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Ensino de Língua Portuguesa baseado em gêneros textuais
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Adapted from: Diretrizes para o Ensino de Língua Portuguesa na Móbile, de autoria de Luciana Tomiatto de Oliveira
Definimos texto como uma unidade comunicativa carregada de significado, produto da
atividade humana, que possui caráter social. Se compreendemos texto como produto de uma
atividade social, de interação entre dois ou mais interlocutores, podemos concluir que é impossível
não se comunicar verbalmente, seja de forma oral ou escrita, por meio de algum texto. Podemos
ir além e afirmar que toda comunicação verbal só é possível por meio de algum gênero textual.
Marcuschi entende gêneros textuais como modelos correspondentes a formas sociais
reconhecíveis nas situações de comunicação em que ocorrem. Sua estabilidade é relativa ao
momento histórico-social em que surgem e circulam. Falar em gêneros textuais é falar em textos
em situações reais de funcionamento e em seu contexto de produção.
A noção de gênero do discurso, segundo Bakhtin, abarca os produtos da atividade de
linguagem em funcionamento permanente na sociedade, os quais apresentam características
relativamente estáveis. Podemos afirmar que a funcionalidade dos gêneros vai além do campo
linguístico, pois cumprem um papel social e cultural, ordenando e estabilizando as atividades
comunicativas cotidianas.
Bronckart considera os textos produtos da atividade de linguagem humana e
conceituados em função de seus objetivos. O autor, apoiando-se nas ideias de Bakhtin, define os
gêneros textuais a partir das sequências “relativamente estáveis”, que se moldam de acordo com
a atividade linguística e discursiva em que os interlocutores estão inseridos. Desse modo, os
gêneros podem ser considerados como verdadeiras ferramentas no cumprimento de
determinadas funções na área da atividade de linguagem.
Uma metodologia de ensino de Língua Portuguesa baseada no estudo dos gêneros
textuais tem como objetivo a inserção do aluno nas atividades humanas de comunicação, já que
a apropriação dos gêneros é um mecanismo fundamental de socialização. Preparar os alunos
para dominar a língua em situações variadas, fornecendo-lhes instrumentos eficazes, ajuda a
desenvolver uma relação com o comportamento discursivo consciente e voluntária, favorecendo
estratégias de autorregulação, determinantes para o desenvolvimento da autonomia intelectual.
O trabalho com gêneros textuais na escola visa, especialmente, dois objetivos precisos de
aprendizagem: aprender a dominar um gênero para melhor conhecê-lo, apreciá-lo,
compreendê-lo e produzi-lo, em qualquer situação social de comunicação, e desenvolver
capacidades que ultrapassam um gênero e que são transferíveis para outros, próximos ou
distantes. “Quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma linguística e sim
uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares”.
(MARCUSCHI, 2008) Assim, podemos afirmar que a apropriação dos gêneros é um mecanismo
fundamental de socialização e inserção nas práticas comunicativas humanas.
Essa metodologia é uma ferramenta importante no desenvolvimento das capacidades de
linguagem, entendidas como “as aptidões requeridas do aprendiz para a produção de um
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gênero numa situação de interação determinada”. (DOLZ & SCHNEUWLY, 2004) No conjunto das
aptidões requeridas, estão:
• Capacidades de ação: adaptação às características do contexto e do referente, com
objetivo de tomar consciência do gênero em questão e identificar as características do contexto
de produção;
• Capacidades discursivas: mobilização de modelos discursivos; capacidades que dizem
respeito ao modo de organização geral do texto, ou seja, à forma como o conteúdo está
organizado;
• Capacidades linguístico-discursivas: domínio de operações psicolinguísticas e da estrutura
linguística.
Os textos situam-se em domínios discursivos1, que produzem contextos e situações para as
práticas sociodiscursivas características. Esses domínios discursivos produzem modelos de ação
comunicativa, que se estabilizam e são transmitidos de geração em geração, e acarretam
reflexão e avaliação social. A cada domínio discursivo, podemos associar capacidades de
linguagem dominantes – são as chamadas tipologias textuais, que correspondem a sequências
definidas pela natureza linguística de sua composição (narrar, relatar, argumentar, expor,
descrever ações).
O quadro abaixo, proposto por Dolz, Noverraz e Schneuwly, categoriza exemplos de
gêneros orais e escritos de acordo com seus domínios sociais de comunicação e suas
capacidades de linguagem dominantes.
DOMÍNIOS SOCIAIS DE
COMUNICAÇÃO
CAPACIDADES DE
LINGUAGEM DOMINANTES
EXEMPLOS DE GÊNEROS ORAIS E ESCRITOS
Cultura literária
ficcional
NARRAR
Conto maravilhoso
Fábula
Lenda
Narrativa de aventura
Narrativa de ficção científica
Narrativa de enigma
Novela fantástica
Documentação e
memorização de
ações humanas RELATAR
Relato de experiência vivida
Relato de viagem
Notícia
Reportagem
Ensaio biográfico
Discussão de
problemas sociais
controversos ARGUMENTAR
Texto de opinião
Diálogo argumentativo
Carta ao leitor
Carta de reclamação
Debate regrado
Transmissão e
construção de saberes
EXPOR
Seminário
Conferência
Artigo ou verbete de enciclopédia
Entrevista
Tomada de notas
Resumo
Relatório científico
Relato de experiência científica
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Marcuschi compreende domínios discursivos como esferas da vida social ou institucional na qual se dão práticas que
organizam formas de comunicação e respectivas estratégias de compreensão.
