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Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS
2VAFAZPUB
2ª Vara da Fazenda Pública do DF
0704472-79.2020.8.07.0018Número do processo:
AÇÃO POPULAR (66)Classe judicial:
AUTOR: MARIVALDO DE CASTRO PEREIRA, HELIO MARCOS PRATES DOYLE, LEANDRO
FREITAS COUTO, RUBENS BIAS PINTO
RÉU: IBANEIS ROCHA BARROS JUNIOR, DISTRITO FEDERAL
DECISÃO
Trata-se de ação popular, com pedido liminar, proposta por MARIVALDO DE CASTRO
PEREIRA, HÉLIO MARCOS PRATES DOYLE, LEANDRO FREITAS COUTO e RUBENS BIAS
PINTO contra o GOVERNADO DO DISTRITO FEDERAL e o DISTRITO FEDERAL, com o objetivo
de suspender os efeitos do Decreto Distrital n.º 40.939/2020, que dispõe sobre medidas para
enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do CORONAVÍRUS (responsável pela
transmissão da COVID-19), sob o argumento de que atenta contra a saúde pública, porque restringe as
medidas de isolamento e distanciamento social, sem qualquer embasamento técnico ou científico. Afirma
que a ação popular é meio adequado para o controle do referido ato editado pelo gestor público, em razão
da necessidade de tutelar a moralidade administrativa, bem como pelo fato da declaração de calamidade
pública, exteriorizada por outro decreto dias antes, ser incompatível com a flexibilização das atividades
econômicas, o que caracterizaria vício na motivação e desvio de finalidade.
Diante destes fatos e fundamentos, pedem a concessão de liminar para suspensão da vigência do Decreto
n.º 40.939/2020, até a apresentação de estudos técnicos em relação à flexibilização das medidas de
isolamento e distanciamento social.
É o relato necessário. Decido.
Inicialmente, antes da análise da questão principal, fundamental estabelecer os limites e a finalidade da
ação popular.
A ação popular tem natureza constitucional e, por intermédio desta demanda, qualquer cidadão, em nome
próprio, na busca da defesa de interesse difuso da coletividade, de forma preventiva ou repressiva, poderá
evitar lesão ou pretender a invalidação de ato (comissivo ou omissivo) ou contrato administrativo lesivo
ao patrimônio público, à moralidade administrativa (que passa a ser objeto autônomo da ação popular), ao
patrimônio histórico/cultural e ao meio ambiente (artigo 5º, LXXIII, da Constituição Federal).
A CF ampliou o objeto da ação popular, para proteger, além do patrimônio público, a moralidade
administrativa (jurídica, não comum), o meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural. A tutela da
saúde pública, em especial quando colocada em risco por pandemias, se associa à moralidade
administrativa, meio ambiente e, indiretamente, ao patrimônio público (em razão das despesas
extraordinárias com as medidas de controle sanitário).
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A ação popular preventiva visa impedir a edição de atos administrativos ou a formalização de contratos
administrativos baseados em normas gerais ou atos concretos com poder de lesar o patrimônio público, a
moralidade administrativa e o meio ambiente. Se houver ameaça de lesão ao patrimônio público,
histórico/cultural, meio ambiente e à moralidade administrativa, cabível ação popular, que visará ordem
impeditiva, justamente o que pretendem os autores na inicial. Portanto, em razão da possibilidade de
assumir caráter preventivo, o prejuízo efetivo ou lesão ao patrimônio público, a violação à moralidade
pública ou ao meio ambiente, pode ser potencial. Portanto, não é condição da ação popular a menção ou a
prova de prejuízos materiais aos cofres públicos.
No caso, os autores, em caráter liminar, pretendem a suspensão dos efeitos jurídicos concretos do Decreto
Distrital n.º 40939/2020. É essencial estabelecer os limites das ações populares, porque não podem ser
utilizadas como sucedâneo de ações diretas de inconstitucionalidade. Não cabe ação popular contra leis ou
atos normativos em tese. O Decreto em referência foi editado com fundamento no artigo 100, inciso VII,
da lei Orgânica do Distrito Federal. Na condição de decreto regulamentar, não poderia ser objeto de
controle de constitucionalidade. Em relação aos decretos regulamentares, a crise é de legalidade e não de
constitucionalidade. Por isso, podem ser controlados por ação popular.
No caso, para compreender os limites desta demanda, essencial tangenciar dois poderes da administração
pública, poder regulamentar e o poder de polícia. No âmbito da administração pública, o poder normativo
é viabilizado por Decreto, ato privativo do Chefe do Executivo. Tal poder normativo confere à autoridade
pública a prerrogativa de editar normas gerais e abstratas, nos limites da legislação. Os decretos, em
essência, regulamentam lei em sentido formal, ou seja, se destinam à sua fiel execução. O decreto n.º
40.939 de 02 de julho de 2.019 foi editado com base no artigo 100, VII, da Lei Orgânica do Distrito
Federal, segundo o qual compete privativamente ao Governador do Distrito Federal expedir decretos e
regulamentos para a fiel execução de lei.
Portanto, a lei orgânica do DF somente admite decretos executivos/regulamentares, não autônomos.
Trata-se de decreto que materializa ato de polícia, com o objetivo de condicionar a propriedade dos
indivíduos, em relação à liberdade econômica, mediante ações fiscalizadoras, preventivas e repressivas.
