SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 100
Baixar para ler offline
LuÍso Duclo Soores
llusïroçõo de Sergio Morques
f.r{
FJ{
)Jo
çn
Í+
Q'.
Ë
)r{ o
S)
cn
o
c
H
H
>)
)-{
FJ{
)Jo
cn
Í-l
Q'.
E
)r{ o
sr
a
o
D
o
t-
o
=
.o
(f)
L
ro
rJ'l
c)
-o
o
lo
(-)"
o
L
F
a
:)
a
G)
lb
o
o
a
o
E
=
ê
o
a
=
-l
Histórias com
FIistória
',. 1
FI Ëa'nt&,
Uma terra
de muita gente
Num país à beira-mar,
que se chama Portugal,
viveram povos antigos,
cá deixaram seu sinal.
Os primeiros habitantes
não tinham casas, mas grutas,
caçavam bichos do mato,
comiam ervas e frutas.
De muito longe chegaram,
os Celtas mais os Iberos.
Quando eles se iuntaram
formaram os Celtiberos.
Vinham ter às nossas praias,
os barcos cartagineses.
Gregos, Fenícios e outros
aqui vinham muitas vezes.
LJsavam o alfabeto,
seus hábeis comerciantes,
e usavam a moeda.
Nada ficou como dantes.
Não ia durar a paz.
Todos queriam esta terra.
Por ser tão boa, tão bela
a disputavam em guerra.
Os exércitos romanos,
lutando por um império,
tudo queriam conquistar.
E foi mesmo um caso sério!
Fez-lhes frente Viriato,
bravo pastor lusitano,
que não podia aceitar
o duro poder romano. 111:t
h, , ,...
 ''
Mas os novos invasores
acabaram por ganhar:
pagaram a três traidores,
pagaram para o matar.
Pelas estradas romanas
veio civilização.
Fomos parte do império,
o maior, maior de então.
LJns seis séculos durou
essa romanizaçáo.
Mas os Bárbaros chegaram:
que tremenda confusão!
Alanos, Vândalos, Suevos,
sobretudo Visigodos,
impuseram à pancada
suas regras e seus modos.
Seguiam o cristianismo,
novas maneiras de estar.
Mas lutas, sangrentas lutas,
cá haviam de voltar.
Subiram os Muçulmanos
pela Península acima. i,
Plantaram plantas estranhas
que se dão com este clima.
Trouxeram novas palavras
e nova religião.
Bem queriam cá ficar.
Não ficaram semfre, não.
A Reconquista Cristã
pelo Norte começou.
Mas pô-los daqui para fora
muitos séculos levou.
Dessa mistura de gente,
de línguas e de cultura
se fez aquilo que somos,
e que em Portugal perdura
A suposta
D. Afonso
esp
He
ada de
nrlques
a
A espada de D. Afonso Henriques estava fana de estar parada, em
exposição, no Museu Militar do Porto. .
-Tirem-me daqui!Tirem-me daqui senão desato à espadeirada e parto
tudo à minha volta! - barafustava ela detrás do vidro que a protegia.
Mas ninguém ouve avozdas espadas senão quando elas são empunhadas
por uma mão forte.
-Tirem-me daqui! Se não fosse eu não havia Portugal... Fui feita para
lutar!
A professora, que fora ao museu com os alunos em visita de estudo,
deu ordem para avançarem para a sala seguinte, mas o Afonso José
escondeu-se por trás de uma armadura, enquanto os colegas prosseguiam.
Esborrachou o nariz no vidro que protegia a arma e então ouviu
nitidamente a voz da espada.
- Liberta-ffie: Afonso! Liberta-me que eu conto-te a minha história.
- Conta-me a história primeiro - pediu o rapaz.
A espada não gostava de ser contrariada. Tremeu de irritação, mas lá
começou.
Era uma vez um menino, filho de um poderoso nobre e de uma princesa,
que se chamava Afonso Henriques. Tinha ele três anos quando o seu pai
morreu, ficando a mãe a governar o Condado Portucalense, onde viüam.
Deu-o a educar a um aio chamado Egas Moniz.
- Calculo que esse aio o mandou para as melhores escolas, para ser
muito culto, um verdadeiro sabichão.
- Qual quê! - irritou-se a espada. - Com três anos já ele brincava com
uma espadinha de pau e andava à pancadaria com a garotada. Tinha jeito
para a guerra. Que interesse havia em frequentar a escola?
- Bem, aprendia a ler, a escrever...
6 .t
- Q,re inutilidade! - exclamou a espada. - No nosso tempo, os padres
e os frades é que aprendiam essas coisas. LJm nobre tinha de ser forte na
caça e nas batalhas. Lutava com ursos, com javalis e com os inimigos.
A sua maior ambição era cortar a cabeça aos mouros!
O rapaz arrepiou-se:
- Que horror!
A espada remexeu-se no expositor.
- Tu és um fracalhote, não prestas para nada. Sabes ao menos montar
a cavalo? Já pegaste numa lança? Já mataste um lobo? Conseguias erguer
uma pesada espada de ferro como o nosso rei?
- Não... mas sei mexer num tablet.- ripostou o rapaz, já ofendido,
mostrando a máquina novinha que recebera no Natal.
--l
- Tira essa maquineta insignificante da minha frente senão ainda a
corto ao meio - ameaçou a espada.
Afonso José encolheu-se, com medo, e pediu-lhe que continuasse a
contar.
- Tinha Afonso Henriques uns 14 anos quando se armou cavaleiro.
Esse é que era um tapaz de fibra!
- Eu com 14 anos ainda vou andar na escola. Se me metesse em
cavalarias, o meu pai e a minha mãe punham-me de castigo.
A espada, então, ate rodopiou de tanto rir.
- A tua mãe punha-te de castigo?! Pois Afonso Henriques não recebia
ordens da mamã. Como não estavam dç acordo e ambos queriam mandar,
ele reuniu os seus homens e foi guerrear contra ela na batalha de S. Mamede.
Parece que até a prendeu! E eu furei a barriga a alguns galegos partidários
de D. Teresa!
Afonso José espantou-se. Hoje, bater na mãe seria impensável. Seria a
mais criticável violência doméstica. Mas se Afonso Henriques seguisse as
normas de agora' nunca teria conseguido a independência. Às vezes é
difïcil compreender o que se passava noutros tempos...
I
O rupaz pediu-lhe, então, que contasse um episódio mais divertido.
- Divertido? - interrogou a espada. - O mais divertido foi a batalha de
Ourique. Parece que havia cinco vezes mais mouros do que cristãos, mas
conseguimos dar cabo deles. Até disseram que foi um milagre! Só eu acabei
com umas dúzias de infiéis. No fim da batalha, os soldados ergueram-nos
e aclamaram D. Afonso Henriques rei. O nosso herói nunca me largou,
empunhou-me no ar. Que glória! Que excitação!
- No futebol também levantam o Ronaldo, levam-no aos ombros -
disse Afonso José. - Ele também é um rei.. . à moda moderna.
A espada, furiosa, quase partia o vidro. Como é que aquele miúdo se
atrevia a comparar um simples futebolista com o ConquistadoÊ
- Que comparação incrível! D. Afonso Henriques era o homem mais
forte e corajoso do seu tempo. Distinguia-se entre todos, pela bravura e até
pela altura. Havia de ter dois metros bem medidos!
- Se fosse hoje, certamente, seria o rei do basquetebol; é um jogo em
que se atiram bolas bem alto para acertar num cesto - explicou Afonso
José.
A espada estava mesmo a perder a paciência
- Cala-tq rapaz irreverente. Não confundas desportistas com herois
que lutaram por uma causa, por uma fé, por um país.
A espada continuou a contar que nunca se afastara do seu senhor.
Dormia junto dele e até na morte o acompanhou. Foi sepultada com
o primeiro rei na igreja de Santa Cruz, em Coiinbra.
- Então, como é que vieste aqui parar? - quis saber o jovem.
- Quando abriram o túmulo, séculos mais tarde, encontraram-me e
veneraram-me como símbolo. Vários reis vieram admirar-me, quiseram
empunhar-me. Calcula que D. Sebastião até me levou paraAlcácer Quibir.
De facto, julga-se que a espada verdadeira por lá tenha ficado e que eu seja
uma réplica. Mas a história está cheia de incerrezas... E hoje aqui estou,
para que todos me vejam. Sem mim, o teu país não existiria. Tü serias,
provavelmente, galego ou mouro.
O rupaz fitou a antiquíssima espada que tanto mais teria para contar.
Este ano queria praticar um novo desporto. Tinha pensado no ténis ou no
atletismo. Mas, naquele momento, de repente, teve vontade de pegar
naquela espada e de aprender esgrima. Tinham-lhe chamado Afonso em
honra do primeiro rei e o pai dizia-lhe, muitas vezes:
- Hás de ser forte e corajoso e de vencer na vida. Hás de ser um
conquistador! Para isso te demos o nome que tens!
Mas nunca lhe tinham oferecido uma espada. A mãe nem o deixava ter
um canivete suíço, com medo que se cortasse.
- Gostava de te levar comigo, espada... - murmurou ele. -Vou ver se
consigo tirar-te daí... Libertar-te.
Estava a pensar como é que havia de partir o espesso vidro, quando
a professora entrou, explosiva, na sala.
- Que tapaz impertinente, este Afonso! Sempre a desobedecer! Tem
a mania da independência!
E puxou-o pela manga do casaco, arrastando-o
Ele ficou a olhar para trás.
A espada, vertical, chamava-o com o seu brilho.
dali para fora.
il:
.,iì
iì.....--
l- I I 'lì'
'l
| .,t r ì 1.i
t , j i/ 1
)
, , rF 74/
'":'!';
t'/ ' "
'i,Ju
".',
' ''
|,
..../ // 1
.:..'i..r1,- ": "/l'/
i
,/
-/-.'
t-. -:-
tfar.
G.
''. '

(  )
/

.. :1
'!'
I
I
I
!
!
$
t)
i
I
I
I
!
i
I
i
I
!
i
I
ü
L?
Com el-rei D.
aquele que fez
Dinis,
tudo
o
o que qurs
D. Dinis mand.ou aparelhar o seu cavalo para ir até ao pinhal de Leiria.
- Também queremos ir! exclamaram os príncipes Constança e
Afonso.
- E posso levar o Martim para brincar comigo? - perguntou o infante.
O pajem sorriu e apressou-se a tratar de tudo o que fazia falta. Foi à
cozin}:a pedir pão e fruta para a merenda, e não se esqueceu da caixinha
com uma pena de gansor urn frasco de tinta e uma folha de pergaminho,
para o caso de el-rei precisar de escrever. Levava também um saquito para
Írazer pinhões. Estava no paço desde os 8 anos, graças ao pai ser alfaiate
da corte, e prestava pequenos serviços.
Num trote cadenciado, depressa chegaram ao pinhal, onde se amontoavam
centenas de pequenos pinheiros-bravos para serem plantados naquele
chão de areia.
A princesinha ficou desiludida.
- Se o pinhal que o avô começou a plantar era de pinheiros-mansos,
que dão pinhões, para que manda o senhor meu pai plantar todos estes
que não servem para nada? ,
O rei então explicou que os pinheiros-bravos iam segurar muito melhor
aqueles terrenos. E dariam boa madeira para fazer barcos. Portugal, para
se desenvolver, tinha de se aventurar pelos caminhos do mar
Mas o herdeiro do trono estava mais interessado em lutas, e para tal jít
apanhara dois ramos secos, que pareciam mesmo lanças, e declarara guerra
a Martim. Por entre as árvores, nas clareiras, travavam as batalhas. Zás,
pás, catrapás! ^"
È9"
s
L2 S.
s
ë
{
- Por Santiago, vamos aos mouros! - gritava Afonso, enquanto o
companheiro fugia, pois várias vezes já sofrera os seus rudes golpes.
- Martim, dá-me o saco paÍa guardar os pinhões - exigia a princesa.
- Cala-te que eu é que vou ser rei, eu é que mand.o aqui! - exclamava
o irmão que não queria interromper a brincadqira.
Mas ela logo ripostava:
- Ora essa!Tinha eu 20 meses quando fui prometida ao futuro rei de
Castela. E vou casar-me aos 12 anos.Vou ser rainha de um país maior que
o teu!
- Pois eu vou ser doutor de leis e impor a ordem. Agora vamos lanchar
- disse Martim, para espanto dos infantes, habituados afazerem dele gato-
-sapato.
- Cala-telVais mas é ser alfaiate como o teu pai!Já se viu alguém mudar
de grupo social?
-
tl
llb
"[
.ç
/ ,
ó
t0
,
 o-o t
D. Dinis, eue entretanto se aproximara, interrompeu a conversa.
- O nosso país precisa de pessoas muito sabedoras. Para isso criei os
Estudos Gerais, que formarão doutores em Artes, Leis e Medicina. euem
sabe se o Martim não será uma ilustre figura...
Mas naquele momento o rapa z era apenas lum pajeffir € estendeu na
erva uma toalha com fruta, pão e queijo.
Quando terminaram' o rei deu a mão à filha e foi mostrar-lhe as flores
do pinheiro. Poucos reparavam nelas, mas eram tão belas, tão perfumadas...
Bem podiam inspirar um poema.
As imagens ffansformaram-se em palavras, vibraram no seu coração.
O rei ffovador sentou-se numa pedra e cantou:
Ai flores, ai flores do verde pinho
se sabeis novas do meu amigo.
Ai, Deus, e u é? (Ai, Deus, onde está?)
Ai flores, ai flores do zterde ramq
se sabeis novas do meu amado
Ai, Deus, e u é? (Ai, Deus, onde está?)
Se sabeis noz)cts do meu amigo,
aquele que mentiu do que pôs comigo
Ai, Deus, e u é? (Ai, Deus, onde estó?)
A sua voz bem timbrada ressoava pelo pinhal, abafando a dos melros e
das cotovias.
Martim e constança aproximaram-se, maravilhados. Aquele momento
parecra mesmo mágico.
Já Afonso corria com um coelho na mão:
'^
- L,acer-o, cacel-o com um pau.vai ser o meu jantar.
t4
Martim foi buscar a caixinha com a pena de ganso e estendeu-a ao
soberano.
- Este poema é tão lindo que não se pode perder. Ninguém faz poemas
como os vossos, nem trovador nem jogral. Escrevei_o, _a., senhor, antes
que ele se apague da vossa memória. um diar' com ,;r* ìr..rrru, hei de
juntar todas as vossas poesias num livro.
o sol estava quase a pôr-se quando, de novo, montaram os cavalos, de
regresso ao castelo.
À entrada do grande pátio muralhado encontraram a rainha D. Isabel,
que distribuía esmolas pelos pobres. o. rei sorriu, rembrando o milagre
que acontecera numa manhã de janeiro.
- Meu pai, contai-me de novo como tudo se passou. Quero guardar
para sempre essa história na lembrança _ pediu a princesinhì.
Então, D. Dinis contou que vira a sua esposa sair do castero com
qualquer coisa escondida no regaço, e rogo calculara que fosse pão para
matar a fome aos mais necessitados. Muiãs ,o.res a advertira de que não
devia gastar em esmolas o dinheiro que ere queria pataouffos fins, para
grandes projetos. E perguntara-lhe o que l.u"uu. Ela hesitara um pouco,
comprometida por continuar a distribuir esmotu, .orr,rul-,oorr,"de do
marido, mas respondera:
- São rosas, senhor, são rosas...
- Rosas em janeiro? Nunca tal se viu.
Então a rainha abrira o manto . o oao em rosas se tornara. Fora esse o
milagre das rosas
- É uma santa, a nossa rainha - observou o pajem. -Vive parao bem,
vive para a paz.
-- - rs,,vr^r' Y rv,- I
o infante D. Afonso torceu o nafiz.Ter uma mãe santa tinha um
inconveniente: nunca o deixava andar à pancadaria. E mal sabia ele que,
no futuro, a mãe havia de ir para os campos de batalha pôr fim às lutas que
iria ter com o pai.
16
A padeira de Aliubarrota
Brites de Almeida vivia em Aljubarrota e lá trabalhava como padeira.
Mas a sua fama não vinha das apetitosas fornadas de pão com que matava
a fome a quem ali morava. Tornara-se famosa pela sua foïça, coragem e
patriotismo' Vinha gente de fora para a conhecer. E ela tinha orgulho em
contar a sua história, sempre que lhe pediam:
Nasci em Faro, e, rogo à nascença, viram que eu era diferente, pois
tinha seis dedos em cada mão.
- Que bom! - exclamaram os meus pais, convencidos que, por ter
dedos a mais, ia ser muito trabalhadeira.
Enganaram-se bem! Eu não gostava de servir na taberna que eles
tinham e entretinha-me a brincar como os rapazes. pancadaria, jogo do
pau e espadeirada eram a minha especialidade. Um dia parti uma bilha na
cabeça dê um sujeito que se meteu comigo!
Pior foi quando um soldado me pediu em casamento. Só me casaria
com ele se antes lutasse comigo para vermos quem era mais forte. Eu
tinha um corpanzil de meter respeito, mais músculos que um ferreiro, e a
agilidade de um galgo. Claro que lhe ganhei! Mas, pot azar_, o fracore, o
lingrinhas, o insigniÍicante, foi desta para melhor... E tive de fugir para
não ser presa. Que caminho havia de tomar? Meti-me num batel, rumo a
castela, mas fui atacada por piratas, que me frzeram prisioneira.
venderam-me no mercado de escravos a um surtão.
Acham que eu me deixei ficar? Acham que eu aceitei ser mais uma das
muitas mulheres desse velho caquético? Estão a ver-me fechada num
palácio para o resto da vida? vesti-me de moura e fugi de novo, de barco,
para Portugal.
18
Para ter a certeza de que escapava aos guardas, que podiam ainda
andar à minha procura, cortei o cabelo, comprei roupa de homem, arranjei
um burro e fiz-me almocreve, vendendo um pouco de tudo pelas feiras.
Ninguém desconfiou de que eu era apenas uma "donzela".
Até que um dia, cansada de aventuras, vim para Aljubarrota e rne frz
padeira. Casei com um lavrador. Mal sabia eu que a minha principal
aventura ia ser nessa terra pacata.
vocês já ouviram falar da famosa batalha de Aljubarrora, em que
vencemos os castelhanos, impedindo que o rei deles fosse também rei de
Portugal? Foi na tarde de 14 de agosto de 1385. eue tarde de calor e de
sangue!
À frente das nossas tropas vinham o rei D.João e o condestável D. Nuno
Álvares Pereira, que ia pôr em prática uma nova tática: atátjcado quadrado.
Só graças a ela conseguiriam vencer um exército muito mais numeroso.
Quem me dera ter estad o lá, a combater! Nunca percebi porque é que não
aceitavam mulheres como soldados. Eu seria logo a primeira a alistar-me!
Mas não podia perder o espetáculo. F'ui com os vizinhos para um lugar
de onde podíamos ver a batalha. Extraordinária! os castelhanos avançaram
com os seus cavalos e cavaleiros revestidos por reluzentes armad.uras e os
portugueses iam quase todos a pé.Mas a nossa técnica e coragem foram
de mais! Quando vimos a bandeira inimiga ser arrastada pelo chão, até nos
abraçámos. Foi o sinal da vitória!
Terminada a batalha, voltei para casa e vi que a porta do forno estava
aberta. Quem a abrira? cheirou-me logo a esturro! peguei numa pá,
aproximei-me, e que vi eu? Sete militares de Castela a tremelicarem de
medo lá dentro.
- Saiam daí para fora, seus cobardes!Venham medir forças comigo!
Mas eles cada vez tremiam mais e não dveram coragem de sair. Então,
peguei na pá com que meto os pães no forno e zás!, caprapás!, desatei a
malhar nos inimigos. Os indivíduos chiavam como ratos, uivavam como
lobos, chorincavam como medricas que eram. Mas guerra é guerra! E eu
tinha de lutar por portugal. Dei cabo de todos sere. sete de uma vez!
O povo, quando soube, chamou-me heroína, que ria fazer-me uma
festa. Mas acham vocês que era tempo de festanças? Reuni as outras
mulheres e lá fomos nós à procura de mais fugitivos. Nunca digam que
somos o sexo fraco! Fizemos uma limpeza geral!
20
O achamenro do Brasil
ATO I
Cena I
Em frente da praia do Restelo esta a grande armada de pedro Álvares cabral,
c-om as::: 13 embarcações. Leva IS00 homens na segunda ztiagem marítima
parq a Indza.
Em terra alnontu am-s e arto s dignatário s, familiares, curio s o s.
rr,rÃB fthorando)
- Ai, meu rico filhinho... vai partir e não sei se volta...
JUDEU
- cale-se, senhora! É preciso é dar força a quem parte. E bem precisamos
que vão lá ao oriente buscar especiarias para fazermos negócio.
COZINHEIRO
- o bacalhau sem pimenta e os bolinhos sem canela, já ninguém os
quer. Que venha também a noz-moscada, o cravinho, o açafrão. Nem
o vinho sabe bem sem um bocadinho de gengibre.
UÃB Qimpando as lágrimas)
- Meu rico filho!vai um moço na flor da idade correr tantos perigos por
causa de uns gulosos? Porque não temperam a comida com salsa e coentros?
EanuacÊurrco (transportando um saco com ernes medicinais)
- cale-se, ó tiazinha. vossemecê não entende que por aquelas terras há
plantas que curam as enfermidades? Muitos remédios novos hei de preparar
na minha botica para salvar vidas. Para já vou vender-lhe um chazinho para
os nervos' É tiro e queda. Bebe-o e até fica com vontade de ir para o arraial.
22
COZINHEIRO
- Que charlatão! Vi-o a apanhar urtigas e caganitas de coelho, que são
a base dos remédios milagrosos que impinge por bom dinheiro!
As raparigas agitam lenços e, simultaneamente' trauteiam uma canção.
Caraztela, caraztela,
linda princesa do mar,
onde estqra meu amigo
que tanto tarda em aoltar?
Nos braços de uma sereia,
se quedou enfeitiçado?
Ou no cabo das Tormentqs
tera ele naufragado?
V
:-
O boticário ri e dá, uns passinhos de dança. Vai buscar uma moça para
dançar com ele.
uÃE (empurrando os dois)
-Vão bailar pata o inferno!Vossemecês e toda essa cambada...
VELHO DO RESTELO (olhando para o rio)
-Thntos homens a abandonar Portugal.. . Deviam era ficar cá a trabalhar!
Deixam os campos desertos, já ninguém os semeia. Despr ezamos oficios.
t<r..
.tr oe mats!
uÃe
-Tem toda a tazão, senhor! Já perdi o marido; parre agora o único filho
que tenho...
VELHO DO RESTELO
- tocam o certo pelo duvidoso. euando se arrepend.erem, será tarde
de mais.
Passam Q correr dois grumetes, Diogo e Fernão, cada qual com o seu saquito
a tiracolo, e um padre, andando mais deztagar, com uma grande cruz na mão.
i'
GRUMETE DIOGO
- Adeus, ó gente! Deixem-nos passar que temos de embarcar...
GRUMETE FERNÃO
- Daqui a um ano ou dois estamos de volta. Ricos e famosos!
PADRE
- Se Deus quiser...
24
:...' ,
)
t/
t,,
I
..'".'
:r.-i__
ff
_?'
=:?
>ìf;'
II
rt
I
1
/

N

o
o
l
/
0
lì
é) 0
d
O
/7
ATO II
Cena I
Dez dias passaram e a corevela navega em aho-mar. os bombard,eiros,
treinados para o ofício da gue*a, bocejam, aborrecidos.
BOMBARDEIRO SANCHO Qimpando a arma)
- Não há nada para fazer aqui ! eue maçada!
BOMBARDEIRO MARTIM
- Que saudades que eu tenho de dar uns tirinhos! os únicos inimigos
que vemos são os tubarões, e não podemos gastar munições com eles. eue
irritação!
GRUMETE FERNÃO
- Se estão maçados, venham esfregar o convés! Tâmbém podem lavar
pratos... ou despejar penicos...
os bombardeiros irritam-serfazem menção de bater no grumete.
GRUMETE DIOGO
- Podíamos armar aqui uma tourada. vou buscar uma capa encarnada.
BOMBARDEIRO SANCHO
- Boa ideia. Sempre é mais animado. Eu faço de touro.
BOMBARDEIRO MARTIM
- E eu, de toureiro.
Improvisam u.mcr. qrena e os marinheiros afluem, em círcuro,
pqra assistirem.
Com umq capq negra nas
o bombardeiro Sancho inaeste.
costas e um cesto na cabeça,
26
Vários rapazes se revezam como toureiros.
BOMBARDEIRO MARTIM (agitando o pa.no aermelho)
- Ó touro!
GRUMETE DIOGO
- Marra! Força! Marra, bravo!
BOMBARDEIRO MARTIM (erguendo a espada)
- Morte ao touro!
T
)
F
,
I
(
i
t,"
ì-

:*
Ì
ï, ,.
(
I
r
(r'
tã' "
' ,,
,t*

'J:l,ij'
ii
'! )
.1Í
,,'
1
' " :!.)
.:r,:i' .
:.ï:
I


'#,::'
I
l;!.i
(,
t

!
í
!:.
I
i1
,:::,
'lt'
:.

