço geográfico – o Rio Negro. Dessa vez não pela imponência do dinheiro, mas pela maneira simples e barata que flutua nas águas do Rio Negro através de barcos e casas. Entre 1920 e 1960 vemos nascer a Cidade Flutuante, uma aglomeração de aproximadamente 2000 casas flutuantes que avançavam sobre o Rio Negro, num emaranhado de troncos e tábuas de madeira, abrigando comércio, serviços e residências, com seus 12 000 moradores.10 __________ 10 SOUZA, Leno José B. A Cidade Flutuante de Manaus: rediscutindo conceitos. Artigo publicado na revista AEDOS. UFRGS. 2010. p. 152. 66 Retratos da cidade flutuante. Fotos: Otoni Mesquita no livro Manaus História e Arquitetura.
  • 67. “ Ele me levara para um boteco na ponta da Cidade Flutuante. Dali podíamos ver os barrancos dos Educandos, o imenso igarapé que separa o bairro anfíbio do centro de Manaus. Era a hora do almoço. O labirinto de casas erguidas sobre troncos fervilhava: um enxame de canoas navegava ao redor das casas flutuantes, os moradores chegavam do trabalho, caminhavam em fila sobre as tábuas estreitas que formavam uma teia de circulação. Os mais ousados carregavam um botijão, uma criança, sacos de farinha; se não fossem equilibristas, cairiam no Negro. Um ou outro sumia na escuridão do rio e virava notícia.” Milton Hatoum. Dois Irmãos, pag. 120. “ Vendia de tudo um pouco aos moradores dos Educandos, um dos bairros mais populosos de Manaus, onde ergueram palafitas à beira dos igarapés, nos barrancos e nos clarões da cidade. Manaus cresceu assim: no tumulto de quem chega primeiro.” Milton Hatoum. Dois Irmãos. pag. 41. 67
  • 68. Mercado ribeirinho e casas flutuantes no Rio Negro. Fotos: Marcel Gautherot, 1944. Livro Norte, publicado pelo Instituto Moreira Salles em 2009. 68
  • 69. 69
  • 70. 70
  • 71. Palafitas nas imediações de Manaus e o transporte de produtos. Fotos: Marcel Gautherot, 1944. Livro Norte, publicado pelo Instituto Moreira Salles em 2009. 71
  • 72. 4.4 ZONA FRANCA DE MANAUS O cenário brasileiro muda. A Amazônia é apontada cada vez mais como o elo frágil da soberania nacional. Despovoada, desconectada, desamparada. Desde a segunda guerra mundial os discursos políticos à respeito da região norte se intensificam e a partir dessas premissas a Zona Franca de Manaus é idealizada no ano de 1957 com a lei 3173/57 quando é criado o Porto Livre. São 10 anos de gestação dessa proposta até que em 1967 através do decreto-lei 288 regula-se a implantação do programa de incentivos fiscais para o estabelecimento de um polo industrial, comercial e agropecuário na região. Nesta página: Notícia do jornal A Crítica, anunciando o desmonte da Cidade Flutuante. Página ao lado: Conjunto Habitacional Multifamiliar para Quadra Típica constante no anexo do plano diretor de Manaus de 1967. Arquivo: acervo Cristina Grobe. Novo fôlego, novo afluxo de dinheiro, e com isso novos investimentos no planejamento urbano da cidade que se tornará sede de importantes indústrias nacionais e internacionais, receberá aeroportos e rodovias, e assistirá a um crescimento demográfico novamente elevado. O lema era ‘integrar para não entregar’. “Subimos pelas ruas dos Educandos; na avenida Beira-Rio vimos, lá embaixo, o vazio do porto da Escadaria, antes ocupado por um aglomerado de palafitas. ‘Sabes onde eles estão?’, perguntou Mundo. ‘Eles quem?’ ‘Os moradores da beira do rio. Foram jogados no outro lado da cidade. A área foi desmatada, construíram umas casas...Sobrou uma seringueira. Quer dizer, o tronco e uns galhos, a carcaça.” Milton Hatoum, CINZAS DO NORTE, p. 143. O ano de 1967 é marcante na história manauara. Novo plano diretor, novos empregos, novos eixos de crescimento urbano. Porém para tratar desse novo momento velhas estratégias são postas em prática e a cidade torna a dar as costas para suas águas. O Plano Diretor de 1967 projeta uma cidade que nunca aconteceu, além de desconsiderar a presença dos moradores flutuantes. A Cidade Flutuante, ao lado do Porto Público de Manaus, porta de entrada da cidade, incomoda, perturba a paisagem do novo capital que desembarca em Manaus. Sua derrubada é executada no ano de 1967, ano que marca também o início da construção de conjuntos habitacionais em zonas cada vez mais afastadas do centro, nas direções norte e leste principalmente. Apesar do desmonte dos flutuantes, o centro continua a ser uma área de comércio popular onde a população da cidade vem se abastecer de produtos alimentícios. Até a década de 1990 se torna cada vez mais famosa e movimentada a Feira da Escadaria dos Remédios. Na boca do Rio Negro, em frente à antiga Igreja dos Remédios, encontrava-se a Feira da Escadaria, onde regatões de diversos municípios do Amazonas vinham vender seus produtos. Eram frutas, peixes, verduras e ervas comercializadas em barracas ou nas próprias canoas com os pés na água. O centro se consagra como zona comercial popular, comportando em sua história uma variedade de ocupações – Cidade Flutuante, Feira da Beira da Praia do Mercado, Feira da Escadaria, Feira da Banana, e por último Feira Manaus Moderna. Na década de 1990 essa área enfrenta nova reordenação com o projeto Manaus Moderna, uma avenida de 5 km de extensão para a ligação do porto com o Distrito Industrial. Porém a área em questão é um espaço de ocupação antigo e, portanto, remodelá-lo significou enfrentar as experiências e formas de ocupação que nele se 72
  • 73. 73
  • 74. RESERVA DUCK PARQUE MUNICIPAL DO MINDU PARQUE DOS BILHARES UFAM N sem escala Página ao lado: evolução da mancha urbana, da fundação ao século XX. Base: PMM. Elaborado pela autora. Nesta página: mapa 7 - Limite do perímetro urbano do Município de Manaus e a mancha urbana atual com destaque para a primeira ocupação feita pelos portugueses. Base: Planta Cadastral da Cidade de Manaus. Elaborado pela autora.
