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CAPÍTULO II - O EROTISMO
Eros, invencível no combate, tu que consomes as
riquezas (...)
De ti nenhum dos imortais é capaz de fugir,
Aquele que te possui, enlouquece.
(Sófocles)
Quantificar elementos de erotismo em relação às personagens femininas presentes no
livro e na minissérie, procedendo o confronto e análise é o que faremos neste capítulo.
Entretanto, algumas definições em torno desta categoria fazem-se necessárias previamente à
consideração a respeito dos dados pesquisados. A começar pela origem do vocábulo, que
remonta ao grego erotiko e ao latim eroticu, cujo significado repousa em “aquilo que se
refere ao amor lúbrico, sensual, sexual” (FERREIRA, 1993, p.216).
Segundo Bulfinch, (1999, p.110) a origem de Eros - que para os romanos era Cupido -
remonta à mitologia grega, segundo a qual ele seria fruto da união entre Ares, deus da guerra
e Afrodite, deusa da beleza e do amor. Nestas narrativas, ele é imaginado enquanto uma
criança, um menino caprichoso e irreverente, dotado de asas, arco e flechas, que se diverte em
atirar setas, com o fim de deixar os corações dos mortais e dos imortais completamente
inflamados pelo amor.
De acordo com o relato mitológico, Afrodite, com inveja da beleza de uma jovem,
Psiquê (a Alma), que rivalizava com a sua, incumbe o filho de fazer a moça apaixonar-se
pela criatura mais desprezível sobre a terra. Contudo, por acidente, Eros fere-se em suas
próprias setas e acaba apaixonando-se por Psiquê. Descoberta a relação, Zeus, divindade
suprema do Olimpo, considerado o pai dos deuses e dos homens, ordena que vivam separados
e Psiquê passa a eternamente conviver com Tristeza e Inquietação, à espera de Eros. Ou seja:
enquanto não encontra o amor, a alma vive incompleta, infeliz e inquieta. Em O que é o
62
Erotismo, Lúcia Castello Branco afirma que “o mito grego em suma nos diz que Eros é o
deus que aproxima, mescla, une multiplica e varia as espécies” ( 1984, p. 40).
Uma outra versão do mito está presente em O Banquete, de Platão. No banquete dos
deuses em festejo ao nascimento de Afrodite, Poros (Recurso) deitou-se com Pênia (Pobreza),
assim concebendo Eros, que, para o filósofo, não era um deus, mas um semideus. “E por ser
filho o amor (Eros) do Recurso e da Pobreza, foi esta a condição em que ele ficou”
(PLATÃO, 1972, p.40). Como Pobreza, está sempre carente do objeto amado; como Recurso,
sempre sabe imaginar um meio de chegar aos seus objetivos. Nesta obra, Platão também
relata a história entre Eros e Psiquê, mas sob outro viés, completando esta relação com a
entrada da figura de Ágape, o amor espiritual, desinteressado, de doação, sem espera de
recompensa.
Platão defende que o verdadeiro amor consistiria na afeição elevada a um plano ideal,
que transcenderia o contato físico, sem contudo excluí-lo. Este é o chamado “ideal platônico
do amor”, comumente confundido com o amor inatingível e a afeição sem contato. Na
mesma obra, Platão procura explicar a natureza da busca pelo amor, quando Aristófano
discursa relatando que, no princípio dos tempos, todos os seres humanos eram dotados de
dupla sexualidade1.
Por castigo de Zeus, foram mutilados, separados e condenados a vagar
pela terra, na ânsia do encontro com a metade perdida. Assim, a eterna missão de achar sua
metade seria equivalente a encontrar a continuidade de si mesmo.
É a partir desta visão mitológica acerca da bipartição dos homens é que se explica a
essência do erotismo para muitos autores, como Georges Bataille. Em O Erotismo (p.15), o
autor defende que este se articula em torno de movimentos opostos: a busca de continuidade
dos seres humanos, a tentativa de permanência além de um momento fugaz versus o caráter
mortal dos indivíduos, sua impossibilidade de superar a morte. Para Bataille, os indivíduos se
lançariam nesta busca de permanência porque eles carregam consigo uma espécie de
sentimento de isolamento, permeada por uma eterna nostalgia da sua metade, da continuidade
perdida.
__________________________
1
- Segundo o mito platônico, os seres humanos com dupla sexualidade eram divididos em três gêneros: totalmente femininos, totalmente
masculinos e os andróginos. A partir da bipartição ordenada pelo Olimpo, cada metade procuraria o seu complemento, estando explicada
para os gregos assim a ocorrência da homossexualidade, comum na Antigüidade.
63
A idéia do erotismo enquanto simples evidência de desejo sexual é refutada por grande
parte dos autores que se debruça sobre o tema. Para eles, embora haja correlação entre estas
noções, o sexo constitui uma necessidade física, enquanto erotismo extrapola este conceito,
consistindo em manifestação de desejos como um todo. Todos os animais possuiriam desejo
sexual, entretanto erotismo seria exclusividade apenas da raça humana. Nas palavras de Rollo
May:
sexo pode ser definido de maneira adequada em termos
fisiológicos. Eros, pelo contrário é a vivência das
intenções e o significado do ato. Enquanto sexo é ritmo
de estímulo e resposta, Eros é um estado do ser. A
finalidade do sexo é gratificação e o alívio da tensão,
enquanto Eros representa o desejo, a ânsia e a eterna
procura de expansão. Sexo em suma é o tipo de
relacionamento caracterizado pelo intumescimento dos
órgãos (para o qual buscamos um alívio prazeroso) e o
enchimento das gônadas (para o qual buscamos um
alívio satisfatório). Mas Eros2
é o modo de
relacionamento no qual não procuramos alívio e sim
cultivo, procriação e formação de um mundo (MAY,
1979 p. 80).
O que talvez o autor tenha pretendido explicitar é que o erotismo não se limita aos
mecanismos da genitalidade do sexo, mas vai além, extrapola estas fronteiras Não se trata de
simples atração do cio, mas da “sede” dos corpos por outros corpos. Nabor Nunes Filho, em
Eroticamente Humano, lembra que é inerente ao ser humano desejar e, em uma abordagem
ousada, sustenta que esta característica faz com que todos os homens sejam essencialmente
eróticos, pois o erotismo seria a mola fundamental de nossos atos:
_________________________________
2- Aqui o autor refere-se ao deus do amor com letra maiúscula na verdade para referir-se ao erotismo
64
Antes de ser um animal racional, o homem é um ser
desejante, constantemente sedento e quase sempre
insatisfeito. Nada há no universo o que o preencha ou o
complete(...) o que é causado pela perda de algo, cuja
natureza o próprio homem desconhece, o que evoca a
nostalgia de uma conjugação completa (NUNES
FILHO, 1994, p. 18).
Se o erotismo é um fenômeno natural, o que dizer da sedução? Se a noção de erotismo
parece ser inseparável da natureza humana, coerente é o pensamento de Jean Baudrillard,
segundo o qual os seres humanos também vivem constantemente empenhados no cativante
jogo da sedução. Para o autor, que dedicou um livro inteiro ao tema, seduzir consiste
basicamente em convidar alguém a tomar parte do seu mundo. E este processo tem várias
facetas. A sedução dar-se-ia em vários planos: político, religioso, ideológico...mas o que vai
nos interessar neste trabalho é a sedução do ponto de vista da sexualidade. Assim sendo:
seduzir é fazer este convite para que alguém participe
momentaneamente do seu corpo. Consiste em um jogo cujos
elementos fundamentais são os signos: consistem eles em
transformar os desejos em sinais perceptíveis que os
denunciem. Estes sinais variam e vão desde palavras até os
gestos mais sutis, passando pelos olhares, toques e atitudes.
(BAUDRILLARD, 2001, p. 167).
O autor lembra ainda que a sedução jamais é natural, da ordem da natureza. Consiste
sempre em artifícios que parecem seguir a ordem do signo e do ritual.
Outro conceito que permeia a noção de erotismo, sendo-lhe porém completamente
diverso é o da pornografia. Parece-nos que pornografia consista na descrição pura e simples
dos prazeres carnais. Já o erotismo constitui esta mesma descrição, mas revalorizada em
função de uma idéia do amor ou da vida social, portanto, com outro foco. Uma das distinções
mais corriqueiras que se faz entre os dois fenômenos consiste em enfatizar o teor “nobre” e
“grandioso” do erotismo em oposição ao caráter “grosseiro”, “sujo” e “vulgar” da
pornografia. Inevitável não citar novamente Baudrillard, para quem o erotismo não se vincula
65
diretamente à sexualidade, enquanto a pornografia exibe e explora incansavelmente este
aspecto:
O pornô (...) acrescenta uma dimensão ao espaço do sexo. Ele
o faz mais real que o real, o que causa sua ausência de
sedução. Talvez o pornô não seja mais que uma alegoria, isto
é, um forçamento de signos, um empreendimento barroco de
sobre-significação beirando o grotesco (...) exagerando o
pitoresco dos detalhes anatômicos, num plano onde reina a
alucinação do detalhe (BAUDRILLARD, 2001, p. 37)
Já Lúcia Castello Branco (1984, p.50) relaciona estes conceitos com a indústria
cultural. Para ela “ao contrário do erotismo, que corresponde a uma modalidade não-
utilitária de prazer porque propõe a satisfação e o gozo como fins em si, a pornografia
estaria sempre vinculada a outros objetivos. Nela o prazer depende do pacto com a ideologia
que a mesma veicula”.
Em História da Literatura Erótica, Alexandrian afirma que o erotismo é um
fenômeno poderoso, subversivo, na medida em que caminha em direção à reunião dos seres,
à sua imersão na origem e à sua reintegração na ordem natural do universo. A pornografia, ao
contrário, insiste sempre na mutilação dos seres, no gozo parcial, superficial e solitário, além
de veicular valores que ao invés de subverter a ordem, procuram preservá-la e até enobrecê-la.
O autor estabelece também um comparativo com a noção de obscenidade, que ressaltamos, a
título de curiosidade:
considera-se que o erotismo é tudo o que torna a carne
desejável, tudo o que a mostra em seu brilho ou em seu
desabrochar, tudo o que desperta uma impressão de saúde,
beleza, de jogo deleitável; enquanto a obscenidade rebaixa a
carne, associa a ela à sujeira, às doenças, às brincadeiras
escatológicas e às palavras imundas. (ALEXANDRIAN,
1983, p. 08).
Diante de todo o exposto, nesta análise considerar-se-ão passagens de erotismo em
relação às personagens femininas as ocorrências no livro e na produção televisiva que
66
contenham manifestações, seja de natureza explícita e/ou velada, que remetam à noção de
desejo e sensualidade, ligadas direta ou indiretamente às quatro personagens, nas quais elas
ajam diretamente ou não. Procuramos selecionar todos os sinais e signos perceptíveis de
erotismo, que explicitem a intenção de sedução ou a sedução propriamente dita.
2.1 O EROTISMO NO ROMANCE
2.1.1 Maria Monforte
Apesar de ter importância fundamental na narrativa, a personagem Maria Monforte é
curta e aparece somente em 23 das 694 páginas do livro, seja de modo direto ou referido.
Os primeiros contatos com Pedro da Maia, por exemplo, são contados pelo narrador em
terceira pessoa. O autor também não entra em detalhes a respeito de seus encontros
furtivos com o amante italiano, tampouco descreve como se deu o episódio da fuga para
Viena. Procura detalhar sim, enquanto obra típica do Realismo, aspectos em torno de sua
beleza, suas toillettes, seu gosto em exibir-se em eventos sociais, (dentro e fora de casa) e
sua ânsia, a partir do casamento, de ser aceita e aprovada pela sociedade lisboeta,
sobretudo pelo sogro fidalgo. Além disso, também relata seu destino após a morte de
Pedro da Maia.
Notamos que apenas em uma passagem do livro encontram-se “pistas” de erotismo
em relação à personagem, passagem específica que também foi aproveitada na TV, como
veremos mais adiante. O fragmento não sugere uma cena “picante”, tampouco tem
conotação explicitamente sensual. Apenas deixa “rastros” sutis da descrição de uma
carícia, em um rápido episódio da vida íntima entre marido e mulher.
Aparição Localização/Contexto do
fragmento
Conteúdo do fragmento classificado na
categoria Erotismo
1 Em uma das muitas
recepções da residência de
Arroios, Pedro se irrita
com os homens que dizem
“Maria sabia perceber bem na face do marido
‘estas nuvens’. Corria para ele, tomava-lhe ambas
as mãos, com força, com domínio.
- Que tens tu meu amor? Estás amuado!
- Não, não estou amuado...
- Olha então para mim!
Colava o seu belo seio contra o peito dele; as suas
67
gracejos e dançam com
sua mulher.
mãos corriam-lhe os braços numa carícia lenta e
quente, dos pulsos aos ombros; depois, com um
lindo olhar, estendia-lhe os lábios. Pedro colhia
neles um longo beijo e ficava consolado de tudo”
(QUEIRÓS, 2000, p. 48)
2.1.2 Maria Eduarda
Podemos afirmar que, o erotismo em relação a mais importante personagem feminina
da obra parece percorrer uma curva ascendente ao longo da trama: se no início a presença
é latente, sutil, quase lírica, ao evoluir da narrativa, entretanto, torna-se mais explícito. A
afeição entre Maria Eduarda e Carlos da Maia torna-se cada vez menos espiritual e mais
carnal. É o que se depreende da evolução dos fragmentos abaixo. Em nossa análise da
freqüência de menções ao erotismo em relação à Maria Eduarda, detectamos 5 (cinco)
ocorrências.
No início, o erotismo é subjacente. Para manifestá-lo, o autor lança mão de
insinuações e simbolismos. No primeiro fragmento, por exemplo, Eça insinua um
encontro sexual entre os dois amantes, contando que, após percorrerem os cômodos da
casa que alugaram para mais reservadamente viverem, a alguns minutos do centro de
Lisboa, a quinta dos Olivais, os dois entraram no quarto quente (o autor usa a palavra
alcova, sinônimo de quarto de dormir, esconderijo) e dourado, e que a casa mergulhou no
silêncio entre as árvores, pois não havia mais ninguém na quinta naquela tarde de verão.
