Este documento discute como a arte pode ser usada para educar sobre direitos humanos em Manaus, Brasil. A arte ajuda a desenvolver a empatia e a capacidade de se colocar no lugar do outro através da imaginação narrativa. É importante planejar como integrar obras de arte a um tema de direitos humanos para gerar discussões significativas. Movimentos artísticos do século 20, como o cubismo e o expressionismo, ajudaram a impulsionar debates sobre dignidade humana e influenciaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
1. ¹ Acadêmica de Direito pelo Instituto Amazônico de Ensino Superior - IAMES
DIREITOS HUMANOS: Arte e educação como perspectiva para comunicar
valores intelectuais, culturais e sociais em Manaus.
Ana Luiza Amaro dos Santos¹
Orientação: Simone Helen Drumond Ischkanian
RESUMO
Este trabalho aborda sobre visões de mundo impulsionadas por fortes emoções e
vivências para entenda porque a arte na educação em direitos humanos em Manaus é
uma excelente forma de produzir experiências transformadoras e como ela pode ser uma
das principais aliadas para educar em direitos humanos. Quando foi a última vez que
você se emocionou? Você se lembra? Foi assistindo a um filme, ouvindo uma música,
lendo um livro? Foi produzindo ou desfrutando de alguma forma de arte? E a última vez
que você repensou seus valores e convicções? Teve alguma relação com essa ou alguma
outra forte emoção que sentiu? Essas experiências transformadoras, geralmente,
acontecem por acaso, quando menos esperamos, e muitas vezes dão a sensação de que
havia algo óbvio nos passando despercebido. E é justamente essa sensação que nos
captura quando, como alunas e alunos, entendemos um conceito ou uma ideia. É por
isso que momentos de forte emoção e conexão são tão importantes para a educação e,
em especial para a educação em direitos humanos. Estabelecer conexões que gerem
algum tipo de comprometimento; engajar uma mudança de pensamento; possibilitar às
pessoas que olhem para o mundo para além de suas próprias bolhas. Essas são algumas
das tarefas mais importantes e, ao mesmo tempo, mais árduas da educação. E talvez
sejam ainda mais difíceis para quem pretende educar com valores que fogem às visões
de mundo individualistas, como é o caso de quem trabalha com educação em direitos
humanos.
Palavras-chave: Direitos humanos. Arte. Educação. Valores para vida.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho é sobre arte e educação como perspectiva para comunicar
valores intelectuais, culturais e sociais. Educar em direitos humanos, dentre as várias
possibilidades de sua definição, é educar em valores e formar com e para a cidadania.
Não quaisquer valores, evidentemente, mas valores coerentes com os princípios que
fundamentam os direitos humanos. E não é preciso ir muito longe: resumamos esses
princípios à ideia de respeito à dignidade humana, em todas as suas formas. De pronto,
então, educar em direitos humanos é educar pensando em promover a dignidade de cada
pessoa e a capacidade, a possibilidade, de que cada pessoa respeite à dignidade das
outras pessoas com quem compartilha o mundo
O presente trabalho está organizado em cinco partes, neste contexto é possível
evidenciar que a Arte é uma área de conhecimento que contribui para formação humana
2. do aluno, para ajudá-lo a entender de forma crítica a sociedade que o rodeia e a cultura.
Portanto, não pode ser tratado como forma meramente de entreter, ou ser visto como
uma área menos importante que as demais. Sua existência no currículo contribui para
uma formação plena do aluno, lembrando que é muito importante a formação global,
não se reduzindo o processo educacional somente por áreas mais tradicionais como é o
caso da língua portuguesa, matemática e ciências. Nesse sentido, o conhecimento na
área de Arte faz parte do todo na formação do aluno e não permitir o acesso a essa área
de conhecimento é negar um direito que o cabe para ser formado como cidadão crítico e
consciente.
2 A IMAGINAÇÃO NARRATIVA E A VIVÊNCIA ESTÉTICA: QUAL A
CONTRIBUIÇÃO DA ARTE PARA EDUCAR EM DIREITOS HUMANOS?