  • 75. consolidaram, ou seja, as formas de morar e habitar, mas principalmente, os modos de trabalhar e comercializar das feiras que ali se constituíram. Assim, da mesma forma que a Cidade Flutuante sofre violento desmonte, a Feira da Escadaria é também derrubada para dar lugar à larga Avenida Beira-Rio ou Avenida Manaus Moderna. É a última intervenção da administração pública no local, que através de um aterramento de grandes proporções distanciou as águas do Rio Negro em mais de 150 metros, criando um grande paredão que acompanha toda a orla central de Manaus. 1669 - 1920 É um espaço que guarda muito pouco de sua antiga identidade, a avenida apartou definitivamente o Mercado Adolpho Lisboa do Rio Negro, a Igreja dos Remédios nunca mais avistou as águas que batiam na sua escadaria, e a Igreja Matriz ilhou-se no seu próprio jardim, hoje gradeado, com entrada controlada e envolto por um transito intenso de ônibus que chegam e partem do Terminal que leva seu nome. Além disso, o Mercado público ganhou 2 anexos, galpões metálicos construídos justamente neste solo criado, que reforçam ainda mais essa separação terra-água. Eles são chamados de Feira da Manaus Moderna, fazem a frente fluvial da cidade mas não compõem um conjunto urbanístico identificável e significativo. 1920 - 1960 Manaus está inserida em uma natureza abundante, mas insiste em voltar-lhe as costas, recusando o diálogo e fantasiando-se de ‘modernidades’. Em poucos anos Manaus crescera tanto que Mundo não reconheceria certos bairros. Ele só presenciara o começo da destruição; não chegara a ver a ‘reforma urbana’ do coronel Zanda, as praças do centro, como a Nove de Novembro, serem rasgadas por avenidas e terem todos os seus monumentos saqueados.” Milton Hatoum, CINZAS DO NORTE, p.258. 1960 - 1980 75
  • 76. Mapa 6: Imagem aérea do centro de Manaus com destaque para os edifícios citados no texto. Base: Google Earth. Elaborado pela autora. 1 Igreja Matriz e Praça 2 3 4 5 6 Porto Público de Manaus: Armazenagem de carga Embarque/ Desembarque passageiros Alfândega Ministério dos Transportes/ Marinha Plataformas Flutuantes IGARAPÉ DE SÃO RAIMUNDO 7 Mercado Público Adolpho Lisboa 8 Igreja dos Remédios e Praça 9 Área ocupada pela Cidade Flutuante e Feiras 10 Teatro Amazonas 11 Avenida Floriano Peixoto 12 Avenida Beira-Rio 13 Galpões da Feira da Manaus Moderna 2 3 6 localização do recorte. sem escala. 76
  • 78. 4.5 ANÁLISES DA SITUAÇÃO ATUAL Longe de um tempo passado, Manaus encontra-se plenamente inserida no ciclo de reprodução do capital internacional. Ao mesmo tempo em que ocorreram as mudanças com a construção de novos equipamentos urbanos e redes de comunicação, possibilitando a circulação de pessoas e objetos, há a desarticulação de fluxos pretéritos. Não apenas os eixos desaparecem, mas desarticulam-se algumas atividades. Pretende-se mostrar como as dinâmicas espaciais, estruturadas a partir de uma infra-estrutura imposta pela urgência do capital, anulam em muitos trechos a natureza de Manaus. Considera-se que o cenário urbano atual não se configura como um lugar adequado à vida urbana, não constrói imagens singulares e referenciais da paisagem manauara e, portanto, não contribui para uma relação afetiva dos habitantes com a sua cidade. Habitação, trabalho, lazer e transporte. Serão estes os temas estudados aqui para esclarecer como se dá a vida na cidade de Manaus do ano 2000. Focaremos a região central, núcleo de desenvolvimento da cidade, porém a análise de todo o perímetro urbano será necessária para se compreender como o centro não é apenas um ponto no mapa, mas sim um conjunto vivo de instituições sociais e de um cruzamento intenso de fluxos sejam eles, produtos, pessoas ou ideias. Como tal acredita-se que o desenho urbano do centro de Manaus, pode expressar de modo efetivo e, sobretudo, simbólico, a capacidade do homem amazônico em formalizar uma outra configuração à natureza, o lugar da sua moradia, do seu trabalho e do seu lazer. 78
  • 79. 4.5.1 TRANSPORTE “Toda aglomeração, desenvolvida precisamente para gerar a aproximação, gera afastamento. A aglomeração em um único ponto é impossível; logo alguém será obrigado a se afastar. Quem? (...) Surgem, então, os deslocamentos espaciais regulares e socialmente determinados e disputas ocorrem por localização em função do domínio ou controle do tempo e energia gastos nos deslocamentos espaciais.” VILLAÇA, 2001, p.238. Transporte caracteriza-se como uma infra-estrutura urbana que dá suporte à vida habitual do homem, portanto, trata-se de uma infra-estrutura difusa, que deve estar presente em todas as regiões de um ambiente urbano. Morar, trabalhar e se divertir dependem desse suporte, assim a infra-estrutura de transporte esta presente no dia-a-dia de toda uma população, seja na forma individual ou coletiva. Por esse mesmo motivo a infra-estrutura de transporte de uma cidade pode ser identificada como a própria imagem dessa cidade. Paris, por exemplo, é fortemente identificada através de sua rede metroviária. Manaus, ao contrario de Paris, possui uma única opção em transporte coletivo: ônibus. Fortemente assentada sobre o modal rodoviário, Manaus construiu um espaço intra-urbano com grandes desníveis sociais, a exemplo do que acorreu em diversas cidades brasileiras no século XX. A evolução do transporte público de Manaus, faz parte de um quadro abrangente que percorre todo o país. O declínio do transporte de passageiros sobre trilhos, especialmente os bondes – veículos leves sobre trilhos – pode ser observado dentro e fora do Brasil na primeira metade do século XX. A explosão da indústria 79 automobilística (e de outras indústrias a ela ligadas como fabricantes de pneus, combustíveis e acessórios) esteve decisivamente ligada ao processo de substituição/ sucateamento do modal ferroviário para o modal rodoviário, principalmente nas capitais. Manaus contará com o sistema de bondes até 1957, ano que a empresa inglesa Manáos Tramway deixará de atuar definitivamente na cidade. Após o fim do ciclo extrativista da borracha, não somente a infra-estrutura de transporte deixará de receber investimentos, a iluminação pública também passa a sofrer com constantes quedas de energia. Durante a década de 1940 os bondes começam a operar de forma reduzida para a economia de energia, quando não paravam por completo. A frota de veículos se torna cada vez menor e de pior qualidade. Os bondes que representaram por vários anos o símbolo de uma fase de desenvolvimento, constituindo orgulho referencial para os habitantes de Manaus, chegaram à década de 50 com seu maquinário desgastado, favorecendo assim a introdução de outra modalidade, numa fase de euforia nacional pelo sistema sobre rodas. Nesse mesmo impulso, avenidas são abertas e pontes construídas alcançando localidades cada vez mais distantes do centro, muitas das quais contavam até então com pequenas canoas que subiam os igarapés. As chamadas catraias eram pequenas embarcações cobertas por uma lona, que conduziam entre 15 e 20 pessoas. Seu condutor, o catraiero, é uma figura que quase não existe mais. Sua catraia não sobe mais os igarapés, impedida pelos aterramentos e pontes, e ele, o catraiero, foi substituído pelo motorista dos ônibus. Os igarapés não são mais as vias de comunicação da cidade. No Brasil todo, o ônibus corresponde a 95% do transporte coletivo utilizado e em Manaus essa é a única opção de transporte público. São seis terminais urbanos espalhados pela cidade, dois deles na região central da cidade, destacando-se o Terminal da Matriz (T0).
