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1
BOLETIMINFORMATIVO
EDIÇÃO
No
50
ISSN1519-1109
ANTISEMITISMO
NA ERA
MUSSOLINI
pág. 9
MEU CONVÍVIO
COM A COLÔNIA
JUDAICA
pág. 17
UMA FAMÍLIA
EM MOVIMENTO:
OS MILÃOS
pág. 38
JUDEUS
MARROQUINOS:
SÃO PAULO E RIO
DE JANEIRO
pág. 21
2
3
A PALAVRA DO PRESIDENTE
3
Carta Aberta à Comunidade
Meus amigos,
O Arquivo Histórico Judaico Brasileiro completa neste ano 39 anos, fundado em 1976 por membros da
USP e desde então servindo à comunidade judaica e à sociedade brasileira como um centro de pesquisas
e referência sobre a imigração judaica no Brasil.
Com a eleição da nova Diretoria agora em Agosto de 2015, criamos um novo Espaço da História
Judaica no Brasil apresentando-se hoje como uma instituição voltada à preservação da memória, à
pesquisa e à proteção do maior acervo de fotografias e documentos relativos à comunidade judaica no
Brasil desde a Imigração até os dias atuais englobando as Entidades Judaicas bem como as famílias que
a compõe.
Através do Projeto Muitas Mãos iniciamos um importante processo de modernização administrativa e
tecnológica visando acelerar o arquivamento e digitalização do nosso Acervo. O novo processo permitirá
uma maior interação entre o novo Espaço e a Comunidade permitindo,de um lado o acesso virtual aos dados
arquivados e por outro lado o recebimento eletrônico dos documentos encaminhados pela Comunidade.
Dentre os novos projetos da nova Gestão, destacam-se a produção de conhecimento nas áreas do ensino
e da cultura, colaborando com a formação de cidadãos críticos e promovendo, por diversos meios, a
reflexão sobre questões fundamentais do nosso tempo.
OProjetoMinhasRaízes–NossaHistóriavaiinteragircomosalunos,paisefamílias,montandosuasárvores
genealógicas,entrevistando seus avós identificando-os com a nossa história,nossa cultura e religiosidade.
Projetos como dos Movimentos Juvenis Caminho para novas Lideranças permitirão integração e
renovação do Ecossistema Comunitário, visando um importante ganho de eficiência na consolidação de
Entidades afins.
Conclamo então todas as nossas Entidades, Pais e Alunos a apoiar o novo Espaço de sua História,
mantendo Viva e Dinâmica suas Memórias.
Que o novo ano de 5776 nos traga a força e a determinação para o enfrentamento dos novos desafios.
Seilly Heumann
Presidente
ESPAÇO DA HISTÓRIA JUDAICA NO BRASIL
A memória viva da imigração até os dias de hoje
4
EDITORIAL
Foi uma experiência gratificante introduzir as modifica-
ções que fizemos no Boletim número 49, principalmente
no formato. A aceitação manifestada pelos leitores, nos
induziu a repeti-las e fazer outras variações necessárias.
Editar uma publicação judaica que desperte o inte-
resse de leitores é um desafio constante e muito salutar.
Evidentemente que o mérito maior se deve aos nossos
colaboradores escolhidos entre os melhores autores e
que tenham textos interessantes dentro da temática de
nossa publicação.
Neste mês de agosto, elegemos uma nova diretoria presi-
dida por Seilly Heuman que assumiu os destinos de nossa
Instituição,com novos projetos,preservando entretanto os
objetivos que sempre pautaram nossa atuação na comuni-
dade.Tenho certeza que esta revitalização trará os resulta-
dos que todos almejamos.
Uma nota triste: entre o dia de lançamento deste Bole-
tim e aquele quando recebi a colaboração de minha que-
rida amiga Profª.Consuelo Pondé de Sena, ela faleceu em
Salvador. Deixou um texto cheio de carinho e amor pela
comunidade judaica da Bahia onde conviveu por muitos
anos e era querida e respeitada por todos.
Adeus amiga,vamos nos privar dos seus artigos inteligentes
mas guardaremos para sempre sua lembrança e sua alegria.
Nosso reconhecimento sincero, neste momento de mu-
danças à CIBRACON e a CONSTRUTORA ATLAN-
TICA, na pessoa do seu presidente Engenheiro Jayme
Serebrenic que durante mais de 20 anos patrocinou des-
preedidamente todas as realizações e atividades do Arqui-
vo. Obrigado amigo Seré.
Uma palavra de agradecimento também para nossa equi-
pe, sempre eficiente e dedicada.
Boa leitura.
CARLOS KERTÉSZ
Editor
Henrique Brenner
Henrique Brenner, benemérito doador da sede do AHJB, ligou
elogiando muito o Boletim nº 49 e solicitou mais exemplares
do mesmo.
Dorothy S. Bortz
Esteve na sede do AHJB fez muitos elogios ao Boletim nº 49 e
solicitou mais exemplares para distribuir a amigos.
Pe. Henrique Puig
Acuso o recebimento da Revista do AHJB que li com sumo in-
teresse e simpatia. Achei entre outros sumamente bem explicado
o tema tratado sob o título “Padre Anchieta, cristão ou judeu?”,
donde mais uma vez deduso a proximidade e parentesco, por
não dizer identidade, de nossos povos cristão e judeu. Os últi-
mos Papas ao referir-se ao povo judeu falam de nossos irmãos
maiores. São Paulo que sempre se orgulhava de sua origem ju-
daica, da tribo de Benjamim, várias vezes dizia que os judeus
são os possuidores dos valores mais altos. Penso eu que a Estrela
de Davi há de ser um dia que nos ilumine para encontrar jun-
tos a luz que nos trouxe sua descendência tão abençoada.
Lafayette de Azevedo Pondé Filho
Obrigado pelo Boletim no
49 do AHJB. Gostei, detendo-me em
particular no artigo do DavidTabacof,principalmente pelos laços
de amizade com Boris, que foi um dos meus primeiros chefes. No
governo Lomanto,Boris foi Chefe da Casa Civil,sucedendo outro
grande amigo, João Eurico Matta, que havia me levado como
Oficial de Gabinete e depois Sub-Chefe da Casa Civil. Boris é
uma das pessoas mais inteligentes que já conheci, muito prático,
boas lições de vida aprendi com ele. Gostaria de continuar rece-
bendo o Boletim, tenha a certeza que me agradou o seu conteúdo.
CARTAS
5
O BOLETIM DO AHJB é enviado gratuitamente aos sócios, a instituições culturais do Brasil e do exterior, e é também distribuído aos visitantes e consulentes que o solicitam.
Lembramos aos colaboradores que este boletim possui ISSN (International Standard Serial Number), número internacional normatizado para publicações seria-
das. Os artigos inéditos podem ser enviados à Redação pelo e-mail ahjb@ahjb.org.br
Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do AHJB.
PRESIDENTE Maurício Serebrinic 1O
VICE PRESIDENTE Carlos Kertész 2O
VICE PRESIDENTE Seilly Heuman DIRETOR FINANCEIRO Jayme Serebrenic SECRETÁRIA
GERAL Myriam Chansky DIR. DE SEÇÕES E INFORMÁTICA Carlos Kertész DIR. DE BIBLIOTECA E ACERVOS DOCUMENTAIS Roney Cytrynowicz DIR. HISTÓRIA ORAL
Marília Freidenson DIR. DE CULTURA IÍDICHE Abrahão Gitelman DIR. INSTITUCIONAL Paulina Faiguenboim DIR. DE COMUNICAÇÃO David Paves DIR. DE PESQUISA
Léa Vinocur Freitag DIR. DE EDUCAÇÃO Simão Priszkulnik DIR. DE PATRIMÔNIO Maurício Serebrinic DIR. DE DPTO. MÚSICA Samuel Belk DIR. DE ACERVOS
ESPECIAIS Simão Frost DIR. DE GENEALOGIA Paulo Valadares DIR. DE PROJETOS INSTITUCIONAIS Seilly Heumann
ADMINISTRAÇÃO Eliane Klein BIBLIOTECA Theodora da C. F. Barbosa DOCUMENTAÇÃO, PESQUISA, PROJETO E EDUCAÇÃO Lúcia Chermont FOTOTECA Arnaldo Lev
SERVIÇOS GERAIS José Messias Ribeiro Santos
EDITOR Carlos Kertész REVISÃO Theodora da C. F. Barbosa DIAGRAMAÇÃO Alexandra Marchesini PROJETO GRÁFICO Marcelo Kertész
CONTATOS ahjb@ahjb.org.br ou pelos telefones 11 3088-0879 / 2157.4124
A linguagem e soletração em cada artigo respeita a escolha do autor.
EXPEDIENTE
Capa: Identidade visual do VI Encontro Nacional do AHJB
SUMÁRIO
06 VI Encontro do Arquivo
Histórico Judaico Brasileiro 38 Uma família em
movimentos: os milãos
Paulo Valadares
09 Antisemitismo na
era Mussolini
Prof. Reuven Faingold
17 Meu convívio com a
colônia judaica
Consuelo Pondé de Sena
28 Refugiados Judeus-Alemães
na República Dominicana
Rafael Picó
21 Judeus Marroquinos:
São Paulo e Rio de Janeiro
Rachel Mizrahi
24 A Fonte da Juventude
Luiz Freitag
32 Judeus nos Trópicos
Esther Regina Largman
36 Uma galinha no Brás
Henrique Suster
45 Rua Santa Clara
do Desterro, 34
Germano Tabacof
30 Reunião de família
Fabia Terni Leipziger
06 NOTÍCIAS E CARTAS
49 PESQUISADORES
51 DOAÇÕES
29 A influência judaica
na Espanha
Rafael Picó
47 Imigração
Ernesto Strauss
6
O
ARQUIVO realizou nos dias 14, 15 e 16 de novembro de 2014 o VI ENCONTRO NACIONAL em
São Paulo na Casa da Cultura Judaica de São Paulo, sob a coordenação do vice-presidente
Carlos Kertész,que saudou os presentes e fez um retrospecto dos 5 Encontros anteriores.
Nesta edição homenageamos ANNE FRANK, jovem judia holandesa,que passou com sua família dois
anos escondida durante a Segunda Guerra Mudial até ser descoberta e enviada para um campo de
extermínio, onde faleceu. No período em que ficou escondida ela escreveu um Diário, salvo por seu
pai único sobrevivente que o publicou e se tornou num dos livros mais lidos em todo o mundo.
A abertura oficial do ENCONTRO foi feita com um Cabalat Shabat conduzido por Simao
Prisculnic, contando com a participação de Muriel Waldman,Daniel Markus e um coral .
VI Encontro do Arquivo
Histórico Judaico Brasileiro
NOTÍCIAS
Em seguida, a arquiteta Joelke Offriga, palestrante oficial
convidada,presidente do Instituto Plataforma Brasil –
IPB, representante da ANNE FRANK HOUSE apresentou
projetos educativos realizados no Brasil sob a inspiração
de Anne Frank, destacou as ações na Cidade do Salvador
em conjunto com a Sociedade Israelita da Bahia – SIB. O
encerramento deu-se com o pronunciamento da profa.
Helena Serebrinic, esposa do presidente Mauricio Serebrinic
que discorreu sobre as atividades do AHJB e enfatizou sobre
o desempenho de nossa Instituição que guarda, preserva e
disponibiliza nosso rico acervo para todos interessados na
imigração e permanência da comunidade judaica do Brasil.
O sábado e domingo foram destinados a apresentação
dos trabalhos com debates acalorados, demonstrando o
interesse de todos pelos Encontros promovidos pelo AHJB.
Na tarde do sábado, foi efetivado o lançamento do segundo
livro do Nucleo de História Oral Gaby Becker intitulado“Carta
de chamada“reunindo expressivo público interessado na obra.
O VI ENCONTRO NACIONAL terminou no domingo,
deixando em todos os participantes e promotores
uma agradável sensação de satisfação, principalmente
quando souberam que o próximo ENCONTRO está
no planejamento de nossas atividades futuras.
6
7
Prof. Israel Blajberg, Joelke Offriga palestrante oficial,
Carlos Kertesz e Mauricio Serebrinic
Diretor Seilly Heumann com Muriel Waldman,
Simão Priszkulnik, Nanete e John Konig
Palestrante Joelke Offriga ladeada por Miriam Olsner e
Rubens Bergel e seus filhos
Presidente Mauricio Serebrinic e sua esposa Helena
Diretores Mauricio Serebrinic, Jayme Serebrenic e
Carlos Kertész e suas esposas Helena, Tatiana e Bertha
Diretor Abrahão Gitelman e profa. Nancy Rozenchan
7
8
Mauricio Szporer tornou-se em 2015 o mais jovem Desembargador do Brasil,
eleito que foi de uma lista sêxtupla e depois tríplice.
Filho mais jovem dos ativistas comunitários Jacob e Freida Szporer e neto de
imigrantes judeus Marcus e Lola Kertzman e Mauricio e Sarah Szporer, de origem russa
e polonesa respectivamente.
LogoapóssuaformaturaemDireitopelaUniversidadeFederaldaBahia,foiconvocado
pela multi nacional francesa Accor para trabalhar em S. Paulo, onde ficou por 2 anos e
desde cedo começou a se interessar e se envolver com a comunidade judáica. Ainda
nesta ocasião fez e concluiu o programa“Princípios e Valores de Liderança Empresarial
e Comunitária”pelo Insrtituto de Ensino e Pesquisa, Insper.
Retornando para Salvador, onde ficaram suas raízes, foi Presidente de Sociedade
Israelita da Bahia, por 2 mandatos consecutivos, sendo que na sua gestão foi adquirida
o terreno onde se instalará a futura sede da SIB, no bairro da Pituba.
Batalhador pelos direitos humanos, e sempre favorável às liberdades e direitos individuais e coletivos, foi para
Israel fazer um curso de liderança, de onde voltou com entusiasmo crescente. Foi nomeado para o Tribunal
Regional Eleitoral cumprindo 2 mandatos de 2 anos, em ocasiões diferentes.Tomou posse este ano como
Desembargador com o apoio da grande maioria dos advogados e dos seus pares da magistratutura. Atualmente
é também diretor da Conib. Ao tomar posse noTribunal de Justiça da Bahia, disse Mauricio Szporer:“Prometo aqui
na frente de minha família, amigos, pares e autoridades que zelarei de toda alma por aplicar os mais elevados
padrões éticos e morais, balizado nas Leis do nosso país”.
NOTÍCIAS
8
Consuelo Pondé de Sena (1934-2015),
descendente da importante parentela dos Sousas
de Itapicuru (Bahia), grandes pecuaristas e médicos,
trabalhou inicialmente com o museólogo José do
Prado Valadares – casado com a antropológa judia
de origem húngara, Gizela Roth, na elaboração de
uma bibliografia de Arte Brasileira. Depois disto fêz
muita coisa: escreveu sobre o Sertão (Portugueses
e africanos em Inhambupe, 1750, Introdução ao
estudo de uma comunidade do agreste baiano:
Itapicuru, Os Dantas de Itapicuru, dentre outros),
foi professora universitária e dirigiu o Instituto
Geográfico e Histórico da Bahia, desde 1996.
9
ARTIGO
ANTISEMITISMO
NA ERA MUSSOLINI
PROF. REUVEN FAINGOLD *
E
m 1938,quando o regime de Benito Mussolini
publicou leis racistas, 10.000 judeus italianos
militavam nas fileiras do Partido Nacional
Fascista. Na época, quase um de cada quatro
membros da comunidade judaica idolatrava o Ducce, par-
ticipava de comícios, entoava canções partidárias, usava
símbolos fascistas em suas vestimentas, se engalanava para
os momentos de grande júbilo,defendendo incondicional-
mente o regime estabelecido. Eram profissionais liberais,
comerciantes, juízes, docentes, cientistas e pessoas ligadas
à cultura que amavam sua condição de italianos.
Com as proibições de 1938, estes judeus demoraram em
reagir, em tomar consciência de que o abismo que se abria
a seus pés seria bem profundo, ignorando uma realidade
hostil que começava a pressioná-los; enfrentando grandes
obstáculos, por vezes intransponíveis. Muitos preferiram
emigrar, enquanto outros ficaram no país. Estes últimos
se viram obrigados a deixar seus trabalhos assumindo uma
condição de párias e marginalizados. A partir de 1943 os
judeus que moravam ao norte da Itália, foram levados a
campos de extermínio nazistas, principalmente diante do
desembarque das forças aliadas na Sicília.
Cabe perguntar: Como foi possível um grau tão grande
de adesão judaica ao partido fascista sem prever eventuais
“NA ITÁLIA, UM NÚMERO SIGNIFICATIVO DE JUDEUS APOIOU O REGIME ESTABELECIDO POR
BENITO MUSSOLINI; MAS TODAS AS PROVAS DE PATRIOTISMO E LEALDADE AO PARTIDO E AO
PAÍS JAMAIS FORAM RETRIBUÍDAS PELO “DUCCE”. MUITO PELO CONTRÁRIO, O ANTISEMITISMO
HOSTILIZOU TAMBÉM AQUELES JUDEUS NACIONALISTAS SIMPATIZANTES DO FASCISMO”.
perigos? Que fatores os converteram em ativos militantes
“camisas pretas”? Por acaso os judeus não imaginavam que
mesmo militando seriam acusados pelas desgraças mun-
diais? Eles não liam jornais locais e internacionais, não
escutavam rádios nem se informavam nas salas de cinema
para saber o que acontecia no restante da Europa sob a
bandeira da extrema direita? Profissionais e universitários
não tinham acesso a livros ou participavam de palestras em
seus círculos de trabalho? A aliança política Roma-Berlim
entre Hitler e Mussolini não era um claro sinal que nuvens
carregadas sondavam os céus da Europa? Como entender
tamanha cegueira coletiva por parte dos judeus italianos?
A rigor, tal qual aconteceu na Alemanha do Terceiro
Reich, os judeus italianos se sentiam mais italianos que
judeus. Isto por não ter experimentado perseguições, as-
sassinatos e pogroms. Viviam de costas à Europa, princi-
palmente desconhecendo toda a dor e o sofrimento dos
judeus do leste europeu. Os judeus italianos também des-
prezavam a extrema pobreza e a religiosidade desmedida
dos “outros judeus”, aqueles que não eram como eles, acei-
tos como verdadeiros italianos.
Alguns pesquisadores acreditam que o Ducce estava lon-
ge de defender uma postura antijudaica e padrões aber-
tamente antissemitas; e que os líderes das comunidades
10
judaicas costumavam elogiar o movimento fascista dentro
e fora da sinagoga. Naturalmente, existem também outras
opiniões e interpretações acerca da identificação dos ju-
deus italianos face ao movimento fascista. Para estes es-
tudiosos havia uma real necessidade de que os ebrei fos-
sem tratados primeiramente como italianos e logo como
judeus. Assim, toda mobilização de judeus em favor de
Mussolini seria uma forma de expressarem seu extremo
nacionalismo e suas reivindicações cívicas. Talvez seja por
isto que os judeus consideravam o fascismo como uma
volta ao Risorgimento, a luta incansável do século 19 pela
consolidação da unidade nacional e cristalização da iden-
tidade italiana.
Numa reportagem feita ao escritor judeu-alemão Emil
Ludwig (23 de março de 1932), menos de um ano de Hi-
tler assumir o poder, Benito Mussolini afirmava: “Os ju-
deus italianos sempre tem se comportado como bons cidadãos
e tem combatido valentemente como soldados”. Não obstante,
o Ducce também costumava dizer que “os judeus são meus
piores inimigos”. É sabido que Mussolini impediu a sua fi-
lha Edda de casar com um judeu,finalmente consolidando
sua união com o Conde Galeano Ciano, a quem lhe ofere-
ceu poderes absolutos na política exterior do país.
Por inícios do século 20, para grande parte dos dirigen-
tes políticos da Itália, os augúrios de Marx não se haviam
cumprido: o capitalismo avançava rapidamente, o empo-
brecimento ganhava novos setores da população italiana e
os operários se integravam política e culturalmente às so-
ciedades ocidentais.O socialismo italiano,igual ao Partido
Social-Democrata alemão, virava cada vez mais reformista
e crítico. Ambos aceitavam o liberalismo político e prega-
vam fidelidade aos princípios marxistas. Em meio deste
turbilhão de ideias nasceu a proposta do fascismo.
O Ducce teve considerável colaboração de judeus em
sua Marcha sobre Roma. Ele mantinha ministros judeus
em seus gabinetes de governo e convivia com conhecidas
mulheres judias. Tudo isto parece entrar em choque com
o impulso que tomava o Partido Nacional-Socialista dos
Trabalhadores Alemães; o segundo partido em votos nas
eleições de 1930, força que tinha forte admiração pela
figura do Ducce Benito Mussolini. Desde 1922, ano da
ascensão dos fascistas, Mussolini era o ídolo mais respei-
tado e louvado pelos dirigentes nazistas. Fascistas italia-
nos e fascistas alemães se consideravam irmãos políticos
na empreitada modernista contra os fundamentos do co-
munismo e os fetiches liberais que acompanhavam his-
toricamente o Ocidente. O propósito era acabar com um
passado decadente originado na Rússia.
Em 1939, sete anos após a entrevista de Ludwig, foi
editado em Buenos Aires o livro “La última voltereta de
Mussolini” do judeu-italiano Eli Rubin, um ex-agente do
Ministro de Propaganda do Ducce. Nessa obra seu autor
afirma: “Na Itália o antissemitismo foi uma criação absoluta-
mente artificial, uma descoberta realizada por decreto do dia
para a noite”. Rubin acha também que o fracasso da inva-
são a Abissínia (1935-1936) e o envio de pessoas a campos
de trabalho forçado, represálias e inclusive o uso de gás
mostarda; fez o regime italiano procurar um “bode expia-
tório” que respondesse pelos erros do governo. A aliança
Roma-Berlim foi certamente responsável pela luta contra
o comunismo e contra o judeu internacional.
Os judeus italianos
Judeus habitam Itália desde tempos remotos. Eles po-
voavam os territórios do Império romano e a bacia do
Mediterrâneo desde antes do ano 70 d.C; data da des-
truição do Templo de Jerusalém. Chegaram desde o norte
atravessando os Alpes, desde a Germânia, migrando da
Gália e da Hispânia, desde tempos dos Reis Católicos em
1492. Comunidades judaicas surgiram ao norte e sul do
território italiano. Em Apúlia e Calábria os judeus pro-
testaram pela perda de direitos, em Pompéia havia ricas
comunidades devastadas pelo vulcão Vesúvio e em Saler-
no a Universidade de medicina contava com numerosos
docentes judeus. Ultimamente, vem sendo comprovada a
presença judaica na Sicília, especificamente em Brindisi,
Cápua, Venosa, Lavello, Matera, Siracussa, Caserta, Sessa,
11
ARTIGO
Sorrento,Alife,Sanseverino,Eboli Cosenza,Reggio e Ca-
tanzaro. Foram achados restos arqueológicos de sinagogas
dentro de igrejas e monastérios.
Judeus italianos atuaram no comércio, exportando para
o Oriente algodão, queijos e couros. Importavam também
produtos como arroz, índigo e linho para a indústria têxtil.
A comunidade de Palermo tinha rabinos que mantinham
contatos com os da Babilônia. Como Sicília pertencia ao
Reino de Aragão, seus judeus sofreram o desterro como
seus irmãos espanhóis. Fizeram parte da dispersão hispâ-
nica que se dirigiu a Nápoles, Roma, Bálcãs e o Império
turco-otomano. Nem todos abandonaram o país, alguns
adotaram a conversão para seguir vivos, mas despertaram
suspeitas das autoridades por manter suas práticas judai-
cas. Eles usavam apelidos de judaizantes freqüentes nos ar-
quivos da Inquisição, como por exemplo: Barone, Amato,
Campagna,Mazza,Bruno,Bonfiglio,Bonanno e Moncada.
A presença de Napoleão em 1797 levou à Itália os ide-
ais da “Declaração dos Direitos do Homem”. Os judeus
italianos ingressaram na modernidade deixando de lado
mentalidades e comportamentos típicos do gueto; ado-
tando o impulso doutrinário imposto pela Revolução
Francesa. A queda de Bonaparte e o Congresso de Viena
de 1815 - responsável pela divisão da Itália - retornaram
novos ares discriminatórios contra os judeus. Na Toscana
lhes confiscaram seus direitos políticos, em Piedemonte
foram confinados em guetos sendo-lhes proibido entrar
após 9 horas da noite, perderam suas vagas nas universi-
dades, foram expulsos das escolas, negando-lhes também
a possibilidade de empregar cristãos.Nos Estados do Vati-
cano e em Módena os judeus pagavam impostos especiais
para serem tolerados.
Durante o Risorgimento de 1848, movimento de afirma-
ção nacionalista italiano, os judeus obtiveram uma parti-
cipação destacada, encontrando-se líderes como os irmãos
Ciro e Giuseppe Finzi.Por 1870 havia na Itália aproxima-
damente 35.000 judeus, e a maioria atuava na vida política
do país. Eles se consideravam cidadãos italianos em igual-
dade de direitos com outros cidadãos.
Em 1920 a Itália contava com 350 senadores dos quais
19 eram judeus. A integração era total e definitiva. En-
quanto a maioria da população era analfabeta, os judeus
sabiam ler e escrever. Em 1930, 8% dos professores uni-
versitários eram judeus. Nesta lista encontramos sobreno-
mes como Levi, Beppo, Salvatori, Atílio, Ezio, Giuseppe,
Alessandro, Teodoro, Camilo e Renato. Outros sobreno-
mes achados são: Segré, Ângelo, Giorgio, Gino, Vittorio,
Beniamino,Tedeschi, Volterra, Ruggero, Fabrio, Luzzatto,
Vico, Mantovani, Ottolenghi, Ascarelli, Rabenne, Cassu-
to, Castelnuevo, Castiglione e Sermonetta. Entre sobre-
nomes de intelectuais judeus achamos: Sabatini, Pollitzer,
Liuzzi, Loria, Lattes, Sacardoti, Olivetti, Rabean, Tosca-
no, Pollaco, Treves, Diena, Salemi, Sarzoti, Leone, Sira-
cusa, Ara, Monterossi, Bevilacqua, Bolaffio, del Vecchio,
Sanguinetti, Colombo, Barzilai, Mondolfo, Schiff e Falcó.
O médico César Lombroso, ícone do positivismo e estu-
dioso da antropologia criminal, nunca negou sua origem
judaica. Por 1935 dentre 2.525 personalidades notáveis do
país, 169 eram judeus.