Para deixar subentendido que, após ficarem a sós, pela primeira vez os dois personagens
dormiram juntos, o autor usa o conhecido artifício narrativo de encerrar um período com
reticências, como forma de sugerir uma idéia, semcontudo pormenoriza-la.
Já o simbolismo está na descrição dos personagens passando pelos cômodos da casa,
encontrando, por exemplo, tapeçarias que retratavam Marte e Vênus no bosque, que
conforme lembra Thomas Bulfinch, tratam-se de divindades da mitologia romana que
eram amantes - uma provável alusão ao encontro amoroso que teriam os irmãos Carlos
Eduardo e Maria Eduarda ali na casa, também em meio a um bosque. E ainda, está no
quadro reproduzindo a morte de S. João Batista, decapitado a pedido de Salomé por
Herodes,
68
segundo o relato bíblico3
, um episódio marcado por erotismo e ocorrência de sexo entre
familiares, o que aliás, também estava por acontecer na trama queirosiana. Suely Fadul,
em artigo sobre objetos-personagens em Os Maias, lembra que, ao encobrir o quadro,
Carlos da Maia ali também, metaforicamente, tratava de ocultar os objetos anunciadores
da tragédia. Aliás, para a autora, a tela de João Batista tem uma função específica:
“funciona como elemento premonitório, pois tendo João Batista
morrido por condenar a imoralidade a profanação dos amores
incestuosos, novamente aparece para condenar e, simbolicamente,
pressagiar a culpa trágica de Carlos Eduardo e Maria Eduarda, que
se consumará pelo incesto involuntário entre irmãos” (FLORY, 2003,
p. 290)
O ápice da curva do erotismo acontece na última passagem, na descrição do
sentimento de culpa de Carlos quando este, mesmo ciente da consangüinidade que o unia
a Maria Eduarda, ainda assim continua a manter com ela encontros sexuais, por mais de
uma vez. Há uma mescla de uma forte carga erótica com doses de reprovação moral dos
fatos, quando Eça, diante da conduta reprovável do protagonista, descreve seu sentimento
de culpa e seus dilemas de consciência. Os termos utilizados pelo autor neste momento
remetem à animalidade do gesto: “bárbara”, “animal”, “fera”, “ciosa”, “juba”, “bestial”.
A amada já não possuía mais seios, mas “peitos túmidos de seiva”.
Aliás, o caráter desta relação “selvagem” e fora dos padrões da sociedade já era
prenunciado pelo “apelido” dado à casa onde davam-se os encontros: “toca”, que em
nosso vernáculo designa “buraco na terra, na pedra, onde se abrigam animais, abrigo,
refúgio” (FERREIRA, 1993, p.596). Para Suely Fadul, tal expressão conotava “uma
realidade pressentida: a animalidade da relação incestuosa que ali se consumará”
(FLORY, 2003, p.289).
_______________________________
3
- Segundo o relato da Bíblia, (Mateus, Capítulo 14, versículos 3-12), por ter condenado publicamente o fato de Herodes, então
governante da Galiléia, ser amante da própria cunhada, Herodíades, João Batista foi preso. Salomé, sobrinha e enteada do governante,
em uma festa de aniversário, dançou de forma tão sensual que Herodes lhe prometeu o presente que quisesse. A mãe, desejosa de
vingança, influenciou a filha, que pediu a cabeça de João Batista em uma bandeja.
69
Aparição
Localização/Contexto do
fragmento
Conteúdo do fragmento classificado na
categoria Erotismo
1
Alugada a quinta de Craft, Carlos
leva Maria Eduarda a caminhar
pelos cômodos da casa dos
Olivais. Andam pelo salão,
banheiros, de tapeçarias, quando
vêem Marte e Vênus se amando
nos bosques até chegarem ao
quarto, onde vêm um quadro de
João Batista decapitado.
“Penetravam na alcova, quente e cor de ouro. Carlos ao
passar desprendeu as cortinas do arco da capela, feitas
de uma seda leve que coava para dentro de uma
claridade loura (...)
-Aquela horrível cabeça ! – murmurou ela.
Carlos arrancou a cobertura do leito, escondeu a tela
sinistra. E então todo o rumor se extinguiu, a solitária
casa ficou adormecida entre as árvores, numa demorada
sesta, sob a calma de julho...(QUEIRÓS, 2000, p. 426).
2
Maria Eduarda já mora nos
Olivais com a filha, a
preceptora inglesa e os demais
criados. Carlos lhe visitava
todas as manhãs. Na frente da
criadagem, ela bordava e ele
lia.
“Mas bordado e livro caíam logo no chão – e os
seus lábios, os seus braços uniam-se
arrebatadamente. Ela escorregava sobre o divã;
Carlos ajoelhava numa almofada, trêmulo,
impaciente” (...) e ali ficava, abraçado à sua
cintura, balbuciando mil cousas pueris e ardentes,
por entre longos beijos que os deixavam frouxos,
com os olhos cerrados, numa doçura de desmaio”
(QUEIRÓS, 2000, p. 443).
3
Carlos aproveita a ausência do
avô, em viagem à quinta de
Santa Olávia, no Porto, para
passar a primeira noite com
Maria Eduarda nos Olivais.
“Um trovão rolou lento e surdo. Mas Maria já não o
ouviu, caída nos braços de Carlos. Nunca o desejara,
nunca o adorara tanto! Os seus beijos ansiosos pareciam
tender mais longe que a carne, trespassá-lo, querer
sorver-lhe a vontade e a alma; e toda noite, entre esses
brocados radiantes, com os cabelos soltos, divina em sua
nudez, ela lhe apareceu realmente como a deusa que ele
sempre imaginara, que o arrebatava enfim, apertado ao
seu seio imortal, e com ele pairava numa celebração de
amor muito alto, sobre nuvens de ouro” (QUEIRÓS,
2000, p. 446)
4
Carlos descobre que Maria
Eduarda é sua irmã. Apesar da
revelação dos laços de
consangüinidade e ele
procurá-la para fazer-lhe a
Ele tenteava, procurando na brancura da roupa;
encontrou um joelho a que percebia a forma e o calor
suave através da seda leve; e ali esqueceu a mão aberta e
frouxa, num entorpecimento onde toda a vontade e
consciência se lhe fundiam deixando-lhe apenas a
sensação daquela pele quente e macia, onde a sua palma
pousava. (...) sem resistência como um corpo morto ele
70
revelação, o protagonista não
consegue; se entrega à paixão
e mantém relações sexuais
com a irmã.
caiu-lhe sobre o seio. Os seus lábios secos acharam-se
colados num beijo aberto que os umedecia. E de repente,
Carlos enlaçou-a furiosamente, esmagando-a e sugando-
a, numa paixão e num desespero que fez tremer todo o
leito” (QUEIRÓS, 2000, p.638)
5
Ainda atormentado com a
revelação, Carlos não tem
coragem de revelar a verdade
à Maria Eduarda. Pela segunda
vez tem relações carnais com a
irmã. Mas desta vez a culpa
reflete-se na repugnância
física. O fragmento refere-se
ao drama de consciência que o
aflige, minutos depois do ato.
“Fora primeiramente aquele aroma que a envolvia,
flutuava entre os cortinados, lhe ficava a ele na pele e no
fato, o excitava tanto outrora, o impacientava tanto agora
(...) Fora depois aquele corpo dela, adorado sempre
como um mármore ideal, que de repente lhe aparecera,
como era na sua realidade, forte demais, musculoso, de
grossos membros de amazona bárbara, com todas as
belezas copiosas do animal de prazer. Nos seus cabelos
de um lustre tão macio, sentia agora inesperadamente
uma rudeza de juba. Os seus movimentos na cama, ainda
nessa noite, o tinham assustado como se fossem os de
uma fera, lenta, ciosa, que se estirava para o
devorar...Quando os seus braços o enlaçavam, o
esmagavam contra os seus rijos peitos túmidos de seiva,
ainda de certo lhe punham nas veias uma chama que era
toda bestial” (QUEIRÓS, 2000, p. 645)
2.1.3 Condessa de Gouvarinho
Em se tratando da personagem descrita como a amante balzaquiana, carente e
inconveniente de Carlos da Maia, encontramos 3 (três) menções na categoria em
questão.
Notamos que a intenção do autor em ressaltar este aspecto da personagem fica
patente quando utilizou determinadas palavras para descrever a impressão que tinha
Carlos da Maia a respeito dela. São adjetivos e verbos que remetem à sensualidade, ao
apelo sensorial em geral: “picante”, “cetim das formas”, “avermelhados”, “quentes”, “
aroma”, “ despia”, “ calor”, “seio arfando” etc.
Note-se que em todas as passagens não há diálogos, mas reflexões internas do
protagonista acerca da personagem em questão. Assim, o leitor toma contato com o
erotismo que cercava a Condessa apenas por meio das reflexões de Carlos da Maia.
O último fragmento, por exemplo, relata um encontro furtivo entre os amantes, a
bordo de uma carruagem, durante o percurso na estrada de Queluz. No livro, jamais se
descreve o que se passa dentro dela. O narrador limitou-se a descrever os fatos após o
71
término do passeio. Tudo é dito nas entrelinhas, dando ao leitor a capacidade de ver com
os olhos da imaginação aquilo que ele mesmo não mostra. O interior é revelado pelo
exterior, em conformidade com típico ditame da estética do Realismo.
Teria Eça inspirado-se em Flaubert ? É o que parece, pois passagem semelhante está
presente também na obra do autor francês, Madame Bovary, publicado em 1857, no qual
narra-se o encontro de Emma com o amante León, também a bordo de um fiacre. Emma,
tal como a Condessa, era infeliz no casamento e buscava no adultério a válvula de escape
para sua existência entediada de esposa de médico do interior. A exemplo do que fez o
Cinema4
ao adaptar a obra de Gustave Flaubert, também a TV, na adaptação de Os Maias,
aproveitou tal passagem, mas fazendo-lhe outra leitura, conforme se verá mais adiante.
Fiquemos com os fragmentos do livro:
Aparição Localização/Contexto do
fragmento
Conteúdo do fragmento classificado na
categoria Erotismo
1
Depois de ser apresentada a
Carlos na ópera, a Condessa,
a pretexto de levar o filho
para consultar o médico
sobre suposta doença,
resolver visitar o médico.
Carlos reflete sobre a mulher
que acabara de sair do
consultório.
“Havia ali uma pontinha de romantismo, muito
irregular e picante...E devia ser deliciosamente
bem feita. A sua imaginação despia-a, enrolava-
se-lhe no cetim das formas, onde sentia ao
mesmo tempo alguma cousa de maduro e de
virginal. E outra vez como nas primeiras noites
que os vira em S. Carlos, aqueles cabelos
tentavam-no, assim avermelhados, tão crespos e
quentes” ... (QUEIRÓS, 2000, p.210)
_____________
4
- O livro Madame Bovary foi adaptada quatro vezes para o cinema: pelo diretor americano Vincent Minelli, pelo indiano Ketan
Metha, e pelos franceses Claude Chabrol e Jean Renoir, estas últimas realizadas em 1934 e 1992, respectivamente. IN Muller Jr,
Adalberto. Cinema, Tradução Infidelidade: os casos de Madame Bovary. Revista Sessões do Imaginário, n.º 11. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 1994, P. 52-57.
72
2
Carlos visita a casa dos conde
de Gouvarinho. A Condessa
encontra-se sozinha em casa.
“...sentia o seu aroma de verbena, o calor que subia do
seu seio arfando com força (...) Insensivelmente,
irresistivelmente, Carlos achou-se com os lábios nos
lábios dela. A seda do vestido roçava-lhe, com um fino
ruge-ruge entre os braços- e ela pendia para trás a
cabeça, branca como uma cera, com as pálpebras
docemente cerradas. Ele deu um passo, tendo-a assim
enlaçada, e como morta; o seu joelho encontrou um sofá
baixo, que rolou e fugiu ainda, até que se esbarrou
contra o pedestal onde o senhor conde erguia a fronte
inspirada. E um longo suspiro morreu, num rumor de
saias amarrotadas” (QUEIRÓS, 2000, p. 292)
3
Primeiro encontro
clandestino entre Carlos e a
Condessa, no qual acontece
o adultério, a bordo de uma
carruagem simples, um
“calhambeque duro”, nas
palavras do autor.
“... por uma tarde quente, com um céu triste de
trovoada e no momento em que estavam caindo
algumas gotas grossas de chuva – Carlos apeava-se
de um coupé de praça, que viera parar, devagar, à
esquina da Patriarcal, com os estores vede
misteriosamente corridos. Dous sujeitos que
passavam, sorriram-se, como se o vissem escoar-se
desajeitadamente de uma portinha suspeita. E com
efeito a velha traquitana de rodas amarelas acabava
de ser uma alcova de amor, perfumada de verbena,
durante as duas horas que Carlos rolava dentro
dela, pela estrada de Queluz, com a senhora
Condessa de Gouvarinho. (QUEIRÓS, 2003, p.295)
2.1.4 Raquel Cohen
Conforme já se disse anteriormente, a mulher de banqueiro Raquel Cohen é a
personagem silenciosa do romance, não tendo direito a falas nem a quaisquer expressões.
Diante disso, é natural que as menções ao erotismo em relação a ela também sejam
reduzidas. Em todo o livro, contabiliza-se apenas um fragmento no qual isso acontece,
reproduzido abaixo.
Nela o erotismo está presente na por meio das opiniões masculinas acerca da
personagem. Sempre a ela se referem como se estivessem descrevendo um objeto, algo
inanimado, cuja serventia é saciar o desejo, uma necessidade física, mais precisamente a
73
fome. Literalmente lhe são atribuídas qualidades que dizem respeito à carne: “deliciosa”,
“apetitosa”, “carnezinha faisandée”.
