Este artigo tem como objetivo mapear e discutir as
transformações que a sociedade está passando no novo ambiente de rede, fornecido pela Internet. Ele também pretende introduzir a rede social Fluzz, de acordo com as concepções de Augusto de Franco, concebida para aproveitar todos os benefícios da inteligência coletiva. Esta rede social tem como foco principal a troca de experiências entre os usuários, permitindo o surgimento de projetos inovadores.
1. Fluzz: Uma rede social baseada em inteligˆ ncia
e
coletiva
Ericsson Santana Marin
Instituto de Inform´ tica
a
Universidade Federal de Goi´ s (UFG)
a
Goiˆ nia – GO – Brasil
a
{ericssonmarin}@inf.ufg.br
Abstract—This article aims to map and discuss the compreens˜ o da emergˆ ncia e da capacidade da so-
a e
transformations that the society is undergoing in the ciedade humana de gerar ordem bottom-up por meio
new networked environment, provided by the Internet. It ¸˜ ¸˜
da cooperacao. Esta articulacao, modifica o background
also aims to introduce the social network Fluzz, designed e lanca novos pressupostos para as teorias sobre a
¸
to enjoy all the benefits of collective intelligence. This
¸˜
sociedade. Como aplicacao deste estudo, o projeto de
social network has as its main focus the exchange of
experiences between users, allowing the emergence of
´
uma rede social denominada Fluzz, e concebido para
innovative projects. The context established places people ¸˜
organizar, otimizar, e favorecer o processo de interacao
in a continuous process production, supporting, dissemi- a ı ¸˜
entre os usu´ rios e a busca cont´nua por inovacoes.
nating, multiplying, defending, distributing, discussing and O restante deste texto est´ organizado da seguinte
a
developing innovations in large scale. ¸˜
maneira. A secao 2 apresenta uma reflex˜ o sobre a nova
a
Index Terms—Social Networks, Collective Intelligence, ¸˜ ¸˜
sociedade em rede. A secao 3 d´ uma explanacao sobre
a
Innovation. conceitos dos sistemas complexos adaptativos e suas
¸˜ ¸˜
implicacoes em rede sociais. A secao 4 discute sobre
¸˜ ¸˜
I. S EC AO 1 - I NTRODUC AO ¸˜
inteligˆ ncia coletiva. A secao 5 realiza uma abordagem
e
A necessidade de conex˜ o do ser humano existe
a das redes sociais na Internet, com suas carater´sitcas
ı
desde o surgimento de suas habilidades de escrita h´ a ¸˜
peculiares. A secao 6 relaciona redes sociais no processo
mais de cinco mil anos. As facilidades oferecidas pela ¸˜ ´
de aprendizagem. Em seguida, na secao 7, e apresentada
Internet trouxeram um novo impulso a estas conex˜ es. o a rede social Fluzz, com os princ´pios que nortearam sua
ı
As chamadas Redes Sociais atingiram escala planet´ ria, a ¸˜
concepcao e suas principais caracter´sticas. Finalmente,
ı
¸˜
com a participacao de milh˜ es de pessoas. Bilh˜ es de
o o ¸˜ ¸˜
a secao 8 traz algumas consideracoes finais.
documentos j´ est˜ o dispon´veis em uma verdadeira
a a ı
biblioteca global, com as pessoas adquirindo capacidade ¸˜
II. S EC AO 2 - A SOCIEDADE EM REDE
de conex˜ o com quase qualquer outra pessoa no planeta.
a ´
E not´ rio que a Internet abriu as portas para o de-
o
A inteligˆ ncia coletiva sempre existiu na sociedade.
e ¸˜
senvolvimento da sociedade da informacao e do con-
Entretanto, atrav´ s da internet, esta inteligˆ ncia teve seus
e e hecimento. Hoje presencia-se a chamada Era das Redes,
horizontes abertos, rompeu barreiras para uma ativi- que vem sendo analisada por uma importante ciˆ ncia
e
dade at´ ent˜ o limitada, sobretudo geograficamente. A
e a intitulada Teoria das Redes, inicialmente proposta por
´
novidade agora e que deve-se considerar a inteligˆ ncia e Barab´ si [1], e que tem como objetivo mapear os novos
a
coletiva em rede, estimulada pela troca de informacoes ¸˜ modelos de estudo de redes.
