1) O documento é uma decisão judicial que interdita totalmente o Presídio Regional de Araranguá devido às condições insalubres e perigosas.
2) A decisão aponta que o presídio está superlotado e não cumpre normas de segurança, direitos humanos e saúde.
3) A administração prisional ignorou prazos para resolver os problemas apontados, mesmo tendo recursos para obras em outras unidades.
1. Autos n. 004.13.005331-0
Ação: Outros/Outros
Autor: Ministério Público de Santa Catarina e outro
Vistos, etc.
Trato do processo administrativo em que o representante do Ministério Público
que oficia perante este Juízo requer a interdição do Presídio Regional de Araranguá, pelas razões
elencadas na inicial e documentos.
Recebida a inicial, este Juízo acolheu parcialmente o pedido de interdição,
determinando o cumprimento de uma série de exigências, em prazos diversos, como condicionantes
para a manutenção do funcionamento do Presídio, reconhecidamente em condições inseguras e
insalubres, em desrespeito a todas as normas legais aplicáveis à abertura de um estabelecimento
penal no ordenamento pátrio, sem contar uma série de tratados internacionais sobre direitos
humanos dos quais esta nação é signatária.
Durante a tramitação do feito, algumas medidas foram obedecidas pela administração penitenciária
do Estado e outras até a presente data não foram sequer adequadamente respondidas até a presente
data.
Foram realizadas também, por determinação deste Juízo, vistorias pelo Corpo de Bombeiros e pela
Vigilância Sanitária do Estado, em que as irregularidades apontadas pelo requerente deste processo
administrativo foram devidamente demonstradas, mostrando as inadequações estruturais do prédio e
a situação insalubre e perigosa a que estão submetidos os internos e os servidores daquela unidade
prisional.
É de se acrescentar que o pedido de interdição foi precipitado por um motim e princípio de incêndio
ocorrido no mês de abril de 2013 naquele unidade em que somente se pode imputar a falta de
conseqüências mais graves a alguma espécie de intervenção divina e à cooperação entre os agentes
prisionais e parte dos internos.
Para piorar, neste mês de abril último, uma tentativa de fuga do pátio do presídio, durante o horário
de visitação, redundou no disparo de armas de fogo dos seguranças terceirizados armados presentes
nas muradas do ergástulo (também por motivo completamente ignorado por este magistrado, há
regulamentação legal vedando a presença da força pública do estado na manutenção da segurança
em estabelecimentos penais) e que também não resultou em uma tragédia por intervenção pura e
simples da fortuna e pela extrema habilidade dos agentes públicos envolvidos no gerenciamento da
crise.
Quanto à premente questão da superlotação inaceitável da unidade, após quase seis meses de
interdição, e muito por esforço dos outros atores envolvidos na questão, houve uma diminuição
sensível do número de presos internos no Presídio Regional de Araranguá, situação que fugiu
novamente do controle, de modo que se encontra hoje situação semelhante a que havia na unidade
quando da tomada da decisão que interditou parcialmente o local há quase um ano hoje.
A fundamentação legal sobre a interdição do presídio já foi devida e
cumpridamente exposta na decisão de fls. 47/51, não precisando este Magistrado se alongar
novamente sobre o assunto, tomando por brevidade os fundamentos jurídicos daquela decisão como
razão desta decisão também.
Por outro lado, o presídio mostra-se completamente inadequado para a
finalidade a que se destina, conforme se denota pela farta documentação juntada aos autos. A
situação de lotação, número de servidores por preso, salubridade e segurança do local não atendem
o mínimo necessário para um tratamento digno aos que lá se encontram cumprindo pena ou
aguardando julgamento e para fornecer um mínimo de segurança para os que lá trabalham e de
tranqüilidade para a população ordeira desta comarca e desta região.
Não bastassem todos os esforços envidados por esta Corregedoria, inclusive
com a decretação da interdição parcial e a fixação de prazos, quase todos desrespeitados pela
administração prisional do Estado, notícia recente demonstra a existência de recursos para que se
tenha solução para os problemas apontados na unidade, mas a aparente falta de vontade dos agentes
2. públicos responsáveis e deixando a impressão de que não existe interesse da administração em
cumprir a decisão acima citada.
