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A rapariga discriminada


       Estava um dia de sol na cidade de Banguecoque, Tailândia, e a família Haong,
que vivia na ruela Tiny, estava a cumprir a sua rotina diária: a senhora Haong estava a
fazer olaria, o senhor Haong ocupava-se dos seus negócios e Maya, a única filha,
encontrava-se na escola da cidade. A sua mãe e o seu pai trabalhavam todo o dia sem
pausa para descansar e ela ia para a escola.
       Maya tinha 11 anos. Era uma rapariga morena, com cabelos longos, lisos e
negros. Os seus olhos tinham a forma amendoada e eram pretos como duas azeitonas.
       Para além da escola, a jovem tinha outros interesses: fazia ginástica acrobática
desde tenra idade, ia à piscina uma vez por semana e, nos tempos livres, adorava dar um
passeio de elefante.
       Mas, um dia, as suas vidas mudaram totalmente… Um grupo de jovens que
residia na cidade estava descontente com a situação atual do país e decidiu revoltar-se
contra o governo. A população toda manifestou-se nas ruas com bandeiras e apupos
contra o estado atual da nação. A confusão instalou-se com roubos, violência e até
mortes.
       Como a situação estava complicada e não havia segurança na cidade e no país, a
família Haong teve de se mudar para outro país, tendo optado por Portugal, um país
inteiramente desconhecido e situado no outro lado do mundo.
          De repente, viram-se numa situação de pobreza extrema à qual não estavam
habituados e tiveram de abdicar de todos os pequenos luxos a que estavam
acostumados.
       Ao chegarem a Portugal, mais precisamente a Lisboa, tiveram a ajuda de uma
instituição que os acolheu com muito prazer. Também contaram com o apoio de uma
igreja da cidade que lhes cedeu uma modesta casa com água, luz, móveis e alguns
eletrodomésticos básicos. Ofereceram-lhes comida e colocaram Maya na escola mais
próxima.
       Durante muito tempo, a família Haong procurou trabalho em muitos locais até
que a mãe de Maya encontrou emprego num escritório de uma loja chinesa e o pai nos
serviços administrativos da junta de freguesia da sua área de residência.

                                                                                     1
Com o rendimento do seu trabalho, foram conseguindo pagar as suas despesas e
a sua comida. Contudo, continuavam a precisar da preciosa ajuda da instituição que os
acolhera, para continuarem a pagar a renda da casa.
       Quando viviam na Tailândia, sempre sonharam construir uma linda mansão com
três andares, com imponentes escadarias, fabulosas carpetes a perder de vista, imensos
quartos e duas salas enormes repletas de cristais fantásticos. Mas o sonho das suas vidas
tinha ruído. No entanto, apesar das enormes adversidades, nunca desistiram dos seus
ideais de justiça, solidariedade e trabalho.
       Maya frequentava a EB 2,3 da Caparica, mesmo à porta de casa. Esta escola era
como qualquer outra: era multicultural, tinha bolsas para alunos carenciados, tinha
clubes para ocupar os alunos nos tempos livres e desporto escolar.
       Maya vivia o dia a dia na escola com muita dificuldade, pois não conseguia fazer
amigos, todos a olhavam com enorme desconfiança. Nas aulas, mantinha-se silenciosa,
sentada ao fundo da sala, rezando para que nenhum professor a interpelasse. Nos
recreios, sentava-se sozinha, num recanto. Sozinha não era bem assim, pois contava
sempre com a excelente companhia e a preciosa amizade de um livro, mas este não lhe
chegava. Os colegas gozavam-na por ser estrangeira e insultavam-na, contudo, Maya
tentava sempre ignorá-los, mas a situação estava a ser muito difícil e a tornar-se
insuportável.
       Passaram dias, semanas, meses e ninguém brincava com ela. Maya não estava a
entender a razão de tanto afastamento. Todos os dias a situação se repetia e Maya não
contava aos pais o que acontecia na escola, com a ténue esperança de conseguir resolver
este seu problema.
