O absenteísmo psicológico generalizado pode ser sintoma de uma doença degenerativa da administração das empresas. É como um câncer silencioso que se propaga com rapidez pelo corpo, e se não for detectado a tempo pode ser fatal.
Absenteísmo Psicológico - Revista Fundação Dom Cabral - Alfredo Bottone
1. negócios
IlustraçãoÁgathaKretli
A presença física do empregado, isola-
damente, não garante absolutamente nada
em termos de produtividade e comprome-
timento. O que realmente precisamos é da
presença dele de corpo e alma, mais alma
do que corpo.
O absenteísmo psicológico generaliza-
do pode ser sintoma de uma doença dege-
nerativa da administração das empresas.
É como um câncer silencioso que se
propaga com rapidez pelo corpo, e
se não for detectado a tempo pode
ser fatal.
Essa doença tem inúme-
ras manifestações, tais como:
navegar na internet para assuntos
alheios ao trabalho; descaso com
prazos e qualidade; longas conversas
sobre assuntos estranhos aos interesses da empresa;
leituras “privadas”; falta de colaboração em algo que o
empregado poderia fazer, etc. Você, com certeza, seria
capaz de enumerar dezenas de outros exemplos que tra-
duzem essa alienação para com os interesses da empresa.
Mas de quem é a culpa desse absenteísmo (aparen-
temente invisível)? Do empregado ou do gestor?
O absenteísmo psicológico só é invisível quando o
próprio gestor está alienado dos movimentos de sua equi-
pe, não interagindo o suficiente para perceber o que vai
bem e o que não vai. Se o contato com o colaborador é
formal e com baixa frequência – não tendo sequer clareza
do que ele de fato está “fazendo” –, então fica difícil para
o gestor ter a percepção do nível de absenteísmo psicoló-
gico em sua equipe.
O empregado que não tem desafios, não é chamado
a participar de assuntos para os quais pode efetivamente
contribuir, apenas recebe ordens e, pior, nem recebe
orientação sobre o que e como fazer para cumpri-las,
estará fortemente inclinado a adotar uma postura de alie-
nação no ambiente de trabalho.
O gestor que não lidera o seu grupo com efetividade
é o responsável direto por esse problema. As causas do
absenteísmo psicológico devem ser avaliadas pelo líder,
juntamente com o superior e o RH, para que se possa agir
a tempo e estancar o problema.
Se o colaborador é aquele que “não quer nada com
nada”, o gestor deve atuar diretamente, sendo assertivo
numa conversa com ele e definindo claramente a mudan-
ça esperada, no curtíssimo prazo, para que o alienado
possa continuar fazendo parte do quadro da empresa.
O que não pode é o gestor sempre atribuir as causas
do absenteísmo psicológico apenas ao próprio funcioná-
rio, ou a outros fatores alheios à sua gestão, sem inves-
tigar as causas ou avaliar a produtividade do empregado
dentro das metas a ele estabelecidas.
O absenteísmo psicológico pode ser denotado quan-
do há a presença física do colaborador no trabalho e,
combinado com sua ausência psicológica, o beneficia
com o gozo do seu salário, enquanto traz para o gestor, e
em consequência para a empresa, o prejuízo do desper-
dício de recursos.
Cada gestor deve se fazer algumas indagações,
como:
• Ao final de cada dia, sei exatamente o que
cada colaborador produziu de importante para a
empresa?
• Conheço o tempo e os recursos que as
tarefas atribuídas a meus colaboradores deman-
dam deles, para poder avaliá-los de forma preci-
sa quanto ao cumprimento dessas obrigações?
• Atribuo desafios aos colaboradores,
de forma equilibrada, evitando excessos
para alguns e o esvaziamento para
outros?
• Centralizo tantas tarefas comigo
que não tenho tempo para prestar
atenção na real situação dos colabo-
radores quanto à produtividade, clima
organizacional, riscos de perder profissio-
nais, etc.?
• Consigo liderar as pessoas de forma que as metas
que atribuo a elas possam contribuir para o alcance dos
objetivos da empresa?
• Quando percebo que alguém está navegando na
internet, ou de alguma forma utilizando seu tempo de
trabalho em assuntos alheios ao interesse da empresa,
finjo que não vi ou chamo o empregado e converso sobre
sua atitude inconveniente?
• Ao ter informação de que os colaboradores estão
insatisfeitos com várias questões da empresa, e perceber
que isso está afetando a produtividade, faço uma reunião
com eles e tento entender melhor o que está acontecen-
do, ou prefiro não me envolver, acreditando que alguém
(por exemplo o RH) fará isso?
• Atividades estranhas que, com alguma frequência,
são percebidas por mim no ambiente de trabalho, apenas
me incomodam ou me fazem tomar atitudes para reverter
essa situação?
• Nas reuniões, procuro manter o foco de todos nos
assuntos que estiverem sendo tratados, usando estra-
tégias que mantenham a participação e interesse dos
participantes?
O absenteísmo psicológico é mais sério e grave do
que o absenteísmo físico, pois este, do ponto de vista
formal, é de fácil controle mesmo quando (equivocada-
mente) não se atua em suas causas. Apesar de provo-
car muitas perdas em todos os sentidos – resultados,
inovação, talentos, ética, clima organizacional, etc. – o
absenteísmo psicológico costuma ser negligenciado. Sem
dúvida, a maior causa do problema está no líder, pelo seu
“absenteísmo” na gestão das pessoas/equipe, seja por
falta de competência nessa área, ou porque não prioriza
a questão em sua agenda. É uma doença que tem cura,
mas dificilmente no curto prazo, exigindo ações rápidas
antes que se torne crônica.
Alfredo Bottone é matemático e advogado, foi diretor de Administração
e Recursos Humanos em grandes empresas, como CESP, Elektro, Light,
Grupo Marfrig e CPFL Energia. Atualmente, faz doutorado na Universidade
da Flórida e atua como consultor especializado em RH e Relações
Trabalhistas. É autor do livro “Insights de um RH Estratégico”, Editora
Schoba, 2012.
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