Na busca do interesse público, é possível editar atos normativos, como o decreto em questão, para
restringir o exercício de liberdades individuais e de restringir o uso, gozo e disposição da propriedade
privada, no aspecto econômico. Portanto, tal decreto regulamentar retrata típico poder de polícia, que
pode ser objeto de controle por ação popular.
O pedido liminar dos autores tem caráter preventivo (que também se confunde com um dos pedidos
finais), qual seja, “impedir os efeitos concretos do Decreto”. A violação de princípios constitucionais
como como a moralidade administrativa e a tutela da saúde pública, são questões prejudiciais. Portanto, o
objetivo da ação popular é impedir a flexibilização das medidas de isolamento e distanciamento social.
Em resumo, cabe ação popular para questionar decreto regulamentar que materializa poder de polícia do
Estado, cuja crise é de legalidade, não de constitucionalidade.
Por isso, deve ser admitida a ação popular.
No caso, há elementos capazes de evidenciar a probabilidade do direito alegado pelos autores, para fins de
concessão da liminar.
O réu, em 26 de junho de 2.020, no uso de suas prerrogativas legais, declarou estado de calamidade
pública no âmbito do Distrito Federal (Decreto n.º 40.924/2020), em decorrência da pandemia causada
pelo CORONAVÍRUS, cujo objeto é fiscal, em razão do desequilíbrio das contas públicas. Em razão do
estado de calamidade pública, é possível flexibilizar metas da lei de responsabilidade fiscal, redirecionar
investimentos, dispensa o Executivo de metas fiscais previstas no orçamento, bem como da limitação de
empenho prevista na LRF, permite a abertura de créditos suplementares, dispensa de licitações, entre
outros benefícios que não interessam diretamente à presente demanda. O fato é que o decreto de
calamidade pública, ainda que tenha função preponderantemente fiscal, retrata crise econômica que se
relaciona diretamente com a crise sanitária.
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E é justamente para minimizar os efeitos da crise sanitária no âmbito econômico que foi declarado o
estado de calamidade pública. Todavia, no dia 02 de julho de 2.020, ou seja, poucos dias após a
declaração de calamidade pública, foi editado o Decreto n.º 40.939/2020, que dispõe sobre as medidas de
enfrentamento da emergência de saúde pública. Portanto, no preâmbulo do próprio Decreto, se reconhece
a emergência na saúde pública e a grave crise sanitária.
No Decreto n.º 40.939/2020, objeto desta ação popular, houve considerável flexibilização do isolamento e
distanciamento social, ao liberar, no artigo 3º, toda e qualquer atividade comercial e industrial no Distrito
Federal, com exceção das mencionadas no artigo 2º, de alcance absolutamente limitado. É fato que a
flexibilização do distanciamento e isolamento social está acompanhada de protocolos e medidas de
segurança gerais e específicos, conforme anexo deste ato normativo. Ocorre que medidas de segurança e
protocolos de saúde no auge da contaminação e com os leitos no limite máximo da capacidade de
ocupação, são necessários, mas não suficientes para evitar o colapso do sistema de saúde. O conteúdo do
decreto, em si considerado, não merece censura, mas o momento da flexibilização e a ausência de estudo
técnico sobre a pertinência da reabertura neste período crítico, é que merecem reprovação.
Não se desconhece a grave crise econômica que tem como causa a crise sanitária. É fato que
comerciantes, autônomos e empresários estão no limite da suspensão de suas atividades econômicas, o
que demandará políticas públicas em nível federal e distrital no setor econômico para recuperação destas
atividades.
A questão central é justamente a ausência de respaldo técnico e científico capaz de justificar a
flexibilização acentuada do isolamento e distanciamento social neste momento. Em todos os países do
mundo que foram bem sucedidos no controle desta grave pandemia, as únicas medidas eficientes capazes
de conter a proliferação do vírus foram o isolamento e o distanciamento social. Em razão da rigidez destas
medidas em países europeus, bem como na Ásia, foi possível o controle eficaz da proliferação da doença,
o que permitiu a retomada econômica, em etapas, com planejamento e segurança sanitária.
No Brasil, em razão de divergências entre as diversas esferas de governo e da ausência de coordenação
conjunta entre União, Estados e Municípios para o combate da doença, as medidas para o controle da
COVID-19 não tiveram a mesma eficiência que países europeus e asiáticos. No caso do Distrito Federal,
no início da pandemia, tal unidade da federação era referência no combate à doença. O Distrito Federal
foi uma das primeiras unidades da Federação a suspender aulas e atividades econômicas, o que impediu a
disseminação do vírus e o colapso no sistema de saúde, em especial na rede pública.
Na medida em que o isolamento e o distanciamento social eram flexibilizados por sucessivos decretos, na
mesma proporção, os casos aumentaram exponencialmente e o Distrito Federal passou a flertar com uma
grave crise sanitária e o risco iminente de colapso no sistema público e privado de saúde. Se já há
evidências concretas e reais, baseados em números e estatísticas, de que a flexibilização do isolamento e
distanciamento social coloca em risco a saúde pública, pois os leitos de UTIs destinadas pela rede pública
e privada estão no limite máximo da capacidade, qualquer ação governamental, por mais bem
intencionada que seja em relação ao setor econômico (o que não se questiona), deve, necessariamente,
estar pautada em estudos técnicos, científicos, planejamento sanitário e escalas de retomada econômica.
As ações econômicas estão interligadas e necessariamente associadas às ações de saúde. Não há como
dissociá-las. O aumento do número de casos também poderá comprometer o patrimônio público, pois o
Distrito Federal terá de realizar gastos extraordinários para aumentar o número de leitos de UTIs, para
tentar absorver a demanda que certamente virá com as medidas de flexibilização.