       Um dia, um rapaz negro entrou para a sua turma e começou também a ser
descriminado. A rapariga, ao vê-lo tão abatido, ficou feliz por ter alguém que percebia o
que ela sofria na escola.
       Num intervalo, Maya, apesar das suas enormes dificuldades com a língua
portuguesa, conseguiu questionar o colega:
       _ Qual é o teu nome e de onde vens?




                                                                                       2
_ Chamo-me Nali. Sou do Senegal, da tribo Halkimaia e, como os meus pais
vieram para aqui trabalhar, eu fui inscrito nesta escola. E tu como te chamas? –
perguntou ele com sotaque africano.
        _ O meu nome é Maya. Vim da Tailândia, fugida da revolta e da guerra que se
vivia no meu país. Vim com a minha família há algum tempo.
        O intervalo da manhã tinha acabado e todos os alunos foram para as salas de
aula.
        Ao fim do dia, Maya e Nali despediram-se um do outro e cada um foi para o seu
lar.
        No dia seguinte, já eles conseguiam planear passeios para fazerem fora do
horário escolar, estudos em casa um do outro e muitas outras coisas interessantes.
        Mas, como os colegas de turma eram muito racistas, nunca se aproximavam
deles nos intervalos, na hora de almoço ou até para a elaboração de trabalhos de grupo.
Contudo, um dia, na aula de Formação Cívica, o professor sem comentar, mas
apercebendo-se do que estava a acontecer na sua turma, solicitou aos alunos que
fizessem um trabalho de grupo sobre as virtudes e os defeitos dos alunos da turma. Este
tema suscitou de imediato um enorme burburinho na aula, criando desde logo a
confusão para a constituição dos grupos. É certo que Maya e Nali foram imediatamente
excluídos, não tendo havido, por parte dos colegas, qualquer interesse em incluí-los. O
professor deixou que os grupos se formassem assim e que os dois colegas estrangeiros
constituíssem o seu próprio grupo.
        No dia da apresentação dos trabalhos, para surpresa de todos, o referido
professor trazia ele próprio uma lista com as virtudes e os defeitos de cada aluno da
turma. A avaliação atribuída ao trabalho traduzia a falta de civismo e de valores sociais
dos alunos. Assim, o professor sugeriu que fizessem um novo trabalho, incluindo nos
grupos os colegas que estavam a ser excluídos. Como Maya e Nali eram excelentes
alunos, deram um grande contributo para esse trabalho. Porém, fora da sala de aula,
tudo se mantinha, os colegas continuavam afastados.
        Maya estava cansada de ser humilhada e decidiu contar em casa o que se estava
a passar na escola, pois todos os dias chorava porque os colegas a maltratavam apenas
por ter costumes diferentes. De imediato, os pais dirigiram-se à escola e expuseram o
problema ao Diretor. Este foi à sala de aula e falou com os alunos da turma para
compreender o que estava a acontecer. A turma foi obrigada a fazer trabalhos de
                                                                                       3
pesquisa sobre a multiculturalidade, sobre o racismo na escola e sobre os valores
humanos.
       Na semana seguinte, foram obrigados a apresentar os seus trabalhos a todas as
turmas da escola. Deste modo, toda a escola compreendeu que a cor da pele não é
relevante para a criação de amizades, para maior ou menor sabedoria ou para traduzir
melhores ou piores valores humanos.
       Apesar de tudo isto, a situação continuava desagradável. A menina adorava ler e
mergulhava no mundo da fantasia para esquecer o inferno que estava a viver. À noite,
ao deitar, tinha sempre a companhia de um livro.
       Naquela noite, estrelada e linda, algo de estranho lhe aconteceu. Quando foi
abrir a gaveta do armário para tirar um pijama, ouviu uma voz que lhe sussurrava:
       _ Olha Maya, andas tão preocupada, tão triste, abres e fechas as minhas gavetas
com tanta força!... O que se passa contigo?
