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Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Medicina baseada em evidências
Avaliação do risco de viés de ensaios
clínicos randomizados pela ferramenta
da colaboração Cochrane
Alan Pedrosa Viegas de CarvalhoI
, Valter SilvaII
, Antonio José GrandeIII
Centro Cochrane do Brasil (CCB), em conjunto com o Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica
(PgMIT) da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da
Universidade Federal de São Paulo
INTRODUÇÃO
A validade de um estudo está diretamente relacionada a duas
dimensões, validade interna e externa. A primeira diz respeito
se o estudo responde a uma questão de pesquisa de forma apro-
priada, ou seja, livre de vieses. É determinada pela forma com
que o delineamento, a coleta de dados e as análises foram con-
duzidas e expostas a todos os vieses. A segunda está relacio-
nada com a pergunta de pesquisa, se essa foi gerada de forma
apropriada, está ligada à capacidade de generalizar e aplicar os
resultados dessa pesquisa em outros cenários.1
Ensaio clínico randomizado é um tipo de estudo experimen-
tal, no qual os participantes são colocados aleatoriamente no
grupo intervenção e grupo controle. Esse é considerado o pa-
drão de excelência ou padrão ouro entre todos os métodos de
investigação clínica utilizados, pois é capaz de produzir evidên-
cias científicas diretas e com menor probabilidade de erro para
esclarecer uma relação causa-efeito entre dois eventos.2
A amostra é selecionada a partir de uma condição clíni-
ca de interesse e, após a seleção dos participantes, esses são
divididos utilizando a randomização para dois grupos ou
mais. Os termos randomização, aleatorização e casualização
são sinônimos, cujo sentido é “ao acaso”, “a esmo”, “sortea-
do”, “casualizado”, “sem seleção ou critério de escolha”, “de-
pendente de fatores incertos e sujeitos ao acaso”. Nesse caso,
um grupo é chamado de experimental, pois é exposto a uma
intervenção que se acredita ser melhor que as intervenções
atuais. O outro grupo é chamado de controle ou de compa-
ração, pois nesse grupo não se aplica a intervenção do grupo
experimental, ou se aplica a intervenção usual. Os pacientes
são acompanhados por  determinado período de tempo em
ambos os grupos e assim se avaliam os desfechos relacionados
à doença ou problema. Portanto, as diferenças encontradas
nos desfechos podem ser atribuídas à intervenção recebida
com menor probabilidade de viés.3
Apesar de ensaio clínico randomizado ser o padrão ouro para
o desenvolvimento de pesquisa com seres humanos, esse tipo
de estudo é muito propenso a vieses, seja pela arbitrariedade
dos investigadores na seleção da amostra e aferição das variáveis
analisadas, seja na dificuldade no controle de outros fatores que
podem influenciar no desfecho clínico.2
Viés ou erro sistemáti-
co pode ser definido como qualquer tendenciosidade na coleta,
análise dos dados, interpretação, publicação ou revisão dos da-
dos, que induz a conclusões que sistematicamente tendem a se
distanciar da verdade.3
A saúde baseada em evidências é uma ciência e um movi-
mento que visa reduzir as incertezas para a tomada de decisão.4
Um profissional qualificado e atualizado não apenas necessita
de o domínio das ferramentas que estão disponíveis atualmente
para busca de evidências, mas precisa de um olhar crítico sobre
aquilo que é publicado, para que assim possa confiar ou não nas
informações com que está se deparando. Assim, um dos passos
essenciais para a prática da saúde baseada em evidências é a
avaliação da qualidade metodológica dos estudos. Para isso, é
necessário saber onde e como procurar os vieses presentes nos
estudos, o que pode ser feito, determinar se o viés realmente
está presente e qual é o seu tamanho, e finalmente decidir se os
vieses são importantes e, portanto, capazes de comprometer a
integridade dos resultados/conclusões apresentados.
OBJETIVOS
O objetivo desta revisão foi descrever o método utilizado
para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados
	I
Assistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo
(EPM-Unifesp). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).
	II
Assistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São
Paulo (EPM-Unifesp). Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Agrárias de Itapeva (FAIT).
	III
Assistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São
Paulo (EPM-Unifesp).
Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Alan Pedrosa Viegas de Carvalho | Valter Silva | Antonio José Grande
39
de acordo com os critérios da Colaboração Cochrane para de-
senvolvimento de revisões sistemáticas de intervenção.
MATERIAIS E MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo, em que foi utiliza-
do como fonte de informação o Manual Cochrane para
Desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção,
versão 5.1.0 (Cochrane Handbook),1
para podermos descrever
e detalhar as peculiaridades da atual ferramenta utilizada para
avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados em
revisões sistemáticas Cochrane. O manual encontra-se dispo-
nível no programa Review Manager (RevMan),5
criado para o
desenvolvimento e manutenção de Revisões Sistemáticas, que
está disponível para download gratuito para autores de revisão
sistemática (http://ims.cochrane.org/revman/download), e
pode ser acessado online gratuitamente pelo site (http://www.
cochrane-handbook.org/).1
RESULTADOS
A recomendação atual da Colaboração Cochrane para ava-
liação do risco de viés de ensaios clínicos é de uso de uma fer-
ramenta em que se utiliza avaliação baseada em domínios, ou
seja, uma avaliação crítica é feita de forma separada para dife-
rentes aspectos do risco de viés desse tipo de estudo. Essa foi
desenvolvida entre 2005 a 2007 por um grupo de metodologis-
tas, editores e autores de revisão sistemática (Tabela 1). É uma
ferramenta composta de duas partes, em que estão contidos sete
domínios, denominados: geração da sequência aleatória, ocul-
tação da alocação, cegamento de participantes e profissionais,
cegamento de avaliadores de desfecho, desfechos incompletos,
relato de desfecho seletivo e outras fontes de vieses (Tabela 1).
A primeira parte refere-se à descrição do que foi relatado
no estudo que está sendo avaliado, em detalhes suficientes
para que o julgamento seja feito com base nessas informações.
A segunda parte é o julgamento quanto ao risco de viés para
cada um dos domínios analisados, que podem ser classificados
em três categorias: baixo risco de viés, alto risco de viés ou risco
de viés incerto (Tabela 1).
