SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 215
Baixar para ler offline
UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE
FACULDADE DE AGRONOMIA E ENGENHARIA FLORESTAL
DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA RURAL

MANUAL DE HIDROLOGIA

Por:
Professor Doutor Carmo Vaz
Introdução à Hidrologia

1
1.1
1.1.1

1-1

INTRODUÇÃO À HIDROLOGIA
IDEIAS GERAIS SOBRE A HIDROLOGIA

Objecto da hidrologia

A Hidrologia trata da ocorrência, circulação e distribuição da água na Terra, das suas
propriedades físicas e químicas, da sua interacção com o meio, de acordo com a definição
apresentada em 1982 pela Organização Meteorológica Mundial e que é aceite de forma
generalizada.
Embora a Hidrologia abranja o conhecimento da água tanto nos continentes como na atmosfera e
nos oceanos, o estudo dos ramos aéreo e oceânico é feito nas disciplinas específicas de
Meteorologia e Oceanografia, ficando a Hidrologia propriamente dita dedicada ao ramo terrestre.
A Hidrologia da Engenharia (Engineering Hydrology na terminologia inglesa corrente) é uma
parte restrita da Hidrologia que inclui as áreas pertinentes ao planeamento, projecto e exploração
de obras de engenharia visando o controlo e a utilização da água para satisfação das necessidades
humanas. O seu enfoque é, por isso, o da aplicação da ciência na solução de problemas de
engenharia.
1.1.2

A Hidrologia como disciplina do curso de Engenharia Civil

A Hidrologia da Engenharia, apesar do seu carácter aplicado, apresenta diferenças muito
significativas no seu tratamento em relação à maioria das restantes disciplinas do curso de
Engenharia Civil. Se, a título de exemplo, quisermos confrontar a Hidrologia com as
disciplinas da área de Estruturas (Resistência de Materiais, Teoria das Estruturas, Pontes),
podemos constatar:
a) o objecto de estudo das disciplinas de Estruturas engloba estruturas artificiais construídas
em grande medida com materiais fabricados pelo Homem, sendo bastante bem previsíveis
os comportamentos quer dos materiais quer das estruturas. No caso da Hidrologia, o
objecto de estudo é o ciclo hidrológico nas suas várias componentes, que são fenómenos
da Natureza e, por conseguinte, processos essencialmente aleatórios.
b) as diferenças no objecto de estudo traduzem-se em grandes diferenças no controlo sobre o
mesmo que é grande no caso das Estruturas e pequeno ou nulo no caso dos processos que
integram o ciclo hidrológico.
c) no que se refere aos métodos de análise, as disciplinas de Estruturas utilizam uma teoria
matemática formal, baseada em hipóteses próximas da realidade, e ainda recorrem à análise
experimental relativamente pouco dispendiosa. No caso da Hidrologia, há (ainda) um peso
grande de empirismo para enfrentar fenómenos demasiado complexos para serem
analisados com métodos matemáticos relativamente simples. Verifica-se a necessidade
duma grande acumulação de informações (dados hidrológicos). A experimentação é, em
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-2

geral, muito dispendiosa.
d) no que respeita aos processos de cálculo, ambas as áreas têm beneficiado imenso do acesso
a computadores cada vez mais potentes que, por sua vez, possibilitam o desenvolvimento e
a utilização de programas de cálculo sempre mais sofisticados e o tratamento de
quantidades crescentes de informação. No caso da Hidrologia, as ferramentas mais
utilizadas são a análise estatística e os modelos de simulação hidrológica das componentes
da fase terrestre do ciclo hidrológico, desde a precipitação até ao escoamento.

1.1.3

Objectivos da disciplina de Hidrologia

Os objectivos do estudo da disciplina de Hidrologia correspondem às necessidades de:
•
•

aprofundar o conhecimento do ramo terrestre do ciclo hidrológico;
utilizar os conhecimentos adquiridos em aplicações práticas como, por exemplo,
- no dimensionamento de obras hidráulicas (descarregadores de barragens, secções de
vazão de pontes, etc.);
- no dimensionamento de sistemas de drenagem de regadios e áreas urbanas;
- na determinação de necessidades de rega;
- na gestão dos recursos hídricos;
- na protecção do meio ambiente.

Nas aplicações, a Hidrologia liga-se estreitamente às disciplinas antecedentes de Hidráulica
Geral e às disciplinas subsequentes de Abastecimento de Água, Drenagem e Saneamento, Obras
Hidráulicas.

1.1.4

Breve referência à História da Hidrologia

Sugere-se a leitura do excelente livro de A.K. Biswas, "History of Hydrology", no qual o autor
faz uma interessante recapitulação dos principais marcos no progresso da Hidrologia, desde a
Antiguidade aos fins do século XIX. Os elementos que a seguir se apresentam foram extraídos
desse livro e do "Handbook of Applied Hydrology" de Ven Te Chow.
1.1.4.1 A Hidrologia na Antiguidade Oriental (Egipto, Mesopotâmia, China)
A civilização egípcia floresceu à volta do Nilo. Para além das extensivas obras de irrigação do
tempo dos Faraós, há a referir a barragem de Saad-El-Kafara, datada de cerca de 2800 a.c. e
cujos encontros permaneceram até aos nossos dias.
A importância dada à água, em particular às obras de irrigação e controle de cheias, na China
Antiga era tão grande que, diz a lenda, um engenheiro que dirigiu grandes obras hidráulicas
acabou por se tornar o imperador Yü, o Grande.
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-3

Se a Hidráulica, pelo impacto directo das obras, ocupava o primeiro plano, a necessidade de
conhecimentos sobre a ocorrência e a distribuição da água tornava-se também muito importante.
Sendo a irrigação no Nilo feita por inundação, a medição dos níveis nesse rio foi desde logo
sendo feita, através dos "nilómetros" (cisternas com escalas graduadas ligadas ao rio por
condutas subterrâneas). O nilómetro de Roda, próximo do Cairo, tem um registo contínuo de
níveis de 641 d.c. a 1890 d.c., constituindo a mais longa série hidrológica do mundo.
A Mesopotâmia (nome que significa "entre rios") era uma região fértil, atravessada pelos rios
Tigres e Eufrates, ambos de regime muito irregular, obrigando a grandes cuidados com os diques
de protecção contra cheias e obras de irrigação. Essa preocupação aparece bem explícita no
famoso Código de Hamurabi, imperador da Babilónia (cerca de 1700 a.c.)
1.1.4.2 A Hidrologia na Antiguidade Clássica - Grécia e Roma
As primeiras tentativas de explicação da circulação da água (donde surgem os rios?) aparecem
com os filósofos gregos. Platão apresenta o conceito dum mar subterrâneo (Tartarus) com
inúmeras ligações à superfície, dando origem aos rios, lagos e mares. Aristóteles defendia que o
frio transformava o ar em água e isso acontecia tanto nas altas montanhas como no interior da
terra, sendo essa a origem dos rios. Note-se que os Gregos dispunham de observações limitadas
de muitos fenómenos e da sua interligação o que de certa forma explica a sua incapacidade de
descobrirem o conceito do ciclo hidrológico. Apesar disso, filósofos como Anáxagoras e
Teófrasto apresentaram hipóteses próximas da concepção moderna do ciclo hidrológico,
infelizmente caídas no esquecimento devido à influência dominante de Aristóteles.
A civilização romana não foi tão fértil como a grega em pensadores, tendo no entanto produzido
grandes obras de engenharia através da aplicação empírica da experiência adquirida. Apesar
disso, Vitruvius apresenta no seu livro "De architectura libridecem" um conceito bastante claro
do ciclo hidrológico, com a precipitação dando origem ao escoamento e a evaporação como
fonte das nuvens. Há a referir ainda Hero de Alexandria que escreve que o caudal depende da
área e da velocidade mas este conceito não se impôs até ao século XVI.
1.1.4.3 A Hidrologia na Idade Média
A Idade Média na Europa foi dominada ideologicamente pela Igreja que se opôs fortemente à
pesquisa experimental, baseando-se nos dogmas e na escolástica, para evitar o aparecimento de
heresias. Foi um período de cerca de 13 séculos de fraco desenvolvimento científico com o
correspondente reflexo na Hidrologia.
1.1.4.4 A Hidrologia no Renascimento - Século XVI
O Renascimento corresponde ao desabrochar definitivo do pensamento científico e da
experimentação. A partir do século XVI, a Hidrologia, com as ciências irmãs da Hidráulica e da
Meteorologia não parou de se desenvolver.

Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-4

Leonardo da Vinci, conhecido sobretudo como um pintor de génio, tinha nos seus cadernos de
notas conceitos essencialmente correctos sobre o ciclo hidrológico, sobre o escoamento em
superfície livre e sobre a distribuição de velocidades numa secção.
Bernard Palissy, um cientista francês, apresentou a primeira formulação clara e completa do ciclo
hidrológico, baseada em observações. Apresentou também ideias sobre o escoamento
subterrâneo.
1.1.4.5 A Hidrologia nos Séculos XVII e XVIII
O século XVII é o século de Galileo, Kepler, Newton, Harvey, Descartes, Van Leeuwenhoek.
No domínio da Hidrologia salientam-se os nomes de Perrault e Halley.
Benedeto Castelli apresenta uma explicação clara da relação entre caudal, secção transversal e
velocidade, sistematizando ideias anteriores de Hero e Leonardo da Vinci.
Perrault, no seu livro "Da origem das fontes", demonstra brilhantemente que o escoamento no rio
Sena (cabeceiras) podia ser totalmente explicado a partir da precipitação, apresentando um
balanço hídrico rudimentar.
Mariotte realizou experiências similares e outras respeitantes à medição de velocidades. Halley,
muito conhecido pelos seus trabalhos de Astronomia, tomou como exemplo o mar Mediterrâneo
e mostrou que a evaporação dos mares era amplamente suficiente para justificar os escoamentos
dos rios.
Os desenvolvimentos dos conceitos do ciclo hidrológico no século XVII e seguintes estão
ligados às medições de precipitação, evaporação e caudal. É assim que começam a surgir os
primeiros instrumentos hidrométricos modernos: udómetros, tinas de evaporação.
O século XVIII testemunha o florescimento das medições hidrológicas e do desenvolvimento
teórico. Podem referir-se como marcos fundamentais a
medição de velocidade com o tubo
de Pitot, a
equação de Bernouilli (conservação de energia) e a fórmula de Chézy para o
cálculo do caudal numa secção transversal dum escoamento.
1.1.4.6 A Hidrologia no Século XIX
A ciência da Hidrologia avançou muito rapidamente durante o século XIX. Verificaram-se
progressos importantes na medição de variáveis hidrológicas, nomeadamente com a introdução
de udógrafos para registo contínuo da precipitação e de molinetes para a medição de velocidades
em rios e canais. Nos países mais industrializados, iniciou-se a colheita sistemática de dados
hidrológicos e a sua análise.
Em termos de conceptualização teórica, os marcos mais significativos a registar são:
- o estudo de perfis de velocidade em canais, por Darcy e Bazin;
- a equação de Manning para o cálculo de caudais em escoamentos turbulentos
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-5

uniformes;
- a fórmula racional para a determinação de caudais de cheia, por Thomas Mulvaney;
- a teoria do escoamento em meio poroso por Darcy, Dupuit, Thiem e Forcheimer;
- o diagrama de Rippl para cálculo de capacidades de albufeiras;
- a fórmula de Hagen – Poiseuille para o escoamento laminar.
1.1.4.7 A Hidrologia na actualidade
Os progressos alcançados na Hidrologia durante o século XX são numerosos e representam um
avanço qualitativo na direcção dum conhecimento científico dos fenómenos. Ven Te Chow
considerou três períodos para caracterizar o desenvolvimento da Hidrologia no século XX até à
actualidade:
- período do empirismo (1900-1930) com uma grande abundância de fórmulas
empíricas, criação de organismos para a recolha sistemática de dados hidrológicos,
criação da Associação Internacional de Ciências Hidrológicas (nome actual);
- período da racionalização (1930-1950), caracterizados pelo aparecimento das teorias
fundamentais da Hidrologia moderna, nomeadamente as teorias do hidrograma
unitário, de Sherman; da infiltração, de Horton; do escoamento em meio poroso para
poços em regime variável, de Theis; a análise estatística de fenómenos extremos,
proposta por Gumbel; e do transporte de sedimentos, de Einstein;
- finalmente, um período de teorização (1950 - ), em que a Hidrologia faz cada vez
mais uso de métodos matemáticos avançados e dos modernos conceitos de Mecânica
de Fluidos e da Termodinâmica, em paralelo com uma utilização massiva de
computadores como ferramenta básica de trabalho.
A moderna Hidrologia, e em particular a Hidrologia da Engenharia, faz uma integração que se
procura sempre mais perfeita, entre as teorias dos processos hidrológicos e a informação
disponível, em termos de registos de precipitação, caudais e de outras variáveis hidrológicas
fundamentais.

1.2

RESERVAS HÍDRICAS NA TERRA

A água é o liquido mais abundante na Terra. De facto, existe uma quantidade enorme, estimada
em cerca de 1,600 x 106 km3. Aproximadamente 15 % desta água está quimicamente “presa” na
crusta terrestre. A quantidade de água livre é cerca de 1,386 x 106 km3 (1,386 x 1015 m3).
Poderia parecer que a quantidade de água na Terra fosse quase ilimitada. Contudo, esta imagem
muda bastante se considerar a possibilidade de utilizar essa água. Para tal, pode-se analisar o
Quadro 1.1, que mostra a importância das diferentes reservas hídricas.
Quadro 1.1. Importância das diversas reservas hídricas (cf. UNESCO, 1978)
Volume (103 km3)

Manual de Hidrologia

Volume de água
total (%)

Volume de água
doce (%)
Introdução à Hidrologia

1-6

1,338,000

96.5

-

doce

91.0

0.007

0.26

salgados

85.4

0.006

-

Pântanos

11.5

0.0008

0.03

Rios

2.1

0.0002

0.006

Humidade do solo

16.5

0.0012

0.05

Água subterrânea:
doce

10,530

0.76

30.1

12,870

0.93

-

340.6

0.025

1.0

24,023.5

1.7

68.6

Água na atmosfera

12.9

0.001

0.04

Água biológica

1.1

0.0001

0.003

1,385,985
35,029

100
2.5

100

Oceanos e mares
Lagos:

salgada
Gelo e neve
Calotes polares

TOTAL DE ÁGUA
ÁGUA DOCE

Deste quadro ressalta imediatamente a pequeníssima fracção de água utilizável pelo Homem em
relação à totalidade da água existente no planeta. Vê-se que cerca de 97.5 % é água salgada e 1.7
% corresponde às zonas polares. Além disso, uma boa parte da água subterrânea está situada a
enormes profundidades o que torna o seu aproveitamento antieconómico nas condições actuais.
A parcela correspondente às águas superficiais e ás águas subterrâneas pouco profundas, aquela
que efectivamente pode ser utilizada com mais facilidade, é de facto bastante pequena, apenas
cerca de 0.3 % da água que existe na Terra !
O tempo de residência é o valor que se obtêm dividindo o volume da reserva pelo volume
médio do correspondente fluxo de renovação. Assim, o tempo de residência representa o tempo
médio que uma gota de água permanece numa certa reserva de água antes de passar para uma
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-7

outra reserva. O quadro 1.2 apresenta valores do tempo de residência para as várias reservas
hídricas.
Quadro 1.2. Tempo de residência para as várias reservas hídricas
Volume
(103 km3)

Tempo de residência (ordem
de grandeza)

Oceanos e mares

1,338,000

≈4000 anos

Lagos e albufeiras

176.4

≈10 anos

Pântanos

11.5

≈1-10 anos

Rios

2.1

≈2 semanas

Humidade do solo

16.5

≈2 semanas - 1 ano

Água subterrânea:

23,400

≈2 semanas - 10,000 anos

Gelos e glaciares

24,364

≈10 - 1000 anos

12.9

≈10 dias

Atmosfera

Note-se que, enquanto para as águas superficiais, especialmente para os rios, esses tempos são
curtos, para os oceanos, glaciares e águas subterrâneas profundas esses tempos contam-se por
centenas ou milhares de anos. Note-se também que as reservas representam uma imagem
estática, um "instantâneo" das disponibilidades de água e pouco tem a ver com a sua importância
para o ciclo hidrológico (que representa uma imagem dinâmica) onde a contribuição dos rios ou
da atmosfera, por exemplo, é muito superior ao seu volume total instantâneo.
O tempo de residência também tem relevância no âmbito de poluição de recursos hídricos. Por
exemplo, um rio com água poluída poderá, em princípio, ser limpo em relativamente pouco
tempo (teoricamente, em apenas algumas semanas), quando as fontes poluentes deixam de
existir. No caso dum lago grande, a sua limpeza já será um processo de muitos anos.

1.3
1.3.1

O CICLO HIDROLÓGICO

Conceito de ciclo hidrológico. Diagrama de Horton

O conceito de ciclo hidrológico é extremamente útil para se iniciar o estudo da Hidrologia. O
ciclo hidrológico pode ser descrito como um conjunto de arcos que representam os diversos
caminhos através dos quais a água na natureza circula e se transforma, constituindo um sistema
de enorme complexidade.

Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-8

O ciclo hidrológico não tem início ou fim mas é habitual partir-se da evaporação da água dos
oceanos e sua incorporação na atmosfera. Os processos que em seguida se desenrolam estão
apresentados sob forma gráfica no diagrama de Horton, figura 1.1.

Figure 1.1 Diagrama de Horton
O vapor de água resultante da evaporação nos oceanos acumula-se na atmosfera e é transportado
por massas de ar em movimento. Sob condições adequadas, o vapor condensa-se para formar
nuvens que, por sua vez, podem dar origem a precipitação, quer sobre a terra quer sobre os
oceanos.
A precipitação que cai sobre a terra pode seguir caminhos diversos:
- parte evapora-se durante a queda;
- parte é interceptada por árvores, vegetação ou telhados de casas e volta a evaporar-se;
- parte atinge a superfície do solo, infiltrando-se ou ficando retida em depressões
superficiais.
A parte retida em depressões superficiais divide-se numa componente que se evapora e noutra
que origina escorrimento superficial. A parte que se infiltra contribui, por um lado, para
alimentar o processo de transpiração das plantas e de evaporação a partir do solo; por outro, por
efeito da gravidade, vai alimentar as toalhas de água subterrânea. As águas subterrâneas
contribuem para alimentar a vegetação, a evaporação a partir do solo e os escoamentos dos rios.
Por efeito da gravidade, parte das águas subterrâneas vai ter directamente ao oceano.
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-9

O escorrimento superficial sobre o solo dá origem a linhas de água que se fundem em rios os
quais, devido à gravidade, vão descarregar no oceano, alimentando no seu percurso lagos,
pântanos e albufeiras. Em todo este processo, há continuamente evaporação da água da mesma
forma que pode haver precipitação directamente sobre os rios e lagos. Também os rios
contribuem muitas vezes para alimentar as toalhas de água subterrânea com que comunicam.
Com a descarga da água no oceano por escoamento superficial ou escoamento subterrâneo fechase o ciclo hidrológico. O "motor" deste ciclo é a energia solar que, no processo de passagem de
partículas de água para atmosfera por evaporação, lhes transmite a energia potencial necessária
para o seu regresso ao oceano, actuadas pela gravidade a partir da precipitação.
A figura 1.2 faz uma outra representação do ciclo hidrológico. Aí estão indicadas os três ramos
normalmente considerados no ciclo hidrológico: o ramo oceânico, objecto da Oceanografia; o
ramo aéreo ou atmosférico, objecto da Meteorologia; e o ramo terrestre, objecto da Hidrologia.

Figura 1.2 O Ciclo Hidrológico
A figura 1.3 é ainda uma representação descritiva do ciclo hidrológico mas na qual se faz já uma
avaliação quantitativa das variáveis envolvidas. P, E, ET, I, G e Q representam respectivamente a
precipitação, a evaporação, a evapotranspiração, a infiltração, o escoamento subterrâneo e o
escoamento superficial. As percentagens estão expressas em termos da precipitação total anual
média que se estima em cerca de 860 mm.

Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-10

Figure 1.3 Representação quantitativa do Ciclo Hidrológico

1.3.2

Irregularidade espacial e temporal

È preciso salientar que as quantidades de precipitação, evaporação, escoamento e outras
variáveis hidrológicas apresentam enormes irregularidades quer na sua distribuição geográfica
quer na sua distribuição temporal. O facto de poder haver grandes variações destas quantidades
de ano para ano num mesmo local significa que a sua caracterização apenas é possível numa base
estatística a partir de longas séries de valores observados.
Em Moçambique, há dois organismos que desempenham um papel central na recolha e registo
de dados relativos às variáveis hidrológicas. São eles:
- O Instituto Nacional de Meteorologia de Moçambique (INAM) que colecta dados de
precipitação e evaporação, para além de outros relativos a variáveis climáticas
(temperatura, humidade relativa, vento, radiação solar, etc.) que influem nas grandezas
hidrológicas;
- a Direcção Nacional de Águas (DNA) que recolhe dados de precipitação, evaporação,
água subterrânea e escoamento superficial.
Outros organismos como o Instituto Nacional de Investigação Agronómica (INIA) e algumas
grandes empresas do sector agrícola possuem também informação hidrológica com interesse,
sobretudo registos de precipitação, evaporação, evapotranspiração.

Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1.4

1-11

BALANÇO HÍDRICO

Se se considerar uma certa região geográfica durante um determinado período de tempo, o
movimento da água obedece ao princípio da conservação da massa traduzido pela equação da
continuidade. Essa equação pode escrever-se como

I -O=

ds
dt

na sua forma contínua

ou como

(I - O) ∆t = ∆s

na sua forma discreta

em que I representa a entrada de água no sistema por unidade de tempo, O é a saída de água do
sistema também por unidade de tempo e ∆S é a variação do volume armazenado no interior do
sistema. Designa-se por balanço hídrico a equação da continuidade aplicada a uma certa região
e escrita em função das variáveis do ciclo hidrológico.

Figure 1.4 Representação conceptual do balanço hídrico
As regiões em que fazem estudos de balanços hídricos são definidas normalmente em função do
objectivo que se pretende alcançar, podendo, no entanto, existir restrições de carácter político e
administrativo à livre definição dessas regiões.
A figura 1.4, uma versão mais abstracta do ciclo hidrológico duma região, é útil porque permite
uma tradução fácil do balanço hídrico em termos matemáticos.
Na figura 1.4, as variáveis
têm o seguinte significado:
P
precipitação;
Q1, Q2 escoamento superficial que entra e sai da região;
G1, G2 escoamento subterrâneo que entra e sai da região;
Ss, Sso, Saq
volume armazenado à superfície, no solo e no aquífero (água
subterrânea);
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

E
T
rso, raq
(ressurgência);
I
R

1-12

evaporação a partir de águas superficiais e do solo;
transpiração das plantas;
água do solo e água subterrânea que reaparecem à superfície
infiltração (no solo);
recarga (percolação para os aquíferos).

Conforme a região que se considere, assim se podem estabelecer os correspondentes balanços
hídricos. Por exemplo, se se considerar toda a região representada na figura 1.4, ter-se-á a
seguinte equação:
(P + Q1 + G1) - (Q2 + G2 + E + T) = ∆S
em que ∆S representa a variação total do volume armazenado. Note-se que nesta equação não
aparecem a infiltração, a recarga e a ressurgência que, por serem processos "interiores" à região
em estudo, não afectam o respectivo balanço hídrico.
Se agora se considerar apenas a superfície da terra, o balanço hídrico será:
(P + Q1 + r) - (Q2 + E + T + I) = ∆Ss
O balanço hídrico para um (único) aquífero será:
(G1 + R) - (G2 + raq) = ∆Saq
É um exercício relativamente simples estabelecer os balanços hídricos para outras regiões como,
por exemplo, a camada superficial do solo ou do aquífero. Tenha-se em atenção que todas as
variáveis que intervêm nas equações de balanços hídricos são expressas como volumes por
unidade de tempo.
A equação do balanço hídrico pode ser consideravelmente simplificada quando a região
considerada é a bacia hidrográfica e quando se adoptem longos períodos de tempo (pelo menos
um ano). Numa bacia hidrográfica, não há, em condições naturais, outra entrada de água além da
precipitação e há uma única saída de água. Por outro lado, num longo período de tempo a
variação do volume armazenado pode ser desprezada perante os valores acumulados das outras
variáveis. Assim, a equação do balanço hídrico passa a ser nessas condições:
P - (Q2 + E + T) = 0
O maior obstáculo na resolução de problemas práticos com utilização do balanço hídrico reside
principalmente na dificuldade de medir ou estimar adequadamente as variáveis intervenientes.
Por exemplo, a precipitação é medida pontualmente fazendo-se depois a extrapolação para toda a
área envolvida1. Os caudais em rios podem ser medidos com razoável precisão excepto durante
1

ver o capítulo sobre precipitação

Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-13

as cheias. As maiores dificuldades surgem, no entanto, associadas à medição ou estimação dos
valores de infiltração, recarga, escoamento subterrâneo, evaporação, transpiração e volumes
armazenados no solo e em aquíferos.
O balanço hídrico é uma ferramenta muito útil e que pode ser utilizada numa grande variedade
de situações como, por exemplo:
• determinação do valor duma variável hidrológica quando todas as restantes que entram no
balanço são conhecidas;
• estimação do erro global cometido na medição ou estimação das variáveis hidrológicas,
quando todas as que entram no balanço hídrico são conhecidas;
• operação de albufeiras;
• avaliação das necessidades de rega.
O balanço hídrico é também a componente central dos modelos de simulação hidrológica modelos matemáticos em que se procura reproduzir as características principais do movimento
de água numa região a partir do momento em que ela precipita.