       Maya olhou à sua volta assustada sem perceber o que estava a acontecer. Gelou
e parou, com os negros olhos bem abertos, fitando afincadamente todas as gavetas do
armário. Tomou coragem e abriu-as e fechou-as delicadamente. Por fim, o armário
voltou a falar-lhe:
       _ Não te queria assustar, apenas sou um amigo cá de casa que não te faço mal,
guardo delicadamente as tuas roupas, fecho em mim muitos dos teus segredos…
       Maya respirou fundo e contou-lhe o que lhe ia na alma.
       O armário soltou uma lágrima de tristeza com aquela amarga história e a sua voz
tremeu, dizendo:
       _ Amigaaaaaa…., juntos vamos conseguir fazer ver aos teus colegas que a
amizade não se faz por aparências, mas por sentimentos. Amanhã, vais sentar-te ao lado
de um colega e deves participar na aula sem medo, pois tu própria não podes afastar-te.
Ao almoço, mesmo que te gozem deves sentar-te próximo deles, sem receio de dar o
primeiro passo e verás que, no final desta semana, te sentirás bem melhor.
       Maya deitou-se e pegou no seu livro, mas não conseguia concentrar-se,
acabando por adormecer. Dormiu muito mal nessa noite. Estava nervosa e confusa com
tudo isto: a situação da escola, um armário no quarto que falava, tudo lhe era
demasiadamente estranho.
       No dia seguinte, respirou fundo, entrou na sala de aula e sentou-se ao lado de
uma colega. Participou ativamente nas aulas e foi elogiada pelos professores.
                                                                                     4
Passou a ir com frequência à biblioteca da escola, sentava-se ao lado dos colegas
no refeitório e, nos recreios, para além da habitual companhia de Neli, passou a ter a
companhia da colega de carteira.
       A partir dessa altura, os colegas de Maya e Nali começaram gradualmente a
aproximar-se deles. Certo é que Maya passou a estar muito mais feliz nas aulas e, no
final do primeiro período, já contava com a amizade de duas colegas que estudavam
com ela e iam a sua casa.
       Maya, todos os dias, conversava com o seu armário confidente. Contava-lhe
agora, não as tristezas dos seus dias, mas as alegrias da sua vida.
       Os pais tinham trabalho e Maya tinha, finalmente, amigos na escola. Os seus
resultados escolares melhoraram e recebeu o diploma de mérito no final do ano.




                                                                                      5

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  • 1. A rapariga discriminada Estava um dia de sol na cidade de Banguecoque, Tailândia, e a família Haong, que vivia na ruela Tiny, estava a cumprir a sua rotina diária: a senhora Haong estava a fazer olaria, o senhor Haong ocupava-se dos seus negócios e Maya, a única filha, encontrava-se na escola da cidade. A sua mãe e o seu pai trabalhavam todo o dia sem pausa para descansar e ela ia para a escola. Maya tinha 11 anos. Era uma rapariga morena, com cabelos longos, lisos e negros. Os seus olhos tinham a forma amendoada e eram pretos como duas azeitonas. Para além da escola, a jovem tinha outros interesses: fazia ginástica acrobática desde tenra idade, ia à piscina uma vez por semana e, nos tempos livres, adorava dar um passeio de elefante. Mas, um dia, as suas vidas mudaram totalmente… Um grupo de jovens que residia na cidade estava descontente com a situação atual do país e decidiu revoltar-se contra o governo. A população toda manifestou-se nas ruas com bandeiras e apupos contra o estado atual da nação. A confusão instalou-se com roubos, violência e até mortes. Como a situação estava complicada e não havia segurança na cidade e no país, a família Haong teve de se mudar para outro país, tendo optado por Portugal, um país inteiramente desconhecido e situado no outro lado do mundo. De repente, viram-se numa situação de pobreza extrema à qual não estavam habituados e tiveram de abdicar de todos os pequenos luxos a que estavam acostumados. Ao chegarem a Portugal, mais precisamente a Lisboa, tiveram a ajuda de uma instituição que os acolheu com muito prazer. Também contaram com o apoio de uma igreja da cidade que lhes cedeu uma modesta casa com água, luz, móveis e alguns eletrodomésticos básicos. Ofereceram-lhes comida e colocaram Maya na escola mais próxima. Durante muito tempo, a família Haong procurou trabalho em muitos locais até que a mãe de Maya encontrou emprego num escritório de uma loja chinesa e o pai nos serviços administrativos da junta de freguesia da sua área de residência. 1