a distˆ ncia. Com grande velocidade e a baixo custo, esta
a ¸˜ ¸˜
As facilidades de interacao, a democratizacao de
´
inteligˆ ncia e estimulada por grupos de pessoas em um
e ` ¸˜
acesso as informacoes, e o avanco das chamadas TICs
¸
¸˜
ambiente multidirecional de comunicacao, baseado no ¸˜ ¸˜
(Tecnologias de Informacao e Comunicacao), reduziram
¸˜
novo paradigma de comunicacao de muitos para muitos. os custos, aumentaram a velocidade, o alcance e a
´
O objetivo deste artigo e um estudo da inteligˆ ncia e assincronicidade, permitindo o rompimento das barreiras
coletiva e da nova sociedade em rede, a aplicacao do ¸˜ a ¸˜
temporais e geogr´ ficas da comunicacao.
instrumental das teorias dos sistemas complexos aos Segundo o psic´ logo russo, Lev Semenovich Vygot-
o
sistemas de agentes compostos por seres humanos, a ¸˜
sky (1896-1934), todas as funcoes mentais de alto n´vel
ı
2. se originam dos relacionamentos entre indiv´duos. O
ı O efeito borboleta tem servido como met´ fora para
a
pesquisador educacional Carl Bereiter [2], aprofunda algumas pesquisas sobre a influˆ ncia da Internet, por
e
ainda mais, afirmando que todo conhecimento est´ nas a considerar que, na era digital, o conhecimento adquirido
¸˜
relacoes entre os indiv´duos envolvidos numa atividade,
ı em rede, por meio da tecnologia, ocorre dentro de
¸˜
com as ferramentas que eles usam e as condicoes mate- ambientes que est˜ o, em grande parte, fora do controle
a
riais do ambiente no qual a atividade acontece. ¸˜
dos indiv´duos. Na internet a informacao compartilhada
ı
Cavalcante e Nepomuceno [3] entendem que as comu- ı ´
adquire contornos imprevis´veis, pois e dividida social-
nidades em rede s˜ o o epicentro dos projetos inovadores
a mente como resultado das conex˜ es estabelecidas.
o
do futuro, pois atuam como canais de r´ pida divulgacao
a ¸˜ Um aspecto importante da dinˆ mica das redes sociais
a
¸˜ a ¸˜
e distribuicao de ideias e produtos. S˜ o agregacoes de ´
e a sua emergˆ ncia. Trata-se de uma caracter´stica dos
e ı
pessoas em torno de interesses comuns, independente de sistemas complexos [6], e envolve o aparecimento de
¸˜
fronteiras ou demarcacoes territoriais fixas. Est˜ o abertas
a padr˜ es de comportamento em larga escala, que n˜ o s˜ o
o a a
para a troca de conhecimentos e experiˆ ncias, que geram
e necessariamente determinados em microescala. Isso quer
¸˜
oportunidades de colaboracao sem precedentes, criando dizer que as propriedades emergentes s˜ o aquelas que
a
a ¸˜
uma nova dimens˜ o para a inovacao. o sistema possui, mas que n˜ o podem ser encontradas
a
¸˜
O novo conceito ou nova geracao da Web, a chamada em suas partes individualmente. Essas dinˆ micas sociais
a
Web 3.0, que emprega al´ m da possibilidade de realizar
e podem ser constru´das coletivamente, em um processo
ı
¸˜
transacoes, Web 1.0, e de poder participar e produzir, Web ´
bottom-up, que e o mecanismo da emergˆ ncia, pois de-
e
2.0, tamb´ m admite a qualquer um inovar, programar
e nota como esses comportamentos devem vir debaixo para
as interfaces de sua maneira, agregar valores, classificar, cima em um determinado sistema. Para Recuero [7],
´
tornando-se multifuncional. O momento e de ubiquidade, a emergˆ ncia aparece com o surgimento de comporta-
e
e como afirma o professor e cientista S´lvio Meira da
ı mentos coletivos, n˜ o centralizados. Dentro desta esfera,
a
¸˜
UFPE, de dividir a atencao com v´ rias coisas simultane-
a o aparecimento da ordem em sistemas ca´ ticos, a auto-
o
¸˜
amente, em um processo de atencao parcial cont´nua. ı ¸˜ ¸˜
organizacao e a adaptacao dos sistemas, s˜ o considerados
a
Aquilo que Einstein (1879-1955) chamou de bomba comportamentos emergentes. O pr´ prio surgimento das
o
¸˜
das telecomunicacoes foi chamado por Roy Ascott [4] redes sociais na internet pode ser considerado como um
¸˜
de segundo dil´ vio, o das informacoes, por conta da
u comportamento emergente e auto-organizado.