Aparição Localização/Contexto do
fragmento
Conteúdo do fragmento classificado na categoria
Erotismo
1 Primeira descrição de Raquel
Cohen, mulher casada com o
banqueiro Jacó Cohen e que
era amante de João da Ega
“Entre os amigos, no Ramalhete, sobretudo na frisa,
discutia-se às vezes Raquel, e as opiniões
discordavam. Taveira achava-a deliciosa! E dizia-o
rilhando o dente; ao marquês não deixava de
aparecer apetitosa, para uma vez, aquela
carnezinha faisandée de mulher de trinta anos”
(QUEIRÓS, 2000, p.135)
2.2 - O EROTISMO NA MINISSÉRIE
2.2.1 Maria Monforte
Se na obra de partida ela tem participação quase fugaz na trama, na minissérie, ao
contrário, seu destaque e ênfase foram quantitativamente maiores, especialmente na categoria
aqui sob análise: na TV foram 9 (nove) menções a mais. Provavelmente, por tratar-se de uma
personagem complexa, cujo caráter parece modificar-se conforme a trama desenvolve-se5
, a
roteirista optou por dar-lhe maior exposição, seja encenando trechos que no livro são
rapidamente descritos ou sugeridos, seja criando livremente novas situações envolvendo-a.
Um exemplo é sua primeira aparição, (inexistente no livro, aliás6
) que já surge
marcada pelo erotismo: a cena da tourada, na qual aparece associada à carne, à cor vermelha e
ao sangue. Não por acaso quando perguntada por D. Diogo se gosta de touradas, sua resposta
e primeira fala na minissérie é : “Em Portugal há pouco sangue. Prefiro as espanholas”.
Note-se também que há erotismo na seqüência do piquenique em Sintra, no qual brinca com
___________________________
5
- Em nosso análise, no início da trama, Maria Monforte é uma jovem que acredita na força do amor e por ele luta. Uma vez casada, torna-
se uma esposa entediada e infiel. Depois de fugir com amante italiano e ficar arruinada, torna-se uma cortesã e uma mãe pouco zelosa.
6
- Em entrevista contida no DVD da minissérie, Maria Adelaide Amaral justificar a seqüência da Praça de Touros emOs Maias. Segundo a
autora, é habitual estratégia dos autores de televisão elaborar o primeiro capítulo de uma novela ou minissérie de forma a causar impacto,
captar a atenção dos telespectadores para o novo produto. Para isso, nada melhor que reproduzir um espetáculo tipicamente ibérico,
grandioso, e plasticamente atrativo. A roteirista conta que, durante o processo de gestação da minissérie, empreendeu uma série de pesquisas
em Portugal, e durante uma delas descobriu, em meio a vários escritos do autor português os planos de futuramente escrever um romance
que tivesse uma tourada como pano de fundo inicial.
74
as uvas na boca de Pedro da Maia, em uma espécie de convite para que, além da fruta,
também “experimente-a”. Aqui a metáfora do pecado – a maçã- fora trocada pelas uvas.
Figura 1- Cena do Piquenique em Sintra
Em outra seqüência, temos o devaneio do poeta Alencar, em uma das muitas recepções
em Arroios. É compreensível a opção da roteirista em conceber a cena em questão, na qual
Maria Monforte aparece ao poeta, que acabar de sorver uma taça de absinto, caracterizada a
partir de vestimentas gregas, representando ora as deusas Ártemis, ora Afrodite. Embora esta
passagem não exista na obra de partida, para caracterizar a beleza da personagem, a todo
momento, no livro Eça lança mão das comparações com divindades mitológicas: “que diabo!
Juno tinha sangue de assassino”; e ainda “ as suas formas de estátua davam-lhe o esplendor
de uma Ceres” (QUEIRÓS, 2000, pp. 36-37). Apesar de ser uma seqüência inexistente no
romance, não chega a constituir uma disjunção, visto que neste caso a TV parece comungar
com um projeto ideológico do autor.
Diante da beleza daquela aparição, o poeta Alencar ficara extasiado, como se estivesse
diante de uma obra de arte, uma escultura, um quadro. E na verdade, era o que realmente
apreciava. Ao transformar a personagem em Afrodite, a autora lançou mão da
intertextualidade ao reproduzir a obra “O nascimento de Vênus”, de Boticelli7
. Como se sabe,
nesta tela retrata-se o nascimento da deusa grega do amor a partir da espuma do mar.
________________________________
7-
A obra data de 1485 e foi pintada em têmpera sobre tela pelo fiorentino Sandro Botticelli, retratando no mar o nascimento da deusa
romana do amor
75
Nela a deusa aparece desnuda, branca, com fartos cabelos cacheados e soltos, e em
seu entorno, uma paisagem marinha, com abundância de conchas. Com exceção da nudez
completa, Maria Monforte na TV também aparece assim caracterizada. As conchas estão por
toda parte – desde as luzes no chão do palco até o papel da parede do palco onde se
apresenta. Nada mais natural que invocar uma obra de arte da Renascença para ilustrar os
sonhos de um poeta representante do Romantismo, estilo que louvava o retorno dos ideais
clássicos e humanistas.
Figura 2- Cena do sonho de Alencar
A intertextualidade também encontra-se presente em outra seqüência, que retrata o
primeiro e decisivo encontro adúltero com o italiano Tancredo. Depois de tê-lo primeiro como
hóspede depois do episódio da caçada na Tojeira e em seguida como convidado, Maria
apaixona-se e é correspondida. Depois de distribuir pães aos miseráveis nas ruas de Lisboa,
Tancredo tira-lhe o véu e beija-lhe a boca. A câmera foca o véu negro caindo no chão – uma
metáfora, já que com o véu caía também a máscara de fiel esposa da personagem.
Tem início a seqüência em que os dois amantes fazem sexo à vista dos mendigos e
cães sujos e doentes, sugerindo uma associação: assim como aqueles sobreviviam à margem
da sociedade, também a paixão entre Maria Monforte e o italiano era marginal, adúltera, fora
dos padrões sociais. Quando a câmera foca no cão, também insinua o desejo animal, que fica
patente na falta de pudor em fazer sexo na rua, de pé, com testemunhas.
76
Figura 3 – Cena do encontro adúltero na rua com Tancredo
É interessante observar ainda sobre esta cena que a mesma realiza um intertexto com o
filme A Rainha Margot8
, de Patrice Chéreau, (que aliás também é baseado em um romance de
Alexandre Dumas,) no qual Marguerite de Valois, a futura rainha da França, casada com
Henrique IV, mantém encontros sexuais com seu amante La Môlle, nas mesmas
circunstâncias, porém em meio às então fétidas ruas de Paris do século XVI.
Aparição Localização/Contexto da
Cena
Conteúdo da cena classificada na categoria
Erotismo
1
Tourada em Lisboa.
Primeira aparição da
personagem. Primeira vez que
Carlos da Maia sai de casa
desde a morte da mãe, dois
anos antes.
Na Praça de Touros, troca olhares lânguidos com
Pedro da Maia, que ficará fascinado por sua beleza. A
câmera detém-se generosamente no decote, nos seios
arfantes, na boca entreaberta, ao mesmo tempo em
que mostra o touro –símbolo de virilidade- atingido
por lanças, em uma possível alusão ao homem, no caso
Pedro, sendo atingido pela lança da paixão. Presença
maciça da cor vermelha na seqüência: o sangue do
animal ferido, os rubis que adornam o colo da
personagem, o manto do toureiro e a sombrinha
escarlate da personagem.
________________________________
8- O filme, uma co-produção alemã, francesa e italiana de 1994, retrata o jogo de influências nos bastidores da monarquia francesa em 1572.
Conta a história do casamento da católica Margot e do protestante Henrique Bourbon de Navarre, como forma de minimizar as disputas
religiosa no país, mas acaba servindo de estopim para um violento massacre de protestantes, conhecido como a “ noite de São Bartolomeu”,
no qual morreram mais de seis mil protestantes, que teve a conivência do rei da França, Carlos IX, irmão de Margot.
77
2
Concerto no Teatro de S.
Carlos. Embora Pedro da Maia
já tivesse se comunicado com
Maria por meio de flores e
bilhetes, entregues em sua
casa, será a primeira vez em
que se encontraram
pessoalmente. E que trocaram
as primeiras palavras.
A partir do parapeito de um dos camarotes, a câmera
foca em close um ramo de camélias vermelhas; na
seqüência, o decote generoso que mostra seios
brancos, respiração ofegante, boca, sorriso e ombros
nus da personagem. Boa dose de voyerismo, uma vez
que ambos vêm um ao outro (por meio de uma
luneta); o observador é observado e vice-versa.
3 Passeio em Sintra, no Castelo
de S. Jorge.
Personagem ora se esconde, ora se revela nas sombras
das ruínas do antigo palácio, com vista para floresta e
para o mar. Personagem foge e aparece, em jogo de
sedução com Pedro da Maia.
4 Piquenique em Sintra.
Primeiras informações sobre
as origens da personagem e de
seu pai.
Na residência alugada pelos Monforte no verão, Maria
provoca Pedro com um cacho de uvas, Convida-o
prová-las, ressaltando-lhes o doce sabor: uma sugestão
para que prove de seus beijos. Uma possível metáfora
à maçã, fruto proibido usado por Eva para tentar Adão
no paraíso. Trocam olhares de desejo, a respiração de
ambos é ofegante. Pedro responde, colocando frutas na
boca de Maria. Suas peles roçam uma na outra, a
câmera dá close nas duas bocas próximas, mas o beijo
não acontece.
5
Mesmo com a reprovação de
Afonso, os dois se casam e,
depois da lua de mel na Itália e
França, voltam a Portugal.
Maria está grávida.
A câmera mostra o casal na cama. A imagem não é
nítida; Por baixo dos lençóis, aparecem de longe os
torsos masculino e feminino nus.
6
Durante uma das recepções na
casa de Arroios, Maria
apresenta-se como atriz em um
palco especialmente preparado
para ocasião. O fundo do palco
é uma ilustração de uma
floresta.
Maria mostra-se, dançar, requebrando os quadris até o
chão. O poeta Alencar, que é apaixonado por Maria,
depois de beber uma dose de uma bebida verde
(absinto?) vê sua apresentação de maneira diferente
dos demais convidados. Primeiro, ela aparece a ele
com outras roupas, vestida como a deusa grega
Ártemis, a deusa da caça, munida de um arco. Depois,
78
com flores nos cabelos soltos e véus brancos, aparece
como a deusa do amor sensual, Afrodite. Tudo ao som
de flautas. Alencar fica extasiado.
7
Em outra recepção em
Arroios, Pedro se irrita com os
homens que dizem gracejos e
dançam com sua mulher;
retira-se para o quarto.
Ela seduz o marido. Enquanto ele chora, ela lambe-lhe
as lágrimas. Pernas, quadris, nádegas femininas; os
corpos rolam um por cima do outro na cama – mas a
câmera nada mostra de perto.
8
Na festa de batizado do
segundo filho, Maria conhece
Tancredo, o italiano ferido por
Pedro durante uma caçada.
Depois de a ter tirado para dançar, o italiano, cuja
beleza logo encanta-lhe, oferece-lhe um desenho e a
encara. Abraça e beija as mãos da pequena filha, Maria
Eduarda enquanto dirige olhares sedentos para a mãe.
9 Decidida a ser uma mulher
caridosa, Maria distribui pães
aos pobres e moradores de rua
de Lisboa. Tancredo aparece
para ajudá-la na tarefa.
Há um clima de sedução entre os dois. Tancredo se
aproxima, beija-a com volúpia. A câmera mostra o
véu negro que lhe cobria o rosto caindo sobre o chão;
Tancredo levanta-lhe a saia, a câmera foca a face de
um cão vira-lata. Fazem sexo de pé, encostados em
uma parede, na rua, em plena luz do dia. A câmera
mostra o olhar de um mendigo e a expressão de prazer
da personagem. Agora de costas, Tancredo rasga-lhe
as roupas, os seios aparecem nus. A música de fundo
lembra que “ninguém larga a grande roda”, ou seja, é
impossível fugir do destino.
10
Depois da morte de Tancredo
e do pai, Maria se entrega à
prostituição e aparece em um
bordel na França
Um homem nu deitado de costas em um divã
vermelho. Uma mulher passa um leque feito de penas
pelo corpo do rapaz, que se vira e agarra-a, beijando-a
na boca. É Maria Monforte, de cabelos lisos soltos,
extremamente maquiada e vestindo roupas de dormir.
2.2.2 Maria Eduarda
Na maior parte das 6 (seis) cenas detectadas na minissérie segundo esta categoria, o
erotismo está presente de maneira mais explícita e tais menções são maiores na TV que no
livro. Entretanto, é interessante notar-se que, embora esta personagem tenha papel de maior
79
destaque ao longo da trama que Maria Monforte, quando a categoria é erotismo,
quantitativamente esta protagoniza mais cenas na TV que Maria Eduarda.
Figuras 4 e 5, takes que retratam um dos encontros com Carlos Eduardo nos Olivais.
Assim como no livro, conforme já observamos no sub-capítulo anterior, a figura de
Maria Eduarda aos poucos vai abandonando o caráter de deusa intangível, para se corporificar
em mulher real, começando a integrar mais intensamente a trama. Outro ponto é que Maria
Eduarda é apresentada aos telespectadores (assim como aos leitores) enquanto esposa de
Castro Gomes, antes de apaixonar-se por Carlos Eduardo durante uma viagem a Portugal.
Dadas as peculiaridades do formato, a TV consegue evidenciar mais aspectos da vida íntima
da personagem com o suposto marido que o romance. Entretanto, todas as cenas de
intimidade entre ela e Carlos Gomes, quando sugerem sexo, não o fazem de maneira erótica,
80
pois não explicitam desejo e sim submissão ao homem, (categoria que analisaremos mais à
frente), já que Maria Eduarda era concubina do brasileiro, e a ele se unira
apenas por motivos financeiros, a fim de manter sua sobrevivência, da filha e da mãe9
. A
falta de erotismo, neste caso, parece ser indicativa de uma convivência sem prazer, por
obrigação, imposta pelas circunstâncias que envolviam a personagem.
Todas as seqüências aqui selecionadas procuram evidenciar o desejo enquanto
manifestação física, mas parecem sempre atreladas a um sentimento de amor puro, quase
sublime em relação a Carlos Eduardo. Exceção fica por conta da última cena, na qual Carlos
já ciente de sua condição de irmão de Maria Eduarda, ainda assim leva a cabo seu encontro
sexual com Maria Eduarda. Nesta passagem, a paixão perde sua conotação de pureza e ganha
dimensão de um sentimento puramente carnal e até animalesco, uma vez que agora o incesto é
voluntário por parte do protagonista. Em background surgem sons de tambores, que parecem
mesclados a gritos tribais, efeitos utilizados durante toda a sequência. Uma provável sugestão
de que acontecia ali uma prática selvagem, pouco civilizada, quase tribal.
