A decisão do Supremo Tribunal Federal que manteve Renan Calheiros na presidência do Senado Federal fez ruir o último bastião da ética e da moralidade das instituições políticas do Brasil porque representou o ápice da deterioração das instituições políticas do Brasil. O próprio ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso afirmou à imprensa que é inadmissível o descumprimento de uma ordem judicial considerando-o golpe de estado ou desobediência civil. A manutenção de Renan Calheiros na presidência do Senado representa um atentado contra a contra a ordem jurídica do País e a vontade popular que na manifestação do dia 04/12 exigiu o “fora Renan”. O Supremo Tribunal Federal se integra, desta forma, ao lamaçal do Poder Executivo e do Poder Legislativo. Com a desmoralização do STF, fica aberto, de hoje em diante, o precedente de não se respeitar decisões judiciais sob a forma de liminar ou não.
SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
Ruiu o último bastião da moralidade no brasil, o supremo tribunal federal
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RUIU O ÚLTIMO BASTÃO DA MORALIDADE NO BRASIL, O SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL
Fernando Alcoforado
Tem sido frequente a ocorrência de eventos que configuram o conflito entre o
exercício da ética e da política no Brasil. O termo ética representa um conjunto de
valores morais e princípios que devem nortear a conduta humana na sociedade. A ética
serve para estabelecer regras de conduta que garanta o equilíbrio e o bom
funcionamento da sociedade, assegurando que ninguém seja prejudicado. Neste sentido,
a ética está relacionada com o sentimento de justiça social. A ética é construída por uma
sociedade com base nos valores históricos e culturais. Do ponto de vista da Filosofia, a
Ética é uma ciência que estuda os valores e princípios morais de uma sociedade e seus
grupos.
Cada sociedade e cada grupo possuem seus próprios códigos de ética. Além dos
princípios gerais que norteiam o bom funcionamento social, existe também a ética de
determinados grupos ou locais específicos. Neste sentido, podem ser citadas a ética
médica, ética do engenheiro, ética de trabalho, ética empresarial, ética educacional, ética
nos esportes, ética jornalística, ética na política, etc. Por sua vez, o estudo sobre o
caráter do indivíduo e os costumes recebe o nome de moral. Ética e moral tornam-se
sinônimos, designando o mesmo objeto e o mesmo campo de investigação filosófica.
Os moralistas romanos, em grande parte, retomam a concepção estóica de que o fim
último das ações humanas está na própria virtude. Eles sustentam que a ação virtuosa se
define pela retidão ou honestidade nos atos praticados. A moral é para eles a disciplina
filosófica que estabelece um conjunto de deveres que a natureza impõe ao homem, seja
com respeito a si próprio, seja com relação aos outros homens. A política, por sua vez,
para os moralistas romanos é responsável por instaurar as condições de uma vida justa e
feliz.
Para Aristóteles a Política é a ciência mais suprema, a qual as outras ciências estão
subordinadas e da qual todas as demais se servem numa cidade grega. A tarefa da
Política é investigar qual a melhor forma de governo e instituições capazes de garantir a
felicidade coletiva. Segundo Aristóteles, o homem é um animal social e político por
natureza. E, se o homem é um animal político, significa que tem necessidade natural de
conviver em sociedade, de promover o bem comum e a felicidade.
Com as teses de Maquiavel expostas em sua obra O Príncipe cai por terra a concepção
de Aristóteles da política enquanto busca da justiça e do bem comum. Em cada época
histórica, o fundamento da política e do Estado para Maquiavel é a manutenção do
poder político pelas classes dirigentes. Para Maquiavel, a finalidade essencial da política
é, em síntese, conquistar e manter o poder. É baseado nesta visão que Maquiavel cunha
sua famosa e mais polêmica frase: os fins justificam os meios.
Ao longo da história são inúmeros os exemplos de classes dirigentes que se utilizam de
todos os meios legítimos e ilegítimos para se manterem no poder ou para conquistá-lo.
Quem está no poder se utiliza do aparelho do estado para promover a si próprio e a seus
correligionários nas disputas eleitorais. Comenta-se que o presidente Fernando
Henrique Cardoso teria corrompido parlamentares para votarem na emenda
constitucional que viabilizou sua reeleição. O presidente Lula usou a máquina do estado
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para eleger sua candidata Dilma Roussef à presidência da República. Quem está fora do
poder e busca conquistá-lo utiliza também de métodos aéticos para derrotar quem está
no poder. As campanhas golpistas de Carlos Lacerda contra os presidentes Getúlio
Vargas, Juscelino Kubitchek e João Goulart são bons exemplos deste tipo de atitude
daqueles que estão fora do poder.
