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1 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
O. S. ARAUJO
MELQUISEDEQUE
Sua ordem e religião
EDIÇÃO DO AUTOR
1ª. edição: 2016
2 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Revisão: Osmar S. Araujo
Diagramação: Osmar S. Araujo
Capa: Osmar S. Araujo
3 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
SUMÁRIO
PREFÁCIO, 5
Melquisedeque um rei cananeu, 8
A religião de Melquisedeque, 17
A ordem de Melquisedeque, 25
O sacerdóciode Cristo, 31
Referências, 37
4 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
PREFÁCIO
Esse estudo é parte do Trabalho de Conclusão de Curso
(TCC)realizado pelo autor como exigência ao Curso deDoutorado
Livre em Teologia, que foi entregue à Universidade da Bíblia em
dezembro de 2016.
O autor, embora não defenda, propõe para discussões
teológicas, a possibilidade de o personagemem foco professaruma
religião cananeia estritamente monoteísta, mas, não
necessariamente, identificando o “seu senhor” Deus Altíssimo
como sendo o mesmo de Abraão e, sucessivamente dos patriarcas.
Com tal possibilidade, a linha de interpretação divergindo da linha
tradicional, defendida pela maioria dos cristãos.
Melquisedeque (Malki-Tzedek “meu rei é justiça”) é, sem
dúvidas, o homem mais enigmático ou misterioso da Bíblia
Sagrada. Foram muitas as tentativas de identificá-lo. Alguns até
procuram situá-lo dentro da cultura dos hebreus, e até mesmo da
fé cristã, mas nenhuma conclusão inteiramente segura sepodetirar
desse entendimento. 1 Quanto ao fato de sua pessoa física ou
somática, é mais seguro, interpretá-lo como um ser humano de
1 CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, v. 4, 2006, p.
210.
5 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
carne e ossos, ressalvando, é claro, a sua grandeza e atributos
descritos na Bíblia.
A lista dos supostos “melquisedeques” é grande. Portanto,
há quem o associecomSem, comEnoque, comJó e, até comAdão.
Outros o identificam com Espírito Santo, com a um anjo, e com o
próprio Jesus [pré-encarnado] e, a muitos outros.
De fato, para um grupo de exegetas judeus do círculo
rabínico do primeiro século, o Melquisedeque a quem Abraão
tinha pagado os dízimos era Sem. Para eles, o filho de Noé ainda
estava vivo no período do patriarca Abraão e continuou vivo por
mais 25 anos após a morte do patriarca (FREEDMAN, Ed.,1992,
v. 4, p. 686).
As questões relacionadas a esse“Rei-Sacerdote” dão espaço
principalmente a especulações tradicionais como, por exemplo: a
talmúdica hebraica. Esta diz se tratar de Sem filho de Noé2, um
sobrevivente do dilúvio, que ainda vivia nos tempos de Abrão
como o homem mais velho da épocano mundo.
Posto que os problemas relacionados ao tema têm sido em
torno de sua identidade – Quem ele é? De sua religião – A que
deus servia? De seu papel na Cristologia – Qual a sua relação com
2 Esta possibilidade disposta na tradição judaica entra em contradição com
o testemunho neotestamentário, observado pelo escritor aos Hebreus,
quando enfatiza: “sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo
princípio de dias nem fim de vida, mas, sendo feito semelhante ao Filho
de Deus, permanece sacerdote para sempre” (Hb 7.3, ARC).
6 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
o Filho de Deus, o Messias e a seu sacerdócio? E outras menos
importantes.
Esse trabalho, embora não tão extenso, visa explorar uma
possibilidade ora negada, ora omitida pela corrente tradicionalista
– qual a verdadeira religião de Melquisedeque?
Prefácio do autor3, 26 de janeiro de 2018.
3 Bacharel em Teologia pela Faculdade de Administração, Ciências,
Educação e Letras – FACEL (2014). Possui os Cursos Online de
Mestrado e Bacharelado Livre em Teologia pela Universidade da Bíblia
– UNIB (2015-16). Licenciado em Filosofia pela Filemom Escola de
Teologia – FEST (2018).
7 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
MELQUISEDEQUE UM REI CANANEU
“E Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho;
e este era sacerdote do Deus Altíssimo. E abençoou-
o, e disse:
Bendito seja Abrão do Deus Altíssimo, o possuidor
dos céus e da terra; e bendito seja o Deus Altíssimo
que entregou os teus inimigos nas tuas mãos. E deu-
lhe o dízimo de tudo” (Gn 14.18).
O relato bíblico de Gênesis, embora não cita o nome Canaã como
a terra natal deMelquisedeque, certamente queo autor ou o redator
final desselivro o liga a ela, ao apresenta-lo como “rei de Salém”,
que é de fato associadaquase que unanimemente à Jerusalém, que
posteriormente aparece com o nome Jebus – uma cidade das sete
nações cujos moradores foram expulsos para dar lugar ao povo
israelita. Ele era um contemporâneo de Abrão.
Segundo Rocha4 , o fato de Melquisedeque aparecer na
passagem bíblica, sem pai e sem mãe, constitui uma evidência de
que ele era da descendência de Cão e não de Sem. Rocha, que é
Doutor em Divindade, entende que Melquisedeque, porserdeuma
4 ROCHA, Aldery N. Bíblia Revelada, Novo Testamento Explicado -
Ômega. São Paulo: Editora ISH, 2011, p. 894.
8 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
descendência amaldiçoada, ao abençoar Abrão, recebeu de Deus
um escapepara se livrar da maldição de noéica que fora infringida
sobreos filhos de Cão, chanceesta aproveitada porele na primeira
oportunidade.
O teólogo cita Gênesis 12.2,3 como base. Seaceito tal tese,
esse fato identifica ainda mais a raça do rei-sacerdote como dos
cananeus ou canaanitas – a saber, um descendente de Canaã.
As referências [bíblicas] a Melquisedeque se acham nos
livros de Gênesis 14.18; Salmos 110.4 e Hebreus 5.6,10; 6.20 e
7.1,10,11,15,17, 21.
A identidade de Melquisedeque
Como foi dito na parte introdutória, existem muitas
propostas de identificação da pessoa de Melquisedeque. O
mistério todo gira em torno de seu repentino aparecimento no
cenário da história, e seu consequente desaparecimento.
O Dicionário Bíblico Wycliffe apresenta algumas pessoas
que supostamente são identificadas com o personagem
Melquisedeque. Segundo os autores, para Orígenes, ele era um
anjo; para Epifânio, era o Espírito Santo; para Ambrósio, era o
Senhor Jesus Cristo; Para Calmet, era Enoque; para alguns
Targuns (literaturas judaicas), Lutero e outros, ele era Sem, o filho
de Noé.5
5 PFEFFER; VOS; REA, 2008, p. 1247.
9 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Uma opinião comum entre os judeus: Sem
De acordo com Norman R. Champlin (2006) a opinião de
que Melquisedeque era Sem, é comum entre vários escritores
judeus6. Ainda que para o autor, a razão desse esforço seja uma
tentativa de evitarem “o problema” gerado pelo fato de ele ser um
rei pagão, em sua visão, uma exegese da passagem bíblica não
permite uma identificação de Melquisedeque com a fé cristã-
judaica, só sendo isso possível pela prática da eisegese, que é,
segundo ele, “ler no texto aquilo que queremos ver ali, e não
realmente o que faz parte do texto sagrado”7.
Segundo o Targum Pseudo-Jonathan (Tg Ps-J) de Gn
14,18a, de acordo com pesquisas de Aíla Andrade 8 (2008),
Melquisedeque é identificado com “Shem, filho de Noé”. O
objetivo neste tópico é fazer uma análise mais detalhada dessa
expressão, visto que as figuras deNoé e seus filhos estão marcados
com grande conotação mítica e escatológica.
6 Champlin cita o Targum sobre Jon. e Jerus. Jarchi, Baal Hatturim, Levi
Bem Jerson e Abendana sobre Gn 14. 18; Bmidbar Rabba, seção 4, fol. 182,
4; Pierke Eliezer cap. 8; Jushasin, fol. 135, 3 e outros (2006, vol. 4, p. 211).
7 CHAMPLIN, Norman R. O Antigo Testamento Interpretado versículo
por versículo. Vol. 1. São Paulo: Candeia, 2000, p. 114.
8 ANDRADE, Aíla L. P. de. À Maneira de Melquisedeque, o Messias
segundo o judaísmo e os desafios da Cristologia no contexto
neotestamentário e de hoje. Tese apresentada ao Departamento de Teologia
da Faculdade Jesuíta de
10 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Para Aíla Luzia Pinheiro deAndrade (2008), analisando as
camadas literárias mais antigas,
Melquisedeque foi identificado comas divindades cultuadas pelos
povos vizinhos de Israel.
O objetivo principal da paráfrase targúmica era fazer com que o texto
bíblico fosse compreendido, atualizado, e se tornasse uma profecia
sobre o fim dos tempos. Para realizar esse objetivo, os sábios
acrescentaram comentários dentro da narrativa enquanto traduziam
o texto hebraico. E assim preenchiam certas lacunas do texto bíblico,
evitavam interpretações nocivas à fé monoteísta e ofereciam uma
palavra sobre o futuro.8
Para RodríguezCarmona, a identificação deMelquisedeque
com Shem tinha como objetivos combater a teologia de Hb. Não
descartamos detodo essaopinião de Carmona, mas aceitamos que,
antes do Targum ser posto porescrito, havia uma tradição oral bem
anterior e que teria porobjetivo preencher as lacunas da narrativa
bíblica, evitando um prejuízo para o monoteísmo, como também
está presente uma hermenêutica de forte cunho escatológico. Cf.
Antonio RODRÍGUEZ CARMONA, “La figura de Melquisedec
en la literatura targúmica”, EstBib 37 (1978) 79-102.
Segundo a pesquisadoraos rabinos explicavam que Shem,
tendo sobrevivido ao dilúvio, numa nova vida como
Melquisedeque, teria assumido as funções de sumo sacerdote de
El Elyon e por isso Abraão, que era da mesma linhagem, o
reconheceu quando o encontrou e pagou-lhe o dízimo dos espólios
11 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
da guerra9. De acordo com Aíla Andrade, Melquisedeque como
Shem10 podeserencontrado no TgNeof, no TgPs-J, no Tg II (110)
e no Tg II (W), embora essa identificação não seja mencionada no
Tg Onq e nem no 1QapGen.
Um Messias sacerdotal
O conceito de um messias sacerdotaltem origens no próprio
Antigo Testamento (Lv 4,3.5.16; 6,15). No período anterior ao
exílio, o sumo sacerdoteera subserviente ao rei, que também podia
exercer funções sacerdotais (1 Sm 6,1221; 24,25; 1 Rs 3,4; 8,1-5;
12,33), mas, segundo José Adriano Filho11, durante o exílio e pós-
exílio a figura do sumo sacerdote começou a assumir dimensões
mais significativas. E Jeremias promete que os levitas servirão
9 ANDRADE, 2008, p. 123.
10 Melquisedeque identificado com Shem também é mencionado em Ned
32b; Pir R. Eliez 8 e 27,3; Bem. R. 4,8. Essa associação entre ambos
só é possível devido à idade que o livro do Gênesis dá tanto para Shem
como para Abrão. Seguindo a genealogia encontrada em Gn 11,10-11,
se pode deduzir que Abraão teria nascido no ano 292 depois do Dilúvio
e, como viveu durante 175 anos, teria morrido no ano 467 pós-
diluviano. Como se afirma que Shem tinha a idade de 98 anos quando
aconteceu o Dilúvio, aos 100 anos lhe nasceu o filho e depois viveu
mais 500 anos, então se pode concluir, segundo as narrativas bíblicas,
que Shem tenha sobrevivido a Abraão por 33 anos (ANDRADE, 2008,
p. 123).
11 José Adriano Filho é Doutor em Ciências da Religião pela Universidade
Metodista de São Paulo. Professor no Seminário Presbiteriano
Independente de Londrina, PR.
