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Aprendizagem da matemática e construção de identidades: uma
perspectiva psicológica sócio-cultural
Guida de Abreu
Department of Psychology, University of Luton, UK
1. Introdução
O objectivo deste artigo é reflectir sobre o papel mediador da identidade na aprendizagem
da Matemática numa perspectiva psicológica sócio-cultural. É um trabalho de reflexão
sobre questões como de onde vem a necessidade deste tipo de análise, como situar o
conceito de identidade dentro das abordagens sócio-culturais e como desenvolver
ferramentas que permitam prosseguir o estudo do fenómeno ao nível empírico.
Ashmore e Jussin (1997) numa síntese sobre os estudos da identidade nas ciências sociais
do século xx, incluindo a psicologia, a sociologia e a antropologia, distinguem dois tipos
de análise do impacto do EU (self) e da identidade no desenvolvimento psicológico do
indivíduo e de grupos sociais. Um tipo de análise examina o fenómeno da identidade ao
nível individual e o outro ao nível social. Ao nível individual, são visíveis duas abordagens
de pesquisa com origem na concepção do EU de William James (1890). Uma abordagem
centra-se na investigação dos motivos e impulsos que, supostamente, fazem a pessoa agir
de uma certa forma. A outra abordagem, concentra o objecto de análise no EU como
conhecido pelos outros, como por exemplo, auto-estima, auto-conceito e auto-avaliação.
Esta segunda abordagem emerge como dominante na década de 40, estendendo a sua
influência até aos anos 70. Em termos metodológicos, nota-se a predominância da
abordagem quantitativa. O interesse em aspectos do EU, tais como, auto-conceito, auto-
estima, auto-avaliação, levou ao desenvolvimento de questionários (escalas) e análises
correlacionais. São efectuados estudos de correlações entre níveis de auto-estima e
medidas de desempenho na escola ou correlações entre atribuições individuais do
desempenho e aproveitamento escolar. As dificuldades neste tipo de estudos são bem
conhecidas, desde a concepção do EU como uma "entidade fundamentalmente não
social" (Oyserman e Markus, 1998), à concepção dos testes e escalas (será que medem o
que se propõem medir?). O paralelo entre a abordagem predominante na psicologia dos
anos 40 a 70 e a pesquisa sobre o impacto do EU na aprendizagem da Matemática é
patente. Como mostra McLeod (1992), na sua revisão de literatura, o EU é visto como
parte do domínio afectivo e seu impacto na aprendizagem é estruturado em torno de
estudos sobre crenças e atitudes acerca do EU. Os estudos da relação entre género
(masculino e feminino) e a percepção sobre competência, atribuições causais de
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
sucesso/insucesso e o desempenho na Matemática escolar, são um exemplo concreto desta
abordagem.
O meu interesse pelo estudo das identidades no contexto da cognição matemática, desde a
fase inicial, foi marcado por um distanciamento da concepção individualista acima
referida. Este processo proveio de observações empíricas sobre: (1) a diversidade entre
alunos provenientes do mesmo grupo sócio-cultural, em termos da sua participação nas
práticas da família; e (2) a disrupção entre práticas da família e da escola, ocasionada pelo
status social diferente. Estas observações foram obtidas num estudo com alunos de uma
comunidade canavieira do nordeste do Brasil (Abreu, 1993), conduzido numa perspectiva
teórica que abarcava ideias de Vygotsky (1978, 1986), em particular a ideia que a
aprendizagem envolvia a reconstrução ao nível psicológico de formas de representação
culturais (simbólicas ou físicas), e a ideia de que a aprendizagem se situa no contexto das
práticas, de acordo com a teoria desenvolvida por de Lave (1988).
As noções de participação e disrupção eram consideradas na perspectiva teórica adoptada
mas vistas de um ângulo distinto das observações empíricas mencionadas. Em primeiro
lugar, a participação tinha sido explorada por Vygotskianos, nas interfaces na "zona
proximal de desenvolvimento", e por antropólogos, como Lave, em termos de
"apprenticeship". Mas, em geral, a participação examinada era a que levava à transmissão
do saber e valores dos grupos, i.e., à continuidade das práticas. A possibilidade de
disrupção também era considerada na teoria mas, primordialmente, em termos de
diferenças entre sistemas de representação cultural dos grupos que, por sua vez, levavam a
conflitos cognitivos. No nosso caso, a disrupção salientada estava associada ao status
social das comunidades de prática ou à valorização da prática no contexto da estrutura
social mais ampla. Assim, se existem conflitos, não são apenas de ordem cognitiva, mas
também de identificação na pertença ou rejeição da pertença ao grupo.
2. Re-conceptualização teórica inicial
Visando articular uma perspectiva psicológica que incorporasse a análise da valorização
das práticas e da diversidade na participação, voltei-me para as teorias da psicologia social
Europeia. O conceito de "representações sociais" de Moscovici (1988) permitiu adicionar
uma dimensão social ao sistema de representação cultural. Segundo a óptica das
representações sociais, o conhecimento matemático não pode ser dissociado do grupo que
o utiliza (produz, ou transforma). A representação do conhecimento incorpora a
valorização. Esta dimensão social da representação, por si só, não explica a origem da
diversidade, pois continuamos com dificuldade em explicar como uma representação
compartilhada por um grupo gera diversidade nos seus membros.
3
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Para explicar a diversidade recorri à integração das noções de representações sociais e
identidades sociais, seguindo a trilha de Lloyd e Duveen (1992). Estes autores, ao
estudarem como crianças desenvolvem identidades de género, no contexto da educação
pré-escolar, observaram que a diversidade emerge na interface entre a representação social
e a identidade social. Crianças com representações semelhantes sobre o género masculino
ou feminino posicionavam-se de forma diferente em relação às mesmas. Por exemplo,
meninas, que compartilhavam representações sociais de género (conhecimento dos
marcadores sociais de feminino e masculino), assumiam diferentes identidades sociais
manifestadas em formas de participação (preferência por grupos do mesmo género ou
grupos mistos). Na sua elaboração inicial, Lloyd e Duveen apropriaram o conceito de
identidade social de Tajfel (1978), definido como "a parte do auto-conceito do indivíduo
que deriva do seu conhecimento de pertença a um grupo social (ou grupos) conjuntamente
com o valor e o significado emocional associado a essa pertença". Esta perspectiva
permite combinar a ideia que participação nos grupos (escola, família, etc.) leva à
reconstrução das representações mas que o indivíduo exerce uma certa agência ao tomar
consciência do valor e posiciona-se emocionalmente.
Um aspecto da teoria de Tajfel, que se articulou muito bem com uma perspectiva sócio-
cultural da aprendizagem, foi a sua ênfase nos processos intergrupais na formação da
identidade social. A sua tese, que o ser humano precisa de identidades sociais positivas e
que, em casos de grupos de status social inferior, estas podem ser conseguidas deixando o
grupo ou reavaliando o status do grupo, fazia sentido na situação observada com os
alunos da comunidade canavieira. Por exemplo, o status inferior do grupo familiar era
legitimado tanto dentro grupo como fora (devido à situação económica muito difícil). A
procura da identidade social positiva podia viabilizar-se no sucesso escolar e abandono da
agricultura. A combinação de conceitos de Vygotsky, Moscovici e Tajfel gerou uma
estrutura de análise (Tabela 1) que contempla os três sistemas considerados centrais na
Psicologia Cultural (ver Much, 1995).
4
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Sistema Perspectiva teórica Aspecto saliente na análise psicológica
Cultural Vygotsky
"Mediação cultural"
Reconstrução cognitiva dos sistemas
culturais de representação do saber
Social Moscovici
"Representações sociais"
Reconstrução psicológica dos valores e
crenças associados ao saber e grupo social
que o utiliza, produz e transforma
Pessoa Tajfel
"Identidade social"
Processos de identificação social associados
à construção da pertença em comunidades de
prática.
3. Desenvolvimento teórico na década de 90
A abordagem sócio-cultural à aprendizagem, na década de 90, tem vindo a colocar como
central a noção de identidade. Esta noção surge dentro da abordagem pos-Vygotskiana,
visando superar a conceptualização limitada da mediação social na aprendizagem
(Litowitz, 1993; Minick, Stone e Forman, 1993). Segundo Litowitz (1993)
"Encontramos na literatura influenciada por Vygotsky muitas descrições de díades
perfeitamente orquestradas, passando tranquilamente pelos estágios de adulto-
ensinando e criança-aprendendo com poucos obstáculos. A intenção positiva de
ambos os participantes é raramente questionada (…). Quando a aprendizagem não
acontece, como ocorre frequentemente, ficamos com duas possíveis causas: ou o
adulto não criou o suporte correcto, ou a criança escolheu não usar o suporte
proporcionado." (p.187)
Jacqueline Goodnow (1990, 1993) tem argumentado que esta visão neutra das
interacções, como um espaço em que se negoceiam métodos e habilidades, não se
preocupa com as motivações que levam a criança e o adulto a envolverem-se ou resistirem
à actividade (ver César, 2000 para uma síntese da investigação Portuguesa nesta área).