Os domínios geração da sequência aleatória, ocultação de
alocação e relato de desfecho seletivo devem ser considerados
em um único julgamento para cada estudo. Já para os domí-
nios cegamento dos participantes e profissionais, cegamento
de avaliadores de desfechos e para desfechos incompletos,
dois ou mais julgamentos podem ser utilizados, pois os jul-
gamentos geralmente precisam ser feitos separadamente para
diferentes desfechos ou para o mesmo desfecho em diferentes
momentos (Tabela 1).
Uma alternativa para limitar o número de questões para os
domínios é agrupar os desfechos em subjetivos e objetivos para
avaliar o cegamento de avaliadores de desfecho. E, para desfe-
chos incompletos, subdividir em desfechos relatados em 6 me-
ses e desfechos relatados em 12 meses.
O suporte para o julgamento de cada domínio é um sumário
no qual o julgamento para o risco de viés poderá ser baseado
e trará transparência para o julgamento de todos os domínios
(Tabela 2). O suporte para o julgamento geralmente é obti-
do de um único artigo de um estudo publicado, mas poderá
ser obtido por uma mistura de artigos advindos de um único
Domínio
Suporte para o
julgamento
Julgamento do autor da revisão e critérios para julgamento
Viés de seleção
1. Geração
da sequência
aleatória
Descrever
em detalhe o
método utilizado
para gerar
a sequência
aleatória, para
permitir avaliar
se foi possível
produzir grupos
comparáveis.
Baixo risco de viés:
Tabela de números randômicos;
Geração de números randômicos por computador;
Arremesso de moeda;
Embaralhamento de cartões ou envelopes;
Jogando dados;
Sorteio;
Minimização.
Alto risco de viés:
Sequência gerada por data par ou ímpar de nascimento;
Sequência gerada por alguma regra com base na data (ou dia) de admissão;
Sequência gerada por alguma regra baseada no número do prontuário do hospital ou clínica;
Alocação pelo julgamento do profissional;
Alocação pela preferência do participante;
Alocação baseada em resultados de exames ou testes prévios;
Alocação pela disponibilidade da intervenção.
Risco de viés incerto:
Informação insuficiente sobre o processo de geração da sequência aleatória para permitir
julgamento.
Tabela 1. Ferramenta da Colaboração Cochrane para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados
Continua...
Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane
40
Viés de seleção
2. Ocultação de
alocação
Descrever em
detalhes o
método utilizado
para ocultar
a sequência
aleatória, para
determinarmos
se a alocação
das intervenções
pôde ser prevista
antes ou durante
o recrutamento
dos
participantes.
Baixo risco de viés:
Ocultação de alocação por uma central;
Recipientes de drogas numerados de forma sequencial com aparência idêntica;
Envelopes sequenciais numerados, opacos e selados.
Alto risco de viés:
Utilizando um processo aberto de randomização (exemplo: lista randômica de números);
Envelopes sem critérios de segurança (exemplo: envelopes não selados, ou que não sejam opacos ou
que não sejam numerados sequencialmente);
Alternância ou rotação;
Data de nascimento;
Número de prontuário;
Qualquer outro procedimento que não oculte a alocação.
Risco de viés incerto:
Informação insuficiente sobre o processo de geração da sequência aleatória para permitir
julgamento. Este é o caso se estiver descrito que a ocultação foi realizada utilizando envelopes, mas
não estiver claro se foram selados, opacos e numerados sequencialmente.
Viés de
performance
3. Cegamento
de participantes
e profissionais
Avaliação deve
ser feita para
cada desfecho
principal (ou
classes de
desfechos)
Descrever todas
as medidas
utilizadas
para cegar
participantes
e profissionais
envolvidos em
relação a qual
intervenção
foi dada ao
participante.
Fornecer
informações
se realmente o
cegamento foi
efetivo.
Baixo risco de viés:
Estudo não cego ou cegamento incompleto, mas os autores da revisão julgam que o desfecho não se
altera pela falta de cegamento;
Cegamento de participantes e profissionais assegurado, e é improvável que o cegamento tenha sido
quebrado.
Alto risco de viés:
Estudo não cego ou cegamento incompleto, e o desfecho é susceptível de ser influenciado pela falta
de cegamento;
Tentativa de cegamento dos participantes e profissionais, mas é provável que o cegamento tenha
sido quebrado, e o desfecho é influenciado pela falta de cegamento.
Risco de viés incerto:
Informação insuficiente para julgar como alto risco e baixo risco de viés;
O estudo não relata esta informação.
Viés de detecção
4. Cegamento
de avaliadores
de desfecho
Avaliação deve
ser feita para
cada desfecho
principal (ou
classes de
desfechos)
Descrever todas
as medidas
utilizadas
para cegar os
avaliadores
de desfecho
em relação ao
conhecimento
da intervenção
fornecida a cada
participante.
Fornecer
informações se
o cegamento
pretendido foi
efetivo.
Baixo risco de viés:
Não cegamento da avaliação dos desfechos, mas os autores da revisão julgam que o desfecho não
pode ser influenciado pela falta de cegamento;
Cegamento da avaliação dos desfechos foi realizado, e é improvável que o cegamento tenha sido
quebrado.
Alto risco de viés:
Não houve avaliação cega dos desfechos, e os desfechos avaliados são influenciáveis pela falta de
cegamento;
Os avaliadores de desfechos foram cegos, mas é provável que o cegamento tenha sido quebrado, e o
desfecho mensurado pode ter sido influenciado pela falta de cegamento.
Risco de viés incerto:
Informação insuficiente para julgar como alto risco e baixo risco de viés;
O estudo não relata esta informação.
Continua...
Tabela 1. Continuação
Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Alan Pedrosa Viegas de Carvalho | Valter Silva | Antonio José Grande
41
Viés de atrito
5. Desfechos
incompletos
Avaliação deve
ser feita para
cada desfecho
principal (ou
classes de
desfechos)
Descrever
se os dados
relacionados aos
desfechos estão
completos para
cada desfecho
principal,
incluindo perdas
e exclusão
da análise.