O decreto de calamidade pública teve o objetivo de flexibilizar o orçamento, em especial para ações
destinadas ao combate da pandemia, cujos gastos aumentarão de forma considerável com a proliferação
da doença em velocidade incompatível com a capacidade de atendimento pelo sistema de saúde, público e
privado.
É fato notório que o objetivo do isolamento e do distanciamento social é evitar contaminação em massa,
de forma simultânea, o que sobrecarregaria e colapsaria a rede de saúde, pública e privada. O isolamento
e o distanciamento social permitem que o sistema de saúde, público e privado, tenha condições de
absorver toda a demanda. A rede pública de saúde está operando no limite de sua capacidade e, com a
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ampla liberação de atividades econômicas, conforme artigo 3º do Decreto, haverá aumento considerável
de casos, mesmo com os protocolos e medidas de segurança. Os protocolos e medidas de segurança são
essenciais para o controle da proliferação da doença, mas quando houver sinais de estabilização do
número de casos e o tal propalado “achatamento da curva”. A adoção de medidas de segurança e
protocolos no ápice da crise sanitária, com leitos de UTI no limite máximo ou próximo do colapso,
dissociados de estudos técnico e científicos, representará sério risco para a saúde pública e, também, para
o patrimônio público (em razão dos gastos extraordinários e imensuráveis que tal aumento de demanda
provocará).
A moralidade administrativa (em termos jurídicos) e a necessária proteção ao patrimônio público,
principais objetivos de tutela da ação popular, impede que o gestor público, no ápice da crise sanitária,
com o sistema de saúde pública e privada no limite ou próximo ao limite de sua capacidade de
atendimento, renuncie ao único meio conhecido pela ciência atualmente para evitar a disseminação e a
proliferação da doença, o isolamento e o distanciamento social. É óbvio que o gestor público deve
planejar a retomada econômica, mas deve fazê-lo de forma planejada, segura e alicerçado em estudos e
análise técnica e científica. Os protocolos e as medidas de segurança que constam no Decreto serão
extremamente eficientes quando a doença estiver controlada e o sistema de saúde, público e privado, com
plena capacidade de atendimento.
A retomada econômica no ápice da crise sanitária, com o sistema de saúde no limite máximo de sua
capacidade de atendimento, mesmo que acompanhada dos melhores protocolos e medidas de segurança,
levará ao caos na saúde pública e, como consequência, ao aprofundamento da crise econômica. Em
relação aos protocolos de segurança, duas questões devem ser levadas em consideração na estatística da
retomada: Em primeiro lugar, o Poder Público não tem condições técnica de fiscalizar o cumprimento
destes protocolos em todos os estabelecimentos comerciais e industriais. Ademais, o custo destes
protocolos para os comerciantes, em especial os de menor porte, certamente levará ao descumprimento
destas regras sanitárias.
Os atos de polícia possuem discricionariedade, mas quando não há razoabilidade se torna questão de
ilegalidade. Não há dúvida de que o controle judicial das atividades administrativas é limitado. O controle
judicial é restrito à legalidade dos atos da administração pública, pois a intervenção judicial em situações
de discricionariedade administrativa, oportunidade e conveniência, em especial as relativas aos atos de
polícia, violaria o princípio da separação dos poderes (denominado “controle do mérito dos atos
praticados no exercício da função administrativa”). Todavia, isso não significa que os atos discricionários
não são passíveis de controle judicial, em especial na verificação se a conduta do gestor é compatível com
os limites da discricionaridade, cuja análise tem como referência justamente os princípios da
razoabilidade e proporcionalidade. No caso, a decisão administrativa não pode ser dissociada de estudos
sanitários. Não há essa opção.
Portanto, apurar se o gestor respeitou os limites da discricionaridade administrativa, que não é, nunca foi
e jamais será absoluta, consiste em analisar a própria legalidade e não o mérito da decisão. A ausência de
razoabilidade e proporcionalidade, a pretexto de discricionariedade, viola a legalidade. Há limites bem
definidos para atuação discricionária e, a depender do contexto social, econômico e, no caso, sanitário, os
princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade, que devem ser apurados no caso
concreto, servirão como referência para apurar se a conduta do gestor é compatível com os limites da
discricionaridade.
No caso concreto, os elementos indicam que os limites da discricionariedade administrativa não foram
observados, uma vez que o gestor, sem qualquer estudo ou análise técnica/científica, flexibiliza o
isolamento e o distanciamento social, com a retomada da quase totalidade da atividade econômica, no
momento mais crítico da crise sanitária, com a rede de saúde, pública e privada, no limite da capacidade
e, ainda, menos de 1 semana depois de declarar e reconhecer o estado de calamidade pública.
O setor econômico dependerá de políticas públicas eficientes em nível federal e local. O possível colapso
na rede de saúde, pública e privada, apenas acentuará a crise econômica, em especial se houver a
necessidade de retroceder na flexibilização, cuja experiência negativa já foi verificada em outras unidades
da federação.
