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Kalum, segundo a tradição baga contada por
Revière1
(1966), era o nome da península onde
se encontra a atual Conacri – capital da
República da Guiné, país dos sujeitos
produtores das imagens desta exposição.
Se fôssemos mapear um corpo, o Kalum seria
os pés do Kakulima, este importante monte para
os povos baga, ponto de encontro dos ancestrais
que celebravam a fertilidade daquela terra.
Os povos que habitavam o Kalum tinham
dois importantes motivos para se encontrar no
monte Kakulima. um deles era o fruto
produzido pelas palmeiras, a palma, fruto que
produz o óleo de dendê - ou o vinho de palma -
muito apreciada pelas populações locais. O
outro motivo era o alimento espiritual, gestado a
partir do sepultamento – naquele monte - dos
sábios da região, dotados poderes ocultos.
Assim, a fertilidade naquele lugar era voltada
para alimentar tanto o corpo quanto o espírito
das pessoas, o que motivava os encontros entre
as populações locais no Kakulima.
Com o tempo, e os movimentos de dispersão
de outros povos oriundos de outros territórios,
os encontros foram se intensificando no
Kakulima, e o Kalum se tornou trajeto de
sujeitos de movimentos/travessias/passagens.
Segundo a tradição baga, a península
começou a ser povoada com uma mulher,
chamada Tombo Ali, imigrante de Tomboliyá.
Ela teve um filho de nome Khamfori Ali. Este
foi considerado o primeiro morador de um dos
primeiros vilarejos da península Kalum,
1
http://www.webguinee.net/bibliotheque/ethnographie/
rivieretoponymie_cky_kalum.html.
chamado Nongô, o berço do clã Bangurá. Mais
tarde, outro filho deste clã - Khamfori Kha - foi
morar há poucos quilômetros de onde Ali
morava, próximo à foz do riacho Kaporô,
“nascedouro” em língua baga.
Bem próximo a este riacho existia uma gruta
dentro da qual havia uma pedra de oferenda aos
sábios da região e aos ancestrais. Então os baga
deram o nome de Ratoma - uma árvore em
abundância na localidade cujas folhas tinham
alto poder medicinal e mágico - para outro
importante vilarejo que se formara no Kalum.
Em Ratoma, várias vezes por ano os
moradores desses vilarejos, e de outros menores,
se agrupavam na companhia de tocadores de
tam-tam, griots e representantes espirituais.
Durante vários dias eram oferecidas comidas e
cabaças cheias de vinho de palma aos “visíveis” e
aos “invisíveis”, a fim de suplicar aos espíritos
dos seus antepassados proteção e uma boa pesca.
A partir de alianças entre clãs baga, Kaporô
começou a se expandir e passou a ser a capital da
península. Entre esses acordos nasceram outros
homens. Um chamado de Khamfori Massa e
outro Khamfori Konan. Enquanto o primeiro
continuara residindo em Kaporô, o segundo se
deslocara e fora morar em uma das ilhas que
ultrapassa a península rumo ao mar. Khamfori
Konan seguira para além dos “pés” do monte
Kakulima.
Embora tenha se mudado, Khamfori Konan
mantinha-se em trânsito, indo e vindo com
frequência de um lado a outro, da ilha à
península. Este outro lugar em que fora morar
também era tão rico quanto o Kakulima. A
fertilidade da terra também fazia crescer
palmeiras que produziam excelentes vinhos de
palma.
Essa bebida afetava tanto quem a
experimentava que quando se queria beber um
bom vinho de palma, ia-se à terra do Konan. Por
conta desse lugar e do seu vinho este homem se
tornou muito conhecido, a ponto dos moradores
da península fazerem sempre a passagem para a
ilha, a fim de conseguirem a preciosa bebida.
Na cultura sosso, a do povo que passara a
chegar e impor ao Kalum sua cultura e sua
língua, nakiri tem sentido de “o outro lado”, e
nakirikai “os moradores do outro lado”.
