2. -.mfRo COMUM
pela Oxlord UnI
"l1'li11 Importante documen
Q1Inem deade o Relatório
....ndf'. Nosso fulllro comum.
~I 15do da Comleaio Mundial sobre
liiio Ambiente e Desenvolvimento,
...... um dOS temas mais preme""
... do memento 8 relaçilo entre o
'11 nvolvlmen1o e o melo ambiente.
M ~lfaiill.90ea coIlgldaa pela Co
1IIIIeIo, 10 longo da l!ê8 8noa da
PIICIU'" e análl_, apólaJn..ae em
"poIrnet1lo8 de centenas de eepe
....IIIM de quase todoa oa pelles,
lDImsnCIo um cenádo mundial do de
l8llVOIv'.n1entO a seu Impacto nos re
__ pllnetérI08.
..... das Idéias centreis da
"'/10"'111m comum alltma e com
PIO'I1t que um desenvOlvimento eco
lânIoo ... toma Impenoss a con-
1IMI;1o dOII meIoS nalllrals. Sem
lMdIdu que aesegurem a conquista
.... obJetIvo, a humanidade pom
l1li rI4Ico 8 própria aobnIvlYêncla.
A otn p6e em evldêncls meti
dilnl, lIdma de qualaquer dúvidas,
.... ,.11dsde: um progresso econô
mIcO a aoclal cada vez maior nAo po
dirá bII_se na axploraçilo Indis
criminada a devastadora ds natureu.
Ao conlnlllo: trem o uao sablamente
dirigido doa recuraoe naturais. nio
hawr6 desenvOlvlmamo sustentável.
A fim da ssllanlar as propor
90M e a marcha das causas que es
110 concomlndo pera tomar a Terra
lnabltaval, Nosso fulllro comum
...-ntaadvartánclss como as se
e cada ano, 6 milhões da
de tarraa produtivas se
em de8ertos Inúteis. Em
IMO corresponde 8 urns
....... sornsdes da Ale
Espanha, Inglatarra,
Noruega - 2.170.000
.....
111"".. 110 deatruldoa
'~~T~'
NOSSO
-FUTURO
COMUM
001-431H110.6
Assinado de forma digital por
Márcio Estevam
DN: cn=Márcio Estevam, o, ou,
email=marcio.estevam@yahoo.co
m, c=<n
Dados: 2009.03.01 15:00:17 -03'00'
3. COMISSÃO
Presidente: Gro Horlem Brundlland (Noruega)
Vice-presidente: Ma.-.r Kllalid (Sudão)
Susanna Agnelli (Itália)
Salell A. AI·Athel (Arábia Saudita)
Bernard CII"".ro (Zimbábue)
Lamlne Mohammed Fadlka (Costa do Matflm)
Volker Hauft (Rep6blica Federal d. Alemanha)
Ist_an Lang (Hungria)
Ma Shljun (Repablica Popular da China)
Margarita Marino de Batera (Colômbia)
Nagendra 81ngh (índia)
Paulo Nogueira Neto (Brasil)
Saburo Okita (Japão)
SlIridath S. ltamphal (Guiana)
Wllliam D. ltuekelshaus (EUA)
Mobamed Sabnoun (Argélia)
Emil Salim (Indonésia)
Bukar Shaib (Nigéria)
Vladimir Sokolov (URSS)
Ja_ Stanovnlk (Iugoslávia)
Mauri"" Strong (Canadá)
EX-OFFICIO
Jlm Ma.Neill (Canadá)
-
COMISSAO MUNDIAL
SOBRE MEIO AMBIENTE
E DESENVOLVIMENTO
NOSSO
FUTURO
COMUM
2'edíção
Chamndà~
' )
I .): ....
~
~ J!fl/)
~I b li:= I ""----"'".
~
Editora da Fundação Getulio Vargas
Rio de Janeiro, RJ 1991
4. Titulo da obra em lngJês:
Our cOIlU7IOnfuture
Oxford I New York, Oxlbrd Ulllversily Press, 1987
Direitos rese....ados desta ediçAo ~ Fimdação Getulio Vatgas
Praia de Bolafogo, 190 - 22253
Rio de Jalleiro, RJ - Brasil
11vedada. reprodução tutal ou parcial desta obra
Copyrighl C Comisslo Mundial sobre Meio Ambiente e
DeseJlV01vimento
l' edição -1988
2' ediçAo-I991
Editora da Fundaçio Getulio Vargas
Cbef..: Francisco de Castro Azevedo
Coordenaçlío editorial: DamilIo Nascimento
Supervisão de editoração: En:llía Lopes de Souza
Supervisão gráfica: Hélio Lourenço Netto
Capa: Marcos Tupper
Nosso[uturo comum IComisslio M••diol_ Mo., ABlbiea,••
De&alvotvimeolO. - 2. ed.. - Rio ... J8IlClro! Edilora da Fudaçio Getulio Varps,
1991.
xvüi, 430p.
Tradução do:: Qllr commOa. mtlH'e.
lael.i 1>ibllogra!iA.