  • 80. No entanto, os ônibus correspondem a somente 2% da frota de veículos da cidade, responsáveis pelo transporte de 56% da população. Enquanto os automóveis particulares correspondem à 71% da frota transportando 12% dos habitantes de Manaus. A sobrecarga não se dá somente dentro dos ônibus, mas também nas vias por onde passam. Há um claro anel na circulação da cidade, com a preponderância de 2 eixos: centro – norte e centro – leste, dois eixos de expansão do crescimento urbano. É visível o afunilamento em direção ao centro, concentrando em uma pequena área da cidade, uma quantidade enorme de veículos, disputando o espaço das vias com ambulantes e pedestres, gerando maior desconforto aos usuários, maior degradação do ambiente, e constante insatisfação de todos. Tempos de viagem distintos: via ônibus e via barco. Fonte: conversa com moradores. Elaborado pela autora. O fluxo centro – norte hoje é o que apresenta maior volume de veículos e pessoas em Manaus. É neste eixo que estão concentrados importante equipamentos urbanos além de importantes conexões como a saída para a BR 174 e AM 010, o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes, a Rodoviária, a futura Arena Amazônia, além de forte comércio e presença de edifícios institucionais. Em segundo lugar, mas não menos importante está o eixo centro – leste. A zona leste (nordeste ,sobretudo) é a que apresenta hoje maior concentração populacional, com o surgimento de inúmeros conjuntos habitacionais nas bordas da Reserva Ducke, limite do perímetro urbano. O centro de Manaus catalisa todas as atividades. Chegar e sair da cidade, acompanhar alguém que vai viajar de barco, ou ir buscar um parente que está chegando, estudar, comercializar, rezar, assistir à uma ópera, beber com os amigos, comer um bom tambaqui na brasa. O centro da cidade é sem duvida a área que mais atrai viagens. Gráfico Frota/modo de transporte X usuários. Fonte: PMM. 80
  • 81. AM-010 BR-174 RESERVA DUCK T3 T4 AEROPORTO INTERNACIONAL EDUARDO GOMES T5 UFAM T1 T0 Mapa 8: Carragamento do Transporte Público. Fonte: PMM. Elaborado pela autora. 81 T2 Quantidade de linhas de ônibus 0 - 25 25 - 50 50 - 75 75 - 100 100 - 150       
  • 82. 4.5.2 HABITAÇÃO Cearenses, paraenses, maranhenses e ribeirinhos dos mais diversos rios amazônicos aportaram à Manaus. A cidade cresceu em população e em extensão, chegando à ocupar 26km no sentido leste-oeste, e 21km no sentido norte-sul (limites do perímetro urbano). Casas de taipa ou de madeira, telhados de palha ou de zinco, casas sobre palafitas ou mesmo flutuantes. São habitações informais que contrastam em cor, número e forma com a cidade legal, suas torres residenciais e condomínios fechados. Dispondo unicamente de recursos próprios para a construção de sua moradia, grande parte dessa população migrante buscou no seu próprio saber as técnicas para a realização desse empreendimento. Desde a derrocada da borracha, a expansão das habitações sobre igarapés passou a fazer parte da paisagem urbana de Manaus como um processo natural de evolução dos tempos. Diariamente pessoas transitam pelas ruas do centro ou em bairros distantes, onde os aglomerados de palafitas e os igarapés poluídos parecem imperceptíveis ao cotidiano de quem não está inserido em tal condição de pobreza social. As várzeas, baixadas, ribeiras e igarapés da cidade foram tomados pela falta de investimentos em habitação de baixo custo o que impediu o acesso à terra por grande parte de população que fugia da estagnação econômica do interior do Estado do Amazonas. O mesmo acontece nos dias de hoje com a ocupação dos limites do perímetro urbano de Manaus nos extremos norte e leste da cidade (ver mapa 9), onde vive atualmente a maioria da população com difícil acesso à equipamentos públicos de saúde e educação. Cada vez mais longe do centro a ocupação da cidade se guiou pelos corpos d’água, mais uma vez os rios foram os principais elementos de orientação na produção do espaço urbano, condicionantes de uma organização habitacional que deve lidar com uma paisagem mutante, ora cheia, ora vazante. Assim, ao contrário da cidade legal, organizada em ruas, lotes e alinhamentos, dividida em zoneamentos de forma regular e legítima, a cidade informal das palafitas e flutuantes guarda em sua paisagem características únicas, formas de relacionamento com o meio natural e social particulares e nesse ponto torna-se uma paisagem rica, exuberante, cheia de cores, sons e cheiros. É uma paisagem que se esconde do olhar desatento, pois encontra-se nos miolos de quadra, ao longo dos igarapés que recortam os quarteirões. Mesmo escondida esse tipo de habitação persiste e se mantém presente na cidade de Manaus tanto em sua área central como nos bairros mais distantes. Ao longo do século XX, esse tipo de ocupação foi