12 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
para sempre juntamente com os descendentes de Davi (33,14-18)
e suas profecias têm eco na descrição de Zacarias do sumo
sacerdote Josué. Na visão de Zacarias 3 e seu desenvolvimento
em 6, 9-14, a era messiânica futura é claramente dominada pela
figura do sumo sacerdote Josué, enquanto outro personagem
aparece de passagem e num papel subordinado12.
Nelson Rocha,13 falando da origem do sacerdócio
universal, expõe possuiuma visão diferente na qual
A realização do sacerdócio divino que não estava em Levi.
Inicialmente, estava em Melquisedeque. Melquisedeque o transmitiu
a Abraão, e cada primogênito seria incumbido de ser um propagador
desse sacerdócio. Em toda nação haveria primogênitos, em toda
família, em toda tribo. A bênção patriarcal passaria a todos eles. A
todos alcançaria a bênção dos direitos de herança, de propriedade
dobrada, de liderança espiritual, de autoridade moral e de
posteridade; especialmente o sacerdócio. Este sacerdócio foi
manifestado em tempos remotos, desde Enos, Noé, Enoque, Jó e
Jetro.
Para Rocha (D.D. Doutor em Divindade), que também é
tradutor, comentarista e editor da Bíblia Revelada, Novo
Testamento Ômega, Moisés foi o último sacerdotedessaordem, o
qual instituiu o sacerdócio arônico. Poroutro lado, segundo ele, Jó
foi um grande patriarca em seus dias. Sendo juiz e sacerdote
universal.
Na visão do editor e comentarista (supracitado), o fato de
Melquisedeque, não ser da linhagem de Sem, e sim, de Cão, fez
12 FILHO, 2005, p. 1.
13 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
com que ele não fosse contado na genealogia dos hebreus, e é por
isso queseu paie sua mãe e seus irmãos não constam na genealogia
de Adão13.
De acordo como pesquisadorde Oracula emSão Bernardo
do Campo, (v. 1, n.1, 2005), nem Davi, nem o sumo sacerdote
Josué é chamado explicitamente de Messias, mas esta
interpretação será desenvolvida em Qumran, quando se fala do
“Messias de Aarão e Israel” (1QS IX,11). No Sirácida 45,6-22
Aarão ocupaum lugar exaltado e Simão, o Justo, é elogiado (50,1).
No Documento de Damasco, à espera do Messias que redimirá o
povo da iniquidade é uma indicação de que o templo atual não é
eficaz e há necessidade de um sacerdotemessiânico para restaurá-
lo.
Em seu artigo Filho comenta que além da apresentação de
figura de Levi, Melquisedec, o sacerdote do Deus altíssimo, é
também utilizado para apresentar uma figura messiânica
sacerdotaldo final dos tempos. Em 11QMelquisedec, Melquisedec
é identificado como jubileu, a expiação, a execução do julgamento
divino e um ser celestial exaltado.
Na visão do autor (Id), mesmo que não haja uma menção
explícita de que Melquisedec realiza a expiação “em favor dos
filhos da luz e dos homens do lote de Melquisedec”, é provável
que seja ele o sumo sacerdote celestial que efetua os ritos de
expiação do Yom hakippurim escatológico. A narrativa de 2
13 ROCHA, 2011. p. 895.
14 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Enoque 69-73 (Eslavônio) também apresenta a figura mediadora
de Melquisedec, oferecendo um desenvolvimento da tradição
sacerdotalde Enoque, referindo-se à relação entre a sua função e a
de Melquisedec14.
O nome “Melquisedeque”
A palavra Melquisedeque, segundo o escritor aos
Hebreus, “é, por interpretação, rei de justiça”, e por ser ele
também “rei de Salém”, isso o torna também um “rei de paz”
(7.2), já que “Salém” em hebraico transliterado é shalom “paz”.
Esse nome vem de duas palavras hebraicas (melek), “rei” e
(tsedeq), “justiça, retidão” (SOARES, 2008, p. 116).
A palavra significa, literalmente, “meu rei e justo” ou, conforme
Boyer15 (2006, p. 429), “Rei de Justiça”.
Salém, a cidade de Melquisedeque
“Em Salém está o seu tabernáculo e em Sião a sua
habitação” (Sl76.2).
14 FILHO, 2005, p. 2.
15 BOYER, Orlando S. Pequena Enciclopédia Bíblica. São Paulo: Editora
Vida, 1978.
15 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
A maioria dos estudiosos deBíblia entendem que a Salém
(Shalem), governada por Melquisedeque, cujo equivalente
hebraico é shalom “paz”), é o antigo nome de Jerusalém.
Comentando Hebreus 7.2, Stern16 (2008, p.739) diz:
Shalem – equivalente hebraico à palavra “shalom”, que significa
não apenas “paz” como ainda saúde, integridade, inteireza (ver Mt
10.12N) – é a cidade de Jerusalém. Isto está claro tanto no Salmo
73.3(2), onde linhas paralelas de poesia identificam Shalem (Salém)
com Sião, quanto em fontes judaicas tradicionais.
Do Dicionário da Bíblia de Davis (1985), depreende-se
que pelo menos cinco fatores estão ligados ao fato da Salém de
Gênesis 14 ser a Jerusalém cidade de Davi:
1. A cidade já existia e era governada por um rei, antes da conquista
de Canaã pelos israelitas. 2. Que o nome Jerusalém significa cidade,
ou segundo o modo hebraico de entender, fundamento de paz, ou
segurança, de que Salém é uma abreviação. 3. Que Salém se emprega
como sinônimo de Jerusalém em Sl 76.2. 4. Que a comparação do
Senhor de Davi com Melquisedeque no Sl 110.4, é a mais
apropriada, visto que Melquisedeque foi rei da mesma cidade em que
Davi também o foi. 5. Que Jerusalém se acha no caminho de Hobá e
Damasco para Hebrom, lugar para onde se dirigia o patriarca
Abraão.17
O historiador Josefo diz que essa cidade, referindo-se a
Salém, é a própria Jerusalém (Ant. 1.10.2). Mas outros a nomeiam
16 STERN, David H. Comentário Histórico-Cultural do Novo
Testamento. Rio de Janeiro: Templus, 2008.
17 DAVIS, John D. Dicionário da Bíblia. Tradução do Rev. J. R. Carvalho
Braga.
16 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
como a cidade jebusita na fronteira entre Judá e Benjamim, que foi
tomada porJoabe e se tornou “a cidade de Davi”18.
Champlin19 (2006) identifica Salém como “uma provável
divindade cananeia, adorada pelos jebuseus originais”. Essa
conjetura, segundo o autor, explicaria a verdadeira origem do
nome da cidade.
Conclusão parcial
Se provada a identificação de Salém com Jerusalém, as
implicações segundo Davis seriam: 1. A cidade de Jerusalém já
existia antes da conquista de Canaã pelos israelitas, e era
governada por um rei. 2. Que o nome Jerusalém significa cidade,
ou segundo o modo hebraico de entender, fundamento de paz, ou
segurança, de que Salém é uma abreviação. 3. Que Salém se
emprega como sinônimo de Jerusalém em Sl 76.2. 4. Que a
comparação do Senhor de Davi com Melquisedeque no Sl 110.4,
é a mais apropriada, visto que Melquisedeque foi rei da mesma
cidade em que Davi também o foi. 5. Que Jerusalém se acha no
caminho de Hobá e Damasco para Hebrom, lugar para onde se
dirigia o patriarca Abraão.
18 Pfeiffer, Charles F.; VOS, Howard F.; REA John. Dicionário Bíblico
Wycliffe. Tradução Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro: CPAD, 2008,
p. 1732.
19 CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e
Filosofia.Vol. 6. São Paulo: Agnus, 2006, p.35.
17 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
A RELIGIÃO DE MELQUISEDEQUE
As informações bíblicas em relação a esse misterioso personagem
têm intrigado os estudiosos modernos, levando-os a conclusões
diferentes. Uma destas trata-se da própria religião de
Melquisedeque, devido à expressão hebraica usada em relação ao
“Deus” que ele servia como sacerdote: “Deus Altíssimo” (Gn
14.18).
Aplicar a expressão “Deus Altíssimo” (‘el ‘Elyon) ao Deus
de Israel, como o faz a opinião tradicional,20 já não convence a
todos os estudiosos daBíblia.
É interessante que, das 4068 vezes que o vocábulo “Deus”
aparece na Bíblia em suas várias formas (Concordância Bíblica
Exaustiva), apenas em cinco delas no AT consta a expressão
“Deus Altíssimo”, uma em Salmos (78.35), e quatro somente nesta
passagem relacionada a Abrão e Melquisedeque. Destas quatro,
uma foi dita pelo redator do texto de Gênesis, duas por
Melquisedeque e, apenas uma porAbrão21.
20 Segundo o Dicionário Bíblico Wycliffe, a opinião de que
Melquisedeque era um verdadeiro adorador do Senhor é comungada
por Josefo, Irineu, Calvino, KD, Leupold, et al).
21 GILMER, Tomas L; JACOBS, Jon; VILELA, Milton. Concordância
Bíblica Exaustiva. São Paulo: Vida, 1999, p. 323-337.
18 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
No NT, a expressão aparece quatro vezes, uma relacionada
à mesma passagem de Gênesis, e as outras três, provieram daboca
de pessoas possuídas porespíritos malignos:
Marcos 5:7 - e gritou em alta voz: “Que queres comigo, Jesus, Filho
do Deus Altíssimo? Rogo-te por Deus que não me atormentes!
Lucas 8:28 -Quando viu Jesus, gritou, prostrou-se aos seus pés e
disse em alta voz: “Que queres comigo, Jesus, Filho do Deus
Altíssimo? Rogo-te que não me atormentes!
Atos 16:17 - Essa moça seguia a Paulo e a nós, gritando: “Estes
homens são servos do Deus Altíssimo e lhes anunciam o caminho da
salvação”.
Hebreus 7:1 - Esse Melquisedeque, rei de Salém e sacerdote do
Deus Altíssimo, encontrou-se com Abraão quando este voltava,
depois de derrotar os reis, e o abençoou;
El-Elyon, o Deus de Melquisedeque
Na opinião de Champlin, está “claro” que Abraão deve ter
pensado que Melquisedeque servia ao mesmo Deus que ele. A
observação do teólogo é que em parte alguma o rei Melquisedeque
é identificado com a fé dos hebreus22.
De fato, aquelas delicadas distinções que os historiadores religiosos
agora fazem acerca destas coisas dificilmente descrevem o primitivo
estado de coisas que prevalecia na época de Abraão. Não há que
duvidar que Melquisedeque era homem conhecido por seu poder
político e por sua espiritualidade, bem como por suas funções
sacerdotais; e Abraão não se hesitou em associar-se a ele, e mesmo
a trata-lo como um superior.23
22 CAMPLIN, 2006, v. 4, p. 210.
23 _____________, p. 210.
19 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Para Mircea Eliade,24 historiador romeno de religiões, é
importante lembrar que “existe certo número de analogias entre os
costumes dos patriarcas e as instituições sociais e jurídicas do
Oriente Próximo”. O autor admite ainda que “diversas tradições
mitológicas foram conhecidas e adaptadas pelos patriarcas durante
sua permanência na Mesopotâmia” (Op. cit.).
Do ponto de vista de Pfeiffer et al, autores do Dicionário
Bíblico Wycliffe - um referencial da pesquisa bíblico-teológica -
não existe unanimidade ou “qualquer concordânciasobreo fato de
Melquisedeque ser um adorador de Jeová ou de Baal”. Para os
autores,
Na liturgia de Rás Shamra, Baal é mencionado como “o deus
supremo”, a suprema divindade do panteão cananeu. Assim, alguns
entendem que Melquisedeque abençoou Abraão através de Baal a
quem ele considerava o supremo deus da cidade-estado de Salém
(Eric Voegelin, Israel and Revelation, Londres. Oxford, Univ. Press.