1.5 ANO HIDROLÓGICO
As variáveis hidrológicas, como a precipitação, o escoamento ou a evaporação, são claramente
influenciadas por uma ciclicidade anual. Em Moçambique, isto é bem evidente nas duas mais
importantes variáveis do ciclo hidrológico, a precipitação e o escoamento. Com efeito, tanto a
precipitação como o escoamento atingem valores elevados nos meses de Dezembro a Março ao
passo que no período de Junho a Setembro os seus valores são bastante baixos.
Em muitas aplicações, interessa utilizar os valores acumulados anuais de precipitação e
escoamento, por exemplo para balanços hídricos anuais. Nesses casos, não se pode adoptar como
período de registo o ano civil (1 Janeiro - 31 Dezembro) pois isso corresponderia a repartir por
dois anos uma mesma época de chuvas. Considera-se por isso um ano especial designado por
ano hidrológico.
Toma-se para início do ano hidrológico o fim da época de estiagem o que tem a vantagem de
evitar a divisão duma mesma época de chuvas. Tem também vantagens para a efectivação de
balanços hídricos anuais:
P - (R + E + T) = ∆S
pois no fim da época de estiagem pode aceitar-se que o armazenamento é sempre bastante
pequeno pelo que ∆S é aproximadamente nulo. Procura-se, portanto, que os anos hidrológicos
sejam (estatisticamente) independentes uns dos outros, o que obviamente não aconteceria se, por
exemplo, se se usasse o ano civil.
O procedimento adoptado para a definição do início do ano hidrológico procura, de facto,
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-14

minimizar a dependência estatística dos sucessivos anos hidrológicos. Ele consiste em formar
séries anuais de escoamentos adoptando, alternativamente, diferentes meses para o seu início
(Setembro, Outubro, Novembro, etc.) e determinar, para cada alternativa de início, o valor do
coeficiente de autocorrelação. O mês que origine o mais baixo coeficiente de autocorrelação
deve ser o adoptado para início do ano hidrológico.
Em Moçambique, verifica-se que os escoamentos em dada região dão coeficientes de
autocorrelação mais baixos tomando o ano hidrológico com início em 1 de Outubro ao passo que
noutras regiões o mínimo coeficiente de autocorrelação corresponderia a um início em 1 de
Novembro. Por razões de ordem organizativa, a Direcção Nacional de Águas adoptou como ano
hidrológico o período que vai de 1de Outubro dum ano a 30 de Setembro do ano seguinte.

Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

1-15

EXERCÍCIOS
1.
Numa albufeira com uma área de 10 km2 verificaram-se durante um período de 5 dias os
seguintes valores:
Caudal afluente = 15 m3/seg.
Caudal efluente = 3 m3/seg.
Nível da água no 1º dia = 25,0 m.
Nível da água no 6º dia = 25,4 m.
Precipitação = 0 mm.
a)
b)

Calcule o volume da água perdida por evaporação na albufeira, durante estes 5 dias
Calcule a altura média diária de evaporação da albufeira.

2.
Considere um lago com uma saída natural. A área do lago é de 500 km2 e a da bacia
drenante de 2800 km2. Durante um ano verificou-se que a precipitação na região foi de 600 mm.
e a evaporação no lago de 800 mm, não se tendo verificado uma variação sensível do nível do
lago. O caudal médio descarregado ao longo do ano foi de 9 m3/s.
a)
b)

Calcule o caudal drenado da bacia para o lago.
Calcule a evaporação na bacia drenante.

3.

Em que condições é que a precipitação numa bacia não produz

a)
b)
c)

Nenhum escoamento superficial
Nenhum escoamento subterrâneo
Nenhum escoamento

4.
Explique a presença e a ausência de água superficial e água subterrânea numa zona com
dunas (p. ex. a ilha de Inhaca) e numa planície dum rio (p. ex. o rio Incomati).
5.
Construiu-se uma barragem numa secção dum rio com uma bacia drenante de 1800 km2.
A albufeira tem uma área inundada média de 35 km2 e uma capacidade de armazenamento de
600 milhões m3. O caudal médio (afluente) do rio é de 5,6 m3/s. A precipitação anual média
ponderada sobre a bacia é de 700 mm. O enchimento da albufeira depois da sua construção levou
5 anos. Durante esse período o caudal médio descarregado pela albufeira foi de 0,5 m3/s. Logo
depois da construção da barragem (durante e depois do enchimento da albufeira) começou-se a
tirar, anualmente, 12 milhões de m3 de água da albufeira para o abastecimento duma vila e para
um regadio.
a)
Calcule o caudal médio descarregado pela albufeira depois do seu enchimento (numa
situação de equilíbrio o nível médio da albufeira mantêm-se constante).
Manual de Hidrologia
Introdução à Hidrologia

b)

1-16

Calcule as perdas anuais na albufeira por evaporação.

6.
Na secção de saída (secção de referência) duma bacia hidrográfica de 1600 km2 foi
construída uma barragem com uma albufeira com uma superfície de 35 km2 e uma capacidade de
armazenamento de 600 milhões m3. A albufeira é alimentada por um rio que drena a bacia. O
caudal médio no rio é de 4,5 m3/s. A precipitação anual média naquela zona é de 700 mm. O
enchimento da albufeira depois da sua construção levou 5 anos.
a)
Calcule as perdas anuais na albufeira por evaporação (assuma que a superfície da
albufeira é constante).
b)
Calcule a evapotranspiração anual (em mm) na bacia.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2

CARACTERIZAÇÃO DUMA BACIA HIDROGRÁFICA

2.1

2-1

BACIAS HIDROGRÁFICAS

Uma bacia hidrográfica é uma região definida topográficamente, drenada por um curso de água
ou um sistema interligado de cursos de água, tal que a única entrada de água na região seja a
precipitação e todos os caudais efluentes sejam descarregados através de uma única saida (secção
de referência da bacia).
Quando o balanço hídrico é realizado na região correspondente a uma bacia hidrográfica, ele
torna-se consideravelmente simplificado já que a única entrada de água corresponde à
precipitação e a saída de água se faz numa única secção. Também para a gestão dos recursos
hídricos a bacia hidrográfica constitui a unidade mais conveniente pois é a nível da bacia que se
verificam as relações mais estreitas entre:
•
•
•
•

recursos hídricos a montante e a jusante;
recursos de água superficiais e de águas subterrâneas;
consumos a montante e disponibilidades a jusante, em termos de quantidade e qualidade;
modificações na ocupação do solo ou obras hidráulicas no rio e nas margens e modificações
morfológicas ou das características do escoamento a montante e a jusante, por vezes a
distâncias de dezenas de quilómetros.

Tudo isto justifica o papel privilegiado desempenhado pelas bacias hidrográficas em estudos
hidrológicos e de gestão de recursos hídricos. A figura 2.1 representa as principais bacias de
Moçambique e a figura 2.2 a bacia do rio Malema, afluente do rio Lúrio.
A bacia hidrográfica é limitada pela linha de separação das águas. Esta linha passa pelos
pontos de máxima cota entre bacias, seguindo pelas linhas de cumeada, podendo no entanto
existir pontos mais altos no interior da bacia. A linha de separação divide a região onde a
precipitação caída vai dar origem a escoamento drenado através da secção de referência das
regiões vizinhas, drenadas por outros cursos de água.
A definição dos limites da bacia hidrográfica torna-se menos precisa quando se considera o
escoamento subterrâneo. Assim, distingue-se por vezes a linha de separação topográfica ou
superficial da linha de separação freática ou subterrânea. Na situação ilustrada pela figura 2.3,
a precipitação que se infiltra acima da camada geológica impermeável acaba por se escoar numa
bacia vizinha.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

Figure 2.1 Principais bacias de Moçambique

Manual de Hidrologia

2-2
Caracterízação duma bacia hidrográfica

Figure 2.2 Bacia do rio Malema

Manual de Hidrologia

2-3
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-4

Figure 2.3 Limites duma bacia hidrográfica
Nesta situação, a definição dos limites da bacia hidrográfica não se pode fazer sem ambiguidade
visto que apenas uma parte da precipitação caída acima da camada geológica impermeável se
infiltra enquanto outra parte se transforma em escoamento superficial na bacia. Por outro lado, os
níveis freáticos variam ao longo do ano o que tem como consequência a variação da linha de
separação freática. Por isso, normalmente e para efeitos práticos, despreza-se o efeito introduzido
pelo escoamento subterrâneo, junto aos limites da bacia. A incorreção cometida é negligenciável
com a excepção das bacias com muito pequena dimensão ou com características geológicas
particulares.
O comportamento hidrológico duma bacia hidrográfica é essencialmente uma função das
características climáticas da região (precipitação, evaporação) e das características fisiográficas
da bacia. As características fisiográficas podem ser agrupadas da seguinte maneira:
•

características geométricas

-

área de drenagem;
perímetro;
índice de compacidade;
factor de forma.

•

características do sistema de drenagem

-

constância do escoamento;
ordem;
densidade de drenagem.

•

características do relevo

-

curva hipsométrica;
altitude média;
altura média;
perfil do rio;
inclinação média do leito;
declividade dos terrenos;
rectângulo equivalente;
declive médio
índice de declive de Roche;

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-5

•

2.2
2.2.1

curva hidrodinâmica;
coeficiente de massividade;
coeficiente orográfico.

características de geologia, solos e vegetação

CARACTERÍSTICAS GEOMÉTRICAS

Área de drenagem

A área de drenagem é a área da projecção horizonal da superfice da bacia hidrográfica, sendo
normalmente determinada por planimetria ou por utilização de GIS (Sistema de Informação
Geográfica), em cartas com escalas (no caso de Moçambique) entre 1:250,000 e 1:50,000.
A área de drenagem tem uma importância enorme nos valores dos escoamentos, que se podem,
duma maneira geral, considerar funções crescentes da área. A área da bacia do rio Malema
(centro-norte de Moçambique) é de 2,600 km2.
2.2.2

Perímetro

O perímetro da bacia é o perímetro da projecção horizontal da superfície da bacia hidrográfica.
O perímetro da bacia do rio Malema é de 342 km.
2.2.3

Índice de compacidade

O índice de compacidade ou índice de Gravelius, Kc, é a relação entre o perímetro da bacia e o
perímetro dum círculo de área igual à da bacia:
Kc = P/(2πR), em que A = πR2 define o valor de R. Então:

P

Kc =
2π

A

=

0.282 P
A

π

Kc é sempre maior ou igual à unidade apenas se tendo Kc = 1 para uma bacia de forma circular.
Kc é um valor adimensional que não depende da área mas da forma da bacia sendo tanto maior
quanto mais essa forma se afaste da circular. Note-se que quanto maior fôr Kc menos compacta é
a bacia. Apresentam-se na figura 2.4 algumas formas esquemáticas de bacias e os respectivas
índices de compacidade. A título de exemplo, a bacia do rio Malema tem um valor de Kc = 1.89.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-6

Figura 2.4 Índices de compacidade para várias formas de bacias
Se imaginarmos uma precipitação instantânea e uniforme sobre a bacia, o escoamento a que ela
dá origem surgirá concentrado na secção de saída ou mais distribuido ao longo do tempo
conforme a forma da bacia seja próxima da circular ou irregular. Assim, em igualdade de outros
factores, a tendência para grandes cheias será tanto mais acentuada quanto mais próximo da
unidade for o valor de Kc.
2.2.4

Factor de forma

O factor de forma, Kf, é a relação entre a largura média e o comprimento da bacia, definido
como o comprimento, L, do seu curso de água mais longo. A largura média, l, é definida como a
largura dum rectângulo com o mesmo comprimento e com a mesma área:
l = A/L
Kf = l/L = A/L2
Se se considerar as primeiras três bacias representadas na figura 2.4, os seus factores de forma
são aproximadamente 0.25, 0.50 e 1. As bacias com factores de forma baixos são as que têm
formas estreitas ou irregulares. Nestes casos, é menos provável a ocorrência de chuvas intensas
cobrindo simultâneamente toda a sua extensão e, por outro lado, os escoamentos resultantes
surgem na secção de saída mais distribuidos ao longo do tempo pelo que, em igualdade de outros
factores, bacias com Kf baixos terão menos tendências para grandes cheias do que bacias com Kf
elevados. O valor de Kf para a bacia do rio Malema é de 0.1 aproximadamente.

2.3
2.3.1

CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA DE DRENAGEM

Constância do escoamento

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-7

Os rios e seus afluentes podem classificar-se como perenes, intermitentes e efémeros, de
acordo com o critério da constância do escoamento.
Os rios perenes são os que, em condições naturais1, escoam água durante todo o ano quer por
terem afluentes com diferentes regimes de alimentação quer por terem uma alimentação contínua
de águas subterrâneas. É normalmente o caso dos rios mais importantes de Moçambique, como o
Maputo, o Umbelúzi, o Incomáti e o Limpopo, na região sul.
Os rios intermitentes são os que em geral têm água durante a época húmida e secam na estiagem.
Durante a época húmida beneficiam da precipitação e dum nível freático alto enquanto que,
durante a época seca, o lençol freático desce a um nível inferior ao do leito do rio, não
permitindo fazer a sua alimentação. Podem referir-se como exemplo os rios Mazim’chopes e
Govuro.
Os rios efémeros apenas têm água durante e imediatamente a seguir aos períodos de precipitação,
não recebendo escoamento subterrâneo. Podem citar-se como exemplo os rios Movene e
Impamputo.
2.3.2

Ordem

A ordem dos cursos de água é uma classificação que reflecte o grau de ramificação da rede
hidrográfica da bacia. Pode ser feita a partir dum mapa em que estejam representados todos os
canais naturais suficientemente bem definidos quer correspondam a cursos de água perenes,
intermitentes ou efémeros.
Um critério de ordenação que por vezes tem sido seguido é o de considerar como de ordem 1 os
cursos de água que não são afluentes de qualquer outro; de ordem 2 os que são afluentes dos rios
de ordem 1; de ordem n+1 os que são afluentes dos cursos de água de ordem n. Este critério é de
aplicação simples e quase nada dependente do pormenor com que a rede hidrográfica está
representada no mapa. No entanto, apresenta como significativas desvantagens o facto de
poderem surgir como tendo a mesma ordem rios de dimensão totalmente distinta. Em
Moçambique, tanto o Zambeze como o Infulene seriam rios de ordem 1 por este critério.
Um critério mais seguido actualmente é o de Horton-Strahler: são considerados de ordem 1 as
linhas de água iníciais, que não recebem quaisquer afluentes; a junção de duas linhas de água de
ordem 1 origina uma linha de água de ordem 2; a junção de dois rios de ordem n gera um rio de
ordem n+1. Assim, os troços terminais dos grandes rios têm números de ordem bastante altos.
A figura 2.5 ilustra a utilização destes dois critérios.

1

É necessário referir o rio “em condições naturais” por causa das grandes modificações de regime de escoamento introduzidas por tomas
de água e por albufeiras de armazenamento.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-8

Figure 2.5 Critérios de ordenação de cursos de água
2.3.3

Densidade de drenagem

A densidade de drenagem, λ, é a relação entre o comprimento total dos cursos de água duma
bacia, sejam eles perenes, intermitentes ou efémeros, e a área da bacia:
∑ li
λ= i

A

λ é dado em km-1 e varia normalmente entre 0.5 e 3.5 km-1. A densidade de drenagem é também
um indicador da tendência para a ocorrência de cheias numa bacia hidrográfica. Com efeito,
numa bacia bem drenada o escoamento superficial é rapidamente canalizado para linhas de água
bem definidas e pode surgir concentrado na secção de referência da bacia. Naquelas bacias mal
drenadas (λ baixo), a precipitação vai originar sobretudo escoamento sub-superficial e
subterrâneo que se processam com muito mais lentidão, não originando por isso picos de cheia
elevados.

2.4

CARACTERÍSTICAS DO RELEVO

2.4.1

Curva hipsométrica

A curva hipsométrica é a curva A(z) em que A é a área da bacia que se situa acima da altitude ou
cota z referida ao nível do mar. A área pode ser expressa em km2 ou em percentagem da área
total da bacia. A curva hipsométrica é obtida a partir da carta hipsométrica, carta onde a
representação das altitudes é feita por curvas de nível ou por qualquer outro processo de
representação gráfica. A figura 2.6 apresenta um exemplo de curva hipsométrica. A figura 2.7
apresenta a curva hipsométrica da bacia do rio Malema.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

Figure 2.6 Curva hipsométrica

Figure 2.7 Curva hipsométrica do rio Malema

Manual de Hidrologia

2-9
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2.4.2

2-10

Altitude média

A altitude média da bacia, Z, é dada pela expressão:
Atotal

∫

z ⋅ da

0

Z=

Atotal

O integral dá a área limitada pela curva z(A) e pelos eixos coordenados, podendo ser fácilmente
calculado por uma fórmula de integração numérica a partir da curva hipsométrica. Um processo
mais expedito é o de assimilar o integral a um somatório:
Atotal

∫
0

n

z ⋅ da = ∑ z i Ai
i=1

em que Ai é a área da bacia entre as curvas de nível i e (i+1) e zi a média das altitudes dessas duas
curvas de nível.
A altitude média é uma característica com grande influência em variáveis hidrometeorológicas
como a precipitação e a temperatura. Em Moçambique, as zonas de maior altitude (Gurué,
Milange, Angónia, Lichinga) são as regiões de maiores precipitações anuais médias e mais
baixas temperaturas mínimas.
2.4.3

Altura média

A altura média, H, é dada pela expressão:
Atotal

H=

∫

h ⋅ da

0

Atotal

em que h é a cota acima da secção de referência ou de estudo, em vez de z que é a altitude ou
cota referida ao nível do mar. Assim, se estivermos a tomar como secção de referência a foz no
oceano, as alturas h coincidem com as altitudes z; se a secção de referência fôr, por exemplo, a
secção de confluência do afluente com o rio principal, então para esse afluente ter-se-á:
ou

h = z - zconf
h = z - z100

já que toda a bacia (100%) do afluente se situa acima de zconf. Daqui se tira imediatamente que

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-11

H = Z - z100
A altura média da bacia dá-nos uma ideia se a bacia é muito ou pouco acidentada. Normalmente,
as bacias com maiores alturas médias apresentam quedas mais importantes que podem por vezes
ser aproveitadas para a produção de energia hidroeléctrica.
2.4.4

Perfil do rio

O perfil do rio é a representação gráfica da função z(L) em que z é a cota duma dada secção do
rio e L a respectiva distância à foz.
A figura 2.8 apresenta a título de exemplo o perfil do rio Malema e dos seus afluentes Namparro,
Mutivasse, Nataleia e Lalace. Note-se que a marcação de distâncias para os afluentes em sentido
contrário ao rio principal, a partir da confluência, torna o gráfico mais legível do que seria se
todas as distâncias fossem marcadas no mesmo sentido. O perfil dum rio dá uma noção imediato
das zonas de quedas importantes, grandes extensões quase planas e mais facilmente inundáveis,
etc.
2.4.5

Inclinação média do leito

A inclinação média do leito obtem-se dividindo a diferença entre as cotas máxima e mínima do
leito pelo comprimento do rio. É também possível determinar de modo análogo a inclinação
média dum troço do rio.
A partir da figura 2.8, pode-se calcular que a inclinação média de todo o leito do rio Malema é de
0.00859 mas que o troço de 135 km de jusante tem uma inclinação de apenas 0.00278.
2.4.6

Declividade dos terrenos

Quanto maior a declividade dos terrenos maior será a velocidade com que se dá o escorrimento
superfícial e, consequentemente, menor será o tempo que a água leva a atingir o sistema de
drenagem, facilitando o aparecimento de maiores pontas de cheias. Para tal contribui também o
facto de maior declividade corresponder a uma menor infiltração de água no solo. Por outro lado,
as maiores velocidades agravam o problema da erosão do solo.
A declividade dos terrenos duma bacia é normalmente obtida por amostragem:
•
•
•

marcam-se, por exemplo a partir duma quadrícula aposta ao mapa da bacia, um número
elevado de pontos no interior da bacia;
para cada ponto determina-se a declividade a partir das duas curvas de nível entre as quais o
ponto se situa;
fica-se assim com uma distribuição estatística das declividades o que permite igualmente
obter a declividade média da bacia.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

Figure 2.8 Perfis do rio Malema e afluentes

Manual de Hidrologia

2-12
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-13

Um outro método para determinar a declividade média dos terrenos é o método do Alvord.
Suponha-se a bacia representada numa carta com curvas de nível espaçadas de D (por exemplo,
D = 20 metros). A figura 2.9 representa as curvas de nível às cotas n-D, n, n+D.

Figure 2.9 Método de Alvord.
Considere-se a curva de nível à cota n. A faixa de terreno entre as curvas de nível à cota n-D/2 e
n+D/2 está representada a tracejado na figura.
Se se designar por dn a largura média dessa faixa, a declividade média dos terrenos nessa faixa
será dada por in = D/dn.
Se o comprimento da curva de nível à cota n for Ln, então:
D Ln = D L n
in =
d n Ln
An
em que An é área da faixa a tracejado.
Este raciocínio é aplicável a qualquer faixa de terreno correspondente a uma curva de nível da
carta. Portanto, pode-se definir a declividade média dos terrenos da bacia como a média
ponderada das declividades médias de todas as faixas que compõem a bacia.

I=

DL
∑ An i n
∑
= D Ln =
∑ An
∑ An
A

em que L é o comprimento total das curvas de nível de equidistância D existentes na bacia e A é
a área da bacia.
Esta método é, assim, bastante prático pois, conhecido D, basta determinar A com um planímetro
(ou GIS) e medir L com um curvímetro (ou GIS). Note-se que, sendo I um valor adimensional,
se deve exprimir tanto L como D em km e A em km2.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2.4.7

2-14

Rectângulo equivalente

O rectângulo equivalente é o rectângulo com área e perímetro iguais aos da bacia, isto é:
2(Le+le) = P
Le * le = A
Pode-se ressolver as duas equações para obter Le e le:
Le =
le =

2
P
+ P -A
16
4

2
Só é válida para P ≥ 16 A

2
P
- P -A
16
4

A bacia do rio Malema tem A = 2,600 km2 e P = 342 km, donde se tira para o rectângulo
equivalente:
Le = 154 km;
le = 17 km.

Figure 2.10 Rectângulo equivalente do rio Malema
A figura 2.10 faz a representação do rectângulo equivalente para a bacia do rio Malema. Nele
marcaram-se as várias curvas de nível espaçadas de formas a representarem as correspondentes
áreas. Por exemplo, a área entre as curvas de nível de 700 e 800 m é de 20 x 17 = 340 km2 . As
áreas são obtidas a partir da curva hipsométrica.
2.4.8

Índice de declive médio

O índice de declive médio, Ii, entre as curvas de nível de cotas Zi e Zi-1 é dado pela relação:
Z i - Z i -1
2,
Ii =
Xi
em que Xi é a distância entre as duas curvas de nível no rectângulo equivalente. Por exemplo, no
caso da bacia do rio Malema, o índice de declive médio entre as cotas 1,300 e 1,400 m é:

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

I=

2-15

1,400 - 1,300
= 0.0159
6,300

enquanto que ele é apenas de 0,0024 entre as cotas 600 e 700 m.
2.4.9

Índice de declive de Roche

O índice de declive de Roche, Ip, é o índice de declive médio para toda a bacia. No exemplo do
rio Malema, o rectângulo equivalente permite calcular
I p=

1,900 - 465
= 0.00932
154,000

2.4.10 Índice de declive global
O índice de Roche é muito afectado se a bacia tiver pequenas áreas de grande altitude. Afim de
representar mais fielmente as características médias da bacia, o índice de declive global, Ig,
exclui as áreas correspondentes aos 5% mais altos e aos 5% mais baixos da bacia:

Ig=

Z 5 - Z 95
Le

Para a bacia do Malema, obtem-se:
Ig=

1,400 - 540
= 0.00558.
154,000

Como é evidente, Ig é sempre inferior a Ip. Os valores de Z5 e Z95 são obtidos a partir da curva
hipsométrica.
2.4.11 Curva hidrodinâmica
A curva hidrodinâmica representa, a menos dum factor constante, as possibilidades energéticas
da bacia.
Se se considerar um volume de água V caindo duma altura h, a energia potencial que lhe
corresponde é
En = ρgVh Joules (com as unidades do Sistema Internacional), ou
En = 2,722 Vh KWh (com V em Mm3 e h em m).
Considere-se agora o caso dum rio sem afluentes onde estão identificadas diversas secções

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-16

(figura 2.11) e marquem-se os pontos (Vi, hi).
Figure 2.11 Curva hidrodinâmica
h é a cota da secção e V o volume anual médio que nela se escoa. A área delimitada pela curva
V(h) multiplicada pelo factor 2,722 dá a energia potencial total correspondente ao escoamento do
rio, designando-se por potencial fluvial bruto.
h max

En = 2,722

∫ Vdh 3
0

Considere-se agora o caso dum rio com afluentes como se representa na figura 2.12. O processo
de representação da curva V(h) pode ser repetido para o rio principal e para os afluentes, à
semelhança do caso anterior, permitindo determinar o potencial fluvial bruto de cada afluente e
da totalidade da bacia.

Figura 2.12 Curva Hidrodinâmica para um rio principal e os
afluentes
A determinação do potencial fluvial bruto implica o conhecimento dos volumes escoados nas
diversas secções. Quando tal não acontece e se dispõe apenas de cartas topográficas com a
indicação da rede de drenagem, pode utilizar-se a curva hidrodinâmica para uma primeira ideia
do potencial energético da bacia.
A curva hidrodinâmica baseia-se na hipótese da proporcionalidade entre áreas drenadas e
volumes escoados:

V1 =V2 =V3
= ... = K,
A1 A2 A3
hipótese válida em primeira aproximação desde que toda a área tenha características climáticas,
geológicas e de solos homogéneas. Então:

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

h max

En = 2,722

∫

V ⋅ dh = 2,722 K

2-17

h max

0

∫

A ⋅ dh

0

Portanto, se se traçar uma curva semelhante às das figuras 2.11 e 2.12 mas em que os volumes
escoados são substituidos pelas correspondentes áreas de drenagem, teremos a curva
hidrodinâmica.
Para se obter o valor do potencial energético multiplica-se a área delimitada pela curva
hidrodinâmica pelo factor (2,722 * K). O valor de K pode ser estimado por uma das seguintes
vias:
•
•

se numa secção (de preferência, a jusante) se conhecer o valor do volume anual médio V e
sendo A a respectiva área drenante, virá K = V/A, com K em m se V em Mm3 e A em km2.
se não houver quaisquer dados de escoamento na bacia, utilizar o valor de K calculado para
uma bacia vizinha com características similares.

As figuras 2.13 e 2.14 apresentam as curvas hidrodinâmica e do potencial fluvial bruto da bacia
do Malema. As curvas diferem entre si porque a bacia não tem características homogéneas de
precipitação e, por isso, os escoamentos não são proporcionais às áreas.
2.4.12 Coeficiente de massividade
O coeficiente de massividade é o quociente entre a altura média da bacia, em metros, e a sua
área, em km2. O coeficiente de massividade da bacia do rio Malema é de 340/2,600 = 0.13. Este
coeficiente toma valores elevados para pequenas bacias com grandes desníveis e valores baixos
para grandes bacias de relevo pouco acentuado. No entanto, os respectivos valores podem ser os
mesmos para bacias muito diferentes. Por exemplo, uma bacia pequena com relevo pouco
acentuado e uma bacia grande com grandes desníveis podem ter valores muito próximos de
coeficiente de massividade.
2.4.13 Coeficiente orográfico
O coeficiente orográfico é o produto da altura média pelo coeficiente de massividade. O
coeficiente orográfico permite fazer a distinção de situações em relação às quais o coeficiente de
massividade dá indicações dúbias. Admite-se que a fronteira entre relevo pouco acentuado e
relevo acentuado é marcado pelo valor do coeficiente oregráfico igual a 6. O coeficiente
orográfico da bacia do rio Malema é de 44.

