2. Quando o primeiro pastor de almas se elevou da Terra, no carro da
morte, o Senhor esperou-o no Trono de Justiça e Misericórdia, de
modo a ouvir-lhe o relatório alusivo às ovelhas do mundo.
Nos céus, aves felizes entoavam cânticos à paz, enquanto serafins
tangiam harmoniosas citaras ao longe. Tudo era esperança e júbilo no
paraíso; no entanto, o pastor, que fora também no Plano Terrestre o
primeiro homem bom, trazia consigo dolorosa expressão de amargura.
Os cabelos brancos caíam-lhe em desalinho, seus pés e mãos tinham
marcas sangrentas e de seus olhos fluíam lágrimas abundantes.
3. O Todo-poderoso recebeu-o, surpreendido. O ancião inclinou-se,
reverente; saudou-o, respeitoso, e manteve-se em profundo silêncio. As
interrogações paternais, todavia, explodiram afetuosas. Como seguia o
rebanho da Terra? Observa-se o regulamento da Natureza? Atendia-se
ao caminho traçado? Havia suficiente respeito na vida de todos?
Bastante compreensão no serviço individual? Conforme o
desdobramento dos negócios terrestres, abriria novos horizontes ao
progresso dos homens. O dever bem vivido conferiria mais extenso
direito às criaturas.
4. O velhinho, contudo, ouvia e chorava. Mais austeramente inquirido,
respondeu, soluçando: - Ai de mim, Senhor! As ovelhas que me
confiastes, segundo me parece, trazem corações de animais cruéis. A
maioria tem gestos de lobos, algumas revelam a dureza do tigre e
outras a peçonha de víboras ingratas.
De fisionomia severa, embora serena, o Senhor perguntou: - Não tem
as ovelhas a dádiva do corpo para o sublime aprendizado na escola
terrestre? – Sim, suspirou o ancião, mas desprezam-no e insultam-no,
todos os dias, através do relaxamento e da viciação.
5. Não possuem a casa, o ninho doce que lhes dei? – Mas fazem do
campo doméstico verdadeiro reduto de hostilidades cordiais, no qual se
combatem mutuamente, a distância do entendimento e do perdão. (...)
Todavia, continuou o Misericordioso, e a Natureza que os cerca?
Porventura, não lhes falam ao coração a claridade do sol, a bênção do
ar, a bondade da água, a carícia do vento, a cooperação dos animais, a
proteção do arvoredo, o perfume das flores, a sabedoria da semente e a
dádiva dos frutos? Infelizmente, esclareceu o ancião, vagueiam como
cegos e surdos, ante o concerto harmônico de vossas graças, e oprimem
a Natureza simbolizando gênios do mal, destruidores despóticos. (...)
6. Foi então que, desde esse dia, o monstro cego e surdo da guerra
acompanha os pastores do bem, a fim de exterminar, em tormentas de
suor e lágrimas, tudo o que, na Terra, constitua obra de vaidade e
orgulho, egoísmo e tirania dos homens, contrários aos sublimes
desígnios de Deus.
REFLEXÃO:
O homem recebeu de Deus a dádiva da vida. Na Natureza, encontra ele
a demonstração da força da Criação, que supre a Humanidade de tudo
aquilo que ela precisa. O alimento, o ar, a água, enfim, os recursos de
toda ordem para a construção de um mundo melhor.
7. Também recebeu de Deus a lei de amor e caridade, para que
desenvolvesse a capacidade de amar, harmonizando o ambiente em que
vive. Cabe, portanto, ao homem, desenvolver a capacidade de se
adaptar ao ambiente terrestre, preservando tudo aquilo que mantém o
equilíbrio da vida. Portanto, ele é responsável pela preservação e
manutenção da Natureza: rios, mares, terra, animais, vegetais, que
representam as forças equilibradoras da Criação. Permitir a destruição
dessa Criação é caminhar para a autodestruição. Apesar de ser animal
social, precisando uns dos outros, o homem costuma se enclausurar no
egoísmo, no orgulho e na vaidade, que ilude e destrói.
8. O homem ama a si próprio mais do que aos outros. Exige respeito mas
não costuma respeitar; vive sua própria verdade conforme seus próprios
interesses e submete a todos aqueles que não pensam como ele,
impondo suas próprias condições e percepções. O egoísmo individual
transforma-se em egoísmo coletivo; grupos e facções surgem e se
digladiam, em diversas arenas humanas, defendendo os seus próprios
interesses. O egoísmo coletivo traz a disputa, e esta o conflito, a luta, a
guerra. Na guerra o homem sofre e verifica toda a sua impotência em
controlar a dor, que ali é gerada.
9. Ele se cansa de tanto sofrer e, volta e meia, pergunta si mesmo: Como
Deus permite que a guerra exista, que a guerra ocorra, que a guerra
aconteça? E essa lenda da guerra nos mostra porque a guerra é
necessária aos homens. A guerra é aquele monstro cego e surdo, com
muitas garras e muitas bocas que extermina os homens; que gera a dor
nas famílias, para que se possa refletir e verificar a existência dos
pastores do bem; aqueles que vêm trazer a mensagem da Criação,
através da lei do amor, como caminho opcional para a felicidade do
homem. Se a felicidade não é deste mundo, é porque o homem não é
capaz de enxergá-la e construí-la pelo caminho mais fácil, o caminho
da lei de Deus.
10. Deus nos deu todas as condições para suprirmos as nossas
necessidades. Nos deu o livre-arbítrio, ensinando-nos através da
família, através da sociedade a necessidade da vida em comum. Assim
sendo, há a necessidade de respeito, de consideração uns pelos outros.
Porém, existem aqueles que preferem se manter como lobos,
aproveitando todas as oportunidades para atacar o seu semelhante.
Endurecidos como tigre, incapaz de amar a quem quer que seja. E o
que é mais grave, se envenenando como cobras e víboras, que destroem
através da maledicência, da ingratidão, da mentira. Assim sendo, as
falhas individuais vão se multiplicando e vão se tornando falhas
coletivas.
11. Os grupos vão se formando e, de forma antagônica, começam a
disputar não sei o quê. Muitas vezes, ao longo dessa disputa, percebem
que o objetivo inicial já está totalmente deformado, e que eles não
entendem bem por que estão lutando. Apenas querem lutar, guerrear. E
a consequência natural dessas coisas é a dor; e, aí, o homem aprende
através do sofrimento, porque as coisas não ocorrem como ele deseja.
Como a guerra é surda e cega, ela é impiedosa em abater o ser na sua
caminhada; e aqueles grupos, aquelas coletividades que se deixaram
envolver pelas lutas e pelas disputas sofrem, se abatem, e diante do
arrependimento e da dor, aprendem que o caminho mais fácil teria sido
o caminho do amor.
12. Então, na lenda da guerra, aquele pastor dos homens, aquele primeiro
homem bom que subiu aos céus diante de Deus, trazia a palavra do
amor. Mas os homens trataram-no com sarcasmo, e preferiram aprender
através do sofrimento. É fácil verificar que, desde que o homem existe,
a guerra existe também; e depois de cada combate a disposição para o
diálogo, para a compreensão aumenta. Isto porque, a dor que abateu o
homem força-o a olhar para a lei do amor, como a melhor alternativa de
caminho. E, aí, busca em coletividade se proteger, se respeitar; e o
progresso advém de tudo isso.
13. Sendo assim, enquanto neste planeta de provas e expiações habitarem
seres como nós, ainda imperfeitos, egoístas, orgulhosos e prepotentes, a
guerra continuará a conviver entre nós, abatendo através da dor, e do
reajuste, e ensinando o caminho do amor.
Muita Paz!
Meu Blog: http://espiritual-espiritual.blogspot.com.br