natureza exponencial, e ca´ tica de seu crescimento.
o
¸˜
III. S EC AO 3 - S ISTEMAS COMPLEXOS ADAPTATIVOS
Ludwig Von Bertalanffy [5], desenvolveu a chamada
Teoria Geral dos Sistemas, que implicava em uma
¸˜
reorientacao fundamental do pensamento cient´fico so-
ı
bre os sistemas. Neste estudo, ele afirmava que, para
¸˜
Figura 1 - Representacao de um sistema complexo
entender um fenˆ meno, era necess´ rio observar n˜ o
o a a
¸˜
apenas suas partes, mas suas partes em interacao. Esses Johnson [6] afirma que os coletivos inteligentes que
estudos coincidiram com diversas outras abordagens que ¸˜ ¸˜
as redes de comunicacao colocaram em acao, exibem
buscavam superar o paradigma anal´tico-cartesiano.
ı caracter´sticas que s˜ o pr´ prias dos sistemas complexos
ı a o
No in´cio da d´ cada de 1960, o meteorologista amer-
ı e adaptativos, ou seja, processos emergentes que operam a `
icano Edward Lorenz iniciou estudos que ficaram con- semelhanca dos sistemas de enxames, cujas principais
¸
hecidos como Teoria do Caos, a partir da matem´ tica a caracter´sticas s˜ o: ausˆ ncia de controle centralizado,
ı a e
n˜ o linear. Ao estudar um programa de computador que
a natureza autˆ noma das subunidades, alta conectividade
o
testava o movimento de massas de ar, Lorenz constatou entre as subunidades e causalidade em rede n˜ o linear
a
¸˜
que pequenas alteracoes ao longo de um processo pode- de iguais que exercem influˆ ncia sobre iguais.
e
¸˜
riam representar, ao final, consequˆ ncias de proporcoes
e
incalcul´ veis. Esse efeito desordenado e imprevis´vel foi
a ı ¸˜ ˆ
IV. S EC AO 4 - A INTELIG E NCIA COLETIVA
definido como efeito borboleta, e de acordo com seu ¸˜
Compartilhar informacoes, ou compartilhar descober-
criador, poderia ser entendido como se o bater de asas ´
tas importantes, e um benef´cio que ajuda as pessoas a
ı
de uma borboleta na China pudesse provocar, tempos ¸˜
agirem mais r´ pido. A colaboracao gera sinergia, e con-
a
depois, um tornado no Texas. sequentemente melhorias, competitividade e inovacao,¸˜
3. criando o ambiente ideal para novas ideias. imento. Examinando os espacos que foram representa-
¸
Pierre L´ vy [8] define a inteligˆ ncia coletiva como
e e ¸˜
tivos para a hist´ ria da inovacao da humanidade, Johnson
o
uma inteligˆ ncia distribu´da por toda parte, incessante-
e ı [9] descobriu alguns padr˜ es recorrentes, e batizou um
o
mente valorizada, coordenada em tempo real, que resulta deles de Slow Hunch, ou palpite lento.
¸˜
em uma mobilizacao efetiva das competˆ ncias, tendo
e Segundo Johnson, as ideias precisam de um tempo
como base e objetivos, o conhecimento e o enriqueci- ¸˜
de incubacao, e passam por um bom tempo na forma
¸˜
mento m´ tuo das pessoas. Comporta a nocao de que o
u de palpite parcial. Consequentemente, quando as ideias
¸˜
universo dos internautas pode fornecer informacoes mais ganham forma neste estado de palpite, elas precisam
´
exatas do que peritos individuais. A ideia e que o todo colidir com outros palpites. Para Johnson, aquilo que
seja capaz de se autocorrigir. a ´
transforma um palpite em algo extraordin´ rio, e outro
Segundo Cavalcante e Nepomuceno [3], essa in- palpite, que andou povoando a mente de outra pessoa.
teligˆ ncia coletiva pode ser classificada de trˆ s formas:
e e Seguindo o racioc´nio do autor, boas ideias surgem da
ı
a inconsciente, que ocorre quando o usu´ rio contribui
a colis˜ o entre dois palpites menores, que formam portanto
a
¸˜
com alguma informacao para o coletivo, mesmo sem algo maior do que eles pr´ prios.