Figura 6: Mesmo já ciente do incesto, Carlos faz sexo com a irmã. E é assolado pela culpa.
Também as cores utilizadas nas roupas de cama, (o vermelho da colcha e o negro dos
lençóis), simbolicamente, dão a medida de como naquele momento a paixão mesclava-se à
impureza, à podridão de uma relação condenável. O ritmo da cena é mais rápido, a
intensidade é maior. E os corpos nus, embora mais evidentes que nas demais seqüências,
aparecem envoltos em véu negro, rodeado por velas em candelabros, emprestando um ar
sinistro à cena.
___________________
9
- Na minissérie, diferente do livro, Maria Monforte ainda é viva, mas está com os dias contados. Tuberculosa, seu tratamento na Suíça é
pago por Castro Gomes, fato este que reiteradamente ele lembra à Maria Eduarda
81
Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria
Erotismo
1
Após a viagem de Castro Gomes
ao Brasil, Carlos da Maia, a
pretexto de saber da saúde da filha
de Maria Eduarda, Roseclair, que
havia curado dias antes, faz visita
à mãe e declara-se a ela.
Trata-se da primeira cena de beijo entre os
personagens. Cena ardorosa, Carlos toca a nuca,
única parte exposta do corpo da personagem.
Agarra-a pela cintura. As respirações são ofegantes.
2 Carlos faz uma visita Maria
Eduarda enquanto ela borda uma
talagarça.
É Maria Eduarda quem toma iniciativa de um longo
toque na face de Carlos. Acontece um longo beijo na
boca, cheio de desejo e ânsia, sem preocupação com
convenções sociais, uma vez ambos que se
encontram no corredor do prédio onde fora morar
depois da viagem de Castro Gomes ao Brasil. O
desejo do casal é crescente.
3
Carlos leva Maria Eduarda para
conhecer a casa que alugou de
Craft no campo, a Quinta dos
Olivais
Depois de entrar em vários cômodos da casa, Maria
Eduarda declara-se, apaixonada. Ambos despem-se
um ao outro. A luz é clara, há foco na pele branca da
personagem. A câmera faz um suave travelling,
passeia entre os dois, usa planos e contra-planos. De
longe aparece o bico do seio da personagem, sua
expressão de prazer na cama, respiração ofegante.
Há insinuação do ato sexual, mostra-se Carlos por
cima da personagem. Ambos aparecem nus somente
de longe, sob véus transparentes. A música é suave.
4
Após Castro Gomes ter revelado a
Carlos que não era casado com Maria
Eduarda e que Rosiclair não era sua
filha, Carlos vai até os Olivais.
Encontra Maria e com ela discute por
ela ter lhe escondido a verdade. Ela
pede perdão por ter escondido seu
passado, mas Carlos não se convence.
Os amantes decidem romper. Carlos
retira-se, deixando Maria Eduarda em
cena sozinha, chorando.
Desesperada, Maria chora pela perda. Corre para o
espelho e acaricia-o. Na verdade, está tão abalada
pelo rompimento que não consegue ver seu próprio
reflexo, apenas a imagem do seu amado. Beija-lhe a
boca, chama-o pelo nome. Cena de forte simbolismo
– o que aparecia ali era seu desejo de manter sua
“cara- metade” ao seu lado, o que parecia então
impossível.
82
5
Perturbado por não esquecer Maria
Eduarda e arrependido da briga,
Carlos volta aos Olivais, disposto
a fazer as pazes. E a pede a em
casamento
No quarto de Maria Eduarda os dois se reconciliam.
A câmera mostra Carlos beijando joelhos e pernas
nuas da personagem, deitada. Levanta-le a saia. Há
um corte e um close para o rosto da mulher, com
expressão de prazer. A seqüência, que conta com o
narrador em off descrevendo a cena, “nunca a
desejara tanto” termina com a personagem
dormindo seminua, com os cabelos soltos, “divina
em sua nudez”, seguindo exatamente o conteúdo do
livro à página 446.
6
Carlos acaba de saber que é irmão
de Maria Eduarda e dirige-se à
casa da amante para fazer-lhe a
revelação, que impede a
continuação do romance.
Encontra-a em seu quarto, deitada
na cama. E mesmo ciente do
parentesco, não consegue resistir à
paixão
Trata-se da seqüência de maior e mais explícita
carga erótica em relação à personagem. Ao som de
tambores, a câmera mostra um casal fazendo sexo
na cama, de maneira mais próxima e desta vez mais
nítida. Aparecem o contorno dos seios, nádegas e a
púbis da personagem, que aparece completamente
nua de costas. Ao contrário das outras cenas, a
mulher aparece mais ativa no ato, dando prazer ao
homem. Diferente das outras cenas, aqui não há
suavidade mas certa animalidade no ato, em
harmonia com a passagem equivalente do romance.
A roupa de cama é em tons escuros, a luz utilizada é
sombria.
2.2.3 Condessa de Gouvarinho
Nota-se que em relação a esta personagem, o erotismo ressaltado na minissérie, com 5
(cinco) menções, duas a mais que no romance. Entretanto, mesmo sendo personagem
secundária, parece-nos que Eça de Queirós, já no século XIX, fazia pairar sobre Teresa
Thompson uma nuvem de erotismo, embora naturalmente mais velada que a veiculada na
minissérie. Como já dito anteriormente, é próprio da linguagem televisiva evidenciar por
imagens aquilo que no suporte escrito é apenas insinuado. Exemplo deste caráter mais
explícito das cenas são as passagens dos encontros furtivos com Carlos da Maia, que
acontecem dentro do coupé e no consultório médico.
83
Ao que parece, na televisão foi ressaltado o caráter erótico da personagem, sempre
associada à necessidade de “desafogo” sexual de Carlos da Maia. É interessante notar
também que a iniciativa das abordagens e dos encontros com o personagem sempre partem da
Condessa, seja nas seqüências nas quais o erotismo é velado quanto naquelas em que é
explícito, uma atitude ousada e até mesmo condenável para uma mulher da alta sociedade da
época.
Figura 7: A Condessa seduz Carlos em seu consultório médico
Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria
Erotismo
2 Recepção na casa dos Gouvarinho,
à mesa, durante jantar, convidados
discutem sobre o adultério de
mulheres casadas
A personagem, com vestido decotado no busto, provoca
Carlos, roçando seus pés nas pernas do médico por baixo da
mesa, ao lado do marido.
3
Encontro furtivo entre a condessa e
o médico, dentro de uma
carruagem, em frente ao consultório
de Carlos, onde os amantes
marcaram o encontro.
Durante um passeio pela cidade, a condessa e o médico
fazem sexo dentro de um coupé, sem se importar com o
desconforto e sem tirar as roupas. Embora a condessa
declare-se e apaixonada, o médico apenas dá vazão ao
desejo físico, sem demonstrar envolvimento.
84
4
No consultório, condessa reclama
da escassez de encontros com o
amante. Carlos mescla irritação e
uma certa carência, por conta da
revelação da história de seus pais.
O médico agarra a condessa por trás, aperta-lhe os seios,
levanta-lhe a saia. E de roupa, faz sexo com a condessa, em
cima de uma mesa, de maneira rude e sem carinho, como
nítido desafogo de um mero desejo sexual.
5
Novamente no consultório,
Carlos já apaixonado por Maria
Eduarda, entretanto, continua
encontrando-se com a Condessa.
Rápida cena, novamente de roupa, de maneira rápida,
a condessa faz sexo com o amante; ele de olhos
fechados; o ato parecia ser um desafogo que o médico
mal podia esperar que chegasse ao fim.
2.2.3 Raquel Cohen
Ao contrário do que acontece no romance, no produto televisivo a personagem em
questão, embora seja secundária, tem maior participação na trama. Um exemplo são as 3 (três)
menções relativas ao erotismo referentes à judia mulher do diretor do Banco Nacional. Nelas
a personagem tem voz ativa, protagoniza diálogos e situações, ao contrário da passagem única
do livro, na qual o erotismo em torno da personagem fica patente por meio dos relatos
masculinos dos freqüentadores do Ramalhete.
Parece então que, à primeira vista , em relação a esta personagem, há uma aparente
disjunção entre romance e minissérie. De todas as personagens femininas, é Raquel Cohen a
única que, nas passagens com maior carga erótica, jamais está envolvida realmente com seu
amante, João da Ega.
Ao final de todas as seqüências, ela parece arrepender-se do adultério, afirmando
sempre que pretende preservar seu casamento, tratando-se então o romance com o jovem Ega
de um mero passatempo, um divertimento para uma esposa entediada. Mas, se refletirmos
que, ao ressaltar este aspecto a minissérie acaba reforçando o propósito do livro de Eça de
desnudar a sociedade portuguesa do século XIX – e hipocrisia nos casamento é apenas uma
de suas faces , então os conteúdos da televisão e livro guardam coerência entre si, estando
em conjunção.
Para dar a medida da relação proibida com João da Ega, os encontros dos amantes são
sempre são rápidos, fugidios e em locais ermos, como em um cemitério, local escolhido pela
própria personagem para tal. O adultério se dá entre cruzes, velas e túmulos da primeira vez,
dentro de uma cova em um mausoléu na segunda. Note-se que nesta última há um ar teatral,
85
quando os amantes parecem divertir-se ao encenar supostamente o encontro entre D. Pedro e
de Inês de Castro10
, já morta. Uma fantasia para tirar da mesmice a enfadonha vida de uma
mulher da alta sociedade lisboeta...
Figura 8: Raquel encontra-se com João da Ega dentro de uma tumba no cemitério,
simulando a história de D. Pedro e Inês de Castro.
Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria
Erotismo
1
No teatro S. Carlos, durante
concerto de ópera, enquanto
Jacó Cohen sai para tomar ar,
Raquel e João da Ega ficam
sozinhos no camarote.
Os amantes aproveitam a ausência do marido para
agarrarem-se, beijarem-se, atrás das cadeiras do
camarote. Há dose de voyerismo, já que a cena é
observada do outro lado do teatro, por meio de uma
luneta, por Taveira, amigo de João da Ega. A câmera
mostra tudo de longe. O telespectador vê a cena a
partir dos olhos do personagem.
_______________________________
10
- No século XIV, o então príncipe de Portugal, D. Pedro, apaixonou-se pela dama de companhia de sua mulher, a espanhola Inês de
Castro, que foi sua amante e mãe de quatro filhos seus. A nobreza, com medo de que Inês se tornasse rainha de Portugal quando D. Pedro
assumisse o trono de seu pai, D. Afonso IV, matou-a em 1355, enquanto o rei encontrava-se fora de Lisboa. Dois anos depois, ao ser
coroado rei de Portugal, D. Pedro vingou-se , matando os assassinos de Inês e mandando exumar a ossada de sua amada, coroando -a morta e
obrigando toda corte - sobretudo a nobreza e o clero, que haviam condenado seu romance - a ajoelharem-se diante do cadáver e a beijar-lhe
os ossos da mão.
86
2
Encontro furtivo entre Raquel e
João da Ega no cemitério,
durante o dia. O lugar é sugerido
pela personagem.
Simulando levar flores para um túmulo, vestida de
preto, com uma capa da mesma cor, como se estivesse
de luto, Raquel caminha entre os jazigos. É agarrada
por João da Ega, que a leva para dentro de um
mausoléu. Lá, à luz de velas nos candelabros, Ega tira
a roupa da personagem, que fica apenas de espartilho,
embora o espectador veja- a apenas da cintura para
cima. A câmera afasta-se e volta apenas para marcar a
o fim do encontro entre os amantes, quando a
personagem se diz arrependida do encontro.
3
Novo encontro entre a
personagem e seu amante, no
cemitério, desta vez à noite. A
escolha foi novamente da
personagem, que sugere encenar
a história de Inês de Castro.
No meio do cemitério, a câmera mostra de longe Ega
carregando um corpo aparentemente inerte, como se
estivesse morto. Há um corte e mostra-se o interior de
um mausoléu, preparado de tal forma que se tem a
sensação de estar acontecendo um velório – há velas,
cruzes e coroas de flores. A câmera nos mostra um
suposto cadáver de mulher em uma cova. João da Ega
entra em cena, se aproxima da cova: “Ah, minha Inês,
estás tão fria....e tão apetitosa!”. Há aí uma sugestão
de uma perversão sexual, a necrofilia. Pouco depois a
câmera nos mostra os amantes aos beijos dentro da
tumba.
CATEGORIA: EROTISMO
Personagens Menções no livro Menções na TV
Maria Monforte 01 10
Maria Eduarda 05 06
Condessa de Gouvarinho 03 05
Raquel Cohen 01 03
Total 10 24
87
EVOLUÇÃO DAS MENÇÕES À CATEGORIA EROTISMO NA
TRANSMUTAÇÃO DO LIVRO PARA A TV
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Menções no livro Menções na minissérie
Maria Monforte Maria Eduarda
Condessa de Gouvarinho Raquel Cohen
Ao levarmos em consideração que seja possível mensurar numericamente as menções
ao tema Erotismo no livro e na minissérie, constataremos que houve uma considerável
elevação de freqüência de repetição da categoria em relação às quatro personagens na
transmutação para a TV. No meio eletrônico ela foi 140% maior que no meio impresso.
Flagrante foi o incremento do caráter erótico da personagem Maria Monforte: a
repetição de seqüências com esta especificidade cresceu 900% na minissérie em comparação
com o livro. Pode-se dizer que a trajetória da personagem é marcada em um primeiro
momento pelo erotismo velado e referido até o casamento com Pedro da Maia; é a partir do
adultério que o erotismo fica mais explícito.