,f1r'
.J
/
6
È
I
!
,:l::l
t3.,
..i
I :íÌ
:..
't,,
!
ì
Ì

'%:
O "totuo" cai com uma estocada, as cqpqs ztão pelo ar e os jovens enztolztem-se
à luta.
PADR"E (com um terço enorme nas mãos)
- Meu Deus, que horror... Quando não tiverem nada para fazer,
aproveitem para rezar. l
Aparece o meste, que separa os joztens, dando com um remo no rabo de cada um.
MESTRE
- São proibidas lutas.
BOMBARDEIRO MARTIM
- Mas não há aqui tabernas...
BOMBARDEIRO SANCHO
- Nem moças para namorar...
GRUMETE FERNAO
- Ontem ftzeram uma representação sobre Santa Bárbara, mas a santa
tinha bigode!
Tbdos desatam a rir menos o padre.
PADRE
- Santa Bárbara ainda vos há de castigar! Ainda há de lançar um raio...
BOMBARDEIRO SANCHO
- Um raio que nos parta! E feio praguejar, ó senhor padre!
O gajeiro sobe ao topo do mqstro e grita.
GAJEIRO
-Terra à vista! Terra à vista!
PILOTO
- E a ilha de s. Nicolau, em caboverde, onde vamos fazer aguada
Todos se aproximam da amurada e dão ztiztas por se aproximarem de terra.
GRUMETE DIOGO
28
- O melhor de uma viagem por mar é, afinal, chegar a terra!
Cena II
Os marinheiros arrltmq,m as barricas de agua e qs cestcts com alimentos
frescos.
O grumete Fernão tira uma peça de fruta e delicia-se a roê-la. Tira outra e
guarda-a por dentro da camisa
MESTRE
- Alto aí! Tens a mão ligeira... Aqui é tudo conrado, bem contadinho.
Dá cá o que tiraste.
Fernão entrega a segunda peça e continua a roer a primeira.
GRUMETE FERNÃO
olhem lá que grande coisa! pena tenho eu de não ter antes
escorropichado uma garcafa de vinho.
MESTRE
- Dão-te uma caneca por dia, biscoitos e peixe seco. Que mais queres?
És algum fidalgo?
Aparece o piloto, aflüo.
PILOTO
- F'alta uma das nossas naus, a de Vasco de Ataíde. Sobe ao mastro,
gajeiro, a ver se a descobres.
O gajeiro sobe.
Os marinheiros aproximam-se da amurada e perscrutam o mar
GAJEIRO
- Nada vejo, meu capitão. Nem sombra de nau nem seus destroços. E o
mar está todo chão, como uma planície azul.
l
li
iii
ll
il
Pedro Álooru Cabral desce para o conztés.
PEDRO ÁTVANES CABRAL
como pôde a nau desaparecer, sem um aviso? Se estivesse em
dificuldades, devia soar as bombardas. 
MESTRE
- Não houve tempesrade. Não está encalhada.
MARINHEIRO
-Omaraengoliu.
GRUMETE FERNÃO
- Foi decerto o Adamastor ou outro monsffo marinho que a puxaram
para o fundo.
PADRE
- Foi a vonrade de Deus. só Ele sabe qual o nosso destino.
ASTRÓNOMO
- Eu bem vi nos astros que algo havia de correr mal neste dia... Os astros
nunca mentem.
MARINHEIRO
- Ó seu adivinho, se vossemecê sabia isso, porque não avisou?
o marinheiro arcanca-lhe da mão as cartas asuonómicas para as atirar
borda fora. Os outros tipulantes afastam_nos.
ASTRONOMO
- Thmbém está escrito nos astros que vais pagar pela tua insolência.
Ainda hás de morrer num naufrágio!
MARINHEIRO
- Burlão!Vamos deitá-lo aos tubarões!
32
O capitão-mor faz um sinal parq se calarem.
PEDRO ALVARES CABRAL
- Quem se aventura tem de estar preparado para todas as surpresas:
as melhores e as piores também. Se nada podemos fazer, as minhas ordens
são prosseguir viagem.
GRUMETE FERNÃO
- Naquela nau seguia o tio que me criou e tantos companheiros nossos...
Não me conformo.
Limpa as lagrimas.
PADRE
-Paz às suas almas... Rezemos, irmãos
l,W
I
t
tl

h,
ìl

1,.
t'o--*
ì a
,l
ctDS-HCH_03
Cena III
A esquadra segue sem sobressabos. Alguns marinheiros pescam à tinha.
Outros jogam xadrezr lançam os dados.
GRUMETE FERNÃO
- Estás a fazer batota.
GRUMETE DIOGO
- Mentiroso!
MESTRE
- Larguem o jogo, vão lavar o .on*r.
Diogo, Fernão e outros uipulantes lavam, em conjunto, o connés. E cantam:
A água do mar salgado
laaa, lazta, lava o chã.o.
Mas água nenhuma lava
a mágoa do coração.
Terrninam a tarefa.
GRUMETE DIOGO
- Esta viagem é uma seca!
MESTRE (a troçar)
-Ainda não bebeste água podre... Nem comeste sola de sapato...
GAJEIRO
- Nem te caíram os dentes com escorbuto... Estás cheio de sorte!
E ainda te queixas!
34
O gajeiro, de repente, grita do qlto do mastro.
GAJEIRO
- Estou a ver umas algas esquisitas...
PILOTO
- São rabos de asno. A terra está próxima.
GRUMETE DIOGO
-}láL de ser a cosra de África. Não é por lá que se vai à Índia?
PILOTO (falando para o mestre)
- Acho que aqui há gato! Mandaram-me desviar da rota habitual. Mais
para ocidente. Será que já sabiam que havia por aqui novas terras?
&
t----=...--.
-
I
=G
€
I
Pedro Álroru Cabral aproxima-se, risonho.
PEDRO Árvenes CABRAL (dirigindo_se ao gajeiro)
- Ó rapaz, olhabem! Já vês terra?
GAJEIRO
- Senhor, vejo um monte ao longe, mesmo longe. IJm monte redondo.
PEDRO ÁTVNNES CABRAL
- É tempo de Páscoa. por isso vai chamar-se Monte pascoal.
Para festejarmos, há vinho paratodos!
A tripulação junta-se à roda do capitão-mor, com cts canecas na mão.
O mestre distribui a bebida.
TRIPULAÇÃO
-viva a nova descoberta!viva o Monte pascoal.
o marinheiro toca uma gaita e os joaens da tripuração dançam de
contenta.mentu.
ATO III
Cena I
Numa praia.
Nicolau Coelho foi ewiado & terrq, pelo capitão-mor para conhecer de perto os
indígenas. Estes aproximam-se do navegador, curiosos.
NICOLAU COELHO (acenando amigaztelmente)
- Olá, gente! Nós vimos em paz.
Sorri e abre as mãos, mostrando que não traz armas.
Os índios fazem uma roda à sua voha. Ti"azern ercos, setas e uns estranhos
toucqdos de penas. Muitos têm um osso enfiado no lábio inferior e apresentam
o corpo pintado.
NICOLAU COELHO
- Baixem as setas. Sou um amigo, de Portugal. E trago presentes...
Aproximem-se, aproximem-se !
De parte a parte, procuram fazer-se entender por gestos,
NICOLAU COELHO
-Tomem!Tomem!
" INDIOS
_ ????
O naaegador começa a distribuir carapuças aermelhas e oferece até um chapéu
de linho que lhe cobria a cabeça.
Os índios dão-lhe ercos, setes, colares. Até um toucado de penas.
Cria-se um belo entendimento, embora não se compreendam pela fala.
NICOLAU COELHO
- Gostei de vos conhecer. Mas tenho de voltar para bordo. Adeus! Adeus!
INDIOS
_???
i
:
i
I
ì
a
((
ll

I
.l
t:
I
ri
Ì
I
I
i
I
J
l t
N.
' t
. ,rì'!t
rli /i
^qü
( a.i
ì
t
o I
d.uü,
È
.l
ì.
r
t,
t
i v
//
, .,"_
ïú'i
'ì*tì

f
( t

/
:. ,.
ì,
Ì'
i,jll
.tÍ*
;: :... /
j.. i,,
:::)
í"1
t
- -'

L ìç.--=!:,ìï,
i
I
I
it
li
r
rï
I í
1l
, /
i,
I
rj
t
y'.- 'i í
(
t
f
I
>-.-f2
Cena II
Alguns dias depois, na nau principal.
Pedro Áloortt Cabral zsai receber alguns índios trazidos por Ìr{icolau Coelho.
Está estenüda uma alcatifa ztermelha onde se ergue um q,ssento de aeludo parq o
capitão-mor. Os outros capitães esperam de p,é, trajados a rigor.
MESTRE (entusiasmado)
- Até parece que estamos num palácio! Os índios vão sentir-se uns
príncipes...
MARINHEIRO
- Sabem lá eles o que são príncipes... Príncipes da selva..
BOMBARDEIRO SANCHO (falando pqra o companheiro)
- Estão a ligar de mais a estes selvagens.
BOMBARDEIRO MARTIM
- Devíamos era disparar já as bombardas e conquistar esta terra a ferro
e fogo.
BOMBARDEIRO SANCHO
- Estas criaturas davam uns bons escravos. E levávamos umas raparigas
para o porão para nos fazerem companhia...
PADRE
- Calem essas bocas sujas! Faz falta é evangelizá-los. Fazê-los adorar a
cruz de Cristo
O padre ergue a cruz e, nesse momentq entram Nicolau e um pequeno grupo
de índios.
40
Pedro Alaares Cabral, sentado, está imponente, com um cordão e medalha de
ouro ao pescoço.
os índios aproximam-se, olham para tudo, apontam o colar e de seguida
apontqm pqra terra.
PEDRo Árvanns CABRAL (saudando)
- Sejam bem-vindos a bordo.
À portr, para os outros capitães.
- Reparem como olham para o ouro. Não é novidade para eles. otimo!
NICOLAU COELHO
- Podíamos dar-lhes da nossa comida... Nada melhor para conquistar
as pessoas do que uma almoçarada.
,,^:,,'
,ì',
$
Os marinheiros trazem tabuleiros com iguarias. Os indígenas prol)a.m peixe
cozido, bolos, melrfigos. Mas, enojados, cospem tudo.
GRUMETE DIOGO
- São esquisitos! Não gostam do melhor que temos. Naturalmente
comem carne crua. Até são capazes de comer gente... Que horror!
GRUMETE FERNÃO
- Então se lhes dessem sardinha salgada e biscoitos d.uros...
GRUMETE DIOGO
- Até vomitavam!
Os tripulantes imitam os índios. Riem. Riem.
ouzte-se uma galinha, das muitas que aão a bordo, a cacarejar.
CARPINTEIRO
- Comerão eles galinhas? Ou ovelhas?
GRUMETE DIOGO
- Já vamos saber...
Pedro Álztares Cabral manda buscar os animais.
Os índios olham pqrq a oztelha, indiferentes. Ao nerem a galinha debicar no
chão, fogem assustados.
Os naztegantes riem à gargalhada.
GRUMETE DIOGO
-Tão fortes e têm medo de uma galinha!
MESTRE
- E se lhes mostrássemos o papagaio?
O gajeiro zsai buscar o animal.
Os índios, ao.verem o pepagaio, apontam parq terra e falam com o bicho, que
repete tudo o que eles dizem.
NICOLAU COELHO
- Em tèrra vi muitas aves semelhantes e ouvi o seu canto. Algumas
parecem, de facto, da família dos louros. Sem elas como haviam d,e fazer
aqueles toucados de penas?
42
Pedro Alvares Cabral leztanta-se.
Vai anoitecendo.
Os índios estã,o tão à ztontade que se deitam a dormir na alcat'ifa.
PEDROÁTVENNS CABRAL 
-Tragam almofadas e mantas para os nossos convidados.
Os marinheiros cobrem os índios.
BOMBARDEIRO SANCHO
- A nós não nos tratam tão bem.
BOMBARDEIRO MARTIM
- Claro, somos carne para canhão... E lá vamos nós dormir no chão,
amontados, na camarata do mau cheiro.
BOMBARDEIRO SANCHO
- Do mau cheiro? Não! Do requintado perfume de suor e chulé!
Sancho tapa o nariz, os ouffos riem.
I !.-
Cena III
Na nau, no domingo de pascoela, após a missa solene num ilhéu.
PADRE
- Que bela foi a missa solene desta manhã! Repararam como os indígenas
estavam tão interessados e copiavam todos os nossos gestos? Havemos de
os converter, de deixar aqui uma ctuz de cristo.
PEDRO ÁTVENES CABRAL
- E esta terra irá chamar-seVera Cruz.
Todos aplaudem menos alguns bombardeiros que resmungam, à parte.
BOMBARDEIRO SANCHO
- Cruzes canhoto que o diabo é tortolValia mais dispararumas bombardas
para esta gente de pele avermelhada nos Ievar até às jazid,asde ouro.
BOMBARDEIRO MARTIM
- Dinheiro é o que faz falta. E o que é que nós levamos daqui? tlns arcos
e flechas, uns toucados de penas e uns papagaios! Mal-empregada viagem!
l
Os capitães reúnem-se com pedro Álror^ Cabral.
BARTOLOMEU DIAS
-E agorar QU€ fazemos? Prosseguimos para a Índia, como era nosso intento?
OUTRO CAPITÃO
-Damos novas ao rei? Ele não pode ignoraruma descoberta tão importante.
PEDRO ÁTVNNNS CABRAL
- Mandamos uma das naus de volta a contar do achamento, e as outras
seguem pata Oriente. Ffavemos de fazer conquistas, alianças e de encher
naus e caravelas de pimenta!vai ser um carregamento colossal!
PeroVaz de Caminha apresenta a sua cqrta.
PEROVAZDE CA,ÜIINHA
- Eu tomei a liberdade de escrever quanto se passou nesta viagem.
Lendo o meu escrito, D. Manuel conhecerá todos os detalhes.
44
lrr
,
|{l
I
'"t
fr
'"j
PEDRO ALVARES CABRAL (passando os olhos pela carta)
-Tua carta seguirá. Será a nossa voz.
O mestre intromete-se na conaersa.
MESTRE
- Podíamos apanhar dois ou três indígenas para D. Manuel saber como
é esta gente. Em Portugal nunca se viu alguém assim.
GRUMETE FRANCTSCO (rindo)
- Não deixem de levar umas raparigas. Haviam de fazerfuror em Lisboa,
todas nuas, com cabelos negros e brilhantes até à cintura.
o padre benze-se três vezes, escandalizad,o, e ergue ao aho a cruz.
PEDRO Á'LVENBS CABRAL
- NãolVamos deixar cá dois degredados. Estavam condenados à morte.
Se morrerem, cumprem a pena. Tragam-nos cá.
o mestre empurra os dois degredados que ouztiram a conaersa.
DEGREDADO ASSASSINO
- Preferia que me deixassem na Índia. Sempre podia enriquecer. Esta
gente é muito pelintra.
PEDRO ÁTVANES CABRAL
- Não queres ficar aqui? preferes que te mande enforcar?
O degredado apalpa o pescoço.
DEGREDADO ASSASSINO
- Meu rico pescocinho... Eu fico, eu fico.
À portr.
- Mas se estes selvagens me irritarem, ffato-lhes da saúde. Até lhes
arranco as tripas! Já dei cabo de meia duzial
PEDRO Árvenns cABRAL (dirigindo-se ao degredado ladrão)
-Etu?
DEGREDADO LADNÃO
- Eu devia ser perdoado. Desde que saí da prisão nunca mais roubei
MARINHEIRO
- Mentiroso!Tiraste-me uma bolsa e um par de meias!
BOMBARDEIRO SANCHO
46
- E eu tive de te dar uma sova para me d.evolveres umas ceroulas!
PEDRO ALVARES CABRAL
- Está dito. Ficam nesta terra recém-descoberta.
BARTOLOMEU DIAS
- Quando voltarmos estarão vivos e terão muita informação.
Leaam os degredados para terra.
MESTRE (dirigindo-se aos grumetes)
- Rapazes, ajudem a arrumar as barricas de água fresca. Há muita fruta
para acondicionar e bicharada que caçámos para preparar.
Os grumetes deitam mãos à tarefa.
MESTRE
- Despachem-se, molengões! Carreguem os cestos de frutalVão desmanchar
as carnes para o cozinheiro as pôr de salmoura.
Fernão e Diogo limpam o suor da rcsm.
MESTRE
- Despachem-se! Depois destes carregos ainda têm de esfregar o convés.
os dois grumetes escondem-se por trás de umq série de barricas.
GRUMETE DIOGO
- Estou farto de ser grumete! Melhor sorte que nós têm os degredados...
Ficam no Paraíso... Nunca vi sítio mais lindo, onde a Natureza nos dá
tudo... aré lindas miúdas.
GRUMETE FERNÃO
- E se nós fugíssemos num batel? No meio da confusão ninguém dá por
isso.
GRUMETE DIOGO
- Espera, tenho de ir buscar uma coisa.
Volta com um saco.
GRUMETE FRANCISCO
- Que preciosidade levas aí?
GRUMETE DIOGO ffalando ao ouvido do amigo)
- É uma galinha. Acho que não há paraíso sem uns ovinhos estrelados!
Os grumetes fogem.
Volta a ouuir-se a gaita de um marinheiro e ou,ue-se um coro de tripulantes:
Adeus, adeus que nós aqmos
por verdes rotas de sal
levar a terras distantes
o nome de Portugal.
Adeus, adeus que nós z)amos
com aontade ou sem ztontade
descobrir além do mar
essa palavra saudade.
48
I
{t
.//
s(