  • 2. Com o rendimento do seu trabalho, foram conseguindo pagar as suas despesas e a sua comida. Contudo, continuavam a precisar da preciosa ajuda da instituição que os acolhera, para continuarem a pagar a renda da casa. Quando viviam na Tailândia, sempre sonharam construir uma linda mansão com três andares, com imponentes escadarias, fabulosas carpetes a perder de vista, imensos quartos e duas salas enormes repletas de cristais fantásticos. Mas o sonho das suas vidas tinha ruído. No entanto, apesar das enormes adversidades, nunca desistiram dos seus ideais de justiça, solidariedade e trabalho. Maya frequentava a EB 2,3 da Caparica, mesmo à porta de casa. Esta escola era como qualquer outra: era multicultural, tinha bolsas para alunos carenciados, tinha clubes para ocupar os alunos nos tempos livres e desporto escolar. Maya vivia o dia a dia na escola com muita dificuldade, pois não conseguia fazer amigos, todos a olhavam com enorme desconfiança. Nas aulas, mantinha-se silenciosa, sentada ao fundo da sala, rezando para que nenhum professor a interpelasse. Nos recreios, sentava-se sozinha, num recanto. Sozinha não era bem assim, pois contava sempre com a excelente companhia e a preciosa amizade de um livro, mas este não lhe chegava. Os colegas gozavam-na por ser estrangeira e insultavam-na, contudo, Maya tentava sempre ignorá-los, mas a situação estava a ser muito difícil e a tornar-se insuportável. Passaram dias, semanas, meses e ninguém brincava com ela. Maya não estava a entender a razão de tanto afastamento. Todos os dias a situação se repetia e Maya não contava aos pais o que acontecia na escola, com a ténue esperança de conseguir resolver este seu problema. Um dia, um rapaz negro entrou para a sua turma e começou também a ser descriminado. A rapariga, ao vê-lo tão abatido, ficou feliz por ter alguém que percebia o que ela sofria na escola. Num intervalo, Maya, apesar das suas enormes dificuldades com a língua portuguesa, conseguiu questionar o colega: _ Qual é o teu nome e de onde vens? 2
  • 3. _ Chamo-me Nali. Sou do Senegal, da tribo Halkimaia e, como os meus pais vieram para aqui trabalhar, eu fui inscrito nesta escola. E tu como te chamas? – perguntou ele com sotaque africano. _ O meu nome é Maya. Vim da Tailândia, fugida da revolta e da guerra que se vivia no meu país. Vim com a minha família há algum tempo. O intervalo da manhã tinha acabado e todos os alunos foram para as salas de aula. Ao fim do dia, Maya e Nali despediram-se um do outro e cada um foi para o seu lar. No dia seguinte, já eles conseguiam planear passeios para fazerem fora do horário escolar, estudos em casa um do outro e muitas outras coisas interessantes. Mas, como os colegas de turma eram muito racistas, nunca se aproximavam deles nos intervalos, na hora de almoço ou até para a elaboração de trabalhos de grupo. Contudo, um dia, na aula de Formação Cívica, o professor sem comentar, mas apercebendo-se do que estava a acontecer na sua turma, solicitou aos alunos que fizessem um trabalho de grupo sobre as virtudes e os defeitos dos alunos da turma. Este tema suscitou de imediato um enorme burburinho na aula, criando desde logo a confusão para a constituição dos grupos. É certo que Maya e Nali foram imediatamente excluídos, não tendo havido, por parte dos colegas, qualquer interesse em incluí-los. O professor deixou que os grupos se formassem assim e que os dois colegas estrangeiros constituíssem o seu próprio grupo. No dia da apresentação