1. M.., Ambi..... 2. P.llIica ...bi....I. 3. Proteção ...bi....I.
4. Deacnvolvim..", ecoallmleo.l.Comias!<> M...,iaI..ln Meõo ABlbi.....
D_...lvim_.n. Fuad:açáo GcIlIl., V"'1l'"
illD-3013
SUMÁllIo
Siglas e nota sobre a terminologia
Ptefácio da presidente
Da Terra ao mundo: vi.slIo panorâmica da
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento 1
Pàrtel: PRElQCUPAÇÓES COMUNS 27
I Um futuro.ameaç.odo 29
2Em busca do desenvolvimento sustentável 46
3 O papel da economia internacional 72
Parte D: DESAFIOS COMUNS 101
4 População e recursos hllDllUlos 103
5 Segnmnça alimentar: mantendo o potencial 129
6 Espécies e ecossisletnllll: recursos para o desenvolvimen
to 162
7 Energia: opç6es para o meio ambiente e o desenvolvimen
to 186
8 Indt1stria: com menos, produzir mais 230
9 O desafio w:bano 262
Parte lli: ESFORÇOS COMUNS 291
•lI) A adminIs1nlÇ1io das áreas comuns 293
gpaz, segnmnça, desenvolvimento e o meio ambiente 325
12 Pels ação comum: propostas de mudança institucional
e legal 345
Anexo 1 Sdmula dos princípios legais propostos para a proteção
ambiental e o desenvolvimento sustentável 388
Anexo 2 A Comissão e seu trabalho 493
Neste relatório foram incluídas citaçõeS de algumas das muitas
pessou que prestaram depoimento nas audiências públicas da
CMMAD, a fim de ilustrar a ampla garnà de opiniões com que a
ComissIio travou contato em seus três anos de atividades. Elas
nlio refletem necessariamente o ponto de vista da Comissão.
V
5. USTA DE TABELAS
1.1 Tamanho da população e PNB per capita por grupos
de países 32
1.2 Distribuição do COIlllUlOO mtmdial, médias para 1980-82 36
1.3 Taxa anual de crescimento do PIB em países em
desenvolvimento, 1976-85 39
3.1 Transf~ líquida de recumos para países em
desenvolvimento imponadores de capital 74
3.2 A importância crescente do comércio exterior 86
4.1 População mundial 1950-85: fatos-chave 109
4.2 Tamanho da população - atual e projetado - e taxas
de aumento 110
4.3 Indicadores de saúde 112
4.4 Taxas de matrículas dos sexos masculino e feminino,
por Região. 1960 e 1982 113
5.1 Duas décadas de desenvolvimento agrícola 130
7.1 Consumo global de energia primária per capita. 1984 188
8.1 Participação do valor adicionado manufatoreiro
no PlB. por grupo de economias e grupo de renda 231
8.2 Composição do comércio de mercadorias dos países
em desenvolvimento 233
9.1 População residente em áreas urbanas, 1950-2000 263
9.2 Exemplos de rápido aumento popolacional em
cidade. do Terceiro Mundo 264
10.1 Pesca mondial nas principais zonas pesqueiras,
1979-84 300
LISTA DE BOXES
2.1 Crescimento, redistribuição e pobreza 54-55
3.1 Algodão produzido para exportação no Sabel 73
3.2 Açúcar e desenvolvimento sustentável 90
3.3 O papel das empresas transnacionais 93
4.1 O equiUbrio entre alimento e população 106-107
5.1 Perpectivas regionais de desenvolvimento
agríeola 132-/33
5.2 Sistemas naturais de nutrientes e controle de
prdgas 150
6.1 Alguns exemplos de extinção de espécies 164
7. 1 Uuidades de energia 187
7.2 Dois cenários energéticos 190-191
7.3 Quanto custam os danos e o controle da poluição
do ar 201
9.1 Como dominar as cidades 265
9.2 Problemas ambientais nas cidades do Terceiro
Mundo 268
9.3 Três maneiras de usar US$20 milhões para melhorar
as condições de uma cidade de 1 milhão de
habitantes 282
9.4 A falta de compreensão das necessidades das mulheres
nos projetos habitacionais 287
10.1 Os acordos sem precedentes do Tratado Antártico 315
11.1 Gastos militares versus segurança ambiental 339
VU
VI
6. SIGLAS
AlD Associação Internacional de Desenvolvimento
AlEA Ag&cia Intemacional de Energia Atómica
AOO assistência oficiaI ao desenvolvimento
CAEM Conselho de Assistência Econômica Mlltua
CCPA Comitê Cientffi<:o de Pesquisa Antártica
CCRMVA Comissão para a Conservação dos Recursos Marinhos
Vivos da Antártida
CE Comunidade Econ&nica Européia
CEE Comissão Econômica Européia
ClIDMA Comitê das Instituições Intemacionnis de Desenvol
vimento para o Meio Ambiente
CIPB ComissIiD Internacional sobre a Pesca da Baleia
CIPR Comissão Internacional de Proteção Radiológica
CIUC Conselho Internacional de Uniões Científicas
CLA Centto de Ugação Ambiental
CNUAH Centto das Nações Unidas para Assentamentos Hu
manos (Habitat)
OAESI Departamento das Nações Unidas de Assuntos Eco
nômicos e Sociais Internacionnis
EM empresas muItinacionais
ENC Estratégia Nacional de Conservação
FAO Organização das Nações Unidas para a Alimentação e
aAgricul~
FMI Fundo Monetário Internacional
FMVS Fundo Mundial para a Vida Selvagem
GA'IT Acordo GeraI sobre Tarifas e Comércio
GEACPM Grupo de Especialistas em Aspectos CientífICOS da
Poluição Marinha
lIMA0 Institoto Intemaciónal para o Meio Ambiente e o De
senvolvimento
IRM Instituto de ReCursos Mundiais
ICMA Junta das Nações Unidas para a Coordenação do
Meio Ambiente
OCOE Organização para a CooperaçliD e o Desenvolvimento
Econômico
OIT Organização Internacional do Trabalho
OMM Organização Meteorol6gica Mundial
OMS Organização Mundial da Saúde
ONG organizações nIIo-goVemamentais
ONUDI O!::ganização das Nações Unidas para o Desenvolvi·
mento Industrial
Pffi produto interno bruto
PIGB Projeto Internacional para a Geoslera e a Biosfera (do
CIUC)
PNB produto nacional bruto
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PPP Princípio de Pagamento do Poluidor
PRI países recém-industriaJizados
PSN Padrões de Segurança Nuclear
SGMMA Sislema Global de Monitoração do Meio Ambiente
STA Sistema do Tratado Antártico
UICN Upião Internacional para a ConservaçliD da Natureza
e dos Recursos Naturais
UJT União Internacional de Telecomunicações
UNCTAD Conferência da Nações Unidas sobre Comércio e De
senvolvimento
UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultora
VAM valor adicionado manufatureiro
ZEE Zona Econômica Exclusiva
VIII IX
7. NOTA SOBRE A TERMINOLOGIA
o agrupamento de países na apresentação dos dados está indicado
nos lugares apropriados, As expressões "países industrializados"
e "países desenvolvidos11 em geral compreendem as categorias
adotadas pela ONU de eeonomias de mercado desenvolvidas e
países socialistas do Leste europeu e a URSS, Salvo indicação em
contrário~ a expressão ··pais em desenvolvimento" refere~se ao
grupo de países em desenvolvimento com economias de mercado
c aos países socialistas da Ásia. tal como classüicado pela ONU.