O pensamento de Martha Nussbaum, filósofa que, de algumas formas, também
tem inspirado a maneira como entendo a educação, a arte e os Direitos Humanos. No
livro Educação e justiça social, a autora, inspirada pelo polímata indiano Rabindranath
Tagore, destaca que os cidadãos e cidadãs de sociedades democráticas devem possuir,
necessariamente, três capacidades:
a capacidade de autocrítica,
a capacidade de se perceber como ser humano interligado a outros seres
humanos por laços de reconhecimento e interesse,
e a capacidade de se colocar no lugar do outro e compreender sua história,
seus sentimentos e seus interesses.
É justamente por meio das artes que se pode atingir essas capacidades e por
isso há uma forte relação entre arte e direitos humanos.
A esse potencial de se colocar na vida de outras e outros Nussbaum dá o nome
de imaginação narrativa. Em linhas gerais, o que se quer proporcionar com a
imaginação narrativa é a empatia, ou, em maior grau, a alteridade, para que o mundo
seja percebido como algo além da história do próprio indivíduo (ou como uma narrativa
diversa da sua). Como exemplo, a autora escreve que “encenar uma peça de teatro
sobre o dote (ou sobre o racismo) é uma maneira de aprender acerca desse tema que,
para uma criança, tem um significado muito mais profundo do que a leitura de um
manual sobre o mesmo tema.” Pensando dessa forma, parece evidente o potencial da
arte na educação em direitos humanos.
3. Outro importante pensador que dedicou muito tempo a essa relação (da arte na
educação) foi Vygotsky. Para ele, a arte é capaz de gerar fortes emoções que nos
atingem como verdadeiras vivências estéticas que podem nos transformar. Descrever
esse processo é bastante complicado, mas, ao mesmo tempo, é um tanto intuitivo, pois
todas/os já passamos por momentos assim. Se não pelo teatro, quando nos colocaríamos
ativamente na vida de outra pessoa? Se não pela música, cinema ou literatura, quando é
que nos deixaríamos ser invadidos por um sentimento que não é nosso? Esse é o grande
trunfo da arte na educação.
3 USAR A ARTE NA EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS EXIGE
PLANEJAMENTO. COMO ISSO OCORRE NA PRÁTICA?
Para se valer da arte na educação, primeiro é preciso ter um objetivo claro de
qual tema será tratado. Se você busca inspiração, dê uma olhada na Declaração
Universal dos Direitos Humano. Cada artigo pode lhe ajudar a definir um tema. Se
quiser ir direto ao ponto, dê uma lida em nosso artigo sobre os objetivos de
desenvolvimento sustentável, neste contexto cada um dos 17 ODS poderá servir de base
para você definir um tema.
Feita essa escolha, procure descobrir qual tipo de material seria mais motivador
para seu público. Em nossa experiência, percebemos que o cinema tem um forte apelo
para o público adulto, ao passo que música, literatura e fotografia, geram bastante
conexão com jovens, tanto como espectadoras/es quanto como criadoras/es. O ideal,
sempre, é conhecer o grupo com que se trabalha. Procure referências já conhecidas e
apreciadas pela turma e, aos poucos, acrescente outros nomes, títulos e estilos para que
expandam ainda mais seu universo. Libâneo discorre sobre esta questão do
planejamento:
O planejamento consiste numa atividade de previsão da ação a ser realizada,
implicando definição de necessidades a atender, objetivos a atingir dentro das
possibilidades, procedimentos e recursos a serem empregados, tempo de
execução e formas de avaliação. O processo e o exercício de planejar
referem-se a uma antecipação da prática, de modo a prever e programar as
ações e os resultados desejados, constituindo-se numa atividade necessária a
tomada de decisões. (LIBÂNEO, 2001, p. 123)
O planejamento faz parte da ação docente, é um instrumento que o guia no
processo ensino aprendizagem. O professor que realiza sua prática de forma imprevista,
dificilmente contribui para uma aprendizagem significativa, pois deixa transparecer para
os alunos (principalmente adolescentes), um certo “descaso” com sua própria disciplina.