o
saber, pelo simples fato de navegar; a consciente que ¸˜
O grande propulsor da inovacao cient´fica e tec-
ı
ocorre quando o usu´ rio contribui de maneira volunt´ ria
a a nol´ gica, sempre foi o aumento hist´ rico na conectivi-
o o
e efetiva; a plena, que potencializa as duas formas dade, e na capacidade das pessoas de buscar parceiros
´
anteriores. Para os autores, o ideal e que em projetos de com quem possam trocar ideias, e pegar emprestado
inteligˆ ncia coletiva em rede, a inteligˆ ncia plena esteja
e e palpites alheios, combin´ -los com seus pr´ prios palpites,
a o
presente. e transform´ -los em algo novo. Pensar em formas de
a
Pode-se notar, dessa forma, uma profus˜ o de co-
a se criar sistemas e ambientes, que permitam que esses
munidades em redes articuladas que surgem como um palpites se unam, e se tornem algo maior do que eram
rem´ dio para o veneno da velocidade acelerada das
e ´
em partes independentes, e um desafio para a sociedade.
¸˜
mudancas, da especializacao crescente, do tempo escasso
¸
¸˜
V. S EC AO 5 - R EDES S OCIAIS NA I NTERNET
¸˜
e do excesso de informacao. Assim, participar de uma
´
comunidade em rede e uma sa´da para solucionar estes
ı ¸˜ ´
A nocao de rede e onipresente e onipotente em todas
¸˜
problemas, pois permite a ampliacao da capacidade de a ´
as disciplinas. A tem´ tica e complexa, e transita em todas
coleta e an´ lise r´ pida de dados, filtrando o que e
a a ´ ´
as areas de conhecimento. Redes Sociais complexas
relevante, atrav´ s do contato regular de um determinado
e sempre existiram, mas os desenvolvimentos tecnol´ gicoso
grupo que partilhe os mesmos interesses. Toda essa recentes permitiram sua emergˆ ncia como uma forma
e
rede de conex˜ es, utiliza os conhecimentos coletivos e
o ¸˜
dominante de organizacao social. Exatamente como uma
volunt´ rios espalhados pela internet, criando conte´ do,
a u rede de computadores conecta m´ quinas, uma rede social
a
¸˜
solucoes ou desenvolvendo tecnologias. ¸˜
conecta pessoas, instituicoes e suporta redes sociais.
´
Uma Rede Social na Internet RSI e uma estrutura
composta pelos atores (n´ s), que s˜ o representacoes
o a ¸˜
¸˜
das pessoas ou organizacoes, e pelas conex˜ es, con-
o
ı ¸˜
stitu´das de relacoes e lacos sociais, formados atrav´ s
¸ e
¸˜
das interacoes entre os atores. Os sites de redes sociais,
¸˜
que permitem a representacao das RSIs, s˜ o sistemas que
a
¸˜
admitem a construcao de uma persona atrav´ s de ume
¸˜
perfil pessoal, a interacao atrav´ s de coment´ rios e a
e a
¸˜ u
exposicao p´ blica da rede social de cada ator.
¸˜
Apesar de existirem prescricoes, no sentido de que os
recursos t´ cnicos e program´ ticos criam um l´ gica de
e a o
funcionamento poss´vel para as RSIs, segundo Santaella
ı
e Lemos [10], as mesmas gozam de mais liberdade, uma
Figura 2 - Processo de inteligˆ ncia coletiva. Fonte: Cavalcante e
e
liberdade de entrar, sair, usar at´ o ponto ponder´ vel ou
e a
Nepomuceno [3]
imponder´ vel que for de interesse do usu´ rio.
a a
¸˜ ´
A producao de ideias, portanto, e um processo criativo Para Recuero [7], o capital social, ou o conjunto de
e coletivo, por´ m necessita de um tempo de amadurec-
e ¸˜
recursos e relacoes de conhecimento de um determinado
4. grupo, n˜ o est´ individualmente nas pessoas, mas em sua
a a pr´ xima da realidade dessas redes.
o
¸˜
estrutura de relacoes. Os tipos de capital social atuam
n˜ o apenas como motivadores para as conex˜ es, mas
a o
tamb´ m auxiliam a moldar os padr˜ es que v˜ o emergir
e o a
¸˜
da apropriacao dos diversos sites de redes sociais.