continuamente combatido sendo alvo de programas e projetos que culminaram com a remoção dessas populações ribeirinhas para longe da área central, esvaziando o centro e ampliando os limites territoriais de Manaus com a interiorização pelas terras firmes, num modelo de ocupação mista, entre as intervenções planejadas pelo Estado (conjuntos habitacionais) e ocupações espontâneas. Como exemplo mais forte desse processo temos o desmonte da Cidade Flutuante no ano de 1967 com a consecutiva construção do Conjunto de Flores e Conjunto Costa e Silva na região norte da cidade. Hoje a mesma politica pode ser observada e mais conjuntos, ao estilo ‘cidade tiradentes’ são construídos no extremo norte da cidade, um exemplo importante é o Conjunto Nova Cidade, ultimo bairro no sentido norte e hoje um dos mais populosos de Manaus. Com um modelo pré-estabelecido pelas agências multilaterais de desenvolvimento, o governo do Estado do Amazonas pôs em prática o Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus - PROSAMIM – no ano de 2006, alterando a dinâmica habitacional do centro da cidade, substituindo antigas práticas por um novo 82
  • 83. cenário artificial e reproduzindo as mesmas politicas do século XX. Remoção de famílias, aterramento de igarapés, construção de conjuntos habitacionais de qualidade inferior que desestruturam atividades e fluxos antes comuns entre os habitantes das áreas atingidas, a exemplo das catraias citadas anteriormente.11 O Prosamim ignora a paisagem onde se instala, uma paisagem natural rica e socialmente complexa, onde há vazão para diversas atividades e deslocamentos. São lugares pobres, mal acabados, cheios de sons e ruídos de rádios e televisões. São lugares que tem tudo para promover a desordem e o desafeto. Mas, ao contrário, podemos identificar parcerias, cumplicidades e solidariedades. A medida que as águas avançam nas cheias todos se unem na subida dos assoalhos e das pontes de madeira, são novas camadas que se sobrepõem àquelas alagadas pelo rio, camadas estas construídas pela ajuda mutua e pelo esforço coletivo. As janelas não tem cortinas, mas as portas e paredes pintadas revelam não apenas o que foi possível fazer, mas também o belo para os moradores. As palafitas e flutuantes contam com eletrodomésticos, antenas parabólicas e outras comodidades. Aqui e ali é possível ver um vaso com flores, uma conversa na porta de casa e uma vendinha que abastece as redondezas. Descobremse cores, gestos, esconderijos e amplitudes, lugares em que a vista se perde na riqueza dos detalhes. Há esquinas, reentrâncias, caminhos largos e estreitos, pontos de encontro, onde é possível parar o barco, abastecer ou descarregar a mercadoria e onde a conversa se faz presente. Lugares que dão vazão as brincadeiras das crianças. O Prosamim desconsidera essa paisagem e a substitui por um cenário homogeneizante, onde a água desaparece __________ 11 BEZERRA, Arliene A. N. Habitação e ação pública na contemporaneidade: um estudo de caso na área central de Manaus. Dissertação de mestrado apresentado à FFLCHUSP. São Paulo. 2011. 83 sob a avenida, os esconderijos e reentrâncias dão lugar ao descampado do espaço público vazio de vida, de encontro e de conversas. Foi a necessidade de adequação desses ambientes socialmente construídos em benefício da cidade contemporânea, uma cidade genérica. Produto de uma administração e não obra de produção social, coletiva e democrática. O centro da cidade de Manaus com as obras do Prosamim e a reforma da Manaus Moderna passa a ser reproduzido não mais como expressão do desenvolvimento histórico da sociedade, mas sim como ação técnica planejada por algum administrador. Enquanto o centro da cidade passa pelos novos investimentos do Prosamim na bacia dos Educandos e posteriormente na bacia de São Raimundo, a classe de maior poder aquisitivo busca a beleza natural da Ponta Negra. Uma praia fluvial, aos moldes da Barra da Tijuca do Rio de Janeiro, ou da Praia de Boa Viagem no Recife, afastada quase 15km do centro, onde proliferam torres residenciais de alto padrão com vistas para o Rio Negro, e condomínios fechados com marinas particulares. Esta área também passa por uma ampla reestruturação urbana com a implantação de um parque beira-rio ao longo de toda a extensão da avenida Coronel Teixeira. Nesse ponto, afastado do centro, o Rio Negro volta a ser valorizado elevando o preço dos imóveis e serviços circundantes. Processo inverso do que ocorre no centro da cidade onde há grande quantidade de imóveis desocupados, acarretando no completo esvaziamento da região central nos fim de semana e feriados, quando o comércio e serviços estão fechados, evidenciando o completo desequilíbrio de Manaus quando comparamos a oferta de infra-estrutura e empregos com as áreas de concentração habitacional.