Judeus foram o novelista Alberto Moravia (pseudôni-
mo de Alberto Pincherle 1907-1990), o fundador do im-
pressionismo italiano Serafino da Tívoli (1826-1892), o
compositor e músico Alberto Franchetti (1860-1941), o
escritor e filólogo Alessandro d’Ancona (1835-1914), o
diretor das bibliotecas de Florença e Veneza Salomone
Morpurgo (1860-1942), o violinista e compositor Federi-
co Consolo (1841-1906), o matemático Túlio Levi Civittá
(1873-1941), Ernesto Nathan (1848-1921) o prefeito de
Roma entre 1907-1913 e o Primeiro Ministro Luigi Lu-
zzatti (1841-1927), deputado três vezes e organizador dos
Bancos Populares na Itália.
Os judeus de Mussolini
Mussolini nunca atuou sozinho. Ele contava com a per-
manente cooperação de militares, polícia, juízes, funcioná-
rios públicos,tecnocratas nacionalistas e forças conservado-
ras. Quinze anos após a pomposa Marcha sobre Roma, o
12
Ducce continuava dominando uma administração pública
cuja estrutura liberal foi herdada da 1ª Guerra Mundial.
Desde um primeiro momento o chefe de estado contou
com colaboradores judeus. Alguns surgiram como ele das
fileiras socialistas, mas abandonaram o internacionalismo
na 1ª Guerra. Dentre eles podemos mencionar a militan-
te política Margherita Sarfatti, filha de uma rica família
judaica fundadora da linha de “vaporettos” que circulava
pelos canais de Veneza. A Sarfatti possuía vasta cultura
e forte versatilidade para os idiomas, convertendo-se ra-
pidamente numa embaixatriz do fascismo nas mais im-
portantes capitais do mundo. Ela freqüentava salões de
pintura e embaixadas sendo considerada uma “rainha das
artes”. Ministrava palestras em universidades dos EUA
e escreveu o livro de maior exaltação fascista intitulado
“Dux” conhecido no mundo inteiro.
Outros judeus que apoiaram Benito Mussolini foram
Aldo Finzi, grande repressor dos antifascistas; e Carlos
Foá, um renomado fisiologista que publicou a revista “Ge-
rarchia” aprimorando as opiniões do pensamento fascis-
ta. Finzi participou na 1ª Guerra, liderou a Marcha sobre
Roma e ocupou a função de Vice-ministro do Interior e
membro do Conselho Geral do Partido Fascista.Em 1943
ele se uniu ao movimento socialista,sendo expulso do par-
tido e assassinado em 1944.
Na Marcha sobre Roma se destacaram aproximadamen-
te 300 judeus italianos. Dita manifestação contou com a
ajuda econômica de vários industriais da aristocracia do
norte do país. Ali Mussolini tinha amigos e simpatizantes
como Giovanni Agnelli da Fiat, Carlo Esterle, Mario e
Pio Perrone que apoiavam o jornal “Pópulo Italia”. Desde
sempre o Ducce solicitou ajuda de empresários, em espe-
cial da “Confederazione Generale dell’Industria Italiana”,
liderada entre 1919 e 1934 pelo judeu Gino Olivetti, um
reconhecido administrador. Durante a crise política que
se apoderou da Itália em 10 de junho de 1924, Olivetti
saiu em defesa de Mussolini, alertando à população que
qualquer insurreição política acarretaria desordem social e
a interrupção de uma vida econômica produtiva.
A crise financeira de 1929 e a queda de Wall Street nos
Estados Unidos levaram o governo fascista a manifestar-
-se em prol de grupos industriais como forma de reduzir a
fragmentação das propriedades e da administração.Indus-
triais judeus apoiavam o governo, criando-se bases legais
para motivar iniciativas privadas de produção.
Ao elencar as principais figuras do judaísmo italiano
entre 1850-1950, devemos relacionar os seguintes no-
mes: Guido Jung (1876-1949), Gino Arias (1879-1940),
Giorgio del Vecchio (1878-1940), H. Ancona, A. Luria e
T. Meyer (todos assessores econômicos e banqueiros), L.
Toeplitz (banqueiro) e Otto Hernan Kahan (filantropo),
Maurício Rava, Isaías Levi (1863-1949), Ugo Ancona
(1867-1936), Theodoro Meyer (1860-1942), Achille Lo-
ria (1857-1943), Ettore Ovazza (1890-1943), Ítalo Balbo
(1896-1940) e Pietro Badoglio (1871-1945).
Mussolini e o Sionismo
No decorrer dos anos 30, por meros interesses políticos,
Mussolini apoiava aos nacionalistas árabes da Palestina e
aos sionistas. Esta ambivalência se manteve até ele assi-
nar com Adolf Hitler um acordo de defesa mútua; mo-
mento em que o Ducce se posicionou abertamente “contra
o perigo judaico”. Diante desta realidade o líder da Itália
navegou por distintas águas: mantinha contatos e afetos
compartidos com Vladimir Zeev Jabotinsky (1880-1940),
virtuoso orador sionista, soldado e político fundador do
movimento revisionista. A agência de notícias fascista
“Avanti” comemorou em 1935 a celebração do Congresso
dos Sionistas Revisionistas pelo apoio oferecido à Itália
durante a campanha da Abissínia. Na ocasião Mussolini
comentou com o Rabino de Roma o seguinte: “As condições
necessárias para o êxito do movimento sionista dependem da
criação de um Estado judeu, de içar uma bandeira e deter uma
língua. Há uma pessoa que conhece isto muito bem, é o cidadão
fascista Jabotinsky”.
Jabotinsky foi influenciado por Theodor Herzl e ado-
tou o sionismo como bandeira. Durante a 1ª Guerra
13
Mundial criou a “Legião Judaica” e lutou pela libertação
da Palestina sob Mandato Britânico (1917-1947). Foi
oficial do 38º Regimento de Fuzileiros do Rei, comba-
tendo às ordens do general Allenby. Em 1918 Jabotinsky
se estabeleceu na Terra de Israel criando milícias judai-
cas para enfrentar os árabes. Fundou também o Betar,
um movimento juvenil sionista cujos membros vestiam
camisas pardas como os “squadristi” ou jovens fascis-
tas. Este sionista de direita que já admirava Mussolini
encontrou-se com o polonês Jozef Pilsudski; mas pres-
sionou o Congresso Sionista para repudiar a política do
Terceiro Reich.
Após a rápida adoção e instauração de leis racistas por
parte do Estado italiano em 1938, os fascistas iniciaram
uma campanha aberta contra o sionismo.A rigor,foram os
sionistas aqueles que entenderam que a derrota militar na
África levaria Benito Mussolini a entrar em oposição com
a Inglaterra e França, buscando uma aproximação com a
Alemanha de Adolf Hitler. Esta aliança - baseada em po-
líticas antissemitas - obrigava os judeus-sionistas italianos
a buscar uma fuga rumo à Palestina.
A publicação das “Leis de Nüremberg” em 15 de se-
tembro de 1935 atingiu os judeus alemães, mas não gerou
uma ameaça para os judeus italianos. Somente os sionistas
alertavam sobre o início de uma ação antijudaica que não
conheceria fronteiras. E eles não se enganaram. A cam-
panha antissemita na Itália iniciada em agosto de 1936
tinha como responsável Joseph Goebbels, o Ministro da
Propaganda do Terceiro Reich. A partir deste momento,
cinco jornais bancados pelo Ducce, se encarregariam das
campanhas de desprestígio aos sionistas; acusando-os de
importar uma “conspiração bolchevique”.
Por 1934 se comentava publicamente a existência de um
complô judaico para tirar Mussolini do poder. Quando a
polícia do Ducce prendeu um grupo antifascista denomi-
nado “Giustizia e Liberta”, a imprensa local destacou a
origem judaica de seus membros.Vários deles foram julga-
dos e condenados como Carlo Levi, Vittorio Foá, Leone
Guinzburg e Sione Segre.
Os judeus italianos conheciam o significado do perigo
ocasionado pela publicação das Leis de Proteção e Pure-
za do Sangue na Alemanha. Mesmo assim, poucos con-
seguiram enxergar o futuro. Enquanto Primo Levi fazia
progressos em seus estudos e participava de encontros da
Juventude Fascista (sem ser militante fascista), um cole-
ga seu de turma, Ennio Artom, acreditava que os judeus
sofreriam diante da crise iminente. As derrotas das forças
italianas e a pressão das potências ocidentais sobre Itália
recaíam em especial na França, Inglaterra, nos bolchevi-
ques e nos judeus. A discriminação do Estado ficou clara
quando o Ministério do Interior realizou o censo de 14
e 15 de fevereiro de 1938, solicitando pela primeira vez
que os cidadãos colocassem sua religião. Poucos meios de
comunicação repudiaram esta medida oportunista, intole-
rante e fascista.
A perseguição italiana
O antissemita Roberto Farinacci (1892-1945), ministro
de Estado de Mussolini,foi o responsável por fazer obede-
cer à aplicação das leis racistas na Itália. Em pouco tempo,
diretores de teatro receberam ordens de não exibir peças
de teatro de autores judeus; donos de livrarias não pode-
riam vender livros obras de judeus, sempre alertando do
perigo nacional. Os decretos do Conselho Fascista con-
gregado em 07 de outubro de 1938 levaram a vida judaica
à sua condição na Idade Média.Aqueles judeus que apoia-
vam o partido fascista experimentaram um sentimento de
tristeza, dor e desapontamento. Suas vidas ficaram sem
sentido ao serem expulsos das universidades, dos cargos
públicos e do exército.
O coronel Segre mandou todos seus soldados fazer uma
formação e diante deles se disparou um tiro na cabeça. O
general Ascoli fez o mesmo na sua própria casa. O edi-
tor judeu Ângelo Formiggiani se suicidou jogando-se de
uma das torres da catedral de Modena. Nenhum deles
teve direito a avisos fúnebres nos jornais por serem judeus.
O governo italiano decidiu aumentar a pressão por meio
ARTIGO
14
de uma programada operação policial na qual se obteria
maiores informações sobre os judeus do país: perfil de
cada família, tipo de lar, status econômico, etc. A burocra-
cia fez que decretos antijudaicos se convertessem em leis.
Jornais como “La stampa” acusavam diariamente os ju-
deus. Num editorial podemos ler: “Se o Estado fascista é
totalitário, não pode permitir que a cultura italiana se veja
contaminada pelo Judaísmo”. A palavra “contaminada”era
algo novo na Itália, porém bem conhecido na Alemanha.
Mussolini sabia que essa onda antissemita seria do gosto
de Hitler com quem se uniria no pacto Roma-Berlim-
-Tokio.
Desde 1934, Benito Mussolini e seu Ministro Roberto
Farinacci; se empenhavam em esclarecer a seus cidadãos;
que os italianos pertencem a uma raça ariana etnicamen-
te homogênea e superior àquela dos espanhóis, romenos,
gregos e levantinos. Odiado pela esquerda italiana, Fari-
nacci caiu prisioneiro dos partisanos que o executaram
sem muita cerimônia em 1945.
Em tempos da Kristallnacht (9-10 de novembro de 1938)
na Alemanha; os italianos que pretendiam sair da Itália
não podiam extrair mais de 2.500 liras. Segundo estatís-
ticas, nesse período abandonaram o país 6.000 cidadãos,
e alguns pagavam para obter passaportes falsos. A família
de Primo Levi preferiu ficar. Cesare, seu pai, afetado por
um devastador câncer de estomago, sugeriu a conversão
ao Cristianismo; mas todos se negaram. Nos cafés era co-
mum um cartaz: “Judeus não são bem-vindos”. Judeus que
não se cadastravam na polícia eram tomados prisioneiros
e encarcerados.
Em menos de um ano, até meados de 1939, aproxi-
madamente 550 judeus destacados nas ciências, letras,
artes, comércio e indústria, conseguiram sair da Itália.
Dos 42.000 judeus existentes durante a 2ª Guerra, 5.000
foram deportados para campos de concentração e ex-
termínio alemães. Destes, poucos retornaram com vida.
Durante o Holocausto foram assassinados 17% do total
dos judeus italianos. Em Trieste, de um total de 6.000
judeus, ao finalizar a guerra não haviam sobrado mais
de 900. A blitz mais importante de judeus aconteceu em
Roma em 16 de outubro de 1943. Foi uma parceria entre
alemães e italianos, na qual 1.000 homens, mulheres e
crianças foram obrigados a abandonar suas casas, sendo
transportados ao gueto e levados em trens a Birkenau.
Como é de público conhecimento, o Papa Pio XII não se
pronunciou oficialmente contra a perseguição aos judeus
da Europa.
O regime fascista jamais demonstrou compaixão com
seus inimigos. Entre 1930-1934 foram detidos e encar-
cerados 6.000 comunistas e antifascistas, todos sem julga-
mento. Em abril de 1940 Hitler ocupou a Dinamarca, em
maio invadiu os Países Baixos e Paris. Em 26 de maio de
1940, um subsecretário do Ministro do Interior de Mus-
solini escreveu ao chefe da Polícia Arturo Bocchini: “O
Ducce deseja que se preparem campos de concentração para pri-
sioneiros, inclusive judeus”.
Por 1941 o número de detidos havia aumentado para
11.000 pessoas e em 1943 a Itália já contava com 51 cam-
pos de concentração, quase todos localizados ao sul. Não
eram campos de barracas com arame farpado, eram esco-
las, conventos, fortalezas, castelos abandonados e edifícios
improvisados. Havia ainda lugares especialmente destina-
dos para judeus e outros mistos.Não encontramos campos
de extermínio como Auschwitz nem tampouco campos de
trabalho forçado.
Às vezes fica difícil julgar a pessoas que viveram uma
guerra há mais de 70 anos atrás. Mas, é preciso perguntar-
-se que cegueira tomou conta dos judeus fascistas italianos
que não avistaram o futuro negro que lhes estava reserva-
do? Será que negando a realidade conseguiriam fugir dela
mesma? Acaso era uma verdadeira necessidade de não se-
rem enquadrados como estranhos para poderem reivindi-
car uma igualdade desejada? Difícil prognosticar. Aqueles
que conseguiram vistos fugiram. Porém, uma maioria de-
cidiu continuar na Itália amarrada aos governos de turno.
Alguns seguiram seus estudos, outros acharam trabalhos
ocultando seu Judaísmo, e um terceiro grupo se uniu aos
partisanos combatendo nas fileiras da resistência.
15
Primo Levi e Dan Vittorio Segre
Depois do assassinato de vários membros de sua famí-
lia, Primo Levi se incorporou à luta guerrilheira organi-
zada contra os alemães ao norte da Itália. Após a queda
de Mussolini em julho de 1943, estava prestes a combater;
mas foi denunciado e feito prisioneiro em dezembro. En-
viado primeiramente ao campo de detenção de Rosoli di
Capri, dois meses depois seria levado a Auschwitz. Como
é sabido, sobreviveu por seus conhecimentos de química.
Ao ser liberado Auschwitz pelos russos, Levi percorreu
quase toda a Europa destruída, retornando a Turim, sua
cidade natal. Nunca mais se afastou da casa paterna nem
da cidade amada, dedicando sua vida profissional a uma
fábrica de tintas, especializando-se na produção de esmal-
tes sintéticos.
Em 1946 Primo Levi entregou ao professor de sua esco-
la secundária Cesare Pavese os manuscritos de “É isso um
Homem”. Pavese entendeu que aquele não era o momento
ideal para publicar a obra, pois não era conveniente ler
uma publicação que transmitia dor. Havia que olhar para
o futuro e esquecer o sofrimento. Não obstante, Levi con-
seguiu colocar as descrições dilacerantes da obra nas pra-
teleiras das livrarias. Seu belo texto passou inadvertido na
crítica italiana como também na opinião publica em geral.
Ganhou notoriedade somente quando a editora Einaudi o
publicou. Até 1955 não era prudente nem de bom senso
falar do Holocausto. Em 1960 esta obra reflexiva sobre o
comportamento psíquico e humano apareceria na Alema-
nha e Inglaterra. Na França virá à luz depois do suicídio
do autor.
Primo Levi teve vergonha e culpa por ter sobrevivido à
guerra. Sobreviver era em certa forma um ato de automu-
tilação. Ele faz parte daqueles escritores que presenciaram
a queda da natureza humana em todas suas vertentes; to-
cando o fundo do poço,enxergando passivamente a humi-
lhação e a decadência do homem. Certamente, seu suicí-
dio tem tudo a ver com a depressão que o acometeu ao ver
em livros e discursos a negação do Holocausto.
Outro escritor italiano que narra suas experiências em
tempos de guerra é Dan Vittorio Segre, um judeu de fa-
mília rica, criado por governantas, que também sofreu an-
tissemitismo até 1938. Neste ano ele consegue fugir para
Palestina, se incorpora ao serviço diplomático israelense
para encerrar sua vida como professor da Universidade
de Haifa. Nos 16 anos em que viveu na Itália, Dan Segre
participou com total naturalidade nas organizações fascis-
tas (Balilla e Avanguardisti); como também das exibições
ginásticas organizadas pelo partido do Ducce.
A mãe de Dan Segre, uma militante da divisão feminina
do fascismo, obteve uma autorização para que Dan pudes-
se ausentar-se na escola das aulas de religião. Nas 5as fei-
ras ele fazia aulas de Tora para seu Bar Mitzva. Seus pais
começaram a reparar o perigo fascista em 1937, quando
grupos de baderneiros (protegidos pela polícia) entraram
numa sinagoga, interrompendo com gritos antissemitas os
serviços religiosos e batendo nos judeus ali presentes.
Somente as consequências da guerra e os tormentos dos
campos de concentração levaram Primo Levi a assumir
sua condição judaica. Ele escreveu: “Esta experiência dupla,
as leis racistas e o campo de extermínio, estão gravadas em mim
como uma placa de aço. Agora sim sou judeu, costuraram em
mim a estrela de Davi e não apenas nas minhas roupas”. E de-
pois diz: “O verdadeiro crime, o crime geral de todos os alemães
daquela época, foi a falta de coragem para falar”. Seguindo
à risca esta afirmação, poucas são as confissões de judeus
fascistas italianos reconhecendo o maior erro estratégico: a
crença de poder separar a experiência italiana da alemã, de
acreditar que Mussolini atuaria sozinho e por conta pró-
pria, e imaginar o fascismo na Itália como uma ideologia
redentora. Estas pessoas achavam que seu italianismo os
levaria a uma salvação espiritual e que o nacionalismo fer-
voroso os salvaria como judeus.
Os judeus italianos se deixaram levar por um comodis-
mo burguês. Mussolini tinha entregado a eles uma nação
sem conflito de classes e sem greves,propicia para obterem
vantagens econômicas e profissionais; portanto estavam
orgulhosos em demonstrar sua condição de italianos e não
de pessoas excluídas das grandes decisões do país.
ARTIGO
16
A partir de 1938 Itália e Alemanha eram aliadas. Mus-
solini e Hitler manifestavam uma admiração mútua. Os
contatos diplomáticos, políticos e militares nunca estive-
ram melhores. Porém, para os nazistas o antissemitismo
não foi algo secundário, pois fazia parte central de sua
ideologia desde o século 19. O Judaísmo foi alvo prefe-
rido do ódio popular. Alemanha desejava construir uma
“comunidade de sangue germânica”; portanto, considerou
o povo hebreu um fator destrutivo do povo alemão, uma
praga que precisa ser exterminada.
Os maus tratos impostos aos judeus na Alemanha gera-
ram manifestações em organismos de justiça na Inglaterra,
França, Suécia, Suíça, Argentina e Estados Unidos. Nada
disto fez a Itália. O antissemitismo alemão não poderia
ter sido ignorado pelos judeus italianos. Por 1932 havia
mais de 500.000 judeus na Alemanha. Poucos meses de-
pois, já com Hitler no poder; boicotes e queima públi-
ca de livros, destruição e incêndios de lojas e sinagogas,
afastaram os judeus da vida sócio-econômica do país.
Todo centro de cultura e lazer (cinema, teatro e praças)
foi “arianizado” e “limpo de judeus”. Era o “sauberung”
italiano. Os judeus não poderiam adquirir automóveis,
motocicletas ou qualquer outro meio de transporte. Es-
tavam à margem da sociedade.
Em 1939,um ano depois da adoção das “Leis de Nürem-
berg” pelo Ducce, havia na Alemanha somente 200.000
judeus. O resto havia emigrado. Emigrar era privilégio de
poucos, pois requeria dinheiro. Aqueles que ocultavam sua
condição judaica apresentando-se nos consulados como
italianos (sem informar a religião) tinham chances de se-
rem aceitos, pois a maioria dos países não aceitava judeus.
Encerro nosso tema com as palavras da historiadora Vi-
viane Forrester em “O crime ocidental” (Buenos Aires,
2008): “Os países mantiveram sempre um número de cotas
migratórias reduzidas, deixando os judeus pegos na ratoeira
hitlerista, sem nenhuma esperança, alternativa ou recursos.
Todos enganavam os judeus, sempre reticentes. Moral desta
história: em todo lugar compensa auxiliar o horror”.
Bibliografia:
Bobbio, Norberto. Ensayos sobre el fascismo. Universi-
dad de Quilmas. Prometeo Libros. Buenos Aires 2006.
Forrester, Viviane. El crimen occidental. Fondo de Cul-
tura Económica. Buenos Aires 2008.
Gutman, Daniel. El amor judío de Mussolini: del fascis-
mo al exilio. Editora Lumière. Buenos Aires 2005.
Paxton, Robert O. Anatomia do Fascismo. Editora Pe-
nínsula. Barcelona 2005.
Orano, Paolo. Gli ebrei in Italia. Casa Editrice Pinciana,
Roma 1937. [Los judíos en Italia, Roma 1937].
Orano, Paolo. Mussolini fondatore dell’impero fascista.
Casa Editrice Pinciana, Roma 1940.
Rubin, Eli. La Última Voltereta de Mussolini. Editorial
Argumentos. Buenos Aires 1934.
Segre, Dan Vittório. Memoirs of a Fortunate Jew-An
Italian Store. The University of Chicago, Press. Chicago
2008.
Sternhell, Z.; Sznajder, M.; Asheri, M. El nacimiento de
la ideología fascista. Editora Siglo XXI. Madrid 1994.
Thompson, Ian. Primo Levi. Editorial Belacqua. Barce-
lona 2007.
Prof. Reuven Faingold é historiador e educador, PHD em História e
História Judaica pela Universidade Hebraica de Jerusalém. Profes-
sor titular da pós-graduação no Departamento de História da Arte
da FAAP em São Paulo e Ribeirão Preto, ele é também sócio fun-
dador da Sociedade Genealógica Judaica do Brasil e, desde 1984,
membro do Congresso Mundial de Ciências Judaicas de Jerusalém.
17
ARTIGO
MEU CONVÍVIO COM
A COLÔNIA JUDAICA
CONSUELO PONDÉ DE SENA
M
oramos muitos anos
no bairro de Nazaré,
reduto preferido dos
judeus de Salvador,
que se espalhavam pelo Jardim de
Nazaré, Jôgo do Carneiro, Desterro
e redondezas, próximo da Baixa dos
Sapateiros, onde muitos daqueles
imigrantes possuíam estabelecimen-
tos comerciais. Também era accessí-
vel a todos, por causa da proximidade
dos colégios, que dispensava despesas
com os bondes.
Outros tantos, menos abonados,
mascateavam para sobreviver. Eram
vendedores ambulantes que ofereciam
seus produtos pelas ruas, tendo clien-
tes nos mais distantes bairros da cida-
de.Tenho certeza que foram os judeus
que introduziram as vendas a prazo
em nosso meio. Também no Dester-
ro estava situada a Sinagoga, em cujo
prédio da Rua Santa Clara funcionava
a Escola Israelita Brasileira. Segundo
Thales de Azevedo, teria existido ou-
tra sinagoga na Rua do Alvo, frequen-
tada por poloneses. Dessa, confesso,
jamais ouvi qualquer menção.
Por volta da década de 1940 ali nos
estabelecemos, primeiramente, na
casa de minha avó paterna, na Rua
Santa Clara do Desterro nº 8, resi-
dência que fora doada à família do
juiz Pedro Faustino de Souza Condé,
cognominado “O Bom Juiz”, por in-
termédio de A Tarde, em campanha
conduzida pelo jornalista Ernesto
Simões Filho, íntimo amigo de meu
tio-avô, Ezequiel de Souza Pondé, ir-
mão do falecido.
Talvez por desejar residir próximo
de sua família, meu pai adquiriu uma
morada na Rua Franco Velasco, nº 8
(Ladeira do Desterro) um simpático
bangalô pintado de azul claro. Igual a
ele, só existia um outro bangalô, pin-
tado de verde, de propriedade do Sr.
Bernardo Grossman, casado com D.
Berta e pais de Mirinha (Myriam),
Feiga, Frida (Tita) e Moishe, a quem
chamavam de Moischinho. Na parte
inferior da residência, morava a famí-
lia de Sr. Pedro Vaimberg e D. Sônia,
que só tinham uma filha, Sara, mais
tarde, Sra. Leão Rozemberg (Lio-
va) que residiam, isoladamente, na
Ladeira dos Galés. Eram irmãos de
Liova: Líuba e José.
Sobre a nossa família, assim escreve
Esther: “O que possuía melhor situa-
ção era mesmo o doutor Pondé. Nas-
cido na terra, já conhecia grande par-
te da sociedade baiana, enquanto que
nossos pais, estrangeiros, precisavam
ainda entender sua gente e participar
do tecido social. Naquele tempo, mal
frequentavam as raras estatísticas”.
Com efeito, eram situações diame-
tralmente opostas. Meu pai, médi-
co clínico, atendia a vários pacientes
judeus em suas próprias residências,
a todo e qualquer momento que era
convocado. Humano, não estabelecia
preço para os serviços que prestava,
recebendo, em envelope lacrado tudo
que aqueles imigrantes lhe retribuíam.
Lembro-me que, certa feita, indaguei:
pai, eles lhe pagam o que querem ou
o que é justo? Ao que ele respondeu
categórico: “minha filha, eles são imi-
grantes, pagam o que lhe podem”.
Logo ao lado da nossa casa, na de n°
6, vivia a família do seu Jacob Bauer,
pai de Esther e Linda, que tempos
depois se mudaram para São Paulo.
Mais tarde, na mesma morada viveu
a família Schnitman, pais de Simão
e Ângelo (Anjinho). Não me recordo
de existir um irmão mais novo.
Em seguida, encontrava-se o gran-
17
1818
de casarão do Sr. Salomão Lipcovitz,
casado com D. Frima e pais de Mary
e Clara. Era uma grande roça onde
existia uma frondosa mangueira em-
baixo da qual se reunia a meninada da
rua sob os protestos do proprietário.