¸˜
Outro fator impactante na forma das relacoes e a ´
topologia da rede. Augusto de Franco [11] aponta que
´
esta topologia e um fator decisivo, sendo umas mais, e Figura 4 - Modelo de Redes de Mundos Pequenos
¸˜
outras menos eficientes, para a acao dos grupos sociais.
Franco parte dos velhos diagramas de Paul Baran (1964), ¸˜
VI. S EC AO 6 - R EDES S OCIAIS NO PROCESSO DE
esbocados em um documento em que o autor descrevia
¸ APRENDIZAGEM
a estrutura de um projeto que mais tarde se converteria Pierre L´ vy [8] afirma que o crescimento do
e
na Internet, em sua vers˜ o original.
a ciberespaco resulta de um movimento internacional de
¸
Paul Baran pesquisava qual a maneira mais segura ´
jovens avidos para experimentar, coletivamente, for-
¸˜
e sustent´ vel de organizar as estacoes de transmiss˜ o
a a ¸˜
mas de comunicacao diferentes daquelas que as m´dias ı
¸˜
de r´ dio e telecomunicacoes, para que as mesmas so-
a cl´ ssicas prop˜ em.
a o
brevivessem a uma cat´ strofe nuclear. Seu documento
a Nesta nova sociedade do conhecimento, o que se re-
apresentava trˆ s topologias b´ sicas:
e a ´
quer e que as pessoas sejam capazes de criar e de inovar,
mudando continuamente os processos de producao e ¸˜
de gest˜ o, para descobrir maneiras melhores de fazer e
a
´
organizar as coisas. E ensejar oportunidades aos educan-
dos de se tornarem educadores de si mesmos. Aprender
a aprender est´ intimamente relacionado a aprender a
a
interagir em rede.
´
Para Augusto de Franco [11], e necess´ rio libertar o
a
processo educativo das amarras que tentam normatiz´ - a
¸˜
lo de cima para baixo, em instituicoes hierarquizadas,
burocratizadas e fechadas, desenhadas para guardar em
Figura 3 - Topologias de Redes. Fonte: Baran (1964)
caixinhas o suposto conhecimento a ser transferido,
Nas trˆ s imagens representadas na Figura 3, os n´ s
e o de uma maneira pr´ -determinada, para indiv´duos que
e ı
s˜ o os mesmos, variando somente a forma de conex˜ o.
a a ¸˜
preencherem determinadas condicoes.
Para Franco, apenas o terceiro tipo, ou modelo dis- Franco insiste que sistemas educativos devem ser
´
tribu´do, e considerado uma rede propriamente dita,
ı sempre sistemas socioeducativos configurados em local-
¸˜ ¸˜
cuja configuracao permite a ligacao das pessoas entre idades, em socioterritorialidades, quer dizer, em redes
si P2P, sem a existˆ ncia de um centro articulador ou
e sociais que se constituem como comunidades, compar-
coordenador. As outras duas topologias, centralizada e tilhando agendas de aprendizagem.
descentralizada, podem ser chamadas de redes, mas ape- ´ ¸˜
Nesta epoca, a educacao livre nunca foi t˜ o acess´vel.
a ı
nas como casos particulares (em termos matem´ ticos).
a A Web proporciona aos estudantes ao longo da vida as
Ambas s˜ o, na verdade, hierarquias, pois possuem um
a ferramentas para se tornarem autodidatas, para ingressar
´
unico, ou alguns poucos protagonistas, que exercem nas fileiras de outros autodidata grandes pensadores da
poder verticalizado perante os outros n´ s.
o hist´ ria, como Albert Einstein, Alexander Graham Bell,
o
a `
Outra an´ lise complementar as redes distribu´das,
ı Paul Allen e Ernest Hemingway.