Provavelmente era assim que os sosso se viam
por terem se deslocado das terras de Krina2
.
Ser nakirikai não depende apenas de onde se
estava, como também de seus deslocamentos.
Para todos os insulares, os nakirikai eram as
pessoas que estavam na/vinham da “ilha do
Konan”; e para quem estava na/vinha da ilha, os
insulares eram nakirikai. Portanto, todas as
pessoas eram vistas como nakirikai ao estarem
em travessia/passagem de um para outro lado.
Em um sentido mais particular, a capital da
Guiné parece ter passado a se chamar Konakry
por ser vista como um território de nakirikai.
Esta história, sobre a dinâmica das travessias e
encontros, nos permite dizer que seria possível
estender o sentido do nome nakirikai a todos os
povos que ali moram até os dias de hoje, e a
todas as pessoas no Brasil - ou em outros lugares
do mundo - cujo deslocamento, o movimento,
2
Parte do Império do Mali. Alusão à histórica Batalha de
Kirina, quando o rei Soso a perde e deve deixar a terra
com parte de seu povo.
lhes proporcione encontros, experiências e
outros saberes.
O contexto da produção das
nakirigrafias
É fazendo a travessia para “outro lado” que
chego à Guiné em Janeiro de 2014, levando
comigo a pergunta: escola é coisa de branco?
Este discurso, aparentemente naturalizado no
contexto, pressupunha uma escola autoritária,
colonial, que tendia a fazer dos estudantes – e
da comunidade escolar em geral - sujeitos
totalmente passivos às leis que predominariam
neste lugar de produção de conhecimento e
cultura.
Propus nesta pesquisa uma oficina de
fotografias com 12 estudantes do 4º ao 6º ano
do Ensino Fundamental da Escola III de
Forecariá, uma das 8 escolas públicas da cidade.
Durante 30 dias, cada estudante, participante
pôde fotografar o dentrofora da sua escola, a
fim de narrar imageticamente suas histórias de
vida.
Com esta proposta, eu achava que a escola
seria fabulada nas imagens pelo viés que eu a via,
ou seja, de modo a somente confirmar o que eu
fui buscar no campo da pesquisa: uma escola
obediente ao discurso colonial.
Entretanto, as imagens produzidas pelo
grupo3
, ou as nakirigrafias - como linguagem -
me mostraram “outras coisas” vindas de outros
caminhos, deslocando-me do meu até então
3
Ao todo foram produzidas cerca de 2.300 imagens
durante a oficina de fotografias. Deste número, foram
selecionadas 90 para esta exposição.
único campo de conhecimento – político-
cultural e epistemológico – e apontando-me que
a vida em uma/de uma escola é mais complexa
do que o que diz a narrativa – supostamente
oficializada – que dela se cria.
As “narrativas dos de outro lado”, passaram
a agenciar um momento de enunciação das
diferença/perspectiva cultural e política. O que
culminou em uma interação de perspectivas
naquele cotidiano escolar.
Este momento, que também pode ser o deste
nosso encontro com as nakirigrafias,
arranha/tensiona conceitos estagnados de escola,
de África – e da vida -, e passa a complexificar,
ao invés de simplificar, sua imagem político-
cultural.
É o que desejamos com esta exposição!
Assim, boas travessias e boas experiências
com as narrativas desta África!
Fomento:
Apoio:
Nakirigrafias:
narrativas de uma África
Curadoria: Geoésley Mendes
Fotografias: Estudantes da Escola III da cidade de
Forecariá, Guiné Conacri
Coordenação: Mailsa Passos
Realização: Grupo de Pesquisa Culturas e
Identidades no Cotidiano (UERJ)
Fotografia: “escrita/desenho/narrativa” com
luz. Nakirigrafia: “escrita/desenho/narrativa”
dos que são “de outro lado” e estão em
travessias/trânsito/movimentos.