Criticando a abordagem Vygotskiana, Goodnow pergunta: "Onde estão os pais que não
vêem como seu papel transmitir informação e encorajar compreensão? Onde estão as
crianças que, à partida, não querem aprender ou empenhar-se, ou que percebem como
inútil o que o professor adulto está apresentando?" (1990, p. 279). Para Goodnow esta
limitação teórica pode ser superada no exame das ligações entre áreas do saber, habilidade
e identidade social (p.282). Assim, uma criança (ou outro aprendiz) pode ser bem
5
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
sucedido na sua aprendizagem, não porque se interessa pelo saber em si, mas porque se
identifica com o adulto. Também se pode esperar o processo inverso, quando a criança
(aluno) se recusa a identificar-se com o adulto (professor). De facto, uma leitura
cuidadosa da obra de Vygotsky mostra que a ideia, que a apropriação do saber do outro
requer um certo grau de identificação com esse outro, não lhe era totalmente estranha.
"Para compreender a fala do outro não é suficiente compreender as suas palavras -
precisamos de compreender o seu pensamento. Mas, mesmo assim, isso não é
suficiente - precisamos também de conhecer a sua motivação. Nenhuma análise
psicológica da fala é completa até que esse plano seja alcançado." (Vygotsky,
1986, p. 253).
Um outro exemplo da introdução da noção de identidade pode ser encontrado em Lave e
Wenger (1991). Numa proposta radical, Lave e Wenger sugerem que o aprender está
associado à participação em comunidades de prática (prática escolar da Matemática, da
família, do trabalho, etc.). O processo principal passa a ser a participação evolutiva na
prática (da periferia para o centro), no qual mudanças no saber e na habilidade estão
associadas a mudanças na identidade (veja Matos, 2000 para uma revisão teórica e
aplicação a estudos em Portugal). Wenger (1998) argumenta que o foco na identidade
estende o modelo teórico da aprendizagem como participação em comunidades de prática
em duas direcções: (1) a redução do foco para a pessoa mas de uma perspectiva social; (2)
a expansão do foco para além das comunidades de prática, chamando atenção para
processos mais amplos de identificação e estruturas sociais (p.145).
Um aspecto comum na forma como a noção de identidade foi incorporada na teoria pós-
Vygotskiana e na proposta de Wenger é a conceptualização da "identidade situada na
prática". Esta proposição, do ponto vista teórico, evita o dualismo entre o indivíduo e o
sócio-cultural (ver Wenger, 1998). E, do ponto de vista metodológico, requer uma análise
localizada na experiência vivida, uma análise que não se limita a formular proposições
gerais sobre processos (muito comum na psicologia, cf. Duveen, in press) mas que toma
em conta o conteúdo (género, etnia, saber matemático, etc.) e práticas especificas à
identidade em construção (Matemática na escola primária portuguesa, na familia, etc.).
A aplicação destas ideias a práticas matemáticas é ainda muito limitada (para uma
excepção ver Boaler, William e Zevenbergen, 2000). Creio ser óbvio, que o avanço no
entendimento do papel mediador da identidade social na aprendizagem requer ferramentas
conceptuais e metodológicas para o estudo do fenómeno a nível empírico.
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XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
4. Investigando a construção de identidades no contexto de práticas
matemáticas
Em seguida elaboro um esquema de análise da construção das identidades no contexto de
práticas matemáticas. O desenvolvimento deste esquema conjuga conceitos centrais da
teoria das identidades sociais de Tajfel com a direcção de análise proposta por Wenger.
4.1. Ferramentas conceptuais e níveis de análise
Para Tajfel a formação das identidades sociais envolve dois processos complementares.
Primeiro, para definir uma identidade social o indivíduo segmenta o seu ambiente social
em grupos a que pertence e não pertence. Esta segmentação é conseguida através do
processo de categorização social definido como "a ordenação do ambiente social em
agrupamentos de pessoas numa maneira que faz sentido para o indivíduo". Ao apreender
as categorias sociais, a pessoa também apreende a valorização diferenciada dos grupos
dentro das sociedades. Segundo, a identidade social torna-se saliente através do processo
de comparação social. Como destaca Tajfel, "As características do nosso grupo (tal
como o seu status, a sua riqueza ou pobreza, a sua cor de pele e a sua habilidade de
alcançar seus objectivos) ganham mais significação em relação às diferenças percebidas
dos outros grupos e à conotação do valor dessas diferenças" (p.66).
Conjugando as ideias de Tajfel com a proposição de Wenger, a identidade situada na
prática permite abordar processos de identificação ao nível das estruturas sociais amplas e
da pessoa. A manifestação dos processos de categorização e comparação pode ser
investigada a dois níveis: (1) das representações sociais das identidades atribuídas, i.e.
identidades dadas pela localização das práticas na estrutura social ou na estrutura
institucional; (2) das experiências vividas da reconstrução das identidades sociais através
de participação em práticas sociais. Talvez seja importante ressaltar que a ideia de níveis,
como ferramenta analítica, não pressupõe, necessariamente, isolamento e dicotomias.
Segundo Rogoff (1995) "as partes, que compõem o todo de uma actividade ou evento,
podem ser consideradas separadamente como primeiro plano sem perder de vista a
interdependência inerente no todo. A sua estrutura pode ser descrita sem pressupor que a
estrutura de cada parte é independente das outras."
Os dois níveis de análise propostos examinam aspectos complementares da construção de
identidades mencionados frequentmente em abordagens psicológicas e sociológicas. Por
exemplo, Duveen (in press), psicólogo do desenvolvimento, argumenta que a identidade
se refere tanto ao processo de ser identificado (identidade atribuída) como de se identificar
(Identity is as much about the process of being identified as it is about the process of
7
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
identification). Os dois componentes também são considerados na teoria sociológica de
Dubar (1997), na qual a identidade social é definida "como um espaço de tempo
generacional", ou seja " é construída por cada geração com base em categorias e posições
herdadas da geração precedente mas também através das estratégias identitárias
desenroladas nas instituições que os indivíduos atravessam e para cuja transformação real
eles contribuem" (p.118).
4.2 Aplicação do esquema de análise a práticas matemáticas
Em seguida examino a relevância do esquema proposto ao caso específico da
aprendizagem matemática, re-analisando dados empíricos dos estudos que, de facto, têm
contribuído para o desenvolvimento das ideias.
Representação social das práticas e identidades atribuídas:
Identificando o OUTRO
Numa sequência de estudos, que incluíram alunos de escolas na Ilha da Madeira, de uma
comunidade canavieira no Nordeste do Brasil e de comunidades multi-étnicas na
Inglaterra, temos investigado as representações sobre uso da Matemática (Abreu, Bishop
e Pompeu, 1997; Abreu, 1993; Abreu e Cline, 1998; Abreu, Cline e Shamsi, 1999).
Fotografias com pessoas envolvidas em práticas rotineiras na comunidade, trabalhando
num escritório ou vendendo frutas no mercado, têm servido de base para tarefas que
requerem: (1) a classificação das práticas em termos do "uso" e "não uso" da Matemática;
(2) a comparação dos possíveis desempenhos na Matemática escolar, em termos da
escolha do melhor e do pior aluno.
As práticas representadas nas fotografias têm levado em conta o contexto social da
pesquisa mas, em todos os casos, incluem profissões que, na perspectiva dos
pesquisadores, têm um status superior (trabalho no escritório) e um status inferior (por
exemplo, cortador de cana no Brasil e motorista de táxi na Inglaterra). Estas tarefas têm
sido aplicadas como parte de estudos de caso e, portanto, o número de alunos envolvidos
tem sido relativamente baixo (20 a 24 em cada estudo). Os resultados nos diversos grupos
estudados, porém, são consistentes.
Primeiramente, os alunos entrevistados não têm dificuldade em categorizar as práticas em
relação ao uso da Matemática. A análise das tendências do grupo mostra que as categorias
são compartilhadas pela maior parte do grupo. Por exemplo, no estudo efectuado em
Inglaterra, somente dois alunos (de um total de 24) classificam a actividade de taxista
como requerendo Matemática.