1956, pp. 191ss.; Ralph H. Elliott, The Menssage of Genesis,
Nashville. Brodman, 1961, p. 115sss.)25, citado por Pfeiffer, et
al (Di, p. 1247).
Gerhard von Rad (1961, p. 175), de acordo com o mesmo
Dicionário, escreveu que “a divindade mencionada” em Gênesis
14 el Elyon,
24 ELIADE Mircea. História das Crenças e Ideias Religiosas, da idade
da pedra aos mistérios de Elêusis. Volume 1. Rio de Janeiro: Zahar,
2008, p.171.
25 Citado polos autores Pfeiffer, Vos e Rea (Dicionário Bíblico Wycliffe,
2008, 1247).
20 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Provavelmente seja o “Baal do céu”, um deus cananeu, conhecido
particularmente na Fenícia e também em outros lugares longínquos,
e que Melquisedeque, ao venerar o “Supremo Deus, Criador do céu
e da terra” chegou muito perto de acreditar no único Deus do mundo
a quem somente Israel conhecia (Wycliffe, 2007, p. 1247).
Explicando a contemporaneidade de
Melquisedeque, de Abrão e de El (deus principal dos cananeus),
os autores Pfeiffer, Vos e Rea (op. cit. p. 1248) afirmam que se a
data da vida de Abraão (aprox. 2000 a.C.) estiver correta, “então
Melquisedeque viveu antes da substituição de El como principal
deus dos cananeus”. O que explica, na economia do Antigo
Testamento, a séria rivalidade entre a adoração a Jeová e a Baal
(Nm 22.41; Jz 2.13; 6.28-32), principalmente na época de Acabe
e Jezabel (1 Rs 16.32; 18.17-40), o que também explica as
atribuições divinas a Baal dadas pelos seus servidores.
Associações entre Yahweh e El Elion
Dada a comum associação na adoração cananeia a El Elion
com Yahweh, Champlin26 nos convida a recordar
Que esses nomes divinos não foram cunhados pelos
hebreus, pois a verdade é que eles o empregaram para
indicar seus conceitos específicos deDeus. A maioria dos
críticos pensaque os trechos de Gên. 14.18-20 e Sal. 110.4
26 CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e
Filosofia. Vol. 4.
São Paulo: Agnus, 2006.
21 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
refletem um sincretismo, mediante o qual o reinado pré-
davídico ea adoração a El Elion cananeu foram vinculados
à adoração a Yahweh (CHAMPLIN, 2006, Vol. 4, p. 210).
É natural que muitos eruditos tradicionais rejeitem tal
leitura da passagem genesíaca em questão. Outros, porém, mesmo
sendo tradicionalistas, reconhecem a associação que Abrão fez de
uma designação comum e canaanita de El Elyon (“Deus
Altíssimo”), usada por Melquisedeque, com Javé o Deus
específico de Israel.
Ao longo da Bíblia o povo de Deus incorporou várias
designações de Deus, mesmo seletivamente, sempre com o
esclarecimento de que se tratava do Javé, o único Deus revelado
ao seu povo. Um exemplo, o uso do epíteto também dirigido a
Baal, “o que cavalga sobreas nuvens”, para se referir a Javé27 – Sl
68.4
O conceito de um Deus poderoso acima dos outros
“deuses” se encontra em muitas culturas e serve de ponte para
comunicar o Evangelho.
Mas, a reflexão do teólogo é que não haveria motivo de
supormos que “a fé dos hebreus surgira do vácuo”. Para o autor,
“coisaalguma é mais clara, na história das religiões, do que o fato
de que elas dependiam de outras religiões mais antigas, ou
27 Bíblia Missionária de Estudo – Sociedade Bíblica do Brasil, 2ª
edição. São Paulo, 2009, p.19.
22 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
paralelas, fazendo empréstimo das mesmas” (CHAMPLIN, op.
cit.).
ComIsrael não foi diferente, pois se acompanharmos a sua
fé, veremos muitos desses empréstimos e adaptações.
Quanto ao sufixo do nome Melquisedeque (de Malki e
tsedeq), Aíla Andrade declara que
Além do midrash escatológico de Qumran, também há que se
investigar a perspectiva mitológica. Pois, ao contrário do que se
afirma na etimologia popular, Melquisedeque significa “meu rei
(deus) é Tsedeq”. Além disso, o shoreshe qdc compõe vários nomes
teofóricos cananeus como Adoni-tsedeq (meu Senhor é Tsedeq – cf.
Js 10,1.3); Kemosh-tsedeq, Tsedeq-Rimmon, TsedeqMelekh. Esses
nomes teofóricos deram a conhecer um deus cananeu chamado
Tsedeq, adorado na Jerusalém pré-israelita.28
Rosenberg, apud Andrade(2008) afirma queentre as antigas
civilizações havia várias formas populares de nomear a “justiça”.
Conforme esse autor, o termo acadiano Kittum, muitas vezes
correspondiaao amorreu Saduq,como aparece no nome teofórico
do rei Ammisaduqa também chamado de kimtum-kittum29. Então,
podemos afirmar que tanto mesharum quanto kittum são
equivalentes a tsedeq enquanto ambos são considerados como
sendo o atributo “justiça” pertencente ao deus sol, em Canaã ou na
Mesopotâmia.
Mas, na segunda metade do segundo milênio o culto a El
teria sido introduzido no norte de Canaã pelos imigrantes arameus
28 ANDRADE, 2008, p. 126.
29 Roy A. ROSENBERG, op. cit., p. 16ss.
23 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
(cf. Dt 26,5). El era o chefe deum panteão (elyon, o altíssimo – cf.
Dt 32,8) assim como o deus sumério An e o babilônico Anu.
A função principal de El pode ser descrita como a de um
regente distante, que designa os filhos para executar seus decretos
junto ao povo. A preocupação essencial desse deus era a justiça
social (cf. Sl 82, especialmente o v. 6)14.
El, deus de Jacó (cf. Gn 28,19; 32,30), era adorado em
quatro locais de culto: Bêth-el, P enuel (ou P eniel), El Berith e
Shequem, onde Jacó erigiu um altar nomeado El elohê Yisrael (El
é o deus de Israel, Gn 33,20). Conclui-se que os primeiros
habitantes de Jerusalém adoravam principalmente ao deus Tsédeq,
mas, por causa do fluxo migratório dos arameus, os jebusitas
adotaram também o culto a El. Kittum e Mesharum, na tradição
babilônica equivalem a tsedeq e mishôr na Bíblia30.
Segundo Donald A. Hagner, Melquisedeque aparece na
narrativa de Gênesis como pessoa extraordinária, mas não é mais
que um rei e sacerdote humano. Hagner também acha provável a
identificação de Salém com Jerusalém, no entanto, levanta a
questão da verdadeira fé de Melquisedeque:
De Melquisedeque está escrito que era sacerdote do Deus Altíssimo,
isto é, El Elyon, o chefe do panteão cananeu. É o Deus que se entende
ser o mesmo Deus de Israel, como se evidencia de sua descrição
como "Criador dos céus e da terra", o qual deu a vitória a Abraão
(Gn 14:19-20).
30 Roy A. ROSENBERG, The Veneration of Divine Justice: The Dead
Sea Scrolls and Christianity, Westport: Greenwood Press, 1995, p.15-
28.
24 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
25 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
A ORDEM DE MELQUISEDEQUE
“Jurou o SENHOR e não se arrependerá: Tu és um
sacerdote eterno, segundoa ordem de Melquisedeque” (Sl
110.4).
Nesse salmo messiânico, a promessa que o Senhor fez a Davi de
um sacerdoteeterno – promessareforçada com um juramento - só
pode ter cumprimento completo no Messias. A “ordem” de
Melquisedeque nessa afirmação (bem como em Hebreus 6.20) não
se refere a algum preceito emitido por esse homem, por mais
grandioso que ele seja, mas a uma “classe especial” de sacerdócio.
Segundo Richards, 31 “a palavra grega traduzida como
‘ordem’ é taxis”. Para o autor, “ela é usada seis vezes no Novo
Testamento sobre sacerdócio, e se refere a um grupo ou classe
particular” (2012, p. 500).
A Bíblia de Estudo Esquematizada assim expressa em
relação ao Salmo 110.4:
O salmista visiona a mistura de ofícios de rei e sacerdote em uma
pessoa. Essa expectativa podia ser aplicada corretamente a Davi, que
se vestia de uma estola sacerdotal e exercia as funções de sacerdote
31 RICHARDS, Lawrence O. Comentário Histórico-Cultural do Novo
Testamento. Rio de Janeiro: CPAD.
26 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
(2 Sm 6.1418). Todavia, Davi era apenas uma sombra de Cristo, em
que os dois ofícios foram unificados eternamente (Hb 5.610; 7.22).32
Assim sendo, essa é uma ordem eterna, pois o último
sacerdote desta classe, Jesus, se tornou sacerdote “para sempre”
(Hb 6.20). Em notas adicionais a Hebreus 7.12ª, Hagner (1997, p.
123-24) acrescenta que
Melquisedeque desempenhou papel importante no judaísmo do
primeiro século. Visto ter sido tão notável na narrativa de Gênesis,
Melquisedeque tomou-se ligado aos eventos escatológicos
vindouros. Assim é que em Qumran se descobriu um rolo
(etiquetado com o código 11Q Melquisedeque) que retrata a esse rei
e sacerdote como o libertador divino de Israel e vingador que elimina
os inimigos de Deus. Nesse papel, ele age de modo semelhante ao
do Arcanjo Miguel, relatado nos rolos. Nos escritos judaicos da
Idade Média, fica explícita a identificação entre ambos. No entanto,
é improvável que o autor da carta aos Hebreus via Melquisedeque
como anjo, ou arcanjo, como alguns dos judeus de sua época talvez
vissem.124 (Hebreus 7:1-14).33
Com toda a certeza, se essa fosse a interpretação do autor
de Hebreus, ele a teria explicitado na passagem aqui citada, tendo
32 BÍBLIA de estudo esquematizada. Sociedade Bíblica do Brasil.
Almeida Revista e Atualizada, 2ª Edição, Barueri, SP, nota p. 918.
33 Ver op. cit.
27 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
em vista também a sua preocupação com os anjos, que já vimos
antes3435.
Sem começo e sem fim
“[...] sem pai, sem mãe, sem genealogia; que não teve
princípio de dias, nem fim de existência, entretanto, feito
semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote
perpetuamente” (Hb 7.3).
O fato do escritor ter dito sobre Melquisedeque, que o
mesmo “não teve princípios de dias, nem fim de existência”, não
deve ser tomado ao pé da letra. A interpretação literal do v.3
induziu alguns eruditos à conclusão de que Melquisedeque teria
sido na verdade a materialização do Cristo pré-encarnado.
Hagner,36 no capítulo 13 de seu comentário de Hebreus
(7.1-14 - O Enigma de Melquisedeque e Sua Ordem Sacerdotal),
explica o fato de Melquisedeque continuar vivo:
34 Veja-se M, de Jongee A.S. vander Woude, "IIQ Melchizedek and the
New Testament" - llQ Melquisedeque e o Novo Testamento - NTS 12
(1966), pp.
35 -26; e J.A. Fitzmyer, "Further Light on Melchizadek from Qumran
Cave 11" - Um Pouco Mais de Luz Sobre Melquisedeque da Caverna
Qumran 11 - JBL 86 (1967), pp. 25-41.
36 HAGNER, Donald A. Novo Comentário Bíblico Contemporâneo de
Hebreus, Baseado na edição contemporânea de Almeida. São Paulo:
Editora Vida. 1997, p. 121. Donald A. Hagner é catedrático de Novo
Testamento no Fuller.
28 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
O que o autor da carta está tentando sublinhar é o silêncio
surpreendente das Escrituras a respeito da linhagem, nascimento e
morte de Melquisedeque. De um ponto de vista rabínico, o silêncio
é tido como verdadeiramente significativo, em vez de apenas
fortuito, de modo especial em se tratando de uma Pessoa tão
importante, rei e sacerdote ao mesmo tempo. Visto não haver
registro da morte de Melquisedeque, nem do término de seu
sacerdócio (tão pouco de quem lhe teria sucedido), pode-se concluir
que ele permanece sacerdote para sempre.