Manual de Hidrologia
Caracterízação duma bacia hidrográfica

Figura 2.13 Curva hidrodinâmica do rio Malema e alguns
afluentes

Manual de Hidrologia

2-18
Caracterízação duma bacia hidrográfica

2-19

Figura 2.14 Curvas do potencial fluvial bruto da bacia do rio
MalemaCARACTERÍSTICAS DE GEOLOGIA, SOLOS E VEGETAÇÃO
A geologia duma bacia hidrográfica e o tipo de solos dela resultante têm uma grande influência
no movimento da água na bacia, em particulação no que toca ao escoamento, superfical e
subterrâneo.
A geologia define a existência de formações permeáveis e impermeáveis e de aquíferos bem
como a forma como os aquíferos são alimentados e contribuem para alimentar o escoamento dos
rios. A geologia condiciona a localização do nível freático que tem grande importância para o
fenómeno da evapotranspiração. Os rios que comunicam com importantes lençóis freáticos são
normalmente rios perenes, com caudais significativos mesmo durante as estiagens.
O tipo de solos e das camadas geológicas superficiais condicionam fortemente a permeabilidade
dos terrenos e, consequentemente, a infiltração, fenómeno que está na base da recarga dos
aquíferos. Terrenos pouco permeáveis dão origem a que toda a precipitação se transforme
rápidamente em escoamento superficial, gerando por isso cheias mais intensas e de menor
duração.
A geologia e os solos duma bacia são também importantes factores condicionantes da erosão
superficial. As formações mais recentes (do Holoceno e Pleistoceno) assim como formações
calcáreas e graníticas muito alteradas são as mais fácilmente erodíveis. A erosão superficial nos
terrenos da bacia hidrográfica constitui a fonte do caudal sólido que tem de ser transportado pelo
rio.
A cobertura vegetal também tem bastante importância para os fenómenos hidrológicos. Duma
maneira geral, terrenos com florestas e matas têm maiores infiltrações e menores velocidade de
escoamento superficial do que terrenos nus ou cultivados. Isso ajuda a diminuir a erosão
superficial dos terrenos e origina cheias mais prolongadas e menos intensas. Por outro lado, o
tipo de vegetação influencia fortemente o fenómeno de evapotranspiração.
A geologia, os solos e a vegetação têm importância não apenas em grandes bacias hidrográficas
mas mesmo em pequenas bacias urbanas, como é evidenciado pelos grandes problemas de
erosão que se verificam em algumas das principais cidades de Moçambique como Maputo,
Nampula, Nacala e Pemba.

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3
3.1

3-1

REVISÃO DE CONCEITOS DE PROBABILIDADES E
ESTATÍSTICA
DEFINIÇÕES

Uma variável aleatória χ é um variável que toma valores não resultantes de processos e leis
físicas ou relações matemáticas bem determinadas, sendo por isso atribuídos à sorte (acaso). Por
exemplo: o número de pontos no lançamento dum dado.
Uma variável aleatória pode ser discreta ou contínua. É discreta se só pode tomar valores
descontínuos, por exemplo, o número de dias de chuva num ano. A variável aleatória diz-se
contínua quando, num determinado intervalo de valores, limitado ou não, puder tomar qualquer
valor desse intervalo, por exemplo, a precipitação anual.
A população Ω é o conjunto de todos os valores que podem ser assumidos por uma variável
aleatória. Designa-se por amostra a parte observada da população.
Um acontecimento Ai é qualquer subconjunto da população.
A frequência (ou frequência relativa) dum acontecimento Ai é definida por f = n/N em que n é
o número de vezes em que o acontecimento Ai ocorre e N o tamanho da amostra. Por exemplo,
se há um registo de 10 anos de precipitação e se considera o acontecimento de Pano > 1200 mm,
pode acontecer que tal acontecimento ocorra 2 vezes na amostra, então f = 2/10 = 0.2.
A probabilidade P dum acontecimento Ai é P(Ai) = limN→∞f
A moderna teoria das probabilidades baseia-se numa axiomática desenvolvida por Kolmogorov
da qual se deduzem as seguintes consequências:
P(Ai) ≥ 0;
P(Ω) = 1;
P(A ∪ B) = P(A) + P(B) - P(A ∩ B);
P(A ∩ B) = P(A | B) x P(B) = P(B|A) x P(A);
Se P(A ∩ B) = P(A) x P(B), os acontecimentos são independentes.

3.2

FUNÇÕES DE DISTRIBUIÇÃO, DURAÇÃO E DENSIDADE DE PROBABILIDADE

Considere-se uma amostra de N valores duma variável aleatória e classifique-se essa amostra por
ordem crescente:
x1 ≤ x2 ≤ ... ≤ xN
A probabilidade de que a variável aleatória χ assuma um valor não superior a xi é
P (χ ≤xi) = i/N = F(xi)
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-2

F(xi) é a função de distribuição empírica (FDE).
Se se classificar a amostra por ordem decrescente:
x1 ≥ x2 ≥ ... ≥ xN
A probabilidade de que a variável aleatória χ assuma um valor não inferior a xi é
P (χ ≥xi) = i/N = G(xi)
G (xi) é a função de duração.
Note-se que P(χ ≤xi) + P (χ ≥xi) = P (χ ≤xi) + P(χ >xi) + P(χ =xi) = 1 + P (χ = xi) = F(xi) + G(xi)
Para variáveis aleatórias contínuas, P (χ =xi) = 0 ⇒ F(x) + G(x) = 1
Para variáveis aleatórias discretas, F(x) + G(x) = 1 + P(χ =xi)
Para uma variável aleatória contínua, define-se a função densidade de probabilidade f(x):
dF(x)
f(x) =
dx

f ( x ) = Pr ob( x −

dx
dx
≤χ ≤ x+ )
2
2

Há definições paralelas para as variáveis aleatórias discretas.

Figure 3.1 Funções de distribuição, duração e densidade de probabilidade

A figura 3.1 ilustra as relações entre F(x), G(x) e f(x) para uma variável aleatória contínua.
Pode verificar-se teoricamente que o estimador i/N para a probabilidade do acontecimento (χ ≤
xi) é um estimador com viez, i.e., quando a dimensão da amostra cresce indefinidamente o valor
do estimador não tende para o valor correcto da probabilidade. Assim, é preferível utilizar para
as funções de distribuição e de duração.
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-3

F (xi) = Prob (x ≤xi) = i/N+1
G (xi) = Prob (x ≥xi) = i/N+1

3.3

PERÍODO DE RETORNO E RISCO HIDROLÓGICO

Considere-se uma série de 50 valores, por exemplo de precipitação anual, ordenados por ordem
crescente. O valor de ordem i = 41 é igualado ou excedido 10 vezes na série correspondendo-lhe
uma probabilidade de não excedência F = 0.804. O intervalo médio entre ocorrências
sucessivas do acontecimento (χ ≥x41) seria então de cerca de 5 anos. Este intervalo médio entre
ocorrências sucessivas dum acontecimento é designado por período de retorno T.
O período de retorno do acontecimento (χ ≥xi) relaciona-se com a probabilidade de excedência,
G(xi), ou de não excedência, F(xi), pelas expressões:
T(xi) = 1 / G(xi) = 1 / {1-F(xi)}
Assim, no exemplo anteriormente referido, ter-se-ia
F(x41) = P(χ ≤x41) = 0.804
G(x41) = P(χ ≥x41) = 0.196
T(x41) = 1 / 0.196 ≈ 5 anos
Importa deixar bem claro que o conceito de período de retorno não está associado a qualquer
ideia de repetição cíclica e regular do acontecimento. Se, por exemplo, um acontecimento tem
um período de retorno de 10 anos, isso não quer dizer que tal acontecimento ocorre regularmente
de 10 em 10 anos: ele pode ocorrer em dois anos consecutivos assim como pode não ocorrer
durante trinta anos. Se, porém, dispusermos duma série suficientemente longa, então o intervalo
médio entre ocorrências consecutivas do acontecimento seria de 10 anos.
Considere-se agora o acontecimento (χ ≥x) com uma probabilidade de ocorrência G(x)
relativamente baixa. A probabilidade de não ocorrência do acontecimento em 2 anos sucessivos
será [F(x)]2 e a de não ocorrência em N anos sucessivos será [F(x)]N.
Então, a probabilidade de que o acontecimento ocorra pelo menos uma vez em N anos
sucessivos será dada por 1-[F(x)]N. Essa probabilidade designa-se por risco hidrológico R(x, N),
conceito com bastante interesse prático como se pode ver pelos exemplos seguintes.
1º Exemplo) Uma barragem levará 6 anos a ser construída. A sua construção far-se-á com a
protecção de ensecadeiras e desvio do rio através de galerias (como se fez, por exemplo, com a
barragem de Cahora-Bassa). Se adoptar como caudal de dimensionamento das galerias o
correspondente a uma cheia com o período de retorno T = 20 anos, qual é a probabilidade das
ensecadeiras serem galgadas durante a construção?
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-4

A probabilidade de galgamento durante a construção corresponde à situação de insuficiência das
galerias de desvio para passagem o caudal afluente. A probabilidade pedida é, pois, o risco
hidrológico do acontecimento (Qafl > Q20) para N = 6:
R = 1 - F(x)6 = 1 - [1 - G(x)]6 = 1 - [1 - 1/T(x)]6
Como T = 20, R = 0.265.
A probabilidade de galgamento durante a construção é de 0.265, ou seja, aproximadamente 1
possibilidade em 4.
2º Exemplo) Se no exemplo anterior se pretender que a probabilidade de galgamento das
ensecadeiras durante a construção (i.e., o risco hidrológico) não exceda 10%, qual deverá ser o
caudal de dimensionamento das galerias?
R = 0.10 = 1 - [1 - 1/T(x)]6 ⇒ T = 57.4 ≈ 60 anos.
As galerias deveriam ser dimensionadas para um caudal com um período de retorno de cerca de
60 anos.

3.4
3.4.1

PARÂMETROS ESTATÍSTICOS DA POPULAÇÃO E DA AMOSTRA

Introdução

Na Estatística, a população ou a amostra com que se está a lidar são representadas por um
número relativamente pequeno de parâmetros estatísticos. Trata-se de uma forma sintética de
apresentar as principais características da população ou da amostra, em relação às quais interessa
definir:
- a tendência central;
- a dispensão;
- a assimetria;
- os quantis.

3.4.2

Momentos da população e da amostra

Define-se momento de ordem r em relação à origem como

µ =
'
r

-∞

∫x

+∞

Manual de Hidrologia

r

⋅ f ( x )dx

para a população
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

m r' =

1
N

N

∑x
i =1

r
i

3-5

para a amostra

A média da população, µ, ou da amostra, x , são os momentos de ordem 1 em relação à origem:

µ = µ1'
x = m1'
Define-se momento centrado de ordem r como o momento de ordem r tomando a média como
origem:
-∞

µ r = ∫ (x - µ )r f(x) ⋅ dx

para a população

+∞

N

∑( x - x )

r

i

mr =

3.4.3

i=1

para a amostra

N

Tendência central

Os parâmetros que caracterizam a tendência central indicam à volta de que valor se distribuem os
valores da população ou da amostra.
Os parâmetros mais utilizados são a média µ ou x e a mediana , xm .
A média da população e da amostra são dadas respectivamente por

µ=

+∞

∫ x f(x) dx

-∞

x=

1
N

N

∑x
i =1

i

A mediana é o valor que divide a população ou a amostra em duas
partes de igual probabilidade acumulada. Para uma população, a mediana é definida tal que:
µ

∫

-∞

∞

f(x) dx = ∫ f(x) dx = 0.5
µ

Para uma amostra a mediana, xm é definida tal que (amostra ordenada)
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

-

3-6

se N ímpar, m = int(N/2) + 1

por exº: N=25 ⇒ m=13
-

se N par:

1
x m = (x N + x N )
+1
2
2
2

por exemplo, se N=24, xm = (x12 + x13)/2
3.4.4

Dispersão

Os parâmetros que caracterizam a dispersão indicam se os elementos da população ou da
amostra estão muito ou pouco concentrados em torno da média. Os parâmetros mais utilizados
são:
- Variância σ2, s2;
- Desvio padrão σ, s;
- Coeficiente de variação ηv, cv.
A variância é o momento centrado da 2ª ordem:
-∞

σ =
2

∫ (x - µ )

2

+∞
N

2
s =

∑ ( xi - x )2
i=1

N

f(x)dx
N

∑ ( xi - x )2
N
*
= i=1
N -1
N -1

N/N-1 é um factor de correcção do viez. Diz-se que um estimador dum parâmetro apresenta viez
quando o seu valor não tende para o valor correspondente da população quando a dimensão da
amostra cresce indefinidamente.
O desvio padrão é a raiz quadrada da variância. Note-se que o desvio padrão é expresso nas
mesmas unidades que a média e que os elementos da amostra ou da população.
O coeficiente de variação é a relação entre o desvio padrão e a média:
σ
s
ηv =
cv =
µ
x
É um parâmetro adimensional.
A figura 3.2 apresenta duas séries com as mesmas médias mas com diferentes desvios padrão.

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-7

Figure 3.2 Distribuições do mesmo tipo, com s mesmas média e
variâncias diferentes
3.4.5

Assimetria

As populações e as amostras (e as distribuições que as caracterizam) podem ser simétricas
(assimetria nula) ou assimétricas (assimetria positiva ou negativa). A figura 3.3 apresenta três
distribuições com assimetria nula, negativa e positiva.

Figure 3.3 Distribuições com diferentes assimetrias

Quando a assimetria é nula, a média e a mediana coincidem; quando a assimetria é positiva, a
média é superior à mediana e, quando é negativa, a média é inferior à mediana. A média é muito
mais influenciada pelos valores extremos que a mediana.
O parâmetro que caracteriza a assimetria é o coeficiente de assimetria, γ ou g, que é o momento
centrado de 3ª ordem transformado em parâmetro adimensional pela divisão por σ3.
+∞

∫ (x - µ )

3

γ=

f(x) dx

-∞

σ3
N

g=

∑ ( xi - x )3
i=1

Manual de Hidrologia

Ns

3

N

2

*

N
=
(N - 1)(N - 2)

∑( x - x )

3

i

i=1

s

3

*

N
(N - 1)(N - 2)
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-8

N2/{(N-1)(N-2)} é o factor de correcção do viez.

3.4.6

Quantis

O quantil da ordem p é o valor ξp ou xp definido por:
ξp

ξ p = ∫ f(x) dx = p
-∞

Numa amostra ordenada o quantil xp é o valor de ordem j = N * p.
0≤p≤1
A mediana é o quantil de ordem 0.5.

3.5
3.5.1

AJUSTAMENTO DUMA AMOSTRA A UMA DISTRIBUIÇÃO TEÓRICA

Metodologia

A partir duma dada amostra é possível definir a sua função de distribuição empírica. A FDE é, no
entanto, afectada pela dimensão limitada da amostra e, por outro lado, não permite extrapolar
para períodos de retorno superiores à duração da amostra.
Por essa razão, faz-se o ajustamento da amostra a uma função de distribuição teórica (ou lei de
probabilidades ou simplesmente distribuição), procurando-se de entre as várias que têm sido
propostas aquela que melhor se adapte à FDE.
A sequência de cálculo que se adopta para a extrapolação de valores com altos períodos de
retorno, necessários para o dimensionamento de obras hidráulicas, é então a seguinte:
-

selecção de uma de entre as distribuições teóricas;
especificação ou ajustamento da distribuição;
avaliação do ajustamento;
utilização da distribuição para a previsão de valores (extrapolação).

As distribuições teóricas mais utilizadas em Hidrologia são a Normal (ou de Gauss), a LogNormal de 2 parâmetros (Lei de Galton), a Log-Normal de 3 parâmetros, a de Gumbel, a Gama,
a Pearson tipo III e a Log-Pearson tipo III. Neste capítulo apenas se estudará a distribuição
Normal, estudando-se algumas das restantes no capítulo dedicado às cheias.
A especificação ou ajustamento da distribuição consiste na estimação dos respectivos
parâmetros a partir da informação contida na amostra. Existem diversos métodos para fazer o
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-9

ajustamento sendo os mais correntes o método dos momentos, o método da máxima
verosimilhança e o método dos mínimos quadrados. Embora nem sempre seja o mais eficiente,
ir-se-á estudar apenas o método dos momentos que é o de mais simples aplicação.
A estimação pelo método dos momentos consiste em seleccionar os valores dos m parâmetros
da distribuição por forma a que os primeiros m momentos da distribuição sejam iguais aos
correspondentes momentos da amostra.
3.5.2

Distribuição Normal ou de Gauss

A distribuição Normal é a lei de probabilidades que melhor tem sido estudada do ponto de vista
teórico. Tem um enorme campo de aplicação não apenas em Hidrologia mas em muitas outras
áreas de Engenharia como a caracterização de solicitações em estruturas ou o controle de
qualidade dos materiais.
A função densidade é:
f(x) =

-(x -b )2
1
e 2a 2
a 2π

A função de distribuição é:
x

F(x) = ∫ f(x) dx

f(x) =

-∞

dF(x)
dx

A distribuição é simétrica, não sendo integrável analíticamente. F(x) é obtida por integração
numérica e dada em tabelas. A distribuição tem 2 parâmetros: a, b.
Os momentos da distribuição são obtidos em função dos parâmetros:
-

média µ = b;
variância σ2 = a2;
coeficiente de assimetria γ = 0.

Por tal razão, é frequente escrever a expressão de f(x) substituindo a, b, por σ e µ:
f(x) =

-(x - µ )2
1
e 2σ 2
σ 2π

Demonstra-se que a distribuição Normal goza da propriedade de invariância linear: Se x é uma
variável aleatória com distribuição Normal, média µx e desvio padrão σx, então y = c1x + c2 é
também uma variável aleatória normal, com média µy = c1µx + c2 e desvio padrão σy= c1σx.

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-10

As tabelas da distribuição Normal são construídas para uma variável z, variável normal
reduzida, definida por
z = (x – µx)/σx
Com esta definição e atendendo à propriedade da invariância linear da distribuição Normal, é
imediato que µz = 0 e σz = 1. Diz-se então que z é uma variável N(0,1).
A tabela 3.1, reproduzida de Lencastre e Franco (1984), dá os valores de F(z) para z de 0.00 a
3.49 em intervalos de 0.01. Atendendo à simetria da distribuição, a tabela permite obter valores
de F(z) para –3.49 ≤ z ≤ 0.

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-11

Lei Normal ou de Gauss Função de distribuição (µ=0; σ= 1)
Z
0

0
0.5

0.01
0.504

0.02
0.508

0.03
0.512

0.04
0.516

0.05
0.5199

0.06
0.5239

0.07
0.5279

0.08
0.5319

0.09
0.5359

0.1
0.2
0.3
0.4

0.5398
0.5793
0.6179
0.6554

0.5438
0.5832
0.6217
0.6591

0.5478
0.5871
0.6255
0.6628

0.5517
0.591
0.6293
0.6664

0.5557
0.5948
0.6331
0.67

0.5596
0.5987
0.6368
0.6736

0.5636
0.6026
0.6406
0.6772

0.5675
0.6064
0.6443
0.6808

0.5714
0.6103
0.648
0.6844

0.5753
0.6141
0.6517
0.6879

0.5
0.6
0.7
0.8
0.9

0.6915
0.7257
0.758
0.7881
0.8159

0.695
0.7291
0.7611
0.791
0.8186

0.6985
0.7324
0.7642
0.7939
0.8212

0.7019
0.7357
0.7673
0.7967
0.8238

0.7054
0.7389
0.7704
0.7995
0.8264

0.7088
0.7422
0.7734
0.8023
0.8289

0.7123
0.7454
0.7764
0.8051
0.8315

0.7157
0.7486
0.7794
0.8078
0.834

0.719
0.7517
0.7823
0.8106
0.8365

0.7224
0.7549
0.7852
0.8133
0.8389

1
1.1
1.2
1.3
1.4

0.8413
0.8643
0.8849
0.9032
0.9192

0.8438
0.8665
0.8869
0.9049
0.9207

0.8461
0.8686
0.8888
0.9066
0.9222

0.8485
0.8708
0.8907
0.9082
0.9236

0.8508
0.8729
0.8925
0.9099
0.9251

0.8531
0.8749
0.8944
0.9115
0.9265

0.8554
0.877
0.8962
0.9131
0.9279

0.8577
0.879
0.898
0.9147
0.9292

0.8599
0.881
0.8997
0.9162
0.9306

0.8621
0.883
0.9015
0.9177
0.9319

1.5
1.6
1.7
1.8
1.9

0.9332
0.9452
0.9554
0.9641
0.9713

0.9345
0.9463
0.9564
0.9649
0.9719

0.9357
0.9474
0.9573
0.9656
0.9726

0.937
0.9484
0.9582
0.9664
0.9732

0.9382
0.9495
0.9591
0.9671
0.9738

0.9394
0.9505
0.9599
0.9678
0.9744

0.9406
0.9515
0.9608
0.9686
0.975

0.9418
0.9525
0.9616
0.9693
0.9756

0.9429
0.9535
0.9625
0.9699
0.9761

0.9441
0.9545
0.9633
0.9706
0.9767

2
2.1
2.2
2.3
2.4

0.9772
0.9821
0.9861
0.9893
0.9918

0.9778
0.9826
0.9864
0.9896
0.992

0.9783
0.983
0.9868
0.9898
0.9922

0.9788
0.9834
0.9871
0.9901
0.9925

0.9793
0.9838
0.9875
0.9904
0.9927

0.9798
0.9642
0.9878
0.9906
0.9929

0.9803
0.9846
0.9881
0.9909
0.9931

0.9808
0.985
0.9884
0.9911
0.9932

0.9812
0.9854
0.9887
0.9913
0.9934

0.9817
0.9857
0.989
0.9916
0.9936

2.5
2.6
2.7
2.8
2.9

0.9938
0.9953
0.9965
0.9974
0.9981

0.994
0.9955
0.9966
0.9975
0.9982

0.9941
0.9956
0.9967
0.9976
0.9982

0.9943
0.9957
0.9968
0.9977
0.9983

0.9945
0.9959
0.9969
0.9977
0.9984

0.9946
0.996
0.997
0.9978
0.9984

0.9948
0.9961
0.9971
0.9979
0.9985

0.9949
0.9962
0.9972
0.9979
0.9985

0.9951
0.9963
0.9973
0.998
0.9986

0.9952
0.9964
0.9974
0.9981
0.9986

3
3.1
3.2
3.3
3.4

0.9987
0.999
0.9993
0.9995
0.9997

0.9987
0.9991
0.9993
0.9995
0.9997

0.9987
0.9991
0.9994
0.9995
0.9997

0.9988
0.9991
0.9994
0.9996
0.9997

0.9988
0.9992
0.9994
0.9996
0.9997

0.9989
0.9992
0.9994
0.9996
0.9997

0.9989
0.9992
0.9994
0.9996
0.9997

0.9989
0.9992
0.9995
0.9996
0.9997

0.999
0.9993
0.9995
0.9996
0.9997

0.999
0.9993
0.9995
0.9997
0.9998

Tabela 3.1 – Função de distribuição Normal ou de Gauss
— Para volores negativos de z,
utilizar o complemento aritmético para 1 dos volores
F (z) correspondentes ao volor positivo:
F(-z)= 1 – F (z)

de

Ex.: F (- 1) = 1 - F(1) = 1 -0,8413=0,1587
— Para valores de F (z) < 0,5,

calcular 1 - F [z], ler

o valor de z e afectar esse valor

de sinal negative.
Ex.: F |z]= 0,0668; 1 - F (z] = 0,9332; z=-l,5

Esta tabela pode ser utilizada para qualquer distribuição Normal mesmo que não tenha µ=0 e
σ=1, bastando para isso fazer a transformação (x-µx)/σx. Da tabela tira-se que as probabilidades
de x estar entre µ+σ e µ-σ; µ+2σ e µ-2σ; µ+3σ e µ-3σ são respectivamente de 68.3%, 95.4% e
99.7%. As probabilidades de 90%, 95% e 99% correspondem aos intervalos µ ± 1.645σ, µ ±
1.96σ, µ ± 2.575σ.
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-12

Existem métodos analíticos para testar se o ajustamento duma série à Distribuição Normal (ou a
outra distribuição teórica) é aceitável. Estes métodos, como o teste do qui-quadrado e o de
Kolmogorov-Smirnov, serão vistos no capítulo dedicado à estatística de cheias. Um processo
também muito utilizado para verificar se o ajustamento é aceitável é a utilização de papel de
probabilidade, papel com os eixos construidos de tal maneira que, se uma série se ajusta bem à
distribuição representada nesse papel, os seus pontos alinham-se aproximadamente segundo uma
recta. Os pontos têm coordenadas (F(xi), Yi) em que F(xi) é o probabilidade de não excedência
do valor i da série ordenada em ordem crescente ("plotting position") e Yi o valor i da série.
Existem muitas expressões para o cálculo da "plotting position":
-

Califórnia
Hazen
Weibull
Chegadayev
Blom
Tukey

i/N;
(2i-1)/2N;
i/(N+1);
(i-0.3)/(N+0.4);
(i-0.375)/(N+0.25);
(3i-1)/(3N+1).

A fórmula mais eficiente e a mais utilizada é a de Weibull.

3.6
3.6.1

CORRELAÇÃO E REGRESSÃO LINEARES

Correlação e regressão linear simples

A correlação e regressão lineares constituem uma das ferramentas mais utilizadas em Hidrologia,
essencialmente para:
- preencher falhas numa série de registos;
- estender uma série hidrológica a partir de outras mais longas.
A figura 3.4 representa genéricamente o domínio das variáveis aleatórias x e y com funções de
distribuição de probabilidade respectivamente f(x) e g(y).