Este se sentia importunado com as
presenças incômodas dos meninos
que jogavam pedras na mangueira
para colherem suculentas mangas. As
meninas também ali se reuniam para
conversar, mas não causavam qual-
quer estorvo.
Naquele grande edifício mora-
vam muitas famílias, inclusive, a do
Sr. Marcus Palatnick, casado com
D. Rouge, pais de Esther Regina e
Fanny. Esther é a consagrada escri-
tora Esther Largman, que há muito
tempo mora no Rio de Janeiro. Au-
tora de “Jovens Polacas” (1993), ”Tio
Kuba nos Trópicos”( 1999), Jan e
Nassau (1996). Publicou também
“Judeus nos Trópicos” (2003).
Depois que se transferiu para o Rio,
onde terminou o Curso de Geografia
e História, iniciado na Faculdade de
Filosofia, Ciências e Letras da Bahia,
hoje UFBA, perdi Esther de vista.
Quando lançou no Rio de Janeiro,
em 1999, seu romance “Tio Kuba nos
Trópicos”, Carlos Kertész tomou co-
nhecimento do trabalho e me infor-
mou que me encontrava entre as me-
ninas citadas pela autora, escondida
sob o nome de Sueli. Assim escreve:
“Havia deixado pra trás o primário,
as brincadeiras de roda, tão queridas.
Eu, Gusta, Sara, Clarinha, Mirinha
e Sueli. Esta não era judia, filha do
Dr. Condé, regulava conosco em ida-
de e sempre entrava nos folguedos.
Possuía uma irmã mais velha e dois
irmãos. Havia também uma meni-
na, Lurdinha, filha de pai judeu, mas
sua mãe não era. Hoje dou-me conta
de que aceitávamos de bom grado a
companhia de Sueli; mas Lurdinha
nem tanto; talvez de ouvirmos os
mais velhos comentarem sobre essas
famílias, então raras àquela época”.
Ao comentar a rígida endogamia
então existente acrescenta Esther:
“O casamento dentro da comuni-
dade chegava às raias da endoga-
mia, muitos cavalheiros precisavam
chamar primas do velho continente
para esposas”. Com efeito, participei
como observadora à distância, na-
turalmente, do namoro e posterior
casamento de Mary Lipcovitz com
o brasileiro Humberto Quadros, que
foi um “Deus nos acuda“ de sobres-
salto para a família e a sociedade.
Antes deles, casaram-se à revelia do
grupo, a bela Sara Orestein que se
uniu ao Dr. Pacífico Ribeiro, homem
de talento reconhecido, mas estranho
à comunidade.
Como o desejável eram as uniões en-
tre judeus, para fins de identidade, os
realizados fora daquele círculo eram
repudiados. Esther Largman também
se refere ao preconceito contra os se-
fardis, aqui chegados após a primeira
guerra mundial, procedentes dos Bal-
cãs e Oriente Médio. Acrescenta ain-
da: “O grupo vivia isolado e margina-
lizado – por um lado pela população
local,devido à diferença como estran-
geiro e, por outro, do grupo ashkena-
zi, porquanto faltava-lhes identidade
de língua, cultura e mesmo de ritos
religiosos”. Concluindo, arremata:
“Em ambas as gerações era mais fácil
um sefardin unir-se a um não judeu
do que casar-se com um ashkenazi”.
Residiam em outros pontos da cidade,
na Rua Areal de Baixo e Largo Dois
de Julho, onde praticavam seus ritos
religiosos.“Dedicaram-se ao pequeno
comércio, às vendas de importação
e exportação, bem como de tecidos,
sendo muito auxiliados pelos mem-
bros da família”. Conheci pouquíssi-
mos deles, que me foram apontados
por minhas amigas, mas não enten-
dia o porquê daquela segregação.
Ainda em compartimento do mes-
mo edifício residia o pai de Rubem
Tabacof, não sei se Moishe ou Leo-
nel. Vestia-se sempre de negro e sua
aparência era, de certa forma, estra-
nha. Abaixo da roça do Sr. Salomão,
seguia-se outro casarão situado no
pé da ladeira. Desse lado, existia a
morada dos Abramovitz, cujo chefe,
Sr. Marcus, um senhor muito gordo
e avantajado, casado com D. Rachel
e pais de: Abraão, Fernando (Chico)
e Mira. Do outro lado, do mesmo
edifício, viviam os Schreiber, pais de
Líuba e Arthur. Do lado ímpar, re-
sidiam muitas famílias baianas, exis-
tindo apenas uma morada de judeus,
a do Sr. Luís Portnoi e D. Guiomar
que tinham os seguintes filhos: Salo-
mão,Marina,Israel (Ziraé),Germano
(Exo) e Esther (Teté) .
Germano casou-se, muito mais
18
19
ARTIGO
19
tarde, com Sulamita Auster, filha de
Gerson Auster, que moravam na Rua
Climério de Oliveira (Limoeiro),cujo
parto fora feito por meu pai, autor da
sugestão do nome da recém-nascida.
Israel casou-se, em primeiras núpcias,
com Ida Bichucher que morava na
Ladeira da Prata onde também vi-
viam Sulamita (Shulames) e Sara. A
primeira casou-se com Bóris Tabacof
e a segunda com Lipe Goldestein.
Germano Tabacof, usava calças
curtas, como era moda para os ado-
lescentes, era o rapaz mais bonito da
redondeza. Sério, compenetrado, não
dava importância aos pequenos, mes-
mo porque já trabalhava com o pai,
conforme escreveu no primoroso ar-
tigo publicado em A Tarde, no dia 30
de dezembro de 2013.
Mais abaixo, na parte plana, próxi-
mo do Mercado São Miguel, morava
a família do Sr. Leonel Tabacof, pai
de Bóris, Germano, Gusse, David
(Duda) e Esther (Teté), fujona que
só ela. Certa feita Teté, com cinco a
seis anos de idade,escapou da vigilân-
cia da babá e foi encontrada, por um
guarda civil, no Pelourinho. Foi um
salseiro dos diabos!
Na Rua Santa Clara, nº 34, bem
em frente ao Convento do Desterro,
que frequentei com certa assiduidade,
existia no andar térreo o Armazém do
Senhor Manoel Gomes Pomar, um
galego simpaticíssimo que nos vendia,
por vezes fiado, balas e abafa-banca.
Apesar de não ser judia era aceita
entre eles, tanto assim que, muitas
vezes compareci às festas infantis da-
quela Escola e assisti algumas repre-
sentações teatrais.
Como é natural, os imigrantes ju-
deus viviam isolados no seu grupo,
diferentemente portanto dos outros
estrangeiros, como os espanhóis, cujo
processo de assimilação processou-
-se muito rapidamente, por conta da
estreita relação com os portugueses e,
certamente, pelo fato de abraçarem a
mesma religião - o catolicismo. Os
“russos” como genericamente eram
tratados todos os judeus,fossem aske-
nasis ou sefaradins, diferenciavam-se
entre si. Não sei se algum sefaradim
morava naquelas redondezas; penso
que não, viviam em outros bairros,
como nos Barrís e na Barra.
Percebia-se, claramente, que embo-
ra aparentemente constituíssem um
grupo coeso diferenciavam-se entre
si porque procediam de regiões muito
diversas. Conhecidos como “russos”,
divergiam, inclusive, pela orientação
política que adotavam. Assim, os pro-
gressistas tinham uma postura socia-
lista e cultivavam o ídiche; enquanto
os sionistas voltavam-se para o culto
da língua hebraica e sonhavam com
o estabelecimento do Estado de Isra-
el. De minha observação infantil, só
distinguia os sionistas e os que abra-
çaram o comunismo soviético. Esses
eram moços e moças, que cursavam
o Ensino Superior e eram facilmen-
te identificados pelos mais jovens.
Também percebi, porque era muito
atilada, que existia preconceito entre
os próprios judeus, a saber, entre os
ashkenazis de os sefardins .
Na minha condição de “gói”(não ju-
dia) só via as coisas pelas aparências,
não percebendo, portanto, as rivalida-
des existentes entre grupos diferen-
ciados. Para mim, na minha infantil
percepção, a maior diferença entre
nós estava centrada na religião, por-
que éramos adeptos de Jesus Cristo,
enquanto os judeus eram seus supos-
tos algozes. Apesar dessa diferença
marcante, que poderia ser imobiliza-
dora nas relações sociais, as crianças
não alimentavam qualquer resquício
de animosidade em relação a seus
amiguinhos de vizinhança. Davam-
-se bem, frequentavam as festinhas de
aniversário e entretinham-se com as
mesmas brincadeiras. Juntas pulavam
picula, jogavam macaco (amarelinha),
faziam rodas, cantavam as mesmas
canções, divertiam-se com os “cozi-
nhados”, sem que diferenças de ori-
gem e de crenças perturbassem o dia
a dia de cada uma.
De acordo com o relato de Esther:
“Minha irmã tinha suas amiguinhas.
Havia como uma estratificação de
amizade por faixas etárias. Assim
como eu brincava com as meninas de
dez ou doze anos, Stefany fazia parte
de um grupinho com garotas de sete
e oito anos. O mesmo ocorria com os
meninos e rapazes”.
A Sociedade Israelita da Bahia
reunia: Escola, Sinagoga, Biblioteca,
Grêmio, Grupo de Teatro Amador,
organizações juvenis de orientações
diversas, tendo o Sr. Marcus Palatini-
ck criado um coral a quatro vozes na
década de quarenta,grupo que segun-
19
2020
do Esther Regina, sua filha, partici-
pou de várias reuniões e foi convidado
para apresentar-se em Recife, onde
fez um concerto para a comunidade
daquela capital.
A grande maioria das crianças ju-
dias fazia o curso primário na Escola
Israelita Brasileira Jacob Dinenson,
financiada pelos pais dos estudan-
tes, que também a administravam e
promoviam campanhas para ajudar
na sua manutenção. Exercia o papel
de professor responsável pelas dis-
ciplinas do primário, àquele tempo
as quatro séries, o dedicado mestre-
-escola Octacílio Tibiriçá.
Curiosamente, quase todas as crian-
ças judias eram “obrigadas” a estudar
música, cujas aulas eram ministradas
por professores brasileiros, nas casas
dos alunos. Nem todos tinham ten-
dência para esses estudos “forçados”e,
sem aptidão para o piano ou o violino,
passavam horas e horas preparando as
lições, quando prefeririam brincar na
rua, subir nas árvores, ler gibi, brincar
de boneca e de outros divertimentos.
Da minha geração, poucos se desta-
caram como musicistas, tendo atuado
e se destacado como profissionais da
música: Salomão Rabinovitz e Do-
rinha, que, alías, não moravam na
Ladeira do Desterro, por algum tem-
po, denominada Franco Velasco, em
homenagem ao grande pintor baia-
no. Duas professoras de piano eram
requisitadas pela Sociedade Israelita:
Professoras Esther Cardoso e Rosita
Baptista. Quanto aos professores de
violino, só me lembro de professor
Filomeno, que dava aula a alguns me-
ninos da Rua Nova, extensão térrea
daquele logradouro, no qual as resi-
dências eram mais modernas e viviam
outros membros da comunidade, a
exemplo do Sr. Grossman, pai de Jay-
me e Natan - lembranças que não es-
tão muito vivas atualmente, porque a
convivência com essas pessoas não era
próxima. Tenho uma vaga recordação
de que os Wolfovitch também mo-
ravam na Rua Nova, em cuja casa de
esquina residia o terrível Valter Lima,
que nós todos respeitávamos pelas
peraltices que praticava para espanto
da garotada.
Curiosa, observava a relação ínti-
ma que existia entre certas senhoras,
que se reuniam toda tarde para jogar
e, o consequente distanciamento de
muitas outras que permaneciam em
casa, mantendo estranho isolamen-
to. As que eram muito próximas in-
tercambiavam receitas e se ajudavam
mutuamente, em casos de festas e
aniversários. Eram extremamente so-
lidárias. Nem todas, porém, moravam
no Desterro, mas nas proximidades,
de tal forma que vinham a pé do Jogo
do Carneiro e do Jardim de Nazaré.
Lembro-me muito, e com saudades,
de uma amiga especial, Sara Spilberg,
com quem tinha muita afinidade,pois
ambas éramos muito sonhadoras.
Penso que morava no Jogo do Car-
neiro. Fato é que, quase todas as tar-
des, ela aparecia em minha casa para
conversarmos. Recostadas no muro
ou sentadas nos bancos de cimento
da nossa área externa iniciávamos o
papo costumeiro. Falávamos do “nos-
so mundo”, daquele em que somente
nós duas existíamos. Nossas famílias
eram extintas. Assim, donas do pe-
daço, imaginávamos que tomaríamos
todos os sorvetes da Primavera e nos
deliciávamos com as balas e chocola-
tes da Baby,uma confeitaria bem pró-
xima da Baixa dos Sapateiros . Certo
dia Sara veio fazer uma grande reve-
lação. Grande e triste. Como sua fa-
mília era sionista, todos da casa iriam
morar em Israel. Despedimo-nos sem
imaginar que o destino nos separaria
para sempre.
Essas lembranças seguem comigo
pela vida afora como marcos agra-
dáveis de uma convivência salutar. É
certo que essas recordações trazem
consigo algum sentimento de per-
da, de nostalgia. Entretanto, para o
notável Pe. Antônio Vieira: “Não há
alegria neste mundo tão privilegiada,
que não pague pensão à tristeza”.
Amigos da infância que se mantêm
fieis por toda a vida são os melhores
porque resistem à prova do tempo.
Algumas dessas amizades dissolvem-
-se diante da ausência prolongada,
porque carecem da convivência. Sigo,
porém, o pensamento de Camões, se-
gundo o qual, “A verdadeira afeição
na longa ausência se prova”.
A manutenção dessas preciosas
amizades de infância é uma prova da
constância do verdadeiro afeto.
Presidente do Instituto Geográfico e Histó-
rico da Bahia e membro da Academia de
Letras da Bahia
21
ARTIGO
E
mbora minoria no conjunto imigrante, os ju-
deus que se estabeleceram em São Paulo e
Rio de Janeiro a partir da primeira década do
século XX, identificados pela fé e tradições
milenares, diferenciavam-se pelo idioma, traços culturais
e tipo físico. Enquanto os asquenazis, procedentes das co-
munidades judaicas da Europa Oriental, expressavam-se
em iídish, os sefaradis, em ladino e, os judeus orientais,
em árabe. Condições históricas e culturais permitiram que
os judeus ibéricos se evidenciassem pelo cosmopolitismo e
liberalidade, enquanto os asquenazis e os judeus orientais
no conservadorismo. Economicamente melhor situados,
os sefaradis, procedentes de cidades otomanas de refú-
gio (Esmirna e Istambul), escolheram residir em bairros
aprazíveis e residenciais de São Paulo e do Rio de Janei-
ro. Fiéis observantes da religião, comumente dirigidos por
eminentes rabinos, os esmirlis de São Paulo conseguiram
contratar o rabino Jacob Mazaltov, natural de Istambul
que prestara serviços à comunidade sefaradi de Montevi-
deu.O religioso marcou época na sinagoga da Comunidade
Israelita Sephardi, inaugurada em São Paulo de 1929. Em
cerimonial solene, trajando vestes brancas e, preocupado
com o entendimento das rezas, Mazaltov as interrompia
para explicá-las aos presentes, fato que conduziu à sina-
goga judeus de várias procedências, sobretudo depois da
criação do Centro Recreativo Brasileiro Amadeu Toleda-
no, o CIBAT.
Judeus Marroquinos:
São Paulo e Rio de Janeiro
RACHEL MIZRAHI
O texto contou com o apoio de Samuel Elis Azulay Benoliel, Presidente do Conselho Se-
faradi do Rio de Janeiro e das irmãs Barki, Rosa B.Israel e Matilde B. Menasce.
Instalados em São Paulo a partir da primeira década do
século passado, os imigrantes sefaradis do Oriente Médio
caracterizaram-se por abrir as portas de sua sinagoga a to-
dos que a procurassem,certamente inspirados pelo Profeta
Isaías que pressagiou “que minha casa seja a casa de oração
de todos os povos”, dístico colocado na entrada do edifício
da Sinagoga Beth-El do Rio de Janeiro. Da mesma forma,
assim construída, a sinagoga sefaradi paulista recepcionou
a partir de 1930, judeus procedentes da Itália, Grécia, Bul-
gária, antiga Iugoslávia e aos asquenazis alemães, de linha
liberal - imigrantes e refugiados das perseguições antisse-
mitas, perpetradas pelo Nacional Socialismo Alemão em
seus países de origem.
Judeus marroquinos do Norte brasileiro que se transferi-
ram para o Rio de Janeiro surpreenderam-se com a antiga
União Israelita Shel Guemilut Hassidim, sinagoga construí-
da por imigrantes alsacianos e oficializada pelo Imperador
D. Pedro II em 1873. Entre os que se filiaram à sinagoga
estava David José Pérez,nascido em Breves,no Pará.Pérez
buscara o Rio de Janeiro depois de completar estudos nas
yeshivot da cidade de Tânger, cidade natal de seu pai, que
o acompanhara.
No Rio de Janeiro, Pérez dedicou-se à docência em es-
colas oficiais e particulares, chegando a emérito professor
do famoso Colégio Pedro II. Depois do cursar Direito,
doutorou-se em Ciências Econômicas, partindo para uma
brilhante e elogiada carreira profissional, projetando-se na
22
vida cultural do Rio de Janeiro por artigos publicados em
jornais da capital fluminense1
. Em 1916, fundou “A Colu-
mna”, jornal mensal escrito em português sobre assuntos
judaicos e sionistas. O humanista Álvaro de Castilho era
seu sócio e colaborador2
. Os artigos desses diretores obje-
tivavam esclarecer ao público sobre o judaísmo e a história
dos judeus no Brasil e outros locais da diáspora. Em 1922,
Pérez aceitou dirigir a Escola Maguen David, primeiro
estabelecimento de ensino judaico do Rio de Janeiro, do
qual surgiu o conhecido Colégio Hebreu Brasileiro.
A partir dos anos 20, a Shel Guemilut Hassidim recepcio-
nou as famílias dos Azulay, Bemerguis, Abecassis, Benze-
cry, Bensussan, Benarrosh, Zagury, Benoliel, Benchimol,
Benjó, Bentes, Garson, Ezagui, Obadia e os Eshrique,
migrantes judeus da Amazônia brasileira que, aos poucos
passaram a predominar nos cargos diretivos da sinagoga.
Yomtob Azulay, por exemplo, elegeu-se Presidente e per-
maneceu na função por 38 anos, depois que a sinagoga se
transferiu para Botafogo. Os marroquinos diferenciavam-
-se pela escolaridade em bancos de Universidades euro-
peias: os irmãos Rubem David, Elias e Jacob Azulay des-
tacaram-se na área médica (dermatologia e psicanálise) e,
Rubem David Azulay chegou à Presidência da Academia
Brasileira de Medicina.
Dos migrantes marroquinos que se estabeleceram na si-
nagoga sefaradi de São Paulo, sob os cuidados de Men-
del Wolf Diesendruck, prestigioso rabino austríaco, estão
os Athias, os Levy, Alves, Bensadon e os Melul. A franca
recepção sefaradi aos marroquinos foi motivada pela lem-
brança de Amadeu Toledano, judeu da Ilha de Malta, que
batalhou pela construção da sinagoga sefaradi em 1929.
Entre os migrantes nacionais, destacamos Eliézer Moy-
1 MALVEIRA, Antonio Nunes. Achegas para uma biografia do Professor
David José Pérez. Caderno nº. 3 - Colégio D. Pedro II, Rio de Janeiro,
1983. Preocupado com problemas do povo judeu, José Pérez inscre-
veu-se no Primeiro Congresso Judaico Mundial onde se postulava a
criação de um Estado. Em 1917, dando apoio à Declaração Balfour,
Pérez traduziu e prefaciou a obra de Theodor Herzl, no Brasil.
2 Álvaro de Castilho acreditava que o “sionismo deveria fazer parte
do movimento humanista”. FALBEL, N. A Imprensa Judaica. Revista M
orashá. CBSP, São Paulo: dezembro 1977.
sés, nascido na região amazônica em 1878, quando salien-
tou-se por servir no batalhão da Guarda Nacional, criado
pelo Imperador D. Pedro II quando conseguiu patente
de Coronel. Ao candidatar-se para Prefeito de Maca-
pá, conseguiu eleger-se. Conhecido como “Major Levy”,
permaneceu no Território do Acre de 1932 a 1947. Em
São Paulo, sua filha Rachel casou-se com Siegbert Simon,
de origem alemã e, frequente da sinagoga sefaradi desde
1936. Formado na Alemanha, de cultura diversa, Simon
adaptou-se aos costumes judaicos da esposa, trazidos da
Amazônia marroquina.
O mesmo acontecera com Carlos Kertész, cujo pai era
procedente da comunidade judaica húngara e a mãe, dos
Mellul marroquinos, nome aportuguesado para Mello.
Carlos Kertész pertence à quinta geração brasileira das fa-
mílias Mellul de Tânger e Aferiath de Mogador, uma vez
que seus trisavós,bisavós e avós já eram nascidos no Brasil.
A família aportara no Brasil em 1824 e,a crise da borracha
os levou de Belém do Pará a Fortaleza e Recife, até decidir
em 1920 fixar-se em Salvador da Bahia. Seu irmão, Mário
de Mello Kertész elegeu-se prefeito da cidade em duas
oportunidades, na década de 1980. Carlos Roberto de
Mello Kertész que por seis anos dirigiu a comunidade ju-
daica da Bahia reside hoje com sua família em São Paulo e
é,vice-presidente do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro.
Outro emérito participante da sinagoga foi Isaac Athias
que, antes de se estabelecer em São Paulo passara por Re-
cife quando conheceu e se casou com Amélia Dimenstein,
estudante de Medicina. Parente de Elisia Sarraf Hakim,
Athias associou-se em São Paulo com Moisés Hakim,
proprietário de “Ao Movelheiro”, famoso estabelecimen-
to comercial de móveis para escritório. Athias conseguira,
ainda no Norte, formar-se em Contabilidade. Sua exem-
plar formação religiosa foi conseguida por ter sido aluno
de Elias Israel, considerado “Tzadic”, pela sua dedicação
aos estudos, porque preocupado com o ensino das tra-
dições judaicas às crianças judias na cidade de Belém e,
filho de Leão Israel que negociava com o látex. Seu pai
lhe proporcionara esmerada educação em centros judaicos
23
da Europa. Em busca do conhecimento, as crianças judias
da região locomoviam-se em barcos através dos caminhos
naturais da região, percorrendo distâncias enormes para
estudar,sob os cuidados de Elias Israel e sua esposa Sol,da
família Mamann Bendrihen.
A religiosidade de Isaac Athias permitiu que assumisse
o cargo de secretário da Congregação Sefaradi de São Paulo,
durante gestão de Moisés Carmona.Por falar fluentemen-
te o português, Athias passou a liderar a comunidade que
o acolhera em órgãos administrativos judaicos como a FI-
SESP e na CONIB, em âmbito nacional.
Outro sefaradi de destaque foi Moisés Hakim, nascido
em Esmirna que chegou ao Rio de Janeiro em 1922, pro-
cedente do Egito, ao chamado de Joseph Aliman, tio ma-
terno. Em São Paulo, Moisés Hakim casou-se com Elísia
Roffé Sarraf, filha de antigos moradores judeus de Belém
do Pará e doadores do terreno - “lugar santo”- o cemitério
da comunidade judaica do Norte brasileiro.
Um marroquino que se enquadrou de forma feliz entre
os judeus do Oriente Médio, estabelecidos na Mooca, foi
Jacques Sarraf. Acompanhado da esposa Vitória Siles e,
procedentes da velha cidade de Safed, Jacques Sarraf ins-
talou-se na sinagoga da União Israelita Paulista, fundada
pela família de Mário Amar, da mesma origem. Poliglota,
extrovertido, ousado e comunicativo, Sarraf marcou pre-
sença alegre na história dos primeiros imigrantes de fala
árabe de São Paulo, residentes na Mooca. Iniciou-se como
ambulante para depois viver do comércio atacadista de te-
cidos. Homem de religião, Sarraf foi um conciliador aos
fiéis das duas sinagogas, construídas em uma mesma rua
por judeus libaneses de Sidon e de Safed na Mooca, bairro
étnico de São Paulo. Sarraf mantinha contatos próximos
com seus parentes, nascidos em Belém do Pará, partici-
pantes da Sinagoga da Rua Abolição.
A sinagoga sefaradi de São Paulo recebeu nos anos
de 1940 aos imigrantes marroquinos, refugiados da II
Grande Guerra. Preocupados com o antissemitismo ex-
presso pela imprensa e pelas tropas nazistas, sediadas no
Norte da África, grande número de judeus de antigas
comunidades buscou emigrar, pois era corrente que “os
nazistas estavam preparando os fornos para os judeus do
Marrocos”. Entre os que se estabeleceram em São Paulo,
citamos os Laredo e os Chalom, famílias de projeção do
Norte africano. Descendente do rabino Aron Laredo -
religioso da Região do Rif, no século XVII -, Abraham
Laredo,além de presidir a comunidade judaica de Tânger,
era Presidente da Câmara de Comércio Internacional da
expressiva cidade, tendo sido condecorado por serviços
prestados com o título de Officiel de Palme Academique.
Laredo foi também homenageado por Muhamet V, com
a “Ordem de Nissam Alauite”.
Na cidade do Rio de Janeiro, Isaac Rubens Israel, de
origem marroquina, nascido em Portugal, projetou-se nos
meios de comunicação. Era filho de Rubens Israel e de
Alegria Benoliel,nascida em Manaus.Casou-se com Rosa
Barki, da proeminente família sefaradi da Trípoli Italiana.
Jornalista e advogado Rubens adquiriu projeção brasileira
pelos oito anos de trabalho na BBC de Londres, sob o
nome de Rubens Amaral. Braço direito do jornalista Ro-
berto Marinho, Rubens foi o primeiro diretor da atual e
prestigiosa TV Globo.
Mais numerosos, os judeus de origem marroquina que se
estabeleceram na Shel Guemilut Hassidim foram aos pou-
cos, assumindo os quadros diretivos da antiga sinagoga.
Entre as novas famílias marroquinas, citamos os Benza-
quen, os Levy, os Bensussan e os Pinto. Hoje, a sinagoga
é conduzida pelo Rabino Isaac Benzaquen, formado em
1968 pela Yeshiva do Rabino Chefe do Império Britânico,
Haham Dr. Salomon Gaon, de Londres. A entrada desses
novos imigrantes permitiu a volta das canções com a ca-
racterística musicalidade marroquina.