  • 84. RESERVA DUCKE NOVA CIDADE CIDADE DE DEUS CIDADE NOVA PONTA NEGRA JORGE TEIXEIRA NOVO ALEIXO DISTRITO INDUSTRIAL 2 DISTRITO INDUSTRIAL 1 POPULAÇÃO / BAIRRO DE MANAUS 1 827 - 12 053 CENTRO 12 054 - 28 288 28 289 - 53 370 53 371 - 75 832 Mapa 9: População / Bairro Fonte: PMM. Elaborado pela autora. 75 933 - 121 135 84
  • 85. (1) (2) (3) (4) Imagens 1 e 2: Foto aérea da Ponta Negra e vista do chão. Fotos: Quapá e acervo pessoal. Imagens 3 e 4: Foto aérea da Praia de Boa Viagem no Recife e vista do chão. Fotos: panoramio.com. 85
  • 86. (1) (2) (3) (4) Imagens 1 e 2: Conjunto Habitacional Nova Cidade na Zona Norte de Manaus. Adentrando no espaço da floresta. Foto: SOS Archives. Imagem 3: Conjunto Cruviana, Boa Vista - Roraima. PAC - Minha Casa Minha VIda. Imagem 4: Conjunto Habitacional Rio Verde - São Paulo. Fotos: panoramio.com. 86
  • 87. Bairro Nova Vitória. Zona Norte de Manaus. Foto: SOS Archives. 1999. 87
  • 88. Bairro Nova Vitória. Zona norte de Manaus. Foto: SOS Archives. 1999. 88
  • 89. Palafitas. Igarapé de São Raimundo. Foto: Acervo pessoal. 2012. 89
  • 90. Palafitas. Igarapé de São Raimundo. Foto: Lais Matiusse. 2012. 90
  • 91. A cidade genérica. PROSAMIM. Foto: acervo pessoal. 91
  • 92. 4.5.3 ESPAÇOS PÚBLICOS/LIVRES - LUGAR DE LAZER E LUGAR DE TRABALHO As infra-estruturas urbanas de menor porte são tão antigas quanto as próprias cidades. Ruas, largos, praças, passarelas e pontes são estruturas urbanas presentes desde a origem da cidade de Manaus e aquelas que, mesmo com sucessivas modificações, mais permaneceram no seu ambiente urbano. A Rua dos Barés, a Avenida Sete de Setembro, a Praça da Saudade, Praça da Matriz, a Rua Eduardo Ribeiro são espaços públicos por excelência, lugar de animação e sociabilização cotidiana, signos da memória e, portanto, de valor cultural. Além do lugar da conversa e do encontro, são também o espaço do comércio, da troca, da pechincha, justamente pelo movimento que possuem com a passagem de pedestres e com a descarga de mercadorias no porto improvisado da Manaus Moderna. As ruas e praças do centro de Manaus são tomadas pelo comércio formal e informal, são as mais variadas mercadorias que tomam as calçadas seja na extensão das próprias lojas seja nas barracas de ambulantes. Frutas, peixes e sementes que podem ser comprados diretamente do barco que atraca nas costas do Mercado, no muro branco da Manaus Moderna. Sem nenhuma burocracia ou infra-estrutura o centro de Manaus se coloca como lugar do comércio, do movimento, do abastecimento. No passado era tomado pela elite manauara, hoje com a nova mobilidade territorial que expandiu os eixos da metrópole criando novos pontos de interesse (como a Ponta Negra, por exemplo) o centro passou a ser frequentado pelas camadas populares que invadiram as ruas e calçadões, ligaram seus rádios com as mais variadas músicas, e fizeram deste espaço público o seu ganha-pão. O mesmo acontece com os igarapés, principalmente os igarapés dos Educandos e São Raimundo que rodeiam o centro da cidade. São espaços do ir e vir de embarcações que possuem as mais diversas finalidades e tamanhos, podem encostar no ‘quintal’ de uma casa atendendo pessoalmente os fregueses, trazem mercadorias dos mais distantes pontos do Amazonas para trocar ou vender rio acima, levam famílias inteiras que vem se abastecer nas feiras do centro. As ruas do centro de Manaus, assim como os seus igarapés, apresentam além de seus usos correntes, reminiscências de usos urbanos passados. São lugares que possuem estreita relação com a água e dependem dela para o seu acontecimento. Não é difícil ver grupos de pessoas que esperam um barco chegar ou partir por que nele estão parentes queridos, ou mesmo ribeirinhos de outros rios da Amazônia que vem à Manaus comprar mercadorias que eles só encontram aqui. A água é o lugar do encontro e da despedida, do chegar e partir, e são nesses acontecimentos, no olhar daqueles que buscam alguma pista no Rio, que vislumbramos o significado dessa frente fluvial, desses cursos d’água que teimam em compor o tecido urbano de Manaus. Esses encontros, cidade – água, são espaços multifuncionais, possuem uma variedade de usos, participantes e usuários. Mesmo em igarapés tomados por palafitas e flutuantes, onde o uso habitacional pode parecer o único, há uma infinidade de atividades sobrepostas. Cabelereiros, creches, bares, restaurantes e mercadinhos compõem esses bairros sobre as águas. Já o conjunto habitacional, o bairro residencial distante, as áreas de estacionamento e o próprio automóvel criam espaços monofuncionais. Primeiramente com a obra da Manaus Moderna, num momento de intensa fragmentação do espaço urbano, onde o sistema viário foi projetado como um sistema de funções limitado ao fluxo de veículos automotores para a ligação do Porto à zona industrial, e atualmente com o projeto PROSAMIM, onde edifícios puramente habitacionais são implantados com o tamponamento dos igarapés, atestando uma forte tradição da administração pública de desprezo dos rios e sobrevalorização do sistema viário, Manaus se reveste de um discurso excludente que despreza a possibilidade de integração que o Rio Negro e seus igarapés representam, 92
  • 93. a possibilidade de criação de um sistema. Considerando ‘sistema’ como um conjunto das partes ou etapas que encadeiam-se de modo coordenado para atingir um determinado fim, a exemplo do sistema de abastecimento de água, podemos afirmar que Manaus, assim como outras cidades brasileiras, não possui um ‘sistema de espaços públicos livres’.12 Os espaços livres de Manaus nunca chegaram a formar um conjunto dotado de intencionalidade. Cada igarapé, cada praça, rua, calçadão ou parque valem por si sós, não promovem a integração do território. Eles simplesmente acontecem na cidade, e dependendo de sua localização são mais ou menos frequentados. Não são vistos como um conjunto, uma rede, e nos projetos atuais, como o PROSAMIM, continuam a fragmentar o espaço urbano. Seria possível revegetar as margens ocupadas? Construir habitações que possibilitem adequações, subtrações ou adições para diferentes usos conforme a vontade de seus moradores? Possibilitar a navegação em igarapés para a livre circulação de mercadorias e pessoas ou para a simples recreação? Criar espaços públicos tratados? Vivificar a memória do Rio e da própria cidade de Manaus? Decidiu-se sempre pelo não. No entanto, o centro de Manaus e seus espaços livres, com sua frente fluvial e igarapés, continuam vivos no caminhar dos pedestres, nas mercadorias das feiras e ambulantes, e no atracar dos barcos. São espaços fragmentados e degradados que continuam cheios de gente e acenam para a possibilidade dessa integração. Espaços onde o pedestre é o protagonista. Não é preciso ter dinheiro para desfrutar desse ambiente, onde a manifestação da vida pública se dá por completo, onde todos podem contemplar a vista do Rio Negro e sentir-se parte dessa comunidade urbana. __________ 12 BARTALINI, Vladimir. Os córregos ocultos e a rede de espaços públicos urbanos. Arquitextos. Vitrúvios. São Paulo.2009. 93 Barco atracado nas costas de uma casa no Igarapé de São Raimundo. Foto: Marcia Trento. 2012. Familia em uma pequena embarcação atracada na Avenida Beira-Rio com diversas frutas a bordo. Foto: Acervo pessoal. 2012.