Figure 3.4 Correlação entre duas variáveis aleatórias

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-13

Ter-se-á então:
dx
dx
≤ x ≤ x + ) = P(x) = f(x)dx
2
2
P(y) = g(y)d(y)
dx
dx
dy
dy
P(x ≤ x ≤ x+ ∩ y ≤ y ≤ y + ) = P(x, y) = f(x)g(x)dx dy
2
2
2
2
acontecimentos forem independentes.
P(x -

se os

Se os acontecimentos não forem independentes, diz-se que há entre as varáveis uma dependência
estocástica. Quando essa dependência é linear, ela é medida pelo coeficiente de correlação
linear ρxy:
y x

ρ xy =

∫ ∫ (x - µ

x

)(y - µ y ) f(x)g(y) dxdy

N

r xy =

para a população;

σ xσ y

∑ ( xi - x )( yi - y )
i=1

(N - 1) s x s y

N

∑ x y - Nxy
i

=

i

i=1

(N - 1) s x s y

para a amostra.

Demonstra-se que rxy, ρxy ≤ 1. Quando o coeficiente de correlação iguala a unidade, a
correlação é perfeita e os pontos (x,y) alinham-se segundo uma recta. Quando a apresentação
dos pontos (x,y) sugere uma "nuvem" (figura 3.5), o coeficiente de correlação aproxima-se de
zero.

Figure 3.5 Coeficiente de correlação

O coeficiente de correlação exprime o grau de associção, mais ou menos elevado, entre duas
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-14

variáveis aleatórias. Quando a correlação é elevada, pode estabelecer-se uma regressão linear
duma variável (dependente) sobre a outra (independente), isto é, tentar explicar a variação da
variável dependente como uma função linear da variação da variável independente. Por exemplo,
pode tentar-se estabelecer uma regressão linear do escoamento anual numa bacia em função da
precipitação ponderada sobre a bacia.

Figure 3.6 Regressão linear

A expressão da regressão linear é y = ax + b em que a,b são os coeficientes da regressão (figura
3.6), determinados pelo método dos mínimos quadrados.
Como se sabe, o método dos mínimos quadrados determina os coeficientes por forma a
minimizar a soma dos quadrados dos desvios. Designando por y a estimativa de y fornecida pela
^
regressão linear, ter-se-á:
= Σi (yi –y i)2 = Σi [yi – (axi + b)]2
^
= Σi [yi2 – 2 axiyi – 2 byi + (axi + b)2]
= Σi [yi2 – 2 axiyi – 2 byi + a2xi2 + 2axib + b2]

Z

Escolhe-se a e b para ter o Zmínimo
Zmin. ⇒ δZ/δa = 0 e δZ/δb = 0.
δZ/δa = - 2 Σi xiyi + 2 Σi axi2 + 2 Σi b xi = 0;
δZ/δb = - 2 Σi yi + 2 Σi axi + 2 Σi b = 0,

1007
e

chegando-se às equações normais.
N

a=

∑x

i

yi - N x y

i=1
N

∑x

2
i

i=1

b= y - ax

Manual de Hidrologia

- N x2
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-15

É fácil de ver que a = rxy sy/sx.
Chama-se erro padrão da estimativa, se, ao desvio padrão dos resíduos
ˆ
ei = y i - y i

ˆ
Como y = y , e = 0.
Pode verificar-se a seguinte relação entre sy e se:
se2 = sy2 (1-rxy2)
Esta relação evidencia como a variância residual varia com o coeficiente de correlação. Quando
a correlação é perfeita, r=1, os pontos alinham-se todos segundo uma recta e a variância residual
ou variância não explicada pela regressão é nula. À medida que r diminui, se2 vai tendendo para
sy2, ie, a regressão “explica” cada vez menos a variância de y.
Na expressão de se2 é conveniente introduzir um factor de correcção do viez:
se2 = (1-r2) sy2 (N-1)/(N-2).
A variância explicada pela regressão é
2
2
s y = s y r2
ˆ
Se, por exemplo, r = 0.80, a regressão explica 64% da variância total de y.
O coeficiente de determinação, cd, dá a percentagem da variância total que é explicada pela
regressão. Então cd = r2.
Importa notar que, normalmente, a regressão de y sobre x não coincide com a regressão de x
sobre y. Isso só acontece se sy = sx.
Por outro lado, interessa ter uma regra prática que indique quando é que vale a pena utilizar
regressão linear, ou seja, qual o limite inferior para o coeficiente de correlação. Chow (1964)
sugere que se pode usar regressão linear quando r > 0.60, o que corresponde a explicar cerca
de 1/3 da variância de y através da regressão. Talvez seja preferível, no entanto, adoptar como
limite inferior para r um valor um pouco mais alto como 0.70 (cerca de metade da variância
de y explicada pela regressão) ou 0.80 (variância explicada é cerca de 2/3 da variância total).
Para além disso, importa sempre ver se há uma base física para o estabelecimento da regressão
afim de evitar as correlações espúrias (fruto do acaso, do tamanho limitado da amostra ou da
transformação de variáveis).
Exemplo: Considerem-se as séries de precipitações anuais nos postos udométricos P621 e P705,
ambos situados na bacia do rio Monapo. Pretende-se estender as duas séries.

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-16

Ano

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

P621 (mm)

1162

1069

957

1058

1108

1155

805

936

921

732

P705 (mm)

-

-

-

-

-

-

-

-

-

600

Ano

11

12

13

14

15

16

17

18

19

20

P621 (mm)

858

1094

1027

1139

1047

972

1212

1354

876

-

P705 (mm)

923

1087

1166

1064

1298

931

1121

1249

697

976

Ano

21

22

23

24

25

26

27

28

P621 (mm)

-

-

-

-

-

-

-

-

P705 (mm)

1316

766

1129

1187

794

1125

890

880

A série P621 tem 19 valores e a P705 também tem 19 valores, sendo o período comum de 10
anos. Pretende-se estender a série P705 para os primeiros nove anos por regressão sobre P621 e
estender esta para os últimos nove anos por regressão sobre P705.
Tomando o período de 10 anos comuns (anos 10 –19), obtem-se :
variável x (P621): x = 1031 mm; sx = 183 mm.
variável y (P705): x = 1014 mm; sy = 227 mm.
r = 0.80 ; cd = 0.64
Então a regrassão irá explicar 64% de sy2
A regressão linear de y sobre x dá a seguinte equação:
y = 1.01x – 28,
donde se podem obter os valores de y (≡ P705) para os primeiros 9 anos:
1146 / 1052 / 939 / 1041 / 1091 / 1139 / 785 / 917 / 902.
A variância residual é se2 = sy2 (1-r2) = 18,550 ⇒ se = 136.
Para estender agora a série P621 para os últimos 9 anos, estabelece-se uma outra regressão
linear:
x = cy + d, mantendo-se x ≡ P621 e y ≡ P705.
O coeficiente de correlação é óbviamente o mesmo. Obtém-se x = 0.65y + 372 (note-se o
afastamento entre as duas rectas de regressão na figura 8.7).

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-17

Os valores de P621 para os últimos 9 anos serão:
1007 / 1228 / 870 / 1106 / 1144 / 888 / 1104 / 951 / 944
A variância residual é se2 = 1832(1- 0.82) = 12,056 ⇒ se = 110.

Figure 3.7 Exemplo de regressão linear simples

Um aspecto importante a notar quando se utiliza regressão linear para estimar um número grande
de valores em falta é que a variância da série estendida se reduz em relação à série original,
devido ao facto da regressão não entrar com a variância residual (os valores estimados situam-se
sobre a recta de regressão e não à volta dela). Por exemplo, para a série P705 o desvio padrão da
série original (19 valores) é 205 enquanto a série estendida é 180. A média praticamente não
varia (de 1010 para 1008). Assim as características estatísticas da série mudam, o que não é
desejável.
Para obviar a esse inconveniente, pode-se modificar a expressão da regressão linear para:
y = ax + b + s e z = ax + b + s y 1 - r 2 z
A nova parcela é uma componente aleatória, obtida por multiplicação do erro padrão da
estimativa por uma variável aleatória z ≡ N(0,1). É possível obter sucessivos valores de z
recorrendo a uma tabela de números aleatórios ou utilizando rotinas de computador (gerador de
numeros aleatórios). Esta parcela adicional faz com que a variância de y se mantenha (coloca os
pontos fora da recta de regressão).

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-18

Não é possível nestas notas introdutórias aprofundar este tema que é, no entanto, extremamente
importante por ser a base dos chamados modelos autoregressivos de geração sintética.
3.6.2

Transformação de variáveis

Considere-se o exemplo representado na figura 3.8. O coeficiente de correlação anteriormente
definido é uma medida da associação linear entre x e y. Se se fizesse a sua determinação para o
exemplo da figura 3.8, obter-se-ia um valor baixo embora o gráfico evidencie que x e y estão
fortemente associados.

Figure 3.8 Correlação e regressão não lineares

Em situações como esta, uma transformação das variáveis x e y permite mudar uma associação
não linear para uma associação linear a que se podem aplicar as técnicas de correlação e
regressão lineares descritas no tópico anterior. A transformação mais correntemente utilizada em
Hidrologia é a logarítmica que pressupõe que x e y estariam ligados por uma relação do tipo:
y = axb,
que, logaritmizada, origina:
ln(y) = ln(a) + b ln(x),
ou seja, uma relação linear entre os logarítmos de x e y. Pode dar-se como exemplo a equação da
curva de recessão dum rio alimentado por um aquífero, Qt = Qo e -αt.
3.6.3

Correlação e regressão lineares múltiplas

Quando se considera a associação apenas entre duas variáveis, x e y, a correlação e regressão
linear dizem-se simples. É possível, no entanto, generalizar o conceito para a associação entre
uma variável dependente, y, e m variáveis independentes x1, x2, x3, ......., xm.
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-19

A expressão da regressão linear múltipla é:
y = c0 + c1x1 + c2x2 + .... + cmxm.
Se o número de valores da amostra for N, m deve ser bastante inferior a N, não devendo como
regra prática exceder N/5. Pode-se então escrever:
y1 = c0 + c1x11 + c2x21 + .... + cmxm1
y2 = c0 + c1x12 + c2x22 + .... + cmxm2
................. etc.
yN = c0 + c1x1N + c2x2N + .... + cmxmN
Assim temos N equações com m+1 incógnitas (N > m+1), nomeamente c0, c1, c2, ...., cm.
Determinam-se os coeficientes c0, c1, c2, ...., cm de tal maneira que a soma dos quadrados dos
desvios entre y e a estimativa de y seja minimizada (método dos mínimos quadrados). Da mesma
maneira que no caso da regressão linear simples, minimiza-se o valor de
^
Σi (yi -y i)2 = Σi [yi - (c0 + c1x1i + c2x2i + .... + cmxmi)]2.
Assume-se que f(x1,x2,....,xm) = c0 + c1x1 + c2x2 + .... + cmxm.
Assim deve-se minimizar o valor de
z = Σi [yi - f(x1i,x2i,....,xmi)]2.
A minimização de z implica que as derivadas parciais de z em ordem aos ci se anulem. Obtem-se
assim m+1 equações lineares com m+1 incógnitas, as equações normais da regressão linear
múltipla. A sua resolução permite calcular os valores dos coeficientes da regressão.
As medidas de correlação linear múltipla mais utilizadas são o erro padrão dos resíduos, o
coeficiente de correlação múltipla, o coeficiente de determinação e os coeficientes de
correlação parciais.
Erro padrão dos resíduos

O erro padrão dos resíduos calcula-se da mesma forma que para a regressão linear simples:
ˆ
ei = y i - y i , e = 0
2
se =

N
N −1
∑ ei2
( N − 1) ⋅ ( N − m ) i =1

em que (N-1)/(N-m) é um factor de correcção do viez.
se2 dá a variançia residual ou não explicada.
Coeficiente de correlação múltipla
Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-20

O coeficiente de correlação múltipla, R, é definido como
sˆ
R= y
sy
Verifica-se imediatamente que se2 = (1-R2) sy2.
Coeficiente de determinação

O coeficiente de determinação, Cd = R2 dá a variância explicada em percentagem da variância
total de y.
Coeficientes de correlação parciais

Os coeficientes de correlação parciais ri medem o grau de associação de y com cada uma das
variáveis xi e determinam a parte da variância de y explicada por cada xi.
Para calcular um dado ri, começa-se por se determinar o coeficiente de correlação múltipla, R-i,
obtido sem incluir xi na regressão. Então:
2
- i2
2
= R R-2
ri
1 - R -i
R2 - R-i2 dá o acréscimo da variância explicada originado pela inclusão de xi na regressão.
Quanto maior for, maior será ri e mais importante a inclusão de xi na regressão.
A obtenção dos coeficientes de correlação parciais é trabalhosa mas bastante útil pois permite
excluir da regressão variáveis que não ajudam a aumentar a variância explicada.

Manual de Hidrologia
Revisão de conceitos de probabilidades e estatística

3-21

EXERCÍCIOS

1)

Calcule a média e o desvio padrão das seguintes séries de precipitações anuais (em 2
zonas diferentas).
Série 1: 805
Série 2:1014

903
1209

875
480

867
720

912
545

849
512

815
984

882
1444

Comente os resultados.
2)
Reactores nucleares, grandes barragens, diques altos, etc. devem ser projectados de tal
maneira que a probabilidade da sua danificação / galgamento seja da ordem de 1 vez em 10,000
anos (período de retorno de 10,000 anos).
a)
Calcule o risco de danos num reactor nuclear assim dimensionado nos primeiros 50 anos
do seu funcionamento.
b)
Repita o cálculo para um período de retorno de 1000 anos.
3)
Qual é o risco que um acontecimento com período de retorno de N anos ocorra (pelo
menos uma vez) em N anos.
4)
O valor da precipitação anual numa zona pode ser caracterizada pela distribuição
Normal. A precipitação anual média é de 723 mm. O desvio padrão é de 212 mm.
a)
b)
c)
d)
e)
f)

Calcule a probabilidade duma precipitação anual maior que 1000 mm.
Calcule a probabilidade duma precipitação anual menor que 300 mm.
Determine a precipitação com probabilidade de excedência de 1 e 10 %.
Determine a precipitação com probabilidade de não-excedência de 1 e 10 %.
Determine a precipitação com probabilidade de não-excedência de 50 %.
Determine a precipitação com período de retorno de 30 anos.

5)
Dada a seguinte série de 23 valores de precipitação anual num posto udométrico,
expressa em mm,
a)
Ajuste a distribuição Normal à série dada. Trace o gráfico em papel de probabilidade.
b)
Calcule a precipitação anual correspondente aos períodos de retorno de 10 e 50 anos.
c)
Determine os períodos de retorno teóricos a que correspondem as precipitações anuais de
1000 mm e 2015 mm (maior valor da série).
Série: 1803 1295 1118 1626 1120 1116 1473 1194 1016 1372 2015 1662 1549 1448
1753 1914 1422 1346 1092 1489 1397 1245 1219

Manual de Hidrologia
4
4.1

PRECIPITAÇÃO
ALGUNS ELEMENTOS SOBRE A CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA

Dos muitos processos meteorológicos ocorrendo contínuamento na atmosfera, a
precipitação e a evaporação, aqueles em que a atmosfera interactua com a água superficial,
são da maior importância para a Hidrologia.
Muita da água que precipita deriva da evaporação nos oceanos e do transporte a longa
distância pela circulação atmosférica. As duas forças motrizes fundamentais da circulação
atmosférica resultam da rotação da Terra e da transferência de energia entre o Equador e os
Polos.
A Terra recebe permanentemente calor do sol através da radiação solar e emite calor por reradiação ("back radiation") para o espaço. Estes processos estão balanceados em média ao
valor de 210 W/m2. O aquecimento da Terra é, no entanto, desigual: enquanto que, no
Equador, a radiação solar é quase perpendicular à superfície e tem um valor médio de cerca
de 270 W/m2, na região polar, ela atinge a superfície segundo um ângulo oblíquo e tem um
valor médio de apenas cerca de 90 W/m2.
A radiação emitida é uma função da temperatura absoluta da superfície, a qual varia pouco
entre o Equador e os Polos (mais cerca de 20% no Equador). Portanto, a radiação emitida
pela Terra é bastante mais uniforme do que a radiação recebida, provocando assim um
desequilíbrio. O equilíbrio é reposto essencialmente através da circulação atmosférica que
transfere energia do Equador para os Polos (valor médio de cerca de 4 * 109 MW).

Figura 4.1 Circulação numa terra imóvel
Se a Terra fosse uma esfera imóvel, a circulação atmosférica corresponderia à figura 4.1.
Junto do Equador haveria uma ascensão de massas de ar que viajariam na parte superior da
atmosfera em direcção aos Polos, arrefecendo e descendo para as camadas inferiores e
voltando para o Equador (a chamada “ circulação de Hadley”).
A rotação da Terra no sentido Oeste – Leste modifica este modelo simplificado de
circulação.
Se se considerar um anel de ar à volta do Equador, quando ele se move em direcção a um
Polo o seu raio diminui. Para manter o momento angular, a velocidade do ar em relação à
superfície da Terra aumenta, criando um vento com o sentido de Oeste para Leste. Passa-se
o oposto com um anel de ar que se move dum Polo para o Equador. Estes efeitos são o
resultado da chamada “ força de Coriolis”.
Na realidade e de acordo com os conhecimentos actuais, a circulação atmosférica é
caracterizada por três células em cada hemisfério : célula tropical, célula intermédia e célula
polar, figura 4.2.

Figura 4.2 Circulação atmosféica
Na célula tropical, o ar aquecido sobe no Equador, dirige-se para o Polo pela camada
superior da atmosfera, arrefece e desce para a superfície próximo da latitude 30º. Junto da
superfície divide-se em dois ramos, um seguindo em direcção ao Polo e o outro retornando
ao Equador. Na célula polar, o ar ascende próximo da latitude 60º, dirigindo-se para o Polo
pela camada superior da atmosfera. Depois arrefece, desce e regressa, próximo da superfície,
à latitude 60º.
A célula intermédia é o resultado da fracção das outras duas. Próximo da superfície, o ar
dirige-se para o Polo, originando ventos de Oeste.
A distribuição irregular das superfícies dos oceanos e dos continentes, com as
correspondentes diferenças de propriedades térmicas, cria uma variação especial adicional
na circulação atmosférica.
A mudança anual do Equador térmico devido á rotação da Terra à volta do Sol causa uma
correspondente oscilação no padrão de circulação das três células. Quando há uma grande
oscilação, as trocas de ar entre células vizinhas são mais frequentes e completas,
possívelmente resultando numa sequência de anos muitos húmidos. Quando a oscilação é
pequena, podem-se gerar centros estáveis de altas pressões próximos das latitudes 30º,
originando extensos períodos secos.
É preciso notar também que, enquanto na troposfera a temperatura decresce regularmente
com a altitude (a troposfera varia de cerca de 16 km de altura no Equador para cerca de 8
km nos Polos), junto à ionosfera (que separa a troposfera da estratosfera) há variações muito
bruscas de pressão e temperatura que produzem fortes correntes de ar, designadas como " jet
streams", com velocidades entre 15 e 50 m/s, que se mantêm em movimento durante
milhares de quilómetros e têm uma importante influência no movimento das massas de ar.
A circulação atmosférica é extremamente complexa pelo que só é possível apresentar uma
caracterização bastante genérica.
O estudo do transporte do vapor de água pela circulação atmosférica às várias altitudes
mostra que o seu fluxo é mais intenso na baixa atmosfera, com um máximo na vizinhança
de 1 km de altitude, sendo práticamente desprezável acima de 6 km de altitude. Para a
análise do fluxo de vapor de água, a Meteorologia utiliza os conceitos matemáticos de
divergência dum campo de vectores: quando há divergência do fluxo numa dada região,
isto significa que aí existe uma fonte de humidade, isto é, em média a evaporação excede a
precipitação; quando há convergência, há um sumidouro de humidade, ou seja, em média a
precipitação excede a evaporação.
Determinando os valores médios da divergência e da convergência ao longo de várias
latitudes (ver figura 4.3), verifica-se que em média, há:
•
•
•

convergência na zona equatorial, em que há grande precipitação;
convergência nas latitudes médias e elevadas;
divergência nas regiões subtropicais.
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia
Manual de aulas teoricas de hidrologia

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Aula Hidrologia - Método Racional
Aula Hidrologia - Método RacionalAula Hidrologia - Método Racional
Aula Hidrologia - Método RacionalLucas Sant'ana
 
Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)
Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)
Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)Gilson Adao
 
Escoamento Superficial
Escoamento SuperficialEscoamento Superficial
Escoamento SuperficialHidrologia UFC
 
Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais
Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais
Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais Hidrologia UFC
 
Os solos e climas de moçambique
Os solos e climas de moçambiqueOs solos e climas de moçambique
Os solos e climas de moçambiqueVakuva Jose
 
Aula de Hidrologia 03
Aula de Hidrologia 03Aula de Hidrologia 03
Aula de Hidrologia 03Ronaldo Cesar
 
Exercício de bomba e sistema de recalque
Exercício de bomba e sistema de recalqueExercício de bomba e sistema de recalque
Exercício de bomba e sistema de recalqueNatalia Ferreira
 
Glauco exercicios resolvidos (1)
Glauco exercicios resolvidos (1)Glauco exercicios resolvidos (1)
Glauco exercicios resolvidos (1)Amália Ribeiro
 
Hidrologia escoamento superficial
Hidrologia   escoamento superficialHidrologia   escoamento superficial
Hidrologia escoamento superficialmarciotecsoma
 
Aula 6 planejamento urbano e amb
Aula 6   planejamento urbano e ambAula 6   planejamento urbano e amb
Aula 6 planejamento urbano e ambGiovanna Ortiz
 
Exercicios resolvidos -_hidraulica_basic
Exercicios resolvidos -_hidraulica_basicExercicios resolvidos -_hidraulica_basic
Exercicios resolvidos -_hidraulica_basicGerson Justino
 
Mocambique, recussos minerais
Mocambique, recussos minerais Mocambique, recussos minerais
Mocambique, recussos minerais ArcenioNeM
 
Estudo de concepção de sistema de abastecimento de água
Estudo de concepção de sistema de abastecimento de águaEstudo de concepção de sistema de abastecimento de água
Estudo de concepção de sistema de abastecimento de águaluancaio_aguas
 

Mais procurados (20)

Pluviometria
PluviometriaPluviometria
Pluviometria
 
Aula04 precipitação
Aula04   precipitaçãoAula04   precipitação
Aula04 precipitação
 
Aula Hidrologia - Método Racional
Aula Hidrologia - Método RacionalAula Hidrologia - Método Racional
Aula Hidrologia - Método Racional
 
Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)
Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)
Aula 2 hidrologia( ciclo hidrologico)
 
Escoamento Superficial
Escoamento SuperficialEscoamento Superficial
Escoamento Superficial
 
Monografia Versao de defesa-2021.pdf
Monografia Versao de defesa-2021.pdfMonografia Versao de defesa-2021.pdf
Monografia Versao de defesa-2021.pdf
 
Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais
Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais
Propagação de Cheias (Parte 1) - Rios e Canais
 
Os solos e climas de moçambique
Os solos e climas de moçambiqueOs solos e climas de moçambique
Os solos e climas de moçambique
 
REDE DE DRENAGEM
REDE DE DRENAGEMREDE DE DRENAGEM
REDE DE DRENAGEM
 
Aula de Hidrologia 03
Aula de Hidrologia 03Aula de Hidrologia 03
Aula de Hidrologia 03
 
Exercício de bomba e sistema de recalque
Exercício de bomba e sistema de recalqueExercício de bomba e sistema de recalque
Exercício de bomba e sistema de recalque
 
Apostila alunos dreanagem
Apostila alunos dreanagemApostila alunos dreanagem
Apostila alunos dreanagem
 
Glauco exercicios resolvidos (1)
Glauco exercicios resolvidos (1)Glauco exercicios resolvidos (1)
Glauco exercicios resolvidos (1)
 
Aula 2
Aula 2Aula 2
Aula 2
 
Hidrologia escoamento superficial
Hidrologia   escoamento superficialHidrologia   escoamento superficial
Hidrologia escoamento superficial
 
Aula 6 planejamento urbano e amb
Aula 6   planejamento urbano e ambAula 6   planejamento urbano e amb
Aula 6 planejamento urbano e amb
 
Exercicios resolvidos -_hidraulica_basic
Exercicios resolvidos -_hidraulica_basicExercicios resolvidos -_hidraulica_basic
Exercicios resolvidos -_hidraulica_basic
 
Mocambique, recussos minerais
Mocambique, recussos minerais Mocambique, recussos minerais
Mocambique, recussos minerais
 
Aula método racional
Aula método racionalAula método racional
Aula método racional
 
Estudo de concepção de sistema de abastecimento de água
Estudo de concepção de sistema de abastecimento de águaEstudo de concepção de sistema de abastecimento de água
Estudo de concepção de sistema de abastecimento de água
 

Destaque

Manual de hidrologia básica (1)
Manual de hidrologia básica (1)Manual de hidrologia básica (1)
Manual de hidrologia básica (1)Grazi Ruas
 
Hidraulica basica condutos forcados
Hidraulica basica   condutos forcadosHidraulica basica   condutos forcados
Hidraulica basica condutos forcadosMayara Marques
 
Engenharia hidraulica r. j. houghtalen 4ª ed
Engenharia hidraulica   r. j. houghtalen 4ª edEngenharia hidraulica   r. j. houghtalen 4ª ed
Engenharia hidraulica r. j. houghtalen 4ª edGabriel Reis
 
Engenharia Civil - Letícia e Carol
Engenharia Civil - Letícia e Carol   Engenharia Civil - Letícia e Carol
Engenharia Civil - Letícia e Carol Jucemar Souza da Luz
 
3 lista de exercicios mod iv e v (1)
3 lista de exercicios mod iv e v (1)3 lista de exercicios mod iv e v (1)
3 lista de exercicios mod iv e v (1)Laryssa Maia
 
Apostila hidráulica aplicada - Engenharia Civil
Apostila hidráulica aplicada - Engenharia CivilApostila hidráulica aplicada - Engenharia Civil
Apostila hidráulica aplicada - Engenharia CivilBelquior Prado
 
Apostila escoamento em condutos forçados
Apostila escoamento em condutos forçadosApostila escoamento em condutos forçados
Apostila escoamento em condutos forçadosCarlos Argentoni
 
Apostila de Hidrologia Aplicada
Apostila de Hidrologia  AplicadaApostila de Hidrologia  Aplicada
Apostila de Hidrologia AplicadaRoberta Araújo
 
Patologia das construções
Patologia das construçõesPatologia das construções
Patologia das construçõescharlessousa192
 