ARTIGO
24
A FONTE DA JUVENTUDE
A
té os nossos dias não foi descoberto nenhum
medicamento para evitar o envelhecimento.
Desde épocas remotas este é um sonho da
humanidade.
A primeira referência a esse tema está na Bíblia, com
o simbolismo da Árvore da Vida – quem comesse o seu
fruto se tornaria imortal. Muitos séculos à frente, na Idade
Média, a esperança foi a Fonte da Juventude, que poderia
restaurar a saúde e proporcionar beleza a todos os que nela
se banhassem (se fosse encontrada).
Havia ainda a crença no elixir da longa vida, “uma re-
dução da pedra filosofal em água mercurial”, segundo os
alquimistas da época. Se esse elixir fosse dado a um enfer-
mo, com aparência de morto, ao tomar somente uma gota,
ele iria sobreviver,com a graça de Deus,sendo a senilidade
transformada em juventude. Deus era sempre enaltecido
e tinha poder sobre todas as coisas – “Deus super omnia”
(Deus acima de tudo).	
Será que em algum dia existiu uma fonte da juventude?
Não há provas de sua existência. Na mitologia, a fonte se-
ria um rio que saía do Monte Olimpo e passava pela Terra.
Sendo abençoada pelos deuses, seria capaz de dar imorta-
lidade à pessoa que bebesse de sua água. Até mesmo Ale-
xandre, o Grande, teria buscado esse rio da imortalidade,
após ter lido um conto hebraico que falava sobre a fonte.
Na Idade Média, vários exploradores patrocinados pelas
cortes reais também saíram em busca da fonte. Um dos
mais conhecidos foi Ponce de Léon, saindo da Espanha
rumando para América em 1493. Teve o patrocínio dos
“Todo homem deseja viver para sempre, mas nenhum quer ser velho.”
Jonathan Swift (1667-1745) – poeta e escritor satírico irlandês
reis Fernando e Isabel. Chegando em terras novas aportou
em Hispaniola, atual ilha de São Domingos.
Em 1513, Ponce de Leon sai à procura de águas reju-
venescedoras. Descobriu uma ilha a qual deu o nome La
Florida, onde encontrou uma fonte com águas minerais.
Infelizmente, foi ferido por índios, sendo levado para
Cuba, onde faleceu.
Goethe, o grande poeta, dramaturgo e filósofo alemão
(1749-1832) produziu, entre outras obras, Fausto, seu livro
mais famoso, até hoje incluído entre as cem maiores obras
da literatura mundial. Esse livro, escrito em versos, foi ini-
ciado quando Goethe tinha 60 anos (1808) e concluído
em 1832, ano de sua morte, aos 83 anos. Os principais
personagens da obra são o velho Fausto e Mefistófeles,
personificando o Diabo. Este provoca um diálogo com
Deus sobre a fraqueza da Humanidade, apostando com
Deus que poderá ficar com a alma de Fausto, já envelhe-
cido, mestre em Filosofia, Direito, Medicina e Teologia.
Para conseguir seu intento, o Diabo promete a Fausto o
retorno de sua juventude, mas para tanto teria que ceder a
alma. Fausto concorda e é levado até uma bruxa, que está
preparando um elixir com o poder de remoçar.
Antes de ingerir esse líquido miraculoso, Mefistófeles
ainda tenta demover Fausto, pois existiriam outros meios
para prolongar a vida até mais de 80 anos, mantendo a
juventude sem vender a alma.Fausto quer saber qual é essa
alternativa e o Diabo lhe explica:
“Maneja a espada, ativa o arado, conserva-te a ti próprio
e a tua mente num círculo chão, limitado com alimen-
LUIZ FREITAG
24
25
ARTIGOARTIGO
to puro, nutre-te qual gado, vive entre o gado, em suores
quotidianos, adubar pessoalmente o campo e o agro não
temas; por remoçar-te de setenta anos, crê-mo, o melhor
é dos sistemas.
A bruxa vem em seguida e revela a Fausto a visão do
sexo mais belo. Poderia possuir quantas mulheres quisesse,
ingerindo a bebida que ela terminava de preparar.Após re-
fletir, Fausto pondera a Mefistófeles que não tem o hábito
de brandir a enxada, além do que a vida rústica não é o seu
ideal. Aceita pois, engolir a poção.
Assim ocorreu. Fausto tornou-se imortal, mas a alma fi-
cou pertencendo ao Diabo.
Essa apologia da vida saudável, preconizada por Goe-
the, foi inspirada, provavelmente num livro publicado em
1797 pelo seu médico particular, Dr. Hufeland, intitulado
“A arte de prolongar a vida humana”,onde o autor defende
preceitos muito semelhantes: viver no campo e ingerir ali-
mentos naturais. Sugeria ainda que os intelectuais “deve-
riam passar algumas horas do dia trabalhando no campo”.
Nos séculos XIX e XX tiveram início as pesquisas cientí-
ficas com o objetivo de prolongar a juventude.Vários estu-
dos foram publicados, principalmente nos primórdios do
século XX, como o estudo da transposição de hormônios
de macacos para homens (a testosterona ainda não havia
sido descoberta).
Um dos pesquisadores foi o Dr. Serge Voronoff (1866-
1951), que nasceu na Rússia, mas emigrou para a França.
Fazia pesquisas com macacos e acreditava que, ao realizar
transplantes de glândulas de macacos para seres huma-
nos, tornaria possível o prolongamento da vida humana
até 140 anos. Infelizmente, Voronoff enveredou para o
lado comercial das suas experiências e não conseguiu com-
provar cientificamente as suas investigações. Chegou até
a atrair milionários para tratamento nos melhores hotéis
de Paris, tendo clientes como a famosa cantora lírica Lily
Pons. O Dr. Adolphe Brown-Sequard (1817-1894), fa-
moso fisiologista francês contemporâneo de Voronoff,
propôs a teoria denominada “organoterapia”, com a pro-
dução de um suco de glândulas animais, que exerceria a
função de reposição hormonal, mas também não se com-
provou cientificamente.
Passada a euforia dessas modas que enfatizavam as glân-
dulas hormonais, a melhor proposta deste século XXI é
envelhecer com qualidade de vida, seguindo alguns prin-
cípios básicos:
• Abandonar o vício do fumo
• Prevenir a obesidade abdominal
• Tratar sempre a hipertensão arterial
• Controlar o diabetes com cuidados na alimentação e
medicamentos
• Verificar periodicamente taxas de colesterol, triglicéri-
des e ácido úrico
• Consultar o médico de confiança, pelo menos duas ve-
zes ao ano
• Manter uma atividade para ocupar o cérebro
• Cultivar amigos e manter a sociabilidade, reduzindo o
estresse
• Praticar atividade física,pelo menos 30 minutos por dia
• Procurar ter uma vida familiar e sexual estável
Ainda poderemos enfrentar a velhice com dignidade e
classe, lembrando as palavras do soneto de Bastos Tigre
(1882-1957), jornalista, poeta e humorista:
ENVELHECER
Entra pela velhice com cuidado 			
Pé ante pé, sem provocar rumores
Que despertem lembranças do passado,
Sonhos de glória, ilusões de amores.
	 Do que tiveres no pomar plantado,
	 Apanha os frutos e recolhe as flores
	 Mas lavra ainda e planta o teu eirado
	 Que outros virão colher quando te fores
Não te seja a velhice enfermidade!
Alimenta no espírito a saúde,
Luta contra as tibiezas da vontade!
	 Que a neve caia, o teu ardor não mude!
	 Mantém-te jovem, pouco importa a idade
	 Tem cada idade a sua juventude.
25
26
EXPECTATIVA DE VIDA
Toda mudança no viver é um desafio a ser enfrentado no
dia a dia.	
A expectativa de vida atual para os brasileiros é estimada
em 74,8 anos e poderá chegar a 81,2 anos até 2160. É
o que nos informa o Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE).
Desde1990 a ONU (Organização das Nações Uni-
das) criou um método chamado IDH – Índice de
Desenvolvimento Humano – para avaliar anualmente
as condições de vida de uma determinada população.
São analisados fatores como salário, cultura, saúde e ha-
bitação de cada população em particular. O Brasil ainda
não chegou a ter um número considerável de super cen-
tenários, ou seja, pessoas que estão sobrevivendo mais de
100 anos. Por enquanto, os Estados Unidos apresentam
o maior número de pessoas com mais de 100 anos no
mundo – são pouco mais de 55.000. Esta estatística se
deve ao maior cuidado com a saúde que os americanos
dedicam à sua população, através de campanhas de pre-
venção de doenças.
Em segundo lugar está o Japão, com média de 25.000
centenários, e em terceiro lugar vem o Brasil, com 15.000
centenários, mesmo com condições de vida adversas. As
áreas do Brasil onde há maior possibilidade de sobrevivên-
cia são a região sul (74,71 anos) e a região sudeste (74,06
anos), sendo a pior delas a região nordeste (69,71 anos).
Outro dado importante a se destacar refere-se à projeção
de vida para 2060: para os homens, 81 anos, enquanto as
mulheres sobrevivem por mais 7 anos.	
Com índice menor de sobrevivência estão os jovens de
20 a 24 anos, não só por causa de doenças, mas principal-
mente por mortes provocadas pela violência, como assas-
sinatos em brigas fúteis, desde trânsito até disputas por
clubes de futebol. Em 2007, nas regiões norte e nordeste,
segundo o IBGE, a soma de mortes de jovens representou
a elevada porcentagem de 33%.
Com essas estatísticas desalentadoras, os idosos conti-
nuam a sobreviver por mais anos, conforme números que
são divulgados até
mensalmente nos
meios de comu-
nicação. O que se
pode constatar é
que pessoas com
mais de 65 anos es-
tão dando atenção
maior à sua saúde
com os recursos que
a medicina proporciona. Recentemente
tomamos conhecimento de um casal que completou 81
anos de casamento, ele com 101 anos de idade e ela com
100, no interior de São Paulo - comemoraram as bodas
de cacau. Seria a convivência com amor e dedicação um
ao outro um fator de maior longevidade? É possível, po-
rém não se devem ser esquecidos os cuidados com a saúde
em geral, como o tratamento para hipertensão arterial e
diabetes, duas das piores doenças que trazem maiores
complicações para o organismo, mesmo nos mais jovens.
Também são necessárias as visitas semestrais ao médico
de confiança para prevenção de patologias que podem
estar em início e poderão ser tratadas, sem as consequên-
cias de má evolução.
Cuidados iniciais com perdas de memória repetitivas,
bem como depressão comum em idosos devem ser toma-
dos e trarão benefícios para o futuro.
O envelhecimento coloca vários desafios às pessoas que
estão se aproximando dos 65 anos ou mais. O processo de
envelhecimento não é só físico, como também mental e se
torna necessário um planejamento para essa nova fase da
existência.Toda mudança do viver é um novo desafio a ser
enfrentado no dia a dia e faz parte da vida.
Prepare-se positivamente, sabendo que é possível che-
gar aos 100 anos com saúde, desde que sejam seguidas as
recomendações médicas preventivas, cuidados com ali-
mentação e exercícios físicos. A velhice em si não é inca-
pacitante, porém as patologias que poderão acompanhá-la
são um empecilho para desfrutá-la.
26
27
ADIE A SUA FINITUDE
“Quando eu pensar que aprendi a viver, terei aprendido
a morrer.” Leonardo da Vinci (1452-1519) – gênio renas-
centista, pintor, escultor, arquiteto, entre outras profissões.
Todos os temas que abordamos até agora podem servir
de guia para pôr em prática as estratégias necessárias para
prevenir, conviver ou até superar muitas das doenças que
ocorrem quando se avança em idade. Também orientam
como se cuidar e prestar atenção aos fatores que contri-
buem para uma vida saudável.
Entre os assuntos normalmente abordados em palestras
e cursos dirigidos à terceira idade, muitas vezes são es-
quecidos aqueles que tratam da existência (vida) e fini-
tude (morte). A questão do sentido da existência sempre
preocupou cientistas e filósofos. Torna-se mais urgente,
sobretudo para as pessoas que não mais podem adiar o
enfrentamento da finitude próxima, devido ao avanço dos
anos e a graves doenças.
No século XX predominou a crença de que uma quali-
dade de vida superior resulta de melhores condições ma-
teriais, acumuladas no decorrer da vida. Foram enaltecidos
valores como conforto, vida regrada, casamento feliz, tra-
balho que renda bens materiais, com o prestígio daí re-
sultante. Esqueceu-se de que esses valores, ainda que de-
sejáveis, são sempre exteriores, podem exigir muitos anos
de empenho, e nem sempre são obtidos por meios lícitos.
Levam muitas vezes a uma preocupação exagerada com o
status social, sacrificando a interioridade.
Infelizmente, essa perda só é percebida quando o indiví-
duo se dá conta do que deixou passar,por não ter cultivado
o seu eu interior, ocupando o seu cérebro com ideias de
como ganhar mais dinheiro e conservá-lo. Nesse período,
provavelmente, já adquiriu alguma doença incapacitante.
Para Nietzsche,filósofo alemão (1844-1900) que sempre
criticou a “estética da existência”viver bem não é só conti-
nuar existindo e o sentido da vida não é só sobrevivência,
mesmo que seja nas melhores condições materiais.
O caminho para desenvolver um estilo de vida saudável
consiste em manter a alegria de viver, criar coisas novas,
conviver bem com as pessoas próximas, parentes e amigos,
além do sexo seguro. Esse estilo de vida contempla fatores
que irão contribuir para o envelhecimento bem sucedido,
e não deve ser confundido com hedonismo, que é apenas
o cultivo do prazer.
Cuidar de si é uma arte, um privilégio, com autono-
mia para não se sujeitar às conveniências do lazer exte-
rior. Quando o indivíduo perceber que a finitude um
dia chegará, pelas próprias limitações da existência, deve
contentar-se com as suas realizações, sem reter amarguras
e frustrações, bem como raiva e inveja, sentimentos pre-
nunciadores de doenças.
É bom lembrar que, mantendo-se sadio ou com alguma
doença tratável,à medida em que a idade avança,melhores
serão as perspectivas de uma vida longa, com tratamentos
cada vez mais avançados, que surgem a cada ano.
Adie a sua finitude!
Médico geriatra, membro titular da Academia de Medicina de São
Paulo, autor do livro “Como transformar a terceira idade na me-
lhor idade”(Editora Alaúde).
27
ARTIGO
28
Refugiados Judeus-Alemães
na República Dominicana
T
ema muito pouco conhecido e estudado será sintetizado nestas breves
linhas. O ditador Rafael Leonidas Trujillo (1891-1961) ofereceu asilo
aos judeus obrigados a fugir dos Nazistas; porém não foi por altruísmo,
sua intenção era “branquear”a República Dominicana com a entrada de
cem mil imigrantes europeus.
As pessoas que este racista caribenho salvou recordam aqueles feitos. Os cerca de
setecentos judeus que chegaram ficaram agradecidos com o ditador. Eles assenta-
ram-se no norte da ilha em Sosúa. Plantaram árvores e arbustos, traçaram avenidas
e constituíram cooperativas.
Em três anos construíram uma pequena cidade com alto nível social. Publicaram
jornais em alemão e espanhol com todo o tipo de notícias. Os exilados tentaram ir
adiante como agricultores; porém, muitos eram médicos, comerciantes, eletricistas,
etc. e não estavam preparados para amoldar-se aos princípios dos kibutzim judeus.
Os colonos fundaram empresas que distribuíam pelo país: presunto, salsichas, toi-
cinho, manteiga e queijo. Há que ter presente que a maioria era gente citadina, pro-
cediam de Hamburgo, Berlim, Munique e Viena. Não ficaram por alí e emigraram
para os EUA.
Os judeus viveram em paz, sob a ditadura de Trujillo, que chegou ao poder com a
ajuda dos EUA e foi assassinado num atentado em 1961. Os refugiados judeus só
souberam por rumores que o mesmo ditador que os havia acolhido, eliminara doze
mil pessoas, em sua maioria procedentes de Haiti. Os crimes de Trujillo motivaram
o exílio de muitos judeus.
RAFAEL PICÓ, DE PONTEVEDRA, GALIZIA
O engenheiro espanhol RAFAEL PICÓ descende de Leonor Valls y Picó, uma chueta (o cristão-novo da Ilha de
Mallorca) penitenciada pelo Santo Ofício em 1679.Ao visitar Salvador,para participar de um congresso,conheceu
Carlos Kertesz, atual editor do Boletim do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro e assim surgiu a amizade, que
levou a apresentar a C.K a presença judaica na Galicia espanhola,a amizade epistolar que já passa de uma década
e um série de pequenos artigos onde se mostra como os espanhóis veem aos judeus.
29
D
o ponto de vista cultural o grupo étnico que se beneficiou da domi-
nação islâmica, foi a dos judeus espanhóis, que desfrutou de maior
tolerância e de mais oportunidades, de tal maneira que Al-Andalus
assistiu ao florescimento da cultura hebraica. No final do século XI as
atitudes judaicas mudavam da preferência pelo domínio muçulmano e deu origem
a uma oposição equidistante em respeito a disputa entre cristãos e árabes, já na me-
tade do século XII aderiram a orientação pro-cristã, pois os judeus viam tolerância
e oportunidades nos regimes cristãos. A chamada hispanização dos hebreus surgiu
nestes momentos.
Segundo o Direito Castelhano os juramentos realizados em algum momento por
membros das três religiões tinham o mesmo valor e inicialmente as leis castelhanas
consideravam que a pena de morte era para todos, mesmo numa acusação de um
judeu contra um cristão. Este sistema de tolerância colocou a sociedade espanhola
como uma sociedade única na Europa.
Curiosamente a influência judaica chegou ao extremo de ser judeus os banqueiros
dos Reyes Católicos. E mesmo, no período do reinado o Grão Inquisidor, Torque-
mada, era de ascendência judaica.
A convivência com os judeus, foi de grande tolerância, se bem que havia bairros
exclusivamente para eles. Ainda hoje se conserva, a título de exemplo, o de Palma de
Mallorca, chamado Bairro Judío, no mesmo local de épocas passadas.
A Influência Judaica
na Espanha
ARTIGO
3030
Reunião de família
S
empre ouvira falar de meu
pai com respeito e admiração.
Homem culto e distinto era
justo no trato com seus de-
pendentes.Pertencia àquela geração de
pessoas honrosas, fiéis a seus deveres.
Fortes laços sentimentais o liga-
vam à família e à sua cidade natal, às
margens do luminoso Mar Adriático.
Alessandro jamais imaginou ter que
despedir-se de ambas.
Era a véspera da Segunda Gran-
de Guerra. O Fascismo empolgava
multidões e o ódio ao povo de Isra-
el tomava proporções dantescas. Era
preciso fugir.
Não foram poucos os que vieram
despedir-se dele com lágrimas e
grande preocupação. Partia para ter-
ras brasileiras desconhecidas, com a
esposa e um neném gracioso de oito
meses, Ariella, embrulhado num rico
cobertor cor de rosa. Agora só as car-
tas seriam capazes de transmitir o
grande afeto que ligava Alessandro
aos demais da família separada pela
guerra e pelo oceano imenso. Estas
cartas, quando não abertas pela cen-
sura, demoravam quase um mês para
cruzar o Atlântico.
Educado na velha Europa, não foi
fácil para Alessandro transformar-se
FABIA TERNI LEIPZIGER
em imigrante num país tropical, com
cores, sabores, e odores tão exóticos.
O Brasil entra na guerra e a popu-
lação se preocupa até com possíveis
ataques aéreos. No país da fartura, há
racionamento de alimentos. Tempos
difíceis.
Mas enfim uma boa nova na casa
de Alessandro. Outro pacotinho en-
volto num cobertor cor de rosa, Fio-
rella, chega no dia do aniversário do
avô paterno lá longe. Felicíssimo, ao
receber o telegrama com esta notícia,
prepara uma carta comovente para
expressar todo seu carinho.Mas como
fazê-la chegar às mãos de seu filho
Alessandro no Brasil?
A comunicação ultra-marina era
quase inexistente. Malotes postais
não estavam na lista de prioridades da
marinha de guerra no auge do confli-
to mundial. Era mais seguro arranjar
um portador.
Em roda de amigos,o avô de Fiorella
conhece Bartolomeu, que viajaria em
breve, pois tinha parentes no Brasil.
Vivia numa cidadezinha bem próxi-
ma e através de um mensageiro a carta
chega às mãos de Bartolomeu poucos
dias antes que seu navio zarpasse.
De estatura mediana, mas de alma
grandiosa, Bartolomeu era íntegro,
homem de palavra. Curador de um
museu local, nutria grande respeito
pela guarda de documentos antigos.
Passaram-se mais quatro anos de
guerra e o luto, a fome e a desolação
tornam-se as novas cores da Europa.
Os parentes de Alessandro, como os
de Bartolomeu foram obrigados a es-
conder-se, pois Judeus não eram mais
tolerados em nenhum lugar.
Sem mais notícias do paradeiro de
seus pais,Alessandro considera-se um
felizardo quando recebe a informação
de que haviam sobrevivido ao pior.
Agradece a Deus por mais este mi-
lagre.
A guerra termina finalmente, mas
a imensa saudade de Alessandro pela
terra de seus antepassados permane-
ce. É o momento de oferecer a seus
pais o grande sonho; abraçar os no-
vos netinhos.
Uma verdadeira celebração! Os pais
de Alessandro o aguardavam no por-
to. Irmãos e primos na janela do ve-
lho casarão de outrora e ex-colegas de
classe chegaram à tarde como antiga-
mente.Troca de abraços comoventes.
Na fazenda não foi diferente. Espo-
sas de antigos camponeses preparam
travessas de massas saborosas, todas
feitas em casa, com o sabor da infân-
31
cia. Alessandro emociona-se ao rever
a criançada agora na adolescência,
todos com saúde. A guerra devastara
quase tudo, mas os laços afetivos e as
recordações eram indestrutíveis.
O maior prazer foi abraçar cada
um pessoalmente. Desde o jardineiro
idoso de seus avós, ao marinheiro, que
tantos dias inesquecíveis havia-lhe
proporcionado, sempre disposto a na-
vegar até o por do sol, pelo azulado
Adriático,com o barco abarrotado de
jovens alegres,despreocupados.Quan-
ta emoção ao serem transportados a
um tempo maravilhoso já vivido.
Passam os anos. Nas visitas seguin-
tes, também fala-se daqueles tempos,
mas os antigos atores já não estão
mais em cena. Toda aquela geração
partira, inclusive os pais de Alessan-
dro e Bartolomeu.
Alessandro tornara-se avô de cinco
netos e netas. Era chegada a hora de
seus netos conhecerem a sua terra.
Bem próximo a sua cidade natal, um
balneário ensolarado nas margens do
Adriático é escolhido para a nova reu-
nião de família, agora com os filhos
de Fiorella presente.
Na sexta-feira à noite, Alessandro e
seu genro vão à sinagoga local.
Conforme antiga tradição,as pessoas
de outras comunidades são apresenta-
das às da casa enquanto ele se levanta
e é visto pelos presentes. Seguem-se
as belas melodias que saúdam a Paz
do Sábado. Estranhamente, um ho-
mem, absorto em seus pensamentos,
não participa dos cantos.
Alessandro Ventura? Porque este
nome soava-lhe familiar?
Terminado o serviço religioso,cami-
nha até Alessandro, e pergunta-lhe:
- O senhor virá à sinagoga amanhã
pela manhã?
- Porque o senhor pergunta?
- Venha, Sr. Alessandro, é um pedi-
do especial!
Ao voltar, Alessandro relata o
ocorrido. Fiorella, curiosa decide
acompanhá-los no dia seguinte.
Com seus dois filhos pela mão, lá
vão as três gerações à caminho da
sinagoga.
Terminadas as rezas,aproxima-se de
Alessandro aquele senhor misterioso
da noite anterior. Entrega-lhe um
envelope fechado e diz: “Seu pai con-
fiou esta carta ao meu pai, Bartolo-
meu De Benedetti, para que ele a en-
tregasse ao senhor no Brasil. O navio
no qual embarcaria foi torpedeado e
meu pai nunca mais viajou. Procurou
devolvê-la, mas não conseguiu mais
localizar seu pai. Por uma questão de
honra, antes de morrer, entregou-me
a carta na esperança de que um dia
poderia encontrá-lo. Eis que a missão
de meu pai foi agora cumprida.
Emocionado ao contemplar a cali-
grafia de seu próprio pai falecido há
mais de vinte anos, Alessandro fica
pasmo. Fiorella e o marido apro-
ximam-se com afeto, enquanto as
crianças o cercam carinhosamente.
Alessandro começa a ler a carta es-
crita há trinta e um anos atrás, por
ocasião do nascimento de Fiorella,
e não se contém mais. Lágrimas
escorrem-lhe pela face ao sentir o
profundo amor de seus pais. Por um
instante mágico, revê os dois ali a seu
lado, e mergulha naquele tempo ma-
ravilhoso que guardaria para sempre
em sua memória.
A reunião familiar contava agora
com quatro gerações.
N.B. Esta história é verídica. Por
questões de privacidade, os nomes fo-
ram alterados.
ARTIGO
3232
Judeus nos trópicos
AcomunidadejudaicadaBahiade1912a1945
Essa mudança, por vezes traumática, sua acomodação
nem sempre suave, devem ser objeto de estudos e de uma
historiografia compatível com a procura das raízes das mi-
norias brasileiras e da diversidade dos grupos que forma-
ram o que chamamos, de forma ampla, o povo brasileiro.
Sabe-se de cristãos-novos que viveram na Bahia em di-
versos períodos: entre os degredados e colonos durante as
Capitanias e Governo Geral. Anita Novinsky escreve que
constituíam 10% a 20% da população branca na capital
colonial, Salvador (Cristãos Novos na Bahia, p. 67). Ju-
deus vieram para o litoral do nordeste, durante o domínio
dos flamengos, na Bahia (1624-25) e Pernambuco (1630-
54), quando constituíram uma comunidade com ativida-
de intensa em diversos setores, tendo fundado a primeira
sinagoga das Américas em Recife, em 1641. (* Judeus no
domínio holandês, p. 10 Esther R. Largman). Depois da
derrota dos holandeses, a maioria preferiu sair do Brasil,
retornando para Amsterdã ou migrando para a Guiana,
Antilhas ou Nova Amsterdam (hoje Nova York).
Os réus dos tribunais da Inquisição são testemunhas pre-
ciosas. Quando a Carta da Lei, de 25/05/1773 do Marquês
de Pombal decretou distinção entre cristãos-novos e velhos,
no reinado de D.José II,os remanescentes já haviam esque-
cido suas origens – pois haviam se tornado bons católicos.