Segundo Filho (2005), havia, portanto, modelos possíveis
na tradição do judaísmo que foram utilizados na descrição deJesus
como sumo sacerdote, principalmente na Cristologia de Hebreus.
A apresentação que é feita de Jesus como sumo sacerdote é
singular, mas não foi criada ex nihilo e, embora se desenvolva
numa direção específica, deriva da tradição cristã baseada numa
complexa herança judaica.
Nenhum outro texto do Novo Testamento elabora uma Cristologia
sumo sacerdotal como Hebreus, mas é também certo que as duas
maiores funções sumo sacerdotais atribuídas a Jesus, a intercessão e
o auto sacrifício, são atestadas em outros textos cristãos primitivos
(Rm 8,34; Mc 10,45) e, pelo menos em um texto, Jesus é descrito
como um personagem celestial com roupas sacerdotais (Ap 1,13).37
Considerando-se, pois, o que as Escrituras dizem e o que
silenciam a respeito deMelquisedeque, toma-se evidente que ele é
semelhante ao Filho de Deus, que também jamais teve início de
37 FILHO, 2005, apud SACCHI, Paolo. Jewish Apocalyptic and Its
History.
Sheffield: Sheffield Academic Press, 1996, pp.234-235.
29 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
dias, nem fim de vida, com um sacerdócio de validade eterna (cf.
v. 17, com citação do Sl 110.4).
A importância hermenêutica de Melquisedeque
A importância hermenêutica sobre Melquisedeque para a
teologia judaico-cristã é vista principalmente pelas coisas que ela
ilustra:
1. Um significado mais profundo da história;
2. Como a história pode ser profética e simbólica;
3. A unidade do Antigo e Novo Testamentos;
4. A universalidade do ofício messiânico e sumo sacerdotal de
Cristo;
5. A ab-rogação das ordens sacerdotais do Antigo Testamento, por
estarem todas cumpridas em Cristo38.
Conclusão parcial
A despeito do que é tradicionalmente ensinado, há
evidências teóricas que Melquisedeque tenha sido um sacerdote
fiel da religião cananeia. No entanto, tal como ocorreem trabalhos
de natureza científica, o embasamento aqui apresentado, sendo
bastante seletivo, não constitui porsi só uma evidência conclusiva
sobrea leitura proposta.
Isso, evidentemente, deixa o assunto aberto para mais
pesquisas. No entanto, é bem estranho que no AT se acha, tão
38 CHAMPLIN, 2006, VOL. 4, p, 211.
30 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
poucas referências a expressão de Gênesis (“Deus Altíssimo”) em
referência ao verdadeiro Deus, ao passo queapalavra “Altíssimo”,
separadamente, é vista diversas vezes em referência ao Senhor.
O escritor de Hebreus trata de uma ordem sacerdotal
superior – A de Cristo - transmitida por um sacerdote superior
tipificado por Melquisedeque, do qual, segundo Aldery Nelson
Rocha (2011), o sacerdócio de Levi era apenas “um modelo
nacional” daquilo que poderia ser executado por um sacerdócio
universal.
31 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
O SACERDÓCIO DE CRISTO
“[...] A qual [esperança] temos por âncora da alma, segura e firme
e que penetra além do véu, onde Jesus, que nos precedeu, entrou em
nosso lugar, tornando-se sumo sacerdote para sempre, segundo a
ordem de Melquisedeque” (Hb 6.20).
Ao mencionar (cap. 6.20) uma ordem sacerdotal diferente, não
prevista na Lei mosaica, que só aparece uma vez em todo o AT
(Salmo 104.4), e, consequentemente aplicá-la a Jesus, o autor de
Hebreus achou imprescindível justificá-la aos seus leitores
supostamente judeus e, portanto, conhecedores da cláusula da Lei
(Hb 7.4).
É interessante lembrar que os destinatários da mencionada
Epístola são judeus, que estavam na iminência de desviar-se da
graça e voltar-se ao judaísmo.
Porisso o autor anônimo continua a suaargumentação sobre
“A Superioridadede Cristo”, que é o tema geral do livro. Quando
ele falou em Jesus em termos de uma nova ordem sacerdotal,
introduziu uma delimitação ao geral do livro.
A partir desta afirmação (v.20), seus argumentos
cristológicos assumem uma nova dimensão – faz referência a um
32 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
lugar elevado (“no interior do véu”- o próprio céu) – adentrado por
alguém que não era sacerdote da linhagem de Levi.
Um sacerdócio eterno
“Porque este Melquisedeque [...]” (7.1). O autor precisava
explicar - quem era esse Melquisedeque, de quem ele havia falado
(6.20) - para explicar aos seus destinatários a introdução de uma
nova e superior ordem sacerdotal.
É a essa“classificação” que, segundo Richards39, o capítulo
7 dedica-se a explicar, uma vez que o sacerdócio de Cristo deve
ser classificado juntamente com o de Melquisedeque e não como
o de Arão.
Os sacerdotes Aarônicos morriam, mas como nem mesmo a morte
pode impedir Cristo de continuar em seu cargo, Ele tem um
“sacerdócio perpétuo” (7.24) e é capaz de “salvar perfeitamente”
(7.25) aqueles que vão até Deus através dele.40
Para Richards (Id), o fato de que o sacrifício deCristo nunca
foi repetido provaque cumpriu o propósito pelo qual se destinava:
a nossasalvação. Segundo o judeu Messiânico David H. Stern,41 a
informação do versículo 3sobreMelquisedeque não quer dizer que
ele não tivesse pai, mãe ou antepassados; nascimento ou morte,
39 Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento, p. 500.
40 RICHARDS, 2012, p. 500.
41 Autor de o Comentário Judaico do Novo Testamento, p. 739.
33 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
mas significa, tão somente que “o Tanakh não contém registro
deles”. Stern explica que
Esse fato habilita o autor a desenvolver a midrash de que Malki-
Tzedek semelhante ao filho de Deus, permanece koren para
sempre, pois Yeshua também não teve pai humano (Mt 1.18-25) e
existia como a Palavra antes de seu nascimento (Yn 1.1,14) e
continua existindo depois de sua morte.42
Para Stern (Id), a midrash, feita pelo autor de Hebreus,
podeser entendida do seguinte modo:
1. O Tanakh (AT) não apresenta Malki-Tzedek (Melquisedeque) de
nenhum outro modo senão como kohen (sacerdote);
2. Uma vez que o Tanakh é verdadeiro, a existência de
Melquisedeque como um kohenpode ser considerada como sendo
eterna43.
Na opinião do autor acima,
fazer esse tipo de midrash é totalmente judaico quanto a seu caráter,
de modo que se torna relevante destacar, como costumam fazer os
críticos literalistas, que “Malki Tzedek sem dúvida nasceu de pais
verdadeiros, e morreu como qualquer outro homem”.44
Stern diz ser irrelevante a tradição judaica que identifica
Melquisedeque como um filho de Sem, conforme consta no
Talmude Babilônico (N’darim 32B), já que, segundo ele, o Tanakh
é autoritativo, a tradição não o é.
42 ______.2008, p. 740.
43 ______.2008. p. 740.
44 ______.2008, p. 740.
34 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
Conclusão parcial
O sacerdócio de Jesus é eterno pelo “poder de uma vida
indestrutível”, o que põede lado a necessidade de um sistema que
passa adiante o sacerdócio de geração em geração, conforme está
declarado de maneira explícita no capítulo 7. 23-25 a seguir.
Conclusão Geral
A hipótese proposta por este trabalho em relação a religião
de Melquisedeque, em concordância aos documentos e obras
consultadas (vide religião de Melquisedeque – capítulo 1: 2.4) é a
possibilidade de que esse homem misterioso (que aparece e
desaparece repentinamente na passagem bíblica), não seja um
sacerdotedo Deus verdadeiro ou seja, identificado na Bíblia como
o Deus de Israel. Mas, um sacerdote cuja religião e devoção seja a
demesma de Canaã antes de suaconquista porJosué. Isso fazdele,
apesar de ser um tipo perfeito do sacerdócio de Cristo, um
sacerdote pagão ou talvez um estrito “monoteísta” de Baal.
Evidentemente, essa hipótese é negada pela linha tradicional de
interpretação que o vê como um sacerdote do Deus verdadeiro, a
despeito de que não se pode estabelecer a sua linhagem sacerdotal
como é comum para os sacerdotes hebreus.
35 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
A expressão “sacerdotedo Deus Altíssimo”, encontrada em
Gênese 14.28, que no hebraico é El Elyon, não é conclusiva ou
decisiva para identificar o deus a quem o sacerdote-rei
Melquisedeque servia, nem para reconhece-lo como servo do
verdadeiro Deus de Israel. Essa questão é apresentada com
detalhes no desenvolvimento das pesquisas no capítulo já
mencionado, inclusive, uma vez que no panteão cananeu, Baal
também é apresentado como sendo El Elyon, principalmente nas
Cartas de Tell- Amarna.
Presei muito as palavras dos autores do Dicionário Bíblico
Wycliffe. Para eles, a questão não precisa ser anacrônica, ou seja,
a ideia subjacente de sacerdotes fieis em outras religiões não é
estranha para os costumes oucultura dos tempos de Abraão. Aliás,
nem mesmo é preciso cristianizar o texto, forçando uma associação
de fé entre Melquisedeque e Abraão, muito menos com a nossa. O
Novo Testamento mediante o livro canônico de Hebreus, apesar
dereconhecer a grandeza deMelquisedeque, apresenta-o como um
tipo perfeito de Cristo, dando, portanto, toda a glória ao Eterno
Filho de Deus, constituído sacerdoteeternamente.
Se cremos na canonicidade do livro, deixemos com ele a
autoridade deaplicar a Cristo tudo aquilo que a verdadeira teologia
portraz daquele sacerdócio representativo significa para nós como
Igreja a quem o Sacerdotecelestial está sempre intercedendo além
do véu.
36 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
A tese apresentada jamais tem a pretensão de ser conclusiva
na questão, pelo contrário, abre debate em relação ao tema,
acrescentando um conteúdo extra à Teologia e aos estudantes
dessa disciplina. Com certeza este trabalho despertará nos
estudantes ávidos por conhecimento algo cujo tema se pode
aprofundar mais, já que esta abordagem se constitui um modelo
diferente do que vem sendo apresentada tradicionalmente em
relação a essepersonagem.
37 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Aíla L. P. de. À Maneira de Melquisedeque, o
Messias segundo o judaísmo e os desafios da Cristologia no
contexto neotestamentário e de hoje. Tese apresentada ao
Departamento de Teologia da Faculdade Jesuíta de Filosofia e
Teologia, como requisição parcial à obtenção do título de
Doutor em Teologia, 2008.
www.faculdadejesuita.edu.br/documentos/110712841ll2B98xAc
H.pdf.
BÍBLIA de estudo esquematizada. SociedadeBíblica do
Brasil. Almeida Revista e Atualizada. 2ª Edição, Barueri, SP.
BOYER, Orlando S. Pequena Enciclopédia Bíblica. São Paulo:
Editora Vida, 1978.
CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e
Filosofia. Vol. 4. São Paulo: Agnus, 2006.
CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e
Filosofia. Vol. 6. São Paulo: Agnus, 2006.
DAVIS, John D. Dicionário da Bíblia. Tradução do Rev. J. R.
Carvalho Braga. 12ª Edição. Rio de Janeiro: JUERP, 1985.
ELIADE Mircea. História das Crenças e Ideias Religiosas, da
idade dapedra aos mistérios de Elêusis. Volume 1. Rio de Janeiro:
Zahar, 2008.
38 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO
HAGNER, Donald A. Novo Comentário Bíblico
Contemporâneo de Hebreus, Baseado na edição contemporânea
de Almeida. São Paulo: Editora Vida. 1997.