´
e que elas possuem um forte componente de mundo A nova sociedade em rede promover´ uma aceleracao
a ¸˜
pequeno. O modelo de mundo pequeno, criado por ¸˜
das competicoes, entre os sistemas, pessoas, empresas, e
Ducan Watts e Steven Strogatz [12], demonstrava que a ¸˜
tamb´ m provocar´ uma aceleracao das possibilidades de
e a
distˆ ncia m´ dia entre quaisquer duas pessoas no planeta
a e ¸˜
cooperacao. As pessoas poder˜ o cooperar muito mais,
a
n˜ o ultrapassaria um n´ mero pequeno de outras pessoas,
a u dentro de um contexto de abundˆ ncia de informacao e
a ¸˜
bastando que alguns lacos aleat´ rios fossem acrescidos
¸ o conhecimento, onde se muda integralmente o lema de
´
entre os grupos. Este tipo de modelo e especialmente educar. Antes o necess´ rio era decorar, agora precisa-se
a
aplicado para redes sociais e mostra uma rede mais aprender processos, m´ todos, estruturas no n´vel meta,
e ı
5. ou acima do conte´ do, para que seja poss´vel elicitar,
u ı modelo que tem se desenvolvido em diversos projetos
elaborar, capturar e gerar conhecimento novo, realizando cooperativos. O acesso livre e aberto aos conte´ dos u
¸˜
processos de cooperacao com os sistemas, com as pes- ´
postados pelos usu´ rios e um diferencial, sem qualquer
a
soas, com as redes. Tudo isto criar´ um n´ mero de
a u mecanismo de restricao.¸˜
¸˜
oportunidades de educacao fant´ stico.
a o ¸˜ ¸˜
No Fluzz, a tˆ nica da interacao e da formacao de lacos ¸
¸˜
Esse processo de educacao tem que ser transformado sociais n˜ o pode ser baseada em v´nculos preexistentes,
a ı
radicalmente em um processo de aprendizado, saindo de ¸˜
mas sim na penetracao individual em fluxos de ideias,
um processo hier´ rquico, para um processo comunit´ rio,
a a fluxos coletivos abertos de ideias compartilhadas em
de aprendizado cont´nuo, em um contexto segundo S´lvio
ı ı tempo real, que est˜ o em movimento cont´nuo. Por isso
a ı
Meira (UFPE) de coopeticao. Competir e cooperar si-
¸˜ ele possui uma dinˆ mica diferente das conhecidas RSIs.
a
multaneamente, usando intensivamente as ferramentas ¸˜
Os atores podem fazer sugest˜ es, indicacoes, cr´ticas,
o ı
que s˜ o os l´ pis de hoje.
a a elogios. Podem criar experimentos e solicitar ajuda
A mudanca do sistema educacional vai transformar a
¸ quando necess´ rio. Podem apresentar resultados, pos-
a
¸˜
educacao, de um sistema concentrado em estruturas e itivos ou negativos dos experimentos individuais ou
¸˜
restricoes, para um sistema conjuntural e de articulacao ¸˜ coletivos. A ideia foi de criar um amplo campo de
m´ tua para resolver problemas. Ser˜ o estabelecidos
u a ¸˜
projetos, em execucao, ou j´ finalizados. Isso propicia
a
e ¸˜
processos e m´ todos, propiciando articulacoes em um um interessante ambiente de conhecimento coletivo.
paradigma conjuntural de forma intensa, com alta conec- ´
O foco do Fluzz e colocar o que est´ na cabeca
a ¸
¸˜
tividade e interacao, estimulando a reflex˜ o coletiva, que-
a das pessoas, de forma t´ cita, em forma de processos.
a
brando hierarquias, deslocalizando e dessincronizando a ¸˜ ´
A melhor maneira de prover inovacoes e atrav´ s de e
¸˜
geografia do conhecimento e das acoes humanas. ´
projetos, que s˜ o empreendimentos unicos, tempor´ rios,
a a
¸˜
em busca da realizacao de algum objetivo. No ambiente
¸˜
VII. S EC AO 7 - O PROJETO F LUZZ do Fluzz, as pessoas podem criar e compartilhar projetos.
A palavra fluzz nasceu de uma conversa informal ¸˜
A metodologia utilizada para criacao do projeto foi
do autor Augusto de Franco, no in´cio de 2010, com
ı inspirada na metodologia criada por Cavalcante e Nepo-
Marcelo Estraviz, sobre o Buzz do Google. O autor muceno [3], e nas ideias de interatividade de Johnson
observava que Buzz n˜ o captava adequadamente o fluxo
a [9] e Franco [13], cujas propostas s˜ o gerar inteligˆ ncia
a e
¸˜
da conversacao, argumentando que era necess´ rio criar
a ¸˜
coletiva, mediante a ampliacao do crescimento individual
¸˜
outro tipo de plataforma, i-based, baseada na interacao e e do grupo.