Introducao hidrologia
Introducao hidrologiaIntroducao hidrologia
Introducao hidrologiaCleide Soares
 
Metodos probabilisticos de Hidrologia
Metodos probabilisticos de HidrologiaMetodos probabilisticos de Hidrologia
Metodos probabilisticos de HidrologiaFreddy Svv
 
9 patologia das construções - diagnóstico
9 patologia das construções - diagnóstico9 patologia das construções - diagnóstico
9 patologia das construções - diagnósticoAndrea de Souza
 
Aula de hidrografia do brasil
Aula de hidrografia do brasilAula de hidrografia do brasil
Aula de hidrografia do brasilProfessor
 

Destaque (20)

Manual de hidrologia básica (1)
Manual de hidrologia básica (1)Manual de hidrologia básica (1)
Manual de hidrologia básica (1)
 
Hidraulica basica condutos forcados
Hidraulica basica   condutos forcadosHidraulica basica   condutos forcados
Hidraulica basica condutos forcados
 
Engenharia hidraulica r. j. houghtalen 4ª ed
Engenharia hidraulica   r. j. houghtalen 4ª edEngenharia hidraulica   r. j. houghtalen 4ª ed
Engenharia hidraulica r. j. houghtalen 4ª ed
 
Resumo geral hidraulica
Resumo geral hidraulicaResumo geral hidraulica
Resumo geral hidraulica
 
Engenharia Civil - Letícia e Carol
Engenharia Civil - Letícia e Carol   Engenharia Civil - Letícia e Carol
Engenharia Civil - Letícia e Carol
 
Precipitação
PrecipitaçãoPrecipitação
Precipitação
 
Hidrologia 4
Hidrologia 4Hidrologia 4
Hidrologia 4
 
3 lista de exercicios mod iv e v (1)
3 lista de exercicios mod iv e v (1)3 lista de exercicios mod iv e v (1)
3 lista de exercicios mod iv e v (1)
 
Apostila hidráulica aplicada - Engenharia Civil
Apostila hidráulica aplicada - Engenharia CivilApostila hidráulica aplicada - Engenharia Civil
Apostila hidráulica aplicada - Engenharia Civil
 
Apostila escoamento em condutos forçados
Apostila escoamento em condutos forçadosApostila escoamento em condutos forçados
Apostila escoamento em condutos forçados
 
Apostila de Hidrologia Aplicada
Apostila de Hidrologia  AplicadaApostila de Hidrologia  Aplicada
Apostila de Hidrologia Aplicada
 
Patologia das construções
Patologia das construçõesPatologia das construções
Patologia das construções
 
DISEÑO DE OBRAS HIDRAULICAS - HIDROLOGIA
DISEÑO DE OBRAS HIDRAULICAS - HIDROLOGIADISEÑO DE OBRAS HIDRAULICAS - HIDROLOGIA
DISEÑO DE OBRAS HIDRAULICAS - HIDROLOGIA
 
Introducao hidrologia
Introducao hidrologiaIntroducao hidrologia
Introducao hidrologia
 
Precipitação
PrecipitaçãoPrecipitação
Precipitação
 
Hidráulica apostila 1
Hidráulica   apostila 1Hidráulica   apostila 1
Hidráulica apostila 1
 
Metodos probabilisticos de Hidrologia
Metodos probabilisticos de HidrologiaMetodos probabilisticos de Hidrologia
Metodos probabilisticos de Hidrologia
 
9 patologia das construções - diagnóstico
9 patologia das construções - diagnóstico9 patologia das construções - diagnóstico
9 patologia das construções - diagnóstico
 
Hidrografia
HidrografiaHidrografia
Hidrografia
 
Aula de hidrografia do brasil
Aula de hidrografia do brasilAula de hidrografia do brasil
Aula de hidrografia do brasil
 

Último

COMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕES
COMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕESCOMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕES
COMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕESEduardaReis50
 
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...IsabelPereira2010
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...azulassessoria9
 
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfRecomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfFrancisco Márcio Bezerra Oliveira
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéisines09cachapa
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...azulassessoria9
 
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfHistoria da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfEmanuel Pio
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...azulassessoria9
 
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdfPRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdfprofesfrancleite
 
Análise poema país de abril (Mauel alegre)
Análise poema país de abril (Mauel alegre)Análise poema país de abril (Mauel alegre)
Análise poema país de abril (Mauel alegre)ElliotFerreira
 
ENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdf
ENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdfENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdf
ENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdfLeloIurk1
 
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteCOMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteVanessaCavalcante37
 
INTERVENÇÃO PARÁ - Formação de Professor
INTERVENÇÃO PARÁ - Formação de ProfessorINTERVENÇÃO PARÁ - Formação de Professor
INTERVENÇÃO PARÁ - Formação de ProfessorEdvanirCosta
 
Introdução a Caminhada do Interior......
Introdução a Caminhada do Interior......Introdução a Caminhada do Interior......
Introdução a Caminhada do Interior......suporte24hcamin
 
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSOLeloIurk1
 
AULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobre
AULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobreAULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobre
AULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobremaryalouhannedelimao
 
BNCC Geografia.docx objeto de conhecimento
BNCC Geografia.docx objeto de conhecimentoBNCC Geografia.docx objeto de conhecimento
BNCC Geografia.docx objeto de conhecimentoGentil Eronides
 
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Ilda Bicacro
 
3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf
3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf
3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdfBlendaLima1
 

Último (20)

COMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕES
COMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕESCOMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕES
COMPETÊNCIA 4 NO ENEM: O TEXTO E SUAS AMARRACÕES
 
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
DeClara n.º 75 Abril 2024 - O Jornal digital do Agrupamento de Escolas Clara ...
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: LEITURA DE IMAGENS, GRÁFICOS E MA...
 
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfRecomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
 
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdfHistoria da Arte europeia e não só. .pdf
Historia da Arte europeia e não só. .pdf
 
Aula sobre o Imperialismo Europeu no século XIX
Aula sobre o Imperialismo Europeu no século XIXAula sobre o Imperialismo Europeu no século XIX
Aula sobre o Imperialismo Europeu no século XIX
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
 
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdfPRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
 
Análise poema país de abril (Mauel alegre)
Análise poema país de abril (Mauel alegre)Análise poema país de abril (Mauel alegre)
Análise poema país de abril (Mauel alegre)
 
ENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdf
ENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdfENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdf
ENSINO RELIGIOSO 7º ANO INOVE NA ESCOLA.pdf
 
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcanteCOMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
COMPETÊNCIA 2 da redação do enem prodção textual professora vanessa cavalcante
 
INTERVENÇÃO PARÁ - Formação de Professor
INTERVENÇÃO PARÁ - Formação de ProfessorINTERVENÇÃO PARÁ - Formação de Professor
INTERVENÇÃO PARÁ - Formação de Professor
 
Introdução a Caminhada do Interior......
Introdução a Caminhada do Interior......Introdução a Caminhada do Interior......
Introdução a Caminhada do Interior......
 
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
2° ANO - ENSINO FUNDAMENTAL ENSINO RELIGIOSO
 
AULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobre
AULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobreAULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobre
AULA DE CARIOLOGIA TSB introdução tudo sobre
 
BNCC Geografia.docx objeto de conhecimento
BNCC Geografia.docx objeto de conhecimentoBNCC Geografia.docx objeto de conhecimento
BNCC Geografia.docx objeto de conhecimento
 
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
Rota das Ribeiras Camp, Projeto Nós Propomos!
 
3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf
3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf
3-Livro-Festa-no-céu-Angela-Lago.pdf-·-versão-1.pdf
 