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Portanto, no caso, a moralidade administrativa está conectada à preservação da saúde pública e à
necessária proteção do patrimônio público (potencial gasto com o aumento da demanda). Embora o gestor
tenha discricionaridade, a ausência de razoabilidade na flexibilização do distanciamento e isolamento
social coloca em risco a saúde pública e o orçamento público, cujos recursos serão insuficientes em caso
de colapso do sistema. No caso, não há razoabilidade porque a medida é adotada após o reconhecimento
de calamidade pública, no ápice da pandemia no DF, no momento em que o sistema de saúde, público e
privado, está no limite da capacidade e, principalmente, porque a retomada não foi baseada,
fundamentada e justificada em estudos técnicos/científicos e estatísticas reais em relação à evolução da
doença.
A ausência de proporcionalidade/razoabilidade no ato discricionário leva à ilegalidade, um dos
pressupostos da ação popular. A moralidade administrativa e jurídica, retratada no modo de proceder do
gestor, nas consequências de suas decisões (art. 20 da LINDB) e, na necessidade destas terem como base
estudos técnicos e científicos, principalmente quando estas se relacionam com a saúde da população, deve
ser preservada por meio da ação popular.
De acordo com o artigo 20 da LINDB, no âmbito administrativo, a decisão não pode estar baseada em
valores jurídicos abstratos, como liberdade econômica e livre iniciativa, sem que sejam consideradas as
consequências práticas da decisão. Se o gestor público estiver respaldado em laudos técnicos, pareceres
de especialistas e profissionais em saúde pública, estudos científicos, como ocorreu em outras unidades da
federação, poderá planejar a retomada econômica. A maior crise sanitária do último século impõe que as
decisões políticas e administrativas que repercutirão na área econômica estejam associadas à preservação
e prevenção da vida humana. As consequências práticas da ampla flexibilização do isolamento e
distanciamento social só podem ser mensuradas a partir de estudos científicos, a fim de que não haja o
colapso do sistema de saúde, público e privado, com contaminação simultânea e em massa.
Frise-se que o Governo do Distrito Federal está tendo dificuldades para informar, com a decida
transparência, o número total e a localização de leitos de UTI públicos e da rede privada, ocupados e
destinados para paciente com a COVID-19, tanto que o acesso a tal informação é objeto de discussão
judicial. Se o Governo do Distrito Federal não consegue, de forma adequada, prestar informações claras e
precisas sobre a ocupação de leitos e, ante as notícias de que estão no limite máximo da capacidade, a
retomada econômica, com ampla flexibilização do isolamento e distanciamento social, é incompatível
com tal contexto fático e social de calamidade pública. Nas últimas 24 horas, o Distrito Federal bateu
recorde de mortes e os óbitos já passam de 700 (setecentas) pessoas. Portanto, a questão central não é a
retomada econômica planejada, mas a retomada com base em estudos técnicos e científicos que, até este
momento, a sociedade brasiliense desconhece.
A proteção à saúde pública, a preservação do pleno funcionamento do sistema de saúde e a necessário
planejamento sanitário em conjunto com a retomada econômica, são premissas básicas em tempos de
pandemia e que, se observadas, estarão em consonância com a legalidade, a moralidade, a proteção do
patrimônio público e a eficiência. A discricionaridade, neste caso, é limitada. Não há espaço para
oportunidade e conveniência, quando a única medida eficiente e conhecida para controlar a disseminação
do vírus, é a adoção de política rígida de isolamento e distanciamento social.
Assim, não há dúvida da existência de elementos que indicam a probabilidade do direito alegado,
preservação da moralidade administrativa, do patrimônio público e tutela da saúde pública, capaz de
justificar a liminar.
A urgência é evidente, uma vez que a flexibilização do isolamento e distanciamento social poderá, sem
base científica e técnica, potencializar o números de casos, o que provocará colapso no sistema de saúde,
público e privado, que já se encontra no limite máximo de sua capacidade de ocupação, em relação aos
leitos destinados para pacientes com a COVID-19.
Isto posto, DEFIRO a liminar para determinar que o réu, no prazo de 24 horas, por meio de novo
DECRETO, SUSPENDA, temporariamente, os efeitos concretos do DECRETO DISTRITAL n.º
40.939/2020, até que apresente estudos técnicos e científicos de profissionais da área de saúde pública,
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médicos, sanitaristas ou cientistas, que respaldem as medidas de flexibilização do isolamento e
distanciamento social, neste momento de ápice da crise sanitária e de lotação máxima dos leitos de UTI,
na rede pública e privada, tudo nos termos da fundamentação, com o que voltará a vigorar o decreto
anterior, sob pena de multa diária de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) e suspensão judicial do
mesmo, de forma direta.
Fica o Governo do Distrito Federal intimado a dar ampla publicidade nos meios de comunicação em
relação à suspensão dos efeitos deste Decreto, que somente voltará a ter plena eficácia concreta quando
estiver respaldado por estudo ou parecer técnico, que poderá ser apresentado a este juízo a qualquer
momento, onde profissionais de saúde exteriorizam de forma clara e objetiva de que a flexibilização
proposta é compatível com a situação atual da pandemia no Distrito Federal.
Citem-se os réus para apresentarem contestação, no prazo legal de 20 dias, com as advertências legais.
Notifique-se o MP para intervir no feito.
BRASÍLIA, DF, 8 de julho de 2020 11:58:35.
DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI
Juiz de Direito
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Ação popular questiona decreto do DF sobre flexibilização do isolamento

  • 1. Num. 67202837 - Pág. 1 Poder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 2VAFAZPUB 2ª Vara da Fazenda Pública do DF 0704472-79.2020.8.07.0018Número do processo: AÇÃO POPULAR (66)Classe judicial: AUTOR: MARIVALDO DE CASTRO PEREIRA, HELIO MARCOS PRATES DOYLE, LEANDRO FREITAS COUTO, RUBENS BIAS PINTO RÉU: IBANEIS ROCHA BARROS JUNIOR, DISTRITO FEDERAL DECISÃO Trata-se de ação popular, com pedido liminar, proposta por MARIVALDO DE CASTRO PEREIRA, HÉLIO MARCOS PRATES DOYLE, LEANDRO FREITAS COUTO e RUBENS BIAS PINTO contra o GOVERNADO DO DISTRITO FEDERAL e o DISTRITO FEDERAL, com o objetivo de suspender os efeitos do Decreto Distrital n.º 40.939/2020, que dispõe sobre medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente do CORONAVÍRUS (responsável pela transmissão da COVID-19), sob o argumento de que atenta contra a saúde pública, porque restringe as medidas de isolamento e distanciamento social, sem qualquer embasamento técnico ou científico. Afirma que a ação popular é meio adequado para o controle do referido ato editado pelo gestor público, em razão da necessidade de tutelar a moralidade administrativa, bem como pelo fato da declaração de calamidade pública, exteriorizada por outro decreto dias antes, ser incompatível com a flexibilização das atividades econômicas, o que caracterizaria vício na motivação e desvio de finalidade. Diante destes fatos e fundamentos, pedem a concessão de liminar para suspensão da vigência do Decreto n.º 40.939/2020, até a apresentação de estudos técnicos em relação à flexibilização das medidas de isolamento e distanciamento social. É o relato necessário. Decido. Inicialmente, antes da análise da questão principal, fundamental estabelecer os limites e a finalidade da ação popular. A ação popular tem natureza constitucional e, por intermédio desta demanda, qualquer cidadão, em nome próprio, na busca da defesa de interesse difuso da coletividade, de forma preventiva ou repressiva, poderá evitar lesão ou pretender a invalidação de ato (comissivo ou omissivo) ou contrato administrativo lesivo ao patrimônio público, à moralidade administrativa (que passa a ser objeto autônomo da ação popular), ao patrimônio histórico/cultural e ao meio ambiente (artigo 5º, LXXIII, da Constituição Federal). A CF ampliou o objeto da ação popular, para proteger, além do patrimônio público, a moralidade administrativa (jurídica, não comum), o meio ambiente e o patrimônio histórico e cultural. A tutela da saúde pública, em especial quando colocada em risco por pandemias, se associa à moralidade administrativa, meio ambiente e, indiretamente, ao patrimônio público (em razão das despesas extraordinárias com as medidas de controle sanitário). Assinado eletronicamente por: DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI - 08/07/2020 12:01:30 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=20070812013078900000063801105 Número do documento: 20070812013078900000063801105
  • 2. Num. 67202837 - Pág. 2 A ação popular preventiva visa impedir a edição de atos administrativos ou a formalização de contratos administrativos baseados em normas gerais ou atos concretos com poder de lesar o patrimônio público, a moralidade administrativa e o meio ambiente. Se houver ameaça de lesão ao patrimônio público, histórico/cultural, meio ambiente e à moralidade administrativa, cabível ação popular, que visará ordem impeditiva, justamente o que pretendem os autores na inicial. Portanto, em razão da possibilidade de assumir caráter preventivo, o prejuízo efetivo ou lesão ao patrimônio público, a violação à moralidade pública ou ao meio ambiente, pode ser potencial. Portanto, não é condição da ação popular a menção ou a prova de prejuízos materiais aos cofres públicos. No caso, os autores, em caráter liminar, pretendem a suspensão dos efeitos jurídicos concretos do Decreto Distrital n.º 40939/2020. É essencial estabelecer os limites das ações populares, porque não podem ser utilizadas como sucedâneo de ações diretas de inconstitucionalidade. Não cabe ação popular contra leis ou atos normativos em tese. O Decreto em referência foi editado com fundamento no artigo 100, inciso VII, da lei Orgânica do Distrito Federal. Na condição de decreto regulamentar, não poderia ser objeto de controle de constitucionalidade. Em relação aos decretos regulamentares, a crise é de legalidade e não de constitucionalidade. Por isso, podem ser controlados por ação popular. No caso, para compreender os limites desta demanda, essencial tangenciar dois poderes da administração pública, poder regulamentar e o poder de polícia. No âmbito da administração pública, o poder normativo é viabilizado por Decreto, ato privativo do Chefe do Executivo. Tal poder normativo confere à autoridade pública a prerrogativa de editar normas gerais e abstratas, nos limites da legislação. Os decretos, em essência, regulamentam lei em sentido formal, ou seja, se destinam à sua fiel execução. O decreto n.