8
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Em segundo lugar, os resultados mostram que as comparações subjacentes à escolha do
melhor e pior aluno podem partir da compreensão da estrutura da actividade (por
exemplo, a necessidade de lidar com números ou a presença de artefactos como a
calculadora e o metro) ou de julgamentos sobre os actores sociais envolvidos na situação.
Neste caso, as características do actor social, salientadas na comparação, podem estar
ligadas a atributos da pessoa (por exemplo, uma criança pode ser vista como a pior aluna
devido à sua idade) ou à posição social da pessoa (status social da profissão). Tanto no
Brasil como em Inglaterra, a referência ao actor social foi mais extrema no caso das
profissões com um status inferior e incluíu casos envolvendo o grupo de origem dos
alunos. Por exemplo, no estudo efectuado no Brasil, uma aluna, filha de um trabalhador da
cana-de-açúcar, explica porque acha que os piores alunos são os canavieiros nos seguintes
termos: "Se ele fosse bom em Matemática, não estaria trabalhando no campo. Ele estaria
num outro trabalho". No estudo em Inglaterra, um aluno de origem paquistanesa expressa
que: "… ele provavelmente não é bom em nada. Ele veio talvez do Paquistão. … Se ele
fosse bom em Matemática, então seria um doutor … Ele não seria taxista."
Estes resultados, na minha forma de ver, revelam uma compreensão de identidades sociais
como definidas na estrutura macro-social. Um nível de compreensão, que Wenger (1998)
realça como fundamental ao argumentar que "nossas identidades, mesmo que num
contexto de uma prática específica, não são apenas uma questão interna à prática, mas
também uma questão da nossa posição e da posição das nossas comunidades no contexto
das estruturas sociais mais amplas" (p.148). Expandindo esta ideia, Wenger sugere que a
identidade é definida, não apenas pelo que somos, mas também pelo que não somos, i.e.,
pela participação e não-participação. Este nível de análise dá uma indicação das
representações com base nas quais, indivíduos antecipam a identidade que lhes será
atribuída, se forem bem sucedidos (e.g. escola) ou se aderirem à participação em certas
comunidades de prática (e.g. profissões). Não é possível, contudo, capturar a este nível as
dinâmicas, segundo as quais o indivíduo, como participante de certas comunidades de
prática (muitas vezes compulsoriamente, como a família e a escola), se identifica ou
resiste à identificação do grupo. Tento elaborar este nível em seguida.
A experiência vivida na reconstrução das identidades:
"Ser identificado"
Da mesma forma que a pessoa dá sentido ao seu mundo social, atribuindo identidades
sociais aos outros, a participação em práticas sociais faz com que ela adquira a percepção
do modo como é identificada. Nas práticas, em que a participação é compulsória,
psicólogos do desenvolvimento, como Duveen (in press), têm sugerido que a consciência
9
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
do modo como se é identificado pode preceder o " identificar-se". Ou seja, primeiro a
criança internaliza a identidade da comunidade para depois aceitá-la ou rejeitá-la (ver
também Bergman e Luckmann, 1966, socialização primária e secundária). Por exemplo,
primeiro, a criança é identificada como "bom aluno" ou "aluno fraco" em Matemática para
depois identificar-se (aceitando ou rejeitando a identidade). Este processo pode ser
reconhecido no diálogo com Sabina sobre alunos que gostam e não gostam da Matemática
e sobre o impacto do desempenho da escola na vida adulta da pessoa.
Aluna, 2º ano do ensino primário, 7 anos de idade
Entrevistador: Há crianças que gostam da Matemática e outras que não
gostam. Podes pensar sobre alguma que conheces?
Aluna: … a minha irmã … a minha irmã, porque ela vai para a classe
da "Mrs" (as crianças são agrupadas por níveis de desempenho)
e ela realmente não gosta de Matemática.
Entrevistador: Ela gosta?
Aluna: Não, ela não gosta. … Ela é boa em Inglês mas não é boa em
Matemática. Eu sou boa em Matemática mas não sou boa em
Inglês.
Entrevistador: Não és tão boa em Inglês?
Aluna: Não sou.
Entrevistador: Talvez sejas.
Aluna: Não, eu não sou.
Entrevistador: Como sabes que a tua irmã não é boa em Matemática?
Aluna: Porque quando o relatório veio … dizia que eu precisava de me
esforçar mais em Inglês (…). Quando veio o relatório da minha
irmã, dizia que ela não era boa em Matemática, porque ela
tinha que se esforçar mais em Matemática.
Noutro momento da entrevista, o diálogo com Sabina sugere que a categoria de "bom
aluno" em Matemática parece servir de base à forma como o pai começa a identificá-la
com grupos profissionais visados.
Entrevistador: Se uma criança tem dificuldade na escola, será que isso faz
diferença quando ela crescer?
Aluna: Não. …. Ela vai trabalhar nas lojas …
Entrevistador: Então vai fazer diferença?
Aluna: Sim. Ela precisa de aprender a Matemática. É por isso que eu
venho para a escola.
Entrevistador: Porquê vens para a escola?
Aluna: Porque o meu pai diz que eu tenho que ser uma Doutora
quando eu crescer. Eu vou ganhar muito dinheiro.
Entrevistador: Sim.
Aluna: E eu sou muito boa em ciências.
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XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Mesmo numa perspectiva em que a identidade social não é vista como fixa mas
constantemente re-avaliada pela pessoa face a novas experiências, o facto de que certas
fases do desenvolvimento possam ser criticamente influenciadas pelo "ser identificado" é
de extrema importância. O que antes era visto como uma habilidade inata para lidar com o
saber matemático pode ser reanalisado em termos de como formas de identificação levam
a certas trajectórias na aprendizagem e desenvolvimento.
Voltando a Tajfel, o "ser identificado" representa apenas uma das dimensões da identidade
social, i.e., "conhecimento da pertença num grupo social (ou grupos)". A outra dimensão,
i.e., o "valor e o significado emocional associado a essa pertença" precisa ser analisado
para podermos entender o "identificar-se ". Na continuidade da análise mostro como a
dimensão valorativa se pode manifestar nas preferências (resistências) do indivíduo à
participação nas práticas.
A experiência vivida na reconstrução das identidades:
"Identificar-se"
Para analisar as preferências das crianças, gostaria de focar as práticas matemáticas da
família destinadas a ajudar a criança a ser bem sucedida na escola. Com base em Tajfel,
podemos antecipar que a identidade social ligada a práticas matemáticas se torna mais
saliente se as mesmas são experienciadas como distintas. Assim, seleccionei para análise
extractos de entrevistas com alunos que descreveram diferenças na maneira como o
professor (a) ensinava Matemática na escola e (b) a maneira como um familiar os ajudava
em casa. Os exemplos incluem três tipos de preferências: pela escola, pela casa e uso
situado da Matemática. Foram obtidos em entrevistas com alunos seleccionados pelos
professores para o projecto pelo seu bom desempenho em Matemática escolar,
exemplificando assim uma diversidade de posições.
Preferência pela prática matemática da escola:
John, aluno do 4
o
ano, família inglesa-caucasiana
No seguinte extracto nota-se que John descreve a diferença entre a prática na família e na
escola, referindo-se ao algoritmo da subtracção. Reconhece que ambos dão o mesmo
resultado, mas ao compará-los, decide que o da escola é mais adequado. A sua preferência
tem por base o status "histórico" do conhecimento. O pai foi à escola noutros tempos.
Entrevistador: Então disseste que, na maior parte das vezes, ele (o pai) explica da
mesma maneira que o professor, mas que às vezes é um pouco
diferente. Como é que ele explica?
John: Algumas vezes ele diz: “ tens que riscar …”.Se é uma subtracção,
geralmente riscamos o número de cima, ele risca o de baixo, mas o
resultado é o mesmo.
11
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Entrevistador: Qual achas, então, que é a maneira adequada de fazer?
John: Quando risca o número de cima, a maneira do professor.
Entrevistador: Ok. Porque achas melhor?
John: Porque o meu pai foi à escola há alguns anos atrás, por isso faz
de uma maneira diferente, mas nós também fazemos de uma
forma diferente.
Preferência pela prática matemática em casa:
Saira, aluna do 4
o
ano, família paquistanesa
Saira também se refere a diferenças entre as maneiras de fazer Matemática e, tal como
John reconhece, chegam à mesma resposta. Porém, a diferença mais saliente é o tipo de
interacção. Ela claramente não identifica-se com o estilo do seu professor, sempre
apressado.
Entrevistador: Tens alguém da família que te ajuda no trabalho de casa?
Saira: A minha irmã.
Entrevistador: Ela ajuda-te em Matemática?