A menos que o contexto indique o contrário. a expressão ''Tercei
ro MundoH refere-se aos países em desenvolvimento com econo~
mias de mercado. tal como definido pela ONU.
Salvo indicação em contrário. toneladas são toneladas métricas
(l.oookg ou 2,204.6 libras-peso), Dólares são d6lares none-ame
ricanos correntes ou para o ano especificado.
PREFÁCIO DA PRESIDENTE
"Uma agenda global para mudança" - foi o que se pediu à Co
missão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvímento que
preparasse. Tratava-se de um apelo urgente da Assembléia Geral
das Nações Unidas para:
• propor estratégias ambientais de longo prazo para obter um de
senvolvímento sustentável por volta do ano 2000 e da( em diante;
• recomendar maneiras para que a preocupação com o meio am
biente se traduza em maior cooperação entre os países em desen
volvimento e entre pa(ses em estágios diferentes de desenvolvi
mento econômico e social e leve à consecução de objetivos co
muns e interligados que considerem as inter-relações de pessoas,
recursos. meio ambiente e desenvolvimento;
• considerar meios e maneiras pejos quais a comunidade intema~
cional possa lidar mais eficientemente com as preocupações de
cunho ambiental;
• ajudar a definir noções comuns relativas a questões ambientais
de longo prazo e os esforços necessários para tratar com êxito os
problemas da proteção e da melhoria do meio ambiente, uma
agenda de longo prazo a ser posta em prática nos próximos decê
nios, e os objetivos a que aspira a comunidade mundial.
Em dezembro de 1983, quando o secretário-geral das Nações
Unidas me encarregou de criar e presidir urna comissão especial e
independente para tratar deste grande desafio que se impõe à co
munidade muodial. eu tinha plena consciência das dimensões da
tarefa e de que minhas responsabilidades cotidianas de líder de
panido a tomavam quase impossível. Além disso. o que a Assem
bléia Geral solicitava parecia írrealista e ambicioso demais. embo·
ra fosse também uma evidente demonstração do sentimento gene
ralizado na comunidade internacional de frustração e inadequação
no tocante à nossa capacidade de enfrentar as questões vitais do
mundo e lidar bem com elas.
Bste fato é uma realidade incontestável e difícil de negar. Co
mo não se dispõe de respostas para questões fundamentals e sé
rias, a única alternativa é continuar tentando enconlrá-Ias.
Eu ponderava sobre isto tudo quando o secretário-geral apre
sentou-me um argumento irrefutável: nenhum outro líder político
se tomara primeiro-ministro com uma experiência de vários anos,
no plano nacional e internacional. como ministro do Meio Am
x XI
8. blen.... Isto me deu esperanças de que o meio ambiente não estava
fadado a pennanecer uma questão secundária no processo polftico
central de tomada de decisões.
Em Illtima análise, resolvi aceitar o desafio. O desafio de enca
rar o fulUro e de proteger os interesses das gerações vindouras.
Pois uma coisa era perfeitamente clara: precisávamos de um man
dato para a mudança.
Vivemos uma era da história das nações em que é mais neces
sária do que nunca a coordenação entre ação política e responsa
bilidade. A tarefa e o encargo com que se defrontam as NaÇões
Unidas e seu secretário-geral são enormes. Satisfazer com respon
sabilidade os objetivos e as aspirações da humanidade requer o
apoio ativo de todos nós.
Minbas reflexões e perspectivas também se baseavam em ou
tros aspectos importantes de rninba experiência política pessoal:
OS trabalhos anteriores da Comissão Brandt sobre questões Norte
Sul e da Comissão Palme sobre questões de desannamento e se
gurança, de que participei.
Pediam-me que ajudasse a lançar um terceiro e premente apelo
11 ação polftica: após Programa para a sobrevivlncia e Crise c0
mum, da Comissão Brandt, e após Segurança comum, da Comis
são PaIme, viria FuturO comum. Era isso o que eu tinha em mente
quando, junto com o Vice-Presidente Mansour Khalid, comerei a
trabalhar na ambiciosa tarefa que as Nações Unidas nos confiam.
Este relatório, apresentado à Assembléia Geral da ONU em 1987,
é o resultado desse processo.
Talvez nos.. tarefa mais urgente hoje seja persuadir as nações
da necessidade de um retorno ao multilateralismo. O desafio da
reconstrução após a 11 Guerra Mundial foi a verdadeira motivação
que levou ao estabelecimento de nosso sistema econômico inter
nacional do pós-guerra. O desafio de encontrar rumos' para um
desenvolvimento sustentável tinha de fornecer o impeto - ou
mesmo o imperativo - para uma busca renovada de soluçées mul
tilaterais e para um sislema econ/lmico internacional de coopera
çãe reestruturado. Esses desaUos se sobrepunbam às distinções de
soberania nacional, de estratégias limitadas de ganho econllmico e
de várias diseiplioas cientificas.
Após 15 anos de paralisaçãe ou mesmo deterioração na coope
ração global, acredito ter chegado o momento de expectativas
mais elevadas de busca conjunta de objetivos comuns, de um
maior empenbo político em relação a nosso futuro comum.