º 40.939 de 02 de julho de 2.019 foi editado com base no artigo 100, VII, da Lei Orgânica do Distrito Federal, segundo o qual compete privativamente ao Governador do Distrito Federal expedir decretos e regulamentos para a fiel execução de lei. Portanto, a lei orgânica do DF somente admite decretos executivos/regulamentares, não autônomos. Trata-se de decreto que materializa ato de polícia, com o objetivo de condicionar a propriedade dos indivíduos, em relação à liberdade econômica, mediante ações fiscalizadoras, preventivas e repressivas. Na busca do interesse público, é possível editar atos normativos, como o decreto em questão, para restringir o exercício de liberdades individuais e de restringir o uso, gozo e disposição da propriedade privada, no aspecto econômico. Portanto, tal decreto regulamentar retrata típico poder de polícia, que pode ser objeto de controle por ação popular. O pedido liminar dos autores tem caráter preventivo (que também se confunde com um dos pedidos finais), qual seja, “impedir os efeitos concretos do Decreto”. A violação de princípios constitucionais como como a moralidade administrativa e a tutela da saúde pública, são questões prejudiciais. Portanto, o objetivo da ação popular é impedir a flexibilização das medidas de isolamento e distanciamento social. Em resumo, cabe ação popular para questionar decreto regulamentar que materializa poder de polícia do Estado, cuja crise é de legalidade, não de constitucionalidade. Por isso, deve ser admitida a ação popular. No caso, há elementos capazes de evidenciar a probabilidade do direito alegado pelos autores, para fins de concessão da liminar. O réu, em 26 de junho de 2.020, no uso de suas prerrogativas legais, declarou estado de calamidade pública no âmbito do Distrito Federal (Decreto n.º 40.924/2020), em decorrência da pandemia causada pelo CORONAVÍRUS, cujo objeto é fiscal, em razão do desequilíbrio das contas públicas. Em razão do estado de calamidade pública, é possível flexibilizar metas da lei de responsabilidade fiscal, redirecionar investimentos, dispensa o Executivo de metas fiscais previstas no orçamento, bem como da limitação de empenho prevista na LRF, permite a abertura de créditos suplementares, dispensa de licitações, entre outros benefícios que não interessam diretamente à presente demanda. O fato é que o decreto de calamidade pública, ainda que tenha função preponderantemente fiscal, retrata crise econômica que se relaciona diretamente com a crise sanitária. Assinado eletronicamente por: DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI - 08/07/2020 12:01:30 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=20070812013078900000063801105 Número do documento: 20070812013078900000063801105
  • 3. Num. 67202837 - Pág. 3 E é justamente para minimizar os efeitos da crise sanitária no âmbito econômico que foi declarado o estado de calamidade pública. Todavia, no dia 02 de julho de 2.020, ou seja, poucos dias após a declaração de calamidade pública, foi editado o Decreto n.º 40.939/2020, que dispõe sobre as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública. Portanto, no preâmbulo do próprio Decreto, se reconhece a emergência na saúde pública e a grave crise sanitária. No Decreto n.º 40.939/2020, objeto desta ação popular, houve considerável flexibilização do isolamento e distanciamento social, ao liberar, no artigo 3º, toda e qualquer atividade comercial e industrial no Distrito Federal, com exceção das mencionadas no artigo 2º, de alcance absolutamente limitado. É fato que a flexibilização do distanciamento e isolamento social está acompanhada de protocolos e medidas de segurança gerais e específicos, conforme anexo deste ato normativo. Ocorre que medidas de segurança e protocolos de saúde no auge da contaminação e com os leitos no limite máximo da capacidade de ocupação, são necessários, mas não suficientes para evitar o colapso do sistema de saúde. O conteúdo do decreto, em si considerado, não merece censura, mas o momento da flexibilização e a ausência de estudo técnico sobre a pertinência da reabertura neste período crítico, é que merecem reprovação. Não se desconhece a grave crise econômica que tem como causa a crise sanitária. É fato que comerciantes, autônomos e empresários estão no limite da suspensão de suas atividades econômicas, o que demandará políticas públicas em nível federal e distrital no setor econômico para recuperação destas atividades. A questão central é justamente a ausência de respaldo técnico e científico capaz de justificar a flexibilização acentuada do isolamento e distanciamento social neste momento. Em todos os países do mundo que foram bem sucedidos no controle desta grave pandemia, as únicas medidas eficientes capazes de conter a proliferação do vírus foram o isolamento e o distanciamento social. Em razão da rigidez destas medidas em países europeus, bem como na Ásia, foi possível o controle eficaz da proliferação da doença, o que permitiu a retomada econômica, em etapas, com planejamento e segurança sanitária. No Brasil, em razão de divergências entre as diversas esferas de governo e da ausência de coordenação conjunta entre União, Estados e Municípios para o combate da doença, as medidas para o controle da COVID-19 não tiveram a mesma eficiência que países europeus e asiáticos. No caso do Distrito Federal, no início da pandemia, tal unidade da federação era referência no combate à doença. O Distrito Federal foi uma das primeiras unidades da Federação a suspender aulas e atividades econômicas, o que impediu a disseminação do vírus e o colapso no sistema de saúde, em especial na rede pública. Na medida em que o isolamento e o distanciamento social eram flexibilizados por sucessivos decretos, na mesma proporção, os casos aumentaram exponencialmente e o Distrito Federal passou a flertar com uma grave crise sanitária e o risco iminente de colapso no sistema público e privado de saúde. Se já há evidências concretas e reais, baseados em números e estatísticas, de que a flexibilização do isolamento e distanciamento social coloca em risco a saúde pública, pois os leitos de UTIs destinadas pela rede pública e privada estão no limite máximo da capacidade, qualquer ação governamental, por mais bem intencionada que seja em relação ao setor econômico (o que não se questiona), deve, necessariamente, estar pautada em estudos técnicos, científicos, planejamento sanitário e escalas de retomada econômica. As ações econômicas estão interligadas e necessariamente associadas às ações de saúde. Não há como dissociá-las. O aumento do número de casos também poderá comprometer o patrimônio público, pois o Distrito Federal terá de realizar gastos extraordinários para aumentar o número de leitos de UTIs, para tentar absorver a demanda que certamente virá com as medidas de flexibilização. O decreto de calamidade pública teve o objetivo de flexibilizar o orçamento, em especial para ações destinadas ao combate da pandemia, cujos gastos aumentarão de forma considerável com a proliferação da doença em velocidade incompatível com a capacidade de atendimento pelo sistema de saúde, público e privado. É fato notório que o objetivo do isolamento e do distanciamento social é evitar contaminação em massa, de forma simultânea, o que sobrecarregaria e colapsaria a rede de saúde, pública e privada. O isolamento e o distanciamento social permitem que o sistema de saúde, público e privado, tenha condições de absorver toda a demanda. A rede pública de saúde está operando no limite de sua capacidade e, com a Assinado eletronicamente por: DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI - 08/07/2020 12:01:30 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=20070812013078900000063801105 Número do documento: 20070812013078900000063801105