a ¸˜
n˜ o p-based, baseada na participacao. Marcelo Estraviz De acordo com a metodologia citada, as acoes que ¸˜
¸˜
respondeu com a interjeicao fluzz, na ocasi˜ o mais como
a fazem a diferenca, criando um cen´ rio de swarming, ou
¸ a
uma brincadeira, para tentar traduzir a ideia de Buzz mais enxameamento s˜ o: conectar, item fundamental para que
a
fluxo, que mais tarde se converteria no nome do livro de o usu´ rio esteja no ambiente em rede; agrupar, encontrar
a
Franco, Fluzz: Vida humana e convivˆ ncia social nos
e rapidamente suas comunidades para trocar experiˆ ncias; e
novos mundos altamente conectados do terceiro milˆ nio e interagir, dentro da rede, participar efetivamente; con-
[13]. ¸˜
hecer, a partir da interacao, ampliar o conhecimento
O objetivo do projeto, homˆ nimo do livro de
o nos temas discutidos; inovar, a partir do conhecimento,
Franco, consiste em construir uma rede social artic- ¸˜
iniciar o ciclo de reciclagem e inovacao; mudar, permitir
ulada, provinda das inteligˆ ncias coletivas consciente
e mudancas sociais para o indiv´duo, e o grupo-alvo.
¸ ı
e inconsciente. O projeto foi elaborado a partir das
estruturas de microblogging e conex˜ es do Twitter, com
o
algumas caracter´sticas do Storify e do Instructables, mas
ı
com algumas funcionalidades, e espacos de interacoes
¸ ¸˜
´
diferenciados. Uma dessas funcionalidades, e um espaco ¸
¸˜
maior para fundamentacao, ou detalhamento de ideias,
quando necess´ rio.
a
O Fluzz possui ambiente de usu´ rio e de comu-
a
nidades. As comunidades devem estar submetidas ao Figura 5 - Modelo Ontol´ gico do Fluzz. Fonte: Cavalcante e
o
Nepomuceno [3]
princ´pio da autogest˜ o. Os usu´ rios que sa´rem da linha
ı a a ı
ser˜ o aos poucos banidos pela pr´ pria comunidade, um
a o A ferramenta possui recursos para envio de mensagens
6. do espaco individual para o coletivo com facilidade.
¸ eficiˆ ncia dos grupos-alvo; criar e ampliar mercados;
e
e a `
Tamb´ m garante, tanto ao usu´ rio quanto a comunidade, aumentar a velocidade de aprendizado; gerar novos
acesso as ferramentas interativas da rede como chat, tipos de conhecimento; articular especialistas para evitar
blogs, armazenamento de arquivos, integracao com as ¸˜ ¸˜ ´
duplicacao de esforcos. E nesse contexto que a rede
¸
principais redes sociais. ¸˜
social Fluzz surge, promovendo interacoes m´ tuas entre
u
O Fluzz provˆ de mecanismos de opcao de recebi-
e ¸˜ ¸˜
os participantes, caracterizadas por relacoes interdepen-
mento de mensagens por email, para sempre alertar os ¸˜
dentes e processos de negociacao, em que cada intera-
¸˜
usu´ rios de alguma movimentacao relativa ao seu perfil.
a ¸˜
gente participa da construcao inventiva e cooperada da
´ ´
O ambiente individual e uma area onde o usu´ rio a ¸˜
relacao.
pode estabelecer sua identidade e disponibilizar as ¸˜ ¸˜
A utilizacao do Fluzz para engajamento e participacao
¸˜
informacoes que considerar relevante. Uma esp´ cie de e ¸˜ ´
em colaboracao intelectual on-line e um exemplo que
blog individual onde ele possa postar artigos, teses, demonstra como o encadeamento de respostas e o
relat´ rios, fotos, v´deos, links, pdfs, slides. Todas as
o ı entrelacamento de ideias em fluxos coletivos pode ser um
¸
¸˜
informacoes devem ser pass´veis de coment´ rios dos
ı a processo complexo, que envolve dinˆ micas de interacao
a ¸˜
¸˜
usu´ rios, sempre com quantificacao dos resultados.
a ´
em tempo real. Essa e uma m´dia que pode ser usada
ı
¸˜
Recursos para criacao de enquetes, al´ m de ferramen-
e simultaneamente para engajar os membros de uma co-
¸˜
tas de animacao foram disponibilizados. Os ambientes munidade ao redor de uma ideia, aferir o entendimento
de comunidades, operam plenamente dentro do conceito coletivo do grupo sobre determinado conceito, detectar
¸˜
de muitos para muitos, sem a intervencao de um con- e ¸˜ ¸˜
tendˆ ncias, promover solucoes e inovacoes.