Descrever se
as perdas e
exclusões foram
informadas no
estudo, assim
como suas
respectivas
razões. Descreve
se houve
reinclusão
de algum
participante.
Baixo risco de viés:
Não houve perda de dados dos desfechos;
Razões para perdas de dados não estão relacionadas ao desfecho de interesse;
Perda de dados foi balanceada entre os grupos, com razões semelhantes para perda dos dados entre
os grupos;
Para dados dicotômicos, a proporção de dados perdidos comparados com o risco observado do
evento não é capaz de induzir viés clinicamente relevante na estimativa de efeito;
Para desfechos contínuos, estimativa de efeito plausível (diferença média ou diferença média
padronizada) nos desfechos perdidos não é capaz de induzir viés clinicamente relevante no tamanho
de efeito observado;
Dados perdidos foram imputados utilizando-se métodos apropriados.
Alto risco de viés:
Razões para perda de dados pode estar relacionada ao desfecho investigado, com desequilíbrio na
quantidade de pacientes ou razões para perdas entre os grupos de intervenção;
Para dados dicotômicos, a proporção de dados perdidos comparada com o risco observado do evento
é capaz de induzir viés clinicamente relevante na estimativa de efeito;
Para desfechos contínuos, estimativa de efeito plausível (diferença média ou diferença média
padronizada) nos desfechos perdidos, capaz de induzir viés clinicamente relevante no tamanho de
efeito observado.
“As-treated” análise, feita com desvio substancial da intervenção recebida em relação à que foi
randomizada;
Imputação simples dos dados feita de forma inapropriada.
Risco de viés incerto:
Relato insuficiente das perdas e exclusões para permitir julgamento (exemplo: número randomizado
não relatado, as razões para perdas não foram descritas).
Viés de relato
6. Relato de
desfecho
seletivo
Indicar a
possibilidade
de os ensaios
clínicos
randomizados
terem
selecionado os
desfechos ao
descrever os
resultados do
estudo e o que
foi identificado.
Baixo risco de viés:
O protocolo do estudo está disponível e todos os desfechos primários e secundários pré-especificados
que são de interesse da revisão foram reportados de acordo com o que foi proposto;
O protocolo do estudo não está disponível, mas está claro que o estudo publicado incluiu todos os
desfechos desejados.
Alto risco de viés:
Nem todos os desfechos primários pré-especificados foram reportados;
Um ou mais desfechos primários foram reportados utilizando mensuração, método de análise ou
subconjunto de dados que não foram pré-especificados;
Um ou mais desfechos primários reportados não foram pré-especificados (a não ser que uma
justificativa clara seja fornecida para o relato daquele desfecho, como o surgimento de um efeito
adverso inesperado);
Um ou mais desfechos de interesse da revisão foram reportados incompletos, e não podem entrar na
metanálise;
O estudo não incluiu resultados de desfechos importantes que seriam esperados neste tipo de estudo.
Risco de viés incerto:
Informação insuficiente para permitir julgamento. É provável que a maioria dos estudos caia nesta
categoria.
Outros vieses
7. Outras
fontes de viés
Declarar outro
viés que não se
enquadra em
outro domínio
prévio da
ferramenta.
Se em protocolos
de revisões forem
pré-especificadas
questões neste
domínio, cada
questão deve ser
respondida.
Baixo risco de viés:
O estudo parece estar livre de outras fontes de viés.
Alto risco de viés:
Alto risco relacionado ao delineamento específico do estudo; ou
Foi alegado como fraudulento;
Teve algum outro problema.
Risco de viés incerto:
Informação insuficiente para avaliar se um importante risco de viés existe; ou
Base lógica insuficiente de que um problema identificado possa introduzir viés.
Tabela 1. Continuação
Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane
42
Tabela 2. Exemplos de suporte para o julgamento para o domínio geração da sequência aleatória e ocultação de alocação
Domínio Suporte para o julgamento
Geração da sequência aleatória
Citação do estudo: “os pacientes foram alocados de forma randômica”
Comentário: provavelmente realizada de forma correta, pois estudos anteriores publicados pelo mesmo
investigador descrevem de forma clara a geração da sequência aleatória.
Geração da sequência aleatória
Citação do estudo: “os pacientes foram alocados de forma randômica”
Citação do e-mail: “randomização foi realizada de acordo com o dia de tratamento”
Comentário: não foi randomizado.
Ocultação de alocação
Citação do e-mail: “foi gerada por computador pelo nosso estatístico”
Comentário: não está claro se ocultação de alocação foi realizada de maneira apropriada. A resposta do
autor não foi clara.
Figura 1. Exemplo de gráfico de risco de viés de uma revisão sistemática.
Cegamento de avaliação de desfecho (mortalidade por todas as causas)
Geração da sequência aleatória
Ocultação de alocação
Cegamento de avaliação de desfecho (desfechos reportados pelo paciente)
Cegamento de avaliação de desfecho (mortalidade por todas as causas)
Desfechos incompletos (curto prazo [2-6 semanas])
Desfechos incompletos (longo prazo [> 6 semanas])
Relato de desfecho seletivo
Outras fontes de viés
0% 25% 50% 75% 100%
Baixo risco de viés Risco de viés incerto Alto risco de viés
estudo, protocolos, comentários sobre o estudo e contato direto
com o investigador. De forma adicional, um comentário sobre
o que foi obtido pode ser feito. Quando não houver nenhu-
ma informação relacionada a algum domínio, este fato deve
ser exposto.
Com a utilização do programa RevMan,5
pode-se criar figuras
para sumarizar o julgamento do risco de viés dos ensaios clínicos
incluídos em uma revisão sistemática (Figura 1). Para fazer um
julgamento geral do risco de viés de um único ensaio clínico para
um determinado desfecho (exemplo: dor) devemos selecionar os
principais domínios relacionados ao desfecho e julgar como alto
risco de viés, risco de viés incerto e baixo risco de viés.
Para determinar o risco de viés em um desfecho único com
relação a todos os estudos que analisaram aquele desfecho (no
caso de metanálise), julga-se baixo risco de viés (se a maior par-
te da informação for de estudos classificados como baixo risco
de viés), risco de viés incerto (se a maior parte da informação
for de estudos de baixo risco e incerto risco), alto risco de viés
(se a proporção de informação de alto risco é suficiente para
afetar a interpretação dos resultados).
