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      MIX                                                             A
                                                                               mistura de tradições marcou a infância da
                                                                               curitibana Jussara Voss, jornalista e bloguei-
                                                                               ra especializada em gastronomia. Ela lembra
                                                                      que, depois de uma refeição com massas caseiras ita-
                                                                      lianas, na qual o eslavo pierogi também sempre estava
                                                                      presente, a sobremesa poderia ser um doce português
                                                                      ou a torta alemã de maçã apfelstrudel, servida quen-
                                                                      tinha e com nata. “Um pé na Itália, outro em Portugal
                                                                      e alguns costumes poloneses e alemães nos garanti-


      GASTRONÔMICO                                                    ram uma mesa farta, com tudo fresco, sem repetir o
                                                                      prato à noite e sempre com muitos doces”, conta.


                                                                      O seu caso não é uma exceção na cidade. Quem confirma
        Algumas heranças dos primeiros imigrantes europeus que
                                                                      é o professor e doutor da Universidade Federal do Paraná
      chegaram à cidade ainda hoje estão em muitas mesas, trazen-     (UFPR) Carlos Roberto Antunes dos Santos, coordenador
      do à culinária curitibana uma miscelânea de aromas e sabores.   do grupo de pesquisa em História e Cultura da Alimenta-
                                                                      ção e orientador de monografias de graduação, disserta-
                                   por Simone Mattos                  ções de mestrado e teses de doutorado do programa de
                                fotos Walter Morgenthaler             Pós-Graduação em História, na temática sobre História
                                                                      e Cultura da Alimentação. “A gastronomia curitibana re-
                                                                      serva um lugar para todos; a diversidade étnica e cultural
                                                                      recheou a mesa com pratos inventados pelos locais ou
                                                                      trazidos por diversos povos migrantes e imigrantes, num
                                                                      processo permanente de adaptação e readaptação.”




      O pierogi, prato típico
      polonês, é facilmente
      encontrado em Curitiba.

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                                                                                                                                Torta alemã Apfelstrudel
      Dos alemães, ele explica que são bastante considerá-         O texto Aromas e Paladares de Curitiba, produzido            e vinho: heranças
      veis as influências e que elas podem ser encontradas         pelo professor Carlos Antunes em parceria com o              dos colonizadores.
      em todos os lugares de Curitiba. “Ora, só aqui se come       escritor Eduardo Sganzerla, afirma que os restaurantes
      vina e cuque (cuca), ou wienerwurst e kuchen, contri-        de cozinha típica local apresentam pratos que utili-
      buições desses imigrantes”, justifica. Sabemos que a         zam alimentos incorporados à história e à cultura da
      vina ou a wiener, abrasileirada, é a salsicha vienense,      alimentação da região. Seriam eles o pinhão, o milho,
      ou a salsicha preparada à moda de Viena. O kuchen            o feijão em suas diversas cores, a mandioca, o arroz, as
      virou o cuque, ou o bolo assado com farofa de mantei-        carnes bovina, suína e de frango, o torresmo, o polvi-
      ga e açúcar. “Embora a maior parte desses produtos           lho, a banana, que permitem pratos como: a paçoca
      hoje seja industrializada, muitas famílias preservam         de pinhão, a quirera lapeana, a quirera de milho com
      a cultura artesanal de fazer à sua maneira”, afirma.         porco, o arroz de carreteiro, o feijão tropeiro, a polenta
                                                                   com frango caipira, o lombo com pinhão, o barreado,
      Aliás, na cozinha curitibana, prevalece a arte de elabo-     a costela campeira, o carneiro com farofa, o churrasco
      rar os alimentos e de lhes dar sabor e sentido. Segundo      paranaense e, ironicamente, a típica sobremesa curiti-
      o professor, há ali a intimidade familiar, os investi-       bana do Bar Palácio, chamada de Mineiro de Botas.            KRIN E GRASPA
      mentos afetivos, simbólicos, estéticos e econômicos.                                                                      Embora a quase totalidade dos eslavos que chegou ao
      Apesar do processo de industrialização da cidade, a                                                                       Paraná tivesse origem camponesa e fosse gente humilde,
      culinária local remonta às origens rurais e à história dos                                                                possuía uma culinária muito rica. Os poloneses estariam
      imigrantes, que persiste em sobreviver. “Nós gosta-                                                                       entre as famílias cujos descendentes mais preservam os
      mos de preparar nossa própria massa, tradição italiana                                                                    hábitos alimentares. “O pierogi, pastel de ricota cozido,
      herdada, e tem o outro lado da família que é polaco                                                                       é o mais apreciado”, afirma o professor da UFPR. Outros




                                                                                                                                                                                                “
      e que muitas vezes prepara os pierogis”, confirma o                                                                       pratos trazidos por eles a Curitiba são: kapusniak (sopa
                                                                                                                                                                                                           LEmbRo dE Até AS cRIANçAS
      casal Josi Basso e Felipe Pasqualini, titular do blog                                                                     de repolho azedo), bigos (cozido de repolho com defu-
      gastronômico Pastificio dell’Amore. Além da influência                                                                    mados), borstch (sopa de beterraba), galaretka (geleia de                  tomAREm vINho, Só quE com
      europeia, eles têm ainda uma avó com raízes indígenas                                                                     mocotó) e aluszki (arroz enrolado em folha de repolho).                    áGuA E AçúcAR, umA mANEIRA dE
      fortes, que os ensinou a comer Porco à Pururuca com as                                                                    “O rosól (sopa) era, nas noites mais frias, o prato preferido              IR AcoStumANdo o PALAdAR.”
      mãos, entre outras iguarias. “Curitiba tem mesmo uma                                                                      para aquecer e confortar esta gente acostumada ao longo         JuSSARA voSS, JoRNALIStA E bLoGuEIRA
      mistura muito grande de estilos e influências”, dizem.                                                                    inverno europeu”, diz Antunes. Já os ucranianos, trouxe-
                                                                                                                                                                                                ESPEcIALIzAdA Em GAStRoNomIA
                                                                                                                                ram na bagagem sementes de plantas que cultivavam,




      “
                                                                                                                                destacando-se o krin (raiz-forte usada para acompanhar
                Só AquI SE comE vINA E cuquE
                                                                                                                                e temperar alguns pratos), bastante utilizado até hoje.
                ou wIENERwuRSt E KuchEN.”                                                                                                                                                       destilado de uva), geleias e sucos de uva, além de
                cARLoS RobERto ANtuNES doS SANtoS,                                                                              Mas não dá para falar nos hábitos alimentares trazidos          terem trazido alguns legumes até então desconhecidos,
                PRofESSoR, doutoR E cooRdENAdoR do                                                                              pelos europeus sem citar a imensa colônia italiana              como a berinjela, o pimentão e o brócolis.” Pasqualini
                                                                                                                                local, responsável por grande parte de nossa gastrono-          afirma que os restaurantes de Santa Felicidade, com
      GRuPo dE PESquISA Em hIStóRIA E
                                                                                                                                mia. “A de Santa Felicidade foi fundada em 1878, com            seus cardápios nada sofisticados, têm uma fartura e um
      cuLtuRA dA ALImENtAção dA ufPR
                                                                                                                                pouco mais de uma dezena de famílias. Quase todas               modo de servir raros de se encontrar em outras cidades.
                                                                                                                                vinham das regiões agrícolas do nordeste da Itália, o
                                                                                                                                Vêneto. Aqui, os imigrantes se dedicaram inicialmente           Para uma família italiana ou para seus descendentes é
                                                                                                                                às culturas de suas tradições: o milho, do qual faziam          difícil imaginar uma refeição sem vinho, já que a bebida
                                                                                                                                a polenta, a base do sustento dos camponeses daquela            é considerada um alimento. “Lembro de até as crian-
                                                                                                                                região”, diz Antunes. Também conseguiram plantar                ças tomarem vinho, só que com água e açúcar, uma
                                                                                                                                com sucesso as suas parreiras de uva e fazer o vinho            maneira de ir acostumando o paladar”, conta Jussara.
                                                                                                                                de suas tradições. “Além disso, faziam queijos, salames,        Ela se habituou e até hoje não ceia sem uma boa taça.
                                                                                                                                linguiças e outros defumados de porco, graspa (grappa,          “Comida e bebida sempre foram um assunto sério lá em


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                                                                                                        Roll mops e ovos coloridos
                                                                                                        ainda estão presentes nos
                                                                                                        bares tradicionais da cidade.


      casa, será que fui influenciada?”, brinca. Os blogueiros   mas é raro ver em outras cidades, só em bares ale-
      Josi e Pasqualini contam que também praticamente           mães, como o Bar Léo, no centro velho de São Pau-
      só bebem vinho. “Temos muitos amigos que seguiram          lo.” Há também as opções que ela classifica como
      essa tendência, o vinho de qualidade se popularizou e      “velha-guarda”, como roll mops, vinas em conserva
      deve se popularizar ainda mais”, comentam. Para eles,      e ovos coloridos. “Mas estas ficam restritas a grupos
      entretanto, o hábito nada tem a ver com a colonização.     específicos, que frequentam bares clássicos curi-
      “O vinho vendido em Santa Felicidade pelos antigos         tibanos como o Silzeu’s e Maneko’s”, comenta.
      colonos, nunca nos apeteceu”, dizem. Eles lembram
      que outra bebida típica curitibana é a alemã Steinhäger,   Jussara lamenta que o chineque (pão doce), uma
      consumida pura, com cerveja ou misturada ao chope.         tradição local, esteja sumindo. “É difícil encontrar”,
                                                                 reclama. No quesito confeitaria, lembra da torta Marta
      cLáSSIcoS                                                  Rocha, uma invenção daqui que se espalhou por boa
      “É difícil imaginar algum curitibano que não coma          parte do Brasil. O clássico foi criado na década de 50,
      muito pinhão no inverno”, afirma Pasqualini. Ele explica   pelos proprietários da Confeitaria das Famílias, para
      que a forma como o consumimos, cozido na pressão,          tentar sublimar a tristeza que havia invadido o país
      mordendo a semente, é tipicamente curitibana. “Em-         quando a miss Brasil ficou em segundo lugar na dis-
      bora não seja uma exclusividade da cidade, é muito         puta do concurso Miss Universo. Inspirada na bela, a
      forte por aqui.” Ele critica e acha que o ingrediente      confeitaria lançou a famosa torta com massa de pão de
      é subutilizado, pois pouca gente o usa na farofa, por      ló branca e preta recheada com creme de ovos, nozes
      exemplo, ou para preparar uma sopa. “Antigamente, o        e coberta com suspiros. De Curitiba para o mundo.
      pinhão também era preparado na chapa quente, mas
      hoje em dia quase ninguém tem mais fogão a lenha”,
                                                                                          Saiba onde encontrar
      diz. Sobre a forma de preparar pinhão, Jussara lembra                               os sabores curitibanos:
      da maneira mais antiga e tradicional: a sapecada, ou                                1. Com o seu celular, acesse
                                                                                             o site www.phdmobi.com
      seja, assá-lo com grimpas, hábito tipicamente do sul.
                                                                                          2. Faça o download do leitor de tags
                                                                                          3. Abra o aplicativo e use a câmera
      Continuando o passeio pelos cardápios curitiba-                                     4. Mire ou fotografe esta imagem
                                                                                          5. Pronto. Você será direcionado
      nos, Josi cita a carne de onça, tão comum dos bares                                    ao conteúdo exclusivo.
      daqui. “Boteco clássico curitibano serve a iguaria,


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Tv118 curitibano adora

  • 1. VIEW / SABORES MIX A mistura de tradições marcou a infância da curitibana Jussara Voss, jornalista e bloguei- ra especializada em gastronomia. Ela lembra que, depois de uma refeição com massas caseiras ita- lianas, na qual o eslavo pierogi também sempre estava presente, a sobremesa poderia ser um doce português ou a torta alemã de maçã apfelstrudel, servida quen- tinha e com nata. “Um pé na Itália, outro em Portugal e alguns costumes poloneses e alemães nos garanti- GASTRONÔMICO ram uma mesa farta, com tudo fresco, sem repetir o prato à noite e sempre com muitos doces”, conta. O seu caso não é uma exceção na cidade. Quem confirma Algumas heranças dos primeiros imigrantes europeus que é o professor e doutor da Universidade Federal do Paraná chegaram à cidade ainda hoje estão em muitas mesas, trazen- (UFPR) Carlos Roberto Antunes dos Santos, coordenador do à culinária curitibana uma miscelânea de aromas e sabores. do grupo de pesquisa em História e Cultura da Alimenta- ção e orientador de monografias de graduação, disserta- por Simone Mattos ções de mestrado e teses de doutorado do programa de fotos Walter Morgenthaler Pós-Graduação em História, na temática sobre História e Cultura da Alimentação. “A gastronomia curitibana re- serva um lugar para todos; a diversidade étnica e cultural recheou a mesa com pratos inventados pelos locais ou trazidos por diversos povos migrantes e imigrantes, num processo permanente de adaptação e readaptação.” O pierogi, prato típico polonês, é facilmente encontrado em Curitiba. 102 103
  • 2. VIEW / SABORES Torta alemã Apfelstrudel Dos alemães, ele explica que são bastante considerá- O texto Aromas e Paladares de Curitiba, produzido e vinho: heranças veis as influências e que elas podem ser encontradas pelo professor Carlos Antunes em parceria com o dos colonizadores. em todos os lugares de Curitiba. “Ora, só aqui se come escritor Eduardo Sganzerla, afirma que os restaurantes vina e cuque (cuca), ou wienerwurst e kuchen, contri- de cozinha típica local apresentam pratos que utili- buições desses imigrantes”, justifica. Sabemos que a zam alimentos incorporados à história e à cultura da vina ou a wiener, abrasileirada, é a salsicha vienense, alimentação da região. Seriam eles o pinhão, o milho, ou a salsicha preparada à moda de Viena. O kuchen o feijão em suas diversas cores, a mandioca, o arroz, as virou o cuque, ou o bolo assado com farofa de mantei- carnes bovina, suína e de frango, o torresmo, o polvi- ga e açúcar. “Embora a maior parte desses produtos lho, a banana, que permitem pratos como: a paçoca hoje seja industrializada, muitas famílias preservam de pinhão, a quirera lapeana, a quirera de milho com a cultura artesanal de fazer à sua maneira”, afirma. porco, o arroz de carreteiro, o feijão tropeiro, a polenta com frango caipira, o lombo com pinhão, o barreado, Aliás, na cozinha curitibana, prevalece a arte de elabo- a costela campeira, o carneiro com farofa, o churrasco rar os alimentos e de lhes dar sabor e sentido. Segundo paranaense e, ironicamente, a típica sobremesa curiti- o professor, há ali a intimidade familiar, os investi- bana do Bar Palácio, chamada de Mineiro de Botas. KRIN E GRASPA mentos afetivos, simbólicos, estéticos e econômicos. Embora a quase totalidade dos eslavos que chegou ao Apesar do processo de industrialização da cidade, a Paraná tivesse origem camponesa e fosse gente humilde, culinária local remonta às origens rurais e à história dos possuía uma culinária muito rica. Os poloneses estariam imigrantes, que persiste em sobreviver. “Nós gosta- entre as famílias cujos descendentes mais preservam os mos de preparar nossa própria massa, tradição italiana hábitos alimentares. “O pierogi, pastel de ricota cozido, herdada, e tem o outro lado da família que é polaco é o mais apreciado”, afirma o professor da UFPR. Outros “ e que muitas vezes prepara os pierogis”, confirma o pratos trazidos por eles a Curitiba são: kapusniak (sopa LEmbRo dE Até AS cRIANçAS casal Josi Basso e Felipe Pasqualini, titular do blog de repolho azedo), bigos (cozido de repolho com defu- gastronômico Pastificio dell’Amore. Além da influência mados), borstch (sopa de beterraba), galaretka (geleia de tomAREm vINho, Só quE com europeia, eles têm ainda uma avó com raízes indígenas mocotó) e aluszki (arroz enrolado em folha de repolho). áGuA E AçúcAR, umA mANEIRA dE fortes, que os ensinou a comer Porco à Pururuca com as “O rosól (sopa) era, nas noites mais frias, o prato preferido IR AcoStumANdo o PALAdAR.” mãos, entre outras iguarias. “Curitiba tem mesmo uma para aquecer e confortar esta gente acostumada ao longo JuSSARA voSS, JoRNALIStA E bLoGuEIRA mistura muito grande de estilos e influências”, dizem. inverno europeu”, diz Antunes. Já os ucranianos, trouxe- ESPEcIALIzAdA Em GAStRoNomIA ram na bagagem sementes de plantas que cultivavam, “ destacando-se o krin (raiz-forte usada para acompanhar Só AquI SE comE vINA E cuquE e temperar alguns pratos), bastante utilizado até hoje. ou wIENERwuRSt E KuchEN.” destilado de uva), geleias e sucos de uva, além de cARLoS RobERto ANtuNES doS SANtoS, Mas não dá para falar nos hábitos alimentares trazidos terem trazido alguns legumes até então desconhecidos, PRofESSoR, doutoR E cooRdENAdoR do pelos europeus sem citar a imensa colônia italiana como a berinjela, o pimentão e o brócolis.” Pasqualini local, responsável por grande parte de nossa gastrono- afirma que os restaurantes de Santa Felicidade, com GRuPo dE PESquISA Em hIStóRIA E mia. “A de Santa Felicidade foi fundada em 1878, com seus cardápios nada sofisticados, têm uma fartura e um cuLtuRA dA ALImENtAção dA ufPR pouco mais de uma dezena de famílias. Quase todas modo de servir raros de se encontrar em outras cidades. vinham das regiões agrícolas do nordeste da Itália, o Vêneto. Aqui, os imigrantes se dedicaram inicialmente Para uma família italiana ou para seus descendentes é às culturas de suas tradições: o milho, do qual faziam difícil imaginar uma refeição sem vinho, já que a bebida a polenta, a base do sustento dos camponeses daquela é considerada um alimento. “Lembro de até as crian- região”, diz Antunes. Também conseguiram plantar ças tomarem vinho, só que com água e açúcar, uma com sucesso as suas parreiras de uva e fazer o vinho maneira de ir acostumando o paladar”, conta Jussara. de suas tradições. “Além disso, faziam queijos, salames, Ela se habituou e até hoje não ceia sem uma boa taça. linguiças e outros defumados de porco, graspa (grappa, “Comida e bebida sempre foram um assunto sério lá em 104 105
  • 3. VIEW / SABORES Roll mops e ovos coloridos ainda estão presentes nos bares tradicionais da cidade. casa, será que fui influenciada?”, brinca. Os blogueiros mas é raro ver em outras cidades, só em bares ale- Josi e Pasqualini contam que também praticamente mães, como o Bar Léo, no centro velho de São Pau- só bebem vinho. “Temos muitos amigos que seguiram lo.” Há também as opções que ela classifica como essa tendência, o vinho de qualidade se popularizou e “velha-guarda”, como roll mops, vinas em conserva deve se popularizar ainda mais”, comentam. Para eles, e ovos coloridos. “Mas estas ficam restritas a grupos entretanto, o hábito nada tem a ver com a colonização. específicos, que frequentam bares clássicos curi- “O vinho vendido em Santa Felicidade pelos antigos tibanos como o Silzeu’s e Maneko’s”, comenta. colonos, nunca nos apeteceu”, dizem. Eles lembram que outra bebida típica curitibana é a alemã Steinhäger, Jussara lamenta que o chineque (pão doce), uma consumida pura, com cerveja ou misturada ao chope. tradição local, esteja sumindo. “É difícil encontrar”, reclama. No quesito confeitaria, lembra da torta Marta cLáSSIcoS Rocha, uma invenção daqui que se espalhou por boa “É difícil imaginar algum curitibano que não coma parte do Brasil. O clássico foi criado na década de 50, muito pinhão no inverno”, afirma Pasqualini. Ele explica pelos proprietários da Confeitaria das Famílias, para que a forma como o consumimos, cozido na pressão, tentar sublimar a tristeza que havia invadido o país mordendo a semente, é tipicamente curitibana. “Em- quando a miss Brasil ficou em segundo lugar na dis- bora não seja uma exclusividade da cidade, é muito puta do concurso Miss Universo. Inspirada na bela, a forte por aqui.” Ele critica e acha que o ingrediente confeitaria lançou a famosa torta com massa de pão de é subutilizado, pois pouca gente o usa na farofa, por ló branca e preta recheada com creme de ovos, nozes exemplo, ou para preparar uma sopa. “Antigamente, o e coberta com suspiros. De Curitiba para o mundo. pinhão também era preparado na chapa quente, mas hoje em dia quase ninguém tem mais fogão a lenha”, Saiba onde encontrar diz. Sobre a forma de preparar pinhão, Jussara lembra os sabores curitibanos: da maneira mais antiga e tradicional: a sapecada, ou 1. Com o seu celular, acesse o site www.phdmobi.com seja, assá-lo com grimpas, hábito tipicamente do sul. 2. Faça o download do leitor de tags 3. Abra o aplicativo e use a câmera Continuando o passeio pelos cardápios curitiba- 4. Mire ou fotografe esta imagem 5. Pronto. Você será direcionado nos, Josi cita a carne de onça, tão comum dos bares ao conteúdo exclusivo. daqui. “Boteco clássico curitibano serve a iguaria, 106