1. Artigo de Luiz Garcia, publicado no jornal O Globo
O GOL DE ROMÁRIO
Na terça-feira passada, Romário entrou em campo. Usava, se me permitem a
pobreza da imagem, não as sandálias da humildade e da timidez, mas as
chuteiras do artilheiro. E fez um gol de placa.
Denunciou ao plenário da Câmara um fato que muitos de seus colegas
certamente ignoravam. E uns tantos outros fingiam ignorar — o que não é raro
no mundo político. Por interesse direto, ou por contar que seus colegas façam
o mesmo, quando for do seu interesse.
Romário simplesmente contou um episódio triste do mundo do futebol
profissional.
Aqui vai: no último dia 9, ocorreu em Brasília um jantar no qual o presidente da
Confederação Brasileira de Futebol, José Maria Marin, foi recebido por um
grupo de mais ou menos 25 deputados e senadores, para discutir um assunto
que caridosamente podemos definir como cabeludo.
Ignoro, lamentavelmente, seus nomes e partidos. A opinião pública merecia
conhecê-los.
Acontece, e a gente não sabia, que o Ministério do Esporte está preparando
uma medida provisória que concederá anistia a dívidas de clubes de futebol do
país inteiro, no valor de mais ou menos R$ 3 bilhões.
É a soma do que devem ao INSS, ao Imposto de Renda e ao Fundo de
Garantia — que eles simplesmente, ousadamente, não pagaram nos últimos 20
anos.
É um dinheirão, que se explica pela soma dos juros ao longo desse tempão.
Provavelmente, é o maior escândalo na história da cartolagem do esporte
profissional brasileiro.
A anistia, segundo o nosso craque — que agiu com coragem e sem nada
ganhar com isso, a não ser o ódio dos mandachuvas do esporte que é a paixão
do povo brasileiro — está sendo preparada pelo Ministério do Esporte.
Em seu discurso-denúncia, Romário não revelou o que ficou acertado no jantar
que reuniu o presidente da CBF e parlamentares. Ninguém falou em
pagamento: discutiu-se apenas o encaminhamento da anistia.
É uma vergonha, como poucas as que temos conhecido na vida pública
brasileira. E também, vale a pena repetir, um gol de placa do nosso artilheiro.
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