(


J
K-
è
ì
, It
I
//
ìl
tr
I
{
ìj
:
ê
.a
<Jê
h
I'
r
,

I
ì
/
t
I
1t
I
I
I
I
I
-
:)
/

a

o
o
z
o
o

,Í
ii
Ir
1ì
I
t
íd'
o
(./'
Qb
O Desejado
Tiago e Leonor foram à janela.
- Mas que manhã de nevoeiro! - exclamou o rapaz._ E eu que pensava
ir hoje lançar o meu papagaio ao vento ...Láterei de ficar a brincar com os
soldadinhos.
- Mas não estão sempre a dizer que D. Sebastião vai voltar numa
manhã de nevoeiro? E se for hoje?!
Um sorriso iluminou-lhes o rosto. A mãe estava entretida na cozinha e
eles podiam escapar, sem que ninguém os visse. Desciam a colina e logo se
achavam junto ao cais onde aportavam os barcos.
Se assim pensaram, melhor o fizeram. De mão dada, saltitando sobre as
pedras negras da calçada, chegaram ao Tejo. Não se via a outra margem, só
aqui e além silhuetas vagas, esbranquiçadas, movendo-se na âg.* que se
confundia 'com o céu. Entre as gaivotas pousadas em terra, os pescadores
remendavam as redes, miúdos descarços saltavam ao eixo ou lançavam
piões. LIma rapariga cantarolava:
Lá ztem a nau Catrineta
que tem muito que contcff.
Ouai agorq, senhores,
uma historia de pasmar..
G
õ
-t
E
lr
I
- olha! - exclamou Leonor. - olha um barco a aproximar-se. Nem
percebo como se navega com este tempo. É preciso coragem!
A pouco e pouco foram distinguindo as velas, o casco, ouvindo
o barulho das pequenas ondas a embaterem na madeira.
- Aposto que é o Desejado! Quem mais se atreveria a navegar assim?
D. sebastião é que não tem medo de nada. E não vai deixar que os
espanhóis mandem em portugal. É ele!
Aproximaram-se os dois quando o barco, serenamente, acostou.
- Quem vem aí? - pergunrouTiago. _ E D. Sebastião?
- Como adivinhaste que sou Sebastião? - respondeu uma voz rouca.
Os jovens até saltaram de entusiasmo. fam ser os primeiros a receber
o Desejado.
Começaram a sair homens curvados carregando caixas de madeira.
Que estranho...
-Vossemecês trazem o rei?
- Peixe-rei? - galhofou o sujeito. - Esse não é desras águas. só trago
linguados, sardinhas e carapaus.
Leonor, raivosa, destapou o oleado que cobria as caixas e viu, já com
aluz do sol que quebrava a neblina, o pescado, com o seu brilho de prata.
O pescador, sorrindo, atirou-lhes um caranguejo.
- Então, o que é que vocês querem do Sebastião? A mãezinha precisa
de peixe para o almoço?
Fugiram os dois, a correr, e só pararam junto à casa.
Estranhamente, a mãe não lhes ralhou ao abrirem a porta. Nunca os
deixava sair sem autorização, e Leonor, essa, só bem acompanhada podia
pôr o pé na rua.
Hoje sorria como nunca mais sorrira desde que o marido partira para
a aventura africana.
- Esta manhã, recebi uma carta de vosso pai.
- Mas o pai não morreu na guerra? Estamos vestidos de preto, de luto
por ele...
D. Beatriz não respondeu. Desdobrou o papel e leu:
52
ihü.í,hn" aÁmãa et7oíe,'Lt'Leí,tt
rcn'iití f//'lÌs,
Nãn sêi t'e ?íÉtcia/s t't'tü'í/'u6 c,lulara*n até aíÍt'
MwTo tewry já rya*sou
9o{ye a batatln dz ,+hars @ültü" * ,
-
yfu* a airl^a. três rek e a.
f*tn. fm d^a. unssa" jrutm,tutiz. tu Tnrpru f,u
dÁÁ^0 ú14lú t'u,OrtOr l,ríÁ/t tt'tt4 ?tí.Ota,r) aú Wr
rc aì"dn" retP't'rana" ettmh^a" zÜt'La'
lffía arLn^a^dilra,rlottPou,t tz a ttiÁ^a'
?'a/a"
reu{'er O dt'nJwtrO d^O resgate'
Eu estwe entre os 600 capa/atm g uu"batuaw sab ns mdaos dttct*s
fu o. ssba,úinú.
Maç g nd^erus? Elz a,uat'tpqa", d^estunid^or g*fo"ão 'Tantu,7o!')
'ew
ttr
qryát oUl^. E 146, caualgfuamm ceu e/e, entre Lí,til)eft,s fu F, fu
[o*tg"-" ?r^roJ*, Utttra LI/44 eXérc*LO
ry tlnln Utt'LO t't't'14 dm s'ewç
* oãon*n RpÁtmn, ,t^F*W g sz-A:nla onuertìÁ"0 à
f fu tt'{À"o'
eb cod*un' ba,n as wssas for4 efi'agza'st
De u,nn. utlha" toou 0 trouãn
^ão,,rl,u
d2 ca]íhõ6. Os ymttgtwses nã^o
tü,í14^atr4 ?,rwiíto g ^
?nÌu'rnt u,sattst'^4 arti,h^artn"... e 0t 14'0ttot cat'/4"õvs
estattatn arr4dÂ" a'trgl^a^dat àrt t't'tuilÂ"'
Era,tm irnÈ1,ttos os tiotnilos,
rc * rodzattamlortod^o o la^dr, e npowlueí
ta.í^a" wí,(Lê-|Ìs. As /an4a,s trespírsattam m cattalos e m ca'ua/'etm, Útltt í'u'a/í
pesaÁnr arru,a^durns, eril44 aUãn a^o ch^fu. A ?.ftW %"onta^d^a" d2 D'
"Seba,*inú
ftt "t^!iÁ^a"
e fu, M 'uer'?uz
Pi'do, rynu'"tu Út't4 a l"anq'
?ara. rc * op*"tt, çaltaão ?4/a"
o veãaual'
53
Mesm"o an úia, cotthfu,Lei a botar atá a Lr'Lü,ú,ía" h/4g" sc
ryr{trar
cou
repeadm g@ dm ruourm. Pt!*i 'n"ou.tra. l"a/.í&, ca,íÁÁ. pr ah, e dzaiì
conilrut^ar a. l,o*ar até à r'urrte. lá. tü.íÁÂ" a" a/Lu^aÁ.u,ra"
fuão, atno/gãa, já
esúlnh ça,njttp. ?arïwaru-?í'u 0 brap dtre*o e untittu.ei a" èrtL{"er a la,ng" utn
0 ngí)o Ew{traram-mz 0 ngão e 0t u,tut d"oí catalns a galnV
espezth,h^a,ral,ft-?t42.
ou,ui vozzt a m,pbrar a^0 ?í.oíto ,o
rc abaâon^a*se
@ dzserto unlltto,
rc n sa.l,ua,çse. 0 ret*u Vreakaua dz{z. ua,ç D. seba",hÀ"o üoí4if/1Á",
W buar
o son lu até a^o
fn. E excla,tu"ou: "Morrer m^as d"euagar".
7uÁ"0 t'e afflou, ?eft,sel ry "
umte u"e lanata.
^la/,ç
14^ãn aí d"@ h^otrm ry,o,ão anrdn ettata nu,u4^a.
fkãn, on^dz sc
a,rn o/(toa//a*n n futÁn.
Perjoonta-Lh,esVor eLra, mas n*ngu"êl,n saltn a.o certo.
tlm barbuho,
V n al,ì{tara ú144r so{Á^adt, ra/sgou-r,ru a" u,ru//sa"
?ara" ú1,í4 a/í
ttta/ç {war * 4* N (tra4os. Mns ?udt " fuçq ds{zs. Nu,nu. unk Vod^eru
mnniar Lí,ru.a" npã"
^lauba.
ft^" e m^au,s-tratm ?a,r4% e atma oyoÀo
K * resgatu,n, ca,n
út4rnílrb r.era nforão ou venÁtÀ^o útrLo ssuapo. pm tsn u^e d^erawt
?"ft/
e
?.etíA" ?ara m,p/nrar a vorsa pìnÁ^a^dz.
Mns ett nit go p4hÁaÁr. Íe mz atuLars e d"asia*s t?r a.
fil44///h Lm/it",
uefldzi a @ú,úa da fonn t yg* o
rcry rru,tt ?eÁtw.
gz satàada tsí,íl4n dz uíçt qtu satàaÁ^es tet'í,hn dz enAtga/, agore etn tãt
gran/z p.uEo fu yfu a nlryend*nrtn". L* Du.ts 1/0t a,lrenpe.
Voçn ?í,uJU^o e pat g mtubo vtt
W
54
D. Dturte dz Sannrem
Duas lágrimas teimosas corriam dos olhos de D. Beatrí2, que apertou
os dois filhos num abraço.
Tiago, rindo, gracejou:
-Tatvez D. Sebastião nunca apareça, mas qualquer dia vamos receber
o nosso pai, o nosso Desejadol.
- Para já - disse Leonor -, vou tirar esta horrível roupa preta e vestir
a minha saia de veludo encarnado.
Pn tú
tr, L r
A Restauração
da Independência
o mês de novembro de 1640 estava mesmo a chegar ao fim, frio e
chuvoso. Havia 60 anos que portugal perdera a independência, e cada
gota fria de chuva lembrava uma lágrima de um país que não queria ser
governado por reis estrangeiros.
Zé Maúa andava furioso por causa dos novos impostos com que os
espanhóis sobrecarregavam os portugueses. Nada lhe corria bem: a patroa
não lhe aumentava o ordenado; o padrinho não lhe comprava um casaco
grosso de lã pata o inverno: e o que tinha, como crescera, já só lhe servia
nas orelhas...
Razão tinham aqueles gu€: por todo o rado, refilavam!
E agora, que ia descansar, já estava D. Filipa de vilhena a dar_lhe que
fazer:
- Rapaz, vai depressa chamar os meus filhos Jerónimo e Francisco.
Lá foi, contrariado. Mas o que quereria deles a mãe com tanta urgência?
Escondeu-se atrás de um cortinado, a espreitar.
D' Filipa tinha junto de si duas espadas. Que fuia fazer com as armas?
As damas costumavam pegar mais numa agulha do que numa espada...
Pois o que ela fez foj mesmo estranho: chamou os filhos, primeiro
o mais velho e depois o outro, e bateu-lhes com a espada no ombro. rJma
vez que o pai deles tinha morrido, era a mãe quem os armava cavaleiros.
E disse-lhes que se preparava uma revolta. No dia I de dezembro, um
grupo de fidalgos patriotas ia acabar com o domínio espanhol.
- Meus filhos, vão lutar pela voss a pátria. Só quero que voltem para
casa quando estiverem cobertos de glória!
Aquilo é que era falar!Aquela senhora era mais forte, corajosa e patriota
do que a maior parte dos homens.
56
ze lv4afia coçou o naiz. se fosse a mãe dele, dizia-lhe para não se
meter em sarilhos. Para ficar quietinho...
No dia seguinte, D. Jerónimo e D. Francisco saíram de casa bem cedo,
levando as armas. Qual seria o seu destino? Mortinho de curiosida d.e, Ze
Maria esgueirou-se de casa e seguiu-os de longe. Caminharam até ao Paço,
ali à beiraTejo. Lá moravam a duquesa de Mântua (prima e representanre
do rei de Espanha) e o traidor Miguel deVasconcelos, que ranto mal fazia
ao seu país. O que viu a seguir mais o espantou. Daqui e dali surgiram
outros fidalgos armados que dominaram os guardas do palácio. eue
excitação! E entraram todos no edifício monumental
A
tJ
Sem que ninguém o travasse, pouco depois, ZéMariasubiu a escadaria,
curioso. Que iria acontecer?
Encostou-se às paredes e avançou até à porta do escritório de Miguel
de vasconcelos, onde os conspiradores se tinham reunido. Mesmo que
o vissem, quem ia ligar a um rupazito? :
Por toda a parte procuravam o traidor: nas salas, no quarto, debaixo
da cama' Onde se teria ele metido? De repente ouviu-se um restolhar de
papéis dentro de um armário. Deviam ser ratos. E Zé Maria até ffemeu,
porque tinha um medo terrível de ratos. eue horror! os fidalgos
arrombaram o armário. E quem descobriram lá? Emvezde ratos, o barbudo
e feio Miguel de Vasconcelos. Dispararam sobre ele, mas não morreu.
Então que fizeram? Zumba!, atiraram-no paraa rua!
- Bem feito! - disse Zé Maúapara os seus botões, e esgueirou-se escada
abaixo.
À volta do corpo de Miguel deVasconcelos ia-se juntando uma pequena
multidão que gritava:
- Grande diabo!
-Traíste o povo e estás a pagar!
-Vai para o inferno!
"Que belo casaco de lã tinha o malvado...,,, pensou o zéMaria, que
tremia de emoção e de frio, em mangas de camisa. Aquele casaco é que lhe
convinha! Já não fazia falta ao dono. Baixou-se para lho tirar, mas... uma
matilha de cães lançou-se sobre o corpo, a lamber-lhe o sangue.
Agora a multidão crescia e gritava a prenos pulmões:
-Viva o rei D. João IV!
-Viva a independência!
-Viva!
E Zé Maria gritou também.
58
"'-**'
.::
':.
=i{1Èr'
ti*:'l'':-
;:-
: -. .:{-: i:'- i,:i:--
:a
.,:: r.i+ç,it#èF'
i::
.'tÈ
,;'+ ;f,:rr4'*:-;j!:
,.:ìtg
o*;p'
O terramoto
O João e a Ana acordaram ainda antes de o galo cantar. Moravam
numa quinta, na Ajuda, com o tio, e nesse dia iam até Lisboa, onde ele
tinha de fazer uma entrega.
Instalados na carroça cheia de legumes, lá seguiram) aos safanões,
a caminho do Convento do Carmo.
Apesar de jâ ser novembro, estava calor e o sol brilhava num céu claro,
azul, azul. A cidade, linda e monumental, fervilhava de gente elegante e
bem vestida para assistir à missa solene do dia de Todos os Santos. Pelas
ruas passavam também escravos africanos carregando bilhas e cestos,
estrangeiros louros ou tisnados e crianças descalças brincavam entre os
cães vadios. Pena as ruas estarem tão sujas, com dejetos de cavalos e as
imundices que atiravam pelas janelas. Até os penicos lá despejavam...
-Vocês podem ficar aqui, no Terreiro do Paço, à minha espera - disse
o tio quando chegaram a uma enorme praça. - Animação não vai faltar!
Pode ser que os reis e as princesas saiam para irem à Sé.
Os jovens lá ficaram) mas o que mais os encantava era o rio imenso,
liso e brilhante como um espelho, salpicado de barcos.
- Quem me dera embarcar naquela nau e ir até à Índia... - sonhava
o tapaz.
- Ora, isso é muito longe - replicou a rapariga. - Eu preferia...
Mas, de repente, os cães começaram a ladrar e a andar à rod.a, os
cavalos relincharam, inquietos. De seguida, ouviu-se um ronco vindo das
profundezas e o chão desatou a tremer debaixo dos seus pés.
- Que horrot'! - gritou o João, afastando-se do cais.
- Descansa, miúdo, que isto já passa - tranquilizou-o um velhot.. - É
só mais um tremor de terra, nada que assuste quem aqui vive... Já passei
por vários.
60
--
>;;)-
;;
'É::ã
----.
-_-/ --
ffi= _.--ì
--t
I
l
----,-/
=---
--<---
'4'i!;ÉËà*
- ï:.a -
o
G.
l e ï2.:::- .e
''|*z
-..* ...,,.
.-_>-
s
--)
ì
.!_-
J
lr
a
I
a
I
1
' lì
Grupos de gente atordoada, suja, chorando, dirigia-se para o rio. Esse,
pelo menos, nunca poderia arder. Mas Ana insistia em ir até ao convento,
onde o tio devia fazer a sua entrega) perguntando, desesperada, onde ficava.
Subiram a uma colina, e em boa hora o fizeram) porque, estranhamenter
o rio recuou para logo ondas gigantes galgarem o cais, varrendo a Baixa,
arrastando consigo os magotes de gente que junto ao Tejo se apinhava.
De um lado o fogo, do outro a água. por toda a parte, casas e muros
desconjuntavam-se. o chão abria-se. Seria o fim do mundo?
A muito custo' por ruelas intransitáveis, saltando sobre ruínas e mortos,
chegaram ao largo do convento. Lá encontraram a mula Gracinda, que, ao
vê-los, relinchou de alegria. Sobre a carroça abatera-se um edifïcio - estava
esmagada.
Chamaram pelo tio.
-Tio Manuel! Tio Manuel!
e
)
È
ü

   
t-
f'-È-
+
Ninguém lhes respondeu. Afoitaram-se pelo convento em ruínas.
Muitos frades tinham morrido e... também o tio Manuel jazia debaixo de
uma enorme coluna de mármore. Joana ajoelhou-se ao lado do tio, a
chorar. Também o irmão não conseguiu conter as lágrimas.
-Tio Manuel, querido tio... como vamos nós,viver sem si?
Se não podiam devolver-lhe a vida, queriam, pelo menos, levá-lo com
eles. Mas como? Era impossível erguer a coluna que lhe tombara sobre as
costas. Pediram ajuda a dois rapazes que passavam carregados de peças de
prata.
-Temos mais que fazer. A desgraça de uns é a sorte dos outros!
E continuaram a remexer nos destroços em busca de valores. Eram
ladrões!
-Vamos embora daqui! - decidiu o João, a custo. - Não estás a sentir
outro tremor de terra? Olha, mais pedras a cair!
Desatrelou a mula e fugiram com ela em direção à Ajuda. A viagem a
pé era cansativa, demorada. Metia horror. Só os campos permaneciam
iguais. Onde dantes se erguiam construções, agora só havia escombros,
vultos caídos, desgraçados que se arrastavam.lJma garota ferida chamou-os,
pedindo que a levassem dali. Já não tinha ninguém. Puseram-na na garupa
da mula e seguiram viagem. Qne triste, triste viagem... Para espanto das
crianças, na Ajuda, o terramoto pouca mossa frzera. E quem haviam eles de
encontrar? Nada mais nada menos que o rei D. José, a rainha e as quatro
princesas. Como, se o Paço tinha ficado desfeito? A famítia real escapara
porque fora passear a Belém. Pararam, curiosos. E logo de seguida apareceu,
numa carruagem) um senhor muito alto, com uma farta cabeleira postiça,
toda branca.
- E o Marquês de Pombal! - murmuraram os populares. - Que irão
resolver?
Como ninguém os mandasse embora, deixaram-se ficar. Depois dos
cumprimentos, o rei, atercotizado, perguntou ao seu ministro:
- E agora?
t<
- E preciso enterrar os mortos e cuidar dos vivos!
Ana e João acenaram com a cabeça. Sebastião José de Carvalho e Melo
tinha razão.Enxugaram os olhos vermelhos de tanto chorarem. Desmontaram
a miúda da mula e foram para a casa deserta e rachada lavar-lhe as feridas.
64
I
I
I
i-:
l.::l
' ';-
t-'-ig
lr=
iri
I
i
As dinastias
Tu sabes as dinastias?
Perguntaram minhas tias.
A primeira, tia Dina,
é decerto a Afonsina.
A segunda, tia Beatrí2,
eu sei que foi a de Avis.
A terceira, tia Cristina,
foi espanhola, a Filipina.
A quarta, tia Constança,
foi mesmo a de Bragança.
Houve quatro dinastias.
Verdade ou não, ricas tias?
Já respondi acertado.
Agora quero um gelado.
66
l
l
y,
ê
J
L!: -
r- !
,f-
O dia 5 de ourubro
de 1910
O António e a Maria eram primos e passavam sempre as férias juntos,
em casa dela, na Ericeira. Mas aproximava-se outubro, o tempo arrefecia,
as aulas começavam. Então era a hora do adeus, das promessas.
- Vamos escrever um ao outro a contar as novidades. Eu mando-te
uma carta todos os meses - disse a rapariga.
- Quais novidades? - respondeu o rapaz. - Nem calculas como é
aborrecido viver num 3." and,ar, em Lisboa. Não há nada divertido para
fazer.Temos um rio onde não se pode tomar banho. É impossível brincar
nas ruas. A escola fica num prédio velho, e quem lá manda é a palmatória.
Vão ser uns meses sem história. para esquecer!
Mas no dia 5 de outubro ambos foram a correr buscar papel, caneta,
tinteiro e escreveram, com entusiasmo, as primeiras cartas.
---:
-r-g::-=
$
o
fllrrtíUì,.iu
ltsdrr P..rr r'-;-'
Sï:ii'Ê=
--:=:!--
--.-
rsr{fr
.Sr.:*:g
R e p ú b I i ca e rn .-==?.ot,tu I
A' R evo tução tritïiïffinte *
ENFIM!
5:'=z:-
-_--r!.-r
^L
A
-ìr.r--
-t.
_-j
,
-.
-"---
r'?-----
2---.
-ts-.
I
LÍsboq, 5 de ouïubro de 1910
Querídq MqrÍq,
Hoje foí um díq exïrqordínórío: o dq lmplontoçõo do RepúblÍco/
E eu q pensqr que esïes meses nõo ïeríqm hísïóríq... Aposïo que
o 5 de ouïubro qíndq seró feriqdo nqcíonql ! E v:í-o!
Dízíq eu que erq umq moçodo morqr em Lísboq, mqs, qfínql,
ïem qs suqs vonïegens. Assísïí ò revoluçõo/ onïem pqssqrqm
mesmo nq mÍnhq ruq os soldqdos revolïosos que se reunirqm nq
roïundq. Seguí-os dq jonelo qté desqpqrecerem de vistq. Depoís,
díq e noíïe, ouvímos os líros. A mínhq írmõ ïopovc os ouvÍdos
com medo, mqs eu só ïínhq vonïqde de ír ver bem de perïo ïudo
o que qconïeciq.
No río Tejo, os conïrqïorpedeÍros Adqmqsïor e S. Rqfqel
díspororqm sobre o Rossío (onde estqvqm ïropos monórquÍcqs)
e sobre o Pqlócío dqs Necessídqdes (onde vívíq o reí).
Tínhqmos sempre notícíqs frescqs, poís os qrdínqs nõo
pqrovqm de opregoqr os jorneís, que depressq se esgoïqvqm. As
pessoqs que ondqvqm pelcs ruqs pqrqvqm pqrq fqlqrem umqs
com qs outrqs e conïqrem ïudo o que sqbíqm.
000
oo oo o o o o o
trrgoooooE0
.
ooo0Oo
q ggog s
(
:.1
,
Ì.- #-
A cerïq qlïurq dísserqm que q revoluçõo esÍqvq em rísco de
fqlhhn e enïõo o meu poí, que é ïodo republícqno, pegou numq
qrmq e foí combqïer ïqmbém. A mínhq mõe ebreçou-o, com
lógrímos nos oÍhos. Ao despedír-se de nós, dÍsse-nos:
- Nõo guero ver nínguém q chorqr. Esïq é q horq de decídÍrmos
o fuïuro. o povo nõo quer mqis q rnonqrquío. os reís gcsïcrom o
nosso dínheíro, deíxqrqm que os lngleses ficqssem com terríïóríos
oe Áfricq que devíqm ser nossos, corïqrqm-nos q rÍberdqde. só
os cobqrdes nõo luïqm por cquílo em que qcredíïqm, e eu qcredíïo
nc Repúblícq/
DescÍ qs escqdqs com o meu pqí e vÍ que, nq ruq, ouïros
homens como ele seguÍqm o mesmo cqmÍnho. se eu fosse mqís
crescÍdo, tqmbém tínhq ído.
ouví dízer que nq Roïundq qpqrecerqm crgumos murheres,
pronïos q luïqn q servír de enfermeírqs ou q levqr comídq pqrq
os revolïosos.
70
66Ë
g
6
Depoís de tqnïos momenïos emocíonqntes, o mqís fqnïósïíco
qconteceu hoje, òs ç dq mqnhõ. A eepúblícq foí procÍqmqdq dq
vqrqndq dq Cômqrq Munícípcl de Lísboq. Quem o proclornou foí o
Dr. José Relvqs. E, qo mesmo ïempo, hqsÍeqrqm umq bqndeÍrq
novq, verde e vermelhq/
Que fesïq/ Que clegrío/ A mulïídõo nõo se conïínhq com
o enïusíqsmo, gríïcvo:
- VÍvq o Repúblicq/ Vívq c Repúblico/
Mqndo-ïe recortes de olguns jorncís denïro desïe envelope,
como recordoçõo.
Estõo q chqmqr-me pqrq ir pcro q cqmq, mqs qcho que nõo
vou conseguÍr dormir...
Recebe um befo desïe ïeu prímo republícqno que te qdorq.
Anïónío
77
Na Ericeira, na sua vivenda virada para o mar, Maria sentou-se à mesa
e escreveu:
Eríceírq, 5 de ouïubro de 1910
Querído prírno Anïónío,
Espero que esïejqs bem e que nõo ïenhos cponhqdo muíïos
sustos com q revoluçõo.
Por oquí foí um sossego durqnïe ïodq q rnqnhõ. Mqs, c seguír
qo Qlmoço, qs pessoqs corneçqrqm o juntcr-se nqs ruqs, pois
dízÍq-se que q fqmílíq reql vínhq q cqmínho dq nossq ïerrq.
Tínhq-se refugÍodo no pqlócío de Mqfrq pqrq fugír ò revoluçõo,
mqs tqmbém qí nõo esïqvq em segurqnçc. Enïõo que resolveup
Embqrcqr nq EríceÍre, que é q proÍo mqÍs próximc, e qssím
escQpqr.
Eu nuncq ïinhq enconïrqdo um reí ou umq rqínhq e fíqueÍ
cheíq de curíosídqde. lmcaínovc-os sernpre nos seus pqlócíos,
com coroqs e líndos ïrcjes ou em cqrruqgens qïrelqdqs q cqvqlos
brqncos Mqs víerqm ern cqrros (que sõo qs cqrruqgens modernqs),
e qs roupqs que vesïÍqm erqm qbsoíuïqmenïe normqís. A cerÍq
qlturq qpeqrqrn-se e dÍrigírom-se pqrq q prqíq dos pescqdores.
Vóríqs pessoqs os qcomponhovom.
Vou conïqr-ïe qs mínhqs ímpressões sobre q reqÍezq, poÍs
nõo sei se jó q enconïrqsïe qí, nq ccpíïol.
A rqínhq D. Mqríq píq, que jó esïó um bocqdíïo velhoïq,
é bqixinhq, mqs muiïo finq e elegcnïe. cqmínhqvq sempre colcdo.
lq ïrisïe, ïrÍste, ïrisïe.
72
E
6
BEU
A rqínhq D. Améííq é qlïq q vqlen e porecíq qíndq mqíor com
o enorme chopéu que usqvq. Dírígío-se q uns e ouïros, qlïívq,
muÍïo senhorq de sí. Deve ser umq mulher cheÍq de energío.
Tqmbém ví o reí D. Mqnuel, mqs dígo-ïe, frqncqmenïe, que ïíve
penq dele. Tem um qr de ropozínho perdÍdo. Esïqvq pólído como
cerq, ïodo vesÍído de preïo, com um chopéu de coco enfíqdo nq
cobeço. Pergunïou vóríqs vezes se o mqr esïqvq brqvo. Devíq
senïír-se bem nervoso...
MuÍïos populoresjunïorcm-se nqs qrrÍbqs pqrq os observqrem,
mqs eu preferí descer qïé ò prcíe, pqrq qssísïÍr qo embqrque
mqís de perÍo.
Ao lorgo estqvq o Íqïe reql, mqs os fugítívos ïÍverqm de se
meïer em bqrcos q remos pqrq ló chegorem. Uns pescqdores
forqm buscqr cqíxoïes de ïronsporïor peíxe e cesïos, pqrq
fqzerem de degrous, poís es senhorqs ïÍnhqm dífículdqde em
subín com qquelqs sqÍqs ïodqs chÍques. Depoís empurrqrqm os
bqïéÍs, com os pqssqgeíros ló denïro, qÌé fluïuqrem no mqn que
esïqvq reqlmenïe ogíïodo. Remqrqrn, remqrqm, remqrqm. Ló longe,
o reí, qs rqínhqs e seus qcompqnhqnïes pqssqrqm fínqlmenïe
pqrq o gronde íqïe que os íq levqr nõo seí pqrq onde. NÍnguém
qcenou corn lenços.
Hqvíq um grqnde sílêncÍo. Foí o fím dq monqrquío.
73
Aquí guqse todq o genle é republícqnq,, e eu ïqmbém sou
(emboro qíndq hó pouco Íempo gosïosse de bríncqr qos
príncípes e príncesqs), mqs nqquele momenÍo eles deíxqrqm
de ser reís pqrq mírn, tornqrqm-se qpenqs pessoqs gue
ïinhqrn de qbqndonqr q póïríq.
Mqís ïqrde qpqrecerqm uns homens dq cqrbonóríc que
pergunlovqm onde esïqvq q fqmítiq reql. Trqzíqm cqrqbínqs e
bombqs. suspíreí de qlívío por jó se enconïrqr dísïqnïe.
o jovem reí nõo íq ïer q ïrísïe sorïe do seu pqí e írmõo,
qbqïídos q ïíro numq cqrruqgern...
Fomos parq cqsq e eu deíïeí forq q coroq de loïc que
gosïovo de pôr nq cobeçc qucndo brÍncqvq òs príncescs.
Esse ïempo jó pqssou. A rnõe, qïqrefqdq nq cozínhq,
perguntou-me:
- Que bolo queres que eu foço pqrq o jonÍcrp Temos de
fesïejor c Repúblíco.
- Um quolquer. Só nõo pode ser um bolo-rei/
Nõo ïe ofereço umq fqïíq porque morqs q dezenqs de
quÍlómeïros de dísïôncÍq, mqs ïenho penq que nõo esïejos
oquÍ comígo.
Muíïqs squdqdes pqrq os ïeus pqís, pqrq q ïuq mqnq
e porc ÍÍ.
Tuq,
Mqríq
74
, I
5 de Abril
Qu-e-r-iào- àiário, acqbo àe-te rec-eber e 'uoujá ettrear-fe'
sou f.tlha ún'tca e, ?o=r'ttto.-, muitas ueze-s não tenho c,am quem f alar.
Ho)e-{oço onos. Aào-ro(o2", anoS qe-tte àia,.orqu-e é{erjaào!
Não há e-tcolq e-Potso conuiàar-7oro a mtnhafestaimensos omigos'
Qu_anto=S mais amigo=t reunir, mqis preSenfeS recebo, O pio-r é- qve netta
àAta foàa gente- Se lernbra àe cra:Uet e enchem:ryê Q Çarq de rarno;
que vão murchar-
Á Revolu ção àe Abril ec-emli-anha..me- àesàe- qu-e- nasci. Cqlc-,vlq
que-ai lneuS pa,rS queriOm çharnar-me MOriç Àqg CratlQg'Efq vryt nomg
original, rna,' o {uncionário ào regisfo cr:vi,l não a e-,tlou.tiqueltlor'
las lazer q^ot neste Áia tamb(ry teu qJ feug inco-n-venìentes'
Nq mqnhã Ào meu antVersário chQma-m--elogo;
- tlor, anàa àeyressa ver a lelevisão!
A, urr"Sl meio sàorme-ciàa,penSo qre eStá o àq7 glgulvt lQJrama
Aq mev- ograLo, ryrqs não! Esf-ão a t-Tansmifir qs cem?rnQr-aÇ6es àa
reuolução!
76
Abril!
lurma e a
laràe-/,aimu-ilo-aniola,àa.Ma1S-ó-afi r*àiÁ'tio,coat-oo-*àbor,4uemais
ningvémvai saber.
_ _g bo:lo,-p-ora-não-Variar,.1ii.nha -u,m -cr,Lu.o,,e-co.f-tei-eSSa
tafja Para
e e
Vat, À r-te rtC
Pr-e
-nof-ur-almenf,e: --
4livro<
ll^o rv,al nLn
- -V- á ri o s1 og o s -(nã oLn e-l
e
^ht
o- qu a nt o s)-
-
*
-7-
c ai x a s
-à
e -cho colaíe s
--- -- EnV-e o,p es co
^-ài
nhei r-o
-
.*
--lat
o-mai
-{o i_a-res7o-ns6t-el 7-elo5-cra9-o-S-:-àa
r-evolu7ão. ,N-esfa,nlfuro,-{ala--se
ciais qu,e -erÏauam
-p-ronfo-S a -àor -a-,vi Á a p el a -liberÀ a À er ^m a S ai ag ué m *fala Ào P-eS
Soa que'
comegoe-a-àïstrib,uiros-cr,av-o-5-ra,elo-s,solÀaÁos-ElaÍoi-à_minha'f
esfa!
78
toi-lr.usc a r-u,m À ot ami g o s que -c o nui'àei'
-
Agora )ó nõ-q é noàa nou_s..|qs -é tõq siynp_á,tiça! Eoc
a àora!
Qu-anào entrou)-ó-ery c_qrq_e utu t_qqto_s _Ç_tev-o_stuier_am-lhe as lágriue t
aat o-lho-s.D_isse:u,e ent_ão_q11eï_tnhq sìàe 4r1n a ideiaàe Áar{lores aos
solàsdo-s. Jó uais sober tadol
foi
trabal-h-or pqr-a o r-esrqur-qnte o,oàe- esta:uq e,rypr-egad4
lve sçe àia
d áe à a eI
ne
ta
c o m e m o_r_q:uo o- _
q niy,e_t s ó r-t o _e, c o_ tn e_ r g c pt4 q
çã o, áar vm çravo
a caÁa clLe_nt_e,lqt catn_o exérc tfp-na- ruq, e pqtrão_ re,59lveu manàar
ot elnp-r-egaÁos- pora c_qss, dist-rjbuioào_?er çles qs {lo-rgt, A Celeste
leu-ou vmb-raç
a alìnha.
79
I
08
so.,l"o
aou tosst lazo! ilod ol'nlo^at otnn ta^'ol ost1atd ? ogN -ot'ílau'iaf
ohoo ura t^oSloà aob-soossaà so.to7-oil o otod no11
lorcluia
utotoSà5
yl.soitwa snaw'so anb ato6o )azoi oor' anb o bl!?l? o7't;;tanb $;a1o5
'o?unut o o?o+uta atlal?" ou?stahtvo nat^'t o? ol? o nowolanb
o?utl ogl olsa6 alanbo all-tra?ot6o a a4sala7 '4 ? oflaq lilrt ra!
'so^i,or) so?
ogsnpnaAi;a navrc+as lltqk/
a? gçop og5n1onau o anb u'sso t"o17
-oijjou o? |oila?apuâA so? saroli so a+uo+sut wnu
as-vio7o+o6s7-.ott62p
toSr4snl (aToZtrtuo'zoà a7 asso! o7o'tadsa o91
ogSngt;a:t a anb ouanb alua6 o o?oL.ottlos alua6 o o?oL'otolont o1aà
sohu" So o7u2nltt+Sl? 9! a ot'uo) o zalsa? a+saP) è.^tozsatogtsoloq
watotoàSl? aP zdtl uú-a r56atto So anb tila o+Sa ola o95n1o^a a:nQ
'optolwdsa o? ouo" ou o-na+a'o *aho(-Q'ohot"
utn ro1u4 anb o all-na?uã$a '09+v1-'so?olja!
Àì6'^oJsa sofol sa sotn
tl2woc orol6:51o) taabpnb a'11-lotdwoc nosuad'o/orun! oau ol3
lap? wn n,7aà - èollutttoíp'nn
ato-?A -
.oylSnpnat ov ut6; ,odtc'4toà'anb soTo'nto ta?o?los sa tila) èo?o1'1)
o
otoà ttqns Õo ola notodaT as anb ,noc a(ot55o6 Ou-o;l+aai o7 írlo5
I