  • 94. A secura da Avenida Beira-Rio. Foto: acervo pessoal. 2012. 94
  • 95. À espera. O muro da Avenida Beira - Rio e sua estreita calçada é o unico lugar aonde podemos ver o Rio e os barcos que chegam e partem. Foto: acervo pessoal. 2012. 95
  • 96. A água para se refrescar no calor. Meninos nadando no Igarapé de São Raimundo. E homem pulando no Rio Negro, próximo ao Mercado Adolpho Lisboa. Foto 1: acervo pessoal. 2012. Foto 2: Marcio Melo tirada em 28 de maio deste ano. 96
  • 97. O burburinho do mercado. Barraca de bananas e o sobe e desce da carga/descarga de produtos dos barcos que atracam no muro da Avenida Beira-Rio. Foto 1: Fábio Mariz. 2012. Foto 2: acervo pessoal. 2010. 97
  • 98. Imagem página ao lado:maquete eletrônica do projeto. 98
  • 99. 4. A TERCEIRA MARGEM DO RIO: Nova orla fluvial de Manaus. 99
  • 100. 5.1 APROXIMAÇÃO DA ÁREA CENTRAL: DADOS DE PROJETO 100
  • 101. 101
  • 102. EDIFICAÇÕES DE INTERESSE HISTÓRICO A imagem da página anterior delimita a área de estudo, uma porção da região central da cidade de Manaus, que nos proporcionará os dados de projeto. Como já foi visto, é a área de ocupação mais antiga da cidade, e portanto um local que guarda ainda significados/identidades que perduraram no transcorrer do tempo (ver seção ‘marcos urbanos’). É o caso dos Edifícios de Interesse Histórico (mapa 10). O centro de Manaus é pontilhado de edifícios históricos, alguns particulares, como restaurantes, lojas, ou escritórios, e outros públicos, de acesso livre como o Teatro Amazonas, a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, o Mercado Público Adolpho Lisboa, e a Pinacoteca do Estado do Amazonas, antigo quartel da Polícia Militar do Amazonas. Há ainda edifícios públicos mas de acesso controlado como o Palácio da Justiça (em frente ao Teatro Amazonas), o Hospital Santa Casa de Misericórdia e o Grupo Escolar D. Bosco, que apesar de não serem acessíveis a todos possuem um interesse paisagístico inegável. Esses edifícios estão espalhados pelo centro de Manaus e muitos deles encontram-se abandonados, em ruinas, escorados para não desabarem, apesar do tombamento por órgãos de preservação. Além disso, não formam um circuito ou percurso para o pedestre que poderia facilmente percorrer à pé esses pontos da cidade. (1) (3) (2) Legenda Edifícios Públicos de Acesso Livre: 1. Igreja Matriz Nossa Senhora da Conceição 2. Alfândega 3. Mercado Público Adolpho Lisboa 4. Igreja Nossa Senhora dos Remédios 5. Centro de Artes Chaminé 6. Palácio Rio Negro 7. Museu do Homem do Norte 8. Pinacoteca do Estado do Amazonas 9. Biblioteca Pública de Manaus 10. Teatro Amazonas 11. Igreja de São Sebastião 12. Biblioteca Municipal João Bosco Pantoja 13. Palacete Eduardo Ribeiro 14. Paço Municipal 15. Palácio Rio Branco 16. IPHAN (4) Imagens que mostram duas situações distintas: abandono e cuidado. Fotos 1 e 3: construções históricas abandnadas próximo ao Porto. Fotos 2 e 4: Palácio da Justiça e Alfandêga. Acervo pessoal. 2012. 102
  • 103. Mapa 10: Edifícios de Interesse Histórico. Elaborado pela autora. Edifícios Públicos de acesso livre Edifícios Públicos de acesso controlado 12 Edifícios Particulares 11 10 13 9 14 15 7 1 16 6 8 2 4 3 103 5
  • 104. ÁREAS VERDES Apesar de estar inserida em uma imensidão verde, a cidade de Manaus não possui uma significativa arborização urbana. Ao contrário de outras cidades brasileiras, como Maringá e Goiânia, Manaus não encontra em seus parques e praças um elemento que compõe a identidade manauara. Se é possivel associar qualidade de vida ao padrão de qualidade do ambiente urbano, e sendo as praças, parques e caminhos arborizados, ou seja, a própia arborização urbana a imagem que representa de imediato os espaços públicos, observamos, entristecidos, a péssima qualidade de vida que o habitante manauara possui. Na região central da cidade, aqui analisada, as praças existentes são remanescentes de um tempo passado e por isso estão sempre relacionadas à algum edifício histórico. Exemplos importantes dessa relação são a Praça da Matriz, a Praça dos Remédios, a Praça do Congresso em frente ao Instituto de Educação do Amazonas, a praça Heliodoro Balbi em frente à Pinacoteca do Estado e a Praça D. Pedro II em frente ao Paço Municipal. Legenda Áreas Verdes: 1. Praça da Matriz. 2. Praça Tenreiro Aranha 3. Praça Hiliodoro Balbi 4. Praça dos Remédios 5. Parque S. Jefferson Peres 6. Praça São Sebastião 7. Praça do Congresso 8. Praça da Saudade 9. Praça D. Pedro II Desde a implantação do Prosamim, o centro da cidade conta também com o Parque Senador Jefferson Peres. O parque foi implantado na primeira fase do programa que teve início em 2006, e circunda o famoso Palácio Rio Negro. Apesar de importantes essas áreas verdes não formam um sistema articulado através de ruas bem cuidadas e sombreadas, e por isso o pedestre não identifica essas áreas como um conjunto, ou um percurso que possa ser conhecido numa agradável caminhada. (1) (2) Terreno vazio e abandonado (foto 1) ao lado da Praça D. Pedro II (foto 2). Acervo pessoal. 2012. 104
  • 105. Mapa 11: Edifícios Públicos de Interesse Histórico, Áreas verdes e locais ociosos. Elaborado pela autora. 8 7 6 9 3 1 5 2 4 105