DISCUSSÃO
Diante da grande quantidade de ferramentas disponíveis
para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomiza-
dos6
(como exemplo: Maastricht,7
Delphi8
Jadad9
), a ferramen-
ta desenvolvida pela Colaboração Cochrane para avaliação do
risco de viés de ensaios clínicos randomizados,10
é uma ferra-
menta singular que não se enquadra em critérios de um checklist
nem de uma escala, ou seja, não é possível obter uma pontua-
ção final, como geralmente acontece com outras ferramentas.9
Essa ferramenta é baseada em sete domínios, os quais ava-
liam diversos tipos de vieses que podem estar presentes nos
ensaios clínicos randomizados. O julgamento de cada domí-
nio em três categorias (alto risco de viés, baixo risco de viés
e risco de viés incerto) depende de um conhecimento prévio
do avaliador dos critérios estabelecidos para cada julgamento.
Além disso, de acordo com as peculiaridades de cada revi-
são sistemática Cochrane, essa ferramenta pode ser adaptada,
acrescentando domínios e/ou separando os domínios já prees-
tabelecidos de acordos com os desfechos explorados em cada
revisão sistemática.
Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Alan Pedrosa Viegas de Carvalho | Valter Silva | Antonio José Grande
43
Apesar de terem sido publicadas desde 1996, as normas
foram consolidadas para o relato de ensaio clínico randomi-
zado de dois grupos paralelos (Consort).11
Os ensaios clínicos
publicados ainda carecem de informações detalhadas sobre os
métodos utilizados e apresentam erros metodológicos que com-
prometem a sua validade interna.12
Se esses vieses não forem
tratados devidamente, podem repercutir negativamente desde a
tomada de decisão em saúde de forma errônea, até a incorpora-
ção de novos tratamentos e tecnologias em âmbito nacional que
poderão causar mais danos que benefício.
CONCLUSÕES
A recomendação da Colaboração Cochrane para avaliação
do risco de viés de ensaios clínicos randomizados é que seja
utilizada uma ferramenta baseada em sete domínios. Esses do-
mínios englobam a avaliação de viés de seleção, viés de perfor-
mance, viés de detecção, viés de atrito, viés de relato e outros
vieses. O julgamento é subjetivo, e cada desfecho deve ser jul-
gado separadamente. A transparência do método utilizado para
avaliação do risco de viés garante reprodutibilidade no processo
de julgamento dos autores de revisão sistemática Cochrane, o
que repercute diretamente na qualidade das revisões sistemáti-
cas Cochrane.
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interventions. Version 5.1.0 [updated March 2011]. The Cochrane
Collaboration; 2011. Disponível em: http://www.cochrane-handbook.org.
Acessado em 2012 (3 out).
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Koogan; 2008.
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Porto Alegre: Artmed; 2006.
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evidência. Diagn Tratamento. 2004;9(1):27·8.
5.	 Review Manager (RevMan) [Computer program]. Version 5.1. Copenhagen:
The Nordic Cochrane Centre, The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível
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systematic reviews developed by Delphi consensus. J Clin Epidemiol.
1998;51(12):1235-41.
9.	 Jadad AR, Moore RA, Carroll D, et al. Assessing the quality of reports of
randomized clinical trials: is blinding necessary? Control Clin Trials.
1996;17(1):1-12.
10.	Higgins JPT, Altman DG. Chapter 8: Assessing risk of bias in included
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Collaboration; 2011. Disponível em: http://hiv.cochrane.org/sites/hiv.
cochrane.org/files/uploads/Ch08_Bias.pdf. Acessado em 2012 (3 out).
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Elaboration: Updated guidelines for reporting parallel group randomised
trials. J Clin Epidemiol. 2010;63(8):e1-37.
12.	Pildal J, Chan AW, Hróbjartsson A, et al. Comparison of descriptions of
allocation concealment in trial protocols and the published reports: cohort
study. BMJ. 2005;330(7499):1049.
Agradecimentos: Pela concessão da bolsa, os autores Alan Pedrosa Viegas de
Carvalho, Valter Silva, Antonio José Grande, agradecem a Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
INFORMAÇÕES
Endereço para correspondência:
Valter Silva
Centro Cochrane do Brasil
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp)
Rua Borges Lagoa, 564 — conj. 63
Vila Clementino — São Paulo (SP)
CEP 04038-000
Tel. (11) 5575-2970
E-mail: v.silva@ymail.com
Fonte de fomento: nenhuma declarada
Conflito de interesse: nenhum declarado
Data de entrada: 3 de setembro de 2012
Data da última modificação: 21 de setembro de 2012
Data de aceitação: 31 de outubro de 2012
Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.
Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane
44
PALAVRAS-CHAVE:
Viés (epidemiologia).
Ensaio clínico controlado aleatório.
Revisão.
Avaliação da pesquisa em saúde.
Prática clínica baseada em evidências.
RESUMO
Contexto e objetivo: Ensaio clínico randomizado é considerado o padrão ouro para o desenvolvimento de pesquisa
com seres humanos. No entanto, este tipo de pesquisa é susceptível a diversos vieses, que podem comprometer os seus
resultados. O objetivo foi descrever o método utilizado para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados
de acordo com os critérios da Colaboração Cochrane para desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção.
Tipo de estudo e local: Estudo descritivo, realizado no Centro Cochrane do Brasil, em conjunto com o PgMIT da
Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da Unifesp.
Métodos: Foi utilizado como fonte de informação o capítulo 8 (Avaliação do risco de viés dos estudos incluídos) do
Manual Cochrane para Desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção versão 5.1.0 (Cochrane Handbook)
para descrever e detalhar as peculiaridades da atual ferramenta usada para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos
randomizados em revisões sistemáticas Cochrane.
Resultados: A ferramenta é composta por sete domínios que avaliam viés de seleção, viés de performance, viés de
detecção, viés de atrito, viés de relato e outros vieses, que podem comprometer a validade interna de um ensaio clínico.
A avaliação do risco de viés deve ser feita para cada desfecho separadamente ou para grupo de desfechos.
