O documento discute os desafios do mercado de trabalho no futuro diante das transformações tecnológicas, sociais e econômicas. Apresenta três mega tendências (transformações sociais, aprofundamento da inovação tecnológica e transformações econômicas) e analisa seus impactos no trabalho, incluindo a substituição de empregos por robôs e computadores. Debate novas formas de relações trabalhistas e como regular o mercado de trabalho no futuro para lidar com a flexibilidade crescente.
Cibernegócios. Pensou em negócios na rede, pensou ciber
Helio Zylberstajn
1. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos
problemas?
Hélio Zylberstajn – FEA/USP e Fipe
SOBRATT
Sociedade Brasileira de Teletrabalho e Teleatividades
São Paulo - 23/09/2019
2. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Três mega tendências dos nossos dias (Marc De Vos, Itinera Institute, The Future of
Labour Law)
• Transformações sociais: envelhecimento, migração, multiplicação de identidades,
diversidade, mudança de valores. Preocupação: controle social público e privado?
• Aprofundamento da inovação tecnológica: internet, internet de plataformas,
robótica, IA, tecnologia de RH, big data, impressão tridimensional, nanotecnologia,
genética, biogenética.
• Transformações econômicas profundas: Globalização e Hiperglobalização,
mundialização dos mercados, novas estruturas empresariais, transformações no RH.
3. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Transformações sociais
De Vos fala em talentos acinzentados e esverdeados.
Aumento da participação de idosos no mercado de trabalho.
Preocupação com o meio ambiente.
Life long learning.
Jovens (millenials) preferem descompromisso no trabalho para percorrer suas carreiras.
Diversidade em muitas dimensões: opção de gênero, PCDs.
Casamentos adiados. Taxa de natalidade decrescente. Envelhecimento.
Novos padrões de mobilidade nas cidades.
Desapego aos bens tradicionais (automóvel, imóvel).
Todos plugados nas redes sociais.
Preocupação: Controle social privado e estatal – Exemplo: China. Novo conceito de
democracia?
4. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Aprofundamento da inovação tecnológica
A tecnologia provoca efeitos disruptivos: Trabalho 4.0.
Onda mais ameaçadora: Trabalho operado à distância (não é teletrabalho). Médicos
operam a milhares de quilômetros.
Pior: Robôs que arrumam camas de hotel. Arrumadeiras na periferia de São Paulo vão
fazer as camas de hotéis em Manhattan?
Como controlar os impactos da competição no mercado de trabalho, agora em escala
global?
Domenico Di Masi: Reduzir a jornada para 10 horas por semana. Valorizar o ócio.
5. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Frey e Osborne (2013) examinaram a “computadorização” do trabalho e chegaram a
resultados assustadores.
O computador começou substituindo o trabalho humano em atividades repetitivas,
rotineiras e previsíveis.
Agora, está substituindo atividades com conteúdos cognitivos: motoristas, por exemplo.
Advogados e contadores também. Até médicos!
Os autores previram que o computador poderá substituir o trabalho humano em 47%
dos empregos existentes no mercado de trabalho americano.
Estudo replicado em muitos países, com resultados semelhantes. Muito influentes no
debate recente.
6. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Ian Pearson: tecnologia destrói mas também cria empregos. Substituição do QI pelo QE.
Pergunta mais frequente (principalmente dos jornalistas e da mídia em geral): quais
serão as ocupações do futuro? Quais ocupações desaparecerão?
Ocupações do futuro: muita, muita tecnologia. Exemplo: engenheiro de suporte
submarino.
É importante tentar “adivinhar” o futuro das ocupações. Mas é muito importante também
tentar saber antecipadamente quais serão as características e os problemas do
mercado de trabalho no futuro.
7. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Transformações econômicas
Com os resultados de Frei e Osborne, seria inevitável concluir que o fim do trabalho se
aproxima. Mas há visões divergentes. Robôs criarão o dobro de postos de trabalho que
destruirão (The Guardian).
Foi assim com os tecelões, os tipógrafos, os portuários, etc. Destruição e criação de
postos de trabalho. Novos empregos na fabricação das novas máquinas, na operação,
na manutenção, treinamento, controle. Na ampliação dos mercados, nos novos
produtos, etc.
Mas agora é diferente: o risco se chama “fim do emprego” e não fim do trabalho. É o
grande desafio do Direito do Trabalho, dos sindicatos, das empresas e dos governos.