Raquel Cohen, mesmo tratando-se de uma personagem secundária, aparece como
segunda personagem mais erotizada na trama televisiva, experimentando acréscimo de 200%
das menções em relação ao romance. Já a Condessa de Gouvarinho teve incremento de
66,6%. O erotismo na minissérie em relação à Maria Eduarda, por sua vez, foi 20% superior
ao romance. Em princípio os números podem apontar para uma interpretação errônea,
segundo a qual a personagem teria então uma discreta carga de erotismo na TV, a menor
entre todas as personagens femininas. É importante lembrarmos que Maria Eduarda já no
romance é a personagem com maior carga quantitativamente erótica. O que a televisão fez foi
manter este caráter, focando a intensificação não do número de vezes em que o tema é citado,
mas cuidando para explicitar ao máximo o conteúdo destas seqüências.
Em relação às demais personagens, percebe-se que o incremento em relação à
categoria em questão esteve agregado ao aumento da própria frequência de aparição das
88
mesmas. A nuance erótica delas acompanhou sua participação na narrativa televisiva. Ou seja:
quanto maior a participação das personagens em questão na minissérie em relação ao livro,
mais freqüente também serão as suas respectivas referências ao erotismo.

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Erotismo exp religiosa

  • 1. 61 CAPÍTULO II - O EROTISMO Eros, invencível no combate, tu que consomes as riquezas (...) De ti nenhum dos imortais é capaz de fugir, Aquele que te possui, enlouquece. (Sófocles) Quantificar elementos de erotismo em relação às personagens femininas presentes no livro e na minissérie, procedendo o confronto e análise é o que faremos neste capítulo. Entretanto, algumas definições em torno desta categoria fazem-se necessárias previamente à consideração a respeito dos dados pesquisados. A começar pela origem do vocábulo, que remonta ao grego erotiko e ao latim eroticu, cujo significado repousa em “aquilo que se refere ao amor lúbrico, sensual, sexual” (FERREIRA, 1993, p.216). Segundo Bulfinch, (1999, p.110) a origem de Eros - que para os romanos era Cupido - remonta à mitologia grega, segundo a qual ele seria fruto da união entre Ares, deus da guerra e Afrodite, deusa da beleza e do amor. Nestas narrativas, ele é imaginado enquanto uma criança, um menino caprichoso e irreverente, dotado de asas, arco e flechas, que se diverte em atirar setas, com o fim de deixar os corações dos mortais e dos imortais completamente inflamados pelo amor. De acordo com o relato mitológico, Afrodite, com inveja da beleza de uma jovem, Psiquê (a Alma), que rivalizava com a sua, incumbe o filho de fazer a moça apaixonar-se pela criatura mais desprezível sobre a terra. Contudo, por acidente, Eros fere-se em suas próprias setas e acaba apaixonando-se por Psiquê. Descoberta a relação, Zeus, divindade suprema do Olimpo, considerado o pai dos deuses e dos homens, ordena que vivam separados e Psiquê passa a eternamente conviver com Tristeza e Inquietação, à espera de Eros. Ou seja: enquanto não encontra o amor, a alma vive incompleta, infeliz e inquieta. Em O que é o
  • 2. 62 Erotismo, Lúcia Castello Branco afirma que “o mito grego em suma nos diz que Eros é o deus que aproxima, mescla, une multiplica e varia as espécies” ( 1984, p. 40). Uma outra versão do mito está presente em O Banquete, de Platão. No banquete dos deuses em festejo ao nascimento de Afrodite, Poros (Recurso) deitou-se com Pênia (Pobreza), assim concebendo Eros, que, para o filósofo, não era um deus, mas um semideus. “E por ser filho o amor (Eros) do Recurso e da Pobreza, foi esta a condição em que ele ficou” (PLATÃO, 1972, p.40). Como Pobreza, está sempre carente do objeto amado; como Recurso, sempre sabe imaginar um meio de chegar aos seus objetivos. Nesta obra, Platão também relata a história entre Eros e Psiquê, mas sob outro viés, completando esta relação com a entrada da figura de Ágape, o amor espiritual, desinteressado, de doação, sem espera de recompensa. Platão defende que o verdadeiro amor consistiria na afeição elevada a um plano ideal, que transcenderia o contato físico, sem contudo excluí-lo. Este é o chamado “ideal platônico do amor”, comumente confundido com o amor inatingível e a afeição sem contato. Na mesma obra, Platão procura explicar a natureza da busca pelo amor, quando Aristófano discursa relatando que, no princípio dos tempos, todos os seres humanos eram dotados de dupla sexualidade1. Por castigo de Zeus, foram mutilados, separados e condenados a vagar pela terra, na ânsia do encontro com a metade perdida. Assim, a eterna missão de achar sua metade seria equivalente a encontrar a continuidade de si mesmo. É a partir desta visão mitológica acerca da bipartição dos homens é que se explica a essência do erotismo para muitos autores, como Georges Bataille. Em O Erotismo (p.15), o autor defende que este se articula em torno de movimentos opostos: a busca de continuidade dos seres humanos, a tentativa de permanência além de um momento fugaz versus o caráter mortal dos indivíduos, sua impossibilidade de superar a morte. Para Bataille, os indivíduos se lançariam nesta busca de permanência porque eles carregam consigo uma espécie de sentimento de isolamento, permeada por uma eterna nostalgia da sua metade, da continuidade perdida. __________________________ 1 - Segundo o mito platônico, os seres humanos com dupla sexualidade eram divididos em três gêneros: totalmente femininos, totalmente masculinos e os andróginos. A partir da bipartição ordenada pelo Olimpo, cada metade procuraria o seu complemento, estando explicada para os gregos assim a ocorrência da homossexualidade, comum na Antigüidade.
  • 3. 63 A idéia do erotismo enquanto simples evidência de desejo sexual é refutada por grande parte dos autores que se debruça sobre o tema. Para eles, embora haja correlação entre estas noções, o sexo constitui uma necessidade física, enquanto erotismo extrapola este conceito, consistindo em manifestação de desejos como um todo. Todos os animais possuiriam desejo sexual, entretanto erotismo seria exclusividade apenas da raça humana. Nas palavras de Rollo May: sexo pode ser definido de maneira adequada em termos fisiológicos. Eros, pelo contrário é a vivência das intenções e o significado do ato. Enquanto sexo é ritmo de estímulo e resposta, Eros é um estado do ser. A finalidade do sexo é gratificação e o alívio da tensão, enquanto Eros representa o desejo, a ânsia e a eterna procura de expansão. Sexo em suma é o tipo de relacionamento caracterizado pelo intumescimento dos órgãos (para o qual buscamos um alívio prazeroso) e o enchimento das gônadas (para o qual buscamos um alívio satisfatório). Mas Eros2 é o modo de relacionamento no qual não procuramos alívio e sim cultivo, procriação e formação de um mundo (MAY, 1979 p. 80). O que talvez o autor tenha pretendido explicitar é que o erotismo não se limita aos mecanismos da genitalidade do sexo, mas vai além, extrapola estas fronteiras Não se trata de simples atração do cio, mas da “sede” dos corpos por outros corpos. Nabor Nunes Filho, em Eroticamente Humano, lembra que é inerente ao ser humano desejar e, em uma abordagem ousada, sustenta que esta característica faz com que todos os homens sejam essencialmente eróticos, pois o erotismo seria a mola fundamental de nossos atos: _________________________________ 2- Aqui o autor refere-se ao deus do amor com letra maiúscula na verdade para referir-se ao erotismo
  • 4. 64 Antes de ser um animal racional, o homem é um ser desejante, constantemente sedento e quase sempre insatisfeito. Nada há no universo o que o preencha ou o complete(...) o que é causado pela perda de algo, cuja natureza o próprio homem desconhece, o que evoca a nostalgia de uma conjugação completa (NUNES FILHO, 1994, p. 18). Se o erotismo é um fenômeno natural, o que dizer da sedução? Se a noção de erotismo parece ser inseparável da natureza humana, coerente é o pensamento de Jean Baudrillard, segundo o qual os seres humanos também vivem constantemente empenhados no cativante jogo da sedução. Para o autor, que dedicou um livro inteiro ao tema, seduzir consiste basicamente em convidar alguém a tomar parte do seu mundo. E este processo tem várias facetas. A sedução dar-se-ia em vários planos: político, religioso, ideológico...mas o que vai nos interessar neste trabalho é a sedução do ponto de vista da sexualidade. Assim sendo: seduzir é fazer este convite para que alguém participe momentaneamente do seu corpo. Consiste em um jogo cujos elementos fundamentais são os signos: consistem eles em transformar os desejos em sinais perceptíveis que os denunciem. Estes sinais variam e vão desde palavras até os gestos mais sutis, passando pelos olhares, toques e atitudes. (BAUDRILLARD, 2001, p. 167). O autor lembra ainda que a sedução jamais é natural, da ordem da natureza. Consiste sempre em artifícios que parecem seguir a ordem do signo e do ritual. Outro conceito que permeia a noção de erotismo, sendo-lhe porém completamente diverso é o da pornografia. Parece-nos que pornografia consista na descrição pura e simples dos prazeres carnais. Já o erotismo constitui esta mesma descrição, mas revalorizada em função de uma idéia do amor ou da vida social, portanto, com outro foco. Uma das distinções mais corriqueiras que se faz entre os dois fenômenos consiste em enfatizar o teor “nobre” e “grandioso” do erotismo em oposição ao caráter “grosseiro”, “sujo” e “vulgar” da pornografia. Inevitável não citar novamente Baudrillard, para quem o erotismo não se vincula
  • 5. 65 diretamente à sexualidade, enquanto a pornografia exibe e explora incansavelmente este aspecto: O pornô (...) acrescenta uma dimensão ao espaço do sexo. Ele o faz mais real que o real, o que causa sua ausência de sedução. Talvez o pornô não seja mais que uma alegoria, isto é, um forçamento de signos, um empreendimento barroco de sobre-significação beirando o grotesco (...) exagerando o pitoresco dos detalhes anatômicos, num plano onde reina a alucinação do detalhe (BAUDRILLARD, 2001, p. 37) Já Lúcia Castello Branco (1984, p.50) relaciona estes conceitos com a indústria cultural. Para ela “ao contrário do erotismo, que corresponde a uma modalidade não- utilitária de prazer porque propõe a satisfação e o gozo como fins em si, a pornografia estaria sempre vinculada a outros objetivos. Nela o prazer depende do pacto com a ideologia que a mesma veicula”. Em História da Literatura Erótica, Alexandrian afirma que o erotismo é um fenômeno poderoso, subversivo, na medida em que caminha em direção à reunião dos seres, à sua imersão na origem e à sua reintegração na ordem natural do universo. A pornografia, ao contrário, insiste sempre na mutilação dos seres, no gozo parcial, superficial e solitário, além de veicular valores que ao invés de subverter a ordem, procuram preservá-la e até enobrecê-la. O autor estabelece também um comparativo com a noção de obscenidade, que ressaltamos, a título de curiosidade: considera-se que o erotismo é tudo o que torna a carne desejável, tudo o que a mostra em seu brilho ou em seu desabrochar, tudo o que desperta uma impressão de saúde, beleza, de jogo deleitável; enquanto a obscenidade rebaixa a carne, associa a ela à sujeira, às doenças, às brincadeiras escatológicas e às palavras imundas. (ALEXANDRIAN, 1983, p. 08). Diante de todo o exposto, nesta análise considerar-se-ão passagens de erotismo em relação às personagens femininas as ocorrências no livro e na produção televisiva que
  • 6. 66 contenham manifestações, seja de natureza explícita e/ou velada, que remetam à noção de desejo e sensualidade, ligadas direta ou indiretamente às quatro personagens, nas quais elas ajam diretamente ou não. Procuramos selecionar todos os sinais e signos perceptíveis de erotismo, que explicitem a intenção de sedução ou a sedução propriamente dita. 2.1 O EROTISMO NO ROMANCE 2.1.1 Maria Monforte Apesar de ter importância fundamental na narrativa, a personagem Maria Monforte é curta e aparece somente em 23 das 694 páginas do livro, seja de modo direto ou referido. Os primeiros contatos com Pedro da Maia, por exemplo, são contados pelo narrador em terceira pessoa. O autor também não entra em detalhes a respeito de seus encontros furtivos com o amante italiano, tampouco descreve como se deu o episódio da fuga para Viena. Procura detalhar sim, enquanto obra típica do Realismo, aspectos em torno de sua beleza, suas toillettes, seu gosto em exibir-se em eventos sociais, (dentro e fora de casa) e sua ânsia, a partir do casamento, de ser aceita e aprovada pela sociedade lisboeta, sobretudo pelo sogro fidalgo. Além disso, também relata seu destino após a morte de Pedro da Maia. Notamos que apenas em uma passagem do livro encontram-se “pistas” de erotismo em relação à personagem, passagem específica que também foi aproveitada na TV, como veremos mais adiante. O fragmento não sugere uma cena “picante”, tampouco tem conotação explicitamente sensual. Apenas deixa “rastros” sutis da descrição de uma carícia, em um rápido episódio da vida íntima entre marido e mulher. Aparição Localização/Contexto do fragmento Conteúdo do fragmento classificado na categoria Erotismo 1 Em uma das muitas recepções da residência de Arroios, Pedro se irrita com os homens que dizem “Maria sabia perceber bem na face do marido ‘estas nuvens’. Corria para ele, tomava-lhe ambas as mãos, com força, com domínio. - Que tens tu meu amor? Estás amuado! - Não, não estou amuado... - Olha então para mim! Colava o seu belo seio contra o peito dele; as suas
  • 7. 67 gracejos e dançam com sua mulher. mãos corriam-lhe os braços numa carícia lenta e quente, dos pulsos aos ombros; depois, com um lindo olhar, estendia-lhe os lábios. Pedro colhia neles um longo beijo e ficava consolado de tudo” (QUEIRÓS, 2000, p. 48) 2.1.2 Maria Eduarda Podemos afirmar que, o erotismo em relação a mais importante personagem feminina da obra parece percorrer uma curva ascendente ao longo da trama: se no início a presença é latente, sutil, quase lírica, ao evoluir da narrativa, entretanto, torna-se mais explícito. A afeição entre Maria Eduarda e Carlos da Maia torna-se cada vez menos espiritual e mais carnal. É o que se depreende da evolução dos fragmentos abaixo. Em nossa análise da freqüência de menções ao erotismo em relação à Maria Eduarda, detectamos 5 (cinco) ocorrências. No início, o erotismo é subjacente. Para manifestá-lo, o autor lança mão de insinuações e simbolismos. No primeiro fragmento, por exemplo, Eça insinua um encontro sexual entre os dois amantes, contando que, após percorrerem os cômodos da casa que alugaram para mais reservadamente viverem, a alguns minutos do centro de Lisboa, a quinta dos Olivais, os dois entraram no quarto quente (o autor usa a palavra alcova, sinônimo de quarto de dormir, esconderijo) e dourado, e que a casa mergulhou no silêncio entre as árvores, pois não havia mais ninguém na quinta naquela tarde de verão. Para deixar subentendido que, após ficarem a sós, pela primeira vez os dois personagens dormiram juntos, o autor usa o conhecido artifício narrativo de encerrar um período com reticências, como forma de sugerir uma idéia, semcontudo pormenoriza-la. Já o simbolismo está na descrição dos personagens passando pelos cômodos da casa, encontrando, por exemplo, tapeçarias que retratavam Marte e Vênus no bosque, que conforme lembra Thomas Bulfinch, tratam-se de divindades da mitologia romana que eram amantes - uma provável alusão ao encontro amoroso que teriam os irmãos Carlos Eduardo e Maria Eduarda ali na casa, também em meio a um bosque. E ainda, está no quadro reproduzindo a morte de S. João Batista, decapitado a pedido de Salomé por Herodes,
  • 8. 68 segundo o relato bíblico3 , um episódio marcado por erotismo e ocorrência de sexo entre familiares, o que aliás, também estava por acontecer na trama queirosiana. Suely Fadul, em artigo sobre objetos-personagens em Os Maias, lembra que, ao encobrir o quadro, Carlos da Maia ali também, metaforicamente, tratava de ocultar os objetos anunciadores da tragédia. Aliás, para a autora, a tela de João Batista tem uma função específica: “funciona como elemento premonitório, pois tendo João Batista morrido por condenar a imoralidade a profanação dos amores incestuosos, novamente aparece para condenar e, simbolicamente, pressagiar a culpa trágica de Carlos Eduardo e Maria Eduarda, que se consumará pelo incesto involuntário entre irmãos” (FLORY, 2003, p. 290) O ápice da curva do erotismo acontece na última passagem, na descrição do sentimento de culpa de Carlos quando este, mesmo ciente da consangüinidade que o unia a Maria Eduarda, ainda assim continua a manter com ela encontros sexuais, por mais de uma vez. Há uma mescla de uma forte carga erótica com doses de reprovação moral dos fatos, quando Eça, diante da conduta reprovável do protagonista, descreve seu sentimento de culpa e seus dilemas de consciência. Os termos utilizados pelo autor neste momento remetem à animalidade do gesto: “bárbara”, “animal”, “fera”, “ciosa”, “juba”, “bestial”. A amada já não possuía mais seios, mas “peitos túmidos de seiva”. Aliás, o caráter desta relação “selvagem” e fora dos padrões da sociedade já era prenunciado pelo “apelido” dado à casa onde davam-se os encontros: “toca”, que em nosso vernáculo designa “buraco na terra, na pedra, onde se abrigam animais, abrigo, refúgio” (FERREIRA, 1993, p.596). Para Suely Fadul, tal expressão conotava “uma realidade pressentida: a animalidade da relação incestuosa que ali se consumará” (FLORY, 2003, p.289). _______________________________ 3 - Segundo o relato da Bíblia, (Mateus, Capítulo 14, versículos 3-12), por ter condenado publicamente o fato de Herodes, então governante da Galiléia, ser amante da própria cunhada, Herodíades, João Batista foi preso. Salomé, sobrinha e enteada do governante, em uma festa de aniversário, dançou de forma tão sensual que Herodes lhe prometeu o presente que quisesse. A mãe, desejosa de vingança, influenciou a filha, que pediu a cabeça de João Batista em uma bandeja.