!
; %
+-
-
+ .-
&-:r:- -
çtO
Democracia na floresta
Aquele lobo chamava-se Reinaldo, mas, como o nome era comprido,
tratavam-no sempre por rei. Era forte, feroz, façanhudo, e sentia-se o rei
da floresta.
- Aqui mando eu e todos vós obedeceis às minhas ordens!
Os outros bichos: erf geral, baixavam as orelhas - os que tinham
orelhas! - e calavam-se, porque os dentes dele eram bem afiados.
Só o mocho Moisés o contrariava sempre:
-Tir estás atrasado, Reinaldo. Não sabes que Portugal e uma República?
Aqui não se aceitam reis. No mar jâ há a República dos peixes.
- Então sou Presidente da República da Floresta! Está dito. Quem
manda aqui sou eu. E quem refilar vai logo para o meu papo.
Os coelhinhos fugiram para as tocas) as perdizes esconderam-se no
mato. Só a raposa Ramira lhe fez frenter,troçando:
Parece-me que a função de um Presidente da República não
é propriamente comer os cidadãos...
- Pois não - disse o mocho. - Deves representar o teu país. E por isso
lalvez seja boa ideia ires à terra dos homens e exigires, em nome dos
habitantes da floresta, que não cacem mais por estes lados.
O lobo ficou todo vaidoso. com a missão. Escovou o pelo, lavou
a dentuça ruça e lá partiu em direção ao Palácio de Belém, onde vivia
o Presidente dos Portugueses. Os guardas confundiram-no com um cão-
-polícia e deixaram-no passar. O lobo passou o Pátio dos Bichos, subiu a
escadaria e, pelo faro, foi ter diretamente ao gabinete presidencial.
O Presidenté estava sentado à secretária e ficou espantado quando viu
um lobo à sua frente e, mais ainda, quando o ouviu falar:
Como Presidente dos Animais da Floresta, venho exigir que a caça
 seja proibidà.
82
O Presidente dos Portugueses arregalou mais uma vez os olhos e coçou
os ouvidos, mas em breve se recompôs:
- Não sou eu quem faz as leis. Quem as faz ê a Assembleia da República,
com os seus 230 deputados eleitos pelo povo. Mas admira-me que um
lobo tenha essa pretensão. Se sair a lei que desejas, ficas também proibido
de caçar em território nacional.
Ao ouvir estas palavras, o lobo achou melhor sair rapidamente daquele
palácio cor-de-rosa. Os homens não eram de fiar... Ainda o metiam numa
jaula...
De novo na floresta, contou que tinha sido muito bem recebido, mas
mais nada acrescentou. Ser Presidente da República, afinal, para pouco
servia. Não podia decidir sozinho uma coisa tão simples.
- Mas então, quem é que governa o país? - perguntou ele ao mocho
Moisés.
- Portugal tem vários órgãos de soberania: o Presidente, o Governo, a
Assembleia da Republica e osTribunais. Para te explicar tudo em pormenor,
demoraria muito tempo. Mas quem governa propriamente é o Governo, é
bom de ver. O chefe do Governo é um primeiro-ministro, que arranja
ministros que o ajudam.
- Compreendo - disse o lobo Reinaldo. - Então, vou ser primeiro-
-ministro e vou nomear os outros membros do Governo. Eles que trabalhem
enquanto eu descanso!
Ministro da Educação - coruja Cuca
Ministro do Ambiente - javali Jaime
Ministro da Economia - formiga Fulgência
Ministro da Caça - furão Francisco
84
I
O mocho Moisés não ficou ofendido por não ser ministro da Educação,
sendo um sabichão das dúzias. Para ele, aquele Governo era ilegal. Faltaram
as eleições, e numa democracia nada se resolve sem os votos populares.
Faria parte da oposição. Do seu poleiro, num castanheiro altaneiro, ia
piando toda a noite:
- Fora a tirania! Fora a ditadura!
De facto, aquele lobo era mesmo um ditador. Achava-se o maior e queria
impor sempre a sua vontade. Os outros animais que calassem o bico!
h/
r

85
Reinaldo afiou os dentes. Se apanhasse o refilão chamava-lhe um figo,
mas, como o seu opositor voava) sentenciou:
- O mocho Moisés fala contra o Governo, por isso é condenado à
morte. o falcão Fernão que o apanhe e o ffaga à minha presença. Vai
servir-me de jantar.
O mocho abanou as asas:
- Só um tribunal me pode julgar. Que pensas tu? Que és dono e senhor
da floresta só porque tens os dentes mais fortes e pontiagudos?
- Estamos todos fartos de ti! - exclamou a raposa Rita.
- Quem deve mandar é a bicharada! - exclamou o esquilo Ésquilo.
- Queremos a democracia! - exclamaram todos os outros animais em
conjunto.
Reuniram-se na grande clareira à beira do rio, os bichos da terra, do ar
e da água, e, sob orientação do mocho, resolveram fazer eleições.
Organizaram-se em vários partidos :
- o dos Mamíferos, encabeçado pelo coelho Cosme;
- o das Aves, encabeçado pela ágaiaAlice;
- o dos Répteis, encabeçado pelo lagarto Luís;
- o dos fnsetos, encabeçado pela vespa Vera;
- o dos Peixes de Água Doce, encabeçado pela trutaTeresa.
Cada qual defendia as suas ideias para tornar a floresta mais bela, mais
rica, mais feliz e, acima de tudo, mais justa.
Os boletins de voto foram folhas de .árvore, onde cad,a um rabiscou
secretamente a sua vontade.
O pintassilgo até compôs esta canção, inspirada numa que tinha ouvido
na cidade:
O floresta verde, zterde,
terra da fraternidade,
os bichos são quem ordena,
mostrando sua vontade.
E o lobo?
Esse foi viver para ouffo lado...
86
Abandeiraeohino
A Rita e o António eram como o cão e o gato. Não podia haver dois
primos mais diferentes e mais embirrantes. Nada os unia.
- Rita, até o teu nome irrita - dizia o tapaz.
- António, e o teu nome rima com demónio - respondia ela.
O António vivia em tás-os-Montes e, nos tempos livres, gostava de
fazet alpinismo. A Rita vivia nos Açores e, nos tempos livres, praticava
natação. O António era alto e lourol a Rita era baixinha e morena. O António
gostava de se levantar cedo como as galinhas e a Rita, se a deixassem, tinha
os horários de um mocho. O rapaz escolhia sempre os programas desportivos
da televisão e a rapariga, mal entrava na sala, agaffava no comando para
mudar de canal. Só gostava de filmes divertidos.
Por issb, quando iam para casa dos avós, em Lisboa, nas férias, era um
problema. Andavam à zaragata todo o santo dia e de noite faziampartidas
um ao outro: escondiam os pijamas, metiam-se debaixo da cama a chiar
como ratos, fingiam ser fantasmas.
A avó Marta quase enlouquecia com a barafunda. euando a pobre
senhora perguntava:
- Meus queridos, o que vos apetece para o jantar?
A mocinha adiantava-se logo:
- LJma piza! Gelado de morango!
O garoto preferia bifes com batatas fritas e não dispensava o bolo de
bolacha.
Quando os netos eram pequenos, o avô Rui conseguia entretê-los no
parque infantil. Mas, e agora? O António teimava para alugar uma bicicleta.
O seu sonho era pedalar à beira rio. Mas a Rita só ficava satisfeita quando
a levavam à praia.
- Estes miúdos põem-nos os cabelos brancos! - queixavam-se os pobres
senhores, sem saberem como resolver a situação.
88
I
? q ,
4r-1
/:---- =
Certo dia, estavam eles a implicar um com o outro, o avô entrou na
sala, entusiasmado.
- Hoje é a final do Euro 20L6. Portugal joga contra a França. Podemos
assistir na Praça do Comércio, onde colocaram uma tela gigante. Vai ser
sensacional!
- Eu alinho! - disse logo a avó, que, aos 60 anos, ainda participava em
corridas.
Meteram-Se no metropolitano e desceram mesmo na praç a, já coalhada
de gente. LJns ffaziam camisolas da seleção, outros tinham pintado a cara
de verde e vermelho. Não faltavam cachecóis e bonés coloridos.
Os vendedores apregoavam:
- Comprem! Camisolas! Bandeiras baratas!
- Para o menino e para a menina! Para o velho e para o novo! Para
o careca e para o cabeludo!
89
Eram principalmente jovens em grupos e homens feitos que ali se
concentravam, esperando pelo início do espetáculo.
- Vou comprar uma bandeira - disse a avó. E alargou os cordões à
bolsa, escolhendo a maior de todas.
A Rita e o António encolheram os ombros. Estavam mais interessados
em fazer caretas um ao outro.
Pouco depois, as equipas entraram em campo, o jogo começou e, de
repente, aquela multidão desordenada ficou imóvel, presa pelos olhos à
tela gigante. Até a Rita e o António pararam as diabruras.
- Ronaldo! Marca, Ronaldo! - incentivava o avô.
Mas uma onda de desilusão varreu a praça. o Bola de ouro saía
lesionado...
No intervalo todos discutiam: uns vibravam de emoção, outro s faziam
apostas, outros maldiziam o árbitro.
A segunda parte foi ainda mais emocionante. No estádio, em França, e
ali, naquela ptaça' a muitos quilómetros de distância, as bandeiras
agitavam-se, nervosas. Os golos não surgiam... Entrou-se no prolongamento.
Os jogadores estavam cansados. Mas de repente:
- Éder! Grande Éder! - exclamou o António, enquanro a Rita batia
palmas. - Finalmente!
- Golo! Portugal! portugal!
- gritavam todos.
E as bandeiras ganharam vida, agitaram-se num vendaval de esperança
e de felicidade.
- Vitória! Vitória!
Foi então um delírio! O António arrancou a bandeira das mãos da avó
e elevou-a no ar, gritando:
- Portugal! Viva portugal!
A Rita ajudou-o a erguê-la bem alto.
- Portugal é o maior!Viva portugal!
Tamuem no estádio de Paris a bandeira portuguesa era hasteada e os
emigrantes, em peso, cantavam o hino:
90
I
Heróis do mar, nobre povo,
N ação zt alente, imortal,
Leztantai hoje de novo
O esplendor de Portugal.
Entre as brumas da memória,
O Patria sente-se a voz
Dos teus egrégios aztós,
Que há, de guiar-te à ztitoria!
À, or*or, às armas!
Sobre a terrq' sobre o mar,
À, or*or, às armas!
Pela Pátria lutar
Contra os canhões marchar, marchar!
9L
Eram todos uma vo4 eram todos uma nação. Eram todos portugal.
Os desconhecidos abraçavam-se e então. . . a Rita e oAntónio abraçaram-se
também. Enrolaram-se no estandarte. Riram e choraram nos braços um
do outro.
A caminho de casa, o avô teve de satisfazer a curiosidade dos netos que
iam trauteando o hino.
- No tempo de D. Afonso Henriques já se cantava isto quando se
ganhava uma batalha? - perguntou o António.
A Rita não perdeu a oportunidade de o picar:
- Qne cabeça de alho chocho! Não reparasre que o hino fala de
canhões? No reinado do nosso primeiro rei lutava-se à espadeirada.
Então o avô contou que o hino começou por ser uma marcha militar,
muito utllizada pelos republicanos, que se opunham à monarquia. F'oi
composto em 1890 por Alfredo l(eil, sendo a letra de Henrique Lopes de
Mendonça. Com ligeiras adaptações, tornou-se hino nacional pouco depois
de ser implantada a República.
Mas a curiosidade dos dois primos não acabava ali.
- Porque é que bandeira é verde e vermelha?
- Por que razã,o tem um escudo? E tantos castelos?
- E se essas explicações ficassem para depois do jantar? - propôs a avó.
os netos acederam, mas, logo que chegaram a casa, foram pôr a
bandeira na varanda. outras, grandes, pequenas, de pano ou de papel,
ondeavam ao vento naquela rua, por tantas ruas, por esse mundo...


ì
-
 

(
%,
I
%
2
e
92
É
,!+ì-:;2&
a
f
JI
i
Portugal sec. XXI
u
Onde está, Portugal, o teu império?
Não sabes, a sério?
4 Qo <ì
Em Afric a) naAmérica, na Ásia, na Oceânia õ
a tua força cresce a cada dia:
é a lusofonia.
Não sabes o seguint e, tavez:
250 milhões de cabeças pensam,
250 milhões de bocas falam
e cantam as suas canções em português
a
Hoje és também
o rosto da União Europeia,
essa grande teia
que une países da velha Europa.
É tua a bandei ra azul com l2 estrelas.
E entoas a Ode à Alegria
como teu hino,
na manhã fria.
N
Descobriste, Portugal,
caminhos de terra e de sal
De paz e fraternidade.
Descobriste, Portugal,
a liberdade.
o E
s
94
t:
/
Indice
{
)
6
t2
18
22
50
56
60
66
68
76
82
88
94
LJma terra de muita gente
A suposta espada de D. Afonso Henriques
Com el-rei D. Dinis, aquele que fez tudo
o que quis
A padeira de Aljubarrota
O achamento do Brasil
O Desejado
A Restauração da IndePendência
O terramoto
As dinastias
O dia 5 de outubro de 1910
O 25 deAbril
Democracia na floresta
Abandeiraeohino
Portugal séc. XXI
96
lq' -
Coleção hrísa Ducla Soares
Uns Óculos para a Rita
I-Jma História de Dedos
Abecedário Maluco
UmaVaca de Estimação
Comprar, Comprar, Comprar!
O Soldado João
Três Histórias do Futuro
Seis Contos de Eça de Queirós
O Livro das Datas
Seis Histórias às Avessas
O Casamento da Gata
A Carochinha e o João Ratão
Contos para Rir
A Princesa da Chuva
.
O CapuchinhoVermelho no Século XXI
Os Animais do Natal
A Fada dos Dentes
A Cidade dos Cães e Outras Histórias
Se os Bichos seVestissem como Gente
O Coelhinho Afonso e Outras Histórias
Quero Crescer!
Um Gato Tem 7 Vidas
João Pestana
Os Direitos das Crianças
Histórias com História
Histórias coÍn História
Autoro Luísa Ducla Soares
lluslroçõo Sérgio Marques
1.'edição: setembro de 2018
@ Porto Editora
Rua da Restauração,365
4099-023 Porto - Portugal
Rua da Restauração,365
4099-023 Porto
Portugal
w,portoeditora.pt
Unldade lndustrial da Mala,
DEP.LEGAL 442497 A8
lsBN 97 A -97 2 -O -7 2An -'1
I
iiliiufi[llffiuuur rrÍrï
ru Porto
Editora
ê 160
'
84946r rr., gr riz: r
i ilililfiililfliffiiiiiiiiil r
Ë 9':89720 0726777 '
.J
SOíìRËS LI,J I SA 'ÚUCLÂ
S H,srnplÊs cori HtsroRtA
' PRt00 EDnlq 14 90f
tdeienie: 10r..1 $esrontl
t
ffi
Coleçoo Luíso Duclo Soores
Histórias com História
A Historia de Portugal com os seus eventos reais, lendas e mitos
serve de fundo a este livro.
Dele constam 14 textos muito diferentes - sérios, trágicos,
curiosos, divertidos -, de diversas tipologias -narrativo, dramático,
em forma de poema, carta, fábula, página de diário - e para todos
os gostos.
viajando através dos séculos, os jovens de hoje vão conviver
com jovens de outros tempos e dos tempos modernos também,
porque, afinal, a História não acabou e nós estamos a vivê-la, dia
a dia.
ì
)
I
ì
l
t
Histórias com História.pdf

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

A fada oriana joaquim santos 5ºg
A fada oriana   joaquim santos 5ºgA fada oriana   joaquim santos 5ºg
A fada oriana joaquim santos 5ºg
IsabelPereira2010
 
Paratextos 8º ano teste 3 com soluções
Paratextos 8º ano teste 3 com soluçõesParatextos 8º ano teste 3 com soluções
Paratextos 8º ano teste 3 com soluções
Zélia fernandes
 
Arvore geneologica de d. afonso iii
Arvore geneologica de d. afonso iiiArvore geneologica de d. afonso iii
Arvore geneologica de d. afonso iii
hugoseverino8a
 
8ºc trabalho saga
8ºc trabalho saga8ºc trabalho saga
8ºc trabalho saga
Lurdes
 
O cavaleiro da dinamarca categorias da narrativa
O cavaleiro da dinamarca  categorias da narrativaO cavaleiro da dinamarca  categorias da narrativa
O cavaleiro da dinamarca categorias da narrativa
fercariagomes
 
Uma viagem ao tempo dos castelos
Uma viagem ao tempo dos castelosUma viagem ao tempo dos castelos
Uma viagem ao tempo dos castelos
EDP28
 
O "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativa
O "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativaO "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativa
O "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativa
Gonçalo Silva
 

Mais procurados (20)

Analise ulisses
Analise ulissesAnalise ulisses
Analise ulisses
 
Teste Ed. Lit 6º ULISSES.docx
Teste Ed. Lit 6º ULISSES.docxTeste Ed. Lit 6º ULISSES.docx
Teste Ed. Lit 6º ULISSES.docx
 
O Cavaleiro Dinamarca síntese
O Cavaleiro Dinamarca sínteseO Cavaleiro Dinamarca síntese
O Cavaleiro Dinamarca síntese
 
A fada oriana joaquim santos 5ºg
A fada oriana   joaquim santos 5ºgA fada oriana   joaquim santos 5ºg
A fada oriana joaquim santos 5ºg
 
A Vida Na Corte Do Rei D. Dinis
A Vida Na Corte Do Rei D. DinisA Vida Na Corte Do Rei D. Dinis
A Vida Na Corte Do Rei D. Dinis
 
Paratextos 8º ano teste 3 com soluções
Paratextos 8º ano teste 3 com soluçõesParatextos 8º ano teste 3 com soluções
Paratextos 8º ano teste 3 com soluções
 
Arvore geneologica de d. afonso iii
Arvore geneologica de d. afonso iiiArvore geneologica de d. afonso iii
Arvore geneologica de d. afonso iii
 
1a dinastia
1a dinastia1a dinastia
1a dinastia
 
Escritor do Mês - Luis Sepúlveda
Escritor do Mês - Luis SepúlvedaEscritor do Mês - Luis Sepúlveda
Escritor do Mês - Luis Sepúlveda
 
História de uma gaivota e do gato que a essinou a voar
História de uma gaivota e do gato que a essinou a voarHistória de uma gaivota e do gato que a essinou a voar
História de uma gaivota e do gato que a essinou a voar
 
O espantalho enamorado
O espantalho enamoradoO espantalho enamorado
O espantalho enamorado
 
Reis de Portugal
Reis de Portugal Reis de Portugal
Reis de Portugal
 
8ºc trabalho saga
8ºc trabalho saga8ºc trabalho saga
8ºc trabalho saga
 
O cavaleiro da dinamarca categorias da narrativa
O cavaleiro da dinamarca  categorias da narrativaO cavaleiro da dinamarca  categorias da narrativa
O cavaleiro da dinamarca categorias da narrativa
 
Nomes coletivos.doc
Nomes coletivos.docNomes coletivos.doc
Nomes coletivos.doc
 
Uma viagem ao tempo dos castelos
Uma viagem ao tempo dos castelosUma viagem ao tempo dos castelos
Uma viagem ao tempo dos castelos
 
Guiao gaivota-gato
Guiao gaivota-gatoGuiao gaivota-gato
Guiao gaivota-gato
 
Personalidades históricas de Vila Real
Personalidades históricas de Vila RealPersonalidades históricas de Vila Real
Personalidades históricas de Vila Real
 
Apresentação Oral - PIL
Apresentação Oral - PILApresentação Oral - PIL
Apresentação Oral - PIL
 
O "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativa
O "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativaO "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativa
O "Ulisses" de Maria Alberta Menéres: correção da ficha de avaliação sumativa
 

Semelhante a Histórias com História.pdf

Jorge amado tenda dos milagres
Jorge amado   tenda dos milagresJorge amado   tenda dos milagres
Jorge amado tenda dos milagres
educacaocedbc
 