As imagens dessa exposição se propõem a
contar outras histórias, de modo a provocar
outros saberes de/com África, no diálogo com
pessoas cujas vidas foram narradas por flashes e
lentes eurocêntricas.

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Poema - Reciclar é preciso
 

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  • 1. Kalum, segundo a tradição baga contada por Revière1 (1966), era o nome da península onde se encontra a atual Conacri – capital da República da Guiné, país dos sujeitos produtores das imagens desta exposição. Se fôssemos mapear um corpo, o Kalum seria os pés do Kakulima, este importante monte para os povos baga, ponto de encontro dos ancestrais que celebravam a fertilidade daquela terra. Os povos que habitavam o Kalum tinham dois importantes motivos para se encontrar no monte Kakulima. um deles era o fruto produzido pelas palmeiras, a palma, fruto que produz o óleo de dendê - ou o vinho de palma - muito apreciada pelas populações locais. O outro motivo era o alimento espiritual, gestado a partir do sepultamento – naquele monte - dos sábios da região, dotados poderes ocultos. Assim, a fertilidade naquele lugar era voltada para alimentar tanto o corpo quanto o espírito das pessoas, o que motivava os encontros entre as populações locais no Kakulima. Com o tempo, e os movimentos de dispersão de outros povos oriundos de outros territórios, os encontros foram se intensificando no Kakulima, e o Kalum se tornou trajeto de sujeitos de movimentos/travessias/passagens. Segundo a tradição baga, a península começou a ser povoada com uma mulher, chamada Tombo Ali, imigrante de Tomboliyá. Ela teve um filho de nome Khamfori Ali. Este foi considerado o primeiro morador de um dos primeiros vilarejos da península Kalum, 1 http://www.webguinee.net/bibliotheque/ethnographie/ rivieretoponymie_cky_kalum.html. chamado Nongô, o berço do clã Bangurá. Mais tarde, outro filho deste clã - Khamfori Kha - foi morar há poucos quilômetros de onde Ali morava, próximo à foz do riacho Kaporô, “nascedouro” em língua baga. Bem próximo a este riacho existia uma gruta dentro da qual havia uma pedra de oferenda aos sábios da região e aos ancestrais. Então os baga deram o nome de Ratoma - uma árvore em abundância na localidade cujas folhas tinham alto poder medicinal e mágico - para outro importante vilarejo que se formara no Kalum. Em Ratoma, várias vezes por ano os moradores desses vilarejos, e de outros menores, se agrupavam na companhia de tocadores de tam-tam, griots e representantes espirituais. Durante vários dias eram oferecidas comidas e cabaças cheias de vinho de palma aos “visíveis” e aos “invisíveis”, a fim de suplicar aos espíritos dos seus antepassados proteção e uma boa pesca. A partir de alianças entre clãs baga, Kaporô começou a se expandir e passou a ser a capital da península. Entre esses acordos nasceram outros homens. Um chamado de Khamfori Massa e outro Khamfori Konan. Enquanto o primeiro continuara residindo em Kaporô, o segundo se deslocara e fora morar em uma das ilhas que ultrapassa a península rumo ao mar. Khamfori Konan seguira para além dos “pés” do monte Kakulima. Embora tenha se mudado, Khamfori Konan mantinha-se em trânsito, indo e vindo com frequência de um lado a outro, da ilha à península. Este outro lugar em que fora morar também era tão rico quanto o Kakulima. A fertilidade da terra também fazia crescer palmeiras que produziam excelentes vinhos de palma. Essa bebida afetava tanto quem a experimentava que quando se queria beber um bom vinho de palma, ia-se à terra do Konan. Por conta desse lugar e do seu vinho este homem se tornou muito conhecido, a ponto dos moradores da península fazerem sempre a passagem para a ilha, a fim de conseguirem a preciosa bebida. Na cultura sosso, a do povo que passara a chegar e impor ao Kalum sua cultura e sua língua, nakiri tem sentido de “o outro lado”, e nakirikai “os moradores do outro lado”. Provavelmente era assim que os sosso se viam por terem se deslocado das terras de Krina2 . Ser nakirikai não depende apenas de onde se estava, como também de seus deslocamentos. Para todos os insulares, os nakirikai eram as pessoas que estavam na/vinham da “ilha do Konan”; e para quem estava na/vinha da ilha, os insulares eram nakirikai. Portanto, todas as pessoas eram vistas como nakirikai ao estarem em travessia/passagem de um para outro lado. Em um sentido mais particular, a capital da Guiné parece ter passado a se chamar Konakry por ser vista como um território de nakirikai. Esta história, sobre a dinâmica das travessias e encontros, nos permite dizer que seria possível estender o sentido do nome nakirikai a todos os povos que ali moram até os dias de hoje, e a todas as pessoas no Brasil - ou em outros lugares do mundo - cujo deslocamento, o movimento, 2 Parte do Império do Mali. Alusão à histórica Batalha de Kirina, quando o rei Soso a perde e deve deixar a terra com parte de seu povo.