Saira: .. na escola não, mas em casa sim (…). Quando tive trabalho de
casa com ângulos, ângulos são muito engraçados, não
conseguia entender a direcção … perguntava-lhe que ângulo é
este …
Entrevistador: Certo. E ela ensina-te da mesma maneira que o professor?
Saira: É um pouco diferente porque, às vezes, quando o professor não
explica bem e não entendo, então eu peço-lhe e ela explica de
maneira diferente. É diferente mas, no fim, quando faço o
trabalho de casa, o resultado dá certo.
Entrevistador: A resposta é a mesma. Qual achas então que é a maneira
adequada de fazer? A maneira como fazes na escola com o teu
professor ou em casa com a tua irmã?
Saira: A maneira como nós fazemos, a maneira como faço com a minha
irmã em casa.
Entrevistador: Com a tua irmã em casa. Porque achas que é melhor?
Saira: Porque o senhor …, o meu professor, não tem muitas coisas
para explicar e ele não quer ser interrompido quando está
a ensinar, quando está a explicar. A minha irmã em casa não,
nós estamos em casa as duas sozinhas (…). Quando tento
perguntar alguma coisa, ele está sempre muito ocupado, sempre
apressado e ocupado. Mas em casa, a minha irmã não está tão
ocupada, não está apressada.
Uso situado da Matemática:
Saeeda, aluna do 6
o
ano, família paquistanesa
Saeeda também foi confrontada com diferenças, tais como o algoritmo da divisão. Porém,
em vez de abandonar uma das maneiras, como faz John, ela passou a usá-las de forma
situada.
12
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Entrevistador: E acerca de trabalho de casa de Matemática, também pedes a
ajuda do teu pai?
Saeeda: Sim. A maior parte do tempo é nas folhas de exercícios que
peço ajuda. Por exemplo, na Sexta-feira, pedi-lhe ajuda na
terceira pergunta (…). Ele mostrou como fazer, mas ele nunca
dá a resposta.
(….)
Entrevistador: Alguém mais te ajuda sem ser o teu pai?
Saeeda: A minha mãe ajudou-me uma vez. Sim, ela ajuda a maior
parte do tempo porque ela é boa em Matemática.
Entrevistador: Ela é boa em Matemática?
Saeeda: Sim. É rápida. Ela acha as repostas muito depressa, mas ela
resolve sozinha, à sua maneira…
(…)
Entrevistador: Então, tanto o teu pai como a tua mãe te ajudam. Eles explicam
da mesma maneira que o professor ou de uma maneira
diferente?
Saeeda: Bom, se for divisão longa, na escola fazemos a divisão de uma
maneira diferente. Eles colocam os restos noutra página, mas nós
não. Nós fazemos longa…e foi assim que o meu pai me ensinou.
(…)
Entrevistador: … é uma maneira diferente da que aprendes na escola. Qual
achas que é a maneira adequada de fazer?
Saeeda: Acho que realmente as duas porque, quando fiz à maneira da
escola e depois fiz à maneira do meu pai, ambas deram o
mesmo resultado. Como elas dão o mesmo resultado, não
importa como se faz, só importa obter a resposta certa.
Entrevistador: …. Quando aprendeste a fazer na escola com o professor …
mostraste ao professor como fazias em casa?
Saeeda: Não porque é parecido; a única coisa diferente é como é
representado (setted) …..
Entrevistador: Continuas a fazer a divisão longa?
Saeeda: Posso fazer das duas maneiras. Assim, quando estou na escola,
eu faço à maneira da escola e, quando estou em casa, faço à
maneira de casa.
Entrevistador: Está bem.
Saeeda: Às vezes fica confuso …
Entrevistador: Esqueces qual a maneira?
Saeeda: Sim.
Entrevistador: Qual das maneiras achas mais fácil?
Saeeda: A maneira da escola.
Entrevistador: E qual pensas dar o resultado mais certo?
Saeeda: O resultado mais certo é o de casa.
Em síntese, os estudos de caso, acima apresentados, mostram primeiramente que as
práticas de casa e da escola foram categorizadas como diferentes a partir de experiências
com aspectos específicos do conhecimento matemático (e.g. as estratégias) e da relação
entre professor (tutor)-aluno. Em segundo lugar, mostram que ao efectuar comparações,
13
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
diferenças no saber foram analisadas em torno do que o aluno experiencia como legítimo.
Assim, para John, o saber de casa não é legítimo para a sua geração. Saeeda, entretanto,
legitima as duas formas, usando-as de forma situada. As comparações também podem ser
feitas com base no tipo de relacionamento, como se viu na preferência de Saira pela
tutoria em casa. Os exemplos apresentados não cobrem todas as formas possíveis de
interpretar as diferenças. No entanto, ilustram uma diversidade na forma como os alunos
reconstroem as suas experiências com a diferença, que por sua vez, se reflectem na forma
como se identificam com a comunidade de prática.
5. Algumas reflexões finais sobre o esquema de análise apresentado
A titulo de reflexão gostaria de realçar os seguintes pontos:
Primeiro: tendo seleccionado para exemplos estudos de caso com alunos bem sucedidos,
evitei nesta apresentação discutir o caso das identificações de alunos mal sucedidos em
Matemática escolar. Esta decisão foi pensada pois o objectivo era colocar a ênfase na
elaboração de um esquema de análise. A partir do esquema apresentado, podemos, por
exemplo, perguntar se as diferenças também são salientes para alunos com dificuldades.
Caso sejam, como se posicionam em relação às mesmas? Qual a possível origem de certos
posicionamentos: relações de poder e legitimação das práticas na estrutura social?
Influência de posicionamentos de adultos significativos, como o professor na escola e os
pais em casa? Estas são questões que temos abordado, entrevistando pais sobre a forma
como ajudam os filhos na Matemática escolar e professores sobre a articulação da relação
entre meio familiar e escola.
Segundo: a análise apresentada de certa forma mostra um "produto estático". Para
entender o processo de categorizações e comparações obtidas em entrevistas com alunos,
no entanto, precisamos de desenvolver formas de entender as dinâmicas evolutivas. A
preferência por uma prática da família ou da escola não pode ser entendida com a análise
isolada de uma delas. É necessário entender a experiência de transição do aluno entre as
duas práticas, de forma a dar sentido a certos posicionamentos e preferências.
Terceiro: penso que o esquema proposto torna a discussão do papel mediador das
identidades sociais acessível ao nível da prática educacional. Por exemplo, se o processo
de ser identificado tem uma influência significante na construção da identidade, podemos
pensar sobre o papel da escola e das práticas na aula de Matemática em definir categorias
de identificação. Esta é uma área a ser investigada.