Jorge amado tenda dos milagres
Jorge amado   tenda dos milagresJorge amado   tenda dos milagres
Jorge amado tenda dos milagres
Thiago Oliveira
 
A fada palavrinha e o gigante das bibliotecas
A fada palavrinha e o gigante das bibliotecasA fada palavrinha e o gigante das bibliotecas
A fada palavrinha e o gigante das bibliotecas
Eunice Rodrigues
 
261224 633921912696695000 ver1
261224 633921912696695000 ver1261224 633921912696695000 ver1
261224 633921912696695000 ver1
Ana Violante
 

Semelhante a Histórias com História.pdf (20)

Despojos de Aljubarrota, o brilho das estórias
Despojos de Aljubarrota, o brilho das estóriasDespojos de Aljubarrota, o brilho das estórias
Despojos de Aljubarrota, o brilho das estórias
 
Teste diagnóstico_5.º
 Teste diagnóstico_5.º Teste diagnóstico_5.º
Teste diagnóstico_5.º
 
Estradas de couro(1)
Estradas de couro(1)Estradas de couro(1)
Estradas de couro(1)
 
Jorge amado tenda dos milagres
Jorge amado   tenda dos milagresJorge amado   tenda dos milagres
Jorge amado tenda dos milagres
 
Jorge amado tenda dos milagres
Jorge amado   tenda dos milagresJorge amado   tenda dos milagres
Jorge amado tenda dos milagres
 
A fada palavrinha e o gigante das bibliotecas
A fada palavrinha e o gigante das bibliotecasA fada palavrinha e o gigante das bibliotecas
A fada palavrinha e o gigante das bibliotecas
 
Os Maias - Análise
Os Maias - AnáliseOs Maias - Análise
Os Maias - Análise
 
900 História de um rei
900   História de um rei900   História de um rei
900 História de um rei
 
261224 633921912696695000 ver1
261224 633921912696695000 ver1261224 633921912696695000 ver1
261224 633921912696695000 ver1
 
“A Fada Pala vrinha e o Gigante das Bibliotecas” de Luísa Ducla Soares
“A Fada Pala vrinha e o Gigante das Bibliotecas”  de Luísa Ducla Soares “A Fada Pala vrinha e o Gigante das Bibliotecas”  de Luísa Ducla Soares
“A Fada Pala vrinha e o Gigante das Bibliotecas” de Luísa Ducla Soares
 
A floresta
A florestaA floresta
A floresta
 
Contos tradicionais, fábulas, lendas e mitos
Contos tradicionais, fábulas, lendas e mitosContos tradicionais, fábulas, lendas e mitos
Contos tradicionais, fábulas, lendas e mitos
 
A Moreninha
A MoreninhaA Moreninha
A Moreninha
 
900 história de um rei
900   história de um rei900   história de um rei
900 história de um rei
 
1 trimestral 6 ano
1 trimestral  6 ano1 trimestral  6 ano
1 trimestral 6 ano
 
A carne humana
A carne humanaA carne humana
A carne humana
 
Fada palavrinha...versão bear
Fada palavrinha...versão bearFada palavrinha...versão bear
Fada palavrinha...versão bear
 
Era uma vez a história de Pedro e Inês
Era uma vez a história de Pedro e InêsEra uma vez a história de Pedro e Inês
Era uma vez a história de Pedro e Inês
 
Machado de assis idéias do canário
Machado de assis   idéias do canárioMachado de assis   idéias do canário
Machado de assis idéias do canário
 
Ulisses16a36
Ulisses16a36Ulisses16a36
Ulisses16a36
 

Mais de NliaIncio

Mais de NliaIncio (15)

o segredo do rio versão - o texto.pdf
o segredo do rio versão - o texto.pdfo segredo do rio versão - o texto.pdf
o segredo do rio versão - o texto.pdf
 
O pavao do abre e fecha.pdf
O pavao do abre e fecha.pdfO pavao do abre e fecha.pdf
O pavao do abre e fecha.pdf
 
Cuida bem de mim
Cuida bem de mimCuida bem de mim
Cuida bem de mim
 
Uma casa nova para a famlia Coelho
Uma casa nova para a famlia CoelhoUma casa nova para a famlia Coelho
Uma casa nova para a famlia Coelho
 
Historia Pão-por-Deus
Historia Pão-por-DeusHistoria Pão-por-Deus
Historia Pão-por-Deus
 
O rato Renato - as regras são importantes
O rato Renato -   as regras são importantesO rato Renato -   as regras são importantes
O rato Renato - as regras são importantes
 
Tenho boas maneiras na Biblioteca
Tenho boas maneiras na BibliotecaTenho boas maneiras na Biblioteca
Tenho boas maneiras na Biblioteca
 
A raposa azul
A raposa azulA raposa azul
A raposa azul
 
Abre a porta toupeirinha
Abre a porta toupeirinhaAbre a porta toupeirinha
Abre a porta toupeirinha
 
História do arco da velha
História do arco da velhaHistória do arco da velha
História do arco da velha
 
As fadas verdes
As fadas verdesAs fadas verdes
As fadas verdes
 
2 contos populares portugueses
2 contos populares portugueses2 contos populares portugueses
2 contos populares portugueses
 
2 bichos, bichinhos e bicharocos texto
2 bichos, bichinhos e bicharocos   texto2 bichos, bichinhos e bicharocos   texto
2 bichos, bichinhos e bicharocos texto
 
Os sapatos do pai natal
Os sapatos do pai natalOs sapatos do pai natal
Os sapatos do pai natal
 
Conto matilde rosa-araujo-cancoezinhas-da-tila
Conto matilde rosa-araujo-cancoezinhas-da-tilaConto matilde rosa-araujo-cancoezinhas-da-tila
Conto matilde rosa-araujo-cancoezinhas-da-tila
 

Último

Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
TailsonSantos1
 
5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf
5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf
5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf
LeloIurk1
 
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptxTeoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
TailsonSantos1
 
SSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffff
SSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffffSSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffff
SSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffff
NarlaAquino
 
GEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdf
GEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdfGEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdf
GEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdf
RavenaSales1
 

Último (20)

Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para criançasJogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
 
Nós Propomos! Autocarros Elétricos - Trabalho desenvolvido no âmbito de Cidad...
Nós Propomos! Autocarros Elétricos - Trabalho desenvolvido no âmbito de Cidad...Nós Propomos! Autocarros Elétricos - Trabalho desenvolvido no âmbito de Cidad...
Nós Propomos! Autocarros Elétricos - Trabalho desenvolvido no âmbito de Cidad...
 
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.pptaula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
aula de bioquímica bioquímica dos carboidratos.ppt
 
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptxOs editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
Os editoriais, reportagens e entrevistas.pptx
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
 
migração e trabalho 2º ano.pptx fenomenos
migração e trabalho 2º ano.pptx fenomenosmigração e trabalho 2º ano.pptx fenomenos
migração e trabalho 2º ano.pptx fenomenos
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdfPROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
 
5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf
5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf
5 bloco 7 ano - Ensino Relogioso- Lideres Religiosos _ Passei Direto.pdf
 
Camadas da terra -Litosfera conteúdo 6º ano
Camadas da terra -Litosfera  conteúdo 6º anoCamadas da terra -Litosfera  conteúdo 6º ano
Camadas da terra -Litosfera conteúdo 6º ano
 
Antero de Quental, sua vida e sua escrita
Antero de Quental, sua vida e sua escritaAntero de Quental, sua vida e sua escrita
Antero de Quental, sua vida e sua escrita
 
PROJETO DE EXTENSÃO - EDUCAÇÃO FÍSICA BACHARELADO.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO - EDUCAÇÃO FÍSICA BACHARELADO.pdfPROJETO DE EXTENSÃO - EDUCAÇÃO FÍSICA BACHARELADO.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO - EDUCAÇÃO FÍSICA BACHARELADO.pdf
 
Estudar, para quê? Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
Estudar, para quê?  Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2Estudar, para quê?  Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
Estudar, para quê? Ciência, para quê? Parte 1 e Parte 2
 
Projeto Nós propomos! Sertã, 2024 - Chupetas Eletrónicas.pptx
Projeto Nós propomos! Sertã, 2024 - Chupetas Eletrónicas.pptxProjeto Nós propomos! Sertã, 2024 - Chupetas Eletrónicas.pptx
Projeto Nós propomos! Sertã, 2024 - Chupetas Eletrónicas.pptx
 
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdfCurrículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
 
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptxSlides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
 
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptxTeoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
 
SSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffff
SSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffffSSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffff
SSE_BQ_Matematica_4A_SR.pdfffffffffffffffffffffffffffffffffff
 
GEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdf
GEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdfGEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdf
GEOGRAFIA - COMÉRCIO INTERNACIONAL E BLOCOS ECONÔMICOS - PROF. LUCAS QUEIROZ.pdf
 
Modelo de Plano Plano semanal Educação Infantil 5 anossemanal Educação Infant...
Modelo de Plano Plano semanal Educação Infantil 5 anossemanal Educação Infant...Modelo de Plano Plano semanal Educação Infantil 5 anossemanal Educação Infant...
Modelo de Plano Plano semanal Educação Infantil 5 anossemanal Educação Infant...
 