O levantamento da presença judaica no Brasil e particu-
larmente na Bahia, depois da Independência, ainda está
para ser realizado.
Em 1821, nas Cortes Portuguesas, o deputado pela Bahia,
A memória e história dos imigrantes, antes mergulhadas na apatia e desinteresse, estão
sendo resgatadas por novos estudos. Personagens que numa vinda temerária atravessaram
o oceano, deixando para trás sua língua, seus hábitos, seu cotidiano e até a própria família.
Carvalho de Melo, defendeu a liberdade para os judeus,
alegando que ela já existia em Roma e na França. Nesse
mesmo ano, Alexandre Gomes Ferrão, também represen-
tando a Bahia, apresentou um projeto de plena restituição
aos judeus e mouros expulsos de Portugal em 1497. 1
Proclamada a Independência, a Constituição de 1824
consignou princípios da liberdade religiosa.
Em 1838, dois irmãos da nação hebraica, Arão e Isa-
ac Sabag, fundaram um empório em Feira de Santana. 2
A presença de alguns judeus, ainda no século XIX, é na
maioria de origem sefardita e foram estudados pelos Wol-
ff: José Abraham e Aram Saback foram registrados como
viajantes em 1837, assim como Jountal Sefarty. Joseph
Alkaim foi dispensado da função de gerente na Com-
panhia de Minas de Assuruhá em 1887. A figura mais
importante foi, sem dúvida, o rabino Isaac Amzalak que,
chegando em 1829, criou um círculo de relações em sua
casa, freqüentado “pela melhor gente do tempo”, inclusive
pelo poeta Castro Alves que dedicou alguns poemas às
suas filhas, em que se inspirou. 3
No início do século XX, encontramos pela imprensa so-
brenomes com clara origem judaica, mas já aculturados
e absorvidos pela sociedade baiana: José Abrão Cohim,
criador de gado e senador; Juiz Antonio Bensabat, coronel
José David Fuchs. 4
A primeira Grande Guerra foi uma explosão que dilace-
rou a comunidade dos países europeus. Os heimatlossen ou
apátridas e as minorias, como corolários às guerras civis e
migrações, perderam os direitos antes inalienáveis, isto é, os
ESTHER REGINA LARGMAN
À memória de Robert Levine
Boletim Informativo Nº 50 - AHJB
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Boletim Informativo Nº 50 - AHJB

  • 1. 1 BOLETIMINFORMATIVO EDIÇÃO No 50 ISSN1519-1109 ANTISEMITISMO NA ERA MUSSOLINI pág. 9 MEU CONVÍVIO COM A COLÔNIA JUDAICA pág. 17 UMA FAMÍLIA EM MOVIMENTO: OS MILÃOS pág. 38 JUDEUS MARROQUINOS: SÃO PAULO E RIO DE JANEIRO pág. 21
  • 2. 2
  • 3. 3 A PALAVRA DO PRESIDENTE 3 Carta Aberta à Comunidade Meus amigos, O Arquivo Histórico Judaico Brasileiro completa neste ano 39 anos, fundado em 1976 por membros da USP e desde então servindo à comunidade judaica e à sociedade brasileira como um centro de pesquisas e referência sobre a imigração judaica no Brasil. Com a eleição da nova Diretoria agora em Agosto de 2015, criamos um novo Espaço da História Judaica no Brasil apresentando-se hoje como uma instituição voltada à preservação da memória, à pesquisa e à proteção do maior acervo de fotografias e documentos relativos à comunidade judaica no Brasil desde a Imigração até os dias atuais englobando as Entidades Judaicas bem como as famílias que a compõe. Através do Projeto Muitas Mãos iniciamos um importante processo de modernização administrativa e tecnológica visando acelerar o arquivamento e digitalização do nosso Acervo. O novo processo permitirá uma maior interação entre o novo Espaço e a Comunidade permitindo,de um lado o acesso virtual aos dados arquivados e por outro lado o recebimento eletrônico dos documentos encaminhados pela Comunidade. Dentre os novos projetos da nova Gestão, destacam-se a produção de conhecimento nas áreas do ensino e da cultura, colaborando com a formação de cidadãos críticos e promovendo, por diversos meios, a reflexão sobre questões fundamentais do nosso tempo. OProjetoMinhasRaízes–NossaHistóriavaiinteragircomosalunos,paisefamílias,montandosuasárvores genealógicas,entrevistando seus avós identificando-os com a nossa história,nossa cultura e religiosidade. Projetos como dos Movimentos Juvenis Caminho para novas Lideranças permitirão integração e renovação do Ecossistema Comunitário, visando um importante ganho de eficiência na consolidação de Entidades afins. Conclamo então todas as nossas Entidades, Pais e Alunos a apoiar o novo Espaço de sua História, mantendo Viva e Dinâmica suas Memórias. Que o novo ano de 5776 nos traga a força e a determinação para o enfrentamento dos novos desafios. Seilly Heumann Presidente ESPAÇO DA HISTÓRIA JUDAICA NO BRASIL A memória viva da imigração até os dias de hoje
  • 4. 4 EDITORIAL Foi uma experiência gratificante introduzir as modifica- ções que fizemos no Boletim número 49, principalmente no formato. A aceitação manifestada pelos leitores, nos induziu a repeti-las e fazer outras variações necessárias. Editar uma publicação judaica que desperte o inte- resse de leitores é um desafio constante e muito salutar. Evidentemente que o mérito maior se deve aos nossos colaboradores escolhidos entre os melhores autores e que tenham textos interessantes dentro da temática de nossa publicação. Neste mês de agosto, elegemos uma nova diretoria presi- dida por Seilly Heuman que assumiu os destinos de nossa Instituição,com novos projetos,preservando entretanto os objetivos que sempre pautaram nossa atuação na comuni- dade.Tenho certeza que esta revitalização trará os resulta- dos que todos almejamos. Uma nota triste: entre o dia de lançamento deste Bole- tim e aquele quando recebi a colaboração de minha que- rida amiga Profª.Consuelo Pondé de Sena, ela faleceu em Salvador. Deixou um texto cheio de carinho e amor pela comunidade judaica da Bahia onde conviveu por muitos anos e era querida e respeitada por todos. Adeus amiga,vamos nos privar dos seus artigos inteligentes mas guardaremos para sempre sua lembrança e sua alegria. Nosso reconhecimento sincero, neste momento de mu- danças à CIBRACON e a CONSTRUTORA ATLAN- TICA, na pessoa do seu presidente Engenheiro Jayme Serebrenic que durante mais de 20 anos patrocinou des- preedidamente todas as realizações e atividades do Arqui- vo. Obrigado amigo Seré. Uma palavra de agradecimento também para nossa equi- pe, sempre eficiente e dedicada. Boa leitura. CARLOS KERTÉSZ Editor Henrique Brenner Henrique Brenner, benemérito doador da sede do AHJB, ligou elogiando muito o Boletim nº 49 e solicitou mais exemplares do mesmo. Dorothy S. Bortz Esteve na sede do AHJB fez muitos elogios ao Boletim nº 49 e solicitou mais exemplares para distribuir a amigos. Pe. Henrique Puig Acuso o recebimento da Revista do AHJB que li com sumo in- teresse e simpatia. Achei entre outros sumamente bem explicado o tema tratado sob o título “Padre Anchieta, cristão ou judeu?”, donde mais uma vez deduso a proximidade e parentesco, por não dizer identidade, de nossos povos cristão e judeu. Os últi- mos Papas ao referir-se ao povo judeu falam de nossos irmãos maiores. São Paulo que sempre se orgulhava de sua origem ju- daica, da tribo de Benjamim, várias vezes dizia que os judeus são os possuidores dos valores mais altos. Penso eu que a Estrela de Davi há de ser um dia que nos ilumine para encontrar jun- tos a luz que nos trouxe sua descendência tão abençoada. Lafayette de Azevedo Pondé Filho Obrigado pelo Boletim no 49 do AHJB. Gostei, detendo-me em particular no artigo do DavidTabacof,principalmente pelos laços de amizade com Boris, que foi um dos meus primeiros chefes. No governo Lomanto,Boris foi Chefe da Casa Civil,sucedendo outro grande amigo, João Eurico Matta, que havia me levado como Oficial de Gabinete e depois Sub-Chefe da Casa Civil. Boris é uma das pessoas mais inteligentes que já conheci, muito prático, boas lições de vida aprendi com ele. Gostaria de continuar rece- bendo o Boletim, tenha a certeza que me agradou o seu conteúdo. CARTAS
  • 5. 5 O BOLETIM DO AHJB é enviado gratuitamente aos sócios, a instituições culturais do Brasil e do exterior, e é também distribuído aos visitantes e consulentes que o solicitam. Lembramos aos colaboradores que este boletim possui ISSN (International Standard Serial Number), número internacional normatizado para publicações seria- das. Os artigos inéditos podem ser enviados à Redação pelo e-mail ahjb@ahjb.org.br Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião do AHJB. PRESIDENTE Maurício Serebrinic 1O VICE PRESIDENTE Carlos Kertész 2O VICE PRESIDENTE Seilly Heuman DIRETOR FINANCEIRO Jayme Serebrenic SECRETÁRIA GERAL Myriam Chansky DIR. DE SEÇÕES E INFORMÁTICA Carlos Kertész DIR. DE BIBLIOTECA E ACERVOS DOCUMENTAIS Roney Cytrynowicz DIR. HISTÓRIA ORAL Marília Freidenson DIR. DE CULTURA IÍDICHE Abrahão Gitelman DIR. INSTITUCIONAL Paulina Faiguenboim DIR. DE COMUNICAÇÃO David Paves DIR. DE PESQUISA Léa Vinocur Freitag DIR. DE EDUCAÇÃO Simão Priszkulnik DIR. DE PATRIMÔNIO Maurício Serebrinic DIR. DE DPTO. MÚSICA Samuel Belk DIR. DE ACERVOS ESPECIAIS Simão Frost DIR. DE GENEALOGIA Paulo Valadares DIR. DE PROJETOS INSTITUCIONAIS Seilly Heumann ADMINISTRAÇÃO Eliane Klein BIBLIOTECA Theodora da C. F. Barbosa DOCUMENTAÇÃO, PESQUISA, PROJETO E EDUCAÇÃO Lúcia Chermont FOTOTECA Arnaldo Lev SERVIÇOS GERAIS José Messias Ribeiro Santos EDITOR Carlos Kertész REVISÃO Theodora da C. F. Barbosa DIAGRAMAÇÃO Alexandra Marchesini PROJETO GRÁFICO Marcelo Kertész CONTATOS ahjb@ahjb.org.br ou pelos telefones 11 3088-0879 / 2157.4124 A linguagem e soletração em cada artigo respeita a escolha do autor. EXPEDIENTE Capa: Identidade visual do VI Encontro Nacional do AHJB SUMÁRIO 06 VI Encontro do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro 38 Uma família em movimentos: os milãos Paulo Valadares 09 Antisemitismo na era Mussolini Prof. Reuven Faingold 17 Meu convívio com a colônia judaica Consuelo Pondé de Sena 28 Refugiados Judeus-Alemães na República Dominicana Rafael Picó 21 Judeus Marroquinos: São Paulo e Rio de Janeiro Rachel Mizrahi 24 A Fonte da Juventude Luiz Freitag 32 Judeus nos Trópicos Esther Regina Largman 36 Uma galinha no Brás Henrique Suster 45 Rua Santa Clara do Desterro, 34 Germano Tabacof 30 Reunião de família Fabia Terni Leipziger 06 NOTÍCIAS E CARTAS 49 PESQUISADORES 51 DOAÇÕES 29 A influência judaica na Espanha Rafael Picó 47 Imigração Ernesto Strauss
  • 6. 6 O ARQUIVO realizou nos dias 14, 15 e 16 de novembro de 2014 o VI ENCONTRO NACIONAL em São Paulo na Casa da Cultura Judaica de São Paulo, sob a coordenação do vice-presidente Carlos Kertész,que saudou os presentes e fez um retrospecto dos 5 Encontros anteriores. Nesta edição homenageamos ANNE FRANK, jovem judia holandesa,que passou com sua família dois anos escondida durante a Segunda Guerra Mudial até ser descoberta e enviada para um campo de extermínio, onde faleceu. No período em que ficou escondida ela escreveu um Diário, salvo por seu pai único sobrevivente que o publicou e se tornou num dos livros mais lidos em todo o mundo. A abertura oficial do ENCONTRO foi feita com um Cabalat Shabat conduzido por Simao Prisculnic, contando com a participação de Muriel Waldman,Daniel Markus e um coral . VI Encontro do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro NOTÍCIAS Em seguida, a arquiteta Joelke Offriga, palestrante oficial convidada,presidente do Instituto Plataforma Brasil – IPB, representante da ANNE FRANK HOUSE apresentou projetos educativos realizados no Brasil sob a inspiração de Anne Frank, destacou as ações na Cidade do Salvador em conjunto com a Sociedade Israelita da Bahia – SIB. O encerramento deu-se com o pronunciamento da profa. Helena Serebrinic, esposa do presidente Mauricio Serebrinic que discorreu sobre as atividades do AHJB e enfatizou sobre o desempenho de nossa Instituição que guarda, preserva e disponibiliza nosso rico acervo para todos interessados na imigração e permanência da comunidade judaica do Brasil. O sábado e domingo foram destinados a apresentação dos trabalhos com debates acalorados, demonstrando o interesse de todos pelos Encontros promovidos pelo AHJB. Na tarde do sábado, foi efetivado o lançamento do segundo livro do Nucleo de História Oral Gaby Becker intitulado“Carta de chamada“reunindo expressivo público interessado na obra. O VI ENCONTRO NACIONAL terminou no domingo, deixando em todos os participantes e promotores uma agradável sensação de satisfação, principalmente quando souberam que o próximo ENCONTRO está no planejamento de nossas atividades futuras. 6
  • 7. 7 Prof. Israel Blajberg, Joelke Offriga palestrante oficial, Carlos Kertesz e Mauricio Serebrinic Diretor Seilly Heumann com Muriel Waldman, Simão Priszkulnik, Nanete e John Konig Palestrante Joelke Offriga ladeada por Miriam Olsner e Rubens Bergel e seus filhos Presidente Mauricio Serebrinic e sua esposa Helena Diretores Mauricio Serebrinic, Jayme Serebrenic e Carlos Kertész e suas esposas Helena, Tatiana e Bertha Diretor Abrahão Gitelman e profa. Nancy Rozenchan 7
  • 8. 8 Mauricio Szporer tornou-se em 2015 o mais jovem Desembargador do Brasil, eleito que foi de uma lista sêxtupla e depois tríplice. Filho mais jovem dos ativistas comunitários Jacob e Freida Szporer e neto de imigrantes judeus Marcus e Lola Kertzman e Mauricio e Sarah Szporer, de origem russa e polonesa respectivamente. LogoapóssuaformaturaemDireitopelaUniversidadeFederaldaBahia,foiconvocado pela multi nacional francesa Accor para trabalhar em S. Paulo, onde ficou por 2 anos e desde cedo começou a se interessar e se envolver com a comunidade judáica. Ainda nesta ocasião fez e concluiu o programa“Princípios e Valores de Liderança Empresarial e Comunitária”pelo Insrtituto de Ensino e Pesquisa, Insper. Retornando para Salvador, onde ficaram suas raízes, foi Presidente de Sociedade Israelita da Bahia, por 2 mandatos consecutivos, sendo que na sua gestão foi adquirida o terreno onde se instalará a futura sede da SIB, no bairro da Pituba. Batalhador pelos direitos humanos, e sempre favorável às liberdades e direitos individuais e coletivos, foi para Israel fazer um curso de liderança, de onde voltou com entusiasmo crescente. Foi nomeado para o Tribunal Regional Eleitoral cumprindo 2 mandatos de 2 anos, em ocasiões diferentes.Tomou posse este ano como Desembargador com o apoio da grande maioria dos advogados e dos seus pares da magistratutura. Atualmente é também diretor da Conib. Ao tomar posse noTribunal de Justiça da Bahia, disse Mauricio Szporer:“Prometo aqui na frente de minha família, amigos, pares e autoridades que zelarei de toda alma por aplicar os mais elevados padrões éticos e morais, balizado nas Leis do nosso país”. NOTÍCIAS 8 Consuelo Pondé de Sena (1934-2015), descendente da importante parentela dos Sousas de Itapicuru (Bahia), grandes pecuaristas e médicos, trabalhou inicialmente com o museólogo José do Prado Valadares – casado com a antropológa judia de origem húngara, Gizela Roth, na elaboração de uma bibliografia de Arte Brasileira. Depois disto fêz muita coisa: escreveu sobre o Sertão (Portugueses e africanos em Inhambupe, 1750, Introdução ao estudo de uma comunidade do agreste baiano: Itapicuru, Os Dantas de Itapicuru, dentre outros), foi professora universitária e dirigiu o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, desde 1996.
  • 9. 9 ARTIGO ANTISEMITISMO NA ERA MUSSOLINI PROF. REUVEN FAINGOLD * E m 1938,quando o regime de Benito Mussolini publicou leis racistas, 10.000 judeus italianos militavam nas fileiras do Partido Nacional Fascista. Na época, quase um de cada quatro membros da comunidade judaica idolatrava o Ducce, par- ticipava de comícios, entoava canções partidárias, usava símbolos fascistas em suas vestimentas, se engalanava para os momentos de grande júbilo,defendendo incondicional- mente o regime estabelecido. Eram profissionais liberais, comerciantes, juízes, docentes, cientistas e pessoas ligadas à cultura que amavam sua condição de italianos. Com as proibições de 1938, estes judeus demoraram em reagir, em tomar consciência de que o abismo que se abria a seus pés seria bem profundo, ignorando uma realidade hostil que começava a pressioná-los; enfrentando grandes obstáculos, por vezes intransponíveis. Muitos preferiram emigrar, enquanto outros ficaram no país. Estes últimos se viram obrigados a deixar seus trabalhos assumindo uma condição de párias e marginalizados. A partir de 1943 os judeus que moravam ao norte da Itália, foram levados a campos de extermínio nazistas, principalmente diante do desembarque das forças aliadas na Sicília. Cabe perguntar: Como foi possível um grau tão grande de adesão judaica ao partido fascista sem prever eventuais “NA ITÁLIA, UM NÚMERO SIGNIFICATIVO DE JUDEUS APOIOU O REGIME ESTABELECIDO POR BENITO MUSSOLINI; MAS TODAS AS PROVAS DE PATRIOTISMO E LEALDADE AO PARTIDO E AO PAÍS JAMAIS FORAM RETRIBUÍDAS PELO “DUCCE”. MUITO PELO CONTRÁRIO, O ANTISEMITISMO HOSTILIZOU TAMBÉM AQUELES JUDEUS NACIONALISTAS SIMPATIZANTES DO FASCISMO”. perigos? Que fatores os converteram em ativos militantes “camisas pretas”? Por acaso os judeus não imaginavam que mesmo militando seriam acusados pelas desgraças mun- diais? Eles não liam jornais locais e internacionais, não escutavam rádios nem se informavam nas salas de cinema para saber o que acontecia no restante da Europa sob a bandeira da extrema direita? Profissionais e universitários não tinham acesso a livros ou participavam de palestras em seus círculos de trabalho? A aliança política Roma-Berlim entre Hitler e Mussolini não era um claro sinal que nuvens carregadas sondavam os céus da Europa? Como entender tamanha cegueira coletiva por parte dos judeus italianos? A rigor, tal qual aconteceu na Alemanha do Terceiro Reich, os judeus italianos se sentiam mais italianos que judeus. Isto por não ter experimentado perseguições, as- sassinatos e pogroms. Viviam de costas à Europa, princi- palmente desconhecendo toda a dor e o sofrimento dos judeus do leste europeu. Os judeus italianos também des- prezavam a extrema pobreza e a religiosidade desmedida dos “outros judeus”, aqueles que não eram como eles, acei- tos como verdadeiros italianos. Alguns pesquisadores acreditam que o Ducce estava lon- ge de defender uma postura antijudaica e padrões aber- tamente antissemitas; e que os líderes das comunidades
  • 10. 10 judaicas costumavam elogiar o movimento fascista dentro e fora da sinagoga. Naturalmente, existem também outras opiniões e interpretações acerca da identificação dos ju- deus italianos face ao movimento fascista. Para estes es- tudiosos havia uma real necessidade de que os ebrei fos- sem tratados primeiramente como italianos e logo como judeus. Assim, toda mobilização de judeus em favor de Mussolini seria uma forma de expressarem seu extremo nacionalismo e suas reivindicações cívicas. Talvez seja por isto que os judeus consideravam o fascismo como uma volta ao Risorgimento, a luta incansável do século 19 pela consolidação da unidade nacional e cristalização da iden- tidade italiana. Numa reportagem feita ao escritor judeu-alemão Emil Ludwig (23 de março de 1932), menos de um ano de Hi- tler assumir o poder, Benito Mussolini afirmava: “Os ju- deus italianos sempre tem se comportado como bons cidadãos e tem combatido valentemente como soldados”. Não obstante, o Ducce também costumava dizer que “os judeus são meus piores inimigos”. É sabido que Mussolini impediu a sua fi- lha Edda de casar com um judeu,finalmente consolidando sua união com o Conde Galeano Ciano, a quem lhe ofere- ceu poderes absolutos na política exterior do país. Por inícios do século 20, para grande parte dos dirigen- tes políticos da Itália, os augúrios de Marx não se haviam cumprido: o capitalismo avançava rapidamente, o empo- brecimento ganhava novos setores da população italiana e os operários se integravam política e culturalmente às so- ciedades ocidentais.O socialismo italiano,igual ao Partido Social-Democrata alemão, virava cada vez mais reformista e crítico. Ambos aceitavam o liberalismo político e prega- vam fidelidade aos princípios marxistas. Em meio deste turbilhão de ideias nasceu a proposta do fascismo. O Ducce teve considerável colaboração de judeus em sua Marcha sobre Roma. Ele mantinha ministros judeus em seus gabinetes de governo e convivia com conhecidas mulheres judias. Tudo isto parece entrar em choque com o impulso que tomava o Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães; o segundo partido em votos nas eleições de 1930, força que tinha forte admiração pela figura do Ducce Benito Mussolini. Desde 1922, ano da ascensão dos fascistas, Mussolini era o ídolo mais respei- tado e louvado pelos dirigentes nazistas. Fascistas italia- nos e fascistas alemães se consideravam irmãos políticos na empreitada modernista contra os fundamentos do co- munismo e os fetiches liberais que acompanhavam his- toricamente o Ocidente. O propósito era acabar com um passado decadente originado na Rússia. Em 1939, sete anos após a entrevista de Ludwig, foi editado em Buenos Aires o livro “La última voltereta de Mussolini” do judeu-italiano Eli Rubin, um ex-agente do Ministro de Propaganda do Ducce. Nessa obra seu autor afirma: “Na Itália o antissemitismo foi uma criação absoluta- mente artificial, uma descoberta realizada por decreto do dia para a noite”. Rubin acha também que o fracasso da inva- são a Abissínia (1935-1936) e o envio de pessoas a campos de trabalho forçado, represálias e inclusive o uso de gás mostarda; fez o regime italiano procurar um “bode expia- tório” que respondesse pelos erros do governo. A aliança Roma-Berlim foi certamente responsável pela luta contra o comunismo e contra o judeu internacional. Os judeus italianos Judeus habitam Itália desde tempos remotos. Eles po- voavam os territórios do Império romano e a bacia do Mediterrâneo desde antes do ano 70 d.C; data da des- truição do Templo de Jerusalém. Chegaram desde o norte atravessando os Alpes, desde a Germânia, migrando da Gália e da Hispânia, desde tempos dos Reis Católicos em 1492. Comunidades judaicas surgiram ao norte e sul do território italiano. Em Apúlia e Calábria os judeus pro- testaram pela perda de direitos, em Pompéia havia ricas comunidades devastadas pelo vulcão Vesúvio e em Saler- no a Universidade de medicina contava com numerosos docentes judeus. Ultimamente, vem sendo comprovada a presença judaica na Sicília, especificamente em Brindisi, Cápua, Venosa, Lavello, Matera, Siracussa, Caserta, Sessa,