14
XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
6. Referências
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XI Seminário de Investigação em Educação Matemática
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Aprendizagem da matemática e construção de identidades

  • 1. Aprendizagem da matemática e construção de identidades: uma perspectiva psicológica sócio-cultural Guida de Abreu Department of Psychology, University of Luton, UK 1. Introdução O objectivo deste artigo é reflectir sobre o papel mediador da identidade na aprendizagem da Matemática numa perspectiva psicológica sócio-cultural. É um trabalho de reflexão sobre questões como de onde vem a necessidade deste tipo de análise, como situar o conceito de identidade dentro das abordagens sócio-culturais e como desenvolver ferramentas que permitam prosseguir o estudo do fenómeno ao nível empírico. Ashmore e Jussin (1997) numa síntese sobre os estudos da identidade nas ciências sociais do século xx, incluindo a psicologia, a sociologia e a antropologia, distinguem dois tipos de análise do impacto do EU (self) e da identidade no desenvolvimento psicológico do indivíduo e de grupos sociais. Um tipo de análise examina o fenómeno da identidade ao nível individual e o outro ao nível social. Ao nível individual, são visíveis duas abordagens de pesquisa com origem na concepção do EU de William James (1890). Uma abordagem centra-se na investigação dos motivos e impulsos que, supostamente, fazem a pessoa agir de uma certa forma. A outra abordagem, concentra o objecto de análise no EU como conhecido pelos outros, como por exemplo, auto-estima, auto-conceito e auto-avaliação. Esta segunda abordagem emerge como dominante na década de 40, estendendo a sua influência até aos anos 70. Em termos metodológicos, nota-se a predominância da abordagem quantitativa. O interesse em aspectos do EU, tais como, auto-conceito, auto- estima, auto-avaliação, levou ao desenvolvimento de questionários (escalas) e análises correlacionais. São efectuados estudos de correlações entre níveis de auto-estima e medidas de desempenho na escola ou correlações entre atribuições individuais do desempenho e aproveitamento escolar. As dificuldades neste tipo de estudos são bem conhecidas, desde a concepção do EU como uma "entidade fundamentalmente não social" (Oyserman e Markus, 1998), à concepção dos testes e escalas (será que medem o que se propõem medir?). O paralelo entre a abordagem predominante na psicologia dos anos 40 a 70 e a pesquisa sobre o impacto do EU na aprendizagem da Matemática é patente. Como mostra McLeod (1992), na sua revisão de literatura, o EU é visto como parte do domínio afectivo e seu impacto na aprendizagem é estruturado em torno de estudos sobre crenças e atitudes acerca do EU. Os estudos da relação entre género (masculino e feminino) e a percepção sobre competência, atribuições causais de
  • 2. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática sucesso/insucesso e o desempenho na Matemática escolar, são um exemplo concreto desta abordagem. O meu interesse pelo estudo das identidades no contexto da cognição matemática, desde a fase inicial, foi marcado por um distanciamento da concepção individualista acima referida. Este processo proveio de observações empíricas sobre: (1) a diversidade entre alunos provenientes do mesmo grupo sócio-cultural, em termos da sua participação nas práticas da família; e (2) a disrupção entre práticas da família e da escola, ocasionada pelo status social diferente. Estas observações foram obtidas num estudo com alunos de uma comunidade canavieira do nordeste do Brasil (Abreu, 1993), conduzido numa perspectiva teórica que abarcava ideias de Vygotsky (1978, 1986), em particular a ideia que a aprendizagem envolvia a reconstrução ao nível psicológico de formas de representação culturais (simbólicas ou físicas), e a ideia de que a aprendizagem se situa no contexto das práticas, de acordo com a teoria desenvolvida por de Lave (1988). As noções de participação e disrupção eram consideradas na perspectiva teórica adoptada mas vistas de um ângulo distinto das observações empíricas mencionadas. Em primeiro lugar, a participação tinha sido explorada por Vygotskianos, nas interfaces na "zona proximal de desenvolvimento", e por antropólogos, como Lave, em termos de "apprenticeship". Mas, em geral, a participação examinada era a que levava à transmissão do saber e valores dos grupos, i.e., à continuidade das práticas. A possibilidade de disrupção também era considerada na teoria mas, primordialmente, em termos de diferenças entre sistemas de representação cultural dos grupos que, por sua vez, levavam a conflitos cognitivos. No nosso caso, a disrupção salientada estava associada ao status social das comunidades de prática ou à valorização da prática no contexto da estrutura social mais ampla. Assim, se existem conflitos, não são apenas de ordem cognitiva, mas também de identificação na pertença ou rejeição da pertença ao grupo. 2. Re-conceptualização teórica inicial Visando articular uma perspectiva psicológica que incorporasse a análise da valorização das práticas e da diversidade na participação, voltei-me para as teorias da psicologia social Europeia. O conceito de "representações sociais" de Moscovici (1988) permitiu adicionar uma dimensão social ao sistema de representação cultural. Segundo a óptica das representações sociais, o conhecimento matemático não pode ser dissociado do grupo que o utiliza (produz, ou transforma). A representação do conhecimento incorpora a valorização. Esta dimensão social da representação, por si só, não explica a origem da diversidade, pois continuamos com dificuldade em explicar como uma representação compartilhada por um grupo gera diversidade nos seus membros. 3
  • 3. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática Para explicar a diversidade recorri à integração das noções de representações sociais e identidades sociais, seguindo a trilha de Lloyd e Duveen (1992). Estes autores, ao estudarem como crianças desenvolvem identidades de género, no contexto da educação pré-escolar, observaram que a diversidade emerge na interface entre a representação social e a identidade social. Crianças com representações semelhantes sobre o género masculino ou feminino posicionavam-se de forma diferente em relação às mesmas. Por exemplo, meninas, que compartilhavam representações sociais de género (conhecimento dos marcadores sociais de feminino e masculino), assumiam diferentes identidades sociais manifestadas em formas de participação (preferência por grupos do mesmo género ou grupos mistos). Na sua elaboração inicial, Lloyd e Duveen apropriaram o conceito de identidade social de Tajfel (1978), definido como "a parte do auto-conceito do indivíduo que deriva do seu conhecimento de pertença a um grupo social (ou grupos) conjuntamente com o valor e o significado emocional associado a essa pertença". Esta perspectiva permite combinar a ideia que participação nos grupos (escola, família, etc.) leva à reconstrução das representações mas que o indivíduo exerce uma certa agência ao tomar consciência do valor e posiciona-se emocionalmente. Um aspecto da teoria de Tajfel, que se articulou muito bem com uma perspectiva sócio- cultural da aprendizagem, foi a sua ênfase nos processos intergrupais na formação da identidade social. A sua tese, que o ser humano precisa de identidades sociais positivas e que, em casos de grupos de status social inferior, estas podem ser conseguidas deixando o grupo ou reavaliando o status do grupo, fazia sentido na situação observada com os alunos da comunidade canavieira. Por exemplo, o status inferior do grupo familiar era legitimado tanto dentro grupo como fora (devido à situação económica muito difícil). A procura da identidade social positiva podia viabilizar-se no sucesso escolar e abandono da agricultura. A combinação de conceitos de Vygotsky, Moscovici e Tajfel gerou uma estrutura de análise (Tabela 1) que contempla os três sistemas considerados centrais na Psicologia Cultural (ver Much, 1995). 4
  • 4. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática Sistema Perspectiva teórica Aspecto saliente na análise psicológica Cultural Vygotsky "Mediação cultural" Reconstrução cognitiva dos sistemas culturais de representação do saber Social Moscovici "Representações sociais" Reconstrução psicológica dos valores e crenças associados ao saber e grupo social que o utiliza, produz e transforma Pessoa Tajfel "Identidade social" Processos de identificação social associados à construção da pertença em comunidades de prática. 3. Desenvolvimento teórico na década de 90 A abordagem sócio-cultural à aprendizagem, na década de 90, tem vindo a colocar como central a noção de identidade. Esta noção surge dentro da abordagem pos-Vygotskiana, visando superar a conceptualização limitada da mediação social na aprendizagem (Litowitz, 1993; Minick, Stone e Forman, 1993). Segundo Litowitz (1993) "Encontramos na literatura influenciada por Vygotsky muitas descrições de díades perfeitamente orquestradas, passando tranquilamente pelos estágios de adulto- ensinando e criança-aprendendo com poucos obstáculos. A intenção positiva de ambos os participantes é raramente questionada (…). Quando a aprendizagem não acontece, como ocorre frequentemente, ficamos com duas possíveis causas: ou o adulto não criou o suporte correcto, ou a criança escolheu não usar o suporte proporcionado." (p.187) Jacqueline Goodnow (1990, 1993) tem argumentado que esta visão neutra das interacções, como um espaço em que se negoceiam métodos e habilidades, não se preocupa com as motivações que levam a criança e o adulto a envolverem-se ou resistirem à actividade (ver César, 2000 para uma síntese da investigação Portuguesa nesta área). Criticando a abordagem Vygotskiana, Goodnow pergunta: "Onde estão os pais que não vêem como seu papel transmitir informação e encorajar compreensão? Onde estão as crianças que, à partida, não querem aprender ou empenhar-se, ou que percebem como inútil o que o professor adulto está apresentando?" (1990, p. 279). Para Goodnow esta limitação teórica pode ser superada no exame das ligações entre áreas do saber, habilidade e identidade social (p.282). Assim, uma criança (ou outro aprendiz) pode ser bem 5