dos trabalhos, para surpresa de todos, o referido professor trazia ele próprio uma lista com as virtudes e os defeitos de cada aluno da turma. A avaliação atribuída ao trabalho traduzia a falta de civismo e de valores sociais dos alunos. Assim, o professor sugeriu que fizessem um novo trabalho, incluindo nos grupos os colegas que estavam a ser excluídos. Como Maya e Nali eram excelentes alunos, deram um grande contributo para esse trabalho. Porém, fora da sala de aula, tudo se mantinha, os colegas continuavam afastados. Maya estava cansada de ser humilhada e decidiu contar em casa o que se estava a passar na escola, pois todos os dias chorava porque os colegas a maltratavam apenas por ter costumes diferentes. De imediato, os pais dirigiram-se à escola e expuseram o problema ao Diretor. Este foi à sala de aula e falou com os alunos da turma para compreender o que estava a acontecer. A turma foi obrigada a fazer trabalhos de 3
  • 4. pesquisa sobre a multiculturalidade, sobre o racismo na escola e sobre os valores humanos. Na semana seguinte, foram obrigados a apresentar os seus trabalhos a todas as turmas da escola. Deste modo, toda a escola compreendeu que a cor da pele não é relevante para a criação de amizades, para maior ou menor sabedoria ou para traduzir melhores ou piores valores humanos. Apesar de tudo isto, a situação continuava desagradável. A menina adorava ler e mergulhava no mundo da fantasia para esquecer o inferno que estava a viver. À noite, ao deitar, tinha sempre a companhia de um livro. Naquela noite, estrelada e linda, algo de estranho lhe aconteceu. Quando foi abrir a gaveta do armário para tirar um pijama, ouviu uma voz que lhe sussurrava: _ Olha Maya, andas tão preocupada, tão triste, abres e fechas as minhas gavetas com tanta força!... O que se passa contigo? Maya olhou à sua volta assustada sem perceber o que estava a acontecer. Gelou e parou, com os negros olhos bem abertos, fitando afincadamente todas as gavetas do armário. Tomou coragem e abriu-as e fechou-as delicadamente. Por fim, o armário voltou a falar-lhe: _ Não te queria assustar, apenas sou um amigo cá de casa que não te faço mal, guardo delicadamente as tuas roupas, fecho em mim muitos dos teus segredos… Maya respirou fundo e contou-lhe o que lhe ia na alma. O armário soltou uma lágrima de tristeza com aquela amarga história e a sua voz tremeu, dizendo: _ Amigaaaaaa…., juntos vamos conseguir fazer ver aos teus colegas que a amizade não se faz por aparências, mas por sentimentos. Amanhã, vais sentar-te ao lado de um colega e deves participar na aula sem medo, pois tu própria não podes afastar-te. Ao almoço, mesmo que te gozem deves sentar-te próximo deles, sem receio de dar o primeiro passo e verás que, no final desta semana, te sentirás bem melhor. Maya deitou-se e pegou no seu livro, mas não conseguia concentrar-se, acabando por adormecer. Dormiu muito mal nessa noite. Estava nervosa e confusa com tudo isto: a situação da escola, um armário no quarto que falava, tudo lhe era demasiadamente estranho. No dia seguinte, respirou fundo, entrou na sala de aula e sentou-se ao lado de uma colega. Participou ativamente nas aulas e foi elogiada pelos professores. 4
  • 5. Passou a ir com frequência à biblioteca da escola, sentava-se ao lado dos colegas no refeitório e, nos recreios, para além da habitual companhia de Neli, passou a ter a companhia da colega de carteira. A partir dessa altura, os colegas de Maya e Nali começaram gradualmente a aproximar-se deles. Certo é que Maya passou a estar muito mais feliz nas aulas e, no final do primeiro período, já contava com a amizade de duas colegas que estudavam com ela e iam a sua casa. Maya, todos os dias, conversava com o seu armário confidente. Contava-lhe agora, não as tristezas dos seus dias, mas as alegrias da sua vida. Os pais tinham trabalho e Maya tinha, finalmente, amigos na escola. Os seus resultados escolares melhoraram e recebeu o diploma de mérito no final do ano. 5