  • 4. Num. 67202837 - Pág. 4 ampla liberação de atividades econômicas, conforme artigo 3º do Decreto, haverá aumento considerável de casos, mesmo com os protocolos e medidas de segurança. Os protocolos e medidas de segurança são essenciais para o controle da proliferação da doença, mas quando houver sinais de estabilização do número de casos e o tal propalado “achatamento da curva”. A adoção de medidas de segurança e protocolos no ápice da crise sanitária, com leitos de UTI no limite máximo ou próximo do colapso, dissociados de estudos técnico e científicos, representará sério risco para a saúde pública e, também, para o patrimônio público (em razão dos gastos extraordinários e imensuráveis que tal aumento de demanda provocará). A moralidade administrativa (em termos jurídicos) e a necessária proteção ao patrimônio público, principais objetivos de tutela da ação popular, impede que o gestor público, no ápice da crise sanitária, com o sistema de saúde pública e privada no limite ou próximo ao limite de sua capacidade de atendimento, renuncie ao único meio conhecido pela ciência atualmente para evitar a disseminação e a proliferação da doença, o isolamento e o distanciamento social. É óbvio que o gestor público deve planejar a retomada econômica, mas deve fazê-lo de forma planejada, segura e alicerçado em estudos e análise técnica e científica. Os protocolos e as medidas de segurança que constam no Decreto serão extremamente eficientes quando a doença estiver controlada e o sistema de saúde, público e privado, com plena capacidade de atendimento. A retomada econômica no ápice da crise sanitária, com o sistema de saúde no limite máximo de sua capacidade de atendimento, mesmo que acompanhada dos melhores protocolos e medidas de segurança, levará ao caos na saúde pública e, como consequência, ao aprofundamento da crise econômica. Em relação aos protocolos de segurança, duas questões devem ser levadas em consideração na estatística da retomada: Em primeiro lugar, o Poder Público não tem condições técnica de fiscalizar o cumprimento destes protocolos em todos os estabelecimentos comerciais e industriais. Ademais, o custo destes protocolos para os comerciantes, em especial os de menor porte, certamente levará ao descumprimento destas regras sanitárias. Os atos de polícia possuem discricionariedade, mas quando não há razoabilidade se torna questão de ilegalidade. Não há dúvida de que o controle judicial das atividades administrativas é limitado. O controle judicial é restrito à legalidade dos atos da administração pública, pois a intervenção judicial em situações de discricionariedade administrativa, oportunidade e conveniência, em especial as relativas aos atos de polícia, violaria o princípio da separação dos poderes (denominado “controle do mérito dos atos praticados no exercício da função administrativa”). Todavia, isso não significa que os atos discricionários não são passíveis de controle judicial, em especial na verificação se a conduta do gestor é compatível com os limites da discricionaridade, cuja análise tem como referência justamente os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. No caso, a decisão administrativa não pode ser dissociada de estudos sanitários. Não há essa opção. Portanto, apurar se o gestor respeitou os limites da discricionaridade administrativa, que não é, nunca foi e jamais será absoluta, consiste em analisar a própria legalidade e não o mérito da decisão. A ausência de razoabilidade e proporcionalidade, a pretexto de discricionariedade, viola a legalidade. Há limites bem definidos para atuação discricionária e, a depender do contexto social, econômico e, no caso, sanitário, os princípios constitucionais da razoabilidade e proporcionalidade, que devem ser apurados no caso concreto, servirão como referência para apurar se a conduta do gestor é compatível com os limites da discricionaridade. No caso concreto, os elementos indicam que os limites da discricionariedade administrativa não foram observados, uma vez que o gestor, sem qualquer estudo ou análise técnica/científica, flexibiliza o isolamento e o distanciamento social, com a retomada da quase totalidade da atividade econômica, no momento mais crítico da crise sanitária, com a rede de saúde, pública e privada, no limite da capacidade e, ainda, menos de 1 semana depois de declarar e reconhecer o estado de calamidade pública. O setor econômico dependerá de políticas públicas eficientes em nível federal e local. O possível colapso na rede de saúde, pública e privada, apenas acentuará a crise econômica, em especial se houver a necessidade de retroceder na flexibilização, cuja experiência negativa já foi verificada em outras unidades da federação. Assinado eletronicamente por: DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI - 08/07/2020 12:01:30 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=20070812013078900000063801105 Número do documento: 20070812013078900000063801105