Novas formas de relações de trabalho (Eurofoundation)
8. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Compartilhamento do trabalhador O mesmo trabalhador é contratado por
um grupo de diferentes empregadores
Compartilhamento do trabalho A empresa troca um empregado em
jornada integral por 2 ou 3 em jornadas
parciais
Gestor interino Especialista de alta qualificação é
contratado para um período
determinado ou para uma tarefa ou um
projeto ou para resolver um problema
específico
Trabalho móvel baseado em Tecnologia
da Informação e Comunicação (ICT)
Os trabalhadores podem executar seu
trabalho de qualquer lugar, em
qualquer horário, apoiados por
tecnologias modernas
Trabalho de portfolio Um trabalhador autônomo trabalha
para um número grande de empresas,
fazendo pequenos serviços para cada
uma delas
Trabalho em multidão (crowd) Plataforma online promove o encontro
entre empresas e trabalhadores. As
atividades grandes são divididas em
pequenas partes entre os trabalhadores
da “nuvem”
Trabalho colaborativo Freelancers, autônomos e
microempresas cooperam de alguma
forma para superar limitações de
tamanho e isolamento
Trabalhador casual A empresa não é obrigada a utilizá-lo
permanentemente, podendo convocá-lo
ocasionalmente
Novas formas de relações de trabalho (Eurofoundation)
9. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Qual será o impacto final da tecnologia sobre o mercado de trabalho?
Impacto quantitativo: ainda não sabemos. Muito pessimismo, mas há otimistas também.
Impacto qualitativo: quase unanimidade. As relações de trabalho não serão as mesmas.
Haverá (já está havendo) profundas transformações, decorrentes da transformações
nas estruturas produtivas.
Para entender, temos que recuar até Ronald Coase (The Nature of the Firm, 1937 –
Premiado com o Nobel em 1991): a firma (empresa) é um arranjo eficiente porque
reduz os custos de coordenação. Mesmo com hierarquias e burocracia.
10. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Coase explicou o sucesso da verticalização e dos conglomerados, a forma vitoriosa de
organização da produção do século passado. Empresa vitoroiosa do século XX:
estrutura verticalizada.
O mundo descrito por Coase começou a se transformar no final do século XX: avanços
na gestão, na TI e na logística reduziram os custos de coordenação.
Primeiro, veio a “reengenharia” e a produção enxuta (lean production). Depois, a
horizontalização e as cadeias produtivas globais.
Modelo vencedor no século XXI: empresa horizontal, com muita transferência de
atividades e terceirização. É a globalização.
11. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Outro autor importante: Gary Becker, também um Prêmio Nobel.
Propôs a dicotomia conhecimento específico x conhecimento geral. O conhecimento
específico se associa ao emprego de longa duração. O conhecimento geral ao de curta
duração. Becker complementa Coase.
As ideias de ambos explicaram as relações de trabalho do século passado. E explicam
também a emergência das novas relações de trabalho do século XXI, que substituem o
emprego de longa duração.
Desafio para sindicatos, governos e para o Direito do Trabalho: Como regulamentar o
novo mercado de trabalho?
E mais: como financiar a Previdência Social?
12. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Primeiras respostas (insatisfatórias)
• Códigos de conduta
• Cláusulas trabalhistas nos acordos regionais
• OIT – “Cláusula Social” e depois “Trabalho decente”
• Sindicatos tentam coordenação internacional: Acordos Marco em multinacionais.
• Juristas propõem o alargamento do conceito de vínculo e de subordinação. “Para-
subordinação”. “Subordinação estrutural”.
As tentativas não estão funcionando porque tentam aplicar os velhos conceitos às novas
condições. Estão aprofundando a segmentação (insiders x outsiders).
13. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Como regular o mercado de trabalho no futuro? Vamos voltar a Marc De vos: Direito das
pessoas será o novo Direito do Trabalho.
Legislação da qualidade do trabalho. Principal preocupação do Direito do Trabalho
tradicional. Precisa ser adaptada ao Trabalho 4.0. Uma possibilidade: a tecnologia, ela
mesma pode ajudar a monitorar a qualidade do trabalho. O robô e o computador serão
os companheiros e não a ameaça.
Legislação do talento. Proteger o direito fundamental (essencial) do desenvolvimento,
manutenção, renovação do talento economicamente útil para as pessoas no mercado
de trabalho. Direito a ser combinado com o sistema educacional. Para as empresas, a
gestão do talento será essencial. Direito do talento será o coração do novo Direito do
Trabalho.
14. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Direito da ativação. Trazer o direito à flexibilização do trabalho para o centro do Direito
do Trabalho. Abraçar as diversas formas de relação de trabalho como direitos.