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Instruções e prescrições
DESCREVER AÇÕES
Instruções de montagem
Receita
Regulamento
Regras de jogo
Instruções
A viabilidade de uma metodologia de ensino de Língua Portuguesa baseada nos gêneros
textuais pressupõe:
• Escolher os gêneros tendo claros os objetivos dessa escolha, nas diferentes etapas da
unidade didática;
• Pesquisar exemplos de gêneros em diferentes fontes, para viabilizar a análise de diferentes
contextos de produção, sua organização textual e seus aspectos linguístico-discursivos;
• Elaborar unidades didáticas (conjunto de atividades que buscam desenvolver as
capacidades de linguagem envolvidas na leitura e produção de gêneros discursivos) para ensinar
a ler e/ou produzir o gênero escolhido.
As unidades didáticas que trabalham a leitura e/ou produção de determinado gênero
textual devem englobar os três níveis do mapeamento textual: contexto de produção, aspectos
discursivos e aspectos linguístico-discursivos.
• Contexto de produção – as formas de organização linguística dos textos surgem no uso da
linguagem como atividade situada em práticas sociais. Sendo assim, não é só a forma escrita ou
oral do texto que o reveste de determinadas características, mas também a situação em que a
produção textual se estabelece. Na análise do contexto de produção de um texto, são
respondidas perguntas como: Onde podemos encontrar o texto? Quem é o autor? Quem são os
possíveis leitores? Quando foi escrito? Com qual objetivo foi escrito? Em qual suporte foi
divulgado?
• Aspectos discursivos – referem-se à distribuição dos conteúdos temáticos ao longo do
texto, ao layout apresentado e às capacidades de linguagem dominantes.
• Aspectos linguístico-discursivos – referem-se às vozes do discurso, às modalizações, aos
elementos que garantem a coesão textual e ao campo lexical. É por meio desses recursos que o
locutor expressa seu ponto de vista e são eles os responsáveis por fornecer ao leitor as pistas
interpretativas.
é Vozes do discurso – o discurso é tecido numa trama de várias vozes incorporadas pelo
sujeito da enunciação; o enunciador atribui, em seu discurso, afirmações de
interlocutores, pontos de vista e opinião públicas em geral.
é Modalizações – os modalizadores são elementos linguísticos que funcionam como
indicadores de intenções, sentimentos e atitudes do locutor em relação a seu discurso.
Eles revelam o grau de engajamento do falante em relação ao conteúdo veiculado e
orientam o leitor na compreensão do conteúdo temático do texto.
é Elementos que garantem a coesão textual – são sequencializadores de ideias, cuja
função é estruturar a linearidade do texto, organizando-o em sucessão de fragmentos
complementares que facilitam a interpretação.
é Campo lexical – conjunto de palavras pertencentes à mesma área do conhecimento,
que apresentam relações de sentido entre si.
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A organização de uma unidade didática deve levar em conta, além do trabalho com os
três níveis de análise textual, os seguintes critérios:
é Os atores do processo de interação verbal, o suporte, as esferas da atividade humana, a
estrutura, a temática e os recursos linguísticos dos textos escolhidos;
é Variações de atividades: exploração do contexto de produção e sua relação com a
construção do texto, das partes que o compõem, dos elementos linguístico-discursivos
presentes na escrita e a intencionalidade do autor ao utilizá-los, entre outras
possibilidades;
é O papel do professor e do aluno no processo de investigação do gênero.
é A co-construção do conhecimento.
Por todas essas características apresentadas, o trabalho com os gêneros do discurso está
estritamente relacionado à autonomia intelectual do indivíduo, cujo desenvolvimento está
baseado na relação entre pensamento e linguagem. Quanto maior a capacidade de expressão
linguística de um sujeito, nos mais variados contextos comunicativos, maior sua capacidade de
autogestão, autossuficiência e independência.
Esse desenvolvimento da relação entre pensamento e linguagem também é responsável
pela potencialização da capacidade leitora do indivíduo. Quanto mais recursos ele possui para
construir um pensamento lógico, estruturado, maior a sua possibilidade de analisar criticamente
tudo aquilo que lê e ouve. Assim, é capaz de reconhecer, no discurso, as marcas deixadas por
quem escreve ou fala, os indicadores de intencionalidade, posicionamento, o dito e o não dito. É
capaz de interpretar, fazer inferências, estabelecer relações. Por essas razões, a relação entre
pensamento e linguagem está diretamente relacionada ao desenvolvimento do pensamento
crítico.