A década de 60 foi um tempo de otimismo e progresso; havia
mais esperança de um mundo novo melhor e de idéias cada vez
Xli
mais internacionais. A. colônias dotadaJI de recursos naturais to...
navam-se nações. Os ideais de cooperação e partilha pareciam
estar sendo seriamente buscados. Paradoxalmente, os aoo~ 70 en
traram pouco a pouco num clima de reação e isolamento, en
quanto uma série de conferências da ONU trazia espemnças de
maior cooperação quanto às questões mais importantes. A Confe
rência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Hwnano, em
1972, levou os países em desenvolvimento e os industrializados a
traçarem, juntos, os ud.ireitosU
da :fanúlia. humana a wn meio am
biente saudável e produtivo. Várias reuniões desse tipo se sucede
ram: sobre os direitos das pessoas a uma alimentação adequada, a
boas moradias, a água de boa qualidade, ao acesso aos meios de
escolher o tamanho das famfiias.
Na década amai, verificou-se um retrocesso quanto às preocu
paçées sociais. Os cientistas chamaram atenção para problemas
urgentes e complexos ligados à própria sobrevivência do homem:
um planeta em processo de aquecimento, ameaças à camada de
ozônio da Terra, desertos que devoram terras de cultivo. Nossa
resposta foi exigir maiores esclarecimentos e transferir os proble
mas a iostitoições mal equipadas para lidar cmn eles. A deteriora
ção ambiental, vista a princípio como um problema sobretudo dos
países ricos e como um efeito colaleral da riqueza induslrÍal, tor
nou-se uma questão de sobrevivência para os países em desenvol
vimento. Ela faz parte da espiral descendente do declfnio econll
mico e ecológico em que muitas das nações mais pobres se vêem
enredadas. Apesar de esperanças oÍlciais expressadas por todos,
nenbuma das tendências hoje idenrifieadas, nenhum programa ou
polftica oferece qualquer esperança real de estreitar a lacuna cada
vez maior entre nações ricas e pobres. E, como parte de nosSO
"desenvolvimento' armazenamos arsenais capazes de alterar 08
rumo. que a evolução vem segnindo há milhões de anos e de criar
um planeta que nossos ancestrais não reconbeceriam.
Em 1982, quando se discutiam pela primeira vez as atribuições
de nossa Comissão, houve quem desejasse que suas considerações
se limitassem apenas a "questões ambientais". Isto teria sido um
grave erro. O meio ambiente não existe como uma esfera desvin
culada das açées, ambições e necessidades humanas, e tentar de
fendê-lo sem levar em conta os problemas hwnanos deu li própria
expressão "meio ambiente" uma conotação de ingenuidade em
certos círculos polftieos. Também a palavra "desenvolvimento"
fni empregada por alguns num sentido muito limitado, como "o
que as nações pobres deviam fazer para se tornarem mais ricas",
e por isso passou a ser posta automaticamente de lado por muitos,
no plano internacional, como algo atinente a especialistas, àque
les ligados a questées de "assistência ao desenvolvimento".
XIII
9. Mas é no urneio ambiente" que todos vivemos; o "'desenvolvi
monto" é o que todos fazemos ao tentar melhorar o que nos cabe
neste lugar que ocupamos. Os dois são inseparáveis. Além disso,
as questões de desenvolvimento devem ser consideradas cruciais
pelo. líderes políticos que acham que seus países já atingiram um
nível que outras nações ainda lutam para alcançar. Muitas das es
tratégias de desenvolvimento adotadas pelas nações industrializa
das são evidentemente insustentáveis. E devido ao grande poder
econômico e político desses países, suas decisões quanto ao de
senvolvimento terão profundo impacto sobre as possibilidades de
todos os povos manterem o progresso humano para as gemçõcs
folurns.
Muitas questões cóticas de sobrevivência estão relacionadas
com desenvolvimento desigual, pobreza e aumento populacional.
Tndas elas impõem pressões sem precedentes sobre as telTllS,
águas, florestas e outros recursos naturais do planeta, e não ape
nas nos países em desenvolvimento. A espiral descendente da p0
breza e da deteriornção ambiental é um desperdício de oportuui
dades e recursos. De modo especial, é um desperdício de recursos
humanos. Esses vinculos 'entre pobreza, desigualdade e deteriora
ção ambiental foram um dos principais temas em nossa análise e
recomendações. O necessário a80m é wna nova era de cresci
mento econômico - um crescimento convincente e ao mesmo
tempo duradouro do ponto de vista social e ambiental.
Devido à abrangéncia de nosso trabalho e à necessidade de
wna visão ampla, eu tinha consciência de que era preciso reunir
wna equipe de cientistas e políticos influentes e altamente qualifi
cados, a fim de formar wna Coraissão verdadeiramente indepen
dente. Isto era essencial ao êxito do processo. Juntos, deveríamos
esquadrinhar o mundo e formular um método interdisciplinar e
integrado para abordar as preocupaçõcs mundiais e nosso futuro
comum. Necessitávamos de ampla participação e de uma clara
maioria de membros de países em desenvolvimento, a Íuo de re
tratar as realidades do mundo. Necessitávamos de pessoas de
grande experiência. oriundas de todos os campos políticos, não só
com fonnação em meio ambiente e desenvolvimento enquanto
disciplinas políticas, mas de todas as áreas onde são tomadas de
ci.sões vitais que influenciam o progresso econômico e social nos
níveis nacional e internacional.