Pfeiffer, Charles F.; VOS, Howard F.; REA John. Dicionário
Bíblico Wycliffe. Tradução Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro:
CPAD, 2008.
RICHARDS, Lawrence O. Comentário Histórico-Cultural do
Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD.
ROSENBERG, Roy A. The Veneration of Divine Justice: The
Dead Sea Scrolls and Christianity, Westport: Greenwood Press,
1995.
STERN, David H. Comentário Histórico-Cultural do Novo
Testamento. Rio de Janeiro: Templus, 2008.
<www.faculdadejesuita.edu.br/documentos/110712841ll2B98xA
cH.pdf>.

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A religião de Melquisedeque

  • 1. 1 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO O. S. ARAUJO MELQUISEDEQUE Sua ordem e religião EDIÇÃO DO AUTOR 1ª. edição: 2016
  • 2. 2 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Revisão: Osmar S. Araujo Diagramação: Osmar S. Araujo Capa: Osmar S. Araujo
  • 3. 3 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO SUMÁRIO PREFÁCIO, 5 Melquisedeque um rei cananeu, 8 A religião de Melquisedeque, 17 A ordem de Melquisedeque, 25 O sacerdóciode Cristo, 31 Referências, 37
  • 4. 4 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO PREFÁCIO Esse estudo é parte do Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)realizado pelo autor como exigência ao Curso deDoutorado Livre em Teologia, que foi entregue à Universidade da Bíblia em dezembro de 2016. O autor, embora não defenda, propõe para discussões teológicas, a possibilidade de o personagemem foco professaruma religião cananeia estritamente monoteísta, mas, não necessariamente, identificando o “seu senhor” Deus Altíssimo como sendo o mesmo de Abraão e, sucessivamente dos patriarcas. Com tal possibilidade, a linha de interpretação divergindo da linha tradicional, defendida pela maioria dos cristãos. Melquisedeque (Malki-Tzedek “meu rei é justiça”) é, sem dúvidas, o homem mais enigmático ou misterioso da Bíblia Sagrada. Foram muitas as tentativas de identificá-lo. Alguns até procuram situá-lo dentro da cultura dos hebreus, e até mesmo da fé cristã, mas nenhuma conclusão inteiramente segura sepodetirar desse entendimento. 1 Quanto ao fato de sua pessoa física ou somática, é mais seguro, interpretá-lo como um ser humano de 1 CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia, v. 4, 2006, p. 210.
  • 5. 5 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO carne e ossos, ressalvando, é claro, a sua grandeza e atributos descritos na Bíblia. A lista dos supostos “melquisedeques” é grande. Portanto, há quem o associecomSem, comEnoque, comJó e, até comAdão. Outros o identificam com Espírito Santo, com a um anjo, e com o próprio Jesus [pré-encarnado] e, a muitos outros. De fato, para um grupo de exegetas judeus do círculo rabínico do primeiro século, o Melquisedeque a quem Abraão tinha pagado os dízimos era Sem. Para eles, o filho de Noé ainda estava vivo no período do patriarca Abraão e continuou vivo por mais 25 anos após a morte do patriarca (FREEDMAN, Ed.,1992, v. 4, p. 686). As questões relacionadas a esse“Rei-Sacerdote” dão espaço principalmente a especulações tradicionais como, por exemplo: a talmúdica hebraica. Esta diz se tratar de Sem filho de Noé2, um sobrevivente do dilúvio, que ainda vivia nos tempos de Abrão como o homem mais velho da épocano mundo. Posto que os problemas relacionados ao tema têm sido em torno de sua identidade – Quem ele é? De sua religião – A que deus servia? De seu papel na Cristologia – Qual a sua relação com 2 Esta possibilidade disposta na tradição judaica entra em contradição com o testemunho neotestamentário, observado pelo escritor aos Hebreus, quando enfatiza: “sem pai, sem mãe, sem genealogia, não tendo princípio de dias nem fim de vida, mas, sendo feito semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote para sempre” (Hb 7.3, ARC).
  • 6. 6 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO o Filho de Deus, o Messias e a seu sacerdócio? E outras menos importantes. Esse trabalho, embora não tão extenso, visa explorar uma possibilidade ora negada, ora omitida pela corrente tradicionalista – qual a verdadeira religião de Melquisedeque? Prefácio do autor3, 26 de janeiro de 2018. 3 Bacharel em Teologia pela Faculdade de Administração, Ciências, Educação e Letras – FACEL (2014). Possui os Cursos Online de Mestrado e Bacharelado Livre em Teologia pela Universidade da Bíblia – UNIB (2015-16). Licenciado em Filosofia pela Filemom Escola de Teologia – FEST (2018).
  • 7. 7 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO MELQUISEDEQUE UM REI CANANEU “E Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; e este era sacerdote do Deus Altíssimo. E abençoou- o, e disse: Bendito seja Abrão do Deus Altíssimo, o possuidor dos céus e da terra; e bendito seja o Deus Altíssimo que entregou os teus inimigos nas tuas mãos. E deu- lhe o dízimo de tudo” (Gn 14.18). O relato bíblico de Gênesis, embora não cita o nome Canaã como a terra natal deMelquisedeque, certamente queo autor ou o redator final desselivro o liga a ela, ao apresenta-lo como “rei de Salém”, que é de fato associadaquase que unanimemente à Jerusalém, que posteriormente aparece com o nome Jebus – uma cidade das sete nações cujos moradores foram expulsos para dar lugar ao povo israelita. Ele era um contemporâneo de Abrão. Segundo Rocha4 , o fato de Melquisedeque aparecer na passagem bíblica, sem pai e sem mãe, constitui uma evidência de que ele era da descendência de Cão e não de Sem. Rocha, que é Doutor em Divindade, entende que Melquisedeque, porserdeuma 4 ROCHA, Aldery N. Bíblia Revelada, Novo Testamento Explicado - Ômega. São Paulo: Editora ISH, 2011, p. 894.
  • 8. 8 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO descendência amaldiçoada, ao abençoar Abrão, recebeu de Deus um escapepara se livrar da maldição de noéica que fora infringida sobreos filhos de Cão, chanceesta aproveitada porele na primeira oportunidade. O teólogo cita Gênesis 12.2,3 como base. Seaceito tal tese, esse fato identifica ainda mais a raça do rei-sacerdote como dos cananeus ou canaanitas – a saber, um descendente de Canaã. As referências [bíblicas] a Melquisedeque se acham nos livros de Gênesis 14.18; Salmos 110.4 e Hebreus 5.6,10; 6.20 e 7.1,10,11,15,17, 21. A identidade de Melquisedeque Como foi dito na parte introdutória, existem muitas propostas de identificação da pessoa de Melquisedeque. O mistério todo gira em torno de seu repentino aparecimento no cenário da história, e seu consequente desaparecimento. O Dicionário Bíblico Wycliffe apresenta algumas pessoas que supostamente são identificadas com o personagem Melquisedeque. Segundo os autores, para Orígenes, ele era um anjo; para Epifânio, era o Espírito Santo; para Ambrósio, era o Senhor Jesus Cristo; Para Calmet, era Enoque; para alguns Targuns (literaturas judaicas), Lutero e outros, ele era Sem, o filho de Noé.5 5 PFEFFER; VOS; REA, 2008, p. 1247.
  • 9. 9 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Uma opinião comum entre os judeus: Sem De acordo com Norman R. Champlin (2006) a opinião de que Melquisedeque era Sem, é comum entre vários escritores judeus6. Ainda que para o autor, a razão desse esforço seja uma tentativa de evitarem “o problema” gerado pelo fato de ele ser um rei pagão, em sua visão, uma exegese da passagem bíblica não permite uma identificação de Melquisedeque com a fé cristã- judaica, só sendo isso possível pela prática da eisegese, que é, segundo ele, “ler no texto aquilo que queremos ver ali, e não realmente o que faz parte do texto sagrado”7. Segundo o Targum Pseudo-Jonathan (Tg Ps-J) de Gn 14,18a, de acordo com pesquisas de Aíla Andrade 8 (2008), Melquisedeque é identificado com “Shem, filho de Noé”. O objetivo neste tópico é fazer uma análise mais detalhada dessa expressão, visto que as figuras deNoé e seus filhos estão marcados com grande conotação mítica e escatológica. 6 Champlin cita o Targum sobre Jon. e Jerus. Jarchi, Baal Hatturim, Levi Bem Jerson e Abendana sobre Gn 14. 18; Bmidbar Rabba, seção 4, fol. 182, 4; Pierke Eliezer cap. 8; Jushasin, fol. 135, 3 e outros (2006, vol. 4, p. 211). 7 CHAMPLIN, Norman R. O Antigo Testamento Interpretado versículo por versículo. Vol. 1. São Paulo: Candeia, 2000, p. 114. 8 ANDRADE, Aíla L. P. de. À Maneira de Melquisedeque, o Messias segundo o judaísmo e os desafios da Cristologia no contexto neotestamentário e de hoje. Tese apresentada ao Departamento de Teologia da Faculdade Jesuíta de
  • 10. 10 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Para Aíla Luzia Pinheiro deAndrade (2008), analisando as camadas literárias mais antigas, Melquisedeque foi identificado comas divindades cultuadas pelos povos vizinhos de Israel. O objetivo principal da paráfrase targúmica era fazer com que o texto bíblico fosse compreendido, atualizado, e se tornasse uma profecia sobre o fim dos tempos. Para realizar esse objetivo, os sábios acrescentaram comentários dentro da narrativa enquanto traduziam o texto hebraico. E assim preenchiam certas lacunas do texto bíblico, evitavam interpretações nocivas à fé monoteísta e ofereciam uma palavra sobre o futuro.8 Para RodríguezCarmona, a identificação deMelquisedeque com Shem tinha como objetivos combater a teologia de Hb. Não descartamos detodo essaopinião de Carmona, mas aceitamos que, antes do Targum ser posto porescrito, havia uma tradição oral bem anterior e que teria porobjetivo preencher as lacunas da narrativa bíblica, evitando um prejuízo para o monoteísmo, como também está presente uma hermenêutica de forte cunho escatológico. Cf. Antonio RODRÍGUEZ CARMONA, “La figura de Melquisedec en la literatura targúmica”, EstBib 37 (1978) 79-102. Segundo a pesquisadoraos rabinos explicavam que Shem, tendo sobrevivido ao dilúvio, numa nova vida como Melquisedeque, teria assumido as funções de sumo sacerdote de El Elyon e por isso Abraão, que era da mesma linhagem, o reconheceu quando o encontrou e pagou-lhe o dízimo dos espólios
  • 11. 11 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO da guerra9. De acordo com Aíla Andrade, Melquisedeque como Shem10 podeserencontrado no TgNeof, no TgPs-J, no Tg II (110) e no Tg II (W), embora essa identificação não seja mencionada no Tg Onq e nem no 1QapGen. Um Messias sacerdotal O conceito de um messias sacerdotaltem origens no próprio Antigo Testamento (Lv 4,3.5.16; 6,15). No período anterior ao exílio, o sumo sacerdoteera subserviente ao rei, que também podia exercer funções sacerdotais (1 Sm 6,1221; 24,25; 1 Rs 3,4; 8,1-5; 12,33), mas, segundo José Adriano Filho11, durante o exílio e pós- exílio a figura do sumo sacerdote começou a assumir dimensões mais significativas. E Jeremias promete que os levitas servirão 9 ANDRADE, 2008, p. 123. 10 Melquisedeque identificado com Shem também é mencionado em Ned 32b; Pir R. Eliez 8 e 27,3; Bem. R. 4,8. Essa associação entre ambos só é possível devido à idade que o livro do Gênesis dá tanto para Shem como para Abrão. Seguindo a genealogia encontrada em Gn 11,10-11, se pode deduzir que Abraão teria nascido no ano 292 depois do Dilúvio e, como viveu durante 175 anos, teria morrido no ano 467 pós- diluviano. Como se afirma que Shem tinha a idade de 98 anos quando aconteceu o Dilúvio, aos 100 anos lhe nasceu o filho e depois viveu mais 500 anos, então se pode concluir, segundo as narrativas bíblicas, que Shem tenha sobrevivido a Abraão por 33 anos (ANDRADE, 2008, p. 123). 11 José Adriano Filho é Doutor em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de São Paulo. Professor no Seminário Presbiteriano Independente de Londrina, PR.