É legítimo que os fins justifiquem os meios utilizados, porém apenas na medida em que
estes meios não entram em contradição com os fins almejados. Isto significa dizer que
nem tudo que se faça é aceitável. Só é aceitável aquilo que contribui para que se atinja o
fim almejado e que não signifique a negação deste. Com Maquiavel, a política deixa de
ser pensada a partir da ética e da religião. Neste sentido, Maquiavel representa uma
dupla ruptura: com os clássicos da Antiguidade greco-romana e com os valores cristãos
medievais. Em Maquiavel, a política identifica-se com o espaço do poder, enquanto
atividade na qual se assenta a existência coletiva e que tem prioridade sobre as demais
esferas da vida humana. A política funde-se com a realidade objetiva, com os problemas
concretos das relações entre os homens. A política descrita em O Príncipe com
inúmeros exemplos retirados da história mais se assemelha ao inferno de Dante do que
ao paraíso prometido.
Para Maquiavel a política deve se preocupar com a ética e a moral. Ao libertar a política
da moral religiosa, Maquiavel explicitou seu caráter terreno e transformou-a em algo
passível de ser assimilada pelos comuns dos mortais. Não é por acaso que
maquiavelismo virou sinônimo de uma prática política desprovida de moral e de boa fé,
um procedimento astucioso e velhaco. É desta forma que pode ser caracterizado o
comportamento do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em conluio com o Poder
Executivo (Michel Temer) e o Poder Legislativo (Rodrigo Maia), manteve Renan
Calheiros na presidência do Senado Federal mesmo na condição de réu em processo em
tramitação no próprio STF e após ele ter desrespeitado o cumprimento de liminar
expedida pelo ministro Marco Aurélio que o removia da presidência do Senado.
A decisão do Supremo Tribunal Federal que manteve Renan Calheiros na presidência
do Senado Federal fez ruir o último bastião da ética e da moralidade das instituições
políticas do Brasil porque representou o ápice da deterioração das instituições políticas
do Brasil. O próprio ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso
afirmou à imprensa que é inadmissível o descumprimento de uma ordem judicial
considerando-o golpe de estado ou desobediência civil. A manutenção de Renan
Calheiros na presidência do Senado representa um atentado contra a contra a ordem
jurídica do País e vontade popular que na manifestação do dia 04/12 exigiu o “fora
Renan”. O Supremo Tribunal Federal se integra, desta forma, ao lamaçal do Poder
Executivo e do Poder Legislativo. Com a desmoralização do STF, fica aberto, de hoje
em diante, o precedente de não se respeitar decisões judiciais sob a forma de liminar ou
não.
O panorama da política brasileira ao longo de sua história e na conjuntura atual reflete
os postulados de Maquiavel. Apesar disso, muitos detentores do poder atuam de acordo
com os princípios contidos na obra de Maquiavel os quais se baseiam em uma visão
utilitarista, pragmática e fundamentada no cálculo frio e racional da relação
custo/benefício. Este foi o caso da decisão do STF que procurou evitar que a presidência
do Senado Federal fosse assumida pelo senador Jorge Viana do PT para beneficiar o
governo Michel Temer. Poucos são os detentores do poder no Brasil que respeitam
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princípios éticos e morais e desenvolvem sua ação na defesa dos interesses da
sociedade.
Além da gigantesca crise econômica e social que conduz o Brasil à bancarrota, o Paísl
enfrenta um processo de descalabro ético e moral no plano político-institucional nunca
visto em sua história. Para superar a crise política, ética e moral no Brasil, é preciso
celebrar um novo pacto social que exige: 1) a renúncia de Michel Temer; 2) a
convocação de uma nova Assembleia Nacional Constituinte Exclusiva para reordenar a
vida nacional em novas bases; e, 3) realização de eleições gerais no País. Para superar a
crise ética e moral no Brasil, é preciso que a Assembleia Nacional Constituinte
Exclusiva delibere sobre a reforma política, do estado e da administração pública, além
de prevenir desvios éticos e morais de gestores públicos, com a adoção de medidas
imediatas que visem a punição exemplar de todos os que atentam contra os princípios
éticos e morais, a transparência dos atos praticados pelos gestores públicos, a vigilância
da Sociedade Civil Organizada no acompanhamento da gestão do setor público e o
combate à criminalidade.
*Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor
universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo,
1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do
desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento
(Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos
Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the
Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e
combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011),
Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012),
Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV,
Curitiba, 2015) e As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo
(Editora CRV, Curitiba, 2016). Possui blog na Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail:
falcoforado@uol.com.br.