  • 2. lhes proporcione encontros, experiências e outros saberes. O contexto da produção das nakirigrafias É fazendo a travessia para “outro lado” que chego à Guiné em Janeiro de 2014, levando comigo a pergunta: escola é coisa de branco? Este discurso, aparentemente naturalizado no contexto, pressupunha uma escola autoritária, colonial, que tendia a fazer dos estudantes – e da comunidade escolar em geral - sujeitos totalmente passivos às leis que predominariam neste lugar de produção de conhecimento e cultura. Propus nesta pesquisa uma oficina de fotografias com 12 estudantes do 4º ao 6º ano do Ensino Fundamental da Escola III de Forecariá, uma das 8 escolas públicas da cidade. Durante 30 dias, cada estudante, participante pôde fotografar o dentrofora da sua escola, a fim de narrar imageticamente suas histórias de vida. Com esta proposta, eu achava que a escola seria fabulada nas imagens pelo viés que eu a via, ou seja, de modo a somente confirmar o que eu fui buscar no campo da pesquisa: uma escola obediente ao discurso colonial. Entretanto, as imagens produzidas pelo grupo3 , ou as nakirigrafias - como linguagem - me mostraram “outras coisas” vindas de outros caminhos, deslocando-me do meu até então 3 Ao todo foram produzidas cerca de 2.300 imagens durante a oficina de fotografias. Deste número, foram selecionadas 90 para esta exposição. único campo de conhecimento – político- cultural e epistemológico – e apontando-me que a vida em uma/de uma escola é mais complexa do que o que diz a narrativa – supostamente oficializada – que dela se cria. As “narrativas dos de outro lado”, passaram a agenciar um momento de enunciação das diferença/perspectiva cultural e política. O que culminou em uma interação de perspectivas naquele cotidiano escolar. Este momento, que também pode ser o deste nosso encontro com as nakirigrafias, arranha/tensiona conceitos estagnados de escola, de África – e da vida -, e passa a complexificar, ao invés de simplificar, sua imagem político- cultural. É o que desejamos com esta exposição! Assim, boas travessias e boas experiências com as narrativas desta África! Fomento: Apoio: Nakirigrafias: narrativas de uma África Curadoria: Geoésley Mendes Fotografias: Estudantes da Escola III da cidade de Forecariá, Guiné Conacri Coordenação: Mailsa Passos Realização: Grupo de Pesquisa Culturas e Identidades no Cotidiano (UERJ) Fotografia: “escrita/desenho/narrativa” com luz. Nakirigrafia: “escrita/desenho/narrativa” dos que são “de outro lado” e estão em travessias/trânsito/movimentos. As imagens dessa exposição se propõem a contar outras histórias, de modo a provocar outros saberes de/com África, no diálogo com pessoas cujas vidas foram narradas por flashes e lentes eurocêntricas.