  • 12. 12 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO para sempre juntamente com os descendentes de Davi (33,14-18) e suas profecias têm eco na descrição de Zacarias do sumo sacerdote Josué. Na visão de Zacarias 3 e seu desenvolvimento em 6, 9-14, a era messiânica futura é claramente dominada pela figura do sumo sacerdote Josué, enquanto outro personagem aparece de passagem e num papel subordinado12. Nelson Rocha,13 falando da origem do sacerdócio universal, expõe possuiuma visão diferente na qual A realização do sacerdócio divino que não estava em Levi. Inicialmente, estava em Melquisedeque. Melquisedeque o transmitiu a Abraão, e cada primogênito seria incumbido de ser um propagador desse sacerdócio. Em toda nação haveria primogênitos, em toda família, em toda tribo. A bênção patriarcal passaria a todos eles. A todos alcançaria a bênção dos direitos de herança, de propriedade dobrada, de liderança espiritual, de autoridade moral e de posteridade; especialmente o sacerdócio. Este sacerdócio foi manifestado em tempos remotos, desde Enos, Noé, Enoque, Jó e Jetro. Para Rocha (D.D. Doutor em Divindade), que também é tradutor, comentarista e editor da Bíblia Revelada, Novo Testamento Ômega, Moisés foi o último sacerdotedessaordem, o qual instituiu o sacerdócio arônico. Poroutro lado, segundo ele, Jó foi um grande patriarca em seus dias. Sendo juiz e sacerdote universal. Na visão do editor e comentarista (supracitado), o fato de Melquisedeque, não ser da linhagem de Sem, e sim, de Cão, fez 12 FILHO, 2005, p. 1.
  • 13. 13 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO com que ele não fosse contado na genealogia dos hebreus, e é por isso queseu paie sua mãe e seus irmãos não constam na genealogia de Adão13. De acordo como pesquisadorde Oracula emSão Bernardo do Campo, (v. 1, n.1, 2005), nem Davi, nem o sumo sacerdote Josué é chamado explicitamente de Messias, mas esta interpretação será desenvolvida em Qumran, quando se fala do “Messias de Aarão e Israel” (1QS IX,11). No Sirácida 45,6-22 Aarão ocupaum lugar exaltado e Simão, o Justo, é elogiado (50,1). No Documento de Damasco, à espera do Messias que redimirá o povo da iniquidade é uma indicação de que o templo atual não é eficaz e há necessidade de um sacerdotemessiânico para restaurá- lo. Em seu artigo Filho comenta que além da apresentação de figura de Levi, Melquisedec, o sacerdote do Deus altíssimo, é também utilizado para apresentar uma figura messiânica sacerdotaldo final dos tempos. Em 11QMelquisedec, Melquisedec é identificado como jubileu, a expiação, a execução do julgamento divino e um ser celestial exaltado. Na visão do autor (Id), mesmo que não haja uma menção explícita de que Melquisedec realiza a expiação “em favor dos filhos da luz e dos homens do lote de Melquisedec”, é provável que seja ele o sumo sacerdote celestial que efetua os ritos de expiação do Yom hakippurim escatológico. A narrativa de 2 13 ROCHA, 2011. p. 895.
  • 14. 14 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Enoque 69-73 (Eslavônio) também apresenta a figura mediadora de Melquisedec, oferecendo um desenvolvimento da tradição sacerdotalde Enoque, referindo-se à relação entre a sua função e a de Melquisedec14. O nome “Melquisedeque” A palavra Melquisedeque, segundo o escritor aos Hebreus, “é, por interpretação, rei de justiça”, e por ser ele também “rei de Salém”, isso o torna também um “rei de paz” (7.2), já que “Salém” em hebraico transliterado é shalom “paz”. Esse nome vem de duas palavras hebraicas (melek), “rei” e (tsedeq), “justiça, retidão” (SOARES, 2008, p. 116). A palavra significa, literalmente, “meu rei e justo” ou, conforme Boyer15 (2006, p. 429), “Rei de Justiça”. Salém, a cidade de Melquisedeque “Em Salém está o seu tabernáculo e em Sião a sua habitação” (Sl76.2). 14 FILHO, 2005, p. 2. 15 BOYER, Orlando S. Pequena Enciclopédia Bíblica. São Paulo: Editora Vida, 1978.
  • 15. 15 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO A maioria dos estudiosos deBíblia entendem que a Salém (Shalem), governada por Melquisedeque, cujo equivalente hebraico é shalom “paz”), é o antigo nome de Jerusalém. Comentando Hebreus 7.2, Stern16 (2008, p.739) diz: Shalem – equivalente hebraico à palavra “shalom”, que significa não apenas “paz” como ainda saúde, integridade, inteireza (ver Mt 10.12N) – é a cidade de Jerusalém. Isto está claro tanto no Salmo 73.3(2), onde linhas paralelas de poesia identificam Shalem (Salém) com Sião, quanto em fontes judaicas tradicionais. Do Dicionário da Bíblia de Davis (1985), depreende-se que pelo menos cinco fatores estão ligados ao fato da Salém de Gênesis 14 ser a Jerusalém cidade de Davi: 1. A cidade já existia e era governada por um rei, antes da conquista de Canaã pelos israelitas. 2. Que o nome Jerusalém significa cidade, ou segundo o modo hebraico de entender, fundamento de paz, ou segurança, de que Salém é uma abreviação. 3. Que Salém se emprega como sinônimo de Jerusalém em Sl 76.2. 4. Que a comparação do Senhor de Davi com Melquisedeque no Sl 110.4, é a mais apropriada, visto que Melquisedeque foi rei da mesma cidade em que Davi também o foi. 5. Que Jerusalém se acha no caminho de Hobá e Damasco para Hebrom, lugar para onde se dirigia o patriarca Abraão.17 O historiador Josefo diz que essa cidade, referindo-se a Salém, é a própria Jerusalém (Ant. 1.10.2). Mas outros a nomeiam 16 STERN, David H. Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento. Rio de Janeiro: Templus, 2008. 17 DAVIS, John D. Dicionário da Bíblia. Tradução do Rev. J. R. Carvalho Braga.
  • 16. 16 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO como a cidade jebusita na fronteira entre Judá e Benjamim, que foi tomada porJoabe e se tornou “a cidade de Davi”18. Champlin19 (2006) identifica Salém como “uma provável divindade cananeia, adorada pelos jebuseus originais”. Essa conjetura, segundo o autor, explicaria a verdadeira origem do nome da cidade. Conclusão parcial Se provada a identificação de Salém com Jerusalém, as implicações segundo Davis seriam: 1. A cidade de Jerusalém já existia antes da conquista de Canaã pelos israelitas, e era governada por um rei. 2. Que o nome Jerusalém significa cidade, ou segundo o modo hebraico de entender, fundamento de paz, ou segurança, de que Salém é uma abreviação. 3. Que Salém se emprega como sinônimo de Jerusalém em Sl 76.2. 4. Que a comparação do Senhor de Davi com Melquisedeque no Sl 110.4, é a mais apropriada, visto que Melquisedeque foi rei da mesma cidade em que Davi também o foi. 5. Que Jerusalém se acha no caminho de Hobá e Damasco para Hebrom, lugar para onde se dirigia o patriarca Abraão. 18 Pfeiffer, Charles F.; VOS, Howard F.; REA John. Dicionário Bíblico Wycliffe. Tradução Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro: CPAD, 2008, p. 1732. 19 CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia.Vol. 6. São Paulo: Agnus, 2006, p.35.
  • 17. 17 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO A RELIGIÃO DE MELQUISEDEQUE As informações bíblicas em relação a esse misterioso personagem têm intrigado os estudiosos modernos, levando-os a conclusões diferentes. Uma destas trata-se da própria religião de Melquisedeque, devido à expressão hebraica usada em relação ao “Deus” que ele servia como sacerdote: “Deus Altíssimo” (Gn 14.18). Aplicar a expressão “Deus Altíssimo” (‘el ‘Elyon) ao Deus de Israel, como o faz a opinião tradicional,20 já não convence a todos os estudiosos daBíblia. É interessante que, das 4068 vezes que o vocábulo “Deus” aparece na Bíblia em suas várias formas (Concordância Bíblica Exaustiva), apenas em cinco delas no AT consta a expressão “Deus Altíssimo”, uma em Salmos (78.35), e quatro somente nesta passagem relacionada a Abrão e Melquisedeque. Destas quatro, uma foi dita pelo redator do texto de Gênesis, duas por Melquisedeque e, apenas uma porAbrão21. 20 Segundo o Dicionário Bíblico Wycliffe, a opinião de que Melquisedeque era um verdadeiro adorador do Senhor é comungada por Josefo, Irineu, Calvino, KD, Leupold, et al). 21 GILMER, Tomas L; JACOBS, Jon; VILELA, Milton. Concordância Bíblica Exaustiva. São Paulo: Vida, 1999, p. 323-337.
  • 18. 18 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO No NT, a expressão aparece quatro vezes, uma relacionada à mesma passagem de Gênesis, e as outras três, provieram daboca de pessoas possuídas porespíritos malignos: Marcos 5:7 - e gritou em alta voz: “Que queres comigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Rogo-te por Deus que não me atormentes! Lucas 8:28 -Quando viu Jesus, gritou, prostrou-se aos seus pés e disse em alta voz: “Que queres comigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Rogo-te que não me atormentes! Atos 16:17 - Essa moça seguia a Paulo e a nós, gritando: “Estes homens são servos do Deus Altíssimo e lhes anunciam o caminho da salvação”. Hebreus 7:1 - Esse Melquisedeque, rei de Salém e sacerdote do Deus Altíssimo, encontrou-se com Abraão quando este voltava, depois de derrotar os reis, e o abençoou; El-Elyon, o Deus de Melquisedeque Na opinião de Champlin, está “claro” que Abraão deve ter pensado que Melquisedeque servia ao mesmo Deus que ele. A observação do teólogo é que em parte alguma o rei Melquisedeque é identificado com a fé dos hebreus22. De fato, aquelas delicadas distinções que os historiadores religiosos agora fazem acerca destas coisas dificilmente descrevem o primitivo estado de coisas que prevalecia na época de Abraão. Não há que duvidar que Melquisedeque era homem conhecido por seu poder político e por sua espiritualidade, bem como por suas funções sacerdotais; e Abraão não se hesitou em associar-se a ele, e mesmo a trata-lo como um superior.23 22 CAMPLIN, 2006, v. 4, p. 210. 23 _____________, p. 210.
  • 19. 19 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Para Mircea Eliade,24 historiador romeno de religiões, é importante lembrar que “existe certo número de analogias entre os costumes dos patriarcas e as instituições sociais e jurídicas do Oriente Próximo”. O autor admite ainda que “diversas tradições mitológicas foram conhecidas e adaptadas pelos patriarcas durante sua permanência na Mesopotâmia” (Op. cit.). Do ponto de vista de Pfeiffer et al, autores do Dicionário Bíblico Wycliffe - um referencial da pesquisa bíblico-teológica - não existe unanimidade ou “qualquer concordânciasobreo fato de Melquisedeque ser um adorador de Jeová ou de Baal”. Para os autores, Na liturgia de Rás Shamra, Baal é mencionado como “o deus supremo”, a suprema divindade do panteão cananeu. Assim, alguns entendem que Melquisedeque abençoou Abraão através de Baal a quem ele considerava o supremo deus da cidade-estado de Salém (Eric Voegelin, Israel and Revelation, Londres. Oxford, Univ. Press. 1956, pp. 191ss.; Ralph H. Elliott, The Menssage of Genesis, Nashville. Brodman, 1961, p. 115sss.)25, citado por Pfeiffer, et al (Di, p. 1247). Gerhard von Rad (1961, p. 175), de acordo com o mesmo Dicionário, escreveu que “a divindade mencionada” em Gênesis 14 el Elyon, 24 ELIADE Mircea. História das Crenças e Ideias Religiosas, da idade da pedra aos mistérios de Elêusis. Volume 1. Rio de Janeiro: Zahar, 2008, p.171. 25 Citado polos autores Pfeiffer, Vos e Rea (Dicionário Bíblico Wycliffe, 2008, 1247).
  • 20. 20 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Provavelmente seja o “Baal do céu”, um deus cananeu, conhecido particularmente na Fenícia e também em outros lugares longínquos, e que Melquisedeque, ao venerar o “Supremo Deus, Criador do céu e da terra” chegou muito perto de acreditar no único Deus do mundo a quem somente Israel conhecia (Wycliffe, 2007, p. 1247). Explicando a contemporaneidade de Melquisedeque, de Abrão e de El (deus principal dos cananeus), os autores Pfeiffer, Vos e Rea (op. cit. p. 1248) afirmam que se a data da vida de Abraão (aprox. 2000 a.C.) estiver correta, “então Melquisedeque viveu antes da substituição de El como principal deus dos cananeus”. O que explica, na economia do Antigo Testamento, a séria rivalidade entre a adoração a Jeová e a Baal (Nm 22.41; Jz 2.13; 6.28-32), principalmente na época de Acabe e Jezabel (1 Rs 16.32; 18.17-40), o que também explica as atribuições divinas a Baal dadas pelos seus servidores. Associações entre Yahweh e El Elion Dada a comum associação na adoração cananeia a El Elion com Yahweh, Champlin26 nos convida a recordar Que esses nomes divinos não foram cunhados pelos hebreus, pois a verdade é que eles o empregaram para indicar seus conceitos específicos deDeus. A maioria dos críticos pensaque os trechos de Gên. 14.18-20 e Sal. 110.4 26 CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol. 4. São Paulo: Agnus, 2006.
  • 21. 21 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO refletem um sincretismo, mediante o qual o reinado pré- davídico ea adoração a El Elion cananeu foram vinculados à adoração a Yahweh (CHAMPLIN, 2006, Vol. 4, p. 210). É natural que muitos eruditos tradicionais rejeitem tal leitura da passagem genesíaca em questão. Outros, porém, mesmo sendo tradicionalistas, reconhecem a associação que Abrão fez de uma designação comum e canaanita de El Elyon (“Deus Altíssimo”), usada por Melquisedeque, com Javé o Deus específico de Israel. Ao longo da Bíblia o povo de Deus incorporou várias designações de Deus, mesmo seletivamente, sempre com o esclarecimento de que se tratava do Javé, o único Deus revelado ao seu povo. Um exemplo, o uso do epíteto também dirigido a Baal, “o que cavalga sobreas nuvens”, para se referir a Javé27 – Sl 68.4 O conceito de um Deus poderoso acima dos outros “deuses” se encontra em muitas culturas e serve de ponte para comunicar o Evangelho. Mas, a reflexão do teólogo é que não haveria motivo de supormos que “a fé dos hebreus surgira do vácuo”. Para o autor, “coisaalguma é mais clara, na história das religiões, do que o fato de que elas dependiam de outras religiões mais antigas, ou 27 Bíblia Missionária de Estudo – Sociedade Bíblica do Brasil, 2ª edição. São Paulo, 2009, p.19.
  • 22. 22 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO paralelas, fazendo empréstimo das mesmas” (CHAMPLIN, op. cit.). ComIsrael não foi diferente, pois se acompanharmos a sua fé, veremos muitos desses empréstimos e adaptações. Quanto ao sufixo do nome Melquisedeque (de Malki e tsedeq), Aíla Andrade declara que Além do midrash escatológico de Qumran, também há que se investigar a perspectiva mitológica. Pois, ao contrário do que se afirma na etimologia popular, Melquisedeque significa “meu rei (deus) é Tsedeq”. Além disso, o shoreshe qdc compõe vários nomes teofóricos cananeus como Adoni-tsedeq (meu Senhor é Tsedeq – cf. Js 10,1.3); Kemosh-tsedeq, Tsedeq-Rimmon, TsedeqMelekh. Esses nomes teofóricos deram a conhecer um deus cananeu chamado Tsedeq, adorado na Jerusalém pré-israelita.28 Rosenberg, apud Andrade(2008) afirma queentre as antigas civilizações havia várias formas populares de nomear a “justiça”. Conforme esse autor, o termo acadiano Kittum, muitas vezes correspondiaao amorreu Saduq,como aparece no nome teofórico do rei Ammisaduqa também chamado de kimtum-kittum29. Então, podemos afirmar que tanto mesharum quanto kittum são equivalentes a tsedeq enquanto ambos são considerados como sendo o atributo “justiça” pertencente ao deus sol, em Canaã ou na Mesopotâmia. Mas, na segunda metade do segundo milênio o culto a El teria sido introduzido no norte de Canaã pelos imigrantes arameus 28 ANDRADE, 2008, p. 126. 29 Roy A. ROSENBERG, op. cit., p. 16ss.
  • 23. 23 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO (cf. Dt 26,5). El era o chefe deum panteão (elyon, o altíssimo – cf. Dt 32,8) assim como o deus sumério An e o babilônico Anu. A função principal de El pode ser descrita como a de um regente distante, que designa os filhos para executar seus decretos junto ao povo. A preocupação essencial desse deus era a justiça social (cf. Sl 82, especialmente o v. 6)14. El, deus de Jacó (cf. Gn 28,19; 32,30), era adorado em quatro locais de culto: Bêth-el, P enuel (ou P eniel), El Berith e Shequem, onde Jacó erigiu um altar nomeado El elohê Yisrael (El é o deus de Israel, Gn 33,20). Conclui-se que os primeiros habitantes de Jerusalém adoravam principalmente ao deus Tsédeq, mas, por causa do fluxo migratório dos arameus, os jebusitas adotaram também o culto a El. Kittum e Mesharum, na tradição babilônica equivalem a tsedeq e mishôr na Bíblia30. Segundo Donald A. Hagner, Melquisedeque aparece na narrativa de Gênesis como pessoa extraordinária, mas não é mais que um rei e sacerdote humano. Hagner também acha provável a identificação de Salém com Jerusalém, no entanto, levanta a questão da verdadeira fé de Melquisedeque: De Melquisedeque está escrito que era sacerdote do Deus Altíssimo, isto é, El Elyon, o chefe do panteão cananeu. É o Deus que se entende ser o mesmo Deus de Israel, como se evidencia de sua descrição como "Criador dos céus e da terra", o qual deu a vitória a Abraão (Gn 14:19-20). 30 Roy A. ROSENBERG, The Veneration of Divine Justice: The Dead Sea Scrolls and Christianity, Westport: Greenwood Press, 1995, p.15- 28.
  • 25. 25 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO A ORDEM DE MELQUISEDEQUE “Jurou o SENHOR e não se arrependerá: Tu és um sacerdote eterno, segundoa ordem de Melquisedeque” (Sl 110.4). Nesse salmo messiânico, a promessa que o Senhor fez a Davi de um sacerdoteeterno – promessareforçada com um juramento - só pode ter cumprimento completo no Messias. A “ordem” de Melquisedeque nessa afirmação (bem como em Hebreus 6.20) não se refere a algum preceito emitido por esse homem, por mais grandioso que ele seja, mas a uma “classe especial” de sacerdócio. Segundo Richards, 31 “a palavra grega traduzida como ‘ordem’ é taxis”. Para o autor, “ela é usada seis vezes no Novo Testamento sobre sacerdócio, e se refere a um grupo ou classe particular” (2012, p. 500). A Bíblia de Estudo Esquematizada assim expressa em relação ao Salmo 110.4: O salmista visiona a mistura de ofícios de rei e sacerdote em uma pessoa. Essa expectativa podia ser aplicada corretamente a Davi, que se vestia de uma estola sacerdotal e exercia as funções de sacerdote 31 RICHARDS, Lawrence O. Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD.
  • 26. 26 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO (2 Sm 6.1418). Todavia, Davi era apenas uma sombra de Cristo, em que os dois ofícios foram unificados eternamente (Hb 5.610; 7.22).32 Assim sendo, essa é uma ordem eterna, pois o último sacerdote desta classe, Jesus, se tornou sacerdote “para sempre” (Hb 6.20). Em notas adicionais a Hebreus 7.12ª, Hagner (1997, p. 123-24) acrescenta que Melquisedeque desempenhou papel importante no judaísmo do primeiro século. Visto ter sido tão notável na narrativa de Gênesis, Melquisedeque tomou-se ligado aos eventos escatológicos vindouros. Assim é que em Qumran se descobriu um rolo (etiquetado com o código 11Q Melquisedeque) que retrata a esse rei e sacerdote como o libertador divino de Israel e vingador que elimina os inimigos de Deus. Nesse papel, ele age de modo semelhante ao do Arcanjo Miguel, relatado nos rolos. Nos escritos judaicos da Idade Média, fica explícita a identificação entre ambos. No entanto, é improvável que o autor da carta aos Hebreus via Melquisedeque como anjo, ou arcanjo, como alguns dos judeus de sua época talvez vissem.124 (Hebreus 7:1-14).33 Com toda a certeza, se essa fosse a interpretação do autor de Hebreus, ele a teria explicitado na passagem aqui citada, tendo 32 BÍBLIA de estudo esquematizada. Sociedade Bíblica do Brasil. Almeida Revista e Atualizada, 2ª Edição, Barueri, SP, nota p. 918. 33 Ver op. cit.
  • 27. 27 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO em vista também a sua preocupação com os anjos, que já vimos antes3435. Sem começo e sem fim “[...] sem pai, sem mãe, sem genealogia; que não teve princípio de dias, nem fim de existência, entretanto, feito semelhante ao Filho de Deus, permanece sacerdote perpetuamente” (Hb 7.3). O fato do escritor ter dito sobre Melquisedeque, que o mesmo “não teve princípios de dias, nem fim de existência”, não deve ser tomado ao pé da letra. A interpretação literal do v.3 induziu alguns eruditos à conclusão de que Melquisedeque teria sido na verdade a materialização do Cristo pré-encarnado. Hagner,36 no capítulo 13 de seu comentário de Hebreus (7.1-14 - O Enigma de Melquisedeque e Sua Ordem Sacerdotal), explica o fato de Melquisedeque continuar vivo: 34 Veja-se M, de Jongee A.S. vander Woude, "IIQ Melchizedek and the New Testament" - llQ Melquisedeque e o Novo Testamento - NTS 12 (1966), pp. 35 -26; e J.A. Fitzmyer, "Further Light on Melchizadek from Qumran Cave 11" - Um Pouco Mais de Luz Sobre Melquisedeque da Caverna Qumran 11 - JBL 86 (1967), pp. 25-41. 36 HAGNER, Donald A. Novo Comentário Bíblico Contemporâneo de Hebreus, Baseado na edição contemporânea de Almeida. São Paulo: Editora Vida. 1997, p. 121. Donald A. Hagner é catedrático de Novo Testamento no Fuller.
  • 28. 28 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO O que o autor da carta está tentando sublinhar é o silêncio surpreendente das Escrituras a respeito da linhagem, nascimento e morte de Melquisedeque. De um ponto de vista rabínico, o silêncio é tido como verdadeiramente significativo, em vez de apenas fortuito, de modo especial em se tratando de uma Pessoa tão importante, rei e sacerdote ao mesmo tempo. Visto não haver registro da morte de Melquisedeque, nem do término de seu sacerdócio (tão pouco de quem lhe teria sucedido), pode-se concluir que ele permanece sacerdote para sempre. Segundo Filho (2005), havia, portanto, modelos possíveis na tradição do judaísmo que foram utilizados na descrição deJesus como sumo sacerdote, principalmente na Cristologia de Hebreus. A apresentação que é feita de Jesus como sumo sacerdote é singular, mas não foi criada ex nihilo e, embora se desenvolva numa direção específica, deriva da tradição cristã baseada numa complexa herança judaica. Nenhum outro texto do Novo Testamento elabora uma Cristologia sumo sacerdotal como Hebreus, mas é também certo que as duas maiores funções sumo sacerdotais atribuídas a Jesus, a intercessão e o auto sacrifício, são atestadas em outros textos cristãos primitivos (Rm 8,34; Mc 10,45) e, pelo menos em um texto, Jesus é descrito como um personagem celestial com roupas sacerdotais (Ap 1,13).37 Considerando-se, pois, o que as Escrituras dizem e o que silenciam a respeito deMelquisedeque, toma-se evidente que ele é semelhante ao Filho de Deus, que também jamais teve início de 37 FILHO, 2005, apud SACCHI, Paolo. Jewish Apocalyptic and Its History. Sheffield: Sheffield Academic Press, 1996, pp.234-235.
  • 29. 29 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO dias, nem fim de vida, com um sacerdócio de validade eterna (cf. v. 17, com citação do Sl 110.4). A importância hermenêutica de Melquisedeque A importância hermenêutica sobre Melquisedeque para a teologia judaico-cristã é vista principalmente pelas coisas que ela ilustra: 1. Um significado mais profundo da história; 2. Como a história pode ser profética e simbólica; 3. A unidade do Antigo e Novo Testamentos; 4. A universalidade do ofício messiânico e sumo sacerdotal de Cristo; 5. A ab-rogação das ordens sacerdotais do Antigo Testamento, por estarem todas cumpridas em Cristo38. Conclusão parcial A despeito do que é tradicionalmente ensinado, há evidências teóricas que Melquisedeque tenha sido um sacerdote fiel da religião cananeia. No entanto, tal como ocorreem trabalhos de natureza científica, o embasamento aqui apresentado, sendo bastante seletivo, não constitui porsi só uma evidência conclusiva sobrea leitura proposta. Isso, evidentemente, deixa o assunto aberto para mais pesquisas. No entanto, é bem estranho que no AT se acha, tão 38 CHAMPLIN, 2006, VOL. 4, p, 211.
  • 30. 30 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO poucas referências a expressão de Gênesis (“Deus Altíssimo”) em referência ao verdadeiro Deus, ao passo queapalavra “Altíssimo”, separadamente, é vista diversas vezes em referência ao Senhor. O escritor de Hebreus trata de uma ordem sacerdotal superior – A de Cristo - transmitida por um sacerdote superior tipificado por Melquisedeque, do qual, segundo Aldery Nelson Rocha (2011), o sacerdócio de Levi era apenas “um modelo nacional” daquilo que poderia ser executado por um sacerdócio universal.
  • 31. 31 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO O SACERDÓCIO DE CRISTO “[...] A qual [esperança] temos por âncora da alma, segura e firme e que penetra além do véu, onde Jesus, que nos precedeu, entrou em nosso lugar, tornando-se sumo sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque” (Hb 6.20). Ao mencionar (cap. 6.20) uma ordem sacerdotal diferente, não prevista na Lei mosaica, que só aparece uma vez em todo o AT (Salmo 104.4), e, consequentemente aplicá-la a Jesus, o autor de Hebreus achou imprescindível justificá-la aos seus leitores supostamente judeus e, portanto, conhecedores da cláusula da Lei (Hb 7.4). É interessante lembrar que os destinatários da mencionada Epístola são judeus, que estavam na iminência de desviar-se da graça e voltar-se ao judaísmo. Porisso o autor anônimo continua a suaargumentação sobre “A Superioridadede Cristo”, que é o tema geral do livro. Quando ele falou em Jesus em termos de uma nova ordem sacerdotal, introduziu uma delimitação ao geral do livro. A partir desta afirmação (v.20), seus argumentos cristológicos assumem uma nova dimensão – faz referência a um
  • 32. 32 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO lugar elevado (“no interior do véu”- o próprio céu) – adentrado por alguém que não era sacerdote da linhagem de Levi. Um sacerdócio eterno “Porque este Melquisedeque [...]” (7.1). O autor precisava explicar - quem era esse Melquisedeque, de quem ele havia falado (6.20) - para explicar aos seus destinatários a introdução de uma nova e superior ordem sacerdotal. É a essa“classificação” que, segundo Richards39, o capítulo 7 dedica-se a explicar, uma vez que o sacerdócio de Cristo deve ser classificado juntamente com o de Melquisedeque e não como o de Arão. Os sacerdotes Aarônicos morriam, mas como nem mesmo a morte pode impedir Cristo de continuar em seu cargo, Ele tem um “sacerdócio perpétuo” (7.24) e é capaz de “salvar perfeitamente” (7.25) aqueles que vão até Deus através dele.40 Para Richards (Id), o fato de que o sacrifício deCristo nunca foi repetido provaque cumpriu o propósito pelo qual se destinava: a nossasalvação. Segundo o judeu Messiânico David H. Stern,41 a informação do versículo 3sobreMelquisedeque não quer dizer que ele não tivesse pai, mãe ou antepassados; nascimento ou morte, 39 Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento, p. 500. 40 RICHARDS, 2012, p. 500. 41 Autor de o Comentário Judaico do Novo Testamento, p. 739.
  • 33. 33 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO mas significa, tão somente que “o Tanakh não contém registro deles”. Stern explica que Esse fato habilita o autor a desenvolver a midrash de que Malki- Tzedek semelhante ao filho de Deus, permanece koren para sempre, pois Yeshua também não teve pai humano (Mt 1.18-25) e existia como a Palavra antes de seu nascimento (Yn 1.1,14) e continua existindo depois de sua morte.42 Para Stern (Id), a midrash, feita pelo autor de Hebreus, podeser entendida do seguinte modo: 1. O Tanakh (AT) não apresenta Malki-Tzedek (Melquisedeque) de nenhum outro modo senão como kohen (sacerdote); 2. Uma vez que o Tanakh é verdadeiro, a existência de Melquisedeque como um kohenpode ser considerada como sendo eterna43. Na opinião do autor acima, fazer esse tipo de midrash é totalmente judaico quanto a seu caráter, de modo que se torna relevante destacar, como costumam fazer os críticos literalistas, que “Malki Tzedek sem dúvida nasceu de pais verdadeiros, e morreu como qualquer outro homem”.44 Stern diz ser irrelevante a tradição judaica que identifica Melquisedeque como um filho de Sem, conforme consta no Talmude Babilônico (N’darim 32B), já que, segundo ele, o Tanakh é autoritativo, a tradição não o é. 42 ______.2008, p. 740. 43 ______.2008. p. 740. 44 ______.2008, p. 740.
  • 34. 34 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO Conclusão parcial O sacerdócio de Jesus é eterno pelo “poder de uma vida indestrutível”, o que põede lado a necessidade de um sistema que passa adiante o sacerdócio de geração em geração, conforme está declarado de maneira explícita no capítulo 7. 23-25 a seguir. Conclusão Geral A hipótese proposta por este trabalho em relação a religião de Melquisedeque, em concordância aos documentos e obras consultadas (vide religião de Melquisedeque – capítulo 1: 2.4) é a possibilidade de que esse homem misterioso (que aparece e desaparece repentinamente na passagem bíblica), não seja um sacerdotedo Deus verdadeiro ou seja, identificado na Bíblia como o Deus de Israel. Mas, um sacerdote cuja religião e devoção seja a demesma de Canaã antes de suaconquista porJosué. Isso fazdele, apesar de ser um tipo perfeito do sacerdócio de Cristo, um sacerdote pagão ou talvez um estrito “monoteísta” de Baal. Evidentemente, essa hipótese é negada pela linha tradicional de interpretação que o vê como um sacerdote do Deus verdadeiro, a despeito de que não se pode estabelecer a sua linhagem sacerdotal como é comum para os sacerdotes hebreus.
  • 35. 35 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO A expressão “sacerdotedo Deus Altíssimo”, encontrada em Gênese 14.28, que no hebraico é El Elyon, não é conclusiva ou decisiva para identificar o deus a quem o sacerdote-rei Melquisedeque servia, nem para reconhece-lo como servo do verdadeiro Deus de Israel. Essa questão é apresentada com detalhes no desenvolvimento das pesquisas no capítulo já mencionado, inclusive, uma vez que no panteão cananeu, Baal também é apresentado como sendo El Elyon, principalmente nas Cartas de Tell- Amarna. Presei muito as palavras dos autores do Dicionário Bíblico Wycliffe. Para eles, a questão não precisa ser anacrônica, ou seja, a ideia subjacente de sacerdotes fieis em outras religiões não é estranha para os costumes oucultura dos tempos de Abraão. Aliás, nem mesmo é preciso cristianizar o texto, forçando uma associação de fé entre Melquisedeque e Abraão, muito menos com a nossa. O Novo Testamento mediante o livro canônico de Hebreus, apesar dereconhecer a grandeza deMelquisedeque, apresenta-o como um tipo perfeito de Cristo, dando, portanto, toda a glória ao Eterno Filho de Deus, constituído sacerdoteeternamente. Se cremos na canonicidade do livro, deixemos com ele a autoridade deaplicar a Cristo tudo aquilo que a verdadeira teologia portraz daquele sacerdócio representativo significa para nós como Igreja a quem o Sacerdotecelestial está sempre intercedendo além do véu.
  • 36. 36 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO A tese apresentada jamais tem a pretensão de ser conclusiva na questão, pelo contrário, abre debate em relação ao tema, acrescentando um conteúdo extra à Teologia e aos estudantes dessa disciplina. Com certeza este trabalho despertará nos estudantes ávidos por conhecimento algo cujo tema se pode aprofundar mais, já que esta abordagem se constitui um modelo diferente do que vem sendo apresentada tradicionalmente em relação a essepersonagem.
  • 37. 37 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO REFERÊNCIAS ANDRADE, Aíla L. P. de. À Maneira de Melquisedeque, o Messias segundo o judaísmo e os desafios da Cristologia no contexto neotestamentário e de hoje. Tese apresentada ao Departamento de Teologia da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, como requisição parcial à obtenção do título de Doutor em Teologia, 2008. www.faculdadejesuita.edu.br/documentos/110712841ll2B98xAc H.pdf. BÍBLIA de estudo esquematizada. SociedadeBíblica do Brasil. Almeida Revista e Atualizada. 2ª Edição, Barueri, SP. BOYER, Orlando S. Pequena Enciclopédia Bíblica. São Paulo: Editora Vida, 1978. CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol. 4. São Paulo: Agnus, 2006. CHAMPLIN, Norman R. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol. 6. São Paulo: Agnus, 2006. DAVIS, John D. Dicionário da Bíblia. Tradução do Rev. J. R. Carvalho Braga. 12ª Edição. Rio de Janeiro: JUERP, 1985. ELIADE Mircea. História das Crenças e Ideias Religiosas, da idade dapedra aos mistérios de Elêusis. Volume 1. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
  • 38. 38 MELQUISEDEQUE, SUAORDEM E RELIGIÃO HAGNER, Donald A. Novo Comentário Bíblico Contemporâneo de Hebreus, Baseado na edição contemporânea de Almeida. São Paulo: Editora Vida. 1997. Pfeiffer, Charles F.; VOS, Howard F.; REA John. Dicionário Bíblico Wycliffe. Tradução Degmar Ribas Júnior. Rio de Janeiro: CPAD, 2008. RICHARDS, Lawrence O. Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento. Rio de Janeiro: CPAD. ROSENBERG, Roy A. The Veneration of Divine Justice: The Dead Sea Scrolls and Christianity, Westport: Greenwood Press, 1995. STERN, David H. Comentário Histórico-Cultural do Novo Testamento. Rio de Janeiro: Templus, 2008. <www.faculdadejesuita.edu.br/documentos/110712841ll2B98xA cH.pdf>.