Legislação de carreiras. As diferenças entre trabalho tradicional e trabalho atípico
desaparecerão. O atípico será o novo típico. É preciso permitir que os indivíduos
percorram suas carreiras. Portabilidade dos direitos acumulados. “Conta” individual da
carreira.
De Vos está sonhando? Na verdade, suas sugestões já são adotadas na Europa:
Flexecurity. Substitui a segurança no emprego pela segurança no mercado de trabalho.
Começou na Dinamarca e na Holanda. Parcialmente adotada em outros países, depois
da crise financeira de 2008-2009: Alemanha, Itália, Espanha, Portugal, França.
Está ajudando a combater o desemprego.
15. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
E o Brasil?
Nosso mercado
de trabalho é
extremamente
flexível (isso
mesmo,
flexível). Vejam
o gráfico. Temos
“flexinsecurity”!
1,112
0,917
1,284 1,275
1,340 1,305 1,278
1,168
1,219
1,353
1,235 1,280
1,189
0,961
1,325
1,453
1,261 1,375 1,347
1,248
1,331
1,124
1,513
1,207 1,214
1,284
1,189
1,244
1,168 1,172
1,243
1,097
1,222
1,131
1,296
1,291 1,280
1,304 1,245
1,315
1,200
1,287
-0,012
-0,596
0,078 0,061 0,056
0,116
0,034-0,001
0,047
0,110 0,137
0,058 0,059
-0,334
0,034
0,173
-0,043
0,130
0,032 0,048 0,044
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
CAGED (milhhões) - Nov/17 a Jul/19
Admitidos Desligados Saldo
16. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Temos que
avançar na
reforma
trabalhista e
sindical
(novidades em
breve).
Temos que
queimar
etapas, mas já
há algum
progresso. 0
50
100
150
200
250
300
350
400
450
out-18 nov-18 dez-18 jan-19 fev-19 mar-19 abr-19 mai-19 jun-19 jul-19
Título do Eixo
Saldos acumulados em 12 meses (em milhares) - CAGED
Intermitente Jornada parcial Restante
17. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Mais indícios de
progresso:
desligamentos
por acordo.
Deverá reduzir a
rotatividade.
0,8
5,8
9,4
11,1
13,5
12,3
14,6
13,2
13,7
15,4
13,0
16,2
13,8
14,2
18,1
19,5 19,4
18,0
19,5
18,4
19,0
1,124
1,513
1,207 1,214 1,284 1,189 1,244 1,168 1,172 1,243 1,097 1,222 1,131 1,296 1,291 1,280 1,304 1,245 1,315 1,200 1,287
0,07%
0,39%
0,78%
0,92%
1,05%
1,03%
1,17%
1,13%
1,17%
1,24%
1,19%
1,32%
1,22%
1,09%
1,40%
1,53%
1,49%
1,44%
1,48%
1,53%
1,47%
0,00%
0,20%
0,40%
0,60%
0,80%
1,00%
1,20%
1,40%
1,60%
1,80%
0,0
2,5
5,0
7,5
10,0
12,5
15,0
17,5
20,0
Desligamentos por acordo (milhares) e Total de desligamentos (milhões) - Nov/17-Jul/19
Por acordo Total % Por acordo Tendência
18. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Previdência Social
De Vos e a Flexecurity sugerem unificação dos regimes e portabilidade. Muito difícil de
por em prática. Como cobrar contribuições dos que não possuem vínculo de emprego?
A Europa está tentando a capitalização compulsória para o trabalho atípico (sem
vínculo).
O Brasil está lutando para completar a Reforma da Previdência, mas muito longe da
unificação. É muito difícil reformar para trás. Seria mais fácil reformar para a frente
(Proposta Fipe, usando o FGTS).
19. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Educação e qualificação
A Flexecurity condiciona o seguro-desemprego à reciclagem (ativação). De Vos sugere
reciclagem como direito (direito ao talento).
O Brasil está muito longe disso, infelizmente.
Sugestão de ex-presidentes da ILERA: incluir o Sistema Educacional no Diálogo Social.
Problema estrutural e crônico no Brasil: informalidade. Causas são diversas, a principal
é o peso dos encargos sociais. Substituir pela CPMF? Quem adota este imposto?
MEI e Simples seriam solução? Ou são bombas-relógio?
Velhos problemas e novos desafios.
20. A tecnologia e o trabalho no futuro: novos desafios ou velhos problemas?
Quem viver verá!
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