4. Por fim, é importante planejar de que maneira o tema proposto será articulado
com a obra escolhida. Isso é bastante importante para que um filme não seja “só” um
filme, ou para que uma música não seja apenas o som ambiente durante uma aula ou
oficina. Prepare os grupos para lidarem com a obra, e provoque-os para refletir sobre o
que ela os faz sentir
4 O ENTENDIMENTO DO DIREITO COMO PROCESSO CULTURAL
Os direitos humanos precisam, inicialmente, ser entendidos como um processo
de luta por dignidade humana. Por este motivo, não cabe na definição desses direitos
uma valoração de bens com fundamento originário ou uma esfera principal de garantias
dadas através da moralidade. Sendo assim, cria-se um reconhecimento do processo
cultural: os direitos humanos são resultados culturais responsáveis por criar as
conjunturas basilares a um sentido político de liberdade e dignidade.
A partir do exposto, os direitos humanos aglutinam reações políticas,
econômicas, sociais e jurídicas, respeitando as circunstâncias ao redor, porém ainda
manifestam em si uma formação cultural e histórica que proporciona meios concretos
para atuar frente à desigualdade de posições ocupadas no acesso aos bens.
A caracterização dos direitos humanos por pautas culturais possibilita uma
construção própria que encontrará na dignidade o caráter universal, portanto, há formas
plurais de atuar no mundo em busca da igualdade de boas condições. Assim, a cultura
dos outros3 também consta no cerne dos direitos humanos e poderá alcançar uma
veracidade formal e material, sem generalizações coloniais ou imperialistas. Entretanto,
para que esse processo ocorra da maneira devida é preciso entender as complexidades
do direito como processo cultural.
5 OS MOVIMENTOS ARTÍSTICOS QUE IMPULSIONARAM DEBATES
SOBRE DIREITOS HUMANOS
O cenário do século XX foi extremamente propício para mudanças na arte, o
que é comprovado pelas inúmeras correntes que surgem em determinado período.
Durante essa época, por causa da eclosão da Primeira Guerra Mundial e a hostilidade
presente na vida das pessoas, os indivíduos entraram em conflito com o próprio ser e
passaram a questionar as visões de mundo apresentadas em momento anterior. As
5. angústias e vontades de renovar os padrões presentes se refletiram e foram
impulsionadas pela linguagem artística.
A famosa pintura Les demoiselles d’Avignon de Pablo Picasso é vista como um
protótipo do cubismo que tem como característica principal a representação dos corpos
em três dimensões.
O Cubismo Sintético, movimento forte entre 1911 e 1916, se utilizava do
método de colagem, principalmente com recortes de jornais, para tratar das figuras de
uma forma distante do realismo. Anos depois, em 1937, Pablo Picasso simulou a técnica
de collage em uma de suas obras mais famosas que retratava o bombardeio à cidade de
Guernica durante a Guerra Civil Espanhola.
O Expressionismo é a qualificação para arte do século passado que revelava
como tema substancial os estados mentais do homem e tinha como característica a
exibição do mundo segundo o olhar do artista, muitas vezes se depreendendo de
fidelidade ao real. O movimento artístico teve sua iniciação com Van Gogh no final do
século XIX e prosseguiu durante o começo do século XX quando Edward Munch foi o
principal expoente. Uma análise mais atenta demonstra como a arte se transforma para
acompanhar as exigências de realidades sociais.
Os artistas do Futurismo, por sua vez, exerciam suas atividades na Itália de
1909 a 1916. Esse grupo seguia as reflexões do poeta Filippo Marinetti que pensava que
a Itália estava aprisionada pelo passado e precisava avançar para o futuro. O primeiro
manifesto futurista escrito por Marinetti apreciava a juventude e as máquinas, enquanto
o segundo reforçava a ideia de um futuro glorioso. Suas principais características
estavam associadas com a necessidade de mostrar velocidade. Para isso, se utilizavam
da deformação de objetos e tinham a propaganda como principal meio de comunicação.
As próprias poesias dessa vertente continham frases fragmentadas com o intuito de
demonstrar agilidade.
O Dadaísmo se encontra no caráter questionador. As indagações das realidades
que se apresentam, a procura por diferentes pontos de vistas e a negação dos estados de
desigualdades permearam todo o movimento. Além de movimentos com enfoque nas
artes plásticas, não se pode esquecer da manifestação da guerra pelas lentes do cinema.
A arte cinematográfica em muitos momentos foi utilizada como instrumento e
propaganda de guerra.