Manual de aulas teoricas de hidrologia

  • 1. UNIVERSIDADE EDUARDO MONDLANE FACULDADE DE AGRONOMIA E ENGENHARIA FLORESTAL DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA RURAL MANUAL DE HIDROLOGIA Por: Professor Doutor Carmo Vaz
  • 2. Introdução à Hidrologia 1 1.1 1.1.1 1-1 INTRODUÇÃO À HIDROLOGIA IDEIAS GERAIS SOBRE A HIDROLOGIA Objecto da hidrologia A Hidrologia trata da ocorrência, circulação e distribuição da água na Terra, das suas propriedades físicas e químicas, da sua interacção com o meio, de acordo com a definição apresentada em 1982 pela Organização Meteorológica Mundial e que é aceite de forma generalizada. Embora a Hidrologia abranja o conhecimento da água tanto nos continentes como na atmosfera e nos oceanos, o estudo dos ramos aéreo e oceânico é feito nas disciplinas específicas de Meteorologia e Oceanografia, ficando a Hidrologia propriamente dita dedicada ao ramo terrestre. A Hidrologia da Engenharia (Engineering Hydrology na terminologia inglesa corrente) é uma parte restrita da Hidrologia que inclui as áreas pertinentes ao planeamento, projecto e exploração de obras de engenharia visando o controlo e a utilização da água para satisfação das necessidades humanas. O seu enfoque é, por isso, o da aplicação da ciência na solução de problemas de engenharia. 1.1.2 A Hidrologia como disciplina do curso de Engenharia Civil A Hidrologia da Engenharia, apesar do seu carácter aplicado, apresenta diferenças muito significativas no seu tratamento em relação à maioria das restantes disciplinas do curso de Engenharia Civil. Se, a título de exemplo, quisermos confrontar a Hidrologia com as disciplinas da área de Estruturas (Resistência de Materiais, Teoria das Estruturas, Pontes), podemos constatar: a) o objecto de estudo das disciplinas de Estruturas engloba estruturas artificiais construídas em grande medida com materiais fabricados pelo Homem, sendo bastante bem previsíveis os comportamentos quer dos materiais quer das estruturas. No caso da Hidrologia, o objecto de estudo é o ciclo hidrológico nas suas várias componentes, que são fenómenos da Natureza e, por conseguinte, processos essencialmente aleatórios. b) as diferenças no objecto de estudo traduzem-se em grandes diferenças no controlo sobre o mesmo que é grande no caso das Estruturas e pequeno ou nulo no caso dos processos que integram o ciclo hidrológico. c) no que se refere aos métodos de análise, as disciplinas de Estruturas utilizam uma teoria matemática formal, baseada em hipóteses próximas da realidade, e ainda recorrem à análise experimental relativamente pouco dispendiosa. No caso da Hidrologia, há (ainda) um peso grande de empirismo para enfrentar fenómenos demasiado complexos para serem analisados com métodos matemáticos relativamente simples. Verifica-se a necessidade duma grande acumulação de informações (dados hidrológicos). A experimentação é, em Manual de Hidrologia
  • 3. Introdução à Hidrologia 1-2 geral, muito dispendiosa. d) no que respeita aos processos de cálculo, ambas as áreas têm beneficiado imenso do acesso a computadores cada vez mais potentes que, por sua vez, possibilitam o desenvolvimento e a utilização de programas de cálculo sempre mais sofisticados e o tratamento de quantidades crescentes de informação. No caso da Hidrologia, as ferramentas mais utilizadas são a análise estatística e os modelos de simulação hidrológica das componentes da fase terrestre do ciclo hidrológico, desde a precipitação até ao escoamento. 1.1.3 Objectivos da disciplina de Hidrologia Os objectivos do estudo da disciplina de Hidrologia correspondem às necessidades de: • • aprofundar o conhecimento do ramo terrestre do ciclo hidrológico; utilizar os conhecimentos adquiridos em aplicações práticas como, por exemplo, - no dimensionamento de obras hidráulicas (descarregadores de barragens, secções de vazão de pontes, etc.); - no dimensionamento de sistemas de drenagem de regadios e áreas urbanas; - na determinação de necessidades de rega; - na gestão dos recursos hídricos; - na protecção do meio ambiente. Nas aplicações, a Hidrologia liga-se estreitamente às disciplinas antecedentes de Hidráulica Geral e às disciplinas subsequentes de Abastecimento de Água, Drenagem e Saneamento, Obras Hidráulicas. 1.1.4 Breve referência à História da Hidrologia Sugere-se a leitura do excelente livro de A.K. Biswas, "History of Hydrology", no qual o autor faz uma interessante recapitulação dos principais marcos no progresso da Hidrologia, desde a Antiguidade aos fins do século XIX. Os elementos que a seguir se apresentam foram extraídos desse livro e do "Handbook of Applied Hydrology" de Ven Te Chow. 1.1.4.1 A Hidrologia na Antiguidade Oriental (Egipto, Mesopotâmia, China) A civilização egípcia floresceu à volta do Nilo. Para além das extensivas obras de irrigação do tempo dos Faraós, há a referir a barragem de Saad-El-Kafara, datada de cerca de 2800 a.c. e cujos encontros permaneceram até aos nossos dias. A importância dada à água, em particular às obras de irrigação e controle de cheias, na China Antiga era tão grande que, diz a lenda, um engenheiro que dirigiu grandes obras hidráulicas acabou por se tornar o imperador Yü, o Grande. Manual de Hidrologia
  • 4. Introdução à Hidrologia 1-3 Se a Hidráulica, pelo impacto directo das obras, ocupava o primeiro plano, a necessidade de conhecimentos sobre a ocorrência e a distribuição da água tornava-se também muito importante. Sendo a irrigação no Nilo feita por inundação, a medição dos níveis nesse rio foi desde logo sendo feita, através dos "nilómetros" (cisternas com escalas graduadas ligadas ao rio por condutas subterrâneas). O nilómetro de Roda, próximo do Cairo, tem um registo contínuo de níveis de 641 d.c. a 1890 d.c., constituindo a mais longa série hidrológica do mundo. A Mesopotâmia (nome que significa "entre rios") era uma região fértil, atravessada pelos rios Tigres e Eufrates, ambos de regime muito irregular, obrigando a grandes cuidados com os diques de protecção contra cheias e obras de irrigação. Essa preocupação aparece bem explícita no famoso Código de Hamurabi, imperador da Babilónia (cerca de 1700 a.c.) 1.1.4.2 A Hidrologia na Antiguidade Clássica - Grécia e Roma As primeiras tentativas de explicação da circulação da água (donde surgem os rios?) aparecem com os filósofos gregos. Platão apresenta o conceito dum mar subterrâneo (Tartarus) com inúmeras ligações à superfície, dando origem aos rios, lagos e mares. Aristóteles defendia que o frio transformava o ar em água e isso acontecia tanto nas altas montanhas como no interior da terra, sendo essa a origem dos rios. Note-se que os Gregos dispunham de observações limitadas de muitos fenómenos e da sua interligação o que de certa forma explica a sua incapacidade de descobrirem o conceito do ciclo hidrológico. Apesar disso, filósofos como Anáxagoras e Teófrasto apresentaram hipóteses próximas da concepção moderna do ciclo hidrológico, infelizmente caídas no esquecimento devido à influência dominante de Aristóteles. A civilização romana não foi tão fértil como a grega em pensadores, tendo no entanto produzido grandes obras de engenharia através da aplicação empírica da experiência adquirida. Apesar disso, Vitruvius apresenta no seu livro "De architectura libridecem" um conceito bastante claro do ciclo hidrológico, com a precipitação dando origem ao escoamento e a evaporação como fonte das nuvens. Há a referir ainda Hero de Alexandria que escreve que o caudal depende da área e da velocidade mas este conceito não se impôs até ao século XVI. 1.1.4.3 A Hidrologia na Idade Média A Idade Média na Europa foi dominada ideologicamente pela Igreja que se opôs fortemente à pesquisa experimental, baseando-se nos dogmas e na escolástica, para evitar o aparecimento de heresias. Foi um período de cerca de 13 séculos de fraco desenvolvimento científico com o correspondente reflexo na Hidrologia. 1.1.4.4 A Hidrologia no Renascimento - Século XVI O Renascimento corresponde ao desabrochar definitivo do pensamento científico e da experimentação. A partir do século XVI, a Hidrologia, com as ciências irmãs da Hidráulica e da Meteorologia não parou de se desenvolver. Manual de Hidrologia
  • 5. Introdução à Hidrologia 1-4 Leonardo da Vinci, conhecido sobretudo como um pintor de génio, tinha nos seus cadernos de notas conceitos essencialmente correctos sobre o ciclo hidrológico, sobre o escoamento em superfície livre e sobre a distribuição de velocidades numa secção. Bernard Palissy, um cientista francês, apresentou a primeira formulação clara e completa do ciclo hidrológico, baseada em observações. Apresentou também ideias sobre o escoamento subterrâneo. 1.1.4.5 A Hidrologia nos Séculos XVII e XVIII O século XVII é o século de Galileo, Kepler, Newton, Harvey, Descartes, Van Leeuwenhoek. No domínio da Hidrologia salientam-se os nomes de Perrault e Halley. Benedeto Castelli apresenta uma explicação clara da relação entre caudal, secção transversal e velocidade, sistematizando ideias anteriores de Hero e Leonardo da Vinci. Perrault, no seu livro "Da origem das fontes", demonstra brilhantemente que o escoamento no rio Sena (cabeceiras) podia ser totalmente explicado a partir da precipitação, apresentando um balanço hídrico rudimentar. Mariotte realizou experiências similares e outras respeitantes à medição de velocidades. Halley, muito conhecido pelos seus trabalhos de Astronomia, tomou como exemplo o mar Mediterrâneo e mostrou que a evaporação dos mares era amplamente suficiente para justificar os escoamentos dos rios. Os desenvolvimentos dos conceitos do ciclo hidrológico no século XVII e seguintes estão ligados às medições de precipitação, evaporação e caudal. É assim que começam a surgir os primeiros instrumentos hidrométricos modernos: udómetros, tinas de evaporação. O século XVIII testemunha o florescimento das medições hidrológicas e do desenvolvimento teórico. Podem referir-se como marcos fundamentais a medição de velocidade com o tubo de Pitot, a equação de Bernouilli (conservação de energia) e a fórmula de Chézy para o cálculo do caudal numa secção transversal dum escoamento. 1.1.4.6 A Hidrologia no Século XIX A ciência da Hidrologia avançou muito rapidamente durante o século XIX. Verificaram-se progressos importantes na medição de variáveis hidrológicas, nomeadamente com a introdução de udógrafos para registo contínuo da precipitação e de molinetes para a medição de velocidades em rios e canais. Nos países mais industrializados, iniciou-se a colheita sistemática de dados hidrológicos e a sua análise. Em termos de conceptualização teórica, os marcos mais significativos a registar são: - o estudo de perfis de velocidade em canais, por Darcy e Bazin; - a equação de Manning para o cálculo de caudais em escoamentos turbulentos Manual de Hidrologia
  • 6. Introdução à Hidrologia 1-5 uniformes; - a fórmula racional para a determinação de caudais de cheia, por Thomas Mulvaney; - a teoria do escoamento em meio poroso por Darcy, Dupuit, Thiem e Forcheimer; - o diagrama de Rippl para cálculo de capacidades de albufeiras; - a fórmula de Hagen – Poiseuille para o escoamento laminar. 1.1.4.7 A Hidrologia na actualidade Os progressos alcançados na Hidrologia durante o século XX são numerosos e representam um avanço qualitativo na direcção dum conhecimento científico dos fenómenos. Ven Te Chow considerou três períodos para caracterizar o desenvolvimento da Hidrologia no século XX até à actualidade: - período do empirismo (1900-1930) com uma grande abundância de fórmulas empíricas, criação de organismos para a recolha sistemática de dados hidrológicos, criação da Associação Internacional de Ciências Hidrológicas (nome actual); - período da racionalização (1930-1950), caracterizados pelo aparecimento das teorias fundamentais da Hidrologia moderna, nomeadamente as teorias do hidrograma unitário, de Sherman; da infiltração, de Horton; do escoamento em meio poroso para poços em regime variável, de Theis; a análise estatística de fenómenos extremos, proposta por Gumbel; e do transporte de sedimentos, de Einstein; - finalmente, um período de teorização (1950 - ), em que a Hidrologia faz cada vez mais uso de métodos matemáticos avançados e dos modernos conceitos de Mecânica de Fluidos e da Termodinâmica, em paralelo com uma utilização massiva de computadores como ferramenta básica de trabalho. A moderna Hidrologia, e em particular a Hidrologia da Engenharia, faz uma integração que se procura sempre mais perfeita, entre as teorias dos processos hidrológicos e a informação disponível, em termos de registos de precipitação, caudais e de outras variáveis hidrológicas fundamentais. 1.2 RESERVAS HÍDRICAS NA TERRA A água é o liquido mais abundante na Terra. De facto, existe uma quantidade enorme, estimada em cerca de 1,600 x 106 km3. Aproximadamente 15 % desta água está quimicamente “presa” na crusta terrestre. A quantidade de água livre é cerca de 1,386 x 106 km3 (1,386 x 1015 m3). Poderia parecer que a quantidade de água na Terra fosse quase ilimitada. Contudo, esta imagem muda bastante se considerar a possibilidade de utilizar essa água. Para tal, pode-se analisar o Quadro 1.1, que mostra a importância das diferentes reservas hídricas. Quadro 1.1. Importância das diversas reservas hídricas (cf. UNESCO, 1978) Volume (103 km3) Manual de Hidrologia Volume de água total (%) Volume de água doce (%)
  • 7. Introdução à Hidrologia 1-6 1,338,000 96.5 - doce 91.0 0.007 0.26 salgados 85.4 0.006 - Pântanos 11.5 0.0008 0.03 Rios 2.1 0.0002 0.006 Humidade do solo 16.5 0.0012 0.05 Água subterrânea: doce 10,530 0.76 30.1 12,870 0.93 - 340.6 0.025 1.0 24,023.5 1.7 68.6 Água na atmosfera 12.9 0.001 0.04 Água biológica 1.1 0.0001 0.003 1,385,985 35,029 100 2.5 100 Oceanos e mares Lagos: salgada Gelo e neve Calotes polares TOTAL DE ÁGUA ÁGUA DOCE Deste quadro ressalta imediatamente a pequeníssima fracção de água utilizável pelo Homem em relação à totalidade da água existente no planeta. Vê-se que cerca de 97.5 % é água salgada e 1.7 % corresponde às zonas polares. Além disso, uma boa parte da água subterrânea está situada a enormes profundidades o que torna o seu aproveitamento antieconómico nas condições actuais. A parcela correspondente às águas superficiais e ás águas subterrâneas pouco profundas, aquela que efectivamente pode ser utilizada com mais facilidade, é de facto bastante pequena, apenas cerca de 0.3 % da água que existe na Terra ! O tempo de residência é o valor que se obtêm dividindo o volume da reserva pelo volume médio do correspondente fluxo de renovação. Assim, o tempo de residência representa o tempo médio que uma gota de água permanece numa certa reserva de água antes de passar para uma Manual de Hidrologia
  • 8. Introdução à Hidrologia 1-7 outra reserva. O quadro 1.2 apresenta valores do tempo de residência para as várias reservas hídricas. Quadro 1.2. Tempo de residência para as várias reservas hídricas Volume (103 km3) Tempo de residência (ordem de grandeza) Oceanos e mares 1,338,000 ≈4000 anos Lagos e albufeiras 176.4 ≈10 anos Pântanos 11.5 ≈1-10 anos Rios 2.1 ≈2 semanas Humidade do solo 16.5 ≈2 semanas - 1 ano Água subterrânea: 23,400 ≈2 semanas - 10,000 anos Gelos e glaciares 24,364 ≈10 - 1000 anos 12.9 ≈10 dias Atmosfera Note-se que, enquanto para as águas superficiais, especialmente para os rios, esses tempos são curtos, para os oceanos, glaciares e águas subterrâneas profundas esses tempos contam-se por centenas ou milhares de anos. Note-se também que as reservas representam uma imagem estática, um "instantâneo" das disponibilidades de água e pouco tem a ver com a sua importância para o ciclo hidrológico (que representa uma imagem dinâmica) onde a contribuição dos rios ou da atmosfera, por exemplo, é muito superior ao seu volume total instantâneo. O tempo de residência também tem relevância no âmbito de poluição de recursos hídricos. Por exemplo, um rio com água poluída poderá, em princípio, ser limpo em relativamente pouco tempo (teoricamente, em apenas algumas semanas), quando as fontes poluentes deixam de existir. No caso dum lago grande, a sua limpeza já será um processo de muitos anos. 1.3 1.3.1 O CICLO HIDROLÓGICO Conceito de ciclo hidrológico. Diagrama de Horton O conceito de ciclo hidrológico é extremamente útil para se iniciar o estudo da Hidrologia. O ciclo hidrológico pode ser descrito como um conjunto de arcos que representam os diversos caminhos através dos quais a água na natureza circula e se transforma, constituindo um sistema de enorme complexidade. Manual de Hidrologia
  • 9. Introdução à Hidrologia 1-8 O ciclo hidrológico não tem início ou fim mas é habitual partir-se da evaporação da água dos oceanos e sua incorporação na atmosfera. Os processos que em seguida se desenrolam estão apresentados sob forma gráfica no diagrama de Horton, figura 1.1. Figure 1.1 Diagrama de Horton O vapor de água resultante da evaporação nos oceanos acumula-se na atmosfera e é transportado por massas de ar em movimento. Sob condições adequadas, o vapor condensa-se para formar nuvens que, por sua vez, podem dar origem a precipitação, quer sobre a terra quer sobre os oceanos. A precipitação que cai sobre a terra pode seguir caminhos diversos: - parte evapora-se durante a queda; - parte é interceptada por árvores, vegetação ou telhados de casas e volta a evaporar-se; - parte atinge a superfície do solo, infiltrando-se ou ficando retida em depressões superficiais. A parte retida em depressões superficiais divide-se numa componente que se evapora e noutra que origina escorrimento superficial. A parte que se infiltra contribui, por um lado, para alimentar o processo de transpiração das plantas e de evaporação a partir do solo; por outro, por efeito da gravidade, vai alimentar as toalhas de água subterrânea. As águas subterrâneas contribuem para alimentar a vegetação, a evaporação a partir do solo e os escoamentos dos rios. Por efeito da gravidade, parte das águas subterrâneas vai ter directamente ao oceano. Manual de Hidrologia
  • 10. Introdução à Hidrologia 1-9 O escorrimento superficial sobre o solo dá origem a linhas de água que se fundem em rios os quais, devido à gravidade, vão descarregar no oceano, alimentando no seu percurso lagos, pântanos e albufeiras. Em todo este processo, há continuamente evaporação da água da mesma forma que pode haver precipitação directamente sobre os rios e lagos. Também os rios contribuem muitas vezes para alimentar as toalhas de água subterrânea com que comunicam. Com a descarga da água no oceano por escoamento superficial ou escoamento subterrâneo fechase o ciclo hidrológico. O "motor" deste ciclo é a energia solar que, no processo de passagem de partículas de água para atmosfera por evaporação, lhes transmite a energia potencial necessária para o seu regresso ao oceano, actuadas pela gravidade a partir da precipitação. A figura 1.2 faz uma outra representação do ciclo hidrológico. Aí estão indicadas os três ramos normalmente considerados no ciclo hidrológico: o ramo oceânico, objecto da Oceanografia; o ramo aéreo ou atmosférico, objecto da Meteorologia; e o ramo terrestre, objecto da Hidrologia. Figura 1.2 O Ciclo Hidrológico A figura 1.3 é ainda uma representação descritiva do ciclo hidrológico mas na qual se faz já uma avaliação quantitativa das variáveis envolvidas. P, E, ET, I, G e Q representam respectivamente a precipitação, a evaporação, a evapotranspiração, a infiltração, o escoamento subterrâneo e o escoamento superficial. As percentagens estão expressas em termos da precipitação total anual média que se estima em cerca de 860 mm. Manual de Hidrologia
  • 11. Introdução à Hidrologia 1-10 Figure 1.3 Representação quantitativa do Ciclo Hidrológico 1.3.2 Irregularidade espacial e temporal È preciso salientar que as quantidades de precipitação, evaporação, escoamento e outras variáveis hidrológicas apresentam enormes irregularidades quer na sua distribuição geográfica quer na sua distribuição temporal. O facto de poder haver grandes variações destas quantidades de ano para ano num mesmo local significa que a sua caracterização apenas é possível numa base estatística a partir de longas séries de valores observados. Em Moçambique, há dois organismos que desempenham um papel central na recolha e registo de dados relativos às variáveis hidrológicas. São eles: - O Instituto Nacional de Meteorologia de Moçambique (INAM) que colecta dados de precipitação e evaporação, para além de outros relativos a variáveis climáticas (temperatura, humidade relativa, vento, radiação solar, etc.) que influem nas grandezas hidrológicas; - a Direcção Nacional de Águas (DNA) que recolhe dados de precipitação, evaporação, água subterrânea e escoamento superficial. Outros organismos como o Instituto Nacional de Investigação Agronómica (INIA) e algumas grandes empresas do sector agrícola possuem também informação hidrológica com interesse, sobretudo registos de precipitação, evaporação, evapotranspiração. Manual de Hidrologia
  • 12. Introdução à Hidrologia 1.4 1-11 BALANÇO HÍDRICO Se se considerar uma certa região geográfica durante um determinado período de tempo, o movimento da água obedece ao princípio da conservação da massa traduzido pela equação da continuidade. Essa equação pode escrever-se como I -O= ds dt na sua forma contínua ou como (I - O) ∆t = ∆s na sua forma discreta em que I representa a entrada de água no sistema por unidade de tempo, O é a saída de água do sistema também por unidade de tempo e ∆S é a variação do volume armazenado no interior do sistema. Designa-se por balanço hídrico a equação da continuidade aplicada a uma certa região e escrita em função das variáveis do ciclo hidrológico. Figure 1.4 Representação conceptual do balanço hídrico As regiões em que fazem estudos de balanços hídricos são definidas normalmente em função do objectivo que se pretende alcançar, podendo, no entanto, existir restrições de carácter político e administrativo à livre definição dessas regiões. A figura 1.4, uma versão mais abstracta do ciclo hidrológico duma região, é útil porque permite uma tradução fácil do balanço hídrico em termos matemáticos. Na figura 1.4, as variáveis têm o seguinte significado: P precipitação; Q1, Q2 escoamento superficial que entra e sai da região; G1, G2 escoamento subterrâneo que entra e sai da região; Ss, Sso, Saq volume armazenado à superfície, no solo e no aquífero (água subterrânea); Manual de Hidrologia
  • 13. Introdução à Hidrologia E T rso, raq (ressurgência); I R 1-12 evaporação a partir de águas superficiais e do solo; transpiração das plantas; água do solo e água subterrânea que reaparecem à superfície infiltração (no solo); recarga (percolação para os aquíferos). Conforme a região que se considere, assim se podem estabelecer os correspondentes balanços hídricos. Por exemplo, se se considerar toda a região representada na figura 1.4, ter-se-á a seguinte equação: (P + Q1 + G1) - (Q2 + G2 + E + T) = ∆S em que ∆S representa a variação total do volume armazenado. Note-se que nesta equação não aparecem a infiltração, a recarga e a ressurgência que, por serem processos "interiores" à região em estudo, não afectam o respectivo balanço hídrico. Se agora se considerar apenas a superfície da terra, o balanço hídrico será: (P + Q1 + r) - (Q2 + E + T + I) = ∆Ss O balanço hídrico para um (único) aquífero será: (G1 + R) - (G2 + raq) = ∆Saq É um exercício relativamente simples estabelecer os balanços hídricos para outras regiões como, por exemplo, a camada superficial do solo ou do aquífero. Tenha-se em atenção que todas as variáveis que intervêm nas equações de balanços hídricos são expressas como volumes por unidade de tempo. A equação do balanço hídrico pode ser consideravelmente simplificada quando a região considerada é a bacia hidrográfica e quando se adoptem longos períodos de tempo (pelo menos um ano). Numa bacia hidrográfica, não há, em condições naturais, outra entrada de água além da precipitação e há uma única saída de água. Por outro lado, num longo período de tempo a variação do volume armazenado pode ser desprezada perante os valores acumulados das outras variáveis. Assim, a equação do balanço hídrico passa a ser nessas condições: P - (Q2 + E + T) = 0 O maior obstáculo na resolução de problemas práticos com utilização do balanço hídrico reside principalmente na dificuldade de medir ou estimar adequadamente as variáveis intervenientes. Por exemplo, a precipitação é medida pontualmente fazendo-se depois a extrapolação para toda a área envolvida1. Os caudais em rios podem ser medidos com razoável precisão excepto durante 1 ver o capítulo sobre precipitação Manual de Hidrologia
  • 14. Introdução à Hidrologia 1-13 as cheias. As maiores dificuldades surgem, no entanto, associadas à medição ou estimação dos valores de infiltração, recarga, escoamento subterrâneo, evaporação, transpiração e volumes armazenados no solo e em aquíferos. O balanço hídrico é uma ferramenta muito útil e que pode ser utilizada numa grande variedade de situações como, por exemplo: • determinação do valor duma variável hidrológica quando todas as restantes que entram no balanço são conhecidas; • estimação do erro global cometido na medição ou estimação das variáveis hidrológicas, quando todas as que entram no balanço hídrico são conhecidas; • operação de albufeiras; • avaliação das necessidades de rega. O balanço hídrico é também a componente central dos modelos de simulação hidrológica modelos matemáticos em que se procura reproduzir as características principais do movimento de água numa região a partir do momento em que ela precipita. 1.5 ANO HIDROLÓGICO As variáveis hidrológicas, como a precipitação, o escoamento ou a evaporação, são claramente influenciadas por uma ciclicidade anual. Em Moçambique, isto é bem evidente nas duas mais importantes variáveis do ciclo hidrológico, a precipitação e o escoamento. Com efeito, tanto a precipitação como o escoamento atingem valores elevados nos meses de Dezembro a Março ao passo que no período de Junho a Setembro os seus valores são bastante baixos. Em muitas aplicações, interessa utilizar os valores acumulados anuais de precipitação e escoamento, por exemplo para balanços hídricos anuais. Nesses casos, não se pode adoptar como período de registo o ano civil (1 Janeiro - 31 Dezembro) pois isso corresponderia a repartir por dois anos uma mesma época de chuvas. Considera-se por isso um ano especial designado por ano hidrológico. Toma-se para início do ano hidrológico o fim da época de estiagem o que tem a vantagem de evitar a divisão duma mesma época de chuvas. Tem também vantagens para a efectivação de balanços hídricos anuais: P - (R + E + T) = ∆S pois no fim da época de estiagem pode aceitar-se que o armazenamento é sempre bastante pequeno pelo que ∆S é aproximadamente nulo. Procura-se, portanto, que os anos hidrológicos sejam (estatisticamente) independentes uns dos outros, o que obviamente não aconteceria se, por exemplo, se se usasse o ano civil. O procedimento adoptado para a definição do início do ano hidrológico procura, de facto, Manual de Hidrologia
  • 15. Introdução à Hidrologia 1-14 minimizar a dependência estatística dos sucessivos anos hidrológicos. Ele consiste em formar séries anuais de escoamentos adoptando, alternativamente, diferentes meses para o seu início (Setembro, Outubro, Novembro, etc.) e determinar, para cada alternativa de início, o valor do coeficiente de autocorrelação. O mês que origine o mais baixo coeficiente de autocorrelação deve ser o adoptado para início do ano hidrológico. Em Moçambique, verifica-se que os escoamentos em dada região dão coeficientes de autocorrelação mais baixos tomando o ano hidrológico com início em 1 de Outubro ao passo que noutras regiões o mínimo coeficiente de autocorrelação corresponderia a um início em 1 de Novembro. Por razões de ordem organizativa, a Direcção Nacional de Águas adoptou como ano hidrológico o período que vai de 1de Outubro dum ano a 30 de Setembro do ano seguinte. Manual de Hidrologia
  • 16. Introdução à Hidrologia 1-15 EXERCÍCIOS 1. Numa albufeira com uma área de 10 km2 verificaram-se durante um período de 5 dias os seguintes valores: Caudal afluente = 15 m3/seg. Caudal efluente = 3 m3/seg. Nível da água no 1º dia = 25,0 m. Nível da água no 6º dia = 25,4 m. Precipitação = 0 mm. a) b) Calcule o volume da água perdida por evaporação na albufeira, durante estes 5 dias Calcule a altura média diária de evaporação da albufeira. 2. Considere um lago com uma saída natural. A área do lago é de 500 km2 e a da bacia drenante de 2800 km2. Durante um ano verificou-se que a precipitação na região foi de 600 mm. e a evaporação no lago de 800 mm, não se tendo verificado uma variação sensível do nível do lago. O caudal médio descarregado ao longo do ano foi de 9 m3/s. a) b) Calcule o caudal drenado da bacia para o lago. Calcule a evaporação na bacia drenante. 3. Em que condições é que a precipitação numa bacia não produz a) b) c) Nenhum escoamento superficial Nenhum escoamento subterrâneo Nenhum escoamento 4. Explique a presença e a ausência de água superficial e água subterrânea numa zona com dunas (p. ex. a ilha de Inhaca) e numa planície dum rio (p. ex. o rio Incomati). 5. Construiu-se uma barragem numa secção dum rio com uma bacia drenante de 1800 km2. A albufeira tem uma área inundada média de 35 km2 e uma capacidade de armazenamento de 600 milhões m3. O caudal médio (afluente) do rio é de 5,6 m3/s. A precipitação anual média ponderada sobre a bacia é de 700 mm. O enchimento da albufeira depois da sua construção levou 5 anos. Durante esse período o caudal médio descarregado pela albufeira foi de 0,5 m3/s. Logo depois da construção da barragem (durante e depois do enchimento da albufeira) começou-se a tirar, anualmente, 12 milhões de m3 de água da albufeira para o abastecimento duma vila e para um regadio. a) Calcule o caudal médio descarregado pela albufeira depois do seu enchimento (numa situação de equilíbrio o nível médio da albufeira mantêm-se constante). Manual de Hidrologia
  • 17. Introdução à Hidrologia b) 1-16 Calcule as perdas anuais na albufeira por evaporação. 6. Na secção de saída (secção de referência) duma bacia hidrográfica de 1600 km2 foi construída uma barragem com uma albufeira com uma superfície de 35 km2 e uma capacidade de armazenamento de 600 milhões m3. A albufeira é alimentada por um rio que drena a bacia. O caudal médio no rio é de 4,5 m3/s. A precipitação anual média naquela zona é de 700 mm. O enchimento da albufeira depois da sua construção levou 5 anos. a) Calcule as perdas anuais na albufeira por evaporação (assuma que a superfície da albufeira é constante). b) Calcule a evapotranspiração anual (em mm) na bacia. Manual de Hidrologia