  • 5. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática sucedido na sua aprendizagem, não porque se interessa pelo saber em si, mas porque se identifica com o adulto. Também se pode esperar o processo inverso, quando a criança (aluno) se recusa a identificar-se com o adulto (professor). De facto, uma leitura cuidadosa da obra de Vygotsky mostra que a ideia, que a apropriação do saber do outro requer um certo grau de identificação com esse outro, não lhe era totalmente estranha. "Para compreender a fala do outro não é suficiente compreender as suas palavras - precisamos de compreender o seu pensamento. Mas, mesmo assim, isso não é suficiente - precisamos também de conhecer a sua motivação. Nenhuma análise psicológica da fala é completa até que esse plano seja alcançado." (Vygotsky, 1986, p. 253). Um outro exemplo da introdução da noção de identidade pode ser encontrado em Lave e Wenger (1991). Numa proposta radical, Lave e Wenger sugerem que o aprender está associado à participação em comunidades de prática (prática escolar da Matemática, da família, do trabalho, etc.). O processo principal passa a ser a participação evolutiva na prática (da periferia para o centro), no qual mudanças no saber e na habilidade estão associadas a mudanças na identidade (veja Matos, 2000 para uma revisão teórica e aplicação a estudos em Portugal). Wenger (1998) argumenta que o foco na identidade estende o modelo teórico da aprendizagem como participação em comunidades de prática em duas direcções: (1) a redução do foco para a pessoa mas de uma perspectiva social; (2) a expansão do foco para além das comunidades de prática, chamando atenção para processos mais amplos de identificação e estruturas sociais (p.145). Um aspecto comum na forma como a noção de identidade foi incorporada na teoria pós- Vygotskiana e na proposta de Wenger é a conceptualização da "identidade situada na prática". Esta proposição, do ponto vista teórico, evita o dualismo entre o indivíduo e o sócio-cultural (ver Wenger, 1998). E, do ponto de vista metodológico, requer uma análise localizada na experiência vivida, uma análise que não se limita a formular proposições gerais sobre processos (muito comum na psicologia, cf. Duveen, in press) mas que toma em conta o conteúdo (género, etnia, saber matemático, etc.) e práticas especificas à identidade em construção (Matemática na escola primária portuguesa, na familia, etc.). A aplicação destas ideias a práticas matemáticas é ainda muito limitada (para uma excepção ver Boaler, William e Zevenbergen, 2000). Creio ser óbvio, que o avanço no entendimento do papel mediador da identidade social na aprendizagem requer ferramentas conceptuais e metodológicas para o estudo do fenómeno a nível empírico. 6
  • 6. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática 4. Investigando a construção de identidades no contexto de práticas matemáticas Em seguida elaboro um esquema de análise da construção das identidades no contexto de práticas matemáticas. O desenvolvimento deste esquema conjuga conceitos centrais da teoria das identidades sociais de Tajfel com a direcção de análise proposta por Wenger. 4.1. Ferramentas conceptuais e níveis de análise Para Tajfel a formação das identidades sociais envolve dois processos complementares. Primeiro, para definir uma identidade social o indivíduo segmenta o seu ambiente social em grupos a que pertence e não pertence. Esta segmentação é conseguida através do processo de categorização social definido como "a ordenação do ambiente social em agrupamentos de pessoas numa maneira que faz sentido para o indivíduo". Ao apreender as categorias sociais, a pessoa também apreende a valorização diferenciada dos grupos dentro das sociedades. Segundo, a identidade social torna-se saliente através do processo de comparação social. Como destaca Tajfel, "As características do nosso grupo (tal como o seu status, a sua riqueza ou pobreza, a sua cor de pele e a sua habilidade de alcançar seus objectivos) ganham mais significação em relação às diferenças percebidas dos outros grupos e à conotação do valor dessas diferenças" (p.66). Conjugando as ideias de Tajfel com a proposição de Wenger, a identidade situada na prática permite abordar processos de identificação ao nível das estruturas sociais amplas e da pessoa. A manifestação dos processos de categorização e comparação pode ser investigada a dois níveis: (1) das representações sociais das identidades atribuídas, i.e. identidades dadas pela localização das práticas na estrutura social ou na estrutura institucional; (2) das experiências vividas da reconstrução das identidades sociais através de participação em práticas sociais. Talvez seja importante ressaltar que a ideia de níveis, como ferramenta analítica, não pressupõe, necessariamente, isolamento e dicotomias. Segundo Rogoff (1995) "as partes, que compõem o todo de uma actividade ou evento, podem ser consideradas separadamente como primeiro plano sem perder de vista a interdependência inerente no todo. A sua estrutura pode ser descrita sem pressupor que a estrutura de cada parte é independente das outras." Os dois níveis de análise propostos examinam aspectos complementares da construção de identidades mencionados frequentmente em abordagens psicológicas e sociológicas. Por exemplo, Duveen (in press), psicólogo do desenvolvimento, argumenta que a identidade se refere tanto ao processo de ser identificado (identidade atribuída) como de se identificar (Identity is as much about the process of being identified as it is about the process of 7
  • 7. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática identification). Os dois componentes também são considerados na teoria sociológica de Dubar (1997), na qual a identidade social é definida "como um espaço de tempo generacional", ou seja " é construída por cada geração com base em categorias e posições herdadas da geração precedente mas também através das estratégias identitárias desenroladas nas instituições que os indivíduos atravessam e para cuja transformação real eles contribuem" (p.118). 4.2 Aplicação do esquema de análise a práticas matemáticas Em seguida examino a relevância do esquema proposto ao caso específico da aprendizagem matemática, re-analisando dados empíricos dos estudos que, de facto, têm contribuído para o desenvolvimento das ideias. Representação social das práticas e identidades atribuídas: Identificando o OUTRO Numa sequência de estudos, que incluíram alunos de escolas na Ilha da Madeira, de uma comunidade canavieira no Nordeste do Brasil e de comunidades multi-étnicas na Inglaterra, temos investigado as representações sobre uso da Matemática (Abreu, Bishop e Pompeu, 1997; Abreu, 1993; Abreu e Cline, 1998; Abreu, Cline e Shamsi, 1999). Fotografias com pessoas envolvidas em práticas rotineiras na comunidade, trabalhando num escritório ou vendendo frutas no mercado, têm servido de base para tarefas que requerem: (1) a classificação das práticas em termos do "uso" e "não uso" da Matemática; (2) a comparação dos possíveis desempenhos na Matemática escolar, em termos da escolha do melhor e do pior aluno. As práticas representadas nas fotografias têm levado em conta o contexto social da pesquisa mas, em todos os casos, incluem profissões que, na perspectiva dos pesquisadores, têm um status superior (trabalho no escritório) e um status inferior (por exemplo, cortador de cana no Brasil e motorista de táxi na Inglaterra). Estas tarefas têm sido aplicadas como parte de estudos de caso e, portanto, o número de alunos envolvidos tem sido relativamente baixo (20 a 24 em cada estudo). Os resultados nos diversos grupos estudados, porém, são consistentes. Primeiramente, os alunos entrevistados não têm dificuldade em categorizar as práticas em relação ao uso da Matemática. A análise das tendências do grupo mostra que as categorias são compartilhadas pela maior parte do grupo. Por exemplo, no estudo efectuado em Inglaterra, somente dois alunos (de um total de 24) classificam a actividade de taxista como requerendo Matemática. 8