Assim~ viemos de experiência,; extremamente diversas: minis-
tros de relações exteriores, funcionários de finanças e planeja
mento, administradores na. áreas de agricultura, ciência e tocno
logia. Vários membros da Comissão são rainistros de gabinete e
economistas de alto nível em suas próprias nações, e muito en
volvidos nos assuntos desses países. Mas como membros da Co
missão não exercíamos as funções que tínhamos em nossos paí
ses, agfamos como individuos: e à medida que nosso trabalho
avançava, iam diminuindo o nacionalismo e as distinções artifi
ciais entre '"industrializado" e Hem desenvolvimentou
• entre
Leste e Oeste. Nascia, em vez disso. uma preocupação comum
com o planeta e com as ameaças ao n:lesmo tempo ecológicas e
econômicas contra as quais todos OS povos, instituições e gover
nos agora lutavam,
Dumnte o tempo em que,a Coraissão esteve reuuida, tragédias
como as crises de fome na Africa, o vazamento na fábrica de pes
ticidas de Bhopal, na (ndia, e o desastre de Tchernobil, na URSS,
aparentemente justificaram as graves previsões quanto ao futuro
humano que se tomaram lugar-comum em meados dos anos 80.
Mas nas audiências públicas que realizamos nos cinco continen
tes, também tomamos conhecimento de vítimas de catástrofes
mais crónicas e generalizadas: a crise da dívida, a cessação da as
sistência aos países em desenvolvimento e do investimento neles.
a queda dos preços dos produtos básicos e das rendas pessoais.
FIcamos convencidos de que eram necessárias grandes mudanças~
tanto de atitude quanto na fonna em que nossas sociedades são
organizadas.
As questões referentes a população pressão populacional,
população e direitos humanos - e os vínculos entre estas e a p0
breza, o meio ambiente e o desenvolvimento revelaram-se das
mais difíceis dentre as que tínhamos de enfrentar. As diferenças
de ponto de vista pareceram a princípio intran<poníveis, e foi pre
ciso muita reflexão e muito empenho para supel'31' distinçõcs cul
turais, religiosas e regionais.
Outra quesrão de vulto foi a área das relações económicas in
ternacionais. Neste e em vários outros asJ>eCtos importantes de
nossa análise e de nossas recomendações, conseguimos chegar a
um amplo consenso.
Foi essencial o fato de todos nos tennos tornado mais expe
rientes, aprendido a suplantar as barTeiras culturais e históricas.
Houve momentos de grande preocupação e crise potencial, mo
mentos de gratidão e reaIização~ momentos de sucesso na elabo
ração de uma análise e uma pempectiva Comuns. O resultado ob
tido foi certamente mais completo, mais realista e mais voltedo
para o futuro do que qualquer de nós, sozinho, poderia conseguir.
Chegamos à Comissão com opiniões e perspectivas diferentes,
valores e crenças diferentes, experiências e noções muito dife
rentes. Após três anos de tmbalho em comum, viagens, troca de
experiências e debates, apresentamos um relatório que é de todos.
Sou profundamente grata a todos os membros da Coraissão por
sua dedicação. sua antevisão e seu engajamento pessoal em nossa
xv
XIV
10. lido comum. Foi sem dúvida uma excelente equipe. O clima de
emize"" e comunicação fIanca. a convergência de idéias e o pr0
cesso de aprendizagem e participação nos propiciaram uma expe
riência de otimismo. muito valiosa !anto para nós quanto. creio,
para este relatório e sua mensagem. Esperamos partilhar com ou
tras pessoas tndo aquilo que aprendemos e todas as experiências
que vivemos juntos. Muitas outras pessoas têm de partiIha.r essa
experiência a fim de que se possa alcançar um desenvolvimento
sustentável.
A Comissão foi orientada por pessoas de todas as categorias
sociais. É a essas pe$soas - a todas as pessoas do mundo - que a
Comissão agora se dirige. Assim, falamos diretamente às pessoas
e também às instilUições que eias criaram.
A Comissão se dirige a governos, seja diretamente. seja por
meio de suas várias agencias e ministérios. Este relatório destina
se. principalmente. à congregação de governos. reunida na As
sembléia Geral das Nações Uuidas.
A Comissão se dirige também à empresa privada. desde a for
mada por uma SÓ pessoa até a grande companhia multinacional,
com um movimento total superior ao de muitos países. e com pos
sibilidades de promover mudanças e melhorias de grande alcance.
Antes de 1Udo. 'potém, nossa mensagem se dirige às pessoas,
cujo bem-estat é o objetivo tlItimo de todas as políticas referentes
a meio ambiente e desenvolvimento. De modo especial, a Comis
são se dirige aos jovens. Aos professores de todo o mundo cabe a
tarefa CtuCial de levar a eles este relatório.
Se não conseguirmos transmitir nossa mensagem de urgência
aos pais e administradores de hoje. arriscamo-nos a comprometer
o direito fundamental de nossas crianças a um meio ambiente
saudável. que promova a vida. Se não conseguirmos traduzir nos
sas palavras numa linguagem capaz de tocar os corações e as
mentes de jovens e idooos. não seremos capazes de empreender as
amplas mndanças sociais necessárias à correção do curso do de
senvolvimento.
A Comissão tenninou seus trabalhos. Pedimos um empenho
conjunto e novas normas de conduta em todos os nfveis, no iote·
resse de todos. As mudanças de atilUde, de valores sociais e de
aspirações que o relat6rio encarece dependeria de amplas campa
nhas educacionais, de debates e da panicípação pública.
Com este objetivo, apelamos a grupos de cidadãos, a orgo..Jza
ções não-govemamentais, a instilUições de ensino e à comunidade
cientffica. Todos no passado desempenharam funções indispensá
veis para a conscientização do público e a mudança política. Sua
participação será vital para orientar o mundo no rumo do desen
volvimento sustentável, para estabelecer os alicerces de Nosso
Futuro Comum.
[
O processo de elaboração desterelat6rio prova que é possfvel
unir esforços, identificar objetivos comuns e estabelecer uma ação
comum. Cada membro da Comissão, se tivesse escrito o telatório
sozinho, teria escolhldo palavras diferen",". ConlUdo, consegui
mos cbegar a acordo sobre a lUlálise, os remédios em geral e as
recomendações para que o curso do desenvolvimento não sofra .
intenupções.