Depois de analisar alguns posicionamentos da arte do Século XX e o que era
trazido de referência sobre dignidade, fica mais fácil traçar as semelhanças e influências
6. da Arte e Direitos Humanos. O apreço pela liberdade do ser, a humanização de
situações da vida social e o caráter questionador das ações humanas são elementos
presentes em ambos processos culturais. O processo cultural, então, pressupõe uma
troca entre as relações culturais e as redes de relações, em um ciclo entendido como
reação cultural.
O contexto para a Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU foi
permeado pelos ideais defendidos em movimentos artísticos. O manifesto pacifista, o
declínio da valorização da guerra, a revolta com a crueldade e o medo de repetição
sintetizam as circunstâncias sociais que impulsionaram o clamor por um meio jurídico
que resguardasse a dignidade da pessoa humana em diversos aspectos da vida.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse artigo se propôs, como objetivo geral, elaborar a forma que a arte e os
direitos humanos se influenciaram no passado a fim de que se observasse o estado em
que os direitos humanos são discutidos a partir de produções artísticas de grande
alcance atualmente. Para além, foi proposta uma avaliação do acesso e participação a
vida cultural como forma de expandir as interações sociais e concretude da dignidade
humana.
O direito não se realiza em si, mas nas consequências factuais que decorrem
dos direitos humanos. Sendo assim, variados elementos da cultura, como a arte, podem
auxiliar no processo de formação e garantia de direitos.
Por esta razão foram avaliados os ideais de diversas áreas e movimentos do
campo artístico para compreender as contribuições que por eles foram oferecidas ao
contexto de aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU de
1948. A influência de movimentos das artes plásticas e também do ramo
cinematográfico reforçaram as vontades e anseios populares do pós guerra no meio
jurídico. Os manifestos pacifistas trazidos por pinturas e filmes sintetizam as
circunstâncias sociais que impulsionaram o clamor por uma resposta jurídica que
resguardasse a dignidade da pessoa humana em diversos aspectos da vida. Portanto,
ficou comprovada a arte no sentido de processo cultural com papel político de extrema
relevância, já que evidencia atentados a justiça.
Considerando o valor da arte para a observação dos direitos humanos na
realidade do século XX, passou a ser traçado então a evolução dos instrumentos que
asseguravam o próprio acesso a arte, como os direitos culturais e o direito ao
7. desenvolvimento humano. A vida cultural, prevista na DUDH, na Constituição
Federativa da República do Brasil e na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento
de 1986, porém enfrenta a complexidade dos direitos humanos de se efetivar. Por isto,
foi mapeada a situação de um importante elemento da vida cultural no Estado do Rio de
Janeiro: o cinema.
A triste realidade revelou que ainda se faz necessário garantir, facilitar e
ampliar o acesso a arte cinematográfica na cidade de Manaus, ainda mais quando os
temas abordados em filmes e séries refletem desigualdades sociais e a importância dos
direitos humanos de forma lúdica e didática para a população, como visto nos
exemplos: Parasita (2019), Avatar: A Lenda de Aang (2006) e Irmão do Jorel (2018).
A arte audiovisual em Manaus de certa forma consegue, portanto, assegurar as
condições para a prática de direitos humanos que foi definida por Herrera Flores, ao
desempenhar um forte papel de conscientização e abarcar uma visão de mundo repleto
por coletividades sociais. Incentivar e alargar o entendimento das pessoas quanto
direitos humanos através da arte é uma ferramenta essencial para a efetivação de uma
vida digna, democrática e justa seja garantida.
REFERÊNCIAS
DUARTE JÚNIOR, J. F. Por que Arte-educação? 16. ed. São Paulo: Papirus, 2005.
FUSARI, M. F. R.; FERRAZ, M. H. C. T. Arte na educação escolar. São Paulo:
Cortez, 2001.
GASPARIN, João Luiz. Comênio ou da arte de ensinar tudo a todos. Campinas:
Papirus, 1994.
LIBÂNEO, José Carlos. Organização e Gestão da Escola – Teoria e Prática. 3ª ed. –
Goiânia, GO: Alternativa, 2001.
MARTINS, M. C.; PICOSQUE, G. GUERRA, M.T.T. Didática do ensino da Arte.
São Paulo:Editora FTD, 1998.
NUSSBAUM, Martha C. Educação e justiça social. Mangualde: Edições Pedago,
2014.