  • 11. 11 ARTIGO Sorrento,Alife,Sanseverino,Eboli Cosenza,Reggio e Ca- tanzaro. Foram achados restos arqueológicos de sinagogas dentro de igrejas e monastérios. Judeus italianos atuaram no comércio, exportando para o Oriente algodão, queijos e couros. Importavam também produtos como arroz, índigo e linho para a indústria têxtil. A comunidade de Palermo tinha rabinos que mantinham contatos com os da Babilônia. Como Sicília pertencia ao Reino de Aragão, seus judeus sofreram o desterro como seus irmãos espanhóis. Fizeram parte da dispersão hispâ- nica que se dirigiu a Nápoles, Roma, Bálcãs e o Império turco-otomano. Nem todos abandonaram o país, alguns adotaram a conversão para seguir vivos, mas despertaram suspeitas das autoridades por manter suas práticas judai- cas. Eles usavam apelidos de judaizantes freqüentes nos ar- quivos da Inquisição, como por exemplo: Barone, Amato, Campagna,Mazza,Bruno,Bonfiglio,Bonanno e Moncada. A presença de Napoleão em 1797 levou à Itália os ide- ais da “Declaração dos Direitos do Homem”. Os judeus italianos ingressaram na modernidade deixando de lado mentalidades e comportamentos típicos do gueto; ado- tando o impulso doutrinário imposto pela Revolução Francesa. A queda de Bonaparte e o Congresso de Viena de 1815 - responsável pela divisão da Itália - retornaram novos ares discriminatórios contra os judeus. Na Toscana lhes confiscaram seus direitos políticos, em Piedemonte foram confinados em guetos sendo-lhes proibido entrar após 9 horas da noite, perderam suas vagas nas universi- dades, foram expulsos das escolas, negando-lhes também a possibilidade de empregar cristãos.Nos Estados do Vati- cano e em Módena os judeus pagavam impostos especiais para serem tolerados. Durante o Risorgimento de 1848, movimento de afirma- ção nacionalista italiano, os judeus obtiveram uma parti- cipação destacada, encontrando-se líderes como os irmãos Ciro e Giuseppe Finzi.Por 1870 havia na Itália aproxima- damente 35.000 judeus, e a maioria atuava na vida política do país. Eles se consideravam cidadãos italianos em igual- dade de direitos com outros cidadãos. Em 1920 a Itália contava com 350 senadores dos quais 19 eram judeus. A integração era total e definitiva. En- quanto a maioria da população era analfabeta, os judeus sabiam ler e escrever. Em 1930, 8% dos professores uni- versitários eram judeus. Nesta lista encontramos sobreno- mes como Levi, Beppo, Salvatori, Atílio, Ezio, Giuseppe, Alessandro, Teodoro, Camilo e Renato. Outros sobreno- mes achados são: Segré, Ângelo, Giorgio, Gino, Vittorio, Beniamino,Tedeschi, Volterra, Ruggero, Fabrio, Luzzatto, Vico, Mantovani, Ottolenghi, Ascarelli, Rabenne, Cassu- to, Castelnuevo, Castiglione e Sermonetta. Entre sobre- nomes de intelectuais judeus achamos: Sabatini, Pollitzer, Liuzzi, Loria, Lattes, Sacardoti, Olivetti, Rabean, Tosca- no, Pollaco, Treves, Diena, Salemi, Sarzoti, Leone, Sira- cusa, Ara, Monterossi, Bevilacqua, Bolaffio, del Vecchio, Sanguinetti, Colombo, Barzilai, Mondolfo, Schiff e Falcó. O médico César Lombroso, ícone do positivismo e estu- dioso da antropologia criminal, nunca negou sua origem judaica. Por 1935 dentre 2.525 personalidades notáveis do país, 169 eram judeus. Judeus foram o novelista Alberto Moravia (pseudôni- mo de Alberto Pincherle 1907-1990), o fundador do im- pressionismo italiano Serafino da Tívoli (1826-1892), o compositor e músico Alberto Franchetti (1860-1941), o escritor e filólogo Alessandro d’Ancona (1835-1914), o diretor das bibliotecas de Florença e Veneza Salomone Morpurgo (1860-1942), o violinista e compositor Federi- co Consolo (1841-1906), o matemático Túlio Levi Civittá (1873-1941), Ernesto Nathan (1848-1921) o prefeito de Roma entre 1907-1913 e o Primeiro Ministro Luigi Lu- zzatti (1841-1927), deputado três vezes e organizador dos Bancos Populares na Itália. Os judeus de Mussolini Mussolini nunca atuou sozinho. Ele contava com a per- manente cooperação de militares, polícia, juízes, funcioná- rios públicos,tecnocratas nacionalistas e forças conservado- ras. Quinze anos após a pomposa Marcha sobre Roma, o
  • 12. 12 Ducce continuava dominando uma administração pública cuja estrutura liberal foi herdada da 1ª Guerra Mundial. Desde um primeiro momento o chefe de estado contou com colaboradores judeus. Alguns surgiram como ele das fileiras socialistas, mas abandonaram o internacionalismo na 1ª Guerra. Dentre eles podemos mencionar a militan- te política Margherita Sarfatti, filha de uma rica família judaica fundadora da linha de “vaporettos” que circulava pelos canais de Veneza. A Sarfatti possuía vasta cultura e forte versatilidade para os idiomas, convertendo-se ra- pidamente numa embaixatriz do fascismo nas mais im- portantes capitais do mundo. Ela freqüentava salões de pintura e embaixadas sendo considerada uma “rainha das artes”. Ministrava palestras em universidades dos EUA e escreveu o livro de maior exaltação fascista intitulado “Dux” conhecido no mundo inteiro. Outros judeus que apoiaram Benito Mussolini foram Aldo Finzi, grande repressor dos antifascistas; e Carlos Foá, um renomado fisiologista que publicou a revista “Ge- rarchia” aprimorando as opiniões do pensamento fascis- ta. Finzi participou na 1ª Guerra, liderou a Marcha sobre Roma e ocupou a função de Vice-ministro do Interior e membro do Conselho Geral do Partido Fascista.Em 1943 ele se uniu ao movimento socialista,sendo expulso do par- tido e assassinado em 1944. Na Marcha sobre Roma se destacaram aproximadamen- te 300 judeus italianos. Dita manifestação contou com a ajuda econômica de vários industriais da aristocracia do norte do país. Ali Mussolini tinha amigos e simpatizantes como Giovanni Agnelli da Fiat, Carlo Esterle, Mario e Pio Perrone que apoiavam o jornal “Pópulo Italia”. Desde sempre o Ducce solicitou ajuda de empresários, em espe- cial da “Confederazione Generale dell’Industria Italiana”, liderada entre 1919 e 1934 pelo judeu Gino Olivetti, um reconhecido administrador. Durante a crise política que se apoderou da Itália em 10 de junho de 1924, Olivetti saiu em defesa de Mussolini, alertando à população que qualquer insurreição política acarretaria desordem social e a interrupção de uma vida econômica produtiva. A crise financeira de 1929 e a queda de Wall Street nos Estados Unidos levaram o governo fascista a manifestar- -se em prol de grupos industriais como forma de reduzir a fragmentação das propriedades e da administração.Indus- triais judeus apoiavam o governo, criando-se bases legais para motivar iniciativas privadas de produção. Ao elencar as principais figuras do judaísmo italiano entre 1850-1950, devemos relacionar os seguintes no- mes: Guido Jung (1876-1949), Gino Arias (1879-1940), Giorgio del Vecchio (1878-1940), H. Ancona, A. Luria e T. Meyer (todos assessores econômicos e banqueiros), L. Toeplitz (banqueiro) e Otto Hernan Kahan (filantropo), Maurício Rava, Isaías Levi (1863-1949), Ugo Ancona (1867-1936), Theodoro Meyer (1860-1942), Achille Lo- ria (1857-1943), Ettore Ovazza (1890-1943), Ítalo Balbo (1896-1940) e Pietro Badoglio (1871-1945). Mussolini e o Sionismo No decorrer dos anos 30, por meros interesses políticos, Mussolini apoiava aos nacionalistas árabes da Palestina e aos sionistas. Esta ambivalência se manteve até ele assi- nar com Adolf Hitler um acordo de defesa mútua; mo- mento em que o Ducce se posicionou abertamente “contra o perigo judaico”. Diante desta realidade o líder da Itália navegou por distintas águas: mantinha contatos e afetos compartidos com Vladimir Zeev Jabotinsky (1880-1940), virtuoso orador sionista, soldado e político fundador do movimento revisionista. A agência de notícias fascista “Avanti” comemorou em 1935 a celebração do Congresso dos Sionistas Revisionistas pelo apoio oferecido à Itália durante a campanha da Abissínia. Na ocasião Mussolini comentou com o Rabino de Roma o seguinte: “As condições necessárias para o êxito do movimento sionista dependem da criação de um Estado judeu, de içar uma bandeira e deter uma língua. Há uma pessoa que conhece isto muito bem, é o cidadão fascista Jabotinsky”. Jabotinsky foi influenciado por Theodor Herzl e ado- tou o sionismo como bandeira. Durante a 1ª Guerra
  • 13. 13 Mundial criou a “Legião Judaica” e lutou pela libertação da Palestina sob Mandato Britânico (1917-1947). Foi oficial do 38º Regimento de Fuzileiros do Rei, comba- tendo às ordens do general Allenby. Em 1918 Jabotinsky se estabeleceu na Terra de Israel criando milícias judai- cas para enfrentar os árabes. Fundou também o Betar, um movimento juvenil sionista cujos membros vestiam camisas pardas como os “squadristi” ou jovens fascis- tas. Este sionista de direita que já admirava Mussolini encontrou-se com o polonês Jozef Pilsudski; mas pres- sionou o Congresso Sionista para repudiar a política do Terceiro Reich. Após a rápida adoção e instauração de leis racistas por parte do Estado italiano em 1938, os fascistas iniciaram uma campanha aberta contra o sionismo.A rigor,foram os sionistas aqueles que entenderam que a derrota militar na África levaria Benito Mussolini a entrar em oposição com a Inglaterra e França, buscando uma aproximação com a Alemanha de Adolf Hitler. Esta aliança - baseada em po- líticas antissemitas - obrigava os judeus-sionistas italianos a buscar uma fuga rumo à Palestina. A publicação das “Leis de Nüremberg” em 15 de se- tembro de 1935 atingiu os judeus alemães, mas não gerou uma ameaça para os judeus italianos. Somente os sionistas alertavam sobre o início de uma ação antijudaica que não conheceria fronteiras. E eles não se enganaram. A cam- panha antissemita na Itália iniciada em agosto de 1936 tinha como responsável Joseph Goebbels, o Ministro da Propaganda do Terceiro Reich. A partir deste momento, cinco jornais bancados pelo Ducce, se encarregariam das campanhas de desprestígio aos sionistas; acusando-os de importar uma “conspiração bolchevique”. Por 1934 se comentava publicamente a existência de um complô judaico para tirar Mussolini do poder. Quando a polícia do Ducce prendeu um grupo antifascista denomi- nado “Giustizia e Liberta”, a imprensa local destacou a origem judaica de seus membros.Vários deles foram julga- dos e condenados como Carlo Levi, Vittorio Foá, Leone Guinzburg e Sione Segre. Os judeus italianos conheciam o significado do perigo ocasionado pela publicação das Leis de Proteção e Pure- za do Sangue na Alemanha. Mesmo assim, poucos con- seguiram enxergar o futuro. Enquanto Primo Levi fazia progressos em seus estudos e participava de encontros da Juventude Fascista (sem ser militante fascista), um cole- ga seu de turma, Ennio Artom, acreditava que os judeus sofreriam diante da crise iminente. As derrotas das forças italianas e a pressão das potências ocidentais sobre Itália recaíam em especial na França, Inglaterra, nos bolchevi- ques e nos judeus. A discriminação do Estado ficou clara quando o Ministério do Interior realizou o censo de 14 e 15 de fevereiro de 1938, solicitando pela primeira vez que os cidadãos colocassem sua religião. Poucos meios de comunicação repudiaram esta medida oportunista, intole- rante e fascista. A perseguição italiana O antissemita Roberto Farinacci (1892-1945), ministro de Estado de Mussolini,foi o responsável por fazer obede- cer à aplicação das leis racistas na Itália. Em pouco tempo, diretores de teatro receberam ordens de não exibir peças de teatro de autores judeus; donos de livrarias não pode- riam vender livros obras de judeus, sempre alertando do perigo nacional. Os decretos do Conselho Fascista con- gregado em 07 de outubro de 1938 levaram a vida judaica à sua condição na Idade Média.Aqueles judeus que apoia- vam o partido fascista experimentaram um sentimento de tristeza, dor e desapontamento. Suas vidas ficaram sem sentido ao serem expulsos das universidades, dos cargos públicos e do exército. O coronel Segre mandou todos seus soldados fazer uma formação e diante deles se disparou um tiro na cabeça. O general Ascoli fez o mesmo na sua própria casa. O edi- tor judeu Ângelo Formiggiani se suicidou jogando-se de uma das torres da catedral de Modena. Nenhum deles teve direito a avisos fúnebres nos jornais por serem judeus. O governo italiano decidiu aumentar a pressão por meio ARTIGO
  • 14. 14 de uma programada operação policial na qual se obteria maiores informações sobre os judeus do país: perfil de cada família, tipo de lar, status econômico, etc. A burocra- cia fez que decretos antijudaicos se convertessem em leis. Jornais como “La stampa” acusavam diariamente os ju- deus. Num editorial podemos ler: “Se o Estado fascista é totalitário, não pode permitir que a cultura italiana se veja contaminada pelo Judaísmo”. A palavra “contaminada”era algo novo na Itália, porém bem conhecido na Alemanha. Mussolini sabia que essa onda antissemita seria do gosto de Hitler com quem se uniria no pacto Roma-Berlim- -Tokio. Desde 1934, Benito Mussolini e seu Ministro Roberto Farinacci; se empenhavam em esclarecer a seus cidadãos; que os italianos pertencem a uma raça ariana etnicamen- te homogênea e superior àquela dos espanhóis, romenos, gregos e levantinos. Odiado pela esquerda italiana, Fari- nacci caiu prisioneiro dos partisanos que o executaram sem muita cerimônia em 1945. Em tempos da Kristallnacht (9-10 de novembro de 1938) na Alemanha; os italianos que pretendiam sair da Itália não podiam extrair mais de 2.500 liras. Segundo estatís- ticas, nesse período abandonaram o país 6.000 cidadãos, e alguns pagavam para obter passaportes falsos. A família de Primo Levi preferiu ficar. Cesare, seu pai, afetado por um devastador câncer de estomago, sugeriu a conversão ao Cristianismo; mas todos se negaram. Nos cafés era co- mum um cartaz: “Judeus não são bem-vindos”. Judeus que não se cadastravam na polícia eram tomados prisioneiros e encarcerados. Em menos de um ano, até meados de 1939, aproxi- madamente 550 judeus destacados nas ciências, letras, artes, comércio e indústria, conseguiram sair da Itália. Dos 42.000 judeus existentes durante a 2ª Guerra, 5.000 foram deportados para campos de concentração e ex- termínio alemães. Destes, poucos retornaram com vida. Durante o Holocausto foram assassinados 17% do total dos judeus italianos. Em Trieste, de um total de 6.000 judeus, ao finalizar a guerra não haviam sobrado mais de 900. A blitz mais importante de judeus aconteceu em Roma em 16 de outubro de 1943. Foi uma parceria entre alemães e italianos, na qual 1.000 homens, mulheres e crianças foram obrigados a abandonar suas casas, sendo transportados ao gueto e levados em trens a Birkenau. Como é de público conhecimento, o Papa Pio XII não se pronunciou oficialmente contra a perseguição aos judeus da Europa. O regime fascista jamais demonstrou compaixão com seus inimigos. Entre 1930-1934 foram detidos e encar- cerados 6.000 comunistas e antifascistas, todos sem julga- mento. Em abril de 1940 Hitler ocupou a Dinamarca, em maio invadiu os Países Baixos e Paris. Em 26 de maio de 1940, um subsecretário do Ministro do Interior de Mus- solini escreveu ao chefe da Polícia Arturo Bocchini: “O Ducce deseja que se preparem campos de concentração para pri- sioneiros, inclusive judeus”. Por 1941 o número de detidos havia aumentado para 11.000 pessoas e em 1943 a Itália já contava com 51 cam- pos de concentração, quase todos localizados ao sul. Não eram campos de barracas com arame farpado, eram esco- las, conventos, fortalezas, castelos abandonados e edifícios improvisados. Havia ainda lugares especialmente destina- dos para judeus e outros mistos.Não encontramos campos de extermínio como Auschwitz nem tampouco campos de trabalho forçado. Às vezes fica difícil julgar a pessoas que viveram uma guerra há mais de 70 anos atrás. Mas, é preciso perguntar- -se que cegueira tomou conta dos judeus fascistas italianos que não avistaram o futuro negro que lhes estava reserva- do? Será que negando a realidade conseguiriam fugir dela mesma? Acaso era uma verdadeira necessidade de não se- rem enquadrados como estranhos para poderem reivindi- car uma igualdade desejada? Difícil prognosticar. Aqueles que conseguiram vistos fugiram. Porém, uma maioria de- cidiu continuar na Itália amarrada aos governos de turno. Alguns seguiram seus estudos, outros acharam trabalhos ocultando seu Judaísmo, e um terceiro grupo se uniu aos partisanos combatendo nas fileiras da resistência.
  • 15. 15 Primo Levi e Dan Vittorio Segre Depois do assassinato de vários membros de sua famí- lia, Primo Levi se incorporou à luta guerrilheira organi- zada contra os alemães ao norte da Itália. Após a queda de Mussolini em julho de 1943, estava prestes a combater; mas foi denunciado e feito prisioneiro em dezembro. En- viado primeiramente ao campo de detenção de Rosoli di Capri, dois meses depois seria levado a Auschwitz. Como é sabido, sobreviveu por seus conhecimentos de química. Ao ser liberado Auschwitz pelos russos, Levi percorreu quase toda a Europa destruída, retornando a Turim, sua cidade natal. Nunca mais se afastou da casa paterna nem da cidade amada, dedicando sua vida profissional a uma fábrica de tintas, especializando-se na produção de esmal- tes sintéticos. Em 1946 Primo Levi entregou ao professor de sua esco- la secundária Cesare Pavese os manuscritos de “É isso um Homem”. Pavese entendeu que aquele não era o momento ideal para publicar a obra, pois não era conveniente ler uma publicação que transmitia dor. Havia que olhar para o futuro e esquecer o sofrimento. Não obstante, Levi con- seguiu colocar as descrições dilacerantes da obra nas pra- teleiras das livrarias. Seu belo texto passou inadvertido na crítica italiana como também na opinião publica em geral. Ganhou notoriedade somente quando a editora Einaudi o publicou. Até 1955 não era prudente nem de bom senso falar do Holocausto. Em 1960 esta obra reflexiva sobre o comportamento psíquico e humano apareceria na Alema- nha e Inglaterra. Na França virá à luz depois do suicídio do autor. Primo Levi teve vergonha e culpa por ter sobrevivido à guerra. Sobreviver era em certa forma um ato de automu- tilação. Ele faz parte daqueles escritores que presenciaram a queda da natureza humana em todas suas vertentes; to- cando o fundo do poço,enxergando passivamente a humi- lhação e a decadência do homem. Certamente, seu suicí- dio tem tudo a ver com a depressão que o acometeu ao ver em livros e discursos a negação do Holocausto. Outro escritor italiano que narra suas experiências em tempos de guerra é Dan Vittorio Segre, um judeu de fa- mília rica, criado por governantas, que também sofreu an- tissemitismo até 1938. Neste ano ele consegue fugir para Palestina, se incorpora ao serviço diplomático israelense para encerrar sua vida como professor da Universidade de Haifa. Nos 16 anos em que viveu na Itália, Dan Segre participou com total naturalidade nas organizações fascis- tas (Balilla e Avanguardisti); como também das exibições ginásticas organizadas pelo partido do Ducce. A mãe de Dan Segre, uma militante da divisão feminina do fascismo, obteve uma autorização para que Dan pudes- se ausentar-se na escola das aulas de religião. Nas 5as fei- ras ele fazia aulas de Tora para seu Bar Mitzva. Seus pais começaram a reparar o perigo fascista em 1937, quando grupos de baderneiros (protegidos pela polícia) entraram numa sinagoga, interrompendo com gritos antissemitas os serviços religiosos e batendo nos judeus ali presentes. Somente as consequências da guerra e os tormentos dos campos de concentração levaram Primo Levi a assumir sua condição judaica. Ele escreveu: “Esta experiência dupla, as leis racistas e o campo de extermínio, estão gravadas em mim como uma placa de aço. Agora sim sou judeu, costuraram em mim a estrela de Davi e não apenas nas minhas roupas”. E de- pois diz: “O verdadeiro crime, o crime geral de todos os alemães daquela época, foi a falta de coragem para falar”. Seguindo à risca esta afirmação, poucas são as confissões de judeus fascistas italianos reconhecendo o maior erro estratégico: a crença de poder separar a experiência italiana da alemã, de acreditar que Mussolini atuaria sozinho e por conta pró- pria, e imaginar o fascismo na Itália como uma ideologia redentora. Estas pessoas achavam que seu italianismo os levaria a uma salvação espiritual e que o nacionalismo fer- voroso os salvaria como judeus. Os judeus italianos se deixaram levar por um comodis- mo burguês. Mussolini tinha entregado a eles uma nação sem conflito de classes e sem greves,propicia para obterem vantagens econômicas e profissionais; portanto estavam orgulhosos em demonstrar sua condição de italianos e não de pessoas excluídas das grandes decisões do país. ARTIGO
  • 16. 16 A partir de 1938 Itália e Alemanha eram aliadas. Mus- solini e Hitler manifestavam uma admiração mútua. Os contatos diplomáticos, políticos e militares nunca estive- ram melhores. Porém, para os nazistas o antissemitismo não foi algo secundário, pois fazia parte central de sua ideologia desde o século 19. O Judaísmo foi alvo prefe- rido do ódio popular. Alemanha desejava construir uma “comunidade de sangue germânica”; portanto, considerou o povo hebreu um fator destrutivo do povo alemão, uma praga que precisa ser exterminada. Os maus tratos impostos aos judeus na Alemanha gera- ram manifestações em organismos de justiça na Inglaterra, França, Suécia, Suíça, Argentina e Estados Unidos. Nada disto fez a Itália. O antissemitismo alemão não poderia ter sido ignorado pelos judeus italianos. Por 1932 havia mais de 500.000 judeus na Alemanha. Poucos meses de- pois, já com Hitler no poder; boicotes e queima públi- ca de livros, destruição e incêndios de lojas e sinagogas, afastaram os judeus da vida sócio-econômica do país. Todo centro de cultura e lazer (cinema, teatro e praças) foi “arianizado” e “limpo de judeus”. Era o “sauberung” italiano. Os judeus não poderiam adquirir automóveis, motocicletas ou qualquer outro meio de transporte. Es- tavam à margem da sociedade. Em 1939,um ano depois da adoção das “Leis de Nürem- berg” pelo Ducce, havia na Alemanha somente 200.000 judeus. O resto havia emigrado. Emigrar era privilégio de poucos, pois requeria dinheiro. Aqueles que ocultavam sua condição judaica apresentando-se nos consulados como italianos (sem informar a religião) tinham chances de se- rem aceitos, pois a maioria dos países não aceitava judeus. Encerro nosso tema com as palavras da historiadora Vi- viane Forrester em “O crime ocidental” (Buenos Aires, 2008): “Os países mantiveram sempre um número de cotas migratórias reduzidas, deixando os judeus pegos na ratoeira hitlerista, sem nenhuma esperança, alternativa ou recursos. Todos enganavam os judeus, sempre reticentes. Moral desta história: em todo lugar compensa auxiliar o horror”. Bibliografia: Bobbio, Norberto. Ensayos sobre el fascismo. Universi- dad de Quilmas. Prometeo Libros. Buenos Aires 2006. Forrester, Viviane. El crimen occidental. Fondo de Cul- tura Económica. Buenos Aires 2008. Gutman, Daniel. El amor judío de Mussolini: del fascis- mo al exilio. Editora Lumière. Buenos Aires 2005. Paxton, Robert O. Anatomia do Fascismo. Editora Pe- nínsula. Barcelona 2005. Orano, Paolo. Gli ebrei in Italia. Casa Editrice Pinciana, Roma 1937. [Los judíos en Italia, Roma 1937]. Orano, Paolo. Mussolini fondatore dell’impero fascista. Casa Editrice Pinciana, Roma 1940. Rubin, Eli. La Última Voltereta de Mussolini. Editorial Argumentos. Buenos Aires 1934. Segre, Dan Vittório. Memoirs of a Fortunate Jew-An Italian Store. The University of Chicago, Press. Chicago 2008. Sternhell, Z.; Sznajder, M.; Asheri, M. El nacimiento de la ideología fascista. Editora Siglo XXI. Madrid 1994. Thompson, Ian. Primo Levi. Editorial Belacqua. Barce- lona 2007. Prof. Reuven Faingold é historiador e educador, PHD em História e História Judaica pela Universidade Hebraica de Jerusalém. Profes- sor titular da pós-graduação no Departamento de História da Arte da FAAP em São Paulo e Ribeirão Preto, ele é também sócio fun- dador da Sociedade Genealógica Judaica do Brasil e, desde 1984, membro do Congresso Mundial de Ciências Judaicas de Jerusalém.