Conclusões: O julgamento do risco de viés recomendado pela Colaboração Cochrane é feito por meio de uma ferramenta
que traz transparência do método aplicado pelos autores, o que garante a reprodutibilidade dos seus resultados.

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Avaliação de Viés em RCTs

  • 1. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Medicina baseada em evidências Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane Alan Pedrosa Viegas de CarvalhoI , Valter SilvaII , Antonio José GrandeIII Centro Cochrane do Brasil (CCB), em conjunto com o Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo INTRODUÇÃO A validade de um estudo está diretamente relacionada a duas dimensões, validade interna e externa. A primeira diz respeito se o estudo responde a uma questão de pesquisa de forma apro- priada, ou seja, livre de vieses. É determinada pela forma com que o delineamento, a coleta de dados e as análises foram con- duzidas e expostas a todos os vieses. A segunda está relacio- nada com a pergunta de pesquisa, se essa foi gerada de forma apropriada, está ligada à capacidade de generalizar e aplicar os resultados dessa pesquisa em outros cenários.1 Ensaio clínico randomizado é um tipo de estudo experimen- tal, no qual os participantes são colocados aleatoriamente no grupo intervenção e grupo controle. Esse é considerado o pa- drão de excelência ou padrão ouro entre todos os métodos de investigação clínica utilizados, pois é capaz de produzir evidên- cias científicas diretas e com menor probabilidade de erro para esclarecer uma relação causa-efeito entre dois eventos.2 A amostra é selecionada a partir de uma condição clíni- ca de interesse e, após a seleção dos participantes, esses são divididos utilizando a randomização para dois grupos ou mais. Os termos randomização, aleatorização e casualização são sinônimos, cujo sentido é “ao acaso”, “a esmo”, “sortea- do”, “casualizado”, “sem seleção ou critério de escolha”, “de- pendente de fatores incertos e sujeitos ao acaso”. Nesse caso, um grupo é chamado de experimental, pois é exposto a uma intervenção que se acredita ser melhor que as intervenções atuais. O outro grupo é chamado de controle ou de compa- ração, pois nesse grupo não se aplica a intervenção do grupo experimental, ou se aplica a intervenção usual. Os pacientes são acompanhados por  determinado período de tempo em ambos os grupos e assim se avaliam os desfechos relacionados à doença ou problema. Portanto, as diferenças encontradas nos desfechos podem ser atribuídas à intervenção recebida com menor probabilidade de viés.3 Apesar de ensaio clínico randomizado ser o padrão ouro para o desenvolvimento de pesquisa com seres humanos, esse tipo de estudo é muito propenso a vieses, seja pela arbitrariedade dos investigadores na seleção da amostra e aferição das variáveis analisadas, seja na dificuldade no controle de outros fatores que podem influenciar no desfecho clínico.2 Viés ou erro sistemáti- co pode ser definido como qualquer tendenciosidade na coleta, análise dos dados, interpretação, publicação ou revisão dos da- dos, que induz a conclusões que sistematicamente tendem a se distanciar da verdade.3 A saúde baseada em evidências é uma ciência e um movi- mento que visa reduzir as incertezas para a tomada de decisão.4 Um profissional qualificado e atualizado não apenas necessita de o domínio das ferramentas que estão disponíveis atualmente para busca de evidências, mas precisa de um olhar crítico sobre aquilo que é publicado, para que assim possa confiar ou não nas informações com que está se deparando. Assim, um dos passos essenciais para a prática da saúde baseada em evidências é a avaliação da qualidade metodológica dos estudos. Para isso, é necessário saber onde e como procurar os vieses presentes nos estudos, o que pode ser feito, determinar se o viés realmente está presente e qual é o seu tamanho, e finalmente decidir se os vieses são importantes e, portanto, capazes de comprometer a integridade dos resultados/conclusões apresentados. OBJETIVOS O objetivo desta revisão foi descrever o método utilizado para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados I Assistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). II Assistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Agrárias de Itapeva (FAIT). III Assistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).
  • 2. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Alan Pedrosa Viegas de Carvalho | Valter Silva | Antonio José Grande 39 de acordo com os critérios da Colaboração Cochrane para de- senvolvimento de revisões sistemáticas de intervenção. MATERIAIS E MÉTODOS Trata-se de um estudo descritivo, em que foi utiliza- do como fonte de informação o Manual Cochrane para Desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção, versão 5.1.0 (Cochrane Handbook),1 para podermos descrever e detalhar as peculiaridades da atual ferramenta utilizada para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados em revisões sistemáticas Cochrane. O manual encontra-se dispo- nível no programa Review Manager (RevMan),5 criado para o desenvolvimento e manutenção de Revisões Sistemáticas, que está disponível para download gratuito para autores de revisão sistemática (http://ims.cochrane.org/revman/download), e pode ser acessado online gratuitamente pelo site (http://www. cochrane-handbook.org/).1 RESULTADOS A recomendação atual da Colaboração Cochrane para ava- liação do risco de viés de ensaios clínicos é de uso de uma fer- ramenta em que se utiliza avaliação baseada em domínios, ou seja, uma avaliação crítica é feita de forma separada para dife- rentes aspectos do risco de viés desse tipo de estudo. Essa foi desenvolvida entre 2005 a 2007 por um grupo de metodologis- tas, editores e autores de revisão sistemática (Tabela 1). É uma ferramenta composta de duas partes, em que estão contidos sete domínios, denominados: geração da sequência aleatória, ocul- tação da alocação, cegamento de participantes e profissionais, cegamento de avaliadores de desfecho, desfechos incompletos, relato de desfecho seletivo e outras fontes de vieses (Tabela 1). A primeira parte refere-se à descrição do que foi relatado no estudo que está sendo avaliado, em detalhes suficientes para que o julgamento seja feito com base nessas informações. A segunda parte é o julgamento quanto ao risco de viés para cada um dos domínios analisados, que podem ser classificados em três categorias: baixo risco de viés, alto risco de viés ou risco de viés incerto (Tabela 1). Os domínios geração da sequência aleatória, ocultação de alocação e relato de desfecho seletivo devem ser