  • 5. Num. 67202837 - Pág. 5 Portanto, no caso, a moralidade administrativa está conectada à preservação da saúde pública e à necessária proteção do patrimônio público (potencial gasto com o aumento da demanda). Embora o gestor tenha discricionaridade, a ausência de razoabilidade na flexibilização do distanciamento e isolamento social coloca em risco a saúde pública e o orçamento público, cujos recursos serão insuficientes em caso de colapso do sistema. No caso, não há razoabilidade porque a medida é adotada após o reconhecimento de calamidade pública, no ápice da pandemia no DF, no momento em que o sistema de saúde, público e privado, está no limite da capacidade e, principalmente, porque a retomada não foi baseada, fundamentada e justificada em estudos técnicos/científicos e estatísticas reais em relação à evolução da doença. A ausência de proporcionalidade/razoabilidade no ato discricionário leva à ilegalidade, um dos pressupostos da ação popular. A moralidade administrativa e jurídica, retratada no modo de proceder do gestor, nas consequências de suas decisões (art. 20 da LINDB) e, na necessidade destas terem como base estudos técnicos e científicos, principalmente quando estas se relacionam com a saúde da população, deve ser preservada por meio da ação popular. De acordo com o artigo 20 da LINDB, no âmbito administrativo, a decisão não pode estar baseada em valores jurídicos abstratos, como liberdade econômica e livre iniciativa, sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. Se o gestor público estiver respaldado em laudos técnicos, pareceres de especialistas e profissionais em saúde pública, estudos científicos, como ocorreu em outras unidades da federação, poderá planejar a retomada econômica. A maior crise sanitária do último século impõe que as decisões políticas e administrativas que repercutirão na área econômica estejam associadas à preservação e prevenção da vida humana. As consequências práticas da ampla flexibilização do isolamento e distanciamento social só podem ser mensuradas a partir de estudos científicos, a fim de que não haja o colapso do sistema de saúde, público e privado, com contaminação simultânea e em massa. Frise-se que o Governo do Distrito Federal está tendo dificuldades para informar, com a decida transparência, o número total e a localização de leitos de UTI públicos e da rede privada, ocupados e destinados para paciente com a COVID-19, tanto que o acesso a tal informação é objeto de discussão judicial. Se o Governo do Distrito Federal não consegue, de forma adequada, prestar informações claras e precisas sobre a ocupação de leitos e, ante as notícias de que estão no limite máximo da capacidade, a retomada econômica, com ampla flexibilização do isolamento e distanciamento social, é incompatível com tal contexto fático e social de calamidade pública. Nas últimas 24 horas, o Distrito Federal bateu recorde de mortes e os óbitos já passam de 700 (setecentas) pessoas. Portanto, a questão central não é a retomada econômica planejada, mas a retomada com base em estudos técnicos e científicos que, até este momento, a sociedade brasiliense desconhece. A proteção à saúde pública, a preservação do pleno funcionamento do sistema de saúde e a necessário planejamento sanitário em conjunto com a retomada econômica, são premissas básicas em tempos de pandemia e que, se observadas, estarão em consonância com a legalidade, a moralidade, a proteção do patrimônio público e a eficiência. A discricionaridade, neste caso, é limitada. Não há espaço para oportunidade e conveniência, quando a única medida eficiente e conhecida para controlar a disseminação do vírus, é a adoção de política rígida de isolamento e distanciamento social. Assim, não há dúvida da existência de elementos que indicam a probabilidade do direito alegado, preservação da moralidade administrativa, do patrimônio público e tutela da saúde pública, capaz de justificar a liminar. A urgência é evidente, uma vez que a flexibilização do isolamento e distanciamento social poderá, sem base científica e técnica, potencializar o números de casos, o que provocará colapso no sistema de saúde, público e privado, que já se encontra no limite máximo de sua capacidade de ocupação, em relação aos leitos destinados para pacientes com a COVID-19. Isto posto, DEFIRO a liminar para determinar que o réu, no prazo de 24 horas, por meio de novo DECRETO, SUSPENDA, temporariamente, os efeitos concretos do DECRETO DISTRITAL n.º 40.939/2020, até que apresente estudos técnicos e científicos de profissionais da área de saúde pública, Assinado eletronicamente por: DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI - 08/07/2020 12:01:30 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=20070812013078900000063801105 Número do documento: 20070812013078900000063801105
  • 6. Num. 67202837 - Pág. 6 médicos, sanitaristas ou cientistas, que respaldem as medidas de flexibilização do isolamento e distanciamento social, neste momento de ápice da crise sanitária e de lotação máxima dos leitos de UTI, na rede pública e privada, tudo nos termos da fundamentação, com o que voltará a vigorar o decreto anterior, sob pena de multa diária de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) e suspensão judicial do mesmo, de forma direta. Fica o Governo do Distrito Federal intimado a dar ampla publicidade nos meios de comunicação em relação à suspensão dos efeitos deste Decreto, que somente voltará a ter plena eficácia concreta quando estiver respaldado por estudo ou parecer técnico, que poderá ser apresentado a este juízo a qualquer momento, onde profissionais de saúde exteriorizam de forma clara e objetiva de que a flexibilização proposta é compatível com a situação atual da pandemia no Distrito Federal. Citem-se os réus para apresentarem contestação, no prazo legal de 20 dias, com as advertências legais. Notifique-se o MP para intervir no feito. BRASÍLIA, DF, 8 de julho de 2020 11:58:35. DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI Juiz de Direito Assinado eletronicamente por: DANIEL EDUARDO BRANCO CARNACCHIONI - 08/07/2020 12:01:30 https://pje.tjdft.jus.br:443/consultapublica/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam?nd=20070812013078900000063801105 Número do documento: 20070812013078900000063801105