  • 17. 17 ARTIGO MEU CONVÍVIO COM A COLÔNIA JUDAICA CONSUELO PONDÉ DE SENA M oramos muitos anos no bairro de Nazaré, reduto preferido dos judeus de Salvador, que se espalhavam pelo Jardim de Nazaré, Jôgo do Carneiro, Desterro e redondezas, próximo da Baixa dos Sapateiros, onde muitos daqueles imigrantes possuíam estabelecimen- tos comerciais. Também era accessí- vel a todos, por causa da proximidade dos colégios, que dispensava despesas com os bondes. Outros tantos, menos abonados, mascateavam para sobreviver. Eram vendedores ambulantes que ofereciam seus produtos pelas ruas, tendo clien- tes nos mais distantes bairros da cida- de.Tenho certeza que foram os judeus que introduziram as vendas a prazo em nosso meio. Também no Dester- ro estava situada a Sinagoga, em cujo prédio da Rua Santa Clara funcionava a Escola Israelita Brasileira. Segundo Thales de Azevedo, teria existido ou- tra sinagoga na Rua do Alvo, frequen- tada por poloneses. Dessa, confesso, jamais ouvi qualquer menção. Por volta da década de 1940 ali nos estabelecemos, primeiramente, na casa de minha avó paterna, na Rua Santa Clara do Desterro nº 8, resi- dência que fora doada à família do juiz Pedro Faustino de Souza Condé, cognominado “O Bom Juiz”, por in- termédio de A Tarde, em campanha conduzida pelo jornalista Ernesto Simões Filho, íntimo amigo de meu tio-avô, Ezequiel de Souza Pondé, ir- mão do falecido. Talvez por desejar residir próximo de sua família, meu pai adquiriu uma morada na Rua Franco Velasco, nº 8 (Ladeira do Desterro) um simpático bangalô pintado de azul claro. Igual a ele, só existia um outro bangalô, pin- tado de verde, de propriedade do Sr. Bernardo Grossman, casado com D. Berta e pais de Mirinha (Myriam), Feiga, Frida (Tita) e Moishe, a quem chamavam de Moischinho. Na parte inferior da residência, morava a famí- lia de Sr. Pedro Vaimberg e D. Sônia, que só tinham uma filha, Sara, mais tarde, Sra. Leão Rozemberg (Lio- va) que residiam, isoladamente, na Ladeira dos Galés. Eram irmãos de Liova: Líuba e José. Sobre a nossa família, assim escreve Esther: “O que possuía melhor situa- ção era mesmo o doutor Pondé. Nas- cido na terra, já conhecia grande par- te da sociedade baiana, enquanto que nossos pais, estrangeiros, precisavam ainda entender sua gente e participar do tecido social. Naquele tempo, mal frequentavam as raras estatísticas”. Com efeito, eram situações diame- tralmente opostas. Meu pai, médi- co clínico, atendia a vários pacientes judeus em suas próprias residências, a todo e qualquer momento que era convocado. Humano, não estabelecia preço para os serviços que prestava, recebendo, em envelope lacrado tudo que aqueles imigrantes lhe retribuíam. Lembro-me que, certa feita, indaguei: pai, eles lhe pagam o que querem ou o que é justo? Ao que ele respondeu categórico: “minha filha, eles são imi- grantes, pagam o que lhe podem”. Logo ao lado da nossa casa, na de n° 6, vivia a família do seu Jacob Bauer, pai de Esther e Linda, que tempos depois se mudaram para São Paulo. Mais tarde, na mesma morada viveu a família Schnitman, pais de Simão e Ângelo (Anjinho). Não me recordo de existir um irmão mais novo. Em seguida, encontrava-se o gran- 17
  • 18. 1818 de casarão do Sr. Salomão Lipcovitz, casado com D. Frima e pais de Mary e Clara. Era uma grande roça onde existia uma frondosa mangueira em- baixo da qual se reunia a meninada da rua sob os protestos do proprietário. Este se sentia importunado com as presenças incômodas dos meninos que jogavam pedras na mangueira para colherem suculentas mangas. As meninas também ali se reuniam para conversar, mas não causavam qual- quer estorvo. Naquele grande edifício mora- vam muitas famílias, inclusive, a do Sr. Marcus Palatnick, casado com D. Rouge, pais de Esther Regina e Fanny. Esther é a consagrada escri- tora Esther Largman, que há muito tempo mora no Rio de Janeiro. Au- tora de “Jovens Polacas” (1993), ”Tio Kuba nos Trópicos”( 1999), Jan e Nassau (1996). Publicou também “Judeus nos Trópicos” (2003). Depois que se transferiu para o Rio, onde terminou o Curso de Geografia e História, iniciado na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Bahia, hoje UFBA, perdi Esther de vista. Quando lançou no Rio de Janeiro, em 1999, seu romance “Tio Kuba nos Trópicos”, Carlos Kertész tomou co- nhecimento do trabalho e me infor- mou que me encontrava entre as me- ninas citadas pela autora, escondida sob o nome de Sueli. Assim escreve: “Havia deixado pra trás o primário, as brincadeiras de roda, tão queridas. Eu, Gusta, Sara, Clarinha, Mirinha e Sueli. Esta não era judia, filha do Dr. Condé, regulava conosco em ida- de e sempre entrava nos folguedos. Possuía uma irmã mais velha e dois irmãos. Havia também uma meni- na, Lurdinha, filha de pai judeu, mas sua mãe não era. Hoje dou-me conta de que aceitávamos de bom grado a companhia de Sueli; mas Lurdinha nem tanto; talvez de ouvirmos os mais velhos comentarem sobre essas famílias, então raras àquela época”. Ao comentar a rígida endogamia então existente acrescenta Esther: “O casamento dentro da comuni- dade chegava às raias da endoga- mia, muitos cavalheiros precisavam chamar primas do velho continente para esposas”. Com efeito, participei como observadora à distância, na- turalmente, do namoro e posterior casamento de Mary Lipcovitz com o brasileiro Humberto Quadros, que foi um “Deus nos acuda“ de sobres- salto para a família e a sociedade. Antes deles, casaram-se à revelia do grupo, a bela Sara Orestein que se uniu ao Dr. Pacífico Ribeiro, homem de talento reconhecido, mas estranho à comunidade. Como o desejável eram as uniões en- tre judeus, para fins de identidade, os realizados fora daquele círculo eram repudiados. Esther Largman também se refere ao preconceito contra os se- fardis, aqui chegados após a primeira guerra mundial, procedentes dos Bal- cãs e Oriente Médio. Acrescenta ain- da: “O grupo vivia isolado e margina- lizado – por um lado pela população local,devido à diferença como estran- geiro e, por outro, do grupo ashkena- zi, porquanto faltava-lhes identidade de língua, cultura e mesmo de ritos religiosos”. Concluindo, arremata: “Em ambas as gerações era mais fácil um sefardin unir-se a um não judeu do que casar-se com um ashkenazi”. Residiam em outros pontos da cidade, na Rua Areal de Baixo e Largo Dois de Julho, onde praticavam seus ritos religiosos.“Dedicaram-se ao pequeno comércio, às vendas de importação e exportação, bem como de tecidos, sendo muito auxiliados pelos mem- bros da família”. Conheci pouquíssi- mos deles, que me foram apontados por minhas amigas, mas não enten- dia o porquê daquela segregação. Ainda em compartimento do mes- mo edifício residia o pai de Rubem Tabacof, não sei se Moishe ou Leo- nel. Vestia-se sempre de negro e sua aparência era, de certa forma, estra- nha. Abaixo da roça do Sr. Salomão, seguia-se outro casarão situado no pé da ladeira. Desse lado, existia a morada dos Abramovitz, cujo chefe, Sr. Marcus, um senhor muito gordo e avantajado, casado com D. Rachel e pais de: Abraão, Fernando (Chico) e Mira. Do outro lado, do mesmo edifício, viviam os Schreiber, pais de Líuba e Arthur. Do lado ímpar, re- sidiam muitas famílias baianas, exis- tindo apenas uma morada de judeus, a do Sr. Luís Portnoi e D. Guiomar que tinham os seguintes filhos: Salo- mão,Marina,Israel (Ziraé),Germano (Exo) e Esther (Teté) . Germano casou-se, muito mais 18
  • 19. 19 ARTIGO 19 tarde, com Sulamita Auster, filha de Gerson Auster, que moravam na Rua Climério de Oliveira (Limoeiro),cujo parto fora feito por meu pai, autor da sugestão do nome da recém-nascida. Israel casou-se, em primeiras núpcias, com Ida Bichucher que morava na Ladeira da Prata onde também vi- viam Sulamita (Shulames) e Sara. A primeira casou-se com Bóris Tabacof e a segunda com Lipe Goldestein. Germano Tabacof, usava calças curtas, como era moda para os ado- lescentes, era o rapaz mais bonito da redondeza. Sério, compenetrado, não dava importância aos pequenos, mes- mo porque já trabalhava com o pai, conforme escreveu no primoroso ar- tigo publicado em A Tarde, no dia 30 de dezembro de 2013. Mais abaixo, na parte plana, próxi- mo do Mercado São Miguel, morava a família do Sr. Leonel Tabacof, pai de Bóris, Germano, Gusse, David (Duda) e Esther (Teté), fujona que só ela. Certa feita Teté, com cinco a seis anos de idade,escapou da vigilân- cia da babá e foi encontrada, por um guarda civil, no Pelourinho. Foi um salseiro dos diabos! Na Rua Santa Clara, nº 34, bem em frente ao Convento do Desterro, que frequentei com certa assiduidade, existia no andar térreo o Armazém do Senhor Manoel Gomes Pomar, um galego simpaticíssimo que nos vendia, por vezes fiado, balas e abafa-banca. Apesar de não ser judia era aceita entre eles, tanto assim que, muitas vezes compareci às festas infantis da- quela Escola e assisti algumas repre- sentações teatrais. Como é natural, os imigrantes ju- deus viviam isolados no seu grupo, diferentemente portanto dos outros estrangeiros, como os espanhóis, cujo processo de assimilação processou- -se muito rapidamente, por conta da estreita relação com os portugueses e, certamente, pelo fato de abraçarem a mesma religião - o catolicismo. Os “russos” como genericamente eram tratados todos os judeus,fossem aske- nasis ou sefaradins, diferenciavam-se entre si. Não sei se algum sefaradim morava naquelas redondezas; penso que não, viviam em outros bairros, como nos Barrís e na Barra. Percebia-se, claramente, que embo- ra aparentemente constituíssem um grupo coeso diferenciavam-se entre si porque procediam de regiões muito diversas. Conhecidos como “russos”, divergiam, inclusive, pela orientação política que adotavam. Assim, os pro- gressistas tinham uma postura socia- lista e cultivavam o ídiche; enquanto os sionistas voltavam-se para o culto da língua hebraica e sonhavam com o estabelecimento do Estado de Isra- el. De minha observação infantil, só distinguia os sionistas e os que abra- çaram o comunismo soviético. Esses eram moços e moças, que cursavam o Ensino Superior e eram facilmen- te identificados pelos mais jovens. Também percebi, porque era muito atilada, que existia preconceito entre os próprios judeus, a saber, entre os ashkenazis de os sefardins . Na minha condição de “gói”(não ju- dia) só via as coisas pelas aparências, não percebendo, portanto, as rivalida- des existentes entre grupos diferen- ciados. Para mim, na minha infantil percepção, a maior diferença entre nós estava centrada na religião, por- que éramos adeptos de Jesus Cristo, enquanto os judeus eram seus supos- tos algozes. Apesar dessa diferença marcante, que poderia ser imobiliza- dora nas relações sociais, as crianças não alimentavam qualquer resquício de animosidade em relação a seus amiguinhos de vizinhança. Davam- -se bem, frequentavam as festinhas de aniversário e entretinham-se com as mesmas brincadeiras. Juntas pulavam picula, jogavam macaco (amarelinha), faziam rodas, cantavam as mesmas canções, divertiam-se com os “cozi- nhados”, sem que diferenças de ori- gem e de crenças perturbassem o dia a dia de cada uma. De acordo com o relato de Esther: “Minha irmã tinha suas amiguinhas. Havia como uma estratificação de amizade por faixas etárias. Assim como eu brincava com as meninas de dez ou doze anos, Stefany fazia parte de um grupinho com garotas de sete e oito anos. O mesmo ocorria com os meninos e rapazes”. A Sociedade Israelita da Bahia reunia: Escola, Sinagoga, Biblioteca, Grêmio, Grupo de Teatro Amador, organizações juvenis de orientações diversas, tendo o Sr. Marcus Palatini- ck criado um coral a quatro vozes na década de quarenta,grupo que segun- 19
  • 20. 2020 do Esther Regina, sua filha, partici- pou de várias reuniões e foi convidado para apresentar-se em Recife, onde fez um concerto para a comunidade daquela capital. A grande maioria das crianças ju- dias fazia o curso primário na Escola Israelita Brasileira Jacob Dinenson, financiada pelos pais dos estudan- tes, que também a administravam e promoviam campanhas para ajudar na sua manutenção. Exercia o papel de professor responsável pelas dis- ciplinas do primário, àquele tempo as quatro séries, o dedicado mestre- -escola Octacílio Tibiriçá. Curiosamente, quase todas as crian- ças judias eram “obrigadas” a estudar música, cujas aulas eram ministradas por professores brasileiros, nas casas dos alunos. Nem todos tinham ten- dência para esses estudos “forçados”e, sem aptidão para o piano ou o violino, passavam horas e horas preparando as lições, quando prefeririam brincar na rua, subir nas árvores, ler gibi, brincar de boneca e de outros divertimentos. Da minha geração, poucos se desta- caram como musicistas, tendo atuado e se destacado como profissionais da música: Salomão Rabinovitz e Do- rinha, que, alías, não moravam na Ladeira do Desterro, por algum tem- po, denominada Franco Velasco, em homenagem ao grande pintor baia- no. Duas professoras de piano eram requisitadas pela Sociedade Israelita: Professoras Esther Cardoso e Rosita Baptista. Quanto aos professores de violino, só me lembro de professor Filomeno, que dava aula a alguns me- ninos da Rua Nova, extensão térrea daquele logradouro, no qual as resi- dências eram mais modernas e viviam outros membros da comunidade, a exemplo do Sr. Grossman, pai de Jay- me e Natan - lembranças que não es- tão muito vivas atualmente, porque a convivência com essas pessoas não era próxima. Tenho uma vaga recordação de que os Wolfovitch também mo- ravam na Rua Nova, em cuja casa de esquina residia o terrível Valter Lima, que nós todos respeitávamos pelas peraltices que praticava para espanto da garotada. Curiosa, observava a relação ínti- ma que existia entre certas senhoras, que se reuniam toda tarde para jogar e, o consequente distanciamento de muitas outras que permaneciam em casa, mantendo estranho isolamen- to. As que eram muito próximas in- tercambiavam receitas e se ajudavam mutuamente, em casos de festas e aniversários. Eram extremamente so- lidárias. Nem todas, porém, moravam no Desterro, mas nas proximidades, de tal forma que vinham a pé do Jogo do Carneiro e do Jardim de Nazaré. Lembro-me muito, e com saudades, de uma amiga especial, Sara Spilberg, com quem tinha muita afinidade,pois ambas éramos muito sonhadoras. Penso que morava no Jogo do Car- neiro. Fato é que, quase todas as tar- des, ela aparecia em minha casa para conversarmos. Recostadas no muro ou sentadas nos bancos de cimento da nossa área externa iniciávamos o papo costumeiro. Falávamos do “nos- so mundo”, daquele em que somente nós duas existíamos. Nossas famílias eram extintas. Assim, donas do pe- daço, imaginávamos que tomaríamos todos os sorvetes da Primavera e nos deliciávamos com as balas e chocola- tes da Baby,uma confeitaria bem pró- xima da Baixa dos Sapateiros . Certo dia Sara veio fazer uma grande reve- lação. Grande e triste. Como sua fa- mília era sionista, todos da casa iriam morar em Israel. Despedimo-nos sem imaginar que o destino nos separaria para sempre. Essas lembranças seguem comigo pela vida afora como marcos agra- dáveis de uma convivência salutar. É certo que essas recordações trazem consigo algum sentimento de per- da, de nostalgia. Entretanto, para o notável Pe. Antônio Vieira: “Não há alegria neste mundo tão privilegiada, que não pague pensão à tristeza”. Amigos da infância que se mantêm fieis por toda a vida são os melhores porque resistem à prova do tempo. Algumas dessas amizades dissolvem- -se diante da ausência prolongada, porque carecem da convivência. Sigo, porém, o pensamento de Camões, se- gundo o qual, “A verdadeira afeição na longa ausência se prova”. A manutenção dessas preciosas amizades de infância é uma prova da constância do verdadeiro afeto. Presidente do Instituto Geográfico e Histó- rico da Bahia e membro da Academia de Letras da Bahia
  • 21. 21 ARTIGO E mbora minoria no conjunto imigrante, os ju- deus que se estabeleceram em São Paulo e Rio de Janeiro a partir da primeira década do século XX, identificados pela fé e tradições milenares, diferenciavam-se pelo idioma, traços culturais e tipo físico. Enquanto os asquenazis, procedentes das co- munidades judaicas da Europa Oriental, expressavam-se em iídish, os sefaradis, em ladino e, os judeus orientais, em árabe. Condições históricas e culturais permitiram que os judeus ibéricos se evidenciassem pelo cosmopolitismo e liberalidade, enquanto os asquenazis e os judeus orientais no conservadorismo. Economicamente melhor situados, os sefaradis, procedentes de cidades otomanas de refú- gio (Esmirna e Istambul), escolheram residir em bairros aprazíveis e residenciais de São Paulo e do Rio de Janei- ro. Fiéis observantes da religião, comumente dirigidos por eminentes rabinos, os esmirlis de São Paulo conseguiram contratar o rabino Jacob Mazaltov, natural de Istambul que prestara serviços à comunidade sefaradi de Montevi- deu.O religioso marcou época na sinagoga da Comunidade Israelita Sephardi, inaugurada em São Paulo de 1929. Em cerimonial solene, trajando vestes brancas e, preocupado com o entendimento das rezas, Mazaltov as interrompia para explicá-las aos presentes, fato que conduziu à sina- goga judeus de várias procedências, sobretudo depois da criação do Centro Recreativo Brasileiro Amadeu Toleda- no, o CIBAT. Judeus Marroquinos: São Paulo e Rio de Janeiro RACHEL MIZRAHI O texto contou com o apoio de Samuel Elis Azulay Benoliel, Presidente do Conselho Se- faradi do Rio de Janeiro e das irmãs Barki, Rosa B.Israel e Matilde B. Menasce. Instalados em São Paulo a partir da primeira década do século passado, os imigrantes sefaradis do Oriente Médio caracterizaram-se por abrir as portas de sua sinagoga a to- dos que a procurassem,certamente inspirados pelo Profeta Isaías que pressagiou “que minha casa seja a casa de oração de todos os povos”, dístico colocado na entrada do edifício da Sinagoga Beth-El do Rio de Janeiro. Da mesma forma, assim construída, a sinagoga sefaradi paulista recepcionou a partir de 1930, judeus procedentes da Itália, Grécia, Bul- gária, antiga Iugoslávia e aos asquenazis alemães, de linha liberal - imigrantes e refugiados das perseguições antisse- mitas, perpetradas pelo Nacional Socialismo Alemão em seus países de origem. Judeus marroquinos do Norte brasileiro que se transferi- ram para o Rio de Janeiro surpreenderam-se com a antiga União Israelita Shel Guemilut Hassidim, sinagoga construí- da por imigrantes alsacianos e oficializada pelo Imperador D. Pedro II em 1873. Entre os que se filiaram à sinagoga estava David José Pérez,nascido em Breves,no Pará.Pérez buscara o Rio de Janeiro depois de completar estudos nas yeshivot da cidade de Tânger, cidade natal de seu pai, que o acompanhara. No Rio de Janeiro, Pérez dedicou-se à docência em es- colas oficiais e particulares, chegando a emérito professor do famoso Colégio Pedro II. Depois do cursar Direito, doutorou-se em Ciências Econômicas, partindo para uma brilhante e elogiada carreira profissional, projetando-se na
  • 22. 22 vida cultural do Rio de Janeiro por artigos publicados em jornais da capital fluminense1 . Em 1916, fundou “A Colu- mna”, jornal mensal escrito em português sobre assuntos judaicos e sionistas. O humanista Álvaro de Castilho era seu sócio e colaborador2 . Os artigos desses diretores obje- tivavam esclarecer ao público sobre o judaísmo e a história dos judeus no Brasil e outros locais da diáspora. Em 1922, Pérez aceitou dirigir a Escola Maguen David, primeiro estabelecimento de ensino judaico do Rio de Janeiro, do qual surgiu o conhecido Colégio Hebreu Brasileiro. A partir dos anos 20, a Shel Guemilut Hassidim recepcio- nou as famílias dos Azulay, Bemerguis, Abecassis, Benze- cry, Bensussan, Benarrosh, Zagury, Benoliel, Benchimol, Benjó, Bentes, Garson, Ezagui, Obadia e os Eshrique, migrantes judeus da Amazônia brasileira que, aos poucos passaram a predominar nos cargos diretivos da sinagoga. Yomtob Azulay, por exemplo, elegeu-se Presidente e per- maneceu na função por 38 anos, depois que a sinagoga se transferiu para Botafogo. Os marroquinos diferenciavam- -se pela escolaridade em bancos de Universidades euro- peias: os irmãos Rubem David, Elias e Jacob Azulay des- tacaram-se na área médica (dermatologia e psicanálise) e, Rubem David Azulay chegou à Presidência da Academia Brasileira de Medicina. Dos migrantes marroquinos que se estabeleceram na si- nagoga sefaradi de São Paulo, sob os cuidados de Men- del Wolf Diesendruck, prestigioso rabino austríaco, estão os Athias, os Levy, Alves, Bensadon e os Melul. A franca recepção sefaradi aos marroquinos foi motivada pela lem- brança de Amadeu Toledano, judeu da Ilha de Malta, que batalhou pela construção da sinagoga sefaradi em 1929. Entre os migrantes nacionais, destacamos Eliézer Moy- 1 MALVEIRA, Antonio Nunes. Achegas para uma biografia do Professor David José Pérez. Caderno nº. 3 - Colégio D. Pedro II, Rio de Janeiro, 1983. Preocupado com problemas do povo judeu, José Pérez inscre- veu-se no Primeiro Congresso Judaico Mundial onde se postulava a criação de um Estado. Em 1917, dando apoio à Declaração Balfour, Pérez traduziu e prefaciou a obra de Theodor Herzl, no Brasil. 2 Álvaro de Castilho acreditava que o “sionismo deveria fazer parte do movimento humanista”. FALBEL, N. A Imprensa Judaica. Revista M orashá. CBSP, São Paulo: dezembro 1977. sés, nascido na região amazônica em 1878, quando salien- tou-se por servir no batalhão da Guarda Nacional, criado pelo Imperador D. Pedro II quando conseguiu patente de Coronel. Ao candidatar-se para Prefeito de Maca- pá, conseguiu eleger-se. Conhecido como “Major Levy”, permaneceu no Território do Acre de 1932 a 1947. Em São Paulo, sua filha Rachel casou-se com Siegbert Simon, de origem alemã e, frequente da sinagoga sefaradi desde 1936. Formado na Alemanha, de cultura diversa, Simon adaptou-se aos costumes judaicos da esposa, trazidos da Amazônia marroquina. O mesmo acontecera com Carlos Kertész, cujo pai era procedente da comunidade judaica húngara e a mãe, dos Mellul marroquinos, nome aportuguesado para Mello. Carlos Kertész pertence à quinta geração brasileira das fa- mílias Mellul de Tânger e Aferiath de Mogador, uma vez que seus trisavós,bisavós e avós já eram nascidos no Brasil. A família aportara no Brasil em 1824 e,a crise da borracha os levou de Belém do Pará a Fortaleza e Recife, até decidir em 1920 fixar-se em Salvador da Bahia. Seu irmão, Mário de Mello Kertész elegeu-se prefeito da cidade em duas oportunidades, na década de 1980. Carlos Roberto de Mello Kertész que por seis anos dirigiu a comunidade ju- daica da Bahia reside hoje com sua família em São Paulo e é,vice-presidente do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro. Outro emérito participante da sinagoga foi Isaac Athias que, antes de se estabelecer em São Paulo passara por Re- cife quando conheceu e se casou com Amélia Dimenstein, estudante de Medicina. Parente de Elisia Sarraf Hakim, Athias associou-se em São Paulo com Moisés Hakim, proprietário de “Ao Movelheiro”, famoso estabelecimen- to comercial de móveis para escritório. Athias conseguira, ainda no Norte, formar-se em Contabilidade. Sua exem- plar formação religiosa foi conseguida por ter sido aluno de Elias Israel, considerado “Tzadic”, pela sua dedicação aos estudos, porque preocupado com o ensino das tra- dições judaicas às crianças judias na cidade de Belém e, filho de Leão Israel que negociava com o látex. Seu pai lhe proporcionara esmerada educação em centros judaicos
  • 23. 23 da Europa. Em busca do conhecimento, as crianças judias da região locomoviam-se em barcos através dos caminhos naturais da região, percorrendo distâncias enormes para estudar,sob os cuidados de Elias Israel e sua esposa Sol,da família Mamann Bendrihen. A religiosidade de Isaac Athias permitiu que assumisse o cargo de secretário da Congregação Sefaradi de São Paulo, durante gestão de Moisés Carmona.Por falar fluentemen- te o português, Athias passou a liderar a comunidade que o acolhera em órgãos administrativos judaicos como a FI- SESP e na CONIB, em âmbito nacional. Outro sefaradi de destaque foi Moisés Hakim, nascido em Esmirna que chegou ao Rio de Janeiro em 1922, pro- cedente do Egito, ao chamado de Joseph Aliman, tio ma- terno. Em São Paulo, Moisés Hakim casou-se com Elísia Roffé Sarraf, filha de antigos moradores judeus de Belém do Pará e doadores do terreno - “lugar santo”- o cemitério da comunidade judaica do Norte brasileiro. Um marroquino que se enquadrou de forma feliz entre os judeus do Oriente Médio, estabelecidos na Mooca, foi Jacques Sarraf. Acompanhado da esposa Vitória Siles e, procedentes da velha cidade de Safed, Jacques Sarraf ins- talou-se na sinagoga da União Israelita Paulista, fundada pela família de Mário Amar, da mesma origem. Poliglota, extrovertido, ousado e comunicativo, Sarraf marcou pre- sença alegre na história dos primeiros imigrantes de fala árabe de São Paulo, residentes na Mooca. Iniciou-se como ambulante para depois viver do comércio atacadista de te- cidos. Homem de religião, Sarraf foi um conciliador aos fiéis das duas sinagogas, construídas em uma mesma rua por judeus libaneses de Sidon e de Safed na Mooca, bairro étnico de São Paulo. Sarraf mantinha contatos próximos com seus parentes, nascidos em Belém do Pará, partici- pantes da Sinagoga da Rua Abolição. A sinagoga sefaradi de São Paulo recebeu nos anos de 1940 aos imigrantes marroquinos, refugiados da II Grande Guerra. Preocupados com o antissemitismo ex- presso pela imprensa e pelas tropas nazistas, sediadas no Norte da África, grande número de judeus de antigas comunidades buscou emigrar, pois era corrente que “os nazistas estavam preparando os fornos para os judeus do Marrocos”. Entre os que se estabeleceram em São Paulo, citamos os Laredo e os Chalom, famílias de projeção do Norte africano. Descendente do rabino Aron Laredo - religioso da Região do Rif, no século XVII -, Abraham Laredo,além de presidir a comunidade judaica de Tânger, era Presidente da Câmara de Comércio Internacional da expressiva cidade, tendo sido condecorado por serviços prestados com o título de Officiel de Palme Academique. Laredo foi também homenageado por Muhamet V, com a “Ordem de Nissam Alauite”. Na cidade do Rio de Janeiro, Isaac Rubens Israel, de origem marroquina, nascido em Portugal, projetou-se nos meios de comunicação. Era filho de Rubens Israel e de Alegria Benoliel,nascida em Manaus.Casou-se com Rosa Barki, da proeminente família sefaradi da Trípoli Italiana. Jornalista e advogado Rubens adquiriu projeção brasileira pelos oito anos de trabalho na BBC de Londres, sob o nome de Rubens Amaral. Braço direito do jornalista Ro- berto Marinho, Rubens foi o primeiro diretor da atual e prestigiosa TV Globo. Mais numerosos, os judeus de origem marroquina que se estabeleceram na Shel Guemilut Hassidim foram aos pou- cos, assumindo os quadros diretivos da antiga sinagoga. Entre as novas famílias marroquinas, citamos os Benza- quen, os Levy, os Bensussan e os Pinto. Hoje, a sinagoga é conduzida pelo Rabino Isaac Benzaquen, formado em 1968 pela Yeshiva do Rabino Chefe do Império Britânico, Haham Dr. Salomon Gaon, de Londres. A entrada desses novos imigrantes permitiu a volta das canções com a ca- racterística musicalidade marroquina. ARTIGO