considerados em um único julgamento para cada estudo. Já para os domí- nios cegamento dos participantes e profissionais, cegamento de avaliadores de desfechos e para desfechos incompletos, dois ou mais julgamentos podem ser utilizados, pois os jul- gamentos geralmente precisam ser feitos separadamente para diferentes desfechos ou para o mesmo desfecho em diferentes momentos (Tabela 1). Uma alternativa para limitar o número de questões para os domínios é agrupar os desfechos em subjetivos e objetivos para avaliar o cegamento de avaliadores de desfecho. E, para desfe- chos incompletos, subdividir em desfechos relatados em 6 me- ses e desfechos relatados em 12 meses. O suporte para o julgamento de cada domínio é um sumário no qual o julgamento para o risco de viés poderá ser baseado e trará transparência para o julgamento de todos os domínios (Tabela 2). O suporte para o julgamento geralmente é obti- do de um único artigo de um estudo publicado, mas poderá ser obtido por uma mistura de artigos advindos de um único Domínio Suporte para o julgamento Julgamento do autor da revisão e critérios para julgamento Viés de seleção 1. Geração da sequência aleatória Descrever em detalhe o método utilizado para gerar a sequência aleatória, para permitir avaliar se foi possível produzir grupos comparáveis. Baixo risco de viés: Tabela de números randômicos; Geração de números randômicos por computador; Arremesso de moeda; Embaralhamento de cartões ou envelopes; Jogando dados; Sorteio; Minimização. Alto risco de viés: Sequência gerada por data par ou ímpar de nascimento; Sequência gerada por alguma regra com base na data (ou dia) de admissão; Sequência gerada por alguma regra baseada no número do prontuário do hospital ou clínica; Alocação pelo julgamento do profissional; Alocação pela preferência do participante; Alocação baseada em resultados de exames ou testes prévios; Alocação pela disponibilidade da intervenção. Risco de viés incerto: Informação insuficiente sobre o processo de geração da sequência aleatória para permitir julgamento. Tabela 1. Ferramenta da Colaboração Cochrane para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados Continua...
  • 3. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane 40 Viés de seleção 2. Ocultação de alocação Descrever em detalhes o método utilizado para ocultar a sequência aleatória, para determinarmos se a alocação das intervenções pôde ser prevista antes ou durante o recrutamento dos participantes. Baixo risco de viés: Ocultação de alocação por uma central; Recipientes de drogas numerados de forma sequencial com aparência idêntica; Envelopes sequenciais numerados, opacos e selados. Alto risco de viés: Utilizando um processo aberto de randomização (exemplo: lista randômica de números); Envelopes sem critérios de segurança (exemplo: envelopes não selados, ou que não sejam opacos ou que não sejam numerados sequencialmente); Alternância ou rotação; Data de nascimento; Número de prontuário; Qualquer outro procedimento que não oculte a alocação. Risco de viés incerto: Informação insuficiente sobre o processo de geração da sequência aleatória para permitir julgamento. Este é o caso se estiver descrito que a ocultação foi realizada utilizando envelopes, mas não estiver claro se foram selados, opacos e numerados sequencialmente. Viés de performance 3. Cegamento de participantes e profissionais Avaliação deve ser feita para cada desfecho principal (ou classes de desfechos) Descrever todas as medidas utilizadas para cegar participantes e profissionais envolvidos em relação a qual intervenção foi dada ao participante. Fornecer informações se realmente o cegamento foi efetivo. Baixo risco de viés: Estudo não cego ou cegamento incompleto, mas os autores da revisão julgam que o desfecho não se altera pela falta de cegamento; Cegamento de participantes e profissionais assegurado, e é improvável que o cegamento tenha sido quebrado. Alto risco de viés: Estudo não cego ou cegamento incompleto, e o desfecho é susceptível de ser influenciado pela falta de cegamento; Tentativa de cegamento dos participantes e profissionais, mas é provável que o cegamento tenha sido quebrado, e o desfecho é influenciado pela falta de cegamento. Risco de viés incerto: Informação insuficiente para julgar como alto risco e baixo risco de viés; O estudo não relata esta informação. Viés de detecção 4. Cegamento de avaliadores de desfecho Avaliação deve ser feita para cada desfecho principal (ou classes de desfechos) Descrever todas as medidas utilizadas para cegar os avaliadores de desfecho em relação ao conhecimento da intervenção fornecida a cada participante. Fornecer informações se o cegamento pretendido foi efetivo. Baixo risco de viés: Não cegamento da avaliação dos desfechos, mas os autores da revisão julgam que o desfecho não pode ser influenciado pela falta de cegamento; Cegamento da avaliação dos desfechos foi realizado, e é improvável que o cegamento tenha sido quebrado. Alto risco de viés: Não houve avaliação cega dos desfechos, e os desfechos avaliados são influenciáveis pela falta de cegamento; Os avaliadores de desfechos foram cegos, mas é provável que o cegamento tenha sido quebrado, e o desfecho mensurado pode ter sido influenciado pela falta de cegamento. Risco de viés incerto: Informação insuficiente para julgar como alto risco e baixo risco de viés; O estudo não relata esta informação. Continua... Tabela 1. Continuação
  • 4. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Alan Pedrosa Viegas de Carvalho | Valter Silva | Antonio José Grande 41 Viés de atrito 5. Desfechos incompletos Avaliação deve ser feita para cada desfecho principal (ou classes de desfechos) Descrever se os dados relacionados aos desfechos estão completos para cada desfecho principal, incluindo perdas e exclusão da análise. Descrever se as perdas e exclusões foram informadas no estudo, assim como suas respectivas razões. Descreve se houve reinclusão de algum participante. Baixo risco de viés: Não houve perda de dados dos desfechos; Razões para perdas de dados não estão relacionadas ao desfecho de interesse; Perda de dados foi balanceada entre os grupos, com razões semelhantes para perda dos dados entre os grupos; Para dados dicotômicos, a proporção de dados perdidos comparados com o risco observado do evento não é capaz de induzir viés clinicamente relevante na estimativa de efeito; Para desfechos contínuos, estimativa de efeito plausível (diferença média ou diferença média padronizada) nos desfechos perdidos não é capaz de induzir viés clinicamente relevante no tamanho de efeito observado; Dados perdidos foram imputados utilizando-se métodos