Em última análise, o que importa é estimular a compreensão
comum e O espírito de responsabilidade comum, tão evidente
mente necessários num mundo dividido.
Mil.lumos de pessoas em todo o mundo contribuírmn para os
trabalhos da Comissão, cOm idéias, com ajuda financeira, ou
compartilh'!Ddo conosco suas experiencias ao nos transmitirem
suas necessidades e caténcias. Fico sinceramente grata a IUdos os
que nos deram sua contribuição. Os nomes de muitas dessas pes
soas constam do anexo 2 do relatório. Agradeço especialmente
ao Vice-Presidente Mansour Khalíd, a todos os demais membros
I
• da Comissão, ao Secretário-Geral Sim MacNeill e a sua equipe em
nossa secretaria, que foram muito além do dever para nos ajuda
tem. Seu entusiasmo e dedicação não tiveram limites, Quero
agradecer aos presidentes e aos membros do Comitê Preparat6rio
~ Intergovemamental Inter-Sessional. que colaboraram estreita
mente com a Comissão, dando-nos incentivo e apoio. Também
agradeço ao diretor executivo do Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambienre, Dr. Mostafa Tolba, por seu apoio e inte
resse valiosos e constantes.
Gro Harlem Brundtland
Oslo, 20 de março de 1987
[
XVI XVII
11. "
;L
','
~
.})
DA TERRA AO MUNDO
VIsão panorâmica da ComIIisão Mundial
sobre Melo Ambiente e Desenvolvimento
Em meados do século XX, vimos nosso planeta do espaço pela
primeira vez. Talvez os historiadores venham a considerar que
este fato teve maior impacto sobre o pensamento do que a revolu
ção copérnica na do século XVI, que abalou a auto-imagem do
homem ao revelar que a Terra não era o centro do univel'llo. Vista
do espaço, a Terra é uma hola frágil e pequena, dominada não
pela ação e pela obra do homem, mas ppr um conjunto ordenado
de nuvens,oceanos, ~~..<!.~I<iJO fato de a humanidade
ser incapaz de agit confonne essa ordenação natoraI está alteran
do fundamentaImente os sistemas planetários. Muitas dessas alte
rações acarretam ameaças à vida. Esta realidade nova, da qual
não há como fugir, tem de ser reconhecida - e enfrentada.
Felizmente, essa realidade nova coincide com fatos mais posi
tivos e também novos neste século. É possível fazer infOnnaç6es
e bens circularem por todo o planeta com uma rapidez sem prece
dentes; é possível produzir mais alimentos e mais bens investindo
menos recursos; a tecnologia e a ciência de que dispomos nos
penuitem, ao menos potencialmente, examinar mais a fundo e
compreender melhor os sistemas naturais. Do e.'!paÇo, podemos
ver e estodar a Terra como um organismo cuja sallde depende da
saúde de todas as suas partes. Temos o poder de reconciliar as
atividades humanas com as leis naturais, e de nos enriquecermos
com isso. E nesse sentido nossa herança eultoraI e espiritual pode
fortalecer nossos interesses econômicos e imperativos de sobrevi
vência.
Esta Comissão acredita que os homens podem construir um fu
turo mais próspero. mais justo e mais seguro. Este relat6rio. Nos
so Futuro Comum, não é uma previsão de decadência. pobreza e
dificuldades ambientais cada vez maiores num mundo cada vez
mais poluído e com recl1l'llOS cada. vez menores. Vemos, ao con
ttário. a possibilidade de uma nova era de creseimento econômi
co, que tem de se apoiar em práticas que conservem e expandam a
base de recursos ambientais. E acreditamos, que tal crescimento é
I absolutamente essencial para mitigar a grande pobreza que se vem
~ intensificando na maior parte do mundo em desenvolvimento.
Mas a esperança da Comissão em relação ao futuro está condi
cionada a uma ação política decisiva que deve ser empreendida
jIi, para que se comece a administrar os recursos do meio am
I
12. blente no intuito de 118Segur8r o progresso hUll'llUlo continuado e a
IObrevivência da humanidade. Não prevemos o futuro; apenas
transmitimos a infonnação - wna informação urgente, baseada
nas evidências científicas mais recenleS e mais abalizadas - de
que é chegado o momento de tomar as decisões necessllrlU afim
de garantir os recursos para o sustento desta geração e das próxi
mas. Não ternos a oferecer um plano detalhado de ação, e sim um
caminho para que os povos do mundo possam ampliar suas esfe
ras de cooperação.
I, O DESAFlO GLOBAL
1.1 )l:x1tos e ~
Os que buscam êxitOs e sinaia de esperança podem encontrar
muitos: a mortalidade infantil está em queda; a expectativa de vi
da humana vem aumentendo; o pen:entual de adultos, no mundo,
que sabem ler e escrever está em ascensão; o pen::entnaI de crian
ças que ingressam na escola está subindo; e a produção global de
alimentos aUflleOta mais depnlSSa que a população.
Mas os mesmos processos que trouxeram essas vantagens gera
ram tendências que o planeta e seus hablmntes não podem supor
tar por muito tempo. Estas têm sido tradicionalmente divididas em
fracassos do "desenvolvimento" e fracassos na gestão do nosso
meio ambiente. No tocante ao desenvolvimento, há, em termos
absolutos, mais famintos no mundo do que nunca, e seu nWnero
vem aumentando. O mesmo ocorre com o nWnero de analfabetos,
com o n1lmero dos que não dispõem de água e moradia de boa
qualidade, e nem de lenha e carvão para cozinhar e se aquecer.
Amplia-se - em vez de dinúnuir - o fosso entre nações ricas e
pobres, e, dadas as circunstâncias atuais e as disposições institu
cional., há poucas perspectivas de que essa tendência se inverta.