trolador de conte´ do. O mecanismo de animacao possui
u ¸˜ ¸˜
A ideia principal de concepcao do Fluzz, foi de criar
a inteligˆ ncia de destacar na primeira p´ gina, os itens
e a um espaco no qual o surgimento das ideias emergisse na
¸
mais relevantes, ou os mais consultados pelos membros ¸˜
medida em que relacoes de exterioridade s˜ o estabele-
a
daquela comunidade. cidas entre os conte´ dos da experiˆ ncia. Foi idealizada
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Existe na ferramenta um mecanismo de busca para ¸˜
a criacao de um modelo ontol´ gico bottom-up, onde as
o
rastrear conte´ do atrav´ s de crit´ rios n˜ o somente
u e e a ¸˜
pessoas possam desenvolver solucoes colaborativamente,
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semˆ nticos, mas de valoracao pelos pr´ prios usu´ rios,
a o a ¸˜
combinando as solucoes e o conte´ do de mais de um
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usando o conceito de folksonomia. Nenhum tipo de projeto para produzir uma experiˆ ncia integrada.
e
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anonimato e poss´vel, para permitir a criacao de lacos
ı ¸˜ ¸ R EFERENCES
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que geram conhecimento. Educacao e etiqueta dever˜ o a
[1] A. L. Barabasi, How Everything is Connected to Everything
ser medidos pelos pr´ prios membros da rede, em con-
o else and what it means for Business, Science and Everyday
stante busca pela autorregulacao. ¸˜ Life. Editora Plume, 2003.
´
Outro recurso importante do Fluzz, e a liberacao de ¸˜ [2] C. Bereiter, Education and Mind in the Knowledge Age. Edi-
¸˜
sua API para construcao de aplicativos que utilizem das tora Lawrence Erlbaum Associates, 2009.
[3] M. Cavalcanti and C. Nepomuceno, O Conhecimento em Rede.
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informacoes contidas na plataforma. Editora Elsevier, 2007.
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A unica regra expl´cita do Fluzz e que um perfil
ı [4] P. Levy, Cibercultura. Editora 34, 1999.
com mais de trinta dias sem qualquer visita de seu pro- [5] L. V. Bertalanffy, Teogia Geral dos Sistemas. Editora Vozes,
1975.
priet´ rio, ser´ devidamente colocado em modo stand by,
a a [6] S. Johnson, Emergence: The Connected Lives of Ants, Brains,
deixando de estar ativo na rede. Estimular a colaboracao ¸˜ Cities, and Software. Editora Scribner, 2001.
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e um ato cont´nuo, que n˜ o pode ser realizado espo-
ı a [7] R. Recuero, Redes Sociais na Internet. Editora Sulina, 2009.
radicamente. Dessa forma o usu´ rio n˜ o entendeu o
a a [8] P. Levy, A Inteligencia Coletiva. Editora Loyola, 1994.
[9] S. Johnson, Where Good Ideas Come From: The Natural
prop´ sito principal desta rede social. O lema do Fluzz e:
o ´ History of Innovation. Editora Riverhead Hardcover, 2010.
n˜ o basta participar, tem que interagir. Criando projetos,
a [10] L. Santaella and R. Lemos, Redes sociais digitais - a cognicao
opinando, indicando, criticando, recriando. conectiva do Twitter. Editora Paulus, 2010.
[11] A. de Franco, Escola de Redes: Novas visoes sobre a sociedade,
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VIII. S EC AO 8 - C ONSIDERAC OES F INAIS o desenvolvimento, a Internet, a politica e o mundo glocalizado.
Editora Saturnos Assessoria em Comunicacao Social S/C Ltda,
¸˜
Uma populacao cada vez mais articulada em uma rede 2008.
distribu´da ser´ capaz de: dar respostas mais r´ pidas para
ı a a [12] D. Watts and S. Strogatz, Collective Dynamics of small-world
networks. Editora Nature, 1998.
mudancas de cen´ rios internos e externos; articular-se
¸ a
[13] A. de Franco, Fluzz: Vida humana e convivencia social nos
´
sem limites regionais por areas de interesse e atuacao ¸˜ novos mundos altamente conectados do terceiro milenio. Ed-
para atividades diversas; fiscalizar, e cobrar por mais itora Escola de Redes, 2011.