  • 18. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2 CARACTERIZAÇÃO DUMA BACIA HIDROGRÁFICA 2.1 2-1 BACIAS HIDROGRÁFICAS Uma bacia hidrográfica é uma região definida topográficamente, drenada por um curso de água ou um sistema interligado de cursos de água, tal que a única entrada de água na região seja a precipitação e todos os caudais efluentes sejam descarregados através de uma única saida (secção de referência da bacia). Quando o balanço hídrico é realizado na região correspondente a uma bacia hidrográfica, ele torna-se consideravelmente simplificado já que a única entrada de água corresponde à precipitação e a saída de água se faz numa única secção. Também para a gestão dos recursos hídricos a bacia hidrográfica constitui a unidade mais conveniente pois é a nível da bacia que se verificam as relações mais estreitas entre: • • • • recursos hídricos a montante e a jusante; recursos de água superficiais e de águas subterrâneas; consumos a montante e disponibilidades a jusante, em termos de quantidade e qualidade; modificações na ocupação do solo ou obras hidráulicas no rio e nas margens e modificações morfológicas ou das características do escoamento a montante e a jusante, por vezes a distâncias de dezenas de quilómetros. Tudo isto justifica o papel privilegiado desempenhado pelas bacias hidrográficas em estudos hidrológicos e de gestão de recursos hídricos. A figura 2.1 representa as principais bacias de Moçambique e a figura 2.2 a bacia do rio Malema, afluente do rio Lúrio. A bacia hidrográfica é limitada pela linha de separação das águas. Esta linha passa pelos pontos de máxima cota entre bacias, seguindo pelas linhas de cumeada, podendo no entanto existir pontos mais altos no interior da bacia. A linha de separação divide a região onde a precipitação caída vai dar origem a escoamento drenado através da secção de referência das regiões vizinhas, drenadas por outros cursos de água. A definição dos limites da bacia hidrográfica torna-se menos precisa quando se considera o escoamento subterrâneo. Assim, distingue-se por vezes a linha de separação topográfica ou superficial da linha de separação freática ou subterrânea. Na situação ilustrada pela figura 2.3, a precipitação que se infiltra acima da camada geológica impermeável acaba por se escoar numa bacia vizinha. Manual de Hidrologia
  • 19. Caracterízação duma bacia hidrográfica Figure 2.1 Principais bacias de Moçambique Manual de Hidrologia 2-2
  • 20. Caracterízação duma bacia hidrográfica Figure 2.2 Bacia do rio Malema Manual de Hidrologia 2-3
  • 21. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-4 Figure 2.3 Limites duma bacia hidrográfica Nesta situação, a definição dos limites da bacia hidrográfica não se pode fazer sem ambiguidade visto que apenas uma parte da precipitação caída acima da camada geológica impermeável se infiltra enquanto outra parte se transforma em escoamento superficial na bacia. Por outro lado, os níveis freáticos variam ao longo do ano o que tem como consequência a variação da linha de separação freática. Por isso, normalmente e para efeitos práticos, despreza-se o efeito introduzido pelo escoamento subterrâneo, junto aos limites da bacia. A incorreção cometida é negligenciável com a excepção das bacias com muito pequena dimensão ou com características geológicas particulares. O comportamento hidrológico duma bacia hidrográfica é essencialmente uma função das características climáticas da região (precipitação, evaporação) e das características fisiográficas da bacia. As características fisiográficas podem ser agrupadas da seguinte maneira: • características geométricas - área de drenagem; perímetro; índice de compacidade; factor de forma. • características do sistema de drenagem - constância do escoamento; ordem; densidade de drenagem. • características do relevo - curva hipsométrica; altitude média; altura média; perfil do rio; inclinação média do leito; declividade dos terrenos; rectângulo equivalente; declive médio índice de declive de Roche; Manual de Hidrologia
  • 22. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-5 • 2.2 2.2.1 curva hidrodinâmica; coeficiente de massividade; coeficiente orográfico. características de geologia, solos e vegetação CARACTERÍSTICAS GEOMÉTRICAS Área de drenagem A área de drenagem é a área da projecção horizonal da superfice da bacia hidrográfica, sendo normalmente determinada por planimetria ou por utilização de GIS (Sistema de Informação Geográfica), em cartas com escalas (no caso de Moçambique) entre 1:250,000 e 1:50,000. A área de drenagem tem uma importância enorme nos valores dos escoamentos, que se podem, duma maneira geral, considerar funções crescentes da área. A área da bacia do rio Malema (centro-norte de Moçambique) é de 2,600 km2. 2.2.2 Perímetro O perímetro da bacia é o perímetro da projecção horizontal da superfície da bacia hidrográfica. O perímetro da bacia do rio Malema é de 342 km. 2.2.3 Índice de compacidade O índice de compacidade ou índice de Gravelius, Kc, é a relação entre o perímetro da bacia e o perímetro dum círculo de área igual à da bacia: Kc = P/(2πR), em que A = πR2 define o valor de R. Então: P Kc = 2π A = 0.282 P A π Kc é sempre maior ou igual à unidade apenas se tendo Kc = 1 para uma bacia de forma circular. Kc é um valor adimensional que não depende da área mas da forma da bacia sendo tanto maior quanto mais essa forma se afaste da circular. Note-se que quanto maior fôr Kc menos compacta é a bacia. Apresentam-se na figura 2.4 algumas formas esquemáticas de bacias e os respectivas índices de compacidade. A título de exemplo, a bacia do rio Malema tem um valor de Kc = 1.89. Manual de Hidrologia
  • 23. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-6 Figura 2.4 Índices de compacidade para várias formas de bacias Se imaginarmos uma precipitação instantânea e uniforme sobre a bacia, o escoamento a que ela dá origem surgirá concentrado na secção de saída ou mais distribuido ao longo do tempo conforme a forma da bacia seja próxima da circular ou irregular. Assim, em igualdade de outros factores, a tendência para grandes cheias será tanto mais acentuada quanto mais próximo da unidade for o valor de Kc. 2.2.4 Factor de forma O factor de forma, Kf, é a relação entre a largura média e o comprimento da bacia, definido como o comprimento, L, do seu curso de água mais longo. A largura média, l, é definida como a largura dum rectângulo com o mesmo comprimento e com a mesma área: l = A/L Kf = l/L = A/L2 Se se considerar as primeiras três bacias representadas na figura 2.4, os seus factores de forma são aproximadamente 0.25, 0.50 e 1. As bacias com factores de forma baixos são as que têm formas estreitas ou irregulares. Nestes casos, é menos provável a ocorrência de chuvas intensas cobrindo simultâneamente toda a sua extensão e, por outro lado, os escoamentos resultantes surgem na secção de saída mais distribuidos ao longo do tempo pelo que, em igualdade de outros factores, bacias com Kf baixos terão menos tendências para grandes cheias do que bacias com Kf elevados. O valor de Kf para a bacia do rio Malema é de 0.1 aproximadamente. 2.3 2.3.1 CARACTERÍSTICAS DO SISTEMA DE DRENAGEM Constância do escoamento Manual de Hidrologia
  • 24. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-7 Os rios e seus afluentes podem classificar-se como perenes, intermitentes e efémeros, de acordo com o critério da constância do escoamento. Os rios perenes são os que, em condições naturais1, escoam água durante todo o ano quer por terem afluentes com diferentes regimes de alimentação quer por terem uma alimentação contínua de águas subterrâneas. É normalmente o caso dos rios mais importantes de Moçambique, como o Maputo, o Umbelúzi, o Incomáti e o Limpopo, na região sul. Os rios intermitentes são os que em geral têm água durante a época húmida e secam na estiagem. Durante a época húmida beneficiam da precipitação e dum nível freático alto enquanto que, durante a época seca, o lençol freático desce a um nível inferior ao do leito do rio, não permitindo fazer a sua alimentação. Podem referir-se como exemplo os rios Mazim’chopes e Govuro. Os rios efémeros apenas têm água durante e imediatamente a seguir aos períodos de precipitação, não recebendo escoamento subterrâneo. Podem citar-se como exemplo os rios Movene e Impamputo. 2.3.2 Ordem A ordem dos cursos de água é uma classificação que reflecte o grau de ramificação da rede hidrográfica da bacia. Pode ser feita a partir dum mapa em que estejam representados todos os canais naturais suficientemente bem definidos quer correspondam a cursos de água perenes, intermitentes ou efémeros. Um critério de ordenação que por vezes tem sido seguido é o de considerar como de ordem 1 os cursos de água que não são afluentes de qualquer outro; de ordem 2 os que são afluentes dos rios de ordem 1; de ordem n+1 os que são afluentes dos cursos de água de ordem n. Este critério é de aplicação simples e quase nada dependente do pormenor com que a rede hidrográfica está representada no mapa. No entanto, apresenta como significativas desvantagens o facto de poderem surgir como tendo a mesma ordem rios de dimensão totalmente distinta. Em Moçambique, tanto o Zambeze como o Infulene seriam rios de ordem 1 por este critério. Um critério mais seguido actualmente é o de Horton-Strahler: são considerados de ordem 1 as linhas de água iníciais, que não recebem quaisquer afluentes; a junção de duas linhas de água de ordem 1 origina uma linha de água de ordem 2; a junção de dois rios de ordem n gera um rio de ordem n+1. Assim, os troços terminais dos grandes rios têm números de ordem bastante altos. A figura 2.5 ilustra a utilização destes dois critérios. 1 É necessário referir o rio “em condições naturais” por causa das grandes modificações de regime de escoamento introduzidas por tomas de água e por albufeiras de armazenamento. Manual de Hidrologia
  • 25. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-8 Figure 2.5 Critérios de ordenação de cursos de água 2.3.3 Densidade de drenagem A densidade de drenagem, λ, é a relação entre o comprimento total dos cursos de água duma bacia, sejam eles perenes, intermitentes ou efémeros, e a área da bacia: ∑ li λ= i A λ é dado em km-1 e varia normalmente entre 0.5 e 3.5 km-1. A densidade de drenagem é também um indicador da tendência para a ocorrência de cheias numa bacia hidrográfica. Com efeito, numa bacia bem drenada o escoamento superficial é rapidamente canalizado para linhas de água bem definidas e pode surgir concentrado na secção de referência da bacia. Naquelas bacias mal drenadas (λ baixo), a precipitação vai originar sobretudo escoamento sub-superficial e subterrâneo que se processam com muito mais lentidão, não originando por isso picos de cheia elevados. 2.4 CARACTERÍSTICAS DO RELEVO 2.4.1 Curva hipsométrica A curva hipsométrica é a curva A(z) em que A é a área da bacia que se situa acima da altitude ou cota z referida ao nível do mar. A área pode ser expressa em km2 ou em percentagem da área total da bacia. A curva hipsométrica é obtida a partir da carta hipsométrica, carta onde a representação das altitudes é feita por curvas de nível ou por qualquer outro processo de representação gráfica. A figura 2.6 apresenta um exemplo de curva hipsométrica. A figura 2.7 apresenta a curva hipsométrica da bacia do rio Malema. Manual de Hidrologia
  • 26. Caracterízação duma bacia hidrográfica Figure 2.6 Curva hipsométrica Figure 2.7 Curva hipsométrica do rio Malema Manual de Hidrologia 2-9
  • 27. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2.4.2 2-10 Altitude média A altitude média da bacia, Z, é dada pela expressão: Atotal ∫ z ⋅ da 0 Z= Atotal O integral dá a área limitada pela curva z(A) e pelos eixos coordenados, podendo ser fácilmente calculado por uma fórmula de integração numérica a partir da curva hipsométrica. Um processo mais expedito é o de assimilar o integral a um somatório: Atotal ∫ 0 n z ⋅ da = ∑ z i Ai i=1 em que Ai é a área da bacia entre as curvas de nível i e (i+1) e zi a média das altitudes dessas duas curvas de nível. A altitude média é uma característica com grande influência em variáveis hidrometeorológicas como a precipitação e a temperatura. Em Moçambique, as zonas de maior altitude (Gurué, Milange, Angónia, Lichinga) são as regiões de maiores precipitações anuais médias e mais baixas temperaturas mínimas. 2.4.3 Altura média A altura média, H, é dada pela expressão: Atotal H= ∫ h ⋅ da 0 Atotal em que h é a cota acima da secção de referência ou de estudo, em vez de z que é a altitude ou cota referida ao nível do mar. Assim, se estivermos a tomar como secção de referência a foz no oceano, as alturas h coincidem com as altitudes z; se a secção de referência fôr, por exemplo, a secção de confluência do afluente com o rio principal, então para esse afluente ter-se-á: ou h = z - zconf h = z - z100 já que toda a bacia (100%) do afluente se situa acima de zconf. Daqui se tira imediatamente que Manual de Hidrologia
  • 28. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-11 H = Z - z100 A altura média da bacia dá-nos uma ideia se a bacia é muito ou pouco acidentada. Normalmente, as bacias com maiores alturas médias apresentam quedas mais importantes que podem por vezes ser aproveitadas para a produção de energia hidroeléctrica. 2.4.4 Perfil do rio O perfil do rio é a representação gráfica da função z(L) em que z é a cota duma dada secção do rio e L a respectiva distância à foz. A figura 2.8 apresenta a título de exemplo o perfil do rio Malema e dos seus afluentes Namparro, Mutivasse, Nataleia e Lalace. Note-se que a marcação de distâncias para os afluentes em sentido contrário ao rio principal, a partir da confluência, torna o gráfico mais legível do que seria se todas as distâncias fossem marcadas no mesmo sentido. O perfil dum rio dá uma noção imediato das zonas de quedas importantes, grandes extensões quase planas e mais facilmente inundáveis, etc. 2.4.5 Inclinação média do leito A inclinação média do leito obtem-se dividindo a diferença entre as cotas máxima e mínima do leito pelo comprimento do rio. É também possível determinar de modo análogo a inclinação média dum troço do rio. A partir da figura 2.8, pode-se calcular que a inclinação média de todo o leito do rio Malema é de 0.00859 mas que o troço de 135 km de jusante tem uma inclinação de apenas 0.00278. 2.4.6 Declividade dos terrenos Quanto maior a declividade dos terrenos maior será a velocidade com que se dá o escorrimento superfícial e, consequentemente, menor será o tempo que a água leva a atingir o sistema de drenagem, facilitando o aparecimento de maiores pontas de cheias. Para tal contribui também o facto de maior declividade corresponder a uma menor infiltração de água no solo. Por outro lado, as maiores velocidades agravam o problema da erosão do solo. A declividade dos terrenos duma bacia é normalmente obtida por amostragem: • • • marcam-se, por exemplo a partir duma quadrícula aposta ao mapa da bacia, um número elevado de pontos no interior da bacia; para cada ponto determina-se a declividade a partir das duas curvas de nível entre as quais o ponto se situa; fica-se assim com uma distribuição estatística das declividades o que permite igualmente obter a declividade média da bacia. Manual de Hidrologia
  • 29. Caracterízação duma bacia hidrográfica Figure 2.8 Perfis do rio Malema e afluentes Manual de Hidrologia 2-12
  • 30. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-13 Um outro método para determinar a declividade média dos terrenos é o método do Alvord. Suponha-se a bacia representada numa carta com curvas de nível espaçadas de D (por exemplo, D = 20 metros). A figura 2.9 representa as curvas de nível às cotas n-D, n, n+D. Figure 2.9 Método de Alvord. Considere-se a curva de nível à cota n. A faixa de terreno entre as curvas de nível à cota n-D/2 e n+D/2 está representada a tracejado na figura. Se se designar por dn a largura média dessa faixa, a declividade média dos terrenos nessa faixa será dada por in = D/dn. Se o comprimento da curva de nível à cota n for Ln, então: D Ln = D L n in = d n Ln An em que An é área da faixa a tracejado. Este raciocínio é aplicável a qualquer faixa de terreno correspondente a uma curva de nível da carta. Portanto, pode-se definir a declividade média dos terrenos da bacia como a média ponderada das declividades médias de todas as faixas que compõem a bacia. I= DL ∑ An i n ∑ = D Ln = ∑ An ∑ An A em que L é o comprimento total das curvas de nível de equidistância D existentes na bacia e A é a área da bacia. Esta método é, assim, bastante prático pois, conhecido D, basta determinar A com um planímetro (ou GIS) e medir L com um curvímetro (ou GIS). Note-se que, sendo I um valor adimensional, se deve exprimir tanto L como D em km e A em km2. Manual de Hidrologia
  • 31. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2.4.7 2-14 Rectângulo equivalente O rectângulo equivalente é o rectângulo com área e perímetro iguais aos da bacia, isto é: 2(Le+le) = P Le * le = A Pode-se ressolver as duas equações para obter Le e le: Le = le = 2 P + P -A 16 4 2 Só é válida para P ≥ 16 A 2 P - P -A 16 4 A bacia do rio Malema tem A = 2,600 km2 e P = 342 km, donde se tira para o rectângulo equivalente: Le = 154 km; le = 17 km. Figure 2.10 Rectângulo equivalente do rio Malema A figura 2.10 faz a representação do rectângulo equivalente para a bacia do rio Malema. Nele marcaram-se as várias curvas de nível espaçadas de formas a representarem as correspondentes áreas. Por exemplo, a área entre as curvas de nível de 700 e 800 m é de 20 x 17 = 340 km2 . As áreas são obtidas a partir da curva hipsométrica. 2.4.8 Índice de declive médio O índice de declive médio, Ii, entre as curvas de nível de cotas Zi e Zi-1 é dado pela relação: Z i - Z i -1 2, Ii = Xi em que Xi é a distância entre as duas curvas de nível no rectângulo equivalente. Por exemplo, no caso da bacia do rio Malema, o índice de declive médio entre as cotas 1,300 e 1,400 m é: Manual de Hidrologia
  • 32. Caracterízação duma bacia hidrográfica I= 2-15 1,400 - 1,300 = 0.0159 6,300 enquanto que ele é apenas de 0,0024 entre as cotas 600 e 700 m. 2.4.9 Índice de declive de Roche O índice de declive de Roche, Ip, é o índice de declive médio para toda a bacia. No exemplo do rio Malema, o rectângulo equivalente permite calcular I p= 1,900 - 465 = 0.00932 154,000 2.4.10 Índice de declive global O índice de Roche é muito afectado se a bacia tiver pequenas áreas de grande altitude. Afim de representar mais fielmente as características médias da bacia, o índice de declive global, Ig, exclui as áreas correspondentes aos 5% mais altos e aos 5% mais baixos da bacia: Ig= Z 5 - Z 95 Le Para a bacia do Malema, obtem-se: Ig= 1,400 - 540 = 0.00558. 154,000 Como é evidente, Ig é sempre inferior a Ip. Os valores de Z5 e Z95 são obtidos a partir da curva hipsométrica. 2.4.11 Curva hidrodinâmica A curva hidrodinâmica representa, a menos dum factor constante, as possibilidades energéticas da bacia. Se se considerar um volume de água V caindo duma altura h, a energia potencial que lhe corresponde é En = ρgVh Joules (com as unidades do Sistema Internacional), ou En = 2,722 Vh KWh (com V em Mm3 e h em m). Considere-se agora o caso dum rio sem afluentes onde estão identificadas diversas secções Manual de Hidrologia
  • 33. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-16 (figura 2.11) e marquem-se os pontos (Vi, hi). Figure 2.11 Curva hidrodinâmica h é a cota da secção e V o volume anual médio que nela se escoa. A área delimitada pela curva V(h) multiplicada pelo factor 2,722 dá a energia potencial total correspondente ao escoamento do rio, designando-se por potencial fluvial bruto. h max En = 2,722 ∫ Vdh 3 0 Considere-se agora o caso dum rio com afluentes como se representa na figura 2.12. O processo de representação da curva V(h) pode ser repetido para o rio principal e para os afluentes, à semelhança do caso anterior, permitindo determinar o potencial fluvial bruto de cada afluente e da totalidade da bacia. Figura 2.12 Curva Hidrodinâmica para um rio principal e os afluentes A determinação do potencial fluvial bruto implica o conhecimento dos volumes escoados nas diversas secções. Quando tal não acontece e se dispõe apenas de cartas topográficas com a indicação da rede de drenagem, pode utilizar-se a curva hidrodinâmica para uma primeira ideia do potencial energético da bacia. A curva hidrodinâmica baseia-se na hipótese da proporcionalidade entre áreas drenadas e volumes escoados: V1 =V2 =V3 = ... = K, A1 A2 A3 hipótese válida em primeira aproximação desde que toda a área tenha características climáticas, geológicas e de solos homogéneas. Então: Manual de Hidrologia
  • 34. Caracterízação duma bacia hidrográfica h max En = 2,722 ∫ V ⋅ dh = 2,722 K 2-17 h max 0 ∫ A ⋅ dh 0 Portanto, se se traçar uma curva semelhante às das figuras 2.11 e 2.12 mas em que os volumes escoados são substituidos pelas correspondentes áreas de drenagem, teremos a curva hidrodinâmica. Para se obter o valor do potencial energético multiplica-se a área delimitada pela curva hidrodinâmica pelo factor (2,722 * K). O valor de K pode ser estimado por uma das seguintes vias: • • se numa secção (de preferência, a jusante) se conhecer o valor do volume anual médio V e sendo A a respectiva área drenante, virá K = V/A, com K em m se V em Mm3 e A em km2. se não houver quaisquer dados de escoamento na bacia, utilizar o valor de K calculado para uma bacia vizinha com características similares. As figuras 2.13 e 2.14 apresentam as curvas hidrodinâmica e do potencial fluvial bruto da bacia do Malema. As curvas diferem entre si porque a bacia não tem características homogéneas de precipitação e, por isso, os escoamentos não são proporcionais às áreas. 2.4.12 Coeficiente de massividade O coeficiente de massividade é o quociente entre a altura média da bacia, em metros, e a sua área, em km2. O coeficiente de massividade da bacia do rio Malema é de 340/2,600 = 0.13. Este coeficiente toma valores elevados para pequenas bacias com grandes desníveis e valores baixos para grandes bacias de relevo pouco acentuado. No entanto, os respectivos valores podem ser os mesmos para bacias muito diferentes. Por exemplo, uma bacia pequena com relevo pouco acentuado e uma bacia grande com grandes desníveis podem ter valores muito próximos de coeficiente de massividade. 2.4.13 Coeficiente orográfico O coeficiente orográfico é o produto da altura média pelo coeficiente de massividade. O coeficiente orográfico permite fazer a distinção de situações em relação às quais o coeficiente de massividade dá indicações dúbias. Admite-se que a fronteira entre relevo pouco acentuado e relevo acentuado é marcado pelo valor do coeficiente oregráfico igual a 6. O coeficiente orográfico da bacia do rio Malema é de 44. Manual de Hidrologia
  • 35. Caracterízação duma bacia hidrográfica Figura 2.13 Curva hidrodinâmica do rio Malema e alguns afluentes Manual de Hidrologia 2-18
  • 36. Caracterízação duma bacia hidrográfica 2-19 Figura 2.14 Curvas do potencial fluvial bruto da bacia do rio MalemaCARACTERÍSTICAS DE GEOLOGIA, SOLOS E VEGETAÇÃO A geologia duma bacia hidrográfica e o tipo de solos dela resultante têm uma grande influência no movimento da água na bacia, em particulação no que toca ao escoamento, superfical e subterrâneo. A geologia define a existência de formações permeáveis e impermeáveis e de aquíferos bem como a forma como os aquíferos são alimentados e contribuem para alimentar o escoamento dos rios. A geologia condiciona a localização do nível freático que tem grande importância para o fenómeno da evapotranspiração. Os rios que comunicam com importantes lençóis freáticos são normalmente rios perenes, com caudais significativos mesmo durante as estiagens. O tipo de solos e das camadas geológicas superficiais condicionam fortemente a permeabilidade dos terrenos e, consequentemente, a infiltração, fenómeno que está na base da recarga dos aquíferos. Terrenos pouco permeáveis dão origem a que toda a precipitação se transforme rápidamente em escoamento superficial, gerando por isso cheias mais intensas e de menor duração. A geologia e os solos duma bacia são também importantes factores condicionantes da erosão superficial. As formações mais recentes (do Holoceno e Pleistoceno) assim como formações calcáreas e graníticas muito alteradas são as mais fácilmente erodíveis. A erosão superficial nos terrenos da bacia hidrográfica constitui a fonte do caudal sólido que tem de ser transportado pelo rio. A cobertura vegetal também tem bastante importância para os fenómenos hidrológicos. Duma maneira geral, terrenos com florestas e matas têm maiores infiltrações e menores velocidade de escoamento superficial do que terrenos nus ou cultivados. Isso ajuda a diminuir a erosão superficial dos terrenos e origina cheias mais prolongadas e menos intensas. Por outro lado, o tipo de vegetação influencia fortemente o fenómeno de evapotranspiração. A geologia, os solos e a vegetação têm importância não apenas em grandes bacias hidrográficas mas mesmo em pequenas bacias urbanas, como é evidenciado pelos grandes problemas de erosão que se verificam em algumas das principais cidades de Moçambique como Maputo, Nampula, Nacala e Pemba. Manual de Hidrologia
  • 37. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3 3.1 3-1 REVISÃO DE CONCEITOS DE PROBABILIDADES E ESTATÍSTICA DEFINIÇÕES Uma variável aleatória χ é um variável que toma valores não resultantes de processos e leis físicas ou relações matemáticas bem determinadas, sendo por isso atribuídos à sorte (acaso). Por exemplo: o número de pontos no lançamento dum dado. Uma variável aleatória pode ser discreta ou contínua. É discreta se só pode tomar valores descontínuos, por exemplo, o número de dias de chuva num ano. A variável aleatória diz-se contínua quando, num determinado intervalo de valores, limitado ou não, puder tomar qualquer valor desse intervalo, por exemplo, a precipitação anual. A população Ω é o conjunto de todos os valores que podem ser assumidos por uma variável aleatória. Designa-se por amostra a parte observada da população. Um acontecimento Ai é qualquer subconjunto da população. A frequência (ou frequência relativa) dum acontecimento Ai é definida por f = n/N em que n é o número de vezes em que o acontecimento Ai ocorre e N o tamanho da amostra. Por exemplo, se há um registo de 10 anos de precipitação e se considera o acontecimento de Pano > 1200 mm, pode acontecer que tal acontecimento ocorra 2 vezes na amostra, então f = 2/10 = 0.2. A probabilidade P dum acontecimento Ai é P(Ai) = limN→∞f A moderna teoria das probabilidades baseia-se numa axiomática desenvolvida por Kolmogorov da qual se deduzem as seguintes consequências: P(Ai) ≥ 0; P(Ω) = 1; P(A ∪ B) = P(A) + P(B) - P(A ∩ B); P(A ∩ B) = P(A | B) x P(B) = P(B|A) x P(A); Se P(A ∩ B) = P(A) x P(B), os acontecimentos são independentes. 3.2 FUNÇÕES DE DISTRIBUIÇÃO, DURAÇÃO E DENSIDADE DE PROBABILIDADE Considere-se uma amostra de N valores duma variável aleatória e classifique-se essa amostra por ordem crescente: x1 ≤ x2 ≤ ... ≤ xN A probabilidade de que a variável aleatória χ assuma um valor não superior a xi é P (χ ≤xi) = i/N = F(xi) Manual de Hidrologia
  • 38. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-2 F(xi) é a função de distribuição empírica (FDE). Se se classificar a amostra por ordem decrescente: x1 ≥ x2 ≥ ... ≥ xN A probabilidade de que a variável aleatória χ assuma um valor não inferior a xi é P (χ ≥xi) = i/N = G(xi) G (xi) é a função de duração. Note-se que P(χ ≤xi) + P (χ ≥xi) = P (χ ≤xi) + P(χ >xi) + P(χ =xi) = 1 + P (χ = xi) = F(xi) + G(xi) Para variáveis aleatórias contínuas, P (χ =xi) = 0 ⇒ F(x) + G(x) = 1 Para variáveis aleatórias discretas, F(x) + G(x) = 1 + P(χ =xi) Para uma variável aleatória contínua, define-se a função densidade de probabilidade f(x): dF(x) f(x) = dx f ( x ) = Pr ob( x − dx dx ≤χ ≤ x+ ) 2 2 Há definições paralelas para as variáveis aleatórias discretas. Figure 3.1 Funções de distribuição, duração e densidade de probabilidade A figura 3.1 ilustra as relações entre F(x), G(x) e f(x) para uma variável aleatória contínua. Pode verificar-se teoricamente que o estimador i/N para a probabilidade do acontecimento (χ ≤ xi) é um estimador com viez, i.e., quando a dimensão da amostra cresce indefinidamente o valor do estimador não tende para o valor correcto da probabilidade. Assim, é preferível utilizar para as funções de distribuição e de duração. Manual de Hidrologia
  • 39. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-3 F (xi) = Prob (x ≤xi) = i/N+1 G (xi) = Prob (x ≥xi) = i/N+1 3.3 PERÍODO DE RETORNO E RISCO HIDROLÓGICO Considere-se uma série de 50 valores, por exemplo de precipitação anual, ordenados por ordem crescente. O valor de ordem i = 41 é igualado ou excedido 10 vezes na série correspondendo-lhe uma probabilidade de não excedência F = 0.804. O intervalo médio entre ocorrências sucessivas do acontecimento (χ ≥x41) seria então de cerca de 5 anos. Este intervalo médio entre ocorrências sucessivas dum acontecimento é designado por período de retorno T. O período de retorno do acontecimento (χ ≥xi) relaciona-se com a probabilidade de excedência, G(xi), ou de não excedência, F(xi), pelas expressões: T(xi) = 1 / G(xi) = 1 / {1-F(xi)} Assim, no exemplo anteriormente referido, ter-se-ia F(x41) = P(χ ≤x41) = 0.804 G(x41) = P(χ ≥x41) = 0.196 T(x41) = 1 / 0.196 ≈ 5 anos Importa deixar bem claro que o conceito de período de retorno não está associado a qualquer ideia de repetição cíclica e regular do acontecimento. Se, por exemplo, um acontecimento tem um período de retorno de 10 anos, isso não quer dizer que tal acontecimento ocorre regularmente de 10 em 10 anos: ele pode ocorrer em dois anos consecutivos assim como pode não ocorrer durante trinta anos. Se, porém, dispusermos duma série suficientemente longa, então o intervalo médio entre ocorrências consecutivas do acontecimento seria de 10 anos. Considere-se agora o acontecimento (χ ≥x) com uma probabilidade de ocorrência G(x) relativamente baixa. A probabilidade de não ocorrência do acontecimento em 2 anos sucessivos será [F(x)]2 e a de não ocorrência em N anos sucessivos será [F(x)]N. Então, a probabilidade de que o acontecimento ocorra pelo menos uma vez em N anos sucessivos será dada por 1-[F(x)]N. Essa probabilidade designa-se por risco hidrológico R(x, N), conceito com bastante interesse prático como se pode ver pelos exemplos seguintes. 1º Exemplo) Uma barragem levará 6 anos a ser construída. A sua construção far-se-á com a protecção de ensecadeiras e desvio do rio através de galerias (como se fez, por exemplo, com a barragem de Cahora-Bassa). Se adoptar como caudal de dimensionamento das galerias o correspondente a uma cheia com o período de retorno T = 20 anos, qual é a probabilidade das ensecadeiras serem galgadas durante a construção? Manual de Hidrologia
  • 40. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-4 A probabilidade de galgamento durante a construção corresponde à situação de insuficiência das galerias de desvio para passagem o caudal afluente. A probabilidade pedida é, pois, o risco hidrológico do acontecimento (Qafl > Q20) para N = 6: R = 1 - F(x)6 = 1 - [1 - G(x)]6 = 1 - [1 - 1/T(x)]6 Como T = 20, R = 0.265. A probabilidade de galgamento durante a construção é de 0.265, ou seja, aproximadamente 1 possibilidade em 4. 2º Exemplo) Se no exemplo anterior se pretender que a probabilidade de galgamento das ensecadeiras durante a construção (i.e., o risco hidrológico) não exceda 10%, qual deverá ser o caudal de dimensionamento das galerias? R = 0.10 = 1 - [1 - 1/T(x)]6 ⇒ T = 57.4 ≈ 60 anos. As galerias deveriam ser dimensionadas para um caudal com um período de retorno de cerca de 60 anos. 3.4 3.4.1 PARÂMETROS ESTATÍSTICOS DA POPULAÇÃO E DA AMOSTRA Introdução Na Estatística, a população ou a amostra com que se está a lidar são representadas por um número relativamente pequeno de parâmetros estatísticos. Trata-se de uma forma sintética de apresentar as principais características da população ou da amostra, em relação às quais interessa definir: - a tendência central; - a dispensão; - a assimetria; - os quantis. 3.4.2 Momentos da população e da amostra Define-se momento de ordem r em relação à origem como µ = ' r -∞ ∫x +∞ Manual de Hidrologia r ⋅ f ( x )dx para a população