Há também tendências ambientais que ameaçam mndificar ra
dicalmente o planeta e ameaçam a vida de muitas espécies, In
cluindo a espécie humana. A cada ano,6 milhões de hectares de
terras produtivas se transformam em desertos Inúteis. Em 30 anos,
Isto repnlSCntará uma área quase igual à da Arábia Saudita.
AnuaImente, são destruídos mais de 11 milhões de hectares de
florestas, o que, dentro de 30 anos, representará wna área do ta
manho aproximado da lodia. Grande parte dessas florestas é
transformada em terra agrícola de baixa qualidade, incapaz de
prover o sustento dos que nela se estabelecem. Na Europa, as
chuvas ácidas matam florestas e lagos e danificam o patrimômio
artístico e arquitetônico das nações; grandes extensões de terra
•
•
I
"
~
A Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvi
mento reuniu-se pela primeira vez em outubro de 1984 e
publicou este relatório 900 dias depois, em abril de 1987.
Durante esse tempo:
• na África, a cnse ligada ao meio ambiente e ao desenvol
vimento. desencadeada pela seca, atingiu o auge, pondo em
risco 35 milhões de pessoas e matando aproximadamente 1
milhão;
• em Bhopal, na lndIa, um vazamento numa fábrica de pes
ticidas matou mais de 2 mil pessoas, deixando outras 200
mil oegas ou feridas;
• na Cidade do México, tanques de gás liquefeito explodi
ram, matando mil pessoas e deixando milhares desabrigadas;
• em Tchemobil, a explosão de um reator duelear espalhou
radiação por toda a Europa, aumentando o risco de incidên
cia de câncer humano;
• na Suíça, durante o incêndio de um depósito, foram des
pejados no rio Reno produtos químicos agrícolas, wlventes
e mercdrio, matando milhões de peixes e ameaçando o
abastecimento de água potável na República Federal da
Alemanha e na Holanda;
• cerca de 60 milhões de pessoas morreram de doenças in
testinals decorrentes de desnutrição e da ingestão de água
imprópria para o consumo; as vitimas, na maioria, eram
crianças.
podem ter:se acidificado a ponto de quase não haver esperanças
de recupernção. A queima de combustfveis fósseis espalha na at
mosfera dióxido de carbono, o que e.~ provocando um gntdual
aquecimento do planelÁ. Devido a esse "efeito estufa", ! possível
que, já no início do pnlximo século, as temperataras médias glo
bais se tenham elevadu a pontu de acarretar o abandono de áreas
de produção agrícola e a elevação do nível do mar, de modo a
inundar cidades costeiras e desequilibrar economias nacionais.
Certos gases industriais ameaçam comprometer seriamente a ca
mada protetora de ozÔnio que envolve o planeta, com o que au
mentaria acentuadamente a incidência de vários tipos de eâncer
em seres humanos e animais e seria rompida a cadeia alimentar
dos oceanos. A indústria e a agricultura despejam substâncias t6
xicas que poluem irremediavelmente a cadeia alimentar hwnana e
os lençóis subterrineos.
Os governos e as instituições multilaterais tomam-se cada vez
mais conscientes da impossibilidade de separar as questões relati
vas ao desenvolvimento econÔmico das questões relativas ao meio
l 3
13. IIIIbIenle; muilaS fonnas de desenvolvimento desgastam os recur
80S ambienlais nos quais se deviam fundamentar, e a deterioração
~ do meio ambiente pode prejudicar o desenvolvimenlD econômico.
"'~_uma das principais "!msWLC..Jml Qp~nc
,Iêniá. =âinl;i"imíli fiO -mUliãó~POrtántO, T
esSêS' prOI)Iem:a.~...;mWíiã· 'pé;,
Até recentemente, o planeta era um grande mundo no qual as ati
vidades humanas e seus efeitos estavam nitidamente conf"mados
em nações, setores (energia, agricultura, comércio) e amplas áreas
de interesse (ambienlai, econômico, social). Esses compartimen
IDs começaram a se diluir, IsID se aplica em particular às várias
"crises" globais que preocuparam a lodos. sobretudo nos I1ltimos
10 anos. NáD sãD crises isoladas: uma crise ambiental, lima crise
do desenvolvimento, uma crise energética. SáD uma s6.
O planeta eslá atravessando um período de crescimento drásti
CO e mudanças fundamenlais. Nosso mundo de 5 bilhões de seres
., humanos tem de encontrar espaço, num contexto ímito, para outro
mundo de seres humanos. Segundo projeções da ONU, em algum
momento do próximo século a população poderá estabilizar-se
entre 8 e 14 bilhões de pessoas. Em sua maior parte, esse au
mento ocorrerá nos pafses mais pobres (mais de 90%) e em cida
des já superpovoadas (90%).
A atividade econômica multiplicou-se para gerar uma econo
mia mundial de USS13 trilhões, que pode qU,intuplicar ou decu
plicar nos próximos 50 anos, A produção industrial cresceu mais
de 50 vezes no illtimo século, sendo que quatro quintos desse
crescimento se deram a partir de 1950, Esses nllmeros refletem e
p...figuram profundos impactos sobre a biosfera, à medida que o
mundo investe em habitação, transporte, agricultura e inddstria.
Grande parte do crescimento econ6mico se faz à custa de maté
, rias-primas de flo...slaS, solos, mares e vias navegáveis.
A nova tecnologia, uma das molas mestras do crescimenlo
econômico, possibilita a desaceleração do consumo perigosa
mente rápido dos recursos finitos, mas também engendra sérios
riscos, como novos tipos de poluição e o surgimento, no planeta,
de novas variedades de fonnas de vida que podem alterar os ru
mos da evolução. Enquanto isso, as indl1s1rias que mais dependem
de recursos do meio ambiente, e que mais poluem, Se multiplicam
com grande rapidez no mundo em desenvolvimento, onde o cres
cimento é mais urgente e há menos possibilidades de minilaizar
efeitos colaterais nocivos.