  • 106. TECIDO URBANO Por meio da análise do tecido urbano existente buscamos identificar e classificar os padrões de parcelamento predominante por quadra, objetivando a caracterização fundiária e como consequência, a qualificação da morfologia urbana. Para caracterizar a composição do território, foram determinadas três categorias para classificar a trama fundiária: 1- lotes pequenos (menores que 500 m²) 2 - lotes grandes (maiores que 1500 m²) e 3 - misto (onde há a presença das duas categorias anteriores sem que haja o predomínio relativo de alguma delas). A primeira categoria, onde as quadras possuem a predominância de lotes pequenos, caracteriza um parcelamento do tipo tradiocional misto (comercial e residencial), representando a primeira forma de ocupação do território manauara. Já a segunda categoria agrupa as quadras onde se identifica a predominância de lotes definidos como grandes. Essas quadras, indicadas em vermelho, localizam-se justamente na porção mais próxima do Rio Negro. São quadras que resultaram das transformações ocorridas durante o século XX, que levaram a cabo reformas urbanas de cunho rodoviarista, como o projeto da Manaus Moderna que criou a larga Avenida Beira-Rio. Dessas intervenções resultaram lotes de grandes proporções que representam um cisma entre a antiga ocupação do centro de Manaus, formada por lotes pequenos, e a frente fluvial do Rio Negro. Além disso se compararmos os locais ociosos apontados no mapa anterior veremos que as áreas desocupadas de maiores dimensões localizam-se justamente nas quadras apontadas em vermelho onde há predominância de lotes grandes. A análise destes dados possibilita o reconhecimento da composição do tecido urbano existente, relacionando-a com as dinâmicas de produção do ambiente urbano, de modo a evidenciar conexões mais próximas entre a estrutura fundiária da região central da cidade de Manaus e as reformas urbanas postas em práticas durante todo o século XX. Este mapeamento permite também compreender quais são os impactos diretos no território causados pelas transformações impostas por novas matrizes fundiárias no tecido consolidado, alterando ou até mesmo eliminando relações urbanas antes comuns como ver/sentir o Rio. Imagem aérea aproximada das quadras apontadas com predominância de lotes grandes. É possível ver a utilização de terrenos vazios como grandes estacionamentos a céu aberto. Google Earth. 106
  • 107. Mapa 12: Padrão de Parcelamento predominante por quadra. Elaborado pela autora. Lotes grandes Misto Lotes pequenos 107
  • 108. Mapa 13: Identificação do sistema viário existente. Elaboração da autora. Avenida Sete de Setembro da Bei raR io Dr. Alm ín Rua Ave ni Ped ro B ote lh o Rua oto eix oP an Rua ori Qui Avenida Fl ntin oB Rua oca Rua Dos iuv a Mir And and rad aL as eão Rua dos Bar és io Avenida Sete de Setembro 108 o Ri ida en Av B aeir Rua Visconde de Porto Alegre Avenida Getúlio Vargas Avenida Eduardo Ribeiro Avenida Epaminondas Avenida Ramos Ferreira
  • 109. SISTEMA VIÁRIO A idendificação e análise do sistema viário da região central de Manaus foi fundamental para a tomada de decisões do projeto urbano proposto neste trabalho final de graduação. Nesta porção da cidade é possível identificar velhas e apertadas ruas coexistindo com novas e largas avenidas. É o caso da Rua dos Barés em contraponto à Avenida Beira-Rio. Antigamente a Rua dos Barés era a última rua antes do Rio Negro. As construções que ali estavam, como o Mercado Público Adolpho Lisboa, tinham como limite uma rampa formada pela própia inclinação do terreno que era banhado pelo Rio. Hoje, como o mapa ao lado nos mostra, existe a Avenida Beira-Rio que afastou as águas do Negro dessas construções, e ainda configura-se como uma Avenida que não possui nenhuma árvore, nenhum local de estar para o pedestre, projetada unicamente para o carro. Outra observação importante é o conjunto formado pelas Avenidas Epaminondas, Floriano Peixoto e Getúlio Vargas. Como o mapa 14 mostra esse é o conjunto de avenidas com maior carregamento de tráfego desta região da cidade, o que explica a presença do Terminal de Ônibus da Matriz, também apontado no mapa 14. São Avenidas largas (entre 15 e 20 metros de leito carroçável) onde o trânsito desordenado de veículos (não existem faixas exclusivas para ônibus) e a calçada exígua dificultam o caminhar do pedestre. Além disso a Avenida Floriano Peixoto e sua continuação, a Av. Getúlio Vargas são o resultado do tamponamento do Igarapé do Aterro (ver foto página 55). A Avenida Eduardo Ribeiro foi projetada ainda no período da borracha sobre o antigo Igarapé do Espírito Santo que passava ao lado da Igreja Matriz. É uma avenida desenhada com uma clara intensão paisgística ao ser coroada com a Praça do Congresso e o edíficio art deco do Instituto de Educação do Amazonas. Por ser uma avenida de difícil saída para o veículos, possui um transito mais leve e dessa forma o número de pedestre é maior. Mesmo assim a avenida ainda possui calçadas pouco generosas e insuficiente arborização. Nesta avenida as vagas de estacionamento para carros sâo à 45°, e muitas vezes ficam vazias, espaço esse que poderia ser usado pelos pedestres. 109
  • 110. LEGENDA Vias de pedestres (calçadões) Vias de trânsito leve - somente veículos particulares Vias de trânsito moderado. Possuem até 10 linhas de ônibus. Vias de trânsito intenso. Até 30 linhas de ônibus. Vias de trânsito pesado. Não possuem linhas de ônibus porém o tráfego de caminhões e carretas (veiculos pesados em geral) é intenso durante todo o dia e noite. Vias de trânsito muito pesado. Possuem mais de 100 linhas de ônibus, alem da presença de veículos pesados. Trânsito desorganisado e congestionado durante todo o dia. pontos de ônibus Terminal de Ônibus da Matriz Saída do Terminal da Matriz. Foto: acervo pessoal 2012. 110
  • 111. Mapa 14: Carregamento do Sistema Viário. Elaboração da autora. 111
  • 113. Mapa 15: A cidade de Manaus e o movimento do Rio Negro. Cheia e Vazante. Elaborado pela autora. 10 11 9 6 7 5 4 113 8