Histórias com História.pdf

  • 1. LuÍso Duclo Soores llusïroçõo de Sergio Morques f.r{ FJ{ )Jo çn Í+ Q'. Ë )r{ o S) cn o c H H >) )-{ FJ{ )Jo cn Í-l Q'. E )r{ o sr
  • 2.
  • 4. Uma terra de muita gente Num país à beira-mar, que se chama Portugal, viveram povos antigos, cá deixaram seu sinal. Os primeiros habitantes não tinham casas, mas grutas, caçavam bichos do mato, comiam ervas e frutas. De muito longe chegaram, os Celtas mais os Iberos. Quando eles se iuntaram formaram os Celtiberos. Vinham ter às nossas praias, os barcos cartagineses. Gregos, Fenícios e outros aqui vinham muitas vezes.
  • 5. LJsavam o alfabeto, seus hábeis comerciantes, e usavam a moeda. Nada ficou como dantes. Não ia durar a paz. Todos queriam esta terra. Por ser tão boa, tão bela a disputavam em guerra. Os exércitos romanos, lutando por um império, tudo queriam conquistar. E foi mesmo um caso sério! Fez-lhes frente Viriato, bravo pastor lusitano, que não podia aceitar o duro poder romano. 111:t h, , ,... ''
  • 6. Mas os novos invasores acabaram por ganhar: pagaram a três traidores, pagaram para o matar. Pelas estradas romanas veio civilização. Fomos parte do império, o maior, maior de então. LJns seis séculos durou essa romanizaçáo. Mas os Bárbaros chegaram: que tremenda confusão! Alanos, Vândalos, Suevos, sobretudo Visigodos, impuseram à pancada suas regras e seus modos. Seguiam o cristianismo, novas maneiras de estar. Mas lutas, sangrentas lutas, cá haviam de voltar.
  • 7. Subiram os Muçulmanos pela Península acima. i, Plantaram plantas estranhas que se dão com este clima. Trouxeram novas palavras e nova religião. Bem queriam cá ficar. Não ficaram semfre, não. A Reconquista Cristã pelo Norte começou. Mas pô-los daqui para fora muitos séculos levou. Dessa mistura de gente, de línguas e de cultura se fez aquilo que somos, e que em Portugal perdura
  • 8. A suposta D. Afonso esp He ada de nrlques a A espada de D. Afonso Henriques estava fana de estar parada, em exposição, no Museu Militar do Porto. . -Tirem-me daqui!Tirem-me daqui senão desato à espadeirada e parto tudo à minha volta! - barafustava ela detrás do vidro que a protegia. Mas ninguém ouve avozdas espadas senão quando elas são empunhadas por uma mão forte. -Tirem-me daqui! Se não fosse eu não havia Portugal... Fui feita para lutar! A professora, que fora ao museu com os alunos em visita de estudo, deu ordem para avançarem para a sala seguinte, mas o Afonso José escondeu-se por trás de uma armadura, enquanto os colegas prosseguiam. Esborrachou o nariz no vidro que protegia a arma e então ouviu nitidamente a voz da espada. - Liberta-ffie: Afonso! Liberta-me que eu conto-te a minha história. - Conta-me a história primeiro - pediu o rapaz. A espada não gostava de ser contrariada. Tremeu de irritação, mas lá começou. Era uma vez um menino, filho de um poderoso nobre e de uma princesa, que se chamava Afonso Henriques. Tinha ele três anos quando o seu pai morreu, ficando a mãe a governar o Condado Portucalense, onde viüam. Deu-o a educar a um aio chamado Egas Moniz. - Calculo que esse aio o mandou para as melhores escolas, para ser muito culto, um verdadeiro sabichão. - Qual quê! - irritou-se a espada. - Com três anos já ele brincava com uma espadinha de pau e andava à pancadaria com a garotada. Tinha jeito para a guerra. Que interesse havia em frequentar a escola? - Bem, aprendia a ler, a escrever... 6 .t
  • 9. - Q,re inutilidade! - exclamou a espada. - No nosso tempo, os padres e os frades é que aprendiam essas coisas. LJm nobre tinha de ser forte na caça e nas batalhas. Lutava com ursos, com javalis e com os inimigos. A sua maior ambição era cortar a cabeça aos mouros! O rapaz arrepiou-se: - Que horror! A espada remexeu-se no expositor. - Tu és um fracalhote, não prestas para nada. Sabes ao menos montar a cavalo? Já pegaste numa lança? Já mataste um lobo? Conseguias erguer uma pesada espada de ferro como o nosso rei? - Não... mas sei mexer num tablet.- ripostou o rapaz, já ofendido, mostrando a máquina novinha que recebera no Natal. --l
  • 10. - Tira essa maquineta insignificante da minha frente senão ainda a corto ao meio - ameaçou a espada. Afonso José encolheu-se, com medo, e pediu-lhe que continuasse a contar. - Tinha Afonso Henriques uns 14 anos quando se armou cavaleiro. Esse é que era um tapaz de fibra! - Eu com 14 anos ainda vou andar na escola. Se me metesse em cavalarias, o meu pai e a minha mãe punham-me de castigo. A espada, então, ate rodopiou de tanto rir. - A tua mãe punha-te de castigo?! Pois Afonso Henriques não recebia ordens da mamã. Como não estavam dç acordo e ambos queriam mandar, ele reuniu os seus homens e foi guerrear contra ela na batalha de S. Mamede. Parece que até a prendeu! E eu furei a barriga a alguns galegos partidários de D. Teresa! Afonso José espantou-se. Hoje, bater na mãe seria impensável. Seria a mais criticável violência doméstica. Mas se Afonso Henriques seguisse as normas de agora' nunca teria conseguido a independência. Às vezes é difïcil compreender o que se passava noutros tempos... I
  • 11. O rupaz pediu-lhe, então, que contasse um episódio mais divertido. - Divertido? - interrogou a espada. - O mais divertido foi a batalha de Ourique. Parece que havia cinco vezes mais mouros do que cristãos, mas conseguimos dar cabo deles. Até disseram que foi um milagre! Só eu acabei com umas dúzias de infiéis. No fim da batalha, os soldados ergueram-nos e aclamaram D. Afonso Henriques rei. O nosso herói nunca me largou, empunhou-me no ar. Que glória! Que excitação! - No futebol também levantam o Ronaldo, levam-no aos ombros - disse Afonso José. - Ele também é um rei.. . à moda moderna. A espada, furiosa, quase partia o vidro. Como é que aquele miúdo se atrevia a comparar um simples futebolista com o ConquistadoÊ - Que comparação incrível! D. Afonso Henriques era o homem mais forte e corajoso do seu tempo. Distinguia-se entre todos, pela bravura e até pela altura. Havia de ter dois metros bem medidos! - Se fosse hoje, certamente, seria o rei do basquetebol; é um jogo em que se atiram bolas bem alto para acertar num cesto - explicou Afonso José. A espada estava mesmo a perder a paciência
  • 12. - Cala-tq rapaz irreverente. Não confundas desportistas com herois que lutaram por uma causa, por uma fé, por um país. A espada continuou a contar que nunca se afastara do seu senhor. Dormia junto dele e até na morte o acompanhou. Foi sepultada com o primeiro rei na igreja de Santa Cruz, em Coiinbra. - Então, como é que vieste aqui parar? - quis saber o jovem. - Quando abriram o túmulo, séculos mais tarde, encontraram-me e veneraram-me como símbolo. Vários reis vieram admirar-me, quiseram empunhar-me. Calcula que D. Sebastião até me levou paraAlcácer Quibir. De facto, julga-se que a espada verdadeira por lá tenha ficado e que eu seja uma réplica. Mas a história está cheia de incerrezas... E hoje aqui estou, para que todos me vejam. Sem mim, o teu país não existiria. Tü serias, provavelmente, galego ou mouro. O rupaz fitou a antiquíssima espada que tanto mais teria para contar. Este ano queria praticar um novo desporto. Tinha pensado no ténis ou no atletismo. Mas, naquele momento, de repente, teve vontade de pegar naquela espada e de aprender esgrima. Tinham-lhe chamado Afonso em honra do primeiro rei e o pai dizia-lhe, muitas vezes: - Hás de ser forte e corajoso e de vencer na vida. Hás de ser um conquistador! Para isso te demos o nome que tens! Mas nunca lhe tinham oferecido uma espada. A mãe nem o deixava ter um canivete suíço, com medo que se cortasse. - Gostava de te levar comigo, espada... - murmurou ele. -Vou ver se consigo tirar-te daí... Libertar-te. Estava a pensar como é que havia de partir o espesso vidro, quando a professora entrou, explosiva, na sala. - Que tapaz impertinente, este Afonso! Sempre a desobedecer! Tem a mania da independência! E puxou-o pela manga do casaco, arrastando-o Ele ficou a olhar para trás. A espada, vertical, chamava-o com o seu brilho. dali para fora. il:
  • 13. .,iì iì.....-- l- I I 'lì' 'l | .,t r ì 1.i t , j i/ 1 ) , , rF 74/ '":'!'; t'/ ' " 'i,Ju ".', ' '' |, ..../ // 1 .:..'i..r1,- ": "/l'/ i ,/ -/-.' t-. -:- tfar. G. ''. ' ( ) / .. :1 '!' I I I ! ! $ t) i I I I ! i I i I ! i I ü L?
  • 14. Com el-rei D. aquele que fez Dinis, tudo o o que qurs D. Dinis mand.ou aparelhar o seu cavalo para ir até ao pinhal de Leiria. - Também queremos ir! exclamaram os príncipes Constança e Afonso. - E posso levar o Martim para brincar comigo? - perguntou o infante. O pajem sorriu e apressou-se a tratar de tudo o que fazia falta. Foi à cozin}:a pedir pão e fruta para a merenda, e não se esqueceu da caixinha com uma pena de gansor urn frasco de tinta e uma folha de pergaminho, para o caso de el-rei precisar de escrever. Levava também um saquito para Írazer pinhões. Estava no paço desde os 8 anos, graças ao pai ser alfaiate da corte, e prestava pequenos serviços. Num trote cadenciado, depressa chegaram ao pinhal, onde se amontoavam centenas de pequenos pinheiros-bravos para serem plantados naquele chão de areia. A princesinha ficou desiludida. - Se o pinhal que o avô começou a plantar era de pinheiros-mansos, que dão pinhões, para que manda o senhor meu pai plantar todos estes que não servem para nada? , O rei então explicou que os pinheiros-bravos iam segurar muito melhor aqueles terrenos. E dariam boa madeira para fazer barcos. Portugal, para se desenvolver, tinha de se aventurar pelos caminhos do mar Mas o herdeiro do trono estava mais interessado em lutas, e para tal jít apanhara dois ramos secos, que pareciam mesmo lanças, e declarara guerra a Martim. Por entre as árvores, nas clareiras, travavam as batalhas. Zás, pás, catrapás! ^" È9" s L2 S. s ë {
  • 15. - Por Santiago, vamos aos mouros! - gritava Afonso, enquanto o companheiro fugia, pois várias vezes já sofrera os seus rudes golpes. - Martim, dá-me o saco paÍa guardar os pinhões - exigia a princesa. - Cala-te que eu é que vou ser rei, eu é que mand.o aqui! - exclamava o irmão que não queria interromper a brincadqira. Mas ela logo ripostava: - Ora essa!Tinha eu 20 meses quando fui prometida ao futuro rei de Castela. E vou casar-me aos 12 anos.Vou ser rainha de um país maior que o teu! - Pois eu vou ser doutor de leis e impor a ordem. Agora vamos lanchar - disse Martim, para espanto dos infantes, habituados afazerem dele gato- -sapato. - Cala-telVais mas é ser alfaiate como o teu pai!Já se viu alguém mudar de grupo social? - tl llb "[ .ç / , ó t0 , o-o t
  • 16. D. Dinis, eue entretanto se aproximara, interrompeu a conversa. - O nosso país precisa de pessoas muito sabedoras. Para isso criei os Estudos Gerais, que formarão doutores em Artes, Leis e Medicina. euem sabe se o Martim não será uma ilustre figura... Mas naquele momento o rapa z era apenas lum pajeffir € estendeu na erva uma toalha com fruta, pão e queijo. Quando terminaram' o rei deu a mão à filha e foi mostrar-lhe as flores do pinheiro. Poucos reparavam nelas, mas eram tão belas, tão perfumadas... Bem podiam inspirar um poema. As imagens ffansformaram-se em palavras, vibraram no seu coração. O rei ffovador sentou-se numa pedra e cantou: Ai flores, ai flores do verde pinho se sabeis novas do meu amigo. Ai, Deus, e u é? (Ai, Deus, onde está?) Ai flores, ai flores do zterde ramq se sabeis novas do meu amado Ai, Deus, e u é? (Ai, Deus, onde está?) Se sabeis noz)cts do meu amigo, aquele que mentiu do que pôs comigo Ai, Deus, e u é? (Ai, Deus, onde estó?) A sua voz bem timbrada ressoava pelo pinhal, abafando a dos melros e das cotovias. Martim e constança aproximaram-se, maravilhados. Aquele momento parecra mesmo mágico. Já Afonso corria com um coelho na mão: '^ - L,acer-o, cacel-o com um pau.vai ser o meu jantar. t4
  • 17. Martim foi buscar a caixinha com a pena de ganso e estendeu-a ao soberano. - Este poema é tão lindo que não se pode perder. Ninguém faz poemas como os vossos, nem trovador nem jogral. Escrevei_o, _a., senhor, antes que ele se apague da vossa memória. um diar' com ,;r* ìr..rrru, hei de juntar todas as vossas poesias num livro. o sol estava quase a pôr-se quando, de novo, montaram os cavalos, de regresso ao castelo. À entrada do grande pátio muralhado encontraram a rainha D. Isabel, que distribuía esmolas pelos pobres. o. rei sorriu, rembrando o milagre que acontecera numa manhã de janeiro. - Meu pai, contai-me de novo como tudo se passou. Quero guardar para sempre essa história na lembrança _ pediu a princesinhì. Então, D. Dinis contou que vira a sua esposa sair do castero com qualquer coisa escondida no regaço, e rogo calculara que fosse pão para matar a fome aos mais necessitados. Muiãs ,o.res a advertira de que não devia gastar em esmolas o dinheiro que ere queria pataouffos fins, para grandes projetos. E perguntara-lhe o que l.u"uu. Ela hesitara um pouco, comprometida por continuar a distribuir esmotu, .orr,rul-,oorr,"de do marido, mas respondera: - São rosas, senhor, são rosas... - Rosas em janeiro? Nunca tal se viu. Então a rainha abrira o manto . o oao em rosas se tornara. Fora esse o milagre das rosas - É uma santa, a nossa rainha - observou o pajem. -Vive parao bem, vive para a paz. -- - rs,,vr^r' Y rv,- I o infante D. Afonso torceu o nafiz.Ter uma mãe santa tinha um inconveniente: nunca o deixava andar à pancadaria. E mal sabia ele que, no futuro, a mãe havia de ir para os campos de batalha pôr fim às lutas que iria ter com o pai. 16
  • 18.
  • 19. A padeira de Aliubarrota Brites de Almeida vivia em Aljubarrota e lá trabalhava como padeira. Mas a sua fama não vinha das apetitosas fornadas de pão com que matava a fome a quem ali morava. Tornara-se famosa pela sua foïça, coragem e patriotismo' Vinha gente de fora para a conhecer. E ela tinha orgulho em contar a sua história, sempre que lhe pediam: Nasci em Faro, e, rogo à nascença, viram que eu era diferente, pois tinha seis dedos em cada mão. - Que bom! - exclamaram os meus pais, convencidos que, por ter dedos a mais, ia ser muito trabalhadeira. Enganaram-se bem! Eu não gostava de servir na taberna que eles tinham e entretinha-me a brincar como os rapazes. pancadaria, jogo do pau e espadeirada eram a minha especialidade. Um dia parti uma bilha na cabeça dê um sujeito que se meteu comigo! Pior foi quando um soldado me pediu em casamento. Só me casaria com ele se antes lutasse comigo para vermos quem era mais forte. Eu tinha um corpanzil de meter respeito, mais músculos que um ferreiro, e a agilidade de um galgo. Claro que lhe ganhei! Mas, pot azar_, o fracore, o lingrinhas, o insigniÍicante, foi desta para melhor... E tive de fugir para não ser presa. Que caminho havia de tomar? Meti-me num batel, rumo a castela, mas fui atacada por piratas, que me frzeram prisioneira. venderam-me no mercado de escravos a um surtão. Acham que eu me deixei ficar? Acham que eu aceitei ser mais uma das muitas mulheres desse velho caquético? Estão a ver-me fechada num palácio para o resto da vida? vesti-me de moura e fugi de novo, de barco, para Portugal. 18
  • 20. Para ter a certeza de que escapava aos guardas, que podiam ainda andar à minha procura, cortei o cabelo, comprei roupa de homem, arranjei um burro e fiz-me almocreve, vendendo um pouco de tudo pelas feiras. Ninguém desconfiou de que eu era apenas uma "donzela". Até que um dia, cansada de aventuras, vim para Aljubarrota e rne frz padeira. Casei com um lavrador. Mal sabia eu que a minha principal aventura ia ser nessa terra pacata.
  • 21. vocês já ouviram falar da famosa batalha de Aljubarrora, em que vencemos os castelhanos, impedindo que o rei deles fosse também rei de Portugal? Foi na tarde de 14 de agosto de 1385. eue tarde de calor e de sangue! À frente das nossas tropas vinham o rei D.João e o condestável D. Nuno Álvares Pereira, que ia pôr em prática uma nova tática: atátjcado quadrado. Só graças a ela conseguiriam vencer um exército muito mais numeroso. Quem me dera ter estad o lá, a combater! Nunca percebi porque é que não aceitavam mulheres como soldados. Eu seria logo a primeira a alistar-me! Mas não podia perder o espetáculo. F'ui com os vizinhos para um lugar de onde podíamos ver a batalha. Extraordinária! os castelhanos avançaram com os seus cavalos e cavaleiros revestidos por reluzentes armad.uras e os portugueses iam quase todos a pé.Mas a nossa técnica e coragem foram de mais! Quando vimos a bandeira inimiga ser arrastada pelo chão, até nos abraçámos. Foi o sinal da vitória! Terminada a batalha, voltei para casa e vi que a porta do forno estava aberta. Quem a abrira? cheirou-me logo a esturro! peguei numa pá, aproximei-me, e que vi eu? Sete militares de Castela a tremelicarem de medo lá dentro. - Saiam daí para fora, seus cobardes!Venham medir forças comigo! Mas eles cada vez tremiam mais e não dveram coragem de sair. Então, peguei na pá com que meto os pães no forno e zás!, caprapás!, desatei a malhar nos inimigos. Os indivíduos chiavam como ratos, uivavam como lobos, chorincavam como medricas que eram. Mas guerra é guerra! E eu tinha de lutar por portugal. Dei cabo de todos sere. sete de uma vez! O povo, quando soube, chamou-me heroína, que ria fazer-me uma festa. Mas acham vocês que era tempo de festanças? Reuni as outras mulheres e lá fomos nós à procura de mais fugitivos. Nunca digam que somos o sexo fraco! Fizemos uma limpeza geral! 20
  • 22.
  • 23. O achamenro do Brasil ATO I Cena I Em frente da praia do Restelo esta a grande armada de pedro Álvares cabral, c-om as::: 13 embarcações. Leva IS00 homens na segunda ztiagem marítima parq a Indza. Em terra alnontu am-s e arto s dignatário s, familiares, curio s o s. rr,rÃB fthorando) - Ai, meu rico filhinho... vai partir e não sei se volta... JUDEU - cale-se, senhora! É preciso é dar força a quem parte. E bem precisamos que vão lá ao oriente buscar especiarias para fazermos negócio. COZINHEIRO - o bacalhau sem pimenta e os bolinhos sem canela, já ninguém os quer. Que venha também a noz-moscada, o cravinho, o açafrão. Nem o vinho sabe bem sem um bocadinho de gengibre. UÃB Qimpando as lágrimas) - Meu rico filho!vai um moço na flor da idade correr tantos perigos por causa de uns gulosos? Porque não temperam a comida com salsa e coentros? EanuacÊurrco (transportando um saco com ernes medicinais) - cale-se, ó tiazinha. vossemecê não entende que por aquelas terras há plantas que curam as enfermidades? Muitos remédios novos hei de preparar na minha botica para salvar vidas. Para já vou vender-lhe um chazinho para os nervos' É tiro e queda. Bebe-o e até fica com vontade de ir para o arraial. 22
  • 24. COZINHEIRO - Que charlatão! Vi-o a apanhar urtigas e caganitas de coelho, que são a base dos remédios milagrosos que impinge por bom dinheiro! As raparigas agitam lenços e, simultaneamente' trauteiam uma canção. Caraztela, caraztela, linda princesa do mar, onde estqra meu amigo que tanto tarda em aoltar? Nos braços de uma sereia, se quedou enfeitiçado? Ou no cabo das Tormentqs tera ele naufragado? V :-
  • 25. O boticário ri e dá, uns passinhos de dança. Vai buscar uma moça para dançar com ele. uÃE (empurrando os dois) -Vão bailar pata o inferno!Vossemecês e toda essa cambada... VELHO DO RESTELO (olhando para o rio) -Thntos homens a abandonar Portugal.. . Deviam era ficar cá a trabalhar! Deixam os campos desertos, já ninguém os semeia. Despr ezamos oficios. t<r.. .tr oe mats! uÃe -Tem toda a tazão, senhor! Já perdi o marido; parre agora o único filho que tenho... VELHO DO RESTELO - tocam o certo pelo duvidoso. euando se arrepend.erem, será tarde de mais. Passam Q correr dois grumetes, Diogo e Fernão, cada qual com o seu saquito a tiracolo, e um padre, andando mais deztagar, com uma grande cruz na mão. i' GRUMETE DIOGO - Adeus, ó gente! Deixem-nos passar que temos de embarcar... GRUMETE FERNÃO - Daqui a um ano ou dois estamos de volta. Ricos e famosos! PADRE - Se Deus quiser... 24 :...' ,
  • 27. ATO II Cena I Dez dias passaram e a corevela navega em aho-mar. os bombard,eiros, treinados para o ofício da gue*a, bocejam, aborrecidos. BOMBARDEIRO SANCHO Qimpando a arma) - Não há nada para fazer aqui ! eue maçada! BOMBARDEIRO MARTIM - Que saudades que eu tenho de dar uns tirinhos! os únicos inimigos que vemos são os tubarões, e não podemos gastar munições com eles. eue irritação! GRUMETE FERNÃO - Se estão maçados, venham esfregar o convés! Tâmbém podem lavar pratos... ou despejar penicos... os bombardeiros irritam-serfazem menção de bater no grumete. GRUMETE DIOGO - Podíamos armar aqui uma tourada. vou buscar uma capa encarnada. BOMBARDEIRO SANCHO - Boa ideia. Sempre é mais animado. Eu faço de touro. BOMBARDEIRO MARTIM - E eu, de toureiro. Improvisam u.mcr. qrena e os marinheiros afluem, em círcuro, pqra assistirem. Com umq capq negra nas o bombardeiro Sancho inaeste. costas e um cesto na cabeça, 26
  • 28. Vários rapazes se revezam como toureiros. BOMBARDEIRO MARTIM (agitando o pa.no aermelho) - Ó touro! GRUMETE DIOGO - Marra! Força! Marra, bravo! BOMBARDEIRO MARTIM (erguendo a espada) - Morte ao touro! T ) F , I ( i t," ì- :* Ì ï, ,. ( I r (r' tã' " ' ,, ,t* 'J:l,ij' ii '! ) .1Í ,,' 1 ' " :!.) .:r,:i' . :.ï: I '#,::' I l;!.i (, t ! í !:. I i1 ,:::, 'lt' :. ,f1r' .J / 6 È I ! ,:l::l t3., ..i I :íÌ :.. 't,, ! ì Ì '%:
  • 29. O "totuo" cai com uma estocada, as cqpqs ztão pelo ar e os jovens enztolztem-se à luta. PADR"E (com um terço enorme nas mãos) - Meu Deus, que horror... Quando não tiverem nada para fazer, aproveitem para rezar. l Aparece o meste, que separa os joztens, dando com um remo no rabo de cada um. MESTRE - São proibidas lutas. BOMBARDEIRO MARTIM - Mas não há aqui tabernas... BOMBARDEIRO SANCHO - Nem moças para namorar... GRUMETE FERNAO - Ontem ftzeram uma representação sobre Santa Bárbara, mas a santa tinha bigode! Tbdos desatam a rir menos o padre. PADRE - Santa Bárbara ainda vos há de castigar! Ainda há de lançar um raio... BOMBARDEIRO SANCHO - Um raio que nos parta! E feio praguejar, ó senhor padre! O gajeiro sobe ao topo do mqstro e grita. GAJEIRO -Terra à vista! Terra à vista! PILOTO - E a ilha de s. Nicolau, em caboverde, onde vamos fazer aguada Todos se aproximam da amurada e dão ztiztas por se aproximarem de terra. GRUMETE DIOGO 28 - O melhor de uma viagem por mar é, afinal, chegar a terra!
  • 30.
  • 31. Cena II Os marinheiros arrltmq,m as barricas de agua e qs cestcts com alimentos frescos. O grumete Fernão tira uma peça de fruta e delicia-se a roê-la. Tira outra e guarda-a por dentro da camisa MESTRE - Alto aí! Tens a mão ligeira... Aqui é tudo conrado, bem contadinho. Dá cá o que tiraste. Fernão entrega a segunda peça e continua a roer a primeira. GRUMETE FERNÃO olhem lá que grande coisa! pena tenho eu de não ter antes escorropichado uma garcafa de vinho. MESTRE - Dão-te uma caneca por dia, biscoitos e peixe seco. Que mais queres? És algum fidalgo? Aparece o piloto, aflüo.
  • 32. PILOTO - F'alta uma das nossas naus, a de Vasco de Ataíde. Sobe ao mastro, gajeiro, a ver se a descobres. O gajeiro sobe. Os marinheiros aproximam-se da amurada e perscrutam o mar GAJEIRO - Nada vejo, meu capitão. Nem sombra de nau nem seus destroços. E o mar está todo chão, como uma planície azul.
  • 33. l li iii ll il Pedro Álooru Cabral desce para o conztés. PEDRO ÁTVANES CABRAL como pôde a nau desaparecer, sem um aviso? Se estivesse em dificuldades, devia soar as bombardas. MESTRE - Não houve tempesrade. Não está encalhada. MARINHEIRO -Omaraengoliu. GRUMETE FERNÃO - Foi decerto o Adamastor ou outro monsffo marinho que a puxaram para o fundo. PADRE - Foi a vonrade de Deus. só Ele sabe qual o nosso destino. ASTRÓNOMO - Eu bem vi nos astros que algo havia de correr mal neste dia... Os astros nunca mentem. MARINHEIRO - Ó seu adivinho, se vossemecê sabia isso, porque não avisou? o marinheiro arcanca-lhe da mão as cartas asuonómicas para as atirar borda fora. Os outros tipulantes afastam_nos. ASTRONOMO - Thmbém está escrito nos astros que vais pagar pela tua insolência. Ainda hás de morrer num naufrágio! MARINHEIRO - Burlão!Vamos deitá-lo aos tubarões! 32
  • 34. O capitão-mor faz um sinal parq se calarem. PEDRO ALVARES CABRAL - Quem se aventura tem de estar preparado para todas as surpresas: as melhores e as piores também. Se nada podemos fazer, as minhas ordens são prosseguir viagem. GRUMETE FERNÃO - Naquela nau seguia o tio que me criou e tantos companheiros nossos... Não me conformo. Limpa as lagrimas. PADRE -Paz às suas almas... Rezemos, irmãos l,W I t tl h, ìl 1,. t'o--* ì a ,l ctDS-HCH_03