  • 8. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática Em segundo lugar, os resultados mostram que as comparações subjacentes à escolha do melhor e pior aluno podem partir da compreensão da estrutura da actividade (por exemplo, a necessidade de lidar com números ou a presença de artefactos como a calculadora e o metro) ou de julgamentos sobre os actores sociais envolvidos na situação. Neste caso, as características do actor social, salientadas na comparação, podem estar ligadas a atributos da pessoa (por exemplo, uma criança pode ser vista como a pior aluna devido à sua idade) ou à posição social da pessoa (status social da profissão). Tanto no Brasil como em Inglaterra, a referência ao actor social foi mais extrema no caso das profissões com um status inferior e incluíu casos envolvendo o grupo de origem dos alunos. Por exemplo, no estudo efectuado no Brasil, uma aluna, filha de um trabalhador da cana-de-açúcar, explica porque acha que os piores alunos são os canavieiros nos seguintes termos: "Se ele fosse bom em Matemática, não estaria trabalhando no campo. Ele estaria num outro trabalho". No estudo em Inglaterra, um aluno de origem paquistanesa expressa que: "… ele provavelmente não é bom em nada. Ele veio talvez do Paquistão. … Se ele fosse bom em Matemática, então seria um doutor … Ele não seria taxista." Estes resultados, na minha forma de ver, revelam uma compreensão de identidades sociais como definidas na estrutura macro-social. Um nível de compreensão, que Wenger (1998) realça como fundamental ao argumentar que "nossas identidades, mesmo que num contexto de uma prática específica, não são apenas uma questão interna à prática, mas também uma questão da nossa posição e da posição das nossas comunidades no contexto das estruturas sociais mais amplas" (p.148). Expandindo esta ideia, Wenger sugere que a identidade é definida, não apenas pelo que somos, mas também pelo que não somos, i.e., pela participação e não-participação. Este nível de análise dá uma indicação das representações com base nas quais, indivíduos antecipam a identidade que lhes será atribuída, se forem bem sucedidos (e.g. escola) ou se aderirem à participação em certas comunidades de prática (e.g. profissões). Não é possível, contudo, capturar a este nível as dinâmicas, segundo as quais o indivíduo, como participante de certas comunidades de prática (muitas vezes compulsoriamente, como a família e a escola), se identifica ou resiste à identificação do grupo. Tento elaborar este nível em seguida. A experiência vivida na reconstrução das identidades: "Ser identificado" Da mesma forma que a pessoa dá sentido ao seu mundo social, atribuindo identidades sociais aos outros, a participação em práticas sociais faz com que ela adquira a percepção do modo como é identificada. Nas práticas, em que a participação é compulsória, psicólogos do desenvolvimento, como Duveen (in press), têm sugerido que a consciência 9
  • 9. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática do modo como se é identificado pode preceder o " identificar-se". Ou seja, primeiro a criança internaliza a identidade da comunidade para depois aceitá-la ou rejeitá-la (ver também Bergman e Luckmann, 1966, socialização primária e secundária). Por exemplo, primeiro, a criança é identificada como "bom aluno" ou "aluno fraco" em Matemática para depois identificar-se (aceitando ou rejeitando a identidade). Este processo pode ser reconhecido no diálogo com Sabina sobre alunos que gostam e não gostam da Matemática e sobre o impacto do desempenho da escola na vida adulta da pessoa. Aluna, 2º ano do ensino primário, 7 anos de idade Entrevistador: Há crianças que gostam da Matemática e outras que não gostam. Podes pensar sobre alguma que conheces? Aluna: … a minha irmã … a minha irmã, porque ela vai para a classe da "Mrs" (as crianças são agrupadas por níveis de desempenho) e ela realmente não gosta de Matemática. Entrevistador: Ela gosta? Aluna: Não, ela não gosta. … Ela é boa em Inglês mas não é boa em Matemática. Eu sou boa em Matemática mas não sou boa em Inglês. Entrevistador: Não és tão boa em Inglês? Aluna: Não sou. Entrevistador: Talvez sejas. Aluna: Não, eu não sou. Entrevistador: Como sabes que a tua irmã não é boa em Matemática? Aluna: Porque quando o relatório veio … dizia que eu precisava de me esforçar mais em Inglês (…). Quando veio o relatório da minha irmã, dizia que ela não era boa em Matemática, porque ela tinha que se esforçar mais em Matemática. Noutro momento da entrevista, o diálogo com Sabina sugere que a categoria de "bom aluno" em Matemática parece servir de base à forma como o pai começa a identificá-la com grupos profissionais visados. Entrevistador: Se uma criança tem dificuldade na escola, será que isso faz diferença quando ela crescer? Aluna: Não. …. Ela vai trabalhar nas lojas … Entrevistador: Então vai fazer diferença? Aluna: Sim. Ela precisa de aprender a Matemática. É por isso que eu venho para a escola. Entrevistador: Porquê vens para a escola? Aluna: Porque o meu pai diz que eu tenho que ser uma Doutora quando eu crescer. Eu vou ganhar muito dinheiro. Entrevistador: Sim. Aluna: E eu sou muito boa em ciências. 10
  • 10. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática Mesmo numa perspectiva em que a identidade social não é vista como fixa mas constantemente re-avaliada pela pessoa face a novas experiências, o facto de que certas fases do desenvolvimento possam ser criticamente influenciadas pelo "ser identificado" é de extrema importância. O que antes era visto como uma habilidade inata para lidar com o saber matemático pode ser reanalisado em termos de como formas de identificação levam a certas trajectórias na aprendizagem e desenvolvimento. Voltando a Tajfel, o "ser identificado" representa apenas uma das dimensões da identidade social, i.e., "conhecimento da pertença num grupo social (ou grupos)". A outra dimensão, i.e., o "valor e o significado emocional associado a essa pertença" precisa ser analisado para podermos entender o "identificar-se ". Na continuidade da análise mostro como a dimensão valorativa se pode manifestar nas preferências (resistências) do indivíduo à participação nas práticas. A experiência vivida na reconstrução das identidades: "Identificar-se" Para analisar as preferências das crianças, gostaria de focar as práticas matemáticas da família destinadas a ajudar a criança a ser bem sucedida na escola. Com base em Tajfel, podemos antecipar que a identidade social ligada a práticas matemáticas se torna mais saliente se as mesmas são experienciadas como distintas. Assim, seleccionei para análise extractos de entrevistas com alunos que descreveram diferenças na maneira como o professor (a) ensinava Matemática na escola e (b) a maneira como um familiar os ajudava em casa. Os exemplos incluem três tipos de preferências: pela escola, pela casa e uso situado da Matemática. Foram obtidos em entrevistas com alunos seleccionados pelos professores para o projecto pelo seu bom desempenho em Matemática escolar, exemplificando assim uma diversidade de posições. Preferência pela prática matemática da escola: John, aluno do 4 o ano, família inglesa-caucasiana No seguinte extracto nota-se que John descreve a diferença entre a prática na família e na escola, referindo-se ao algoritmo da subtracção. Reconhece que ambos dão o mesmo resultado, mas ao compará-los, decide que o da escola é mais adequado. A sua preferência tem por base o status "histórico" do conhecimento. O pai foi à escola noutros tempos. Entrevistador: Então disseste que, na maior parte das vezes, ele (o pai) explica da mesma maneira que o professor, mas que às vezes é um pouco diferente. Como é que ele explica? John: Algumas vezes ele diz: “ tens que riscar …”.Se é uma subtracção, geralmente riscamos o número de cima, ele risca o de baixo, mas o resultado é o mesmo. 11
  • 11. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática Entrevistador: Qual achas, então, que é a maneira adequada de fazer? John: Quando risca o número de cima, a maneira do professor. Entrevistador: Ok. Porque achas melhor? John: Porque o meu pai foi à escola há alguns anos atrás, por isso faz de uma maneira diferente, mas nós também fazemos de uma forma diferente. Preferência pela prática matemática em casa: Saira, aluna do 4 o ano, família paquistanesa Saira também se refere a diferenças entre as maneiras de fazer Matemática e, tal como John reconhece, chegam à mesma resposta. Porém, a diferença mais saliente é o tipo de interacção. Ela claramente não identifica-se com o estilo do seu professor, sempre apressado. Entrevistador: Tens alguém da família que te ajuda no trabalho de casa? Saira: A minha irmã. Entrevistador: Ela ajuda-te em Matemática? Saira: .. na escola não, mas em casa sim (…). Quando tive trabalho de casa com ângulos, ângulos são muito engraçados, não conseguia entender a direcção … perguntava-lhe que ângulo é este … Entrevistador: Certo. E ela ensina-te da mesma maneira que o professor? Saira: É um pouco diferente porque, às vezes, quando o professor não explica bem e não entendo, então eu peço-lhe e ela explica de maneira diferente. É diferente mas, no fim, quando faço o trabalho de casa, o resultado dá certo. Entrevistador: A resposta é a mesma. Qual achas então que é a maneira adequada de fazer? A maneira como fazes na escola com o teu professor ou em casa com a tua irmã? Saira: A maneira como nós fazemos, a maneira como faço com a minha irmã em casa. Entrevistador: Com a tua irmã em casa. Porque achas que é melhor? Saira: Porque o senhor …, o meu professor, não tem muitas coisas para explicar e ele não quer ser interrompido quando está a ensinar, quando está a explicar. A minha irmã em casa não, nós estamos em casa as duas sozinhas (…). Quando tento perguntar alguma coisa, ele está sempre muito ocupado, sempre apressado e ocupado. Mas em casa, a minha irmã não está tão ocupada, não está apressada. Uso situado da Matemática: Saeeda, aluna do 6 o ano, família paquistanesa Saeeda também foi confrontada com diferenças, tais como o algoritmo da divisão. Porém, em vez de abandonar uma das maneiras, como faz John, ela passou a usá-las de forma situada. 12