  • 9. 69 Aparição Localização/Contexto do fragmento Conteúdo do fragmento classificado na categoria Erotismo 1 Alugada a quinta de Craft, Carlos leva Maria Eduarda a caminhar pelos cômodos da casa dos Olivais. Andam pelo salão, banheiros, de tapeçarias, quando vêem Marte e Vênus se amando nos bosques até chegarem ao quarto, onde vêm um quadro de João Batista decapitado. “Penetravam na alcova, quente e cor de ouro. Carlos ao passar desprendeu as cortinas do arco da capela, feitas de uma seda leve que coava para dentro de uma claridade loura (...) -Aquela horrível cabeça ! – murmurou ela. Carlos arrancou a cobertura do leito, escondeu a tela sinistra. E então todo o rumor se extinguiu, a solitária casa ficou adormecida entre as árvores, numa demorada sesta, sob a calma de julho...(QUEIRÓS, 2000, p. 426). 2 Maria Eduarda já mora nos Olivais com a filha, a preceptora inglesa e os demais criados. Carlos lhe visitava todas as manhãs. Na frente da criadagem, ela bordava e ele lia. “Mas bordado e livro caíam logo no chão – e os seus lábios, os seus braços uniam-se arrebatadamente. Ela escorregava sobre o divã; Carlos ajoelhava numa almofada, trêmulo, impaciente” (...) e ali ficava, abraçado à sua cintura, balbuciando mil cousas pueris e ardentes, por entre longos beijos que os deixavam frouxos, com os olhos cerrados, numa doçura de desmaio” (QUEIRÓS, 2000, p. 443). 3 Carlos aproveita a ausência do avô, em viagem à quinta de Santa Olávia, no Porto, para passar a primeira noite com Maria Eduarda nos Olivais. “Um trovão rolou lento e surdo. Mas Maria já não o ouviu, caída nos braços de Carlos. Nunca o desejara, nunca o adorara tanto! Os seus beijos ansiosos pareciam tender mais longe que a carne, trespassá-lo, querer sorver-lhe a vontade e a alma; e toda noite, entre esses brocados radiantes, com os cabelos soltos, divina em sua nudez, ela lhe apareceu realmente como a deusa que ele sempre imaginara, que o arrebatava enfim, apertado ao seu seio imortal, e com ele pairava numa celebração de amor muito alto, sobre nuvens de ouro” (QUEIRÓS, 2000, p. 446) 4 Carlos descobre que Maria Eduarda é sua irmã. Apesar da revelação dos laços de consangüinidade e ele procurá-la para fazer-lhe a Ele tenteava, procurando na brancura da roupa; encontrou um joelho a que percebia a forma e o calor suave através da seda leve; e ali esqueceu a mão aberta e frouxa, num entorpecimento onde toda a vontade e consciência se lhe fundiam deixando-lhe apenas a sensação daquela pele quente e macia, onde a sua palma pousava. (...) sem resistência como um corpo morto ele
  • 10. 70 revelação, o protagonista não consegue; se entrega à paixão e mantém relações sexuais com a irmã. caiu-lhe sobre o seio. Os seus lábios secos acharam-se colados num beijo aberto que os umedecia. E de repente, Carlos enlaçou-a furiosamente, esmagando-a e sugando- a, numa paixão e num desespero que fez tremer todo o leito” (QUEIRÓS, 2000, p.638) 5 Ainda atormentado com a revelação, Carlos não tem coragem de revelar a verdade à Maria Eduarda. Pela segunda vez tem relações carnais com a irmã. Mas desta vez a culpa reflete-se na repugnância física. O fragmento refere-se ao drama de consciência que o aflige, minutos depois do ato. “Fora primeiramente aquele aroma que a envolvia, flutuava entre os cortinados, lhe ficava a ele na pele e no fato, o excitava tanto outrora, o impacientava tanto agora (...) Fora depois aquele corpo dela, adorado sempre como um mármore ideal, que de repente lhe aparecera, como era na sua realidade, forte demais, musculoso, de grossos membros de amazona bárbara, com todas as belezas copiosas do animal de prazer. Nos seus cabelos de um lustre tão macio, sentia agora inesperadamente uma rudeza de juba. Os seus movimentos na cama, ainda nessa noite, o tinham assustado como se fossem os de uma fera, lenta, ciosa, que se estirava para o devorar...Quando os seus braços o enlaçavam, o esmagavam contra os seus rijos peitos túmidos de seiva, ainda de certo lhe punham nas veias uma chama que era toda bestial” (QUEIRÓS, 2000, p. 645) 2.1.3 Condessa de Gouvarinho Em se tratando da personagem descrita como a amante balzaquiana, carente e inconveniente de Carlos da Maia, encontramos 3 (três) menções na categoria em questão. Notamos que a intenção do autor em ressaltar este aspecto da personagem fica patente quando utilizou determinadas palavras para descrever a impressão que tinha Carlos da Maia a respeito dela. São adjetivos e verbos que remetem à sensualidade, ao apelo sensorial em geral: “picante”, “cetim das formas”, “avermelhados”, “quentes”, “ aroma”, “ despia”, “ calor”, “seio arfando” etc. Note-se que em todas as passagens não há diálogos, mas reflexões internas do protagonista acerca da personagem em questão. Assim, o leitor toma contato com o erotismo que cercava a Condessa apenas por meio das reflexões de Carlos da Maia. O último fragmento, por exemplo, relata um encontro furtivo entre os amantes, a bordo de uma carruagem, durante o percurso na estrada de Queluz. No livro, jamais se descreve o que se passa dentro dela. O narrador limitou-se a descrever os fatos após o
  • 11. 71 término do passeio. Tudo é dito nas entrelinhas, dando ao leitor a capacidade de ver com os olhos da imaginação aquilo que ele mesmo não mostra. O interior é revelado pelo exterior, em conformidade com típico ditame da estética do Realismo. Teria Eça inspirado-se em Flaubert ? É o que parece, pois passagem semelhante está presente também na obra do autor francês, Madame Bovary, publicado em 1857, no qual narra-se o encontro de Emma com o amante León, também a bordo de um fiacre. Emma, tal como a Condessa, era infeliz no casamento e buscava no adultério a válvula de escape para sua existência entediada de esposa de médico do interior. A exemplo do que fez o Cinema4 ao adaptar a obra de Gustave Flaubert, também a TV, na adaptação de Os Maias, aproveitou tal passagem, mas fazendo-lhe outra leitura, conforme se verá mais adiante. Fiquemos com os fragmentos do livro: Aparição Localização/Contexto do fragmento Conteúdo do fragmento classificado na categoria Erotismo 1 Depois de ser apresentada a Carlos na ópera, a Condessa, a pretexto de levar o filho para consultar o médico sobre suposta doença, resolver visitar o médico. Carlos reflete sobre a mulher que acabara de sair do consultório. “Havia ali uma pontinha de romantismo, muito irregular e picante...E devia ser deliciosamente bem feita. A sua imaginação despia-a, enrolava- se-lhe no cetim das formas, onde sentia ao mesmo tempo alguma cousa de maduro e de virginal. E outra vez como nas primeiras noites que os vira em S. Carlos, aqueles cabelos tentavam-no, assim avermelhados, tão crespos e quentes” ... (QUEIRÓS, 2000, p.210) _____________ 4 - O livro Madame Bovary foi adaptada quatro vezes para o cinema: pelo diretor americano Vincent Minelli, pelo indiano Ketan Metha, e pelos franceses Claude Chabrol e Jean Renoir, estas últimas realizadas em 1934 e 1992, respectivamente. IN Muller Jr, Adalberto. Cinema, Tradução Infidelidade: os casos de Madame Bovary. Revista Sessões do Imaginário, n.º 11. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1994, P. 52-57.
  • 12. 72 2 Carlos visita a casa dos conde de Gouvarinho. A Condessa encontra-se sozinha em casa. “...sentia o seu aroma de verbena, o calor que subia do seu seio arfando com força (...) Insensivelmente, irresistivelmente, Carlos achou-se com os lábios nos lábios dela. A seda do vestido roçava-lhe, com um fino ruge-ruge entre os braços- e ela pendia para trás a cabeça, branca como uma cera, com as pálpebras docemente cerradas. Ele deu um passo, tendo-a assim enlaçada, e como morta; o seu joelho encontrou um sofá baixo, que rolou e fugiu ainda, até que se esbarrou contra o pedestal onde o senhor conde erguia a fronte inspirada. E um longo suspiro morreu, num rumor de saias amarrotadas” (QUEIRÓS, 2000, p. 292) 3 Primeiro encontro clandestino entre Carlos e a Condessa, no qual acontece o adultério, a bordo de uma carruagem simples, um “calhambeque duro”, nas palavras do autor. “... por uma tarde quente, com um céu triste de trovoada e no momento em que estavam caindo algumas gotas grossas de chuva – Carlos apeava-se de um coupé de praça, que viera parar, devagar, à esquina da Patriarcal, com os estores vede misteriosamente corridos. Dous sujeitos que passavam, sorriram-se, como se o vissem escoar-se desajeitadamente de uma portinha suspeita. E com efeito a velha traquitana de rodas amarelas acabava de ser uma alcova de amor, perfumada de verbena, durante as duas horas que Carlos rolava dentro dela, pela estrada de Queluz, com a senhora Condessa de Gouvarinho. (QUEIRÓS, 2003, p.295) 2.1.4 Raquel Cohen Conforme já se disse anteriormente, a mulher de banqueiro Raquel Cohen é a personagem silenciosa do romance, não tendo direito a falas nem a quaisquer expressões. Diante disso, é natural que as menções ao erotismo em relação a ela também sejam reduzidas. Em todo o livro, contabiliza-se apenas um fragmento no qual isso acontece, reproduzido abaixo. Nela o erotismo está presente na por meio das opiniões masculinas acerca da personagem. Sempre a ela se referem como se estivessem descrevendo um objeto, algo inanimado, cuja serventia é saciar o desejo, uma necessidade física, mais precisamente a
  • 13. 73 fome. Literalmente lhe são atribuídas qualidades que dizem respeito à carne: “deliciosa”, “apetitosa”, “carnezinha faisandée”. Aparição Localização/Contexto do fragmento Conteúdo do fragmento classificado na categoria Erotismo 1 Primeira descrição de Raquel Cohen, mulher casada com o banqueiro Jacó Cohen e que era amante de João da Ega “Entre os amigos, no Ramalhete, sobretudo na frisa, discutia-se às vezes Raquel, e as opiniões discordavam. Taveira achava-a deliciosa! E dizia-o rilhando o dente; ao marquês não deixava de aparecer apetitosa, para uma vez, aquela carnezinha faisandée de mulher de trinta anos” (QUEIRÓS, 2000, p.135) 2.2 - O EROTISMO NA MINISSÉRIE 2.2.1 Maria Monforte Se na obra de partida ela tem participação quase fugaz na trama, na minissérie, ao contrário, seu destaque e ênfase foram quantitativamente maiores, especialmente na categoria aqui sob análise: na TV foram 9 (nove) menções a mais. Provavelmente, por tratar-se de uma personagem complexa, cujo caráter parece modificar-se conforme a trama desenvolve-se5 , a roteirista optou por dar-lhe maior exposição, seja encenando trechos que no livro são rapidamente descritos ou sugeridos, seja criando livremente novas situações envolvendo-a. Um exemplo é sua primeira aparição, (inexistente no livro, aliás6 ) que já surge marcada pelo erotismo: a cena da tourada, na qual aparece associada à carne, à cor vermelha e ao sangue. Não por acaso quando perguntada por D. Diogo se gosta de touradas, sua resposta e primeira fala na minissérie é : “Em Portugal há pouco sangue. Prefiro as espanholas”. Note-se também que há erotismo na seqüência do piquenique em Sintra, no qual brinca com ___________________________ 5 - Em nosso análise, no início da trama, Maria Monforte é uma jovem que acredita na força do amor e por ele luta. Uma vez casada, torna- se uma esposa entediada e infiel. Depois de fugir com amante italiano e ficar arruinada, torna-se uma cortesã e uma mãe pouco zelosa. 6 - Em entrevista contida no DVD da minissérie, Maria Adelaide Amaral justificar a seqüência da Praça de Touros emOs Maias. Segundo a autora, é habitual estratégia dos autores de televisão elaborar o primeiro capítulo de uma novela ou minissérie de forma a causar impacto, captar a atenção dos telespectadores para o novo produto. Para isso, nada melhor que reproduzir um espetáculo tipicamente ibérico, grandioso, e plasticamente atrativo. A roteirista conta que, durante o processo de gestação da minissérie, empreendeu uma série de pesquisas em Portugal, e durante uma delas descobriu, em meio a vários escritos do autor português os planos de futuramente escrever um romance que tivesse uma tourada como pano de fundo inicial.