Essas alterações correlatas criaram novos vínculos entre a eco
nomia global e a ecologia global. No passado, nos preocupamos
com os impactos do crescimento econômico sob... o meio am
biente. Agora temos de nos preocupar com os impactos do des
li, gaste ecol6gico - degradaçáD de solos, regimes hídricos, atmosfe
ra e floreslaS - sobre nossas perspectivas econômicas. Mais re
centemente tivemos de assistir ao aumento acentuado da interde
pendência econ6mica das nações. Agora temos de nos acostumar
., à sua crescente interdependência ecológica. A ecologia e a ec0
nomia estáD cada vez mais entrelaçadas - em âmbito local, regio
ual, nacioual e mundial - numa rede inteiriça de causas e efeitos.
Se a base de recursos local se depaupera, áreas mais amplas
podem ficar depauperadas: o desflorestamento das tetTaS alIaS
acarreta inundações nas tetTaS baixas; a poluição industrial preju
dica a pesca local. Esses implacáveis ciclos localizados passam
4
5
14. qora ao pIano nacional e regional. A deterioração das terras ári
cIu leva milhões de refugiados ambientais a transpor as fronteiras
de seus paises. O desflorestamento na América Latina e na Ásia
wm provocando ntais inundações. com danos sempre maiores.
1108 paises situados em áreas mais baixas e no curso inferior dos
rios. A chuva ácida e a radiação nuclear ultrapassaram"as frontei ,<
ras da Europa. No mundo todo, estio ocorrendo fenômenos simi
la.res. como o aquecimento global e a perda de ozônio. Produtos
qufmicos perigosos, presentes em alimentos comercializsdos in
ternacionaImente, são eles próprios comercializsdos internacio
'11
nalmente. No próximo século. poderão aumentar multo as pres
sões ambientais que geram migrações populacionais. ao passo que
os obstáculos a essa migração poderão ser ainda maiores do que
hoje.
Nos últimos decênios, surgiram no mundo em desenvolvimento
problemas ambientais que põem em risco a vida. O nllmero cres
cente de agricultores e de sem-terras vem gerando pressões nas
áreas rurais. As cidades se enchem de gente. carros e fábricas. E
no entanto esses pafses em desenvolvimento têm de atuar num
contexto em que se amplia o fosso entre a maioria das nações in
dustrializsdas e em desenvolvimento em matéria de recursos, em •
que o mundo industrializado impõe as normas que regem as prin
cipais organizações internacionais, e em que esse mundo indus
trializado já usou grande parte do capital ecológico do planeta.
Essa desigualdade é o maior problema "ambiental" da Terra; é
também seu maior problema de "desenvolvimento".
Em muitos paises em desenvolvimento, as relações econômicas
internacionais constituem um problema a ntais para a admiaistra
ção <;lo meio ambiente. A agricultura, a silvicultura, a produção
energética e a mineração geram pelo menos a metade do produto
nacional bruto de multos desses países, proporcionando empregos
e meios de subsistência em escala ainda maior. A exportação de
recursos naturais continua sendo um fator importante em suas
economias. sobretudo no caso dos menos desenvolvidos. Devido
a enonnes pressões econômicas, tanto .externas corno internas. a ,f
maioria desses países explora excessivamente sua base de recur
sos ambientais.
A recente crise africana ilustra bem e de modo bastante tnígico
como a economia e a ecologia podem interagir de f0rml!- destruti 'I
va e precipitar o desastre. Essa crise, desencadeada pela seca, tem
causas reais ntais profundas. que devem ser buscadas. em parte.
nas polfticas nacionais que dispensaram pouquíssima atenção. e
mesmo assim demasiado tarde. às necessidades da agricullllra de
pequena escala e aos riscos inerentes a rápidos aumentos popuJe
donais. As rafzes da crise estendem-se também a um sistema eco
6
nômico mundial que retira de um contineote pobre mais do que
lhe dá. Não podendo pagar suas dívidas, as nações africanas que
dependem da venda de produtos primários vêem-se obrigadas a
superexplorar seus solos frágeis, transformando assim terras boas
em desertos. Por causa das barreiras comerciais impostas pelos
países ricos - e por muitos países em desenvolvimento - os afri.
canas têm dificuldade em vender seus produtos a preços razoá
veis. o que pressiona ainda mais os sistemas ecológicos. A ajuda
concedida pelas nações doadoras não só tem ficado aquém do de
sejável. como freqüentemente reflete mais as prioridades destas
nações do que as necessidades dos países recebedores. A base de
prodoção de outras áreas do mundo em desenvolvimento é tam
bém afetada tanto por falhas locais quanto pela atuação dos sis
temas econômicos internacionais. Devido à "crise da divida" da
América Latina, os recursos naturais dessa região estáo sendo
usados não para o desenvolvimento. mas para cumprir as obriga
ções rmanceiras contraIdas com os credores estrangeiros. Esse en
foque do problema da dívida é insensato sob vários aspectos:
cconômico, poUtico e ambiental. Exige que países relativamente
pobres aceitem o aumento da pobreza ao mesmo tempo que ex
portam quantidades cada vez maiores de recursos escassos.
Hoje, a renda per capita da maioria dos paises em desenvolvi
mento é mais baixa do que no início da década. O aumento da
pobreza e o desemprego vêm pressionando ainda ntais os recursos
ambientais, à medida que um nllmero maior de pessoas se vê ror
çado a depender mais diretamente deles. Multos governos sus
penderam seus esforços para proteger o meio ambiente e para in
serir considerações ecológicas no planejamento do desenvolvi
mento.
A crise ambiental, que se aprofunda e amplia. representa, para
a segurança nacional - e até para a sobrevivência - uma ameaça
talvez ntais séria do que vizinhos hem annados e mal-intenciona
dos, ou alianças hostis. Em certas áreas da América Latioa. Ásia.
Oriente Médio e África. a deterioