1. Pedagogia do Oprimido
Paulo Freire
Paulo Freire, um pensador comprometido com a vida, não pensa idéias, e sim a existência. Em
Pedagogia do Oprimido relata-nos sua experiência em cinco anos de exílio, mostrando o papel da
conscientização, numa educação realmente libertadora, o "medo da liberdade".
A luta pelo direito do ser humano, pelo trabalho livre, pela afirmação dos homens como pessoas, só
é possível porque a desumanização não é um destino dado, mas resultado de uma "ordem" injusta
que gera a violência dos opressores.
Pode-se ver algumas contradições em relação aos oprimidos e opressores, onde a violência dos
opressores torna-os desumanizados, levando os oprimidos, a qualquer momento lutar contra quem
os fez menos. Esta luta só tem sentido quando o ser menos, ao buscar sua humanidade, não se sinta
também um opressor, mas sim um reconquistador da humanidade em ambos (ser mais e ser menos);
sendo aqui a grande tarefa humanista e histórica dos oprimidos, se libertar a si e aos opressores.
A Pedagogia do Oprimido é uma pedagogia problematizadora, que se apresenta como pedagogia do
homem; onde só ela que se pode fazer de generosidade verdadeira, humanista e não "humanitarista"
que pode alcançar este objetivo. Ao contrário à Pedagogia que parte dos interesses individuais,
egoístas dos opressores camuflados na falsa generosidade, que constrói a desumanização, a
Pedagogia libertária.
Esta pedagogia humanizadora só é possível através da união entre teoria e prática, onde a liderança
revolucionária ao invés de sobrepor aos oprimidos e continuar mantendo-os como quase "coisas",
com eles estabelecem uma relação dialógica. Ao alcançarem, na práxis este saber da realidade, se
descobrem como seus refazedores permanentes.
Portanto, a presença dos oprimidos na busca de sua libertação, mais que pseudoparticipação, é o que
dever ser: engajamento.
A educação bancária pode ser vista como uma educação em que o educador é o dono do saber,
enquanto o educando é um mero ouvinte, que nada sabe. Enquanto numa educação libertadora
ocorre o contrário, onde há interação entre ambos, onde educador e educando acaba aprendendo e
ensinando simultaneamente.
Em uma educação problematizadora, não se transfere, mas sim se compartilha experiências,
constrói seres críticos conseguido através do diálogo com o educador, crítico também. O mundo
agora é visto com uma nova margem, já não é algo que se fala com falsas palavras, mas o
mediatizador dos sujeitos da educação, de que resulte a sua humanização.
A teoria antidialógica é característica das elites dominadoras. Já a teoria da ação dialógica,
‘diálogo’, faz parte da classe revolucionário-libertadora, onde os sujeitos se encontram para a
transformação do mundo.
A divisão da massa popular é preciso, para a classe opressora, porque sem ela, esta corre o risco de
despertar na classe oprimida o sentido de união, que é elemento indispensável à ação libertadora.
Em se tratando da teoria da ação dialógica vemos que na antidialógica existe um sujeito que domina
um objeto e na teoria dialógica existem sujeitos que se encontram para a pronúncia do mundo.
Daí que, enquanto na ação antidialógica a elite dominadora falseia o mundo para melhor dominá-lo,
na dialógica exige o desvelamento do mundo. O desvelamento do mundo e de si mesmas, na práxis
2. verdadeira, possibilita às massas populares a sua adesão. Esta adesão coincide com a confiança que
as massas populares começam a ter em si e na liderança revolucionária, pois começam a perceber a
dedicação, a veracidade na defesa da libertação dos homens.
Na teoria dialógica, contrária a antidialógica, a liderança se obriga ainda que insistentemente, em
manter união dos oprimidos entre si para a libertação, sendo a práxis o ponto fundamental.
Na teoria dialógica a liderança se obriga, como num esforço infatigável, manter a união dos
oprimidos entre si, e deles com ela, para a libertação. Esta união é importante para que as massas
consigam libertar-se da opressão, mas esta, sem a práxis torna-se impossível.
Ao contrário do que ocorre com a elite opressora, onde sua unidade interna que lhe reforça e
organiza o poder, importa a divisão das massas, já para a liderança revolucionária, sua unidade
somente existe na unidade das massas entre si e com ela.
O ato de unir para a libertação é contrário à vontade da classe dominante, por isso torna-se tão
difícil, para a liderança revolucionária mantê-la. O primeiro passo para a unificação é desmitificar a
realidade, sendo também imprescindível uma forma de ação cultural através da qual conheçam o
porquê e o como de sua "aderência" à realidade que lhes dá um conhecimento falso de si mesmos e
dela; sendo necessário desideologizar, ou seja, conhecer a verdadeira face do mundo em que vive,
exercendo assim, um ato de adesão à práxis verdadeira de transformação da realidade injusta.
Na teoria dialógica a organização faz-se presente na tentativa da liderança manter um testemunho
de que a busca da libertação é uma tarefa comum entre o povo. Este testemunho, por sua vez,
humilde e corajoso do exercício de uma tarefa comum evita o risco dos dirigismos antidialógicos. O
testemunho, aqui, é uma das conotações principais do caráter cultural e pedagógico da revolução.
A ação cultural está a serviço da opressão, consciente ou inconscientemente por parte de seus
agentes ou está a serviço da libertação dos homens. No objetivo dominador da ação cultural
antidialógica não se encontra a possibilidade de superação de seu caráter de ação induzida, bem
como no objetivo libertador da ação cultural dialógica, se acha a condição para superar a indução.
Portanto, se descobrirem através de uma modalidade de ação cultural, problematizadora de si
mesmos em seu confronto com o mundo, significa, primeiramente, que se descubra como tal,
reconheçam sua identidade com toda significação profunda que tem esta descoberta.
Uma das falhas, dentre outras que a liderança comete é de não levar em conta a visão do mundo que
o povo tem. Já à a liderança revolucionária, o conhecimento desta lhe é indispensável para sua ação,
como síntese cultural.
O que pretende a ação cultural dialógica, não pode ser o desaparecimento da dialeticidade
permanência-mudança, mas superar as contradições antagônicas de que resulte a libertação dos
homens.
Assim, como o opressor precisa de uma teoria da ação opressora, os oprimidos, para se libertarem,
necessitam de uma teoria de sua ação. Somente na união dele com a liderança revolucionária, na
práxis de ambos, é que esta teoria se faz e se re-faz.
PEDAGOGIA DO OPRIMIDO
Para Paulo Freire, vivemos numa sociedade dividida em classes, sendo que os privilégios de uns,
impedem que a maioria, usufruam dos bens produzidos e, coloca como um desses bens produzidos
e necessários para concretizar a vocação humana dos ser mais, a educação, da qual é excluída
grande parte da população do Terceiro Mundo. Refere-se então a dois tipos de pedagogia: a
pedagogia dos dominantes, onde a educação existe como uma prática de dominação a pedagogia do
oprimido, que precisa ser realizada, na qual a educação surgiria como prática da liberdade.
O movimento para a liberdade deve surgir e partir dos próprios oprimidos, e a pedagogia decorrente
será " aquela que tem que ser forjada com ele e não para ele, enquanto homens ou povos, na luta
incessante de recuperação de sua humanidade". Vê-se que não é suficiente que o oprimido tenha
3. consciência crítica da opressão, mas, que se disponha a transformar essa realidade; trata-se de um
trabalho de conscientização e politização.
A pedagogia do dominante é fundamentada em uma concepção bancária de educação, (predomina o
discurso e a prática, na qual, quem é o sujeito da educação é o educador, sendo os educandos, como
vasilhas a serem enchidas; o educador deposita "comunicados" que estes, recebem, memorizam e
repetem), da qual deriva uma prática totalmente verbalista, dirigida para a transmissão e avaliação
de conhecimentos abstratos, numa relação vertical, o saber é dado, fornecido de cima para baixo, e
autoritária, pois manda quem sabe. Na educação bancária o educador é sempre o que sabe, enquanto
os educandos serão os que não sabem. A rigidez destas posições nega a educação e o conhecimento
como processo de busca. Educador é o sujeito do processo, educando mero
objeto...........................................
Dessa maneira, o educando em sua passividade, torna-se um objeto para receber paternalisticamente
a doação do saber do educador, sujeito único de todo o processo. Esse tipo de educação pressupõe
um mundo harmonioso, no qual não há contradições, daí a conservação da ingenuidade do
oprimido, que como tal se acostuma e acomoda no mundo conhecido (o mundo da opressão)- e eis
aí, a educação exercida como uma prática da dominação.................................
O método Paulo Freire não ensina a repetir palavras, coloca o alfabetizando em condições de poder
re-existenciar criticamente as palavras de seu mundo, para na oportunidade devida, saber e poder
dizer a sua palavra. Com a palavra o homem se faz homem é o que difere dos animais. Neste
método o sentido mais exato da alfabetização é aprender a escrever sua vida, como autor e
testemunha de sua própria história, ou seja, o homem constitui e conquista historicamente sua
própria forma e na medida que se apercebe como testemunha de sua história, sua consciência se faz
reflexivamente responsável desta história.
O diálogo não é um produto histórico, é a própria historicização, é ele, pois, o movimento
constitutivo da consciência que abrindo-se para a infinitude, vence intencionalmente as fronteiras da
finitude e, incessantemente, busca reecontrar-se além de si mesmo. Expressar-se expressando o
mundo, implica o comunicar-se
Alfabetização não é um jogo de palavras, é a consciência reflexiva da cultura, a reconstrução critica
do mundo humano, é toda a pedagogia: aprender a ler é aprender a dizer sua palavra.
Os homens humanizam-se, trabalhando juntos para fazer do mundo, sempre mais, a mediação de
consciências – que se coexistenciam em liberdade. Um método pedagógico de conscientização
alcança as últimas fronteiras do humano, e como o homem sempre se excede, o método também o
acompanha, é a educação como prática de liberdade.
A luta do ser menos pela humanização, pelo trabalho livre, pela desalienação, pela afirmação do
homem como pessoa, somente tem sentido quando os oprimidos buscarem recuperar sua
humanidade, não se sentem idealisticamente opressores, nem se tornam de fato, opressores dos
opressores, mas restauradores da humanidade em ambos.
A preocupação de Paulo Freire é que a pedagogia que faça da opressão de suas causas de objeto da
reflexão dos oprimidos, de que resultará o seu angajamento necessário na luta por sua libertação,
em esta pedagogia se fará e refará.
Um dos elementos básicos na mediação opressor-oprimido é a prescrição. Toda prescrição é a
imposição da opção de uma consciência a outra..
Segundo Paulo Freire a libertação é um processo doloroso, pois depende do próprio individuo
expulsar ou não o opressor de dentro de si. O homem que nasce deste parto é um homem novo que
só é viável na e pela superação da contradição opressores-oprimidos, que é a libertação de todos. A
superação da contradição é o parto que traz ao mundo este homem novo, não o opressor, não mais o
oprimido, mas homem libertando-se.
Um dos problemas mais graves que se põem à libertação é que opressores e oprimidos precisam
4. ganhar a consciência critica da opressão, na práxis desta busca. Através da práxis autêntica que, não
sendo "blábláblá", nem ativismo, mas ação e reflexão, e possível fazê-lo. Práxis é a reflexão e ação
dos homens sobre o mundo para transforma-lo, sem ela é impossível à superação da contradição
opressor-oprimido.
Quanto mais as massas populares desvelam a realidade objetiva e desafiadora sobre a qual elas
devem incidir sua ação transformadora, tanto mais se "inserem" nela criticamente.
Para os opressores, o que vale é ter cada vez mais, à custa, inclusive do ter menos ou do nada ter
dos oprimidos. Ser para eles, é ter, e ter como classe que tem. O sadismo aparece como uma das
características da consciência opressora, na sua visão necrófila do mundo. Por isto é que seu amor é
um amor as avessas – um amor a morte e não a vida.
Dentro da situação concreta de opressão e oprimidos, a autodesvalia é uma das características do
oprimido, que resulta da introjeção que fazem eles da visão que deles tem os opressores. De tanto
ouvirem de si mesmos que são incapazes, indolentes, que não sabem nada, que não podem saber,
acabam por se convencer de sua "incapacidade".
É como homens que os oprimidos tem que lutar e não como "coisas", na relação de opressão em
que estão, que se encontram destruídos. A luta por esta reconstrução começa no auto conhecimento
dos homens destituídos.
Um educador humanista, revolucionário deve orientar-se no sentido da humanização de ambos. Do
pensar autêntico e não no sentido de doação, da entrega do saber, sua ação deve estar fundida da
crença nos homens. Isto tudo exige dele um companheiro dos educandos, em suas relações com
estes.
A educação como pratica de liberdade implica a negação do homem abstrato, isolado, solto,
desligado do mundo, assim como também a negação do mundo como uma realidade ausente.
A prática problematizadora propõe ao homem sua situação como situação problema, propõe a ele a
sua situação como incidência de seu ato cognoscente, através do qual será possível a superação da
percepção mágica ou ingênua que dela tenham.
O diálogo é também uma exigência existencial, e se ele é o encontro em que solidarizam o refletir e
o agir de seus sujeitos endereçados ao mundo e ser transformado e humanizado, não pode reduzir-se
a um ato de depositar idéias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de idéias
a serem consumidas pelos permutantes.
A auto-suficiência é incompatível com o diálogo. Homens que não tem humildade ou a perdem, não
podem aproximar-se do povo. Se alguém não é capaz de sentir-se e saber-se tão homem quanto os
outros, é que lhe falta ainda muito que caminhar para chegar ao lugar do encontro com eles.
A confiança vai fazendo os sujeitos dialógicos cada vez mais companheiros na pronuncia do
mundo. Falar em democracia e silenciar o povo, falar em humanismo e negar os homens é uma
mentira.
Para o educador educando, dialógico, problematizador, o conteúdo programático da educação não é
uma doação ou uma imposição mas devolução organizada, sistematizada e acrescentada ao povo
daqueles elementos que este lhe entregar de forma destruturada.
A investigação da temática envolve investigação do próprio pensar. Pensar que não se dá fora dos
homens, nem num homem só, nem no vazio, mas nos homens e entre os homens, e sempre referido
a realidade.
No processo da descodificação cabe ao investigador, auxiliar, não apenas ouvir os indivíduos, mas
desafiá-lo cada vez mais problematizando, de um lado, a situação existencial codificada e de outro,
as próprias respostas que vão dando aqueles no decorrer do diálogo.
A solidariedade nasce no testemunho que a liderança dá ao povo, no encontro humilde, amoroso e
5. corajoso. Nem todos temos a coragem deste encontro e nos enrijecemos no desencontro, no qual
transformamos os outros em puros objetos, e ao assim agirmos nos tornamos necrófilos, em lugar
de biófilos, matamos a vida, em lugar de alimentarmos, em lugar de busca-la, corremos dela.
Manipulação é uma das características da teoria da ação anti-dialógica, é a manipulação das massas
oprimidas. Através da manipulação vão tentando conformar as massas populares e seus objetivos.
Crianças deformadas num ambiente de desamor, opressivo, frustradas na sua potência, se não
conseguem na juventude, endereçar-se no sentido da rebelião autêntica, ou se acomodam numa
demissão total do seu querer, alienados a autoridades e aos mitos, poderão vir a assumir formas de
ação destrutiva.
CONCLUSÃO
O trabalho de Paulo Freire pode ser visto não apenas como um método de alfabetização, mas como
um processo de conscientização, por levar em conta a natureza política da educação.
Para ele o objetivo da educação deveria ser a libertação do oprimido, que lhe daria meios de
transformar a realidade social e sua volta mediante "conscientização" (conhecimento crítico do
mundo).
A eficácia e a validade de seu método fundamentam-se no fato de partir da realidade do
alfabetizando, do seu universo, do valor pragmático das coisas e fatos de sua vida cotidiana, de suas
situações existenciais.
Obedece às normas metodológicas e lingüísticas, mas vai além delas, ao desafiar o homem ou a
mulher que se alfabetizam a se apropriarem do código escrito com vistas a sua politização.
Vale a pena ressaltar que apesar de nós educadores e profissionais da área educacional sofrermos
diferentes tipos pressões, degradação salarial e até mesmo queda no prestigio sócia,l ainda depende
de nós a valorização, a qualidade e a excelência da educação.