  • 14. 74 as uvas na boca de Pedro da Maia, em uma espécie de convite para que, além da fruta, também “experimente-a”. Aqui a metáfora do pecado – a maçã- fora trocada pelas uvas. Figura 1- Cena do Piquenique em Sintra Em outra seqüência, temos o devaneio do poeta Alencar, em uma das muitas recepções em Arroios. É compreensível a opção da roteirista em conceber a cena em questão, na qual Maria Monforte aparece ao poeta, que acabar de sorver uma taça de absinto, caracterizada a partir de vestimentas gregas, representando ora as deusas Ártemis, ora Afrodite. Embora esta passagem não exista na obra de partida, para caracterizar a beleza da personagem, a todo momento, no livro Eça lança mão das comparações com divindades mitológicas: “que diabo! Juno tinha sangue de assassino”; e ainda “ as suas formas de estátua davam-lhe o esplendor de uma Ceres” (QUEIRÓS, 2000, pp. 36-37). Apesar de ser uma seqüência inexistente no romance, não chega a constituir uma disjunção, visto que neste caso a TV parece comungar com um projeto ideológico do autor. Diante da beleza daquela aparição, o poeta Alencar ficara extasiado, como se estivesse diante de uma obra de arte, uma escultura, um quadro. E na verdade, era o que realmente apreciava. Ao transformar a personagem em Afrodite, a autora lançou mão da intertextualidade ao reproduzir a obra “O nascimento de Vênus”, de Boticelli7 . Como se sabe, nesta tela retrata-se o nascimento da deusa grega do amor a partir da espuma do mar. ________________________________ 7- A obra data de 1485 e foi pintada em têmpera sobre tela pelo fiorentino Sandro Botticelli, retratando no mar o nascimento da deusa romana do amor
  • 15. 75 Nela a deusa aparece desnuda, branca, com fartos cabelos cacheados e soltos, e em seu entorno, uma paisagem marinha, com abundância de conchas. Com exceção da nudez completa, Maria Monforte na TV também aparece assim caracterizada. As conchas estão por toda parte – desde as luzes no chão do palco até o papel da parede do palco onde se apresenta. Nada mais natural que invocar uma obra de arte da Renascença para ilustrar os sonhos de um poeta representante do Romantismo, estilo que louvava o retorno dos ideais clássicos e humanistas. Figura 2- Cena do sonho de Alencar A intertextualidade também encontra-se presente em outra seqüência, que retrata o primeiro e decisivo encontro adúltero com o italiano Tancredo. Depois de tê-lo primeiro como hóspede depois do episódio da caçada na Tojeira e em seguida como convidado, Maria apaixona-se e é correspondida. Depois de distribuir pães aos miseráveis nas ruas de Lisboa, Tancredo tira-lhe o véu e beija-lhe a boca. A câmera foca o véu negro caindo no chão – uma metáfora, já que com o véu caía também a máscara de fiel esposa da personagem. Tem início a seqüência em que os dois amantes fazem sexo à vista dos mendigos e cães sujos e doentes, sugerindo uma associação: assim como aqueles sobreviviam à margem da sociedade, também a paixão entre Maria Monforte e o italiano era marginal, adúltera, fora dos padrões sociais. Quando a câmera foca no cão, também insinua o desejo animal, que fica patente na falta de pudor em fazer sexo na rua, de pé, com testemunhas.
  • 16. 76 Figura 3 – Cena do encontro adúltero na rua com Tancredo É interessante observar ainda sobre esta cena que a mesma realiza um intertexto com o filme A Rainha Margot8 , de Patrice Chéreau, (que aliás também é baseado em um romance de Alexandre Dumas,) no qual Marguerite de Valois, a futura rainha da França, casada com Henrique IV, mantém encontros sexuais com seu amante La Môlle, nas mesmas circunstâncias, porém em meio às então fétidas ruas de Paris do século XVI. Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria Erotismo 1 Tourada em Lisboa. Primeira aparição da personagem. Primeira vez que Carlos da Maia sai de casa desde a morte da mãe, dois anos antes. Na Praça de Touros, troca olhares lânguidos com Pedro da Maia, que ficará fascinado por sua beleza. A câmera detém-se generosamente no decote, nos seios arfantes, na boca entreaberta, ao mesmo tempo em que mostra o touro –símbolo de virilidade- atingido por lanças, em uma possível alusão ao homem, no caso Pedro, sendo atingido pela lança da paixão. Presença maciça da cor vermelha na seqüência: o sangue do animal ferido, os rubis que adornam o colo da personagem, o manto do toureiro e a sombrinha escarlate da personagem. ________________________________ 8- O filme, uma co-produção alemã, francesa e italiana de 1994, retrata o jogo de influências nos bastidores da monarquia francesa em 1572. Conta a história do casamento da católica Margot e do protestante Henrique Bourbon de Navarre, como forma de minimizar as disputas religiosa no país, mas acaba servindo de estopim para um violento massacre de protestantes, conhecido como a “ noite de São Bartolomeu”, no qual morreram mais de seis mil protestantes, que teve a conivência do rei da França, Carlos IX, irmão de Margot.
  • 17. 77 2 Concerto no Teatro de S. Carlos. Embora Pedro da Maia já tivesse se comunicado com Maria por meio de flores e bilhetes, entregues em sua casa, será a primeira vez em que se encontraram pessoalmente. E que trocaram as primeiras palavras. A partir do parapeito de um dos camarotes, a câmera foca em close um ramo de camélias vermelhas; na seqüência, o decote generoso que mostra seios brancos, respiração ofegante, boca, sorriso e ombros nus da personagem. Boa dose de voyerismo, uma vez que ambos vêm um ao outro (por meio de uma luneta); o observador é observado e vice-versa. 3 Passeio em Sintra, no Castelo de S. Jorge. Personagem ora se esconde, ora se revela nas sombras das ruínas do antigo palácio, com vista para floresta e para o mar. Personagem foge e aparece, em jogo de sedução com Pedro da Maia. 4 Piquenique em Sintra. Primeiras informações sobre as origens da personagem e de seu pai. Na residência alugada pelos Monforte no verão, Maria provoca Pedro com um cacho de uvas, Convida-o prová-las, ressaltando-lhes o doce sabor: uma sugestão para que prove de seus beijos. Uma possível metáfora à maçã, fruto proibido usado por Eva para tentar Adão no paraíso. Trocam olhares de desejo, a respiração de ambos é ofegante. Pedro responde, colocando frutas na boca de Maria. Suas peles roçam uma na outra, a câmera dá close nas duas bocas próximas, mas o beijo não acontece. 5 Mesmo com a reprovação de Afonso, os dois se casam e, depois da lua de mel na Itália e França, voltam a Portugal. Maria está grávida. A câmera mostra o casal na cama. A imagem não é nítida; Por baixo dos lençóis, aparecem de longe os torsos masculino e feminino nus. 6 Durante uma das recepções na casa de Arroios, Maria apresenta-se como atriz em um palco especialmente preparado para ocasião. O fundo do palco é uma ilustração de uma floresta. Maria mostra-se, dançar, requebrando os quadris até o chão. O poeta Alencar, que é apaixonado por Maria, depois de beber uma dose de uma bebida verde (absinto?) vê sua apresentação de maneira diferente dos demais convidados. Primeiro, ela aparece a ele com outras roupas, vestida como a deusa grega Ártemis, a deusa da caça, munida de um arco. Depois,
  • 18. 78 com flores nos cabelos soltos e véus brancos, aparece como a deusa do amor sensual, Afrodite. Tudo ao som de flautas. Alencar fica extasiado. 7 Em outra recepção em Arroios, Pedro se irrita com os homens que dizem gracejos e dançam com sua mulher; retira-se para o quarto. Ela seduz o marido. Enquanto ele chora, ela lambe-lhe as lágrimas. Pernas, quadris, nádegas femininas; os corpos rolam um por cima do outro na cama – mas a câmera nada mostra de perto. 8 Na festa de batizado do segundo filho, Maria conhece Tancredo, o italiano ferido por Pedro durante uma caçada. Depois de a ter tirado para dançar, o italiano, cuja beleza logo encanta-lhe, oferece-lhe um desenho e a encara. Abraça e beija as mãos da pequena filha, Maria Eduarda enquanto dirige olhares sedentos para a mãe. 9 Decidida a ser uma mulher caridosa, Maria distribui pães aos pobres e moradores de rua de Lisboa. Tancredo aparece para ajudá-la na tarefa. Há um clima de sedução entre os dois. Tancredo se aproxima, beija-a com volúpia. A câmera mostra o véu negro que lhe cobria o rosto caindo sobre o chão; Tancredo levanta-lhe a saia, a câmera foca a face de um cão vira-lata. Fazem sexo de pé, encostados em uma parede, na rua, em plena luz do dia. A câmera mostra o olhar de um mendigo e a expressão de prazer da personagem. Agora de costas, Tancredo rasga-lhe as roupas, os seios aparecem nus. A música de fundo lembra que “ninguém larga a grande roda”, ou seja, é impossível fugir do destino. 10 Depois da morte de Tancredo e do pai, Maria se entrega à prostituição e aparece em um bordel na França Um homem nu deitado de costas em um divã vermelho. Uma mulher passa um leque feito de penas pelo corpo do rapaz, que se vira e agarra-a, beijando-a na boca. É Maria Monforte, de cabelos lisos soltos, extremamente maquiada e vestindo roupas de dormir. 2.2.2 Maria Eduarda Na maior parte das 6 (seis) cenas detectadas na minissérie segundo esta categoria, o erotismo está presente de maneira mais explícita e tais menções são maiores na TV que no livro. Entretanto, é interessante notar-se que, embora esta personagem tenha papel de maior
  • 19. 79 destaque ao longo da trama que Maria Monforte, quando a categoria é erotismo, quantitativamente esta protagoniza mais cenas na TV que Maria Eduarda. Figuras 4 e 5, takes que retratam um dos encontros com Carlos Eduardo nos Olivais. Assim como no livro, conforme já observamos no sub-capítulo anterior, a figura de Maria Eduarda aos poucos vai abandonando o caráter de deusa intangível, para se corporificar em mulher real, começando a integrar mais intensamente a trama. Outro ponto é que Maria Eduarda é apresentada aos telespectadores (assim como aos leitores) enquanto esposa de Castro Gomes, antes de apaixonar-se por Carlos Eduardo durante uma viagem a Portugal. Dadas as peculiaridades do formato, a TV consegue evidenciar mais aspectos da vida íntima da personagem com o suposto marido que o romance. Entretanto, todas as cenas de intimidade entre ela e Carlos Gomes, quando sugerem sexo, não o fazem de maneira erótica,
  • 20. 80 pois não explicitam desejo e sim submissão ao homem, (categoria que analisaremos mais à frente), já que Maria Eduarda era concubina do brasileiro, e a ele se unira apenas por motivos financeiros, a fim de manter sua sobrevivência, da filha e da mãe9 . A falta de erotismo, neste caso, parece ser indicativa de uma convivência sem prazer, por obrigação, imposta pelas circunstâncias que envolviam a personagem. Todas as seqüências aqui selecionadas procuram evidenciar o desejo enquanto manifestação física, mas parecem sempre atreladas a um sentimento de amor puro, quase sublime em relação a Carlos Eduardo. Exceção fica por conta da última cena, na qual Carlos já ciente de sua condição de irmão de Maria Eduarda, ainda assim leva a cabo seu encontro sexual com Maria Eduarda. Nesta passagem, a paixão perde sua conotação de pureza e ganha dimensão de um sentimento puramente carnal e até animalesco, uma vez que agora o incesto é voluntário por parte do protagonista. Em background surgem sons de tambores, que parecem mesclados a gritos tribais, efeitos utilizados durante toda a sequência. Uma provável sugestão de que acontecia ali uma prática selvagem, pouco civilizada, quase tribal. Figura 6: Mesmo já ciente do incesto, Carlos faz sexo com a irmã. E é assolado pela culpa. Também as cores utilizadas nas roupas de cama, (o vermelho da colcha e o negro dos lençóis), simbolicamente, dão a medida de como naquele momento a paixão mesclava-se à impureza, à podridão de uma relação condenável. O ritmo da cena é mais rápido, a intensidade é maior. E os corpos nus, embora mais evidentes que nas demais seqüências, aparecem envoltos em véu negro, rodeado por velas em candelabros, emprestando um ar sinistro à cena. ___________________ 9 - Na minissérie, diferente do livro, Maria Monforte ainda é viva, mas está com os dias contados. Tuberculosa, seu tratamento na Suíça é pago por Castro Gomes, fato este que reiteradamente ele lembra à Maria Eduarda
  • 21. 81 Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria Erotismo 1 Após a viagem de Castro Gomes ao Brasil, Carlos da Maia, a pretexto de saber da saúde da filha de Maria Eduarda, Roseclair, que havia curado dias antes, faz visita à mãe e declara-se a ela. Trata-se da primeira cena de beijo entre os personagens. Cena ardorosa, Carlos toca a nuca, única parte exposta do corpo da personagem. Agarra-a pela cintura. As respirações são ofegantes. 2 Carlos faz uma visita Maria Eduarda enquanto ela borda uma talagarça. É Maria Eduarda quem toma iniciativa de um longo toque na face de Carlos. Acontece um longo beijo na boca, cheio de desejo e ânsia, sem preocupação com convenções sociais, uma vez ambos que se encontram no corredor do prédio onde fora morar depois da viagem de Castro Gomes ao Brasil. O desejo do casal é crescente. 3 Carlos leva Maria Eduarda para conhecer a casa que alugou de Craft no campo, a Quinta dos Olivais Depois de entrar em vários cômodos da casa, Maria Eduarda declara-se, apaixonada. Ambos despem-se um ao outro. A luz é clara, há foco na pele branca da personagem. A câmera faz um suave travelling, passeia entre os dois, usa planos e contra-planos. De longe aparece o bico do seio da personagem, sua expressão de prazer na cama, respiração ofegante. Há insinuação do ato sexual, mostra-se Carlos por cima da personagem. Ambos aparecem nus somente de longe, sob véus transparentes. A música é suave. 4 Após Castro Gomes ter revelado a Carlos que não era casado com Maria Eduarda e que Rosiclair não era sua filha, Carlos vai até os Olivais. Encontra Maria e com ela discute por ela ter lhe escondido a verdade. Ela pede perdão por ter escondido seu passado, mas Carlos não se convence. Os amantes decidem romper. Carlos retira-se, deixando Maria Eduarda em cena sozinha, chorando. Desesperada, Maria chora pela perda. Corre para o espelho e acaricia-o. Na verdade, está tão abalada pelo rompimento que não consegue ver seu próprio reflexo, apenas a imagem do seu amado. Beija-lhe a boca, chama-o pelo nome. Cena de forte simbolismo – o que aparecia ali era seu desejo de manter sua “cara- metade” ao seu lado, o que parecia então impossível.