  • 41. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística m r' = 1 N N ∑x i =1 r i 3-5 para a amostra A média da população, µ, ou da amostra, x , são os momentos de ordem 1 em relação à origem: µ = µ1' x = m1' Define-se momento centrado de ordem r como o momento de ordem r tomando a média como origem: -∞ µ r = ∫ (x - µ )r f(x) ⋅ dx para a população +∞ N ∑( x - x ) r i mr = 3.4.3 i=1 para a amostra N Tendência central Os parâmetros que caracterizam a tendência central indicam à volta de que valor se distribuem os valores da população ou da amostra. Os parâmetros mais utilizados são a média µ ou x e a mediana , xm . A média da população e da amostra são dadas respectivamente por µ= +∞ ∫ x f(x) dx -∞ x= 1 N N ∑x i =1 i A mediana é o valor que divide a população ou a amostra em duas partes de igual probabilidade acumulada. Para uma população, a mediana é definida tal que: µ ∫ -∞ ∞ f(x) dx = ∫ f(x) dx = 0.5 µ Para uma amostra a mediana, xm é definida tal que (amostra ordenada) Manual de Hidrologia
  • 42. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística - 3-6 se N ímpar, m = int(N/2) + 1 por exº: N=25 ⇒ m=13 - se N par: 1 x m = (x N + x N ) +1 2 2 2 por exemplo, se N=24, xm = (x12 + x13)/2 3.4.4 Dispersão Os parâmetros que caracterizam a dispersão indicam se os elementos da população ou da amostra estão muito ou pouco concentrados em torno da média. Os parâmetros mais utilizados são: - Variância σ2, s2; - Desvio padrão σ, s; - Coeficiente de variação ηv, cv. A variância é o momento centrado da 2ª ordem: -∞ σ = 2 ∫ (x - µ ) 2 +∞ N 2 s = ∑ ( xi - x )2 i=1 N f(x)dx N ∑ ( xi - x )2 N * = i=1 N -1 N -1 N/N-1 é um factor de correcção do viez. Diz-se que um estimador dum parâmetro apresenta viez quando o seu valor não tende para o valor correspondente da população quando a dimensão da amostra cresce indefinidamente. O desvio padrão é a raiz quadrada da variância. Note-se que o desvio padrão é expresso nas mesmas unidades que a média e que os elementos da amostra ou da população. O coeficiente de variação é a relação entre o desvio padrão e a média: σ s ηv = cv = µ x É um parâmetro adimensional. A figura 3.2 apresenta duas séries com as mesmas médias mas com diferentes desvios padrão. Manual de Hidrologia
  • 43. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-7 Figure 3.2 Distribuições do mesmo tipo, com s mesmas média e variâncias diferentes 3.4.5 Assimetria As populações e as amostras (e as distribuições que as caracterizam) podem ser simétricas (assimetria nula) ou assimétricas (assimetria positiva ou negativa). A figura 3.3 apresenta três distribuições com assimetria nula, negativa e positiva. Figure 3.3 Distribuições com diferentes assimetrias Quando a assimetria é nula, a média e a mediana coincidem; quando a assimetria é positiva, a média é superior à mediana e, quando é negativa, a média é inferior à mediana. A média é muito mais influenciada pelos valores extremos que a mediana. O parâmetro que caracteriza a assimetria é o coeficiente de assimetria, γ ou g, que é o momento centrado de 3ª ordem transformado em parâmetro adimensional pela divisão por σ3. +∞ ∫ (x - µ ) 3 γ= f(x) dx -∞ σ3 N g= ∑ ( xi - x )3 i=1 Manual de Hidrologia Ns 3 N 2 * N = (N - 1)(N - 2) ∑( x - x ) 3 i i=1 s 3 * N (N - 1)(N - 2)
  • 44. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-8 N2/{(N-1)(N-2)} é o factor de correcção do viez. 3.4.6 Quantis O quantil da ordem p é o valor ξp ou xp definido por: ξp ξ p = ∫ f(x) dx = p -∞ Numa amostra ordenada o quantil xp é o valor de ordem j = N * p. 0≤p≤1 A mediana é o quantil de ordem 0.5. 3.5 3.5.1 AJUSTAMENTO DUMA AMOSTRA A UMA DISTRIBUIÇÃO TEÓRICA Metodologia A partir duma dada amostra é possível definir a sua função de distribuição empírica. A FDE é, no entanto, afectada pela dimensão limitada da amostra e, por outro lado, não permite extrapolar para períodos de retorno superiores à duração da amostra. Por essa razão, faz-se o ajustamento da amostra a uma função de distribuição teórica (ou lei de probabilidades ou simplesmente distribuição), procurando-se de entre as várias que têm sido propostas aquela que melhor se adapte à FDE. A sequência de cálculo que se adopta para a extrapolação de valores com altos períodos de retorno, necessários para o dimensionamento de obras hidráulicas, é então a seguinte: - selecção de uma de entre as distribuições teóricas; especificação ou ajustamento da distribuição; avaliação do ajustamento; utilização da distribuição para a previsão de valores (extrapolação). As distribuições teóricas mais utilizadas em Hidrologia são a Normal (ou de Gauss), a LogNormal de 2 parâmetros (Lei de Galton), a Log-Normal de 3 parâmetros, a de Gumbel, a Gama, a Pearson tipo III e a Log-Pearson tipo III. Neste capítulo apenas se estudará a distribuição Normal, estudando-se algumas das restantes no capítulo dedicado às cheias. A especificação ou ajustamento da distribuição consiste na estimação dos respectivos parâmetros a partir da informação contida na amostra. Existem diversos métodos para fazer o Manual de Hidrologia
  • 45. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-9 ajustamento sendo os mais correntes o método dos momentos, o método da máxima verosimilhança e o método dos mínimos quadrados. Embora nem sempre seja o mais eficiente, ir-se-á estudar apenas o método dos momentos que é o de mais simples aplicação. A estimação pelo método dos momentos consiste em seleccionar os valores dos m parâmetros da distribuição por forma a que os primeiros m momentos da distribuição sejam iguais aos correspondentes momentos da amostra. 3.5.2 Distribuição Normal ou de Gauss A distribuição Normal é a lei de probabilidades que melhor tem sido estudada do ponto de vista teórico. Tem um enorme campo de aplicação não apenas em Hidrologia mas em muitas outras áreas de Engenharia como a caracterização de solicitações em estruturas ou o controle de qualidade dos materiais. A função densidade é: f(x) = -(x -b )2 1 e 2a 2 a 2π A função de distribuição é: x F(x) = ∫ f(x) dx f(x) = -∞ dF(x) dx A distribuição é simétrica, não sendo integrável analíticamente. F(x) é obtida por integração numérica e dada em tabelas. A distribuição tem 2 parâmetros: a, b. Os momentos da distribuição são obtidos em função dos parâmetros: - média µ = b; variância σ2 = a2; coeficiente de assimetria γ = 0. Por tal razão, é frequente escrever a expressão de f(x) substituindo a, b, por σ e µ: f(x) = -(x - µ )2 1 e 2σ 2 σ 2π Demonstra-se que a distribuição Normal goza da propriedade de invariância linear: Se x é uma variável aleatória com distribuição Normal, média µx e desvio padrão σx, então y = c1x + c2 é também uma variável aleatória normal, com média µy = c1µx + c2 e desvio padrão σy= c1σx. Manual de Hidrologia
  • 46. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-10 As tabelas da distribuição Normal são construídas para uma variável z, variável normal reduzida, definida por z = (x – µx)/σx Com esta definição e atendendo à propriedade da invariância linear da distribuição Normal, é imediato que µz = 0 e σz = 1. Diz-se então que z é uma variável N(0,1). A tabela 3.1, reproduzida de Lencastre e Franco (1984), dá os valores de F(z) para z de 0.00 a 3.49 em intervalos de 0.01. Atendendo à simetria da distribuição, a tabela permite obter valores de F(z) para –3.49 ≤ z ≤ 0. Manual de Hidrologia
  • 47. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-11 Lei Normal ou de Gauss Função de distribuição (µ=0; σ= 1) Z 0 0 0.5 0.01 0.504 0.02 0.508 0.03 0.512 0.04 0.516 0.05 0.5199 0.06 0.5239 0.07 0.5279 0.08 0.5319 0.09 0.5359 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5398 0.5793 0.6179 0.6554 0.5438 0.5832 0.6217 0.6591 0.5478 0.5871 0.6255 0.6628 0.5517 0.591 0.6293 0.6664 0.5557 0.5948 0.6331 0.67 0.5596 0.5987 0.6368 0.6736 0.5636 0.6026 0.6406 0.6772 0.5675 0.6064 0.6443 0.6808 0.5714 0.6103 0.648 0.6844 0.5753 0.6141 0.6517 0.6879 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 0.6915 0.7257 0.758 0.7881 0.8159 0.695 0.7291 0.7611 0.791 0.8186 0.6985 0.7324 0.7642 0.7939 0.8212 0.7019 0.7357 0.7673 0.7967 0.8238 0.7054 0.7389 0.7704 0.7995 0.8264 0.7088 0.7422 0.7734 0.8023 0.8289 0.7123 0.7454 0.7764 0.8051 0.8315 0.7157 0.7486 0.7794 0.8078 0.834 0.719 0.7517 0.7823 0.8106 0.8365 0.7224 0.7549 0.7852 0.8133 0.8389 1 1.1 1.2 1.3 1.4 0.8413 0.8643 0.8849 0.9032 0.9192 0.8438 0.8665 0.8869 0.9049 0.9207 0.8461 0.8686 0.8888 0.9066 0.9222 0.8485 0.8708 0.8907 0.9082 0.9236 0.8508 0.8729 0.8925 0.9099 0.9251 0.8531 0.8749 0.8944 0.9115 0.9265 0.8554 0.877 0.8962 0.9131 0.9279 0.8577 0.879 0.898 0.9147 0.9292 0.8599 0.881 0.8997 0.9162 0.9306 0.8621 0.883 0.9015 0.9177 0.9319 1.5 1.6 1.7 1.8 1.9 0.9332 0.9452 0.9554 0.9641 0.9713 0.9345 0.9463 0.9564 0.9649 0.9719 0.9357 0.9474 0.9573 0.9656 0.9726 0.937 0.9484 0.9582 0.9664 0.9732 0.9382 0.9495 0.9591 0.9671 0.9738 0.9394 0.9505 0.9599 0.9678 0.9744 0.9406 0.9515 0.9608 0.9686 0.975 0.9418 0.9525 0.9616 0.9693 0.9756 0.9429 0.9535 0.9625 0.9699 0.9761 0.9441 0.9545 0.9633 0.9706 0.9767 2 2.1 2.2 2.3 2.4 0.9772 0.9821 0.9861 0.9893 0.9918 0.9778 0.9826 0.9864 0.9896 0.992 0.9783 0.983 0.9868 0.9898 0.9922 0.9788 0.9834 0.9871 0.9901 0.9925 0.9793 0.9838 0.9875 0.9904 0.9927 0.9798 0.9642 0.9878 0.9906 0.9929 0.9803 0.9846 0.9881 0.9909 0.9931 0.9808 0.985 0.9884 0.9911 0.9932 0.9812 0.9854 0.9887 0.9913 0.9934 0.9817 0.9857 0.989 0.9916 0.9936 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9 0.9938 0.9953 0.9965 0.9974 0.9981 0.994 0.9955 0.9966 0.9975 0.9982 0.9941 0.9956 0.9967 0.9976 0.9982 0.9943 0.9957 0.9968 0.9977 0.9983 0.9945 0.9959 0.9969 0.9977 0.9984 0.9946 0.996 0.997 0.9978 0.9984 0.9948 0.9961 0.9971 0.9979 0.9985 0.9949 0.9962 0.9972 0.9979 0.9985 0.9951 0.9963 0.9973 0.998 0.9986 0.9952 0.9964 0.9974 0.9981 0.9986 3 3.1 3.2 3.3 3.4 0.9987 0.999 0.9993 0.9995 0.9997 0.9987 0.9991 0.9993 0.9995 0.9997 0.9987 0.9991 0.9994 0.9995 0.9997 0.9988 0.9991 0.9994 0.9996 0.9997 0.9988 0.9992 0.9994 0.9996 0.9997 0.9989 0.9992 0.9994 0.9996 0.9997 0.9989 0.9992 0.9994 0.9996 0.9997 0.9989 0.9992 0.9995 0.9996 0.9997 0.999 0.9993 0.9995 0.9996 0.9997 0.999 0.9993 0.9995 0.9997 0.9998 Tabela 3.1 – Função de distribuição Normal ou de Gauss — Para volores negativos de z, utilizar o complemento aritmético para 1 dos volores F (z) correspondentes ao volor positivo: F(-z)= 1 – F (z) de Ex.: F (- 1) = 1 - F(1) = 1 -0,8413=0,1587 — Para valores de F (z) < 0,5, calcular 1 - F [z], ler o valor de z e afectar esse valor de sinal negative. Ex.: F |z]= 0,0668; 1 - F (z] = 0,9332; z=-l,5 Esta tabela pode ser utilizada para qualquer distribuição Normal mesmo que não tenha µ=0 e σ=1, bastando para isso fazer a transformação (x-µx)/σx. Da tabela tira-se que as probabilidades de x estar entre µ+σ e µ-σ; µ+2σ e µ-2σ; µ+3σ e µ-3σ são respectivamente de 68.3%, 95.4% e 99.7%. As probabilidades de 90%, 95% e 99% correspondem aos intervalos µ ± 1.645σ, µ ± 1.96σ, µ ± 2.575σ. Manual de Hidrologia
  • 48. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-12 Existem métodos analíticos para testar se o ajustamento duma série à Distribuição Normal (ou a outra distribuição teórica) é aceitável. Estes métodos, como o teste do qui-quadrado e o de Kolmogorov-Smirnov, serão vistos no capítulo dedicado à estatística de cheias. Um processo também muito utilizado para verificar se o ajustamento é aceitável é a utilização de papel de probabilidade, papel com os eixos construidos de tal maneira que, se uma série se ajusta bem à distribuição representada nesse papel, os seus pontos alinham-se aproximadamente segundo uma recta. Os pontos têm coordenadas (F(xi), Yi) em que F(xi) é o probabilidade de não excedência do valor i da série ordenada em ordem crescente ("plotting position") e Yi o valor i da série. Existem muitas expressões para o cálculo da "plotting position": - Califórnia Hazen Weibull Chegadayev Blom Tukey i/N; (2i-1)/2N; i/(N+1); (i-0.3)/(N+0.4); (i-0.375)/(N+0.25); (3i-1)/(3N+1). A fórmula mais eficiente e a mais utilizada é a de Weibull. 3.6 3.6.1 CORRELAÇÃO E REGRESSÃO LINEARES Correlação e regressão linear simples A correlação e regressão lineares constituem uma das ferramentas mais utilizadas em Hidrologia, essencialmente para: - preencher falhas numa série de registos; - estender uma série hidrológica a partir de outras mais longas. A figura 3.4 representa genéricamente o domínio das variáveis aleatórias x e y com funções de distribuição de probabilidade respectivamente f(x) e g(y). Figure 3.4 Correlação entre duas variáveis aleatórias Manual de Hidrologia
  • 49. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-13 Ter-se-á então: dx dx ≤ x ≤ x + ) = P(x) = f(x)dx 2 2 P(y) = g(y)d(y) dx dx dy dy P(x ≤ x ≤ x+ ∩ y ≤ y ≤ y + ) = P(x, y) = f(x)g(x)dx dy 2 2 2 2 acontecimentos forem independentes. P(x - se os Se os acontecimentos não forem independentes, diz-se que há entre as varáveis uma dependência estocástica. Quando essa dependência é linear, ela é medida pelo coeficiente de correlação linear ρxy: y x ρ xy = ∫ ∫ (x - µ x )(y - µ y ) f(x)g(y) dxdy N r xy = para a população; σ xσ y ∑ ( xi - x )( yi - y ) i=1 (N - 1) s x s y N ∑ x y - Nxy i = i i=1 (N - 1) s x s y para a amostra. Demonstra-se que rxy, ρxy ≤ 1. Quando o coeficiente de correlação iguala a unidade, a correlação é perfeita e os pontos (x,y) alinham-se segundo uma recta. Quando a apresentação dos pontos (x,y) sugere uma "nuvem" (figura 3.5), o coeficiente de correlação aproxima-se de zero. Figure 3.5 Coeficiente de correlação O coeficiente de correlação exprime o grau de associção, mais ou menos elevado, entre duas Manual de Hidrologia
  • 50. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-14 variáveis aleatórias. Quando a correlação é elevada, pode estabelecer-se uma regressão linear duma variável (dependente) sobre a outra (independente), isto é, tentar explicar a variação da variável dependente como uma função linear da variação da variável independente. Por exemplo, pode tentar-se estabelecer uma regressão linear do escoamento anual numa bacia em função da precipitação ponderada sobre a bacia. Figure 3.6 Regressão linear A expressão da regressão linear é y = ax + b em que a,b são os coeficientes da regressão (figura 3.6), determinados pelo método dos mínimos quadrados. Como se sabe, o método dos mínimos quadrados determina os coeficientes por forma a minimizar a soma dos quadrados dos desvios. Designando por y a estimativa de y fornecida pela ^ regressão linear, ter-se-á: = Σi (yi –y i)2 = Σi [yi – (axi + b)]2 ^ = Σi [yi2 – 2 axiyi – 2 byi + (axi + b)2] = Σi [yi2 – 2 axiyi – 2 byi + a2xi2 + 2axib + b2] Z Escolhe-se a e b para ter o Zmínimo Zmin. ⇒ δZ/δa = 0 e δZ/δb = 0. δZ/δa = - 2 Σi xiyi + 2 Σi axi2 + 2 Σi b xi = 0; δZ/δb = - 2 Σi yi + 2 Σi axi + 2 Σi b = 0, 1007 e chegando-se às equações normais. N a= ∑x i yi - N x y i=1 N ∑x 2 i i=1 b= y - ax Manual de Hidrologia - N x2
  • 51. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-15 É fácil de ver que a = rxy sy/sx. Chama-se erro padrão da estimativa, se, ao desvio padrão dos resíduos ˆ ei = y i - y i ˆ Como y = y , e = 0. Pode verificar-se a seguinte relação entre sy e se: se2 = sy2 (1-rxy2) Esta relação evidencia como a variância residual varia com o coeficiente de correlação. Quando a correlação é perfeita, r=1, os pontos alinham-se todos segundo uma recta e a variância residual ou variância não explicada pela regressão é nula. À medida que r diminui, se2 vai tendendo para sy2, ie, a regressão “explica” cada vez menos a variância de y. Na expressão de se2 é conveniente introduzir um factor de correcção do viez: se2 = (1-r2) sy2 (N-1)/(N-2). A variância explicada pela regressão é 2 2 s y = s y r2 ˆ Se, por exemplo, r = 0.80, a regressão explica 64% da variância total de y. O coeficiente de determinação, cd, dá a percentagem da variância total que é explicada pela regressão. Então cd = r2. Importa notar que, normalmente, a regressão de y sobre x não coincide com a regressão de x sobre y. Isso só acontece se sy = sx. Por outro lado, interessa ter uma regra prática que indique quando é que vale a pena utilizar regressão linear, ou seja, qual o limite inferior para o coeficiente de correlação. Chow (1964) sugere que se pode usar regressão linear quando r > 0.60, o que corresponde a explicar cerca de 1/3 da variância de y através da regressão. Talvez seja preferível, no entanto, adoptar como limite inferior para r um valor um pouco mais alto como 0.70 (cerca de metade da variância de y explicada pela regressão) ou 0.80 (variância explicada é cerca de 2/3 da variância total). Para além disso, importa sempre ver se há uma base física para o estabelecimento da regressão afim de evitar as correlações espúrias (fruto do acaso, do tamanho limitado da amostra ou da transformação de variáveis). Exemplo: Considerem-se as séries de precipitações anuais nos postos udométricos P621 e P705, ambos situados na bacia do rio Monapo. Pretende-se estender as duas séries. Manual de Hidrologia
  • 52. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-16 Ano 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 P621 (mm) 1162 1069 957 1058 1108 1155 805 936 921 732 P705 (mm) - - - - - - - - - 600 Ano 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 P621 (mm) 858 1094 1027 1139 1047 972 1212 1354 876 - P705 (mm) 923 1087 1166 1064 1298 931 1121 1249 697 976 Ano 21 22 23 24 25 26 27 28 P621 (mm) - - - - - - - - P705 (mm) 1316 766 1129 1187 794 1125 890 880 A série P621 tem 19 valores e a P705 também tem 19 valores, sendo o período comum de 10 anos. Pretende-se estender a série P705 para os primeiros nove anos por regressão sobre P621 e estender esta para os últimos nove anos por regressão sobre P705. Tomando o período de 10 anos comuns (anos 10 –19), obtem-se : variável x (P621): x = 1031 mm; sx = 183 mm. variável y (P705): x = 1014 mm; sy = 227 mm. r = 0.80 ; cd = 0.64 Então a regrassão irá explicar 64% de sy2 A regressão linear de y sobre x dá a seguinte equação: y = 1.01x – 28, donde se podem obter os valores de y (≡ P705) para os primeiros 9 anos: 1146 / 1052 / 939 / 1041 / 1091 / 1139 / 785 / 917 / 902. A variância residual é se2 = sy2 (1-r2) = 18,550 ⇒ se = 136. Para estender agora a série P621 para os últimos 9 anos, estabelece-se uma outra regressão linear: x = cy + d, mantendo-se x ≡ P621 e y ≡ P705. O coeficiente de correlação é óbviamente o mesmo. Obtém-se x = 0.65y + 372 (note-se o afastamento entre as duas rectas de regressão na figura 8.7). Manual de Hidrologia
  • 53. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-17 Os valores de P621 para os últimos 9 anos serão: 1007 / 1228 / 870 / 1106 / 1144 / 888 / 1104 / 951 / 944 A variância residual é se2 = 1832(1- 0.82) = 12,056 ⇒ se = 110. Figure 3.7 Exemplo de regressão linear simples Um aspecto importante a notar quando se utiliza regressão linear para estimar um número grande de valores em falta é que a variância da série estendida se reduz em relação à série original, devido ao facto da regressão não entrar com a variância residual (os valores estimados situam-se sobre a recta de regressão e não à volta dela). Por exemplo, para a série P705 o desvio padrão da série original (19 valores) é 205 enquanto a série estendida é 180. A média praticamente não varia (de 1010 para 1008). Assim as características estatísticas da série mudam, o que não é desejável. Para obviar a esse inconveniente, pode-se modificar a expressão da regressão linear para: y = ax + b + s e z = ax + b + s y 1 - r 2 z A nova parcela é uma componente aleatória, obtida por multiplicação do erro padrão da estimativa por uma variável aleatória z ≡ N(0,1). É possível obter sucessivos valores de z recorrendo a uma tabela de números aleatórios ou utilizando rotinas de computador (gerador de numeros aleatórios). Esta parcela adicional faz com que a variância de y se mantenha (coloca os pontos fora da recta de regressão). Manual de Hidrologia
  • 54. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-18 Não é possível nestas notas introdutórias aprofundar este tema que é, no entanto, extremamente importante por ser a base dos chamados modelos autoregressivos de geração sintética. 3.6.2 Transformação de variáveis Considere-se o exemplo representado na figura 3.8. O coeficiente de correlação anteriormente definido é uma medida da associação linear entre x e y. Se se fizesse a sua determinação para o exemplo da figura 3.8, obter-se-ia um valor baixo embora o gráfico evidencie que x e y estão fortemente associados. Figure 3.8 Correlação e regressão não lineares Em situações como esta, uma transformação das variáveis x e y permite mudar uma associação não linear para uma associação linear a que se podem aplicar as técnicas de correlação e regressão lineares descritas no tópico anterior. A transformação mais correntemente utilizada em Hidrologia é a logarítmica que pressupõe que x e y estariam ligados por uma relação do tipo: y = axb, que, logaritmizada, origina: ln(y) = ln(a) + b ln(x), ou seja, uma relação linear entre os logarítmos de x e y. Pode dar-se como exemplo a equação da curva de recessão dum rio alimentado por um aquífero, Qt = Qo e -αt. 3.6.3 Correlação e regressão lineares múltiplas Quando se considera a associação apenas entre duas variáveis, x e y, a correlação e regressão linear dizem-se simples. É possível, no entanto, generalizar o conceito para a associação entre uma variável dependente, y, e m variáveis independentes x1, x2, x3, ......., xm. Manual de Hidrologia
  • 55. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-19 A expressão da regressão linear múltipla é: y = c0 + c1x1 + c2x2 + .... + cmxm. Se o número de valores da amostra for N, m deve ser bastante inferior a N, não devendo como regra prática exceder N/5. Pode-se então escrever: y1 = c0 + c1x11 + c2x21 + .... + cmxm1 y2 = c0 + c1x12 + c2x22 + .... + cmxm2 ................. etc. yN = c0 + c1x1N + c2x2N + .... + cmxmN Assim temos N equações com m+1 incógnitas (N > m+1), nomeamente c0, c1, c2, ...., cm. Determinam-se os coeficientes c0, c1, c2, ...., cm de tal maneira que a soma dos quadrados dos desvios entre y e a estimativa de y seja minimizada (método dos mínimos quadrados). Da mesma maneira que no caso da regressão linear simples, minimiza-se o valor de ^ Σi (yi -y i)2 = Σi [yi - (c0 + c1x1i + c2x2i + .... + cmxmi)]2. Assume-se que f(x1,x2,....,xm) = c0 + c1x1 + c2x2 + .... + cmxm. Assim deve-se minimizar o valor de z = Σi [yi - f(x1i,x2i,....,xmi)]2. A minimização de z implica que as derivadas parciais de z em ordem aos ci se anulem. Obtem-se assim m+1 equações lineares com m+1 incógnitas, as equações normais da regressão linear múltipla. A sua resolução permite calcular os valores dos coeficientes da regressão. As medidas de correlação linear múltipla mais utilizadas são o erro padrão dos resíduos, o coeficiente de correlação múltipla, o coeficiente de determinação e os coeficientes de correlação parciais. Erro padrão dos resíduos O erro padrão dos resíduos calcula-se da mesma forma que para a regressão linear simples: ˆ ei = y i - y i , e = 0 2 se = N N −1 ∑ ei2 ( N − 1) ⋅ ( N − m ) i =1 em que (N-1)/(N-m) é um factor de correcção do viez. se2 dá a variançia residual ou não explicada. Coeficiente de correlação múltipla Manual de Hidrologia
  • 56. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-20 O coeficiente de correlação múltipla, R, é definido como sˆ R= y sy Verifica-se imediatamente que se2 = (1-R2) sy2. Coeficiente de determinação O coeficiente de determinação, Cd = R2 dá a variância explicada em percentagem da variância total de y. Coeficientes de correlação parciais Os coeficientes de correlação parciais ri medem o grau de associação de y com cada uma das variáveis xi e determinam a parte da variância de y explicada por cada xi. Para calcular um dado ri, começa-se por se determinar o coeficiente de correlação múltipla, R-i, obtido sem incluir xi na regressão. Então: 2 - i2 2 = R R-2 ri 1 - R -i R2 - R-i2 dá o acréscimo da variância explicada originado pela inclusão de xi na regressão. Quanto maior for, maior será ri e mais importante a inclusão de xi na regressão. A obtenção dos coeficientes de correlação parciais é trabalhosa mas bastante útil pois permite excluir da regressão variáveis que não ajudam a aumentar a variância explicada. Manual de Hidrologia
  • 57. Revisão de conceitos de probabilidades e estatística 3-21 EXERCÍCIOS 1) Calcule a média e o desvio padrão das seguintes séries de precipitações anuais (em 2 zonas diferentas). Série 1: 805 Série 2:1014 903 1209 875 480 867 720 912 545 849 512 815 984 882 1444 Comente os resultados. 2) Reactores nucleares, grandes barragens, diques altos, etc. devem ser projectados de tal maneira que a probabilidade da sua danificação / galgamento seja da ordem de 1 vez em 10,000 anos (período de retorno de 10,000 anos). a) Calcule o risco de danos num reactor nuclear assim dimensionado nos primeiros 50 anos do seu funcionamento. b) Repita o cálculo para um período de retorno de 1000 anos. 3) Qual é o risco que um acontecimento com período de retorno de N anos ocorra (pelo menos uma vez) em N anos. 4) O valor da precipitação anual numa zona pode ser caracterizada pela distribuição Normal. A precipitação anual média é de 723 mm. O desvio padrão é de 212 mm. a) b) c) d) e) f) Calcule a probabilidade duma precipitação anual maior que 1000 mm. Calcule a probabilidade duma precipitação anual menor que 300 mm. Determine a precipitação com probabilidade de excedência de 1 e 10 %. Determine a precipitação com probabilidade de não-excedência de 1 e 10 %. Determine a precipitação com probabilidade de não-excedência de 50 %. Determine a precipitação com período de retorno de 30 anos. 5) Dada a seguinte série de 23 valores de precipitação anual num posto udométrico, expressa em mm, a) Ajuste a distribuição Normal à série dada. Trace o gráfico em papel de probabilidade. b) Calcule a precipitação anual correspondente aos períodos de retorno de 10 e 50 anos. c) Determine os períodos de retorno teóricos a que correspondem as precipitações anuais de 1000 mm e 2015 mm (maior valor da série). Série: 1803 1295 1118 1626 1120 1116 1473 1194 1016 1372 2015 1662 1549 1448 1753 1914 1422 1346 1092 1489 1397 1245 1219 Manual de Hidrologia
  • 58. 4 4.1 PRECIPITAÇÃO ALGUNS ELEMENTOS SOBRE A CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA Dos muitos processos meteorológicos ocorrendo contínuamento na atmosfera, a precipitação e a evaporação, aqueles em que a atmosfera interactua com a água superficial, são da maior importância para a Hidrologia. Muita da água que precipita deriva da evaporação nos oceanos e do transporte a longa distância pela circulação atmosférica. As duas forças motrizes fundamentais da circulação atmosférica resultam da rotação da Terra e da transferência de energia entre o Equador e os Polos. A Terra recebe permanentemente calor do sol através da radiação solar e emite calor por reradiação ("back radiation") para o espaço. Estes processos estão balanceados em média ao valor de 210 W/m2. O aquecimento da Terra é, no entanto, desigual: enquanto que, no Equador, a radiação solar é quase perpendicular à superfície e tem um valor médio de cerca de 270 W/m2, na região polar, ela atinge a superfície segundo um ângulo oblíquo e tem um valor médio de apenas cerca de 90 W/m2. A radiação emitida é uma função da temperatura absoluta da superfície, a qual varia pouco entre o Equador e os Polos (mais cerca de 20% no Equador). Portanto, a radiação emitida pela Terra é bastante mais uniforme do que a radiação recebida, provocando assim um desequilíbrio. O equilíbrio é reposto essencialmente através da circulação atmosférica que transfere energia do Equador para os Polos (valor médio de cerca de 4 * 109 MW). Figura 4.1 Circulação numa terra imóvel Se a Terra fosse uma esfera imóvel, a circulação atmosférica corresponderia à figura 4.1. Junto do Equador haveria uma ascensão de massas de ar que viajariam na parte superior da atmosfera em direcção aos Polos, arrefecendo e descendo para as camadas inferiores e
  • 59. voltando para o Equador (a chamada “ circulação de Hadley”). A rotação da Terra no sentido Oeste – Leste modifica este modelo simplificado de circulação. Se se considerar um anel de ar à volta do Equador, quando ele se move em direcção a um Polo o seu raio diminui. Para manter o momento angular, a velocidade do ar em relação à superfície da Terra aumenta, criando um vento com o sentido de Oeste para Leste. Passa-se o oposto com um anel de ar que se move dum Polo para o Equador. Estes efeitos são o resultado da chamada “ força de Coriolis”. Na realidade e de acordo com os conhecimentos actuais, a circulação atmosférica é caracterizada por três células em cada hemisfério : célula tropical, célula intermédia e célula polar, figura 4.2. Figura 4.2 Circulação atmosféica Na célula tropical, o ar aquecido sobe no Equador, dirige-se para o Polo pela camada superior da atmosfera, arrefece e desce para a superfície próximo da latitude 30º. Junto da superfície divide-se em dois ramos, um seguindo em direcção ao Polo e o outro retornando
  • 60. ao Equador. Na célula polar, o ar ascende próximo da latitude 60º, dirigindo-se para o Polo pela camada superior da atmosfera. Depois arrefece, desce e regressa, próximo da superfície, à latitude 60º. A célula intermédia é o resultado da fracção das outras duas. Próximo da superfície, o ar dirige-se para o Polo, originando ventos de Oeste. A distribuição irregular das superfícies dos oceanos e dos continentes, com as correspondentes diferenças de propriedades térmicas, cria uma variação especial adicional na circulação atmosférica. A mudança anual do Equador térmico devido á rotação da Terra à volta do Sol causa uma correspondente oscilação no padrão de circulação das três células. Quando há uma grande oscilação, as trocas de ar entre células vizinhas são mais frequentes e completas, possívelmente resultando numa sequência de anos muitos húmidos. Quando a oscilação é pequena, podem-se gerar centros estáveis de altas pressões próximos das latitudes 30º, originando extensos períodos secos. É preciso notar também que, enquanto na troposfera a temperatura decresce regularmente com a altitude (a troposfera varia de cerca de 16 km de altura no Equador para cerca de 8 km nos Polos), junto à ionosfera (que separa a troposfera da estratosfera) há variações muito bruscas de pressão e temperatura que produzem fortes correntes de ar, designadas como " jet streams", com velocidades entre 15 e 50 m/s, que se mantêm em movimento durante milhares de quilómetros e têm uma importante influência no movimento das massas de ar. A circulação atmosférica é extremamente complexa pelo que só é possível apresentar uma caracterização bastante genérica. O estudo do transporte do vapor de água pela circulação atmosférica às várias altitudes mostra que o seu fluxo é mais intenso na baixa atmosfera, com um máximo na vizinhança de 1 km de altitude, sendo práticamente desprezável acima de 6 km de altitude. Para a análise do fluxo de vapor de água, a Meteorologia utiliza os conceitos matemáticos de divergência dum campo de vectores: quando há divergência do fluxo numa dada região, isto significa que aí existe uma fonte de humidade, isto é, em média a evaporação excede a precipitação; quando há convergência, há um sumidouro de humidade, ou seja, em média a precipitação excede a evaporação. Determinando os valores médios da divergência e da convergência ao longo de várias latitudes (ver figura 4.3), verifica-se que em média, há: • • • convergência na zona equatorial, em que há grande precipitação; convergência nas latitudes médias e elevadas; divergência nas regiões subtropicais.