  • 114. CHEIAS E VAZANTES Como não poderia deixar de ser, o movimento das águas do Rio Negro, mostrado no mapa anterior e nos registros do capítulo 1, é um importante dado de projeto. São seis meses de cheia e seis meses de vazante, correspondentes ao periodo de chuvas (de dezembro à maio) e à seca (de junho à novembro). Neste ciclo as águas do Rio Negro podem variar mais de 15 metros de altura. Até hoje a cota máxima da água registrada na cidade de Manaus foi de 29,77 metros no ano de 2009 e, a cota mínima registrada foi de 13,63 metros em 2010. Dessa forma adota-se a cota de 30 metros como a cota segura para a cidade de Manaus.13 A medida que as águas baixam uma grande porção de terra aflora à superfície e, portanto, chegar ou sair de barco torna-se muito mais difícil. Na região central de Manaus, devido à presença dos mercados e feiras a movimentação de barcos é grande. No periodo da seca a carga e descarga de alimentos e outros produtos é mais custosa e demorada devido a distância que deve ser percorrida à pé e à altura que precisa ser vencida através de um zigue-zague de rampas estreitas e muito inclinadas. Os periodos de cheia e vazante estão intimamente relacionados com a questão da drenagem urbana. No mapa anterior, além de registrar as cotas máxima e mínima das águas do Negro estão marcados também os igarapés que sofreram intervenções e hoje ou estão canalizados, tamponados ou mesmo aterrados e assim deixaram de fazer parte da paisagem urbana de Manaus. São eles: Igarapés Aterrados no século XIX (ciclo da borracha): 1. Ig. Ribeira das Naus 2. Ig. do Espírito Santo 3. Ig. do Aterro 4. Ig. da Bica do Monte Cristo Igarapés canalizados século XXI: 5. Ig. de Manaus (trecho Parque Prosamim Se. Jefferson Peres) 6. Ig. Bittencourt 7. Ig. Mestre Chico 8. Ig. do Quarenta 9. Ig. da Cachoeirinha Igarapés tamponados e margens compactadas para construção de habitação em solo criado - Prosamim: 10. Ig. de Manaus (trecho Parque Residencial Manaus - Prosamim) 11. Ig.do Mestre Chico __________ 13 Dados do Porto Público de Manaus. www.portodemanaus.com.br 114
  • 115. Esquema do movimento das águas - cheia e vazantes. Elaboração da autora. +30m Área de risco 115
  • 116. 5.2 DIRETRIZES O estudo da região central da cidade e suas dinâmicas urbanas levou à escolha do recorte de intervenção proposto, a orla fluvial do centro de Manaus (mapa 16), acreditando que está porção do território manauara possa voltar ao imaginário de sua população como um local de referência para o lazer, para o habitar, para o estar, para viver. Trata-se de um conjunto de decisões que interferem no espaço, no traçado viário e nos fluxos de veículos, na disposição e no caráter de equipamentos públicos e nos parâmetros de uso e ocupação do solo. O objetivo primeiro é retornar o Rio ao centro das atividades ali consolidadas, além de criar uma identidade visivelmente una para a sequência de espaços, momentos e fatos urbanos que vão do Porto Público de Manaus, na extremidade do Igarapé de São Raimundo, ao Igarapé dos Educandos. Proporcionar percursos nessa frente fluvial que sejam legíveis, seguros, confortáveis e convidativos. A reestruturação da orla fluvial de Manaus consistiu no exercício de optar por um modo de construção do ambiente urbano que tenha no desenho das águas o seu fio condutor. Busca-se a partir da reincorporação do Rio Negro ao território urbano, sustentar a água como elemento fundamental do viver manauara, ribeirinho. Ao recuperar a associação entre cidade - ambiente construído - e água - ambiente natural - abre-se a possibilidade de criação de lugares de uso múltiplo, capazes de fortalecer a coletividade ao despertar a multiplicidade de apropriações dos habitantes com sua cidade. Para isso foi preciso desenhar uma infra-estrutura que proporcionasse novamente o encontro do homem com as águas do Negro, uma infra-estrutura ‘de chão’ , ‘de piso’, que possibilite o caminhar até a beira do rio, seja na época de cheia, seja na vazante. Um subir e descer das águas em consonância com a cidade, e não contra ela, como acontece nos dias de hoje. Que este movimento das águas seja um espetáculo à céu aberto, que a dança do ir e vir dos barcos possa ser vista por moradores e visitantes a qualquer época do ano, que a carga e descarga de produtos possa animar constantemente essa frente fluvial com cheiros, cores e sabores da região amazônica. A frente fluvial como espetáculo cotidiano para o pedestre, para o ciclista, para o cidadão não-motorizado. Todas as medidas adotadas possuem um objetivo comum: substituir a cidade hostil ao pedestre e marcada pela segregação socioespacial, por uma cidade mais humana e democrática, onde prevaleçam os espaços de encontro e convivência. Este projeto urbano deseja que esta nova configuração espacial possua qualidade ambiental aliada à vitalidade das ruas e dos espaços de uso coletivo, promovendo a urbanidade. Para que tal objetivo fosse alcançado foi preciso repensar a mobilidade urbana do centro de Manaus. Acredita-se que a prioridade dada ao veículo motorizado e indivídual como hoje acontece nessa região deve ser alterada para se conquistar um espaço 116 Pontos Focais da área de projeto: 1. Porto Público de Manaus 2. Terminal de ônibus da Matriz 3. Igreja da Matriz e Praça 4. Av. Eduardo Ribeiro 5. Alfândega 6. Mercado Público Adolpho Lisboa 7. Igreja dos Remédios e Praça 8. Galpões das Feiras 9. Acesso dos barcos 10. Quadras ociosas 11. Rua Pedro Botelho e Rua Dr. Almínio (conexão com o Parque Prosamim Jefferson Peres). 12. Av. Floriano Peixoto
  • 117. Mapa 16: Recorte da área de intervenção. Elaboração da autora. 4 3 2 1 12 11 5 7 6 10 8 9 117