Dias atrás no sítio do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, chamou atenção a
notícia de que o eminente Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça, no exercício
temporário do Governo do Estado de Santa Catarina, assinou ordem de serviço para o início das
obras de adequação da Penitenciária da comarca de Curitibanos (disponível em:
http://portal.tjsc.jus.br/web/sala-de-imprensa/-/des-nelson-entrega-ordem-de-servico-para-
conhttp://portal.tjsc.jus.br/web/sala-de-imprensa/-/des-nelson-entrega-ordem-de-servico-para-con
strucao-da-penitenciaria-de-curitibanos, acessada na data de hoje).
Considerando a evidente disponibilidade de recursos para construções e
adequações no sistema prisional, não existe a mais mínima desculpa para não ter existido ainda
nenhuma resposta à situação caótica enfrentada pela unidade prisional desta comarca. A
administração prisional do Estado atuando desta maneira demonstra claramente que não tem
nenhum interesse em resolver a situação descrita nestes autos, escarnecendo não apenas da decisão
judicial já mencionada, mas também dos mínimos direitos humanos da população carcerária e da
situação de insegurança em que está inserida toda a população do extremo sul do Estado pela sua
inação.
Esta notícia é ainda mais gravosa porque é de conhecimento da administração
prisional do Estado que em meados do ano passado foi criada uma força-tarefa da Defensoria
Pública do Estado e da União para efetuar um mutirão carcerário neste Estado. Quando da
apresentação do relatório com os resultados do dito mutirão, em reunião ocorrida no Tribunal de
Justiça de Santa Catarina, que contou com a presença inclusive de membros do Governo do Estado,
destacou-se que a situação mais tranqüila encontrada no sistema prisional catarinense era
exatamente a da comarca de Curitibanos. Em contrapartida, o oposto desta situação era exatamente
a do Presídio Regional de Araranguá, considerado como uma das piores estruturas físicas e lotação
entre as unidades vistoriadas.
Apesar de ter certeza que a Penitenciária de Curitibanos não deve ser isenta de problemas, dar
preferência por estruturar tal unidade em detrimento do presídio regional desta comarca torna
evidente no mínimo incapacidade eleger prioridades e resolver problemas, o que é extremamente
absurdo.
Como juiz criminal, não há como deixar de verificar a situação paradoxal em
que se está envolvido ao aplicar justa e inexoravelmente a legislação penal pátria para submeter os
desviantes da norma à punição adequada prevista na lei, mas não ter meios para, por outro lado,
exigir do Estado as contrapartidas, também limitadas ao que exige minimamente o ordenamento
pátrio, como condições para o exercício legítimo do direito de punir.
Também não se pode esquecer que a ocorrência de dois incidentes graves no
espaço de um ano, em que a sorte foi o fator determinante para que não tivessem ocorrido tragédias
memoráveis na unidade prisional, força-me a tomar a única medida responsável e adequada, a fim
de futuramente não ser acusado, na melhor das hipóteses, de conivência com a situação.
Desta forma, determino a interdição total do Presídio Regional de Araranguá,
proibindo o ingresso de novos presos no estabelecimento até que a lotação chegue ao máximo em
200 pessoas, dividida esta quantidade em 150 homens e 50 mulheres.
Tendo em vista a necessidade de adequação da administração prisional do Estado para o
cumprimento desta decisão, fixo como dia para o início do cumprimento desta decisão o dia 01 de
julho de 2014.
Comunique-se a Corregedoria-Geral da Justiça sobre esta decisão.
Comuniquem-se os juízes das comarcas de Turvo, Sombrio, Meleiro e Santa Rosa do Sul, bem
como o juiz da 1.ª Vara Criminal desta comarca.
Comuniquem-se o Delegado Regional de Polícia e o comando do 19.º Batalhão de Polícia Militar.
Intime-se o Estado de Santa Catarina sobre esta decisão, através do Procurador-Geral do Estado.
Oficie-se o Secretário de Justiça e Cidadania e o Diretor do DEAP para cumprimento da ordem.