  • 24. 24 A FONTE DA JUVENTUDE A té os nossos dias não foi descoberto nenhum medicamento para evitar o envelhecimento. Desde épocas remotas este é um sonho da humanidade. A primeira referência a esse tema está na Bíblia, com o simbolismo da Árvore da Vida – quem comesse o seu fruto se tornaria imortal. Muitos séculos à frente, na Idade Média, a esperança foi a Fonte da Juventude, que poderia restaurar a saúde e proporcionar beleza a todos os que nela se banhassem (se fosse encontrada). Havia ainda a crença no elixir da longa vida, “uma re- dução da pedra filosofal em água mercurial”, segundo os alquimistas da época. Se esse elixir fosse dado a um enfer- mo, com aparência de morto, ao tomar somente uma gota, ele iria sobreviver,com a graça de Deus,sendo a senilidade transformada em juventude. Deus era sempre enaltecido e tinha poder sobre todas as coisas – “Deus super omnia” (Deus acima de tudo). Será que em algum dia existiu uma fonte da juventude? Não há provas de sua existência. Na mitologia, a fonte se- ria um rio que saía do Monte Olimpo e passava pela Terra. Sendo abençoada pelos deuses, seria capaz de dar imorta- lidade à pessoa que bebesse de sua água. Até mesmo Ale- xandre, o Grande, teria buscado esse rio da imortalidade, após ter lido um conto hebraico que falava sobre a fonte. Na Idade Média, vários exploradores patrocinados pelas cortes reais também saíram em busca da fonte. Um dos mais conhecidos foi Ponce de Léon, saindo da Espanha rumando para América em 1493. Teve o patrocínio dos “Todo homem deseja viver para sempre, mas nenhum quer ser velho.” Jonathan Swift (1667-1745) – poeta e escritor satírico irlandês reis Fernando e Isabel. Chegando em terras novas aportou em Hispaniola, atual ilha de São Domingos. Em 1513, Ponce de Leon sai à procura de águas reju- venescedoras. Descobriu uma ilha a qual deu o nome La Florida, onde encontrou uma fonte com águas minerais. Infelizmente, foi ferido por índios, sendo levado para Cuba, onde faleceu. Goethe, o grande poeta, dramaturgo e filósofo alemão (1749-1832) produziu, entre outras obras, Fausto, seu livro mais famoso, até hoje incluído entre as cem maiores obras da literatura mundial. Esse livro, escrito em versos, foi ini- ciado quando Goethe tinha 60 anos (1808) e concluído em 1832, ano de sua morte, aos 83 anos. Os principais personagens da obra são o velho Fausto e Mefistófeles, personificando o Diabo. Este provoca um diálogo com Deus sobre a fraqueza da Humanidade, apostando com Deus que poderá ficar com a alma de Fausto, já envelhe- cido, mestre em Filosofia, Direito, Medicina e Teologia. Para conseguir seu intento, o Diabo promete a Fausto o retorno de sua juventude, mas para tanto teria que ceder a alma. Fausto concorda e é levado até uma bruxa, que está preparando um elixir com o poder de remoçar. Antes de ingerir esse líquido miraculoso, Mefistófeles ainda tenta demover Fausto, pois existiriam outros meios para prolongar a vida até mais de 80 anos, mantendo a juventude sem vender a alma.Fausto quer saber qual é essa alternativa e o Diabo lhe explica: “Maneja a espada, ativa o arado, conserva-te a ti próprio e a tua mente num círculo chão, limitado com alimen- LUIZ FREITAG 24
  • 25. 25 ARTIGOARTIGO to puro, nutre-te qual gado, vive entre o gado, em suores quotidianos, adubar pessoalmente o campo e o agro não temas; por remoçar-te de setenta anos, crê-mo, o melhor é dos sistemas. A bruxa vem em seguida e revela a Fausto a visão do sexo mais belo. Poderia possuir quantas mulheres quisesse, ingerindo a bebida que ela terminava de preparar.Após re- fletir, Fausto pondera a Mefistófeles que não tem o hábito de brandir a enxada, além do que a vida rústica não é o seu ideal. Aceita pois, engolir a poção. Assim ocorreu. Fausto tornou-se imortal, mas a alma fi- cou pertencendo ao Diabo. Essa apologia da vida saudável, preconizada por Goe- the, foi inspirada, provavelmente num livro publicado em 1797 pelo seu médico particular, Dr. Hufeland, intitulado “A arte de prolongar a vida humana”,onde o autor defende preceitos muito semelhantes: viver no campo e ingerir ali- mentos naturais. Sugeria ainda que os intelectuais “deve- riam passar algumas horas do dia trabalhando no campo”. Nos séculos XIX e XX tiveram início as pesquisas cientí- ficas com o objetivo de prolongar a juventude.Vários estu- dos foram publicados, principalmente nos primórdios do século XX, como o estudo da transposição de hormônios de macacos para homens (a testosterona ainda não havia sido descoberta). Um dos pesquisadores foi o Dr. Serge Voronoff (1866- 1951), que nasceu na Rússia, mas emigrou para a França. Fazia pesquisas com macacos e acreditava que, ao realizar transplantes de glândulas de macacos para seres huma- nos, tornaria possível o prolongamento da vida humana até 140 anos. Infelizmente, Voronoff enveredou para o lado comercial das suas experiências e não conseguiu com- provar cientificamente as suas investigações. Chegou até a atrair milionários para tratamento nos melhores hotéis de Paris, tendo clientes como a famosa cantora lírica Lily Pons. O Dr. Adolphe Brown-Sequard (1817-1894), fa- moso fisiologista francês contemporâneo de Voronoff, propôs a teoria denominada “organoterapia”, com a pro- dução de um suco de glândulas animais, que exerceria a função de reposição hormonal, mas também não se com- provou cientificamente. Passada a euforia dessas modas que enfatizavam as glân- dulas hormonais, a melhor proposta deste século XXI é envelhecer com qualidade de vida, seguindo alguns prin- cípios básicos: • Abandonar o vício do fumo • Prevenir a obesidade abdominal • Tratar sempre a hipertensão arterial • Controlar o diabetes com cuidados na alimentação e medicamentos • Verificar periodicamente taxas de colesterol, triglicéri- des e ácido úrico • Consultar o médico de confiança, pelo menos duas ve- zes ao ano • Manter uma atividade para ocupar o cérebro • Cultivar amigos e manter a sociabilidade, reduzindo o estresse • Praticar atividade física,pelo menos 30 minutos por dia • Procurar ter uma vida familiar e sexual estável Ainda poderemos enfrentar a velhice com dignidade e classe, lembrando as palavras do soneto de Bastos Tigre (1882-1957), jornalista, poeta e humorista: ENVELHECER Entra pela velhice com cuidado Pé ante pé, sem provocar rumores Que despertem lembranças do passado, Sonhos de glória, ilusões de amores. Do que tiveres no pomar plantado, Apanha os frutos e recolhe as flores Mas lavra ainda e planta o teu eirado Que outros virão colher quando te fores Não te seja a velhice enfermidade! Alimenta no espírito a saúde, Luta contra as tibiezas da vontade! Que a neve caia, o teu ardor não mude! Mantém-te jovem, pouco importa a idade Tem cada idade a sua juventude. 25
  • 26. 26 EXPECTATIVA DE VIDA Toda mudança no viver é um desafio a ser enfrentado no dia a dia. A expectativa de vida atual para os brasileiros é estimada em 74,8 anos e poderá chegar a 81,2 anos até 2160. É o que nos informa o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Desde1990 a ONU (Organização das Nações Uni- das) criou um método chamado IDH – Índice de Desenvolvimento Humano – para avaliar anualmente as condições de vida de uma determinada população. São analisados fatores como salário, cultura, saúde e ha- bitação de cada população em particular. O Brasil ainda não chegou a ter um número considerável de super cen- tenários, ou seja, pessoas que estão sobrevivendo mais de 100 anos. Por enquanto, os Estados Unidos apresentam o maior número de pessoas com mais de 100 anos no mundo – são pouco mais de 55.000. Esta estatística se deve ao maior cuidado com a saúde que os americanos dedicam à sua população, através de campanhas de pre- venção de doenças. Em segundo lugar está o Japão, com média de 25.000 centenários, e em terceiro lugar vem o Brasil, com 15.000 centenários, mesmo com condições de vida adversas. As áreas do Brasil onde há maior possibilidade de sobrevivên- cia são a região sul (74,71 anos) e a região sudeste (74,06 anos), sendo a pior delas a região nordeste (69,71 anos). Outro dado importante a se destacar refere-se à projeção de vida para 2060: para os homens, 81 anos, enquanto as mulheres sobrevivem por mais 7 anos. Com índice menor de sobrevivência estão os jovens de 20 a 24 anos, não só por causa de doenças, mas principal- mente por mortes provocadas pela violência, como assas- sinatos em brigas fúteis, desde trânsito até disputas por clubes de futebol. Em 2007, nas regiões norte e nordeste, segundo o IBGE, a soma de mortes de jovens representou a elevada porcentagem de 33%. Com essas estatísticas desalentadoras, os idosos conti- nuam a sobreviver por mais anos, conforme números que são divulgados até mensalmente nos meios de comu- nicação. O que se pode constatar é que pessoas com mais de 65 anos es- tão dando atenção maior à sua saúde com os recursos que a medicina proporciona. Recentemente tomamos conhecimento de um casal que completou 81 anos de casamento, ele com 101 anos de idade e ela com 100, no interior de São Paulo - comemoraram as bodas de cacau. Seria a convivência com amor e dedicação um ao outro um fator de maior longevidade? É possível, po- rém não se devem ser esquecidos os cuidados com a saúde em geral, como o tratamento para hipertensão arterial e diabetes, duas das piores doenças que trazem maiores complicações para o organismo, mesmo nos mais jovens. Também são necessárias as visitas semestrais ao médico de confiança para prevenção de patologias que podem estar em início e poderão ser tratadas, sem as consequên- cias de má evolução. Cuidados iniciais com perdas de memória repetitivas, bem como depressão comum em idosos devem ser toma- dos e trarão benefícios para o futuro. O envelhecimento coloca vários desafios às pessoas que estão se aproximando dos 65 anos ou mais. O processo de envelhecimento não é só físico, como também mental e se torna necessário um planejamento para essa nova fase da existência.Toda mudança do viver é um novo desafio a ser enfrentado no dia a dia e faz parte da vida. Prepare-se positivamente, sabendo que é possível che- gar aos 100 anos com saúde, desde que sejam seguidas as recomendações médicas preventivas, cuidados com ali- mentação e exercícios físicos. A velhice em si não é inca- pacitante, porém as patologias que poderão acompanhá-la são um empecilho para desfrutá-la. 26
  • 27. 27 ADIE A SUA FINITUDE “Quando eu pensar que aprendi a viver, terei aprendido a morrer.” Leonardo da Vinci (1452-1519) – gênio renas- centista, pintor, escultor, arquiteto, entre outras profissões. Todos os temas que abordamos até agora podem servir de guia para pôr em prática as estratégias necessárias para prevenir, conviver ou até superar muitas das doenças que ocorrem quando se avança em idade. Também orientam como se cuidar e prestar atenção aos fatores que contri- buem para uma vida saudável. Entre os assuntos normalmente abordados em palestras e cursos dirigidos à terceira idade, muitas vezes são es- quecidos aqueles que tratam da existência (vida) e fini- tude (morte). A questão do sentido da existência sempre preocupou cientistas e filósofos. Torna-se mais urgente, sobretudo para as pessoas que não mais podem adiar o enfrentamento da finitude próxima, devido ao avanço dos anos e a graves doenças. No século XX predominou a crença de que uma quali- dade de vida superior resulta de melhores condições ma- teriais, acumuladas no decorrer da vida. Foram enaltecidos valores como conforto, vida regrada, casamento feliz, tra- balho que renda bens materiais, com o prestígio daí re- sultante. Esqueceu-se de que esses valores, ainda que de- sejáveis, são sempre exteriores, podem exigir muitos anos de empenho, e nem sempre são obtidos por meios lícitos. Levam muitas vezes a uma preocupação exagerada com o status social, sacrificando a interioridade. Infelizmente, essa perda só é percebida quando o indiví- duo se dá conta do que deixou passar,por não ter cultivado o seu eu interior, ocupando o seu cérebro com ideias de como ganhar mais dinheiro e conservá-lo. Nesse período, provavelmente, já adquiriu alguma doença incapacitante. Para Nietzsche,filósofo alemão (1844-1900) que sempre criticou a “estética da existência”viver bem não é só conti- nuar existindo e o sentido da vida não é só sobrevivência, mesmo que seja nas melhores condições materiais. O caminho para desenvolver um estilo de vida saudável consiste em manter a alegria de viver, criar coisas novas, conviver bem com as pessoas próximas, parentes e amigos, além do sexo seguro. Esse estilo de vida contempla fatores que irão contribuir para o envelhecimento bem sucedido, e não deve ser confundido com hedonismo, que é apenas o cultivo do prazer. Cuidar de si é uma arte, um privilégio, com autono- mia para não se sujeitar às conveniências do lazer exte- rior. Quando o indivíduo perceber que a finitude um dia chegará, pelas próprias limitações da existência, deve contentar-se com as suas realizações, sem reter amarguras e frustrações, bem como raiva e inveja, sentimentos pre- nunciadores de doenças. É bom lembrar que, mantendo-se sadio ou com alguma doença tratável,à medida em que a idade avança,melhores serão as perspectivas de uma vida longa, com tratamentos cada vez mais avançados, que surgem a cada ano. Adie a sua finitude! Médico geriatra, membro titular da Academia de Medicina de São Paulo, autor do livro “Como transformar a terceira idade na me- lhor idade”(Editora Alaúde). 27 ARTIGO
  • 28. 28 Refugiados Judeus-Alemães na República Dominicana T ema muito pouco conhecido e estudado será sintetizado nestas breves linhas. O ditador Rafael Leonidas Trujillo (1891-1961) ofereceu asilo aos judeus obrigados a fugir dos Nazistas; porém não foi por altruísmo, sua intenção era “branquear”a República Dominicana com a entrada de cem mil imigrantes europeus. As pessoas que este racista caribenho salvou recordam aqueles feitos. Os cerca de setecentos judeus que chegaram ficaram agradecidos com o ditador. Eles assenta- ram-se no norte da ilha em Sosúa. Plantaram árvores e arbustos, traçaram avenidas e constituíram cooperativas. Em três anos construíram uma pequena cidade com alto nível social. Publicaram jornais em alemão e espanhol com todo o tipo de notícias. Os exilados tentaram ir adiante como agricultores; porém, muitos eram médicos, comerciantes, eletricistas, etc. e não estavam preparados para amoldar-se aos princípios dos kibutzim judeus. Os colonos fundaram empresas que distribuíam pelo país: presunto, salsichas, toi- cinho, manteiga e queijo. Há que ter presente que a maioria era gente citadina, pro- cediam de Hamburgo, Berlim, Munique e Viena. Não ficaram por alí e emigraram para os EUA. Os judeus viveram em paz, sob a ditadura de Trujillo, que chegou ao poder com a ajuda dos EUA e foi assassinado num atentado em 1961. Os refugiados judeus só souberam por rumores que o mesmo ditador que os havia acolhido, eliminara doze mil pessoas, em sua maioria procedentes de Haiti. Os crimes de Trujillo motivaram o exílio de muitos judeus. RAFAEL PICÓ, DE PONTEVEDRA, GALIZIA O engenheiro espanhol RAFAEL PICÓ descende de Leonor Valls y Picó, uma chueta (o cristão-novo da Ilha de Mallorca) penitenciada pelo Santo Ofício em 1679.Ao visitar Salvador,para participar de um congresso,conheceu Carlos Kertesz, atual editor do Boletim do Arquivo Histórico Judaico Brasileiro e assim surgiu a amizade, que levou a apresentar a C.K a presença judaica na Galicia espanhola,a amizade epistolar que já passa de uma década e um série de pequenos artigos onde se mostra como os espanhóis veem aos judeus.
  • 29. 29 D o ponto de vista cultural o grupo étnico que se beneficiou da domi- nação islâmica, foi a dos judeus espanhóis, que desfrutou de maior tolerância e de mais oportunidades, de tal maneira que Al-Andalus assistiu ao florescimento da cultura hebraica. No final do século XI as atitudes judaicas mudavam da preferência pelo domínio muçulmano e deu origem a uma oposição equidistante em respeito a disputa entre cristãos e árabes, já na me- tade do século XII aderiram a orientação pro-cristã, pois os judeus viam tolerância e oportunidades nos regimes cristãos. A chamada hispanização dos hebreus surgiu nestes momentos. Segundo o Direito Castelhano os juramentos realizados em algum momento por membros das três religiões tinham o mesmo valor e inicialmente as leis castelhanas consideravam que a pena de morte era para todos, mesmo numa acusação de um judeu contra um cristão. Este sistema de tolerância colocou a sociedade espanhola como uma sociedade única na Europa. Curiosamente a influência judaica chegou ao extremo de ser judeus os banqueiros dos Reyes Católicos. E mesmo, no período do reinado o Grão Inquisidor, Torque- mada, era de ascendência judaica. A convivência com os judeus, foi de grande tolerância, se bem que havia bairros exclusivamente para eles. Ainda hoje se conserva, a título de exemplo, o de Palma de Mallorca, chamado Bairro Judío, no mesmo local de épocas passadas. A Influência Judaica na Espanha ARTIGO
  • 30. 3030 Reunião de família S empre ouvira falar de meu pai com respeito e admiração. Homem culto e distinto era justo no trato com seus de- pendentes.Pertencia àquela geração de pessoas honrosas, fiéis a seus deveres. Fortes laços sentimentais o liga- vam à família e à sua cidade natal, às margens do luminoso Mar Adriático. Alessandro jamais imaginou ter que despedir-se de ambas. Era a véspera da Segunda Gran- de Guerra. O Fascismo empolgava multidões e o ódio ao povo de Isra- el tomava proporções dantescas. Era preciso fugir. Não foram poucos os que vieram despedir-se dele com lágrimas e grande preocupação. Partia para ter- ras brasileiras desconhecidas, com a esposa e um neném gracioso de oito meses, Ariella, embrulhado num rico cobertor cor de rosa. Agora só as car- tas seriam capazes de transmitir o grande afeto que ligava Alessandro aos demais da família separada pela guerra e pelo oceano imenso. Estas cartas, quando não abertas pela cen- sura, demoravam quase um mês para cruzar o Atlântico. Educado na velha Europa, não foi fácil para Alessandro transformar-se FABIA TERNI LEIPZIGER em imigrante num país tropical, com cores, sabores, e odores tão exóticos. O Brasil entra na guerra e a popu- lação se preocupa até com possíveis ataques aéreos. No país da fartura, há racionamento de alimentos. Tempos difíceis. Mas enfim uma boa nova na casa de Alessandro. Outro pacotinho en- volto num cobertor cor de rosa, Fio- rella, chega no dia do aniversário do avô paterno lá longe. Felicíssimo, ao receber o telegrama com esta notícia, prepara uma carta comovente para expressar todo seu carinho.Mas como fazê-la chegar às mãos de seu filho Alessandro no Brasil? A comunicação ultra-marina era quase inexistente. Malotes postais não estavam na lista de prioridades da marinha de guerra no auge do confli- to mundial. Era mais seguro arranjar um portador. Em roda de amigos,o avô de Fiorella conhece Bartolomeu, que viajaria em breve, pois tinha parentes no Brasil. Vivia numa cidadezinha bem próxi- ma e através de um mensageiro a carta chega às mãos de Bartolomeu poucos dias antes que seu navio zarpasse. De estatura mediana, mas de alma grandiosa, Bartolomeu era íntegro, homem de palavra. Curador de um museu local, nutria grande respeito pela guarda de documentos antigos. Passaram-se mais quatro anos de guerra e o luto, a fome e a desolação tornam-se as novas cores da Europa. Os parentes de Alessandro, como os de Bartolomeu foram obrigados a es- conder-se, pois Judeus não eram mais tolerados em nenhum lugar. Sem mais notícias do paradeiro de seus pais,Alessandro considera-se um felizardo quando recebe a informação de que haviam sobrevivido ao pior. Agradece a Deus por mais este mi- lagre. A guerra termina finalmente, mas a imensa saudade de Alessandro pela terra de seus antepassados permane- ce. É o momento de oferecer a seus pais o grande sonho; abraçar os no- vos netinhos. Uma verdadeira celebração! Os pais de Alessandro o aguardavam no por- to. Irmãos e primos na janela do ve- lho casarão de outrora e ex-colegas de classe chegaram à tarde como antiga- mente.Troca de abraços comoventes. Na fazenda não foi diferente. Espo- sas de antigos camponeses preparam travessas de massas saborosas, todas feitas em casa, com o sabor da infân-
  • 31. 31 cia. Alessandro emociona-se ao rever a criançada agora na adolescência, todos com saúde. A guerra devastara quase tudo, mas os laços afetivos e as recordações eram indestrutíveis. O maior prazer foi abraçar cada um pessoalmente. Desde o jardineiro idoso de seus avós, ao marinheiro, que tantos dias inesquecíveis havia-lhe proporcionado, sempre disposto a na- vegar até o por do sol, pelo azulado Adriático,com o barco abarrotado de jovens alegres,despreocupados.Quan- ta emoção ao serem transportados a um tempo maravilhoso já vivido. Passam os anos. Nas visitas seguin- tes, também fala-se daqueles tempos, mas os antigos atores já não estão mais em cena. Toda aquela geração partira, inclusive os pais de Alessan- dro e Bartolomeu. Alessandro tornara-se avô de cinco netos e netas. Era chegada a hora de seus netos conhecerem a sua terra. Bem próximo a sua cidade natal, um balneário ensolarado nas margens do Adriático é escolhido para a nova reu- nião de família, agora com os filhos de Fiorella presente. Na sexta-feira à noite, Alessandro e seu genro vão à sinagoga local. Conforme antiga tradição,as pessoas de outras comunidades são apresenta- das às da casa enquanto ele se levanta e é visto pelos presentes. Seguem-se as belas melodias que saúdam a Paz do Sábado. Estranhamente, um ho- mem, absorto em seus pensamentos, não participa dos cantos. Alessandro Ventura? Porque este nome soava-lhe familiar? Terminado o serviço religioso,cami- nha até Alessandro, e pergunta-lhe: - O senhor virá à sinagoga amanhã pela manhã? - Porque o senhor pergunta? - Venha, Sr. Alessandro, é um pedi- do especial! Ao voltar, Alessandro relata o ocorrido. Fiorella, curiosa decide acompanhá-los no dia seguinte. Com seus dois filhos pela mão, lá vão as três gerações à caminho da sinagoga. Terminadas as rezas,aproxima-se de Alessandro aquele senhor misterioso da noite anterior. Entrega-lhe um envelope fechado e diz: “Seu pai con- fiou esta carta ao meu pai, Bartolo- meu De Benedetti, para que ele a en- tregasse ao senhor no Brasil. O navio no qual embarcaria foi torpedeado e meu pai nunca mais viajou. Procurou devolvê-la, mas não conseguiu mais localizar seu pai. Por uma questão de honra, antes de morrer, entregou-me a carta na esperança de que um dia poderia encontrá-lo. Eis que a missão de meu pai foi agora cumprida. Emocionado ao contemplar a cali- grafia de seu próprio pai falecido há mais de vinte anos, Alessandro fica pasmo. Fiorella e o marido apro- ximam-se com afeto, enquanto as crianças o cercam carinhosamente. Alessandro começa a ler a carta es- crita há trinta e um anos atrás, por ocasião do nascimento de Fiorella, e não se contém mais. Lágrimas escorrem-lhe pela face ao sentir o profundo amor de seus pais. Por um instante mágico, revê os dois ali a seu lado, e mergulha naquele tempo ma- ravilhoso que guardaria para sempre em sua memória. A reunião familiar contava agora com quatro gerações. N.B. Esta história é verídica. Por questões de privacidade, os nomes fo- ram alterados. ARTIGO
  • 32. 3232 Judeus nos trópicos AcomunidadejudaicadaBahiade1912a1945 Essa mudança, por vezes traumática, sua acomodação nem sempre suave, devem ser objeto de estudos e de uma historiografia compatível com a procura das raízes das mi- norias brasileiras e da diversidade dos grupos que forma- ram o que chamamos, de forma ampla, o povo brasileiro. Sabe-se de cristãos-novos que viveram na Bahia em di- versos períodos: entre os degredados e colonos durante as Capitanias e Governo Geral. Anita Novinsky escreve que constituíam 10% a 20% da população branca na capital colonial, Salvador (Cristãos Novos na Bahia, p. 67). Ju- deus vieram para o litoral do nordeste, durante o domínio dos flamengos, na Bahia (1624-25) e Pernambuco (1630- 54), quando constituíram uma comunidade com ativida- de intensa em diversos setores, tendo fundado a primeira sinagoga das Américas em Recife, em 1641. (* Judeus no domínio holandês, p. 10 Esther R. Largman). Depois da derrota dos holandeses, a maioria preferiu sair do Brasil, retornando para Amsterdã ou migrando para a Guiana, Antilhas ou Nova Amsterdam (hoje Nova York). Os réus dos tribunais da Inquisição são testemunhas pre- ciosas. Quando a Carta da Lei, de 25/05/1773 do Marquês de Pombal decretou distinção entre cristãos-novos e velhos, no reinado de D.José II,os remanescentes já haviam esque- cido suas origens – pois haviam se tornado bons católicos. O levantamento da presença judaica no Brasil e particu- larmente na Bahia, depois da Independência, ainda está para ser realizado. Em 1821, nas Cortes Portuguesas, o deputado pela Bahia, A memória e história dos imigrantes, antes mergulhadas na apatia e desinteresse, estão sendo resgatadas por novos estudos. Personagens que numa vinda temerária atravessaram o oceano, deixando para trás sua língua, seus hábitos, seu cotidiano e até a própria família. Carvalho de Melo, defendeu a liberdade para os judeus, alegando que ela já existia em Roma e na França. Nesse mesmo ano, Alexandre Gomes Ferrão, também represen- tando a Bahia, apresentou um projeto de plena restituição aos judeus e mouros expulsos de Portugal em 1497. 1 Proclamada a Independência, a Constituição de 1824 consignou princípios da liberdade religiosa. Em 1838, dois irmãos da nação hebraica, Arão e Isa- ac Sabag, fundaram um empório em Feira de Santana. 2 A presença de alguns judeus, ainda no século XIX, é na maioria de origem sefardita e foram estudados pelos Wol- ff: José Abraham e Aram Saback foram registrados como viajantes em 1837, assim como Jountal Sefarty. Joseph Alkaim foi dispensado da função de gerente na Com- panhia de Minas de Assuruhá em 1887. A figura mais importante foi, sem dúvida, o rabino Isaac Amzalak que, chegando em 1829, criou um círculo de relações em sua casa, freqüentado “pela melhor gente do tempo”, inclusive pelo poeta Castro Alves que dedicou alguns poemas às suas filhas, em que se inspirou. 3 No início do século XX, encontramos pela imprensa so- brenomes com clara origem judaica, mas já aculturados e absorvidos pela sociedade baiana: José Abrão Cohim, criador de gado e senador; Juiz Antonio Bensabat, coronel José David Fuchs. 4 A primeira Grande Guerra foi uma explosão que dilace- rou a comunidade dos países europeus. Os heimatlossen ou apátridas e as minorias, como corolários às guerras civis e migrações, perderam os direitos antes inalienáveis, isto é, os ESTHER REGINA LARGMAN À memória de Robert Levine