1. A FILHA DO TEATRO
“(...) A arte nem é somente uma tentativa mágica de capturar o
real, nem uma forma de conhecimento, nem é apenas resultado
dos traumas, neuroses e frustrações do artista. Ela é tudo isso e
mais alguma coisa.”
(Ariano Suassuna. Iniciação à Estética.)
O texto do pernambucano Luís Augusto Reis é novamente encenado no
Recife, agora com direção de Antônio Rodrigues. A peça tem temporada até 27
de abril no Teatro Arraial na Rua da Aurora. A trama gira em torno de um crime
e da vida de três mulheres com práticas profissionais ligadas ao teatro. O texto
é denso, trazendo elementos que discutem a própria narrativa teatral, inclusive,
os limites da arte de representar. O ato de interpretar é discutido no palco, à
medida que as atrizes vão se revezando na interpretação dos personagens, os
construindo cada uma com trejeitos e tons diferentes.
O cenário e a iluminação são perfeitos, indicando que a criatividade é
mesmo uma ótima alternativa a escassez de recursos tão comum no meio
teatral local. Há cenas deslumbrantes, de beleza plástica sutil e delicada.O
espaço intimista do Teatro Arraial potencializa a dramaticidade do texto e
integra a plateia ao espetáculo, desde o início recebido pelas atrizes já no
palco, de frente para espelhos. Espelhos, aliás, o tempo inteiro em movimento,
quase metáforas da condição do artista, transitando entre mundo real e
imaginado, no jogo do aproximar-se e distanciar-se de si, no malabarismo das
linhas tênues entre o outro em cena e ele mesmo.
Talvez, o sotaque, a dicção e pausas excessivas, em alguns momentos
da fala das atrizes, fragilizem um pouco as intenções do texto, mas nada que
comprometa a peça na sua totalidade. Percebemos que o acordo tácito de
silêncio, risos e pausas entre atrizes e público só aos poucos é reforçado. Não
há obviedades e só pacientemente o espectador vai ligando os fios da trama e
entendendo o jogo de memória que é encenado.
20.04.2013
Natália Barros e Francisco Cavalcanti