  • 12. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática Entrevistador: E acerca de trabalho de casa de Matemática, também pedes a ajuda do teu pai? Saeeda: Sim. A maior parte do tempo é nas folhas de exercícios que peço ajuda. Por exemplo, na Sexta-feira, pedi-lhe ajuda na terceira pergunta (…). Ele mostrou como fazer, mas ele nunca dá a resposta. (….) Entrevistador: Alguém mais te ajuda sem ser o teu pai? Saeeda: A minha mãe ajudou-me uma vez. Sim, ela ajuda a maior parte do tempo porque ela é boa em Matemática. Entrevistador: Ela é boa em Matemática? Saeeda: Sim. É rápida. Ela acha as repostas muito depressa, mas ela resolve sozinha, à sua maneira… (…) Entrevistador: Então, tanto o teu pai como a tua mãe te ajudam. Eles explicam da mesma maneira que o professor ou de uma maneira diferente? Saeeda: Bom, se for divisão longa, na escola fazemos a divisão de uma maneira diferente. Eles colocam os restos noutra página, mas nós não. Nós fazemos longa…e foi assim que o meu pai me ensinou. (…) Entrevistador: … é uma maneira diferente da que aprendes na escola. Qual achas que é a maneira adequada de fazer? Saeeda: Acho que realmente as duas porque, quando fiz à maneira da escola e depois fiz à maneira do meu pai, ambas deram o mesmo resultado. Como elas dão o mesmo resultado, não importa como se faz, só importa obter a resposta certa. Entrevistador: …. Quando aprendeste a fazer na escola com o professor … mostraste ao professor como fazias em casa? Saeeda: Não porque é parecido; a única coisa diferente é como é representado (setted) ….. Entrevistador: Continuas a fazer a divisão longa? Saeeda: Posso fazer das duas maneiras. Assim, quando estou na escola, eu faço à maneira da escola e, quando estou em casa, faço à maneira de casa. Entrevistador: Está bem. Saeeda: Às vezes fica confuso … Entrevistador: Esqueces qual a maneira? Saeeda: Sim. Entrevistador: Qual das maneiras achas mais fácil? Saeeda: A maneira da escola. Entrevistador: E qual pensas dar o resultado mais certo? Saeeda: O resultado mais certo é o de casa. Em síntese, os estudos de caso, acima apresentados, mostram primeiramente que as práticas de casa e da escola foram categorizadas como diferentes a partir de experiências com aspectos específicos do conhecimento matemático (e.g. as estratégias) e da relação entre professor (tutor)-aluno. Em segundo lugar, mostram que ao efectuar comparações, 13
  • 13. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática diferenças no saber foram analisadas em torno do que o aluno experiencia como legítimo. Assim, para John, o saber de casa não é legítimo para a sua geração. Saeeda, entretanto, legitima as duas formas, usando-as de forma situada. As comparações também podem ser feitas com base no tipo de relacionamento, como se viu na preferência de Saira pela tutoria em casa. Os exemplos apresentados não cobrem todas as formas possíveis de interpretar as diferenças. No entanto, ilustram uma diversidade na forma como os alunos reconstroem as suas experiências com a diferença, que por sua vez, se reflectem na forma como se identificam com a comunidade de prática. 5. Algumas reflexões finais sobre o esquema de análise apresentado A titulo de reflexão gostaria de realçar os seguintes pontos: Primeiro: tendo seleccionado para exemplos estudos de caso com alunos bem sucedidos, evitei nesta apresentação discutir o caso das identificações de alunos mal sucedidos em Matemática escolar. Esta decisão foi pensada pois o objectivo era colocar a ênfase na elaboração de um esquema de análise. A partir do esquema apresentado, podemos, por exemplo, perguntar se as diferenças também são salientes para alunos com dificuldades. Caso sejam, como se posicionam em relação às mesmas? Qual a possível origem de certos posicionamentos: relações de poder e legitimação das práticas na estrutura social? Influência de posicionamentos de adultos significativos, como o professor na escola e os pais em casa? Estas são questões que temos abordado, entrevistando pais sobre a forma como ajudam os filhos na Matemática escolar e professores sobre a articulação da relação entre meio familiar e escola. Segundo: a análise apresentada de certa forma mostra um "produto estático". Para entender o processo de categorizações e comparações obtidas em entrevistas com alunos, no entanto, precisamos de desenvolver formas de entender as dinâmicas evolutivas. A preferência por uma prática da família ou da escola não pode ser entendida com a análise isolada de uma delas. É necessário entender a experiência de transição do aluno entre as duas práticas, de forma a dar sentido a certos posicionamentos e preferências. Terceiro: penso que o esquema proposto torna a discussão do papel mediador das identidades sociais acessível ao nível da prática educacional. Por exemplo, se o processo de ser identificado tem uma influência significante na construção da identidade, podemos pensar sobre o papel da escola e das práticas na aula de Matemática em definir categorias de identificação. Esta é uma área a ser investigada. 14
  • 14. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática 6. Referências Abreu, G. d. (1993). The relationship between home and school mathematics in a farming community in rural Brazil. Unpublished Doctoral, Cambridge, Cambridge. Abreu, G. d., Bishop, A., & Pompeu, G. (1997). What children and teachers count as mathematics. In T. Nunes & P. Bryant (Eds.), Learning and Teaching Mathematics: an International Perspective (pp. 233-264). Hove, East Sussex: Psychology Press. Abreu, G. d., & Cline, T. (1998). Studying social representations of mathematics learning in multiethnic primary schools: work in progress. Papers on social representations, 7(1-2), 1-20. Abreu, G. d., Cline, T., & Shamsi, T. (1999). Mathematics learning in multiethnic primary schools (ESRC - R000 222 381). Luton: Department of Psychology, Luton University. Ashmore, R. D., & Jussim, L. (1997). Self and Identiy. Oxford: Oxford University Press. Berger, P., & Luckmann, T. (1966). La construction sociale de la realite. Paris: Meridiens Klincksiek. Boaler, J., William, D., & Zevenbergen, R. (2000). The construction of identity in secondary mathematics education. Paper presented at the 2nd International Conference on Mathematics Education and Society, Montecorvo, Algarve, Portugal. César, M. (2000). Interacções sociais e apreensão de conhecimentos matemáticos: a investigação contextualizada. In J. P. Ponte & L. Serrazina (Eds.), Educação Matemática em Portugal, Espanha e Itália : SPCE - Secção da Matemática. Dubar, C. (1997). A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. Porto: Porto Editora. Duveen, G. (in press). Representations, identities, resistance. In K. Deaux & G. Philogene (Eds.), Social representations: introductions and expplorations . Oxford: Blackwell. Goodnow, J. (1993). Direction of post-Vygotskian research. In E. Forman, N. Minick, & C. A. Stone (Eds.), Contexts for learning (pp. 369-381). Oxford: Oxford University Press. Goodnow, J. J. (1990). The socialization of cognition: what's involved? In J. W. Stiegler, R. A. Shweder, & G. Herdt (Eds.), Cultural Psychology (pp. 259-286). Cambridge: Cambridge University Press. James, W. (1890). Principles of Psychology. New York: Holt. Lave, J. (1988). Cognition in practice. Cambridge: Cambridge University Press. Lave, J., & Wenger, E. (1991). Situated learning and legitimate peripheral participation. Cambridge: Cambridge University Press. Litowitz, B. E. (1993). Deconstruction in the Zone of Proximal Development. In E. Froman, N. Minick, & C. A. Stone (Eds.), Contexts for learning (pp. 184-185). Oxford: Oxford University Press. Lloyd, B., & Duveen, G. (1992). Gender identities and education. London: Harester Wheatsheaf. Matos, J. F. L. (2000). Aprendizagem e Pratica social: contributos para a construção de ferramentas de analise da aprendizagem matemática escolar. In J. P. Ponte & L. Serrazina (Eds.), Educação Matemática em Portugal, Espanha e Itália . 15
  • 15. XI Seminário de Investigação em Educação Matemática McLeod, D. B. (1992). Research on affect in mathematics education: a reconceptualisation. In D. A. Grouws (Ed.), Handbook of research in mathematics teaching and learning (pp. 575-596). New York: Macmillan. Minick, N., Stone, C. A., & Forman, E. A. (1993). Integration of Individual, Social, and Institutional Processes in Accounts of Children's Learning and Development. In E. A. Forman, N. Minick, & C. A. Stone (Eds.), Contexts for learning (pp. 3-16). Oxford: Oxford University Press. Moscovici, S. (1988). Notes towards a definition of social representations. European Journal of Social Psychology, 18, 211-250. Much, N. (1995). Cultural Psychology. In J. A. Smith, R. Harre, & L. V. Langenhove (Eds.), Rethinking Psychology (pp. 97-121). London: Sage. Oyserman, D., & Markus, H. R. (1998). Self as social representation. In U. Flick (Ed.), The psychology of the social (pp. 107-125). Cambridge: Cambridge University Press. Rogoff, B. (1995). Observing sociocultural activity on three planes: participatory appropriation, guided participation, and apprenticeship. In J. V. Wertsch, P. Del- Rio, & A. Alvarez (Eds.), Sociocultural Studies of Mind (pp. 139-165). Cambridge: Cambridge University Press. Tajfel, H. (1978). Social categorisation, social identity and social comparison. In H. Tajfel (Ed.), Differentiation between social groups: studies in social psychology of intergroup relations (pp. 61-76). London: Academic Press. Vygotsky, L. (1978). Mind in society: the development of higher psychological processes. Cambridge, Mass: Harvard University Press. Vygotsky, L. (1986). Thought and Language. Cambridge, Mass: The MIT Press. Wenger, E. (1998). Communities of practice: learning, meaning and identity. Cambridge: Cambridge University Press. 16