apropriados. Alto risco de viés: Razões para perda de dados pode estar relacionada ao desfecho investigado, com desequilíbrio na quantidade de pacientes ou razões para perdas entre os grupos de intervenção; Para dados dicotômicos, a proporção de dados perdidos comparada com o risco observado do evento é capaz de induzir viés clinicamente relevante na estimativa de efeito; Para desfechos contínuos, estimativa de efeito plausível (diferença média ou diferença média padronizada) nos desfechos perdidos, capaz de induzir viés clinicamente relevante no tamanho de efeito observado. “As-treated” análise, feita com desvio substancial da intervenção recebida em relação à que foi randomizada; Imputação simples dos dados feita de forma inapropriada. Risco de viés incerto: Relato insuficiente das perdas e exclusões para permitir julgamento (exemplo: número randomizado não relatado, as razões para perdas não foram descritas). Viés de relato 6. Relato de desfecho seletivo Indicar a possibilidade de os ensaios clínicos randomizados terem selecionado os desfechos ao descrever os resultados do estudo e o que foi identificado. Baixo risco de viés: O protocolo do estudo está disponível e todos os desfechos primários e secundários pré-especificados que são de interesse da revisão foram reportados de acordo com o que foi proposto; O protocolo do estudo não está disponível, mas está claro que o estudo publicado incluiu todos os desfechos desejados. Alto risco de viés: Nem todos os desfechos primários pré-especificados foram reportados; Um ou mais desfechos primários foram reportados utilizando mensuração, método de análise ou subconjunto de dados que não foram pré-especificados; Um ou mais desfechos primários reportados não foram pré-especificados (a não ser que uma justificativa clara seja fornecida para o relato daquele desfecho, como o surgimento de um efeito adverso inesperado); Um ou mais desfechos de interesse da revisão foram reportados incompletos, e não podem entrar na metanálise; O estudo não incluiu resultados de desfechos importantes que seriam esperados neste tipo de estudo. Risco de viés incerto: Informação insuficiente para permitir julgamento. É provável que a maioria dos estudos caia nesta categoria. Outros vieses 7. Outras fontes de viés Declarar outro viés que não se enquadra em outro domínio prévio da ferramenta. Se em protocolos de revisões forem pré-especificadas questões neste domínio, cada questão deve ser respondida. Baixo risco de viés: O estudo parece estar livre de outras fontes de viés. Alto risco de viés: Alto risco relacionado ao delineamento específico do estudo; ou Foi alegado como fraudulento; Teve algum outro problema. Risco de viés incerto: Informação insuficiente para avaliar se um importante risco de viés existe; ou Base lógica insuficiente de que um problema identificado possa introduzir viés. Tabela 1. Continuação
  • 5. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane 42 Tabela 2. Exemplos de suporte para o julgamento para o domínio geração da sequência aleatória e ocultação de alocação Domínio Suporte para o julgamento Geração da sequência aleatória Citação do estudo: “os pacientes foram alocados de forma randômica” Comentário: provavelmente realizada de forma correta, pois estudos anteriores publicados pelo mesmo investigador descrevem de forma clara a geração da sequência aleatória. Geração da sequência aleatória Citação do estudo: “os pacientes foram alocados de forma randômica” Citação do e-mail: “randomização foi realizada de acordo com o dia de tratamento” Comentário: não foi randomizado. Ocultação de alocação Citação do e-mail: “foi gerada por computador pelo nosso estatístico” Comentário: não está claro se ocultação de alocação foi realizada de maneira apropriada. A resposta do autor não foi clara. Figura 1. Exemplo de gráfico de risco de viés de uma revisão sistemática. Cegamento de avaliação de desfecho (mortalidade por todas as causas) Geração da sequência aleatória Ocultação de alocação Cegamento de avaliação de desfecho (desfechos reportados pelo paciente) Cegamento de avaliação de desfecho (mortalidade por todas as causas) Desfechos incompletos (curto prazo [2-6 semanas]) Desfechos incompletos (longo prazo [> 6 semanas]) Relato de desfecho seletivo Outras fontes de viés 0% 25% 50% 75% 100% Baixo risco de viés Risco de viés incerto Alto risco de viés estudo, protocolos, comentários sobre o estudo e contato direto com o investigador. De forma adicional, um comentário sobre o que foi obtido pode ser feito. Quando não houver nenhu- ma informação relacionada a algum domínio, este fato deve ser exposto. Com a utilização do programa RevMan,5 pode-se criar figuras para sumarizar o julgamento do risco de viés dos ensaios clínicos incluídos em uma revisão sistemática (Figura 1). Para fazer um julgamento geral do risco de viés de um único ensaio clínico para um determinado desfecho (exemplo: dor) devemos selecionar os principais domínios relacionados ao desfecho e julgar como alto risco de viés, risco de viés incerto e baixo risco de viés. Para determinar o risco de viés em um desfecho único com relação a todos os estudos que analisaram aquele desfecho (no caso de metanálise), julga-se baixo risco de viés (se a maior par- te da informação for de estudos classificados como baixo risco de viés), risco de viés incerto (se a maior parte da informação for de estudos de baixo risco e incerto risco), alto risco de viés (se a proporção de informação de alto risco é suficiente para afetar a interpretação dos resultados). DISCUSSÃO Diante da grande quantidade de ferramentas disponíveis para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomiza- dos6 (como exemplo: Maastricht,7 Delphi8 Jadad9 ), a ferramen- ta desenvolvida pela Colaboração Cochrane para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados,10 é uma ferra- menta singular que não se enquadra em critérios de um checklist nem de uma escala, ou seja, não é possível obter uma pontua- ção final, como geralmente acontece com outras ferramentas.9 Essa ferramenta é baseada em sete domínios, os quais ava- liam diversos tipos de vieses que podem estar presentes nos ensaios clínicos randomizados. O julgamento de cada domí- nio em três categorias (alto risco de viés, baixo risco de viés e risco de viés incerto) depende de um conhecimento prévio do avaliador dos critérios estabelecidos para cada julgamento. Além disso, de acordo com as peculiaridades de cada revi- são sistemática Cochrane, essa ferramenta pode ser adaptada, acrescentando domínios e/ou separando os domínios já prees- tabelecidos de acordos com os desfechos explorados em cada revisão sistemática.