  • 35. Cena III A esquadra segue sem sobressabos. Alguns marinheiros pescam à tinha. Outros jogam xadrezr lançam os dados. GRUMETE FERNÃO - Estás a fazer batota. GRUMETE DIOGO - Mentiroso! MESTRE - Larguem o jogo, vão lavar o .on*r. Diogo, Fernão e outros uipulantes lavam, em conjunto, o connés. E cantam: A água do mar salgado laaa, lazta, lava o chã.o. Mas água nenhuma lava a mágoa do coração. Terrninam a tarefa. GRUMETE DIOGO - Esta viagem é uma seca! MESTRE (a troçar) -Ainda não bebeste água podre... Nem comeste sola de sapato... GAJEIRO - Nem te caíram os dentes com escorbuto... Estás cheio de sorte! E ainda te queixas! 34
  • 36. O gajeiro, de repente, grita do qlto do mastro. GAJEIRO - Estou a ver umas algas esquisitas... PILOTO - São rabos de asno. A terra está próxima. GRUMETE DIOGO -}láL de ser a cosra de África. Não é por lá que se vai à Índia? PILOTO (falando para o mestre) - Acho que aqui há gato! Mandaram-me desviar da rota habitual. Mais para ocidente. Será que já sabiam que havia por aqui novas terras? & t----=...--. - I =G € I
  • 37. Pedro Álroru Cabral aproxima-se, risonho. PEDRO Árvenes CABRAL (dirigindo_se ao gajeiro) - Ó rapaz, olhabem! Já vês terra? GAJEIRO - Senhor, vejo um monte ao longe, mesmo longe. IJm monte redondo. PEDRO ÁTVNNES CABRAL - É tempo de Páscoa. por isso vai chamar-se Monte pascoal. Para festejarmos, há vinho paratodos! A tripulação junta-se à roda do capitão-mor, com cts canecas na mão. O mestre distribui a bebida. TRIPULAÇÃO -viva a nova descoberta!viva o Monte pascoal. o marinheiro toca uma gaita e os joaens da tripuração dançam de contenta.mentu.
  • 38.
  • 39. ATO III Cena I Numa praia. Nicolau Coelho foi ewiado & terrq, pelo capitão-mor para conhecer de perto os indígenas. Estes aproximam-se do navegador, curiosos. NICOLAU COELHO (acenando amigaztelmente) - Olá, gente! Nós vimos em paz. Sorri e abre as mãos, mostrando que não traz armas. Os índios fazem uma roda à sua voha. Ti"azern ercos, setas e uns estranhos toucqdos de penas. Muitos têm um osso enfiado no lábio inferior e apresentam o corpo pintado. NICOLAU COELHO - Baixem as setas. Sou um amigo, de Portugal. E trago presentes... Aproximem-se, aproximem-se ! De parte a parte, procuram fazer-se entender por gestos, NICOLAU COELHO -Tomem!Tomem! " INDIOS _ ????
  • 40. O naaegador começa a distribuir carapuças aermelhas e oferece até um chapéu de linho que lhe cobria a cabeça. Os índios dão-lhe ercos, setes, colares. Até um toucado de penas. Cria-se um belo entendimento, embora não se compreendam pela fala. NICOLAU COELHO - Gostei de vos conhecer. Mas tenho de voltar para bordo. Adeus! Adeus! INDIOS _??? i : i I ì a (( ll I .l t: I ri Ì I I i I J l t N. ' t . ,rì'!t rli /i ^qü ( a.i ì t o I d.uü, È .l ì. r t, t i v // , .,"_ ïú'i 'ì*tì f ( t / :. ,. ì, Ì' i,jll .tÍ* ;: :... / j.. i,, :::) í"1 t - -' L ìç.--=!:,ìï, i I I it li r rï I í 1l , / i, I rj t y'.- 'i í ( t f I >-.-f2
  • 41. Cena II Alguns dias depois, na nau principal. Pedro Áloortt Cabral zsai receber alguns índios trazidos por Ìr{icolau Coelho. Está estenüda uma alcatifa ztermelha onde se ergue um q,ssento de aeludo parq o capitão-mor. Os outros capitães esperam de p,é, trajados a rigor. MESTRE (entusiasmado) - Até parece que estamos num palácio! Os índios vão sentir-se uns príncipes... MARINHEIRO - Sabem lá eles o que são príncipes... Príncipes da selva.. BOMBARDEIRO SANCHO (falando pqra o companheiro) - Estão a ligar de mais a estes selvagens. BOMBARDEIRO MARTIM - Devíamos era disparar já as bombardas e conquistar esta terra a ferro e fogo. BOMBARDEIRO SANCHO - Estas criaturas davam uns bons escravos. E levávamos umas raparigas para o porão para nos fazerem companhia... PADRE - Calem essas bocas sujas! Faz falta é evangelizá-los. Fazê-los adorar a cruz de Cristo O padre ergue a cruz e, nesse momentq entram Nicolau e um pequeno grupo de índios. 40
  • 42. Pedro Alaares Cabral, sentado, está imponente, com um cordão e medalha de ouro ao pescoço. os índios aproximam-se, olham para tudo, apontam o colar e de seguida apontqm pqra terra. PEDRo Árvanns CABRAL (saudando) - Sejam bem-vindos a bordo. À portr, para os outros capitães. - Reparem como olham para o ouro. Não é novidade para eles. otimo! NICOLAU COELHO - Podíamos dar-lhes da nossa comida... Nada melhor para conquistar as pessoas do que uma almoçarada. ,,^:,,' ,ì', $
  • 43. Os marinheiros trazem tabuleiros com iguarias. Os indígenas prol)a.m peixe cozido, bolos, melrfigos. Mas, enojados, cospem tudo. GRUMETE DIOGO - São esquisitos! Não gostam do melhor que temos. Naturalmente comem carne crua. Até são capazes de comer gente... Que horror! GRUMETE FERNÃO - Então se lhes dessem sardinha salgada e biscoitos d.uros... GRUMETE DIOGO - Até vomitavam! Os tripulantes imitam os índios. Riem. Riem. ouzte-se uma galinha, das muitas que aão a bordo, a cacarejar. CARPINTEIRO - Comerão eles galinhas? Ou ovelhas? GRUMETE DIOGO - Já vamos saber... Pedro Álztares Cabral manda buscar os animais. Os índios olham pqrq a oztelha, indiferentes. Ao nerem a galinha debicar no chão, fogem assustados. Os naztegantes riem à gargalhada. GRUMETE DIOGO -Tão fortes e têm medo de uma galinha! MESTRE - E se lhes mostrássemos o papagaio? O gajeiro zsai buscar o animal. Os índios, ao.verem o pepagaio, apontam parq terra e falam com o bicho, que repete tudo o que eles dizem. NICOLAU COELHO - Em tèrra vi muitas aves semelhantes e ouvi o seu canto. Algumas parecem, de facto, da família dos louros. Sem elas como haviam d,e fazer aqueles toucados de penas? 42
  • 44. Pedro Alvares Cabral leztanta-se. Vai anoitecendo. Os índios estã,o tão à ztontade que se deitam a dormir na alcat'ifa. PEDROÁTVENNS CABRAL -Tragam almofadas e mantas para os nossos convidados. Os marinheiros cobrem os índios. BOMBARDEIRO SANCHO - A nós não nos tratam tão bem. BOMBARDEIRO MARTIM - Claro, somos carne para canhão... E lá vamos nós dormir no chão, amontados, na camarata do mau cheiro. BOMBARDEIRO SANCHO - Do mau cheiro? Não! Do requintado perfume de suor e chulé! Sancho tapa o nariz, os ouffos riem. I !.-
  • 45. Cena III Na nau, no domingo de pascoela, após a missa solene num ilhéu. PADRE - Que bela foi a missa solene desta manhã! Repararam como os indígenas estavam tão interessados e copiavam todos os nossos gestos? Havemos de os converter, de deixar aqui uma ctuz de cristo. PEDRO ÁTVENES CABRAL - E esta terra irá chamar-seVera Cruz. Todos aplaudem menos alguns bombardeiros que resmungam, à parte. BOMBARDEIRO SANCHO - Cruzes canhoto que o diabo é tortolValia mais dispararumas bombardas para esta gente de pele avermelhada nos Ievar até às jazid,asde ouro. BOMBARDEIRO MARTIM - Dinheiro é o que faz falta. E o que é que nós levamos daqui? tlns arcos e flechas, uns toucados de penas e uns papagaios! Mal-empregada viagem! l Os capitães reúnem-se com pedro Álror^ Cabral. BARTOLOMEU DIAS -E agorar QU€ fazemos? Prosseguimos para a Índia, como era nosso intento? OUTRO CAPITÃO -Damos novas ao rei? Ele não pode ignoraruma descoberta tão importante. PEDRO ÁTVNNNS CABRAL - Mandamos uma das naus de volta a contar do achamento, e as outras seguem pata Oriente. Ffavemos de fazer conquistas, alianças e de encher naus e caravelas de pimenta!vai ser um carregamento colossal! PeroVaz de Caminha apresenta a sua cqrta. PEROVAZDE CA,ÜIINHA - Eu tomei a liberdade de escrever quanto se passou nesta viagem. Lendo o meu escrito, D. Manuel conhecerá todos os detalhes. 44
  • 46. lrr , |{l I '"t fr '"j PEDRO ALVARES CABRAL (passando os olhos pela carta) -Tua carta seguirá. Será a nossa voz. O mestre intromete-se na conaersa. MESTRE - Podíamos apanhar dois ou três indígenas para D. Manuel saber como é esta gente. Em Portugal nunca se viu alguém assim.
  • 47. GRUMETE FRANCTSCO (rindo) - Não deixem de levar umas raparigas. Haviam de fazerfuror em Lisboa, todas nuas, com cabelos negros e brilhantes até à cintura. o padre benze-se três vezes, escandalizad,o, e ergue ao aho a cruz. PEDRO Á'LVENBS CABRAL - NãolVamos deixar cá dois degredados. Estavam condenados à morte. Se morrerem, cumprem a pena. Tragam-nos cá. o mestre empurra os dois degredados que ouztiram a conaersa. DEGREDADO ASSASSINO - Preferia que me deixassem na Índia. Sempre podia enriquecer. Esta gente é muito pelintra. PEDRO ÁTVANES CABRAL - Não queres ficar aqui? preferes que te mande enforcar? O degredado apalpa o pescoço. DEGREDADO ASSASSINO - Meu rico pescocinho... Eu fico, eu fico. À portr. - Mas se estes selvagens me irritarem, ffato-lhes da saúde. Até lhes arranco as tripas! Já dei cabo de meia duzial PEDRO Árvenns cABRAL (dirigindo-se ao degredado ladrão) -Etu? DEGREDADO LADNÃO - Eu devia ser perdoado. Desde que saí da prisão nunca mais roubei MARINHEIRO - Mentiroso!Tiraste-me uma bolsa e um par de meias! BOMBARDEIRO SANCHO 46 - E eu tive de te dar uma sova para me d.evolveres umas ceroulas!
  • 48. PEDRO ALVARES CABRAL - Está dito. Ficam nesta terra recém-descoberta. BARTOLOMEU DIAS - Quando voltarmos estarão vivos e terão muita informação. Leaam os degredados para terra. MESTRE (dirigindo-se aos grumetes) - Rapazes, ajudem a arrumar as barricas de água fresca. Há muita fruta para acondicionar e bicharada que caçámos para preparar. Os grumetes deitam mãos à tarefa. MESTRE - Despachem-se, molengões! Carreguem os cestos de frutalVão desmanchar as carnes para o cozinheiro as pôr de salmoura.
  • 49. Fernão e Diogo limpam o suor da rcsm. MESTRE - Despachem-se! Depois destes carregos ainda têm de esfregar o convés. os dois grumetes escondem-se por trás de umq série de barricas. GRUMETE DIOGO - Estou farto de ser grumete! Melhor sorte que nós têm os degredados... Ficam no Paraíso... Nunca vi sítio mais lindo, onde a Natureza nos dá tudo... aré lindas miúdas. GRUMETE FERNÃO - E se nós fugíssemos num batel? No meio da confusão ninguém dá por isso. GRUMETE DIOGO - Espera, tenho de ir buscar uma coisa. Volta com um saco. GRUMETE FRANCISCO - Que preciosidade levas aí? GRUMETE DIOGO ffalando ao ouvido do amigo) - É uma galinha. Acho que não há paraíso sem uns ovinhos estrelados! Os grumetes fogem. Volta a ouuir-se a gaita de um marinheiro e ou,ue-se um coro de tripulantes: Adeus, adeus que nós aqmos por verdes rotas de sal levar a terras distantes o nome de Portugal. Adeus, adeus que nós z)amos com aontade ou sem ztontade descobrir além do mar essa palavra saudade. 48
  • 51. O Desejado Tiago e Leonor foram à janela. - Mas que manhã de nevoeiro! - exclamou o rapaz._ E eu que pensava ir hoje lançar o meu papagaio ao vento ...Láterei de ficar a brincar com os soldadinhos. - Mas não estão sempre a dizer que D. Sebastião vai voltar numa manhã de nevoeiro? E se for hoje?! Um sorriso iluminou-lhes o rosto. A mãe estava entretida na cozinha e eles podiam escapar, sem que ninguém os visse. Desciam a colina e logo se achavam junto ao cais onde aportavam os barcos. Se assim pensaram, melhor o fizeram. De mão dada, saltitando sobre as pedras negras da calçada, chegaram ao Tejo. Não se via a outra margem, só aqui e além silhuetas vagas, esbranquiçadas, movendo-se na âg.* que se confundia 'com o céu. Entre as gaivotas pousadas em terra, os pescadores remendavam as redes, miúdos descarços saltavam ao eixo ou lançavam piões. LIma rapariga cantarolava: Lá ztem a nau Catrineta que tem muito que contcff. Ouai agorq, senhores, uma historia de pasmar..
  • 53. - olha! - exclamou Leonor. - olha um barco a aproximar-se. Nem percebo como se navega com este tempo. É preciso coragem! A pouco e pouco foram distinguindo as velas, o casco, ouvindo o barulho das pequenas ondas a embaterem na madeira. - Aposto que é o Desejado! Quem mais se atreveria a navegar assim? D. sebastião é que não tem medo de nada. E não vai deixar que os espanhóis mandem em portugal. É ele! Aproximaram-se os dois quando o barco, serenamente, acostou. - Quem vem aí? - pergunrouTiago. _ E D. Sebastião? - Como adivinhaste que sou Sebastião? - respondeu uma voz rouca. Os jovens até saltaram de entusiasmo. fam ser os primeiros a receber o Desejado. Começaram a sair homens curvados carregando caixas de madeira. Que estranho... -Vossemecês trazem o rei? - Peixe-rei? - galhofou o sujeito. - Esse não é desras águas. só trago linguados, sardinhas e carapaus. Leonor, raivosa, destapou o oleado que cobria as caixas e viu, já com aluz do sol que quebrava a neblina, o pescado, com o seu brilho de prata. O pescador, sorrindo, atirou-lhes um caranguejo. - Então, o que é que vocês querem do Sebastião? A mãezinha precisa de peixe para o almoço? Fugiram os dois, a correr, e só pararam junto à casa. Estranhamente, a mãe não lhes ralhou ao abrirem a porta. Nunca os deixava sair sem autorização, e Leonor, essa, só bem acompanhada podia pôr o pé na rua. Hoje sorria como nunca mais sorrira desde que o marido partira para a aventura africana. - Esta manhã, recebi uma carta de vosso pai. - Mas o pai não morreu na guerra? Estamos vestidos de preto, de luto por ele... D. Beatriz não respondeu. Desdobrou o papel e leu: 52
  • 54. ihü.í,hn" aÁmãa et7oíe,'Lt'Leí,tt rcn'iití f//'lÌs, Nãn sêi t'e ?íÉtcia/s t't'tü'í/'u6 c,lulara*n até aíÍt' MwTo tewry já rya*sou 9o{ye a batatln dz ,+hars @ültü" * , - yfu* a airl^a. três rek e a. f*tn. fm d^a. unssa" jrutm,tutiz. tu Tnrpru f,u dÁÁ^0 ú14lú t'u,OrtOr l,ríÁ/t tt'tt4 ?tí.Ota,r) aú Wr rc aì"dn" retP't'rana" ettmh^a" zÜt'La' lffía arLn^a^dilra,rlottPou,t tz a ttiÁ^a' ?'a/a" reu{'er O dt'nJwtrO d^O resgate' Eu estwe entre os 600 capa/atm g uu"batuaw sab ns mdaos dttct*s fu o. ssba,úinú. Maç g nd^erus? Elz a,uat'tpqa", d^estunid^or g*fo"ão 'Tantu,7o!') 'ew ttr qryát oUl^. E 146, caualgfuamm ceu e/e, entre Lí,til)eft,s fu F, fu [o*tg"-" ?r^roJ*, Utttra LI/44 eXérc*LO ry tlnln Utt'LO t't't'14 dm s'ewç * oãon*n RpÁtmn, ,t^F*W g sz-A:nla onuertìÁ"0 à f fu tt'{À"o' eb cod*un' ba,n as wssas for4 efi'agza'st De u,nn. utlha" toou 0 trouãn ^ão,,rl,u d2 ca]íhõ6. Os ymttgtwses nã^o tü,í14^atr4 ?,rwiíto g ^ ?nÌu'rnt u,sattst'^4 arti,h^artn"... e 0t 14'0ttot cat'/4"õvs estattatn arr4dÂ" a'trgl^a^dat àrt t't'tuilÂ"' Era,tm irnÈ1,ttos os tiotnilos, rc * rodzattamlortod^o o la^dr, e npowlueí ta.í^a" wí,(Lê-|Ìs. As /an4a,s trespírsattam m cattalos e m ca'ua/'etm, Útltt í'u'a/í pesaÁnr arru,a^durns, eril44 aUãn a^o ch^fu. A ?.ftW %"onta^d^a" d2 D' "Seba,*inú ftt "t^!iÁ^a" e fu, M 'uer'?uz Pi'do, rynu'"tu Út't4 a l"anq' ?ara. rc * op*"tt, çaltaão ?4/a" o veãaual' 53
  • 55. Mesm"o an úia, cotthfu,Lei a botar atá a Lr'Lü,ú,ía" h/4g" sc ryr{trar cou repeadm g@ dm ruourm. Pt!*i 'n"ou.tra. l"a/.í&, ca,íÁÁ. pr ah, e dzaiì conilrut^ar a. l,o*ar até à r'urrte. lá. tü.íÁÂ" a" a/Lu^aÁ.u,ra" fuão, atno/gãa, já esúlnh ça,njttp. ?arïwaru-?í'u 0 brap dtre*o e untittu.ei a" èrtL{"er a la,ng" utn 0 ngí)o Ew{traram-mz 0 ngão e 0t u,tut d"oí catalns a galnV espezth,h^a,ral,ft-?t42. ou,ui vozzt a m,pbrar a^0 ?í.oíto ,o rc abaâon^a*se @ dzserto unlltto, rc n sa.l,ua,çse. 0 ret*u Vreakaua dz{z. ua,ç D. seba",hÀ"o üoí4if/1Á", W buar o son lu até a^o fn. E excla,tu"ou: "Morrer m^as d"euagar". 7uÁ"0 t'e afflou, ?eft,sel ry " umte u"e lanata. ^la/,ç 14^ãn aí d"@ h^otrm ry,o,ão anrdn ettata nu,u4^a. fkãn, on^dz sc a,rn o/(toa//a*n n futÁn. Perjoonta-Lh,esVor eLra, mas n*ngu"êl,n saltn a.o certo. tlm barbuho, V n al,ì{tara ú144r so{Á^adt, ra/sgou-r,ru a" u,ru//sa" ?ara" ú1,í4 a/í ttta/ç {war * 4* N (tra4os. Mns ?udt " fuçq ds{zs. Nu,nu. unk Vod^eru mnniar Lí,ru.a" npã" ^lauba. ft^" e m^au,s-tratm ?a,r4% e atma oyoÀo K * resgatu,n, ca,n út4rnílrb r.era nforão ou venÁtÀ^o útrLo ssuapo. pm tsn u^e d^erawt ?"ft/ e ?.etíA" ?ara m,p/nrar a vorsa pìnÁ^a^dz. Mns ett nit go p4hÁaÁr. Íe mz atuLars e d"asia*s t?r a. fil44///h Lm/it", uefldzi a @ú,úa da fonn t yg* o rcry rru,tt ?eÁtw. gz satàada tsí,íl4n dz uíçt qtu satàaÁ^es tet'í,hn dz enAtga/, agore etn tãt gran/z p.uEo fu yfu a nlryend*nrtn". L* Du.ts 1/0t a,lrenpe. Voçn ?í,uJU^o e pat g mtubo vtt W 54 D. Dturte dz Sannrem
  • 56. Duas lágrimas teimosas corriam dos olhos de D. Beatrí2, que apertou os dois filhos num abraço. Tiago, rindo, gracejou: -Tatvez D. Sebastião nunca apareça, mas qualquer dia vamos receber o nosso pai, o nosso Desejadol. - Para já - disse Leonor -, vou tirar esta horrível roupa preta e vestir a minha saia de veludo encarnado. Pn tú tr, L r
  • 57. A Restauração da Independência o mês de novembro de 1640 estava mesmo a chegar ao fim, frio e chuvoso. Havia 60 anos que portugal perdera a independência, e cada gota fria de chuva lembrava uma lágrima de um país que não queria ser governado por reis estrangeiros. Zé Maúa andava furioso por causa dos novos impostos com que os espanhóis sobrecarregavam os portugueses. Nada lhe corria bem: a patroa não lhe aumentava o ordenado; o padrinho não lhe comprava um casaco grosso de lã pata o inverno: e o que tinha, como crescera, já só lhe servia nas orelhas... Razão tinham aqueles gu€: por todo o rado, refilavam! E agora, que ia descansar, já estava D. Filipa de vilhena a dar_lhe que fazer: - Rapaz, vai depressa chamar os meus filhos Jerónimo e Francisco. Lá foi, contrariado. Mas o que quereria deles a mãe com tanta urgência? Escondeu-se atrás de um cortinado, a espreitar. D' Filipa tinha junto de si duas espadas. Que fuia fazer com as armas? As damas costumavam pegar mais numa agulha do que numa espada... Pois o que ela fez foj mesmo estranho: chamou os filhos, primeiro o mais velho e depois o outro, e bateu-lhes com a espada no ombro. rJma vez que o pai deles tinha morrido, era a mãe quem os armava cavaleiros. E disse-lhes que se preparava uma revolta. No dia I de dezembro, um grupo de fidalgos patriotas ia acabar com o domínio espanhol. - Meus filhos, vão lutar pela voss a pátria. Só quero que voltem para casa quando estiverem cobertos de glória! Aquilo é que era falar!Aquela senhora era mais forte, corajosa e patriota do que a maior parte dos homens. 56
  • 58. ze lv4afia coçou o naiz. se fosse a mãe dele, dizia-lhe para não se meter em sarilhos. Para ficar quietinho... No dia seguinte, D. Jerónimo e D. Francisco saíram de casa bem cedo, levando as armas. Qual seria o seu destino? Mortinho de curiosida d.e, Ze Maria esgueirou-se de casa e seguiu-os de longe. Caminharam até ao Paço, ali à beiraTejo. Lá moravam a duquesa de Mântua (prima e representanre do rei de Espanha) e o traidor Miguel deVasconcelos, que ranto mal fazia ao seu país. O que viu a seguir mais o espantou. Daqui e dali surgiram outros fidalgos armados que dominaram os guardas do palácio. eue excitação! E entraram todos no edifício monumental A tJ
  • 59. Sem que ninguém o travasse, pouco depois, ZéMariasubiu a escadaria, curioso. Que iria acontecer? Encostou-se às paredes e avançou até à porta do escritório de Miguel de vasconcelos, onde os conspiradores se tinham reunido. Mesmo que o vissem, quem ia ligar a um rupazito? : Por toda a parte procuravam o traidor: nas salas, no quarto, debaixo da cama' Onde se teria ele metido? De repente ouviu-se um restolhar de papéis dentro de um armário. Deviam ser ratos. E Zé Maria até ffemeu, porque tinha um medo terrível de ratos. eue horror! os fidalgos arrombaram o armário. E quem descobriram lá? Emvezde ratos, o barbudo e feio Miguel de Vasconcelos. Dispararam sobre ele, mas não morreu. Então que fizeram? Zumba!, atiraram-no paraa rua! - Bem feito! - disse Zé Maúapara os seus botões, e esgueirou-se escada abaixo. À volta do corpo de Miguel deVasconcelos ia-se juntando uma pequena multidão que gritava: - Grande diabo! -Traíste o povo e estás a pagar! -Vai para o inferno! "Que belo casaco de lã tinha o malvado...,,, pensou o zéMaria, que tremia de emoção e de frio, em mangas de camisa. Aquele casaco é que lhe convinha! Já não fazia falta ao dono. Baixou-se para lho tirar, mas... uma matilha de cães lançou-se sobre o corpo, a lamber-lhe o sangue. Agora a multidão crescia e gritava a prenos pulmões: -Viva o rei D. João IV! -Viva a independência! -Viva! E Zé Maria gritou também. 58
  • 60. "'-**' .:: ':. =i{1Èr' ti*:'l'':- ;:- : -. .:{-: i:'- i,:i:-- :a .,:: r.i+ç,it#èF' i:: .'tÈ ,;'+ ;f,:rr4'*:-;j!: ,.:ìtg o*;p'
  • 61. O terramoto O João e a Ana acordaram ainda antes de o galo cantar. Moravam numa quinta, na Ajuda, com o tio, e nesse dia iam até Lisboa, onde ele tinha de fazer uma entrega. Instalados na carroça cheia de legumes, lá seguiram) aos safanões, a caminho do Convento do Carmo. Apesar de jâ ser novembro, estava calor e o sol brilhava num céu claro, azul, azul. A cidade, linda e monumental, fervilhava de gente elegante e bem vestida para assistir à missa solene do dia de Todos os Santos. Pelas ruas passavam também escravos africanos carregando bilhas e cestos, estrangeiros louros ou tisnados e crianças descalças brincavam entre os cães vadios. Pena as ruas estarem tão sujas, com dejetos de cavalos e as imundices que atiravam pelas janelas. Até os penicos lá despejavam... -Vocês podem ficar aqui, no Terreiro do Paço, à minha espera - disse o tio quando chegaram a uma enorme praça. - Animação não vai faltar! Pode ser que os reis e as princesas saiam para irem à Sé. Os jovens lá ficaram) mas o que mais os encantava era o rio imenso, liso e brilhante como um espelho, salpicado de barcos. - Quem me dera embarcar naquela nau e ir até à Índia... - sonhava o tapaz. - Ora, isso é muito longe - replicou a rapariga. - Eu preferia... Mas, de repente, os cães começaram a ladrar e a andar à rod.a, os cavalos relincharam, inquietos. De seguida, ouviu-se um ronco vindo das profundezas e o chão desatou a tremer debaixo dos seus pés. - Que horrot'! - gritou o João, afastando-se do cais. - Descansa, miúdo, que isto já passa - tranquilizou-o um velhot.. - É só mais um tremor de terra, nada que assuste quem aqui vive... Já passei por vários. 60
  • 62. -- >;;)- ;; 'É::ã ----. -_-/ -- ffi= _.--ì --t I l ----,-/ =--- --<--- '4'i!;ÉËà* - ï:.a - o G. l e ï2.:::- .e ''|*z -..* ...,,. .-_>- s --) ì .!_- J
  • 64. Grupos de gente atordoada, suja, chorando, dirigia-se para o rio. Esse, pelo menos, nunca poderia arder. Mas Ana insistia em ir até ao convento, onde o tio devia fazer a sua entrega) perguntando, desesperada, onde ficava. Subiram a uma colina, e em boa hora o fizeram) porque, estranhamenter o rio recuou para logo ondas gigantes galgarem o cais, varrendo a Baixa, arrastando consigo os magotes de gente que junto ao Tejo se apinhava. De um lado o fogo, do outro a água. por toda a parte, casas e muros desconjuntavam-se. o chão abria-se. Seria o fim do mundo? A muito custo' por ruelas intransitáveis, saltando sobre ruínas e mortos, chegaram ao largo do convento. Lá encontraram a mula Gracinda, que, ao vê-los, relinchou de alegria. Sobre a carroça abatera-se um edifïcio - estava esmagada. Chamaram pelo tio. -Tio Manuel! Tio Manuel! e ) È ü t- f'-È- +
  • 65. Ninguém lhes respondeu. Afoitaram-se pelo convento em ruínas. Muitos frades tinham morrido e... também o tio Manuel jazia debaixo de uma enorme coluna de mármore. Joana ajoelhou-se ao lado do tio, a chorar. Também o irmão não conseguiu conter as lágrimas. -Tio Manuel, querido tio... como vamos nós,viver sem si? Se não podiam devolver-lhe a vida, queriam, pelo menos, levá-lo com eles. Mas como? Era impossível erguer a coluna que lhe tombara sobre as costas. Pediram ajuda a dois rapazes que passavam carregados de peças de prata. -Temos mais que fazer. A desgraça de uns é a sorte dos outros! E continuaram a remexer nos destroços em busca de valores. Eram ladrões! -Vamos embora daqui! - decidiu o João, a custo. - Não estás a sentir outro tremor de terra? Olha, mais pedras a cair! Desatrelou a mula e fugiram com ela em direção à Ajuda. A viagem a pé era cansativa, demorada. Metia horror. Só os campos permaneciam iguais. Onde dantes se erguiam construções, agora só havia escombros, vultos caídos, desgraçados que se arrastavam.lJma garota ferida chamou-os, pedindo que a levassem dali. Já não tinha ninguém. Puseram-na na garupa da mula e seguiram viagem. Qne triste, triste viagem... Para espanto das crianças, na Ajuda, o terramoto pouca mossa frzera. E quem haviam eles de encontrar? Nada mais nada menos que o rei D. José, a rainha e as quatro princesas. Como, se o Paço tinha ficado desfeito? A famítia real escapara porque fora passear a Belém. Pararam, curiosos. E logo de seguida apareceu, numa carruagem) um senhor muito alto, com uma farta cabeleira postiça, toda branca. - E o Marquês de Pombal! - murmuraram os populares. - Que irão resolver? Como ninguém os mandasse embora, deixaram-se ficar. Depois dos cumprimentos, o rei, atercotizado, perguntou ao seu ministro: - E agora? t< - E preciso enterrar os mortos e cuidar dos vivos! Ana e João acenaram com a cabeça. Sebastião José de Carvalho e Melo tinha razão.Enxugaram os olhos vermelhos de tanto chorarem. Desmontaram a miúda da mula e foram para a casa deserta e rachada lavar-lhe as feridas. 64