  • 22. 82 5 Perturbado por não esquecer Maria Eduarda e arrependido da briga, Carlos volta aos Olivais, disposto a fazer as pazes. E a pede a em casamento No quarto de Maria Eduarda os dois se reconciliam. A câmera mostra Carlos beijando joelhos e pernas nuas da personagem, deitada. Levanta-le a saia. Há um corte e um close para o rosto da mulher, com expressão de prazer. A seqüência, que conta com o narrador em off descrevendo a cena, “nunca a desejara tanto” termina com a personagem dormindo seminua, com os cabelos soltos, “divina em sua nudez”, seguindo exatamente o conteúdo do livro à página 446. 6 Carlos acaba de saber que é irmão de Maria Eduarda e dirige-se à casa da amante para fazer-lhe a revelação, que impede a continuação do romance. Encontra-a em seu quarto, deitada na cama. E mesmo ciente do parentesco, não consegue resistir à paixão Trata-se da seqüência de maior e mais explícita carga erótica em relação à personagem. Ao som de tambores, a câmera mostra um casal fazendo sexo na cama, de maneira mais próxima e desta vez mais nítida. Aparecem o contorno dos seios, nádegas e a púbis da personagem, que aparece completamente nua de costas. Ao contrário das outras cenas, a mulher aparece mais ativa no ato, dando prazer ao homem. Diferente das outras cenas, aqui não há suavidade mas certa animalidade no ato, em harmonia com a passagem equivalente do romance. A roupa de cama é em tons escuros, a luz utilizada é sombria. 2.2.3 Condessa de Gouvarinho Nota-se que em relação a esta personagem, o erotismo ressaltado na minissérie, com 5 (cinco) menções, duas a mais que no romance. Entretanto, mesmo sendo personagem secundária, parece-nos que Eça de Queirós, já no século XIX, fazia pairar sobre Teresa Thompson uma nuvem de erotismo, embora naturalmente mais velada que a veiculada na minissérie. Como já dito anteriormente, é próprio da linguagem televisiva evidenciar por imagens aquilo que no suporte escrito é apenas insinuado. Exemplo deste caráter mais explícito das cenas são as passagens dos encontros furtivos com Carlos da Maia, que acontecem dentro do coupé e no consultório médico.
  • 23. 83 Ao que parece, na televisão foi ressaltado o caráter erótico da personagem, sempre associada à necessidade de “desafogo” sexual de Carlos da Maia. É interessante notar também que a iniciativa das abordagens e dos encontros com o personagem sempre partem da Condessa, seja nas seqüências nas quais o erotismo é velado quanto naquelas em que é explícito, uma atitude ousada e até mesmo condenável para uma mulher da alta sociedade da época. Figura 7: A Condessa seduz Carlos em seu consultório médico Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria Erotismo 2 Recepção na casa dos Gouvarinho, à mesa, durante jantar, convidados discutem sobre o adultério de mulheres casadas A personagem, com vestido decotado no busto, provoca Carlos, roçando seus pés nas pernas do médico por baixo da mesa, ao lado do marido. 3 Encontro furtivo entre a condessa e o médico, dentro de uma carruagem, em frente ao consultório de Carlos, onde os amantes marcaram o encontro. Durante um passeio pela cidade, a condessa e o médico fazem sexo dentro de um coupé, sem se importar com o desconforto e sem tirar as roupas. Embora a condessa declare-se e apaixonada, o médico apenas dá vazão ao desejo físico, sem demonstrar envolvimento.
  • 24. 84 4 No consultório, condessa reclama da escassez de encontros com o amante. Carlos mescla irritação e uma certa carência, por conta da revelação da história de seus pais. O médico agarra a condessa por trás, aperta-lhe os seios, levanta-lhe a saia. E de roupa, faz sexo com a condessa, em cima de uma mesa, de maneira rude e sem carinho, como nítido desafogo de um mero desejo sexual. 5 Novamente no consultório, Carlos já apaixonado por Maria Eduarda, entretanto, continua encontrando-se com a Condessa. Rápida cena, novamente de roupa, de maneira rápida, a condessa faz sexo com o amante; ele de olhos fechados; o ato parecia ser um desafogo que o médico mal podia esperar que chegasse ao fim. 2.2.3 Raquel Cohen Ao contrário do que acontece no romance, no produto televisivo a personagem em questão, embora seja secundária, tem maior participação na trama. Um exemplo são as 3 (três) menções relativas ao erotismo referentes à judia mulher do diretor do Banco Nacional. Nelas a personagem tem voz ativa, protagoniza diálogos e situações, ao contrário da passagem única do livro, na qual o erotismo em torno da personagem fica patente por meio dos relatos masculinos dos freqüentadores do Ramalhete. Parece então que, à primeira vista , em relação a esta personagem, há uma aparente disjunção entre romance e minissérie. De todas as personagens femininas, é Raquel Cohen a única que, nas passagens com maior carga erótica, jamais está envolvida realmente com seu amante, João da Ega. Ao final de todas as seqüências, ela parece arrepender-se do adultério, afirmando sempre que pretende preservar seu casamento, tratando-se então o romance com o jovem Ega de um mero passatempo, um divertimento para uma esposa entediada. Mas, se refletirmos que, ao ressaltar este aspecto a minissérie acaba reforçando o propósito do livro de Eça de desnudar a sociedade portuguesa do século XIX – e hipocrisia nos casamento é apenas uma de suas faces , então os conteúdos da televisão e livro guardam coerência entre si, estando em conjunção. Para dar a medida da relação proibida com João da Ega, os encontros dos amantes são sempre são rápidos, fugidios e em locais ermos, como em um cemitério, local escolhido pela própria personagem para tal. O adultério se dá entre cruzes, velas e túmulos da primeira vez, dentro de uma cova em um mausoléu na segunda. Note-se que nesta última há um ar teatral,
  • 25. 85 quando os amantes parecem divertir-se ao encenar supostamente o encontro entre D. Pedro e de Inês de Castro10 , já morta. Uma fantasia para tirar da mesmice a enfadonha vida de uma mulher da alta sociedade lisboeta... Figura 8: Raquel encontra-se com João da Ega dentro de uma tumba no cemitério, simulando a história de D. Pedro e Inês de Castro. Aparição Localização/Contexto da Cena Conteúdo da cena classificada na categoria Erotismo 1 No teatro S. Carlos, durante concerto de ópera, enquanto Jacó Cohen sai para tomar ar, Raquel e João da Ega ficam sozinhos no camarote. Os amantes aproveitam a ausência do marido para agarrarem-se, beijarem-se, atrás das cadeiras do camarote. Há dose de voyerismo, já que a cena é observada do outro lado do teatro, por meio de uma luneta, por Taveira, amigo de João da Ega. A câmera mostra tudo de longe. O telespectador vê a cena a partir dos olhos do personagem. _______________________________ 10 - No século XIV, o então príncipe de Portugal, D. Pedro, apaixonou-se pela dama de companhia de sua mulher, a espanhola Inês de Castro, que foi sua amante e mãe de quatro filhos seus. A nobreza, com medo de que Inês se tornasse rainha de Portugal quando D. Pedro assumisse o trono de seu pai, D. Afonso IV, matou-a em 1355, enquanto o rei encontrava-se fora de Lisboa. Dois anos depois, ao ser coroado rei de Portugal, D. Pedro vingou-se , matando os assassinos de Inês e mandando exumar a ossada de sua amada, coroando -a morta e obrigando toda corte - sobretudo a nobreza e o clero, que haviam condenado seu romance - a ajoelharem-se diante do cadáver e a beijar-lhe os ossos da mão.
  • 26. 86 2 Encontro furtivo entre Raquel e João da Ega no cemitério, durante o dia. O lugar é sugerido pela personagem. Simulando levar flores para um túmulo, vestida de preto, com uma capa da mesma cor, como se estivesse de luto, Raquel caminha entre os jazigos. É agarrada por João da Ega, que a leva para dentro de um mausoléu. Lá, à luz de velas nos candelabros, Ega tira a roupa da personagem, que fica apenas de espartilho, embora o espectador veja- a apenas da cintura para cima. A câmera afasta-se e volta apenas para marcar a o fim do encontro entre os amantes, quando a personagem se diz arrependida do encontro. 3 Novo encontro entre a personagem e seu amante, no cemitério, desta vez à noite. A escolha foi novamente da personagem, que sugere encenar a história de Inês de Castro. No meio do cemitério, a câmera mostra de longe Ega carregando um corpo aparentemente inerte, como se estivesse morto. Há um corte e mostra-se o interior de um mausoléu, preparado de tal forma que se tem a sensação de estar acontecendo um velório – há velas, cruzes e coroas de flores. A câmera nos mostra um suposto cadáver de mulher em uma cova. João da Ega entra em cena, se aproxima da cova: “Ah, minha Inês, estás tão fria....e tão apetitosa!”. Há aí uma sugestão de uma perversão sexual, a necrofilia. Pouco depois a câmera nos mostra os amantes aos beijos dentro da tumba. CATEGORIA: EROTISMO Personagens Menções no livro Menções na TV Maria Monforte 01 10 Maria Eduarda 05 06 Condessa de Gouvarinho 03 05 Raquel Cohen 01 03 Total 10 24
  • 27. 87 EVOLUÇÃO DAS MENÇÕES À CATEGORIA EROTISMO NA TRANSMUTAÇÃO DO LIVRO PARA A TV 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Menções no livro Menções na minissérie Maria Monforte Maria Eduarda Condessa de Gouvarinho Raquel Cohen Ao levarmos em consideração que seja possível mensurar numericamente as menções ao tema Erotismo no livro e na minissérie, constataremos que houve uma considerável elevação de freqüência de repetição da categoria em relação às quatro personagens na transmutação para a TV. No meio eletrônico ela foi 140% maior que no meio impresso. Flagrante foi o incremento do caráter erótico da personagem Maria Monforte: a repetição de seqüências com esta especificidade cresceu 900% na minissérie em comparação com o livro. Pode-se dizer que a trajetória da personagem é marcada em um primeiro momento pelo erotismo velado e referido até o casamento com Pedro da Maia; é a partir do adultério que o erotismo fica mais explícito. Raquel Cohen, mesmo tratando-se de uma personagem secundária, aparece como segunda personagem mais erotizada na trama televisiva, experimentando acréscimo de 200% das menções em relação ao romance. Já a Condessa de Gouvarinho teve incremento de 66,6%. O erotismo na minissérie em relação à Maria Eduarda, por sua vez, foi 20% superior ao romance. Em princípio os números podem apontar para uma interpretação errônea, segundo a qual a personagem teria então uma discreta carga de erotismo na TV, a menor entre todas as personagens femininas. É importante lembrarmos que Maria Eduarda já no romance é a personagem com maior carga quantitativamente erótica. O que a televisão fez foi manter este caráter, focando a intensificação não do número de vezes em que o tema é citado, mas cuidando para explicitar ao máximo o conteúdo destas seqüências. Em relação às demais personagens, percebe-se que o incremento em relação à categoria em questão esteve agregado ao aumento da própria frequência de aparição das
  • 28. 88 mesmas. A nuance erótica delas acompanhou sua participação na narrativa televisiva. Ou seja: quanto maior a participação das personagens em questão na minissérie em relação ao livro, mais freqüente também serão as suas respectivas referências ao erotismo.