O documento discute a natureza missionária da Igreja diante das circunstâncias atuais. Afirma que a Igreja deve repensar profundamente sua missão para não se apegar a modelos historicamente limitados, e sim entender que sua essência é ser enviada por Deus para anunciar que Ele é um Deus de amor e misericórdia. Também ressalta a importância de compreender Jesus à luz do Evangelho e seguir Sua missão guiada pelo Espírito Santo.
1. A NATUREZA
MISSIONÁRIA DA IGREJA E
AS CIRCUNSTÂNCIAS ATUAIS
“A Igreja é chamada a repensar profundamente e a
relançar com fidelidade e audácia sua missão nas
novas circunstâncias latino-americanas e mundiais”
(DAp 11)
2. As circunstâncias atuais como sinais
dos tempos?
A Igreja se encontra numa situação de
diáspora diante do mundo atual.
A hegemonia das tradições religiosas em
determinados territórios deixou lugar ao
pluralismo possível.
Nessa situação de efervescência, cidades e
metrópoles substituíram aldeias em todos os
continentes.
A religião torna-se uma commodity.
A Igreja procura encarar os desafios do mundo
de hoje com uma atitude ambivalente.
3. Missão como caminho
de conversão da Igreja
Igreja sente a necessidade de ampliar os
âmbitos de ação de sua missão evangelizadora.
Mas um arquétipo missionário atrelado a uma
visão etnocêntrica e eclesiocêntrica de
“território” não muda.
Se faz necessário um discernimento
fundamental que ajude a não confundir a
fidelidade ao Senhor com a fixação em modelos
historicamente limitados.
Missão se torna um tema paradigmático para
uma profunda conversão da Igreja em termo
de metanoia. Em que sentido?
4. A natureza missionária:
a Missio Dei
“A Igreja peregrina é por sua natureza
missionária, porque tem sua origem na
missão do Filho e do Espírito Santo, segundo
o desígnio do Pai” (AG 2).
“Natureza” que quer dizer “essência”: a
missão vem de Deus porque Deus é amor.
A missão diz respeito ao que Deus “é” e não,
primeiramente, ao que Deus faz.
“Missionária”: a Igreja não é mais aquela que
envia, mas é a enviada. Ela é ao ser enviada.
Não é uma Igreja que tem uma missão, mas
uma missão que tem uma Igreja.
5. Re-encantamento
com o Evangelho
Essa essência missionária da Igreja diz respeito
à essência do Evangelho que vamos anunciar.
Esse anúncio pode-se resumir no seguinte:
Deus é Pai, nós somos seus filhos e filhas,
irmãos e irmãs entre nós. Ponto.
Deus revela em Jesus seu rosto profundamente
humano e, nEle, a humanidade se encontra
plena, reunida numa só família.
O Evangelho inaugura uma nova visão da
história: se acreditarmos que Deus é
verdadeiramente Pai de todos, então os outros
são nossos irmãos. É uma ética que se
fundamenta numa ótica.
6. Encontro, compreensão,
adesão a Jesus
A essência missionária da Igreja diz respeito
também à nossa compreensão de Jesus.
Se quiser encontrar Jesus, é preciso ir à
Galiléia.Lá está ele, “pregando a Boa Nova do
Reino e curando todo tipo de doença” (Mt 4,23).
Para seus familiares Jesus é um louco (cf. Mc
3,21), para as autoridades um possuído pelo
demônio (cf. Jo 10,20), para a sua geração “um
comilão e beberrão, amigo dos cobradores de
impostos e dos pecadores” (Mt 11,19). Muitos
dos seus discípulos o abandonam (cf. Jo 6,66).
Até João Batista tem lá suas dúvidas (cf. Mt
11,3).
7. Quem é Jesus
para nós?
“E vocês, quem dizem que eu sou?” (Mt 16,15).
Com efeito, quem ainda teima em seguir Jesus
não consegue entender muita coisa dele
O Messias esperado era outro. Israel aguardava
a vinda do Filho de Davi
No entanto, aparece um Filho do homem que
realiza, com sua humanidade, sua compaixão e
contra todo poder e domínio, as promessas de
Deus: ele não é o Messias que proclama “o dia
da vingança do nosso Deus” (Is 61,2).
Ele apenas anuncia um Deus Amor, Pai de
todos, também dos estrangeiros e dos inimigos.
8. Ele é o Caminho,
a Verdade, a Vida
O desconcerto causado por Jesus, pela
humanidade universal do Deus que ele anuncia,
acompanha a sua Igreja até os dias de hoje.
Estamos sempre a caminho como discípulos
missionários tentando entender o mistério dEle,
aderindo à sua mesma missão.
Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida que
continuamente surpreende e desafia nossas
direções, nossas convicções e nossas pretensões.
A nossa fé não constitui uma moral, um rito: funda
e se realiza num humanismo. Amar o humano em
todas as suas manifestações e limitações: isto é
divino e isto é exigido aos discípulos missionários.
9. Missão como
ação do Espírito
A essência missionária da Igreja leva a
redescobrir a dimensão da missão como ação
do Espírito Santo (cf. RMi 24).
Ele é o protagonista absoluto que inicia e
orienta a missão, conseqüência direta do
derramamento do Espírito e participação da
vida divina.
Missão não é coerção externa, não depende de
uma necessidade histórica: é
fundamentalmente um dinamismo interior.
Os discípulos são apenas testemunhas da ação
do Espírito no mundo (cf. Lc 24,48).
10. Missão livre,
profunda, universal
O Espírito guia a missão (cf. At 16,6-7)
O Espírito abre as portas aos outros (cf. At
13,46-48).
O Espírito fala a todos (cf. At 2,4; 14,15-17;
17,22-31).
O Espírito impele ir além (cf. At 10,47)
O Espírito cria comunhão (cf. At 2,42-47)
O Espírito indica os missionários (cf. At 13,1-4).
O Espírito suscita a fé (cf. 1Cor 12.3)
O Espírito sopra onde quer (cf. Jo 3,8).
11. Hóspedes
na casa dos outros
O anúncio desse Evangelho e dessa ação do
Espírito leva continuamente a Igreja peregrina
a desinstalar-se.
Se “missão” significa “envio”, todo envio
pressupõe um deslocamento e uma saída:
nessa saída acontece a conversão.
A missão consiste no seguinte: não podemos
esperar que as pessoas venham a nós,
precisamos nós sair ao encontro.
Uma Igreja enviada é uma Igreja que está fora
de casa, como companheira dos pobres e
como hóspede na casa dos outros.
12. Fé e caridade
efetivamente vividas
A energia que a Igreja consegue colocar na
sociedade mundial consiste naquela fé e
naquela caridade efetivamente vividas, e não
em qualquer soberania exterior exercida com
meios puramente humanos.
Portanto, fé e caridade efetivamente vividas
capazes de criar relações novas na formação
de comunidades e na missão com os pobres e
com os outros: ad intra e ad extra como fosse o
palpitar de diástole e sístole de um coração.
Afinal, a missão é uma questão de coração.