  • 6. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Alan Pedrosa Viegas de Carvalho | Valter Silva | Antonio José Grande 43 Apesar de terem sido publicadas desde 1996, as normas foram consolidadas para o relato de ensaio clínico randomi- zado de dois grupos paralelos (Consort).11 Os ensaios clínicos publicados ainda carecem de informações detalhadas sobre os métodos utilizados e apresentam erros metodológicos que com- prometem a sua validade interna.12 Se esses vieses não forem tratados devidamente, podem repercutir negativamente desde a tomada de decisão em saúde de forma errônea, até a incorpora- ção de novos tratamentos e tecnologias em âmbito nacional que poderão causar mais danos que benefício. CONCLUSÕES A recomendação da Colaboração Cochrane para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados é que seja utilizada uma ferramenta baseada em sete domínios. Esses do- mínios englobam a avaliação de viés de seleção, viés de perfor- mance, viés de detecção, viés de atrito, viés de relato e outros vieses. O julgamento é subjetivo, e cada desfecho deve ser jul- gado separadamente. A transparência do método utilizado para avaliação do risco de viés garante reprodutibilidade no processo de julgamento dos autores de revisão sistemática Cochrane, o que repercute diretamente na qualidade das revisões sistemáti- cas Cochrane. REFERÊNCIAS 1. Higgins JPT, Green S. Cochrane handbook for systematic reviews of interventions. Version 5.1.0 [updated March 2011]. The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível em: http://www.cochrane-handbook.org. Acessado em 2012 (3 out). 2. Pereira MG. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. 3. Fletcher RH, Fletcher SW. Epidemiologia Clínica: elementos essenciais. 4a ed. Porto Alegre: Artmed; 2006. 4. Atallah NA. Medicina Baseada em Evidências: A incerteza, a ciência e a evidência. Diagn Tratamento. 2004;9(1):27·8. 5. Review Manager (RevMan) [Computer program]. Version 5.1. Copenhagen: The Nordic Cochrane Centre, The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível em: http://ims.cochrane.org/revman/download. Acessado em 2012 (04 set). 6. Olivo SA, Macedo LG, Gadotti IC, et al. Scales to assess the quality of randomized controlled trials: a systematic review. Phys Ther. 2008;88(2):156-75. 7. de Vet HCW, de Bie RA, van der Heijden GJMG, et al. Systematic reviews on the basis of methodological criteria. Physiotherapy. 1997;83(6):284- 9. Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/ S0031940605661755. Acessado em 2012 (3 out). 8. Verhagen AP, de Vet HC, de Bie RA, et al. The Delphi list: a criteria list for quality assessment of randomized clinical trials for conducting systematic reviews developed by Delphi consensus. J Clin Epidemiol. 1998;51(12):1235-41. 9. Jadad AR, Moore RA, Carroll D, et al. Assessing the quality of reports of randomized clinical trials: is blinding necessary? Control Clin Trials. 1996;17(1):1-12. 10. Higgins JPT, Altman DG. Chapter 8: Assessing risk of bias in included studies. In: Higgins JPT, Green S, editors. Cochrane handbook for systematic reviews of interventions. Version 5.1.0 [updated March 2011]. The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível em: http://hiv.cochrane.org/sites/hiv. cochrane.org/files/uploads/Ch08_Bias.pdf. Acessado em 2012 (3 out). 11. Moher D, Hopewell S, Schulz KF, et al. CONSORT 2010 Explanation and Elaboration: Updated guidelines for reporting parallel group randomised trials. J Clin Epidemiol. 2010;63(8):e1-37. 12. Pildal J, Chan AW, Hróbjartsson A, et al. Comparison of descriptions of allocation concealment in trial protocols and the published reports: cohort study. BMJ. 2005;330(7499):1049. Agradecimentos: Pela concessão da bolsa, os autores Alan Pedrosa Viegas de Carvalho, Valter Silva, Antonio José Grande, agradecem a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) INFORMAÇÕES Endereço para correspondência: Valter Silva Centro Cochrane do Brasil Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Rua Borges Lagoa, 564 — conj. 63 Vila Clementino — São Paulo (SP) CEP 04038-000 Tel. (11) 5575-2970 E-mail: v.silva@ymail.com Fonte de fomento: nenhuma declarada Conflito de interesse: nenhum declarado Data de entrada: 3 de setembro de 2012 Data da última modificação: 21 de setembro de 2012 Data de aceitação: 31 de outubro de 2012
  • 7. Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44. Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane 44 PALAVRAS-CHAVE: Viés (epidemiologia). Ensaio clínico controlado aleatório. Revisão. Avaliação da pesquisa em saúde. Prática clínica baseada em evidências. RESUMO Contexto e objetivo: Ensaio clínico randomizado é considerado o padrão ouro para o desenvolvimento de pesquisa com seres humanos. No entanto, este tipo de pesquisa é susceptível a diversos vieses, que podem comprometer os seus resultados. O objetivo foi descrever o método utilizado para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados de acordo com os critérios da Colaboração Cochrane para desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção. Tipo de estudo e local: Estudo descritivo, realizado no Centro Cochrane do Brasil, em conjunto com o PgMIT da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da Unifesp. Métodos: Foi utilizado como fonte de informação o capítulo 8 (Avaliação do risco de viés dos estudos incluídos) do Manual Cochrane para Desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção versão 5.1.0 (Cochrane Handbook) para descrever e detalhar as peculiaridades da atual ferramenta usada para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados em revisões sistemáticas Cochrane. Resultados: A ferramenta é composta por sete domínios que avaliam viés de seleção, viés de performance, viés de detecção, viés de atrito, viés de relato e outros vieses, que podem comprometer a validade interna de um ensaio clínico. A avaliação do risco de viés deve ser feita para cada desfecho separadamente ou para grupo de desfechos. Conclusões: O julgamento do risco de viés recomendado pela Colaboração Cochrane é feito por meio de uma ferramenta que traz transparência do método aplicado pelos autores, o que garante a reprodutibilidade dos seus resultados.