REFLEXAO ADEQUAÇAO CURRICULAR DEPOIMENTI DE UM ALUNO
1. UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS – UNIMONTES CAMPUS PIRAPORA
Departamento de Métodos e Técnicas
Reflexões sobre uma história antiga, mas atual
Não, eu não vou bem na escola! Este é o meu segundo ano na 7ª série e sou muito maior
que os alunos. Entretanto, eles gostam de mim. Não falo muito na aula, mas fora da sala sei ensinar
um mundo de coisas. Eles estão sempre me rodeando e isso compensa tudo o que acontece na
aula.
Eu não sei porque os professores não gostam de mim. Na verdade, eles nunca acreditam
que a gente sabe alguma coisa, a não ser que se possa dizer o nome do livro onde a gente aprendeu.
Tenho em casa alguns livros: dicionários, atlas, livro de português, matemática, ciências e outros
que a professora manda comprar. Mas, não costumo sentar e lê-los todos, como mandam a gente
fazer na escola.
Uso meus livros quando quero descobrir alguma coisa. Por exemplo, viajo sempre com
meu tio, que, é caminhoneiro. Quando ele me convida para fazer entrega num fim de semana,
vamos logo procurar num mapa rodoviário o caminho para chegar na outra cidade. Mas, na escola,
a gente tem de aprender tudo o que está no livro, e eu não consigo guardar.
No ano passado fiquei uma semana tentando aprender os nomes dos imperadores romanos.
Claro que eu conhecia alguns como Nero, César e Calígula. Mas, é preciso saber todos juntos e
em ordem. E, isso eu nunca sei. Também não ligo muito, pois os meninos que aprendem os
imperadores têm que aprender tudo o que eles fizeram. Estou na 7ª série pela segunda vez, mas a
professora agora não é muito interessada nos imperadores. Ela quer é que a gente aprenda tudo
sobre as guerras gregas. Acho que nunca conseguirei decorar nomes em História.
Este ano, comecei a aprender um pouco sobre caminhões porque meu tio tem três, e disse
que posso dirigir um quando eu fizer 18 anos. Já sei bastante sobre cavalo-a-vapor e marchas de
cinco marcas diferentes de caminhão, alguns a diesel. É gozado como os motores a diesel
funcionam. Comecei a falar sobre eles com a professora de Ciências na quarta-feira passada,
quando a bomba que a gente estava usando para obter vácuo esquentou! Mas, a professora disse
que não via a relação entre um motor diesel e a nossa experiência sobre a pressão do ar. Fiquei
quieto. Mas, os colegas pareceram gostar. Levei quatro deles à garagem do meu tio e vimos o
mecânico desmontar um enorme caminhão diesel. Rapaz, e como ele entende disso ...
Eu também não sou forte em Geografia. Neste ano eles falam em Geografia Física. Durante
toda a semana estudamos agricultura de roça no mundo tropical, sistemas agrícolas tradicionais,
mas não sei bulufas. Talvez porque faltei à aula, pois meu tio me levou a Ribeirão Preto, com
uma carga de televisão. Trouxemos de lá um carregamento de açúcar.
Meu tio tinha me dito as estradas e as distâncias em quilômetros. Ele só dirigia o caminhão
e eu ia lendo as placas com os nomes das cidades por onde passávamos. Até Campinas contei um
montão de fábricas e daí prá frente era só canavial. Mas, prá que tanta cana em São Paulo?
Paramos duas vezes e dirigimos mais de 600 quilômetros, ida e volta. Estou tentando calcular o
óleo e o desgaste do caminhão para ver quanto ganhamos. Eu costumo contar minhas viagens
para meus colegas da escola e eles gostam muito porque há sempre novidades. Gostaria de fazer
minhas redações sobre as viagens que faço com meu tio, mas, outro dia, o assunto da redação na
escola era: "O que uma rosa leva da primavera". Não deu .
Também não dou para Matemática. Parece que não consigo me concentrar nos problemas.
Um deles era assim: "Se um poste telefônico, com 12m de comprimento cai atravessado em uma
estrada, de modo que 1,5m sobrem de um lado e 1m de outro, qual a largura da estrada? "Acho
2. uma bobagem calcular a largura da estrada. Nem tentei responder, pois o problema também não
dizia se o poste tinha caído reto ou torto.
Não vou bem em Educação para o Trabalho. Todos nós fizemos um suporte para vasos e uma
fruteira, com palitos de sorvete. Os meus foram péssimos. Também, não me interessei. Nossa
casa é muito pequena, não tem lugar para pendurar plantas e a única mesa existente está sempre
ocupada.
Quis fazer uma caixa de ferramentas para o meu tio, mas a professora não deixou, pois eu
teria de trabalhar só em madeira. Acabei fazendo a caixa de ferramentas em casa e meu tio disse
que economizei R$ 40,00 com meu presente.
A Orientadora de Educação Moral é fogo! Andei ficando depois da aula, tentando aprender
os artigos do Estatuto do Centro Cívico para fazer nosso Estatuto do Centro Cívico. A professora
disse que só poderíamos ser bons alunos e cidadãos, sabendo isso. E eu quero ser bom cidadão.
Mas, detestava ficar depois da aula porque um bando de meninos estava limpando o lote da
esquina para fazer um parquinho para as crianças do "Lar Espírita". Eu até fiz um conjunto de
barras usando canos velhos. Pedimos jornais velhos, garrafas e ferro velho para vender e com o
dinheiro compramos arame para cercar o lote.
Meu pai disse que eu posso sair da escola quando fizer 15 anos. Estou doidinho para isso
porque há um mundo de coisas que eu quero aprender e fazer e já estou ficando velho.
CALDAS, Roseli Fernandes Lins. Fracasso escolar: reflexões sobre uma história antiga, mas
atual. Psicol. teor. prat. [online]. jun. 2005, vol.7, no.1 [citado 29 Novembro 2021], p.21-33.
Disponível na World Wide Web: . ISSN 1516-3687.
Reflita:
1-A concepção de ensino e aprendizagem do professor ?
2-O contexto escolar em que as situações de ensino e aprendizagem acontecem?
3-A relação professor-aluno?
4- Comente a questão da adequação curricular
5-E em relação aos seus professores, eles estão desinteressados em relação ao
compromisso da educação? (Justifique).
6-A escola é uma instituição interessante ou desinteressante? Por quê?