  • 67. As dinastias Tu sabes as dinastias? Perguntaram minhas tias. A primeira, tia Dina, é decerto a Afonsina. A segunda, tia Beatrí2, eu sei que foi a de Avis. A terceira, tia Cristina, foi espanhola, a Filipina. A quarta, tia Constança, foi mesmo a de Bragança. Houve quatro dinastias. Verdade ou não, ricas tias? Já respondi acertado. Agora quero um gelado. 66
  • 69. O dia 5 de ourubro de 1910 O António e a Maria eram primos e passavam sempre as férias juntos, em casa dela, na Ericeira. Mas aproximava-se outubro, o tempo arrefecia, as aulas começavam. Então era a hora do adeus, das promessas. - Vamos escrever um ao outro a contar as novidades. Eu mando-te uma carta todos os meses - disse a rapariga. - Quais novidades? - respondeu o rapaz. - Nem calculas como é aborrecido viver num 3." and,ar, em Lisboa. Não há nada divertido para fazer.Temos um rio onde não se pode tomar banho. É impossível brincar nas ruas. A escola fica num prédio velho, e quem lá manda é a palmatória. Vão ser uns meses sem história. para esquecer! Mas no dia 5 de outubro ambos foram a correr buscar papel, caneta, tinteiro e escreveram, com entusiasmo, as primeiras cartas. ---: -r-g::-= $ o fllrrtíUì,.iu ltsdrr P..rr r'-;-' Sï:ii'Ê= --:=:!-- --.- rsr{fr .Sr.:*:g R e p ú b I i ca e rn .-==?.ot,tu I A' R evo tução tritïiïffinte * ENFIM! 5:'=z:- -_--r!.-r ^L A -ìr.r-- -t. _-j , -. -"--- r'?----- 2---. -ts-. I
  • 70. LÍsboq, 5 de ouïubro de 1910 Querídq MqrÍq, Hoje foí um díq exïrqordínórío: o dq lmplontoçõo do RepúblÍco/ E eu q pensqr que esïes meses nõo ïeríqm hísïóríq... Aposïo que o 5 de ouïubro qíndq seró feriqdo nqcíonql ! E v:í-o! Dízíq eu que erq umq moçodo morqr em Lísboq, mqs, qfínql, ïem qs suqs vonïegens. Assísïí ò revoluçõo/ onïem pqssqrqm mesmo nq mÍnhq ruq os soldqdos revolïosos que se reunirqm nq roïundq. Seguí-os dq jonelo qté desqpqrecerem de vistq. Depoís, díq e noíïe, ouvímos os líros. A mínhq írmõ ïopovc os ouvÍdos com medo, mqs eu só ïínhq vonïqde de ír ver bem de perïo ïudo o que qconïeciq. No río Tejo, os conïrqïorpedeÍros Adqmqsïor e S. Rqfqel díspororqm sobre o Rossío (onde estqvqm ïropos monórquÍcqs) e sobre o Pqlócío dqs Necessídqdes (onde vívíq o reí). Tínhqmos sempre notícíqs frescqs, poís os qrdínqs nõo pqrovqm de opregoqr os jorneís, que depressq se esgoïqvqm. As pessoqs que ondqvqm pelcs ruqs pqrqvqm pqrq fqlqrem umqs com qs outrqs e conïqrem ïudo o que sqbíqm. 000 oo oo o o o o o trrgoooooE0 . ooo0Oo q ggog s (
  • 71. :.1 , Ì.- #- A cerïq qlïurq dísserqm que q revoluçõo esÍqvq em rísco de fqlhhn e enïõo o meu poí, que é ïodo republícqno, pegou numq qrmq e foí combqïer ïqmbém. A mínhq mõe ebreçou-o, com lógrímos nos oÍhos. Ao despedír-se de nós, dÍsse-nos: - Nõo guero ver nínguém q chorqr. Esïq é q horq de decídÍrmos o fuïuro. o povo nõo quer mqis q rnonqrquío. os reís gcsïcrom o nosso dínheíro, deíxqrqm que os lngleses ficqssem com terríïóríos oe Áfricq que devíqm ser nossos, corïqrqm-nos q rÍberdqde. só os cobqrdes nõo luïqm por cquílo em que qcredíïqm, e eu qcredíïo nc Repúblícq/ DescÍ qs escqdqs com o meu pqí e vÍ que, nq ruq, ouïros homens como ele seguÍqm o mesmo cqmÍnho. se eu fosse mqís crescÍdo, tqmbém tínhq ído. ouví dízer que nq Roïundq qpqrecerqm crgumos murheres, pronïos q luïqn q servír de enfermeírqs ou q levqr comídq pqrq os revolïosos. 70
  • 72. 66Ë g 6 Depoís de tqnïos momenïos emocíonqntes, o mqís fqnïósïíco qconteceu hoje, òs ç dq mqnhõ. A eepúblícq foí procÍqmqdq dq vqrqndq dq Cômqrq Munícípcl de Lísboq. Quem o proclornou foí o Dr. José Relvqs. E, qo mesmo ïempo, hqsÍeqrqm umq bqndeÍrq novq, verde e vermelhq/ Que fesïq/ Que clegrío/ A mulïídõo nõo se conïínhq com o enïusíqsmo, gríïcvo: - VÍvq o Repúblicq/ Vívq c Repúblico/ Mqndo-ïe recortes de olguns jorncís denïro desïe envelope, como recordoçõo. Estõo q chqmqr-me pqrq ir pcro q cqmq, mqs qcho que nõo vou conseguÍr dormir... Recebe um befo desïe ïeu prímo republícqno que te qdorq. Anïónío 77
  • 73. Na Ericeira, na sua vivenda virada para o mar, Maria sentou-se à mesa e escreveu: Eríceírq, 5 de ouïubro de 1910 Querído prírno Anïónío, Espero que esïejqs bem e que nõo ïenhos cponhqdo muíïos sustos com q revoluçõo. Por oquí foí um sossego durqnïe ïodq q rnqnhõ. Mqs, c seguír qo Qlmoço, qs pessoqs corneçqrqm o juntcr-se nqs ruqs, pois dízÍq-se que q fqmílíq reql vínhq q cqmínho dq nossq ïerrq. Tínhq-se refugÍodo no pqlócío de Mqfrq pqrq fugír ò revoluçõo, mqs tqmbém qí nõo esïqvq em segurqnçc. Enïõo que resolveup Embqrcqr nq EríceÍre, que é q proÍo mqÍs próximc, e qssím escQpqr. Eu nuncq ïinhq enconïrqdo um reí ou umq rqínhq e fíqueÍ cheíq de curíosídqde. lmcaínovc-os sernpre nos seus pqlócíos, com coroqs e líndos ïrcjes ou em cqrruqgens qïrelqdqs q cqvqlos brqncos Mqs víerqm ern cqrros (que sõo qs cqrruqgens modernqs), e qs roupqs que vesïÍqm erqm qbsoíuïqmenïe normqís. A cerÍq qlturq qpeqrqrn-se e dÍrigírom-se pqrq q prqíq dos pescqdores. Vóríqs pessoqs os qcomponhovom. Vou conïqr-ïe qs mínhqs ímpressões sobre q reqÍezq, poÍs nõo sei se jó q enconïrqsïe qí, nq ccpíïol. A rqínhq D. Mqríq píq, que jó esïó um bocqdíïo velhoïq, é bqixinhq, mqs muiïo finq e elegcnïe. cqmínhqvq sempre colcdo. lq ïrisïe, ïrÍste, ïrisïe. 72
  • 74. E 6 BEU A rqínhq D. Améííq é qlïq q vqlen e porecíq qíndq mqíor com o enorme chopéu que usqvq. Dírígío-se q uns e ouïros, qlïívq, muÍïo senhorq de sí. Deve ser umq mulher cheÍq de energío. Tqmbém ví o reí D. Mqnuel, mqs dígo-ïe, frqncqmenïe, que ïíve penq dele. Tem um qr de ropozínho perdÍdo. Esïqvq pólído como cerq, ïodo vesÍído de preïo, com um chopéu de coco enfíqdo nq cobeço. Pergunïou vóríqs vezes se o mqr esïqvq brqvo. Devíq senïír-se bem nervoso... MuÍïos populoresjunïorcm-se nqs qrrÍbqs pqrq os observqrem, mqs eu preferí descer qïé ò prcíe, pqrq qssísïÍr qo embqrque mqís de perÍo. Ao lorgo estqvq o Íqïe reql, mqs os fugítívos ïÍverqm de se meïer em bqrcos q remos pqrq ló chegorem. Uns pescqdores forqm buscqr cqíxoïes de ïronsporïor peíxe e cesïos, pqrq fqzerem de degrous, poís es senhorqs ïÍnhqm dífículdqde em subín com qquelqs sqÍqs ïodqs chÍques. Depoís empurrqrqm os bqïéÍs, com os pqssqgeíros ló denïro, qÌé fluïuqrem no mqn que esïqvq reqlmenïe ogíïodo. Remqrqrn, remqrqm, remqrqm. Ló longe, o reí, qs rqínhqs e seus qcompqnhqnïes pqssqrqm fínqlmenïe pqrq o gronde íqïe que os íq levqr nõo seí pqrq onde. NÍnguém qcenou corn lenços. Hqvíq um grqnde sílêncÍo. Foí o fím dq monqrquío. 73
  • 75. Aquí guqse todq o genle é republícqnq,, e eu ïqmbém sou (emboro qíndq hó pouco Íempo gosïosse de bríncqr qos príncípes e príncesqs), mqs nqquele momenÍo eles deíxqrqm de ser reís pqrq mírn, tornqrqm-se qpenqs pessoqs gue ïinhqrn de qbqndonqr q póïríq. Mqís ïqrde qpqrecerqm uns homens dq cqrbonóríc que pergunlovqm onde esïqvq q fqmítiq reql. Trqzíqm cqrqbínqs e bombqs. suspíreí de qlívío por jó se enconïrqr dísïqnïe. o jovem reí nõo íq ïer q ïrísïe sorïe do seu pqí e írmõo, qbqïídos q ïíro numq cqrruqgern... Fomos parq cqsq e eu deíïeí forq q coroq de loïc que gosïovo de pôr nq cobeçc qucndo brÍncqvq òs príncescs. Esse ïempo jó pqssou. A rnõe, qïqrefqdq nq cozínhq, perguntou-me: - Que bolo queres que eu foço pqrq o jonÍcrp Temos de fesïejor c Repúblíco. - Um quolquer. Só nõo pode ser um bolo-rei/ Nõo ïe ofereço umq fqïíq porque morqs q dezenqs de quÍlómeïros de dísïôncÍq, mqs ïenho penq que nõo esïejos oquÍ comígo. Muíïqs squdqdes pqrq os ïeus pqís, pqrq q ïuq mqnq e porc ÍÍ. Tuq, Mqríq 74
  • 76. , I
  • 77. 5 de Abril Qu-e-r-iào- àiário, acqbo àe-te rec-eber e 'uoujá ettrear-fe' sou f.tlha ún'tca e, ?o=r'ttto.-, muitas ueze-s não tenho c,am quem f alar. Ho)e-{oço onos. Aào-ro(o2", anoS qe-tte àia,.orqu-e é{erjaào! Não há e-tcolq e-Potso conuiàar-7oro a mtnhafestaimensos omigos' Qu_anto=S mais amigo=t reunir, mqis preSenfeS recebo, O pio-r é- qve netta àAta foàa gente- Se lernbra àe cra:Uet e enchem:ryê Q Çarq de rarno; que vão murchar- Á Revolu ção àe Abril ec-emli-anha..me- àesàe- qu-e- nasci. Cqlc-,vlq que-ai lneuS pa,rS queriOm çharnar-me MOriç Àqg CratlQg'Efq vryt nomg original, rna,' o {uncionário ào regisfo cr:vi,l não a e-,tlou.tiqueltlor' las lazer q^ot neste Áia tamb(ry teu qJ feug inco-n-venìentes' Nq mqnhã Ào meu antVersário chQma-m--elogo; - tlor, anàa àeyressa ver a lelevisão! A, urr"Sl meio sàorme-ciàa,penSo qre eStá o àq7 glgulvt lQJrama Aq mev- ograLo, ryrqs não! Esf-ão a t-Tansmifir qs cem?rnQr-aÇ6es àa reuolução! 76 Abril!
  • 78.
  • 79. lurma e a laràe-/,aimu-ilo-aniola,àa.Ma1S-ó-afi r*àiÁ'tio,coat-oo-*àbor,4uemais ningvémvai saber. _ _g bo:lo,-p-ora-não-Variar,.1ii.nha -u,m -cr,Lu.o,,e-co.f-tei-eSSa tafja Para e e Vat, À r-te rtC Pr-e -nof-ur-almenf,e: -- 4livro< ll^o rv,al nLn - -V- á ri o s1 og o s -(nã oLn e-l e ^ht o- qu a nt o s)- - * -7- c ai x a s -à e -cho colaíe s --- -- EnV-e o,p es co ^-ài nhei r-o - .* --lat o-mai -{o i_a-res7o-ns6t-el 7-elo5-cra9-o-S-:-àa r-evolu7ão. ,N-esfa,nlfuro,-{ala--se ciais qu,e -erÏauam -p-ronfo-S a -àor -a-,vi Á a p el a -liberÀ a À er ^m a S ai ag ué m *fala Ào P-eS Soa que' comegoe-a-àïstrib,uiros-cr,av-o-5-ra,elo-s,solÀaÁos-ElaÍoi-à_minha'f esfa! 78 toi-lr.usc a r-u,m À ot ami g o s que -c o nui'àei' -
  • 80. Agora )ó nõ-q é noàa nou_s..|qs -é tõq siynp_á,tiça! Eoc a àora! Qu-anào entrou)-ó-ery c_qrq_e utu t_qqto_s _Ç_tev-o_stuier_am-lhe as lágriue t aat o-lho-s.D_isse:u,e ent_ão_q11eï_tnhq sìàe 4r1n a ideiaàe Áar{lores aos solàsdo-s. Jó uais sober tadol foi trabal-h-or pqr-a o r-esrqur-qnte o,oàe- esta:uq e,rypr-egad4 lve sçe àia d áe à a eI ne ta c o m e m o_r_q:uo o- _ q niy,e_t s ó r-t o _e, c o_ tn e_ r g c pt4 q çã o, áar vm çravo a caÁa clLe_nt_e,lqt catn_o exérc tfp-na- ruq, e pqtrão_ re,59lveu manàar ot elnp-r-egaÁos- pora c_qss, dist-rjbuioào_?er çles qs {lo-rgt, A Celeste leu-ou vmb-raç a alìnha. 79
  • 81. I 08 so.,l"o aou tosst lazo! ilod ol'nlo^at otnn ta^'ol ost1atd ? ogN -ot'ílau'iaf ohoo ura t^oSloà aob-soossaà so.to7-oil o otod no11 lorcluia utotoSà5 yl.soitwa snaw'so anb ato6o )azoi oor' anb o bl!?l? o7't;;tanb $;a1o5 'o?unut o o?o+uta atlal?" ou?stahtvo nat^'t o? ol? o nowolanb o?utl ogl olsa6 alanbo all-tra?ot6o a a4sala7 '4 ? oflaq lilrt ra! 'so^i,or) so? ogsnpnaAi;a navrc+as lltqk/ a? gçop og5n1onau o anb u'sso t"o17 -oijjou o? |oila?apuâA so? saroli so a+uo+sut wnu as-vio7o+o6s7-.ott62p toSr4snl (aToZtrtuo'zoà a7 asso! o7o'tadsa o91 ogSngt;a:t a anb ouanb alua6 o o?oL.ottlos alua6 o o?oL'otolont o1aà sohu" So o7u2nltt+Sl? 9! a ot'uo) o zalsa? a+saP) è.^tozsatogtsoloq watotoàSl? aP zdtl uú-a r56atto So anb tila o+Sa ola o95n1o^a a:nQ 'optolwdsa o? ouo" ou o-na+a'o *aho(-Q'ohot" utn ro1u4 anb o all-na?uã$a '09+v1-'so?olja! Àì6'^oJsa sofol sa sotn tl2woc orol6:51o) taabpnb a'11-lotdwoc nosuad'o/orun! oau ol3 lap? wn n,7aà - èollutttoíp'nn ato-?A - .oylSnpnat ov ut6; ,odtc'4toà'anb soTo'nto ta?o?los sa tila) èo?o1'1) o otoà ttqns Õo ola notodaT as anb ,noc a(ot55o6 Ou-o;l+aai o7 írlo5
  • 83. Democracia na floresta Aquele lobo chamava-se Reinaldo, mas, como o nome era comprido, tratavam-no sempre por rei. Era forte, feroz, façanhudo, e sentia-se o rei da floresta. - Aqui mando eu e todos vós obedeceis às minhas ordens! Os outros bichos: erf geral, baixavam as orelhas - os que tinham orelhas! - e calavam-se, porque os dentes dele eram bem afiados. Só o mocho Moisés o contrariava sempre: -Tir estás atrasado, Reinaldo. Não sabes que Portugal e uma República? Aqui não se aceitam reis. No mar jâ há a República dos peixes. - Então sou Presidente da República da Floresta! Está dito. Quem manda aqui sou eu. E quem refilar vai logo para o meu papo. Os coelhinhos fugiram para as tocas) as perdizes esconderam-se no mato. Só a raposa Ramira lhe fez frenter,troçando: Parece-me que a função de um Presidente da República não é propriamente comer os cidadãos... - Pois não - disse o mocho. - Deves representar o teu país. E por isso lalvez seja boa ideia ires à terra dos homens e exigires, em nome dos habitantes da floresta, que não cacem mais por estes lados. O lobo ficou todo vaidoso. com a missão. Escovou o pelo, lavou a dentuça ruça e lá partiu em direção ao Palácio de Belém, onde vivia o Presidente dos Portugueses. Os guardas confundiram-no com um cão- -polícia e deixaram-no passar. O lobo passou o Pátio dos Bichos, subiu a escadaria e, pelo faro, foi ter diretamente ao gabinete presidencial. O Presidenté estava sentado à secretária e ficou espantado quando viu um lobo à sua frente e, mais ainda, quando o ouviu falar: Como Presidente dos Animais da Floresta, venho exigir que a caça seja proibidà. 82
  • 84.
  • 85. O Presidente dos Portugueses arregalou mais uma vez os olhos e coçou os ouvidos, mas em breve se recompôs: - Não sou eu quem faz as leis. Quem as faz ê a Assembleia da República, com os seus 230 deputados eleitos pelo povo. Mas admira-me que um lobo tenha essa pretensão. Se sair a lei que desejas, ficas também proibido de caçar em território nacional. Ao ouvir estas palavras, o lobo achou melhor sair rapidamente daquele palácio cor-de-rosa. Os homens não eram de fiar... Ainda o metiam numa jaula... De novo na floresta, contou que tinha sido muito bem recebido, mas mais nada acrescentou. Ser Presidente da República, afinal, para pouco servia. Não podia decidir sozinho uma coisa tão simples. - Mas então, quem é que governa o país? - perguntou ele ao mocho Moisés. - Portugal tem vários órgãos de soberania: o Presidente, o Governo, a Assembleia da Republica e osTribunais. Para te explicar tudo em pormenor, demoraria muito tempo. Mas quem governa propriamente é o Governo, é bom de ver. O chefe do Governo é um primeiro-ministro, que arranja ministros que o ajudam. - Compreendo - disse o lobo Reinaldo. - Então, vou ser primeiro- -ministro e vou nomear os outros membros do Governo. Eles que trabalhem enquanto eu descanso! Ministro da Educação - coruja Cuca Ministro do Ambiente - javali Jaime Ministro da Economia - formiga Fulgência Ministro da Caça - furão Francisco 84 I
  • 86. O mocho Moisés não ficou ofendido por não ser ministro da Educação, sendo um sabichão das dúzias. Para ele, aquele Governo era ilegal. Faltaram as eleições, e numa democracia nada se resolve sem os votos populares. Faria parte da oposição. Do seu poleiro, num castanheiro altaneiro, ia piando toda a noite: - Fora a tirania! Fora a ditadura! De facto, aquele lobo era mesmo um ditador. Achava-se o maior e queria impor sempre a sua vontade. Os outros animais que calassem o bico! h/ r 85
  • 87. Reinaldo afiou os dentes. Se apanhasse o refilão chamava-lhe um figo, mas, como o seu opositor voava) sentenciou: - O mocho Moisés fala contra o Governo, por isso é condenado à morte. o falcão Fernão que o apanhe e o ffaga à minha presença. Vai servir-me de jantar. O mocho abanou as asas: - Só um tribunal me pode julgar. Que pensas tu? Que és dono e senhor da floresta só porque tens os dentes mais fortes e pontiagudos? - Estamos todos fartos de ti! - exclamou a raposa Rita. - Quem deve mandar é a bicharada! - exclamou o esquilo Ésquilo. - Queremos a democracia! - exclamaram todos os outros animais em conjunto. Reuniram-se na grande clareira à beira do rio, os bichos da terra, do ar e da água, e, sob orientação do mocho, resolveram fazer eleições. Organizaram-se em vários partidos : - o dos Mamíferos, encabeçado pelo coelho Cosme; - o das Aves, encabeçado pela ágaiaAlice; - o dos Répteis, encabeçado pelo lagarto Luís; - o dos fnsetos, encabeçado pela vespa Vera; - o dos Peixes de Água Doce, encabeçado pela trutaTeresa. Cada qual defendia as suas ideias para tornar a floresta mais bela, mais rica, mais feliz e, acima de tudo, mais justa. Os boletins de voto foram folhas de .árvore, onde cad,a um rabiscou secretamente a sua vontade. O pintassilgo até compôs esta canção, inspirada numa que tinha ouvido na cidade: O floresta verde, zterde, terra da fraternidade, os bichos são quem ordena, mostrando sua vontade. E o lobo? Esse foi viver para ouffo lado... 86
  • 88.
  • 89. Abandeiraeohino A Rita e o António eram como o cão e o gato. Não podia haver dois primos mais diferentes e mais embirrantes. Nada os unia. - Rita, até o teu nome irrita - dizia o tapaz. - António, e o teu nome rima com demónio - respondia ela. O António vivia em tás-os-Montes e, nos tempos livres, gostava de fazet alpinismo. A Rita vivia nos Açores e, nos tempos livres, praticava natação. O António era alto e lourol a Rita era baixinha e morena. O António gostava de se levantar cedo como as galinhas e a Rita, se a deixassem, tinha os horários de um mocho. O rapaz escolhia sempre os programas desportivos da televisão e a rapariga, mal entrava na sala, agaffava no comando para mudar de canal. Só gostava de filmes divertidos. Por issb, quando iam para casa dos avós, em Lisboa, nas férias, era um problema. Andavam à zaragata todo o santo dia e de noite faziampartidas um ao outro: escondiam os pijamas, metiam-se debaixo da cama a chiar como ratos, fingiam ser fantasmas. A avó Marta quase enlouquecia com a barafunda. euando a pobre senhora perguntava: - Meus queridos, o que vos apetece para o jantar? A mocinha adiantava-se logo: - LJma piza! Gelado de morango! O garoto preferia bifes com batatas fritas e não dispensava o bolo de bolacha. Quando os netos eram pequenos, o avô Rui conseguia entretê-los no parque infantil. Mas, e agora? O António teimava para alugar uma bicicleta. O seu sonho era pedalar à beira rio. Mas a Rita só ficava satisfeita quando a levavam à praia. - Estes miúdos põem-nos os cabelos brancos! - queixavam-se os pobres senhores, sem saberem como resolver a situação. 88 I
  • 90. ? q , 4r-1 /:---- = Certo dia, estavam eles a implicar um com o outro, o avô entrou na sala, entusiasmado. - Hoje é a final do Euro 20L6. Portugal joga contra a França. Podemos assistir na Praça do Comércio, onde colocaram uma tela gigante. Vai ser sensacional! - Eu alinho! - disse logo a avó, que, aos 60 anos, ainda participava em corridas. Meteram-Se no metropolitano e desceram mesmo na praç a, já coalhada de gente. LJns ffaziam camisolas da seleção, outros tinham pintado a cara de verde e vermelho. Não faltavam cachecóis e bonés coloridos. Os vendedores apregoavam: - Comprem! Camisolas! Bandeiras baratas! - Para o menino e para a menina! Para o velho e para o novo! Para o careca e para o cabeludo! 89
  • 91. Eram principalmente jovens em grupos e homens feitos que ali se concentravam, esperando pelo início do espetáculo. - Vou comprar uma bandeira - disse a avó. E alargou os cordões à bolsa, escolhendo a maior de todas. A Rita e o António encolheram os ombros. Estavam mais interessados em fazer caretas um ao outro. Pouco depois, as equipas entraram em campo, o jogo começou e, de repente, aquela multidão desordenada ficou imóvel, presa pelos olhos à tela gigante. Até a Rita e o António pararam as diabruras. - Ronaldo! Marca, Ronaldo! - incentivava o avô. Mas uma onda de desilusão varreu a praça. o Bola de ouro saía lesionado... No intervalo todos discutiam: uns vibravam de emoção, outro s faziam apostas, outros maldiziam o árbitro. A segunda parte foi ainda mais emocionante. No estádio, em França, e ali, naquela ptaça' a muitos quilómetros de distância, as bandeiras agitavam-se, nervosas. Os golos não surgiam... Entrou-se no prolongamento. Os jogadores estavam cansados. Mas de repente: - Éder! Grande Éder! - exclamou o António, enquanro a Rita batia palmas. - Finalmente! - Golo! Portugal! portugal! - gritavam todos. E as bandeiras ganharam vida, agitaram-se num vendaval de esperança e de felicidade. - Vitória! Vitória! Foi então um delírio! O António arrancou a bandeira das mãos da avó e elevou-a no ar, gritando: - Portugal! Viva portugal! A Rita ajudou-o a erguê-la bem alto. - Portugal é o maior!Viva portugal! Tamuem no estádio de Paris a bandeira portuguesa era hasteada e os emigrantes, em peso, cantavam o hino: 90 I
  • 92. Heróis do mar, nobre povo, N ação zt alente, imortal, Leztantai hoje de novo O esplendor de Portugal. Entre as brumas da memória, O Patria sente-se a voz Dos teus egrégios aztós, Que há, de guiar-te à ztitoria! À, or*or, às armas! Sobre a terrq' sobre o mar, À, or*or, às armas! Pela Pátria lutar Contra os canhões marchar, marchar! 9L
  • 93. Eram todos uma vo4 eram todos uma nação. Eram todos portugal. Os desconhecidos abraçavam-se e então. . . a Rita e oAntónio abraçaram-se também. Enrolaram-se no estandarte. Riram e choraram nos braços um do outro. A caminho de casa, o avô teve de satisfazer a curiosidade dos netos que iam trauteando o hino. - No tempo de D. Afonso Henriques já se cantava isto quando se ganhava uma batalha? - perguntou o António. A Rita não perdeu a oportunidade de o picar: - Qne cabeça de alho chocho! Não reparasre que o hino fala de canhões? No reinado do nosso primeiro rei lutava-se à espadeirada. Então o avô contou que o hino começou por ser uma marcha militar, muito utllizada pelos republicanos, que se opunham à monarquia. F'oi composto em 1890 por Alfredo l(eil, sendo a letra de Henrique Lopes de Mendonça. Com ligeiras adaptações, tornou-se hino nacional pouco depois de ser implantada a República. Mas a curiosidade dos dois primos não acabava ali. - Porque é que bandeira é verde e vermelha? - Por que razã,o tem um escudo? E tantos castelos? - E se essas explicações ficassem para depois do jantar? - propôs a avó. os netos acederam, mas, logo que chegaram a casa, foram pôr a bandeira na varanda. outras, grandes, pequenas, de pano ou de papel, ondeavam ao vento naquela rua, por tantas ruas, por esse mundo... ì - ( %, I % 2 e 92 É
  • 95. JI i Portugal sec. XXI u Onde está, Portugal, o teu império? Não sabes, a sério? 4 Qo <ì Em Afric a) naAmérica, na Ásia, na Oceânia õ a tua força cresce a cada dia: é a lusofonia. Não sabes o seguint e, tavez: 250 milhões de cabeças pensam, 250 milhões de bocas falam e cantam as suas canções em português a Hoje és também o rosto da União Europeia, essa grande teia que une países da velha Europa. É tua a bandei ra azul com l2 estrelas. E entoas a Ode à Alegria como teu hino, na manhã fria. N Descobriste, Portugal, caminhos de terra e de sal De paz e fraternidade. Descobriste, Portugal, a liberdade. o E s 94
  • 96.
  • 97. t: / Indice { ) 6 t2 18 22 50 56 60 66 68 76 82 88 94 LJma terra de muita gente A suposta espada de D. Afonso Henriques Com el-rei D. Dinis, aquele que fez tudo o que quis A padeira de Aljubarrota O achamento do Brasil O Desejado A Restauração da IndePendência O terramoto As dinastias O dia 5 de outubro de 1910 O 25 deAbril Democracia na floresta Abandeiraeohino Portugal séc. XXI 96 lq' -
  • 98. Coleção hrísa Ducla Soares Uns Óculos para a Rita I-Jma História de Dedos Abecedário Maluco UmaVaca de Estimação Comprar, Comprar, Comprar! O Soldado João Três Histórias do Futuro Seis Contos de Eça de Queirós O Livro das Datas Seis Histórias às Avessas O Casamento da Gata A Carochinha e o João Ratão Contos para Rir A Princesa da Chuva . O CapuchinhoVermelho no Século XXI Os Animais do Natal A Fada dos Dentes A Cidade dos Cães e Outras Histórias Se os Bichos seVestissem como Gente O Coelhinho Afonso e Outras Histórias Quero Crescer! Um Gato Tem 7 Vidas João Pestana Os Direitos das Crianças Histórias com História Histórias coÍn História Autoro Luísa Ducla Soares lluslroçõo Sérgio Marques 1.'edição: setembro de 2018 @ Porto Editora Rua da Restauração,365 4099-023 Porto - Portugal Rua da Restauração,365 4099-023 Porto Portugal w,portoeditora.pt Unldade lndustrial da Mala, DEP.LEGAL 442497 A8 lsBN 97 A -97 2 -O -7 2An -'1
  • 99. I iiliiufi[llffiuuur rrÍrï ru Porto Editora ê 160 ' 84946r rr., gr riz: r i ilililfiililfliffiiiiiiiiil r Ë 9':89720 0726777 ' .J SOíìRËS LI,J I SA 'ÚUCLÂ S H,srnplÊs cori HtsroRtA ' PRt00 EDnlq 14 90f tdeienie: 10r..1 $esrontl t ffi Coleçoo Luíso Duclo Soores Histórias com História A Historia de Portugal com os seus eventos reais, lendas e mitos serve de fundo a este livro. Dele constam 14 textos muito diferentes - sérios, trágicos, curiosos, divertidos -, de diversas tipologias -narrativo, dramático, em forma de poema, carta, fábula, página de diário - e para todos os gostos. viajando através dos séculos, os jovens de hoje vão conviver com jovens de outros tempos e dos tempos modernos também, porque, afinal, a História não acabou e nós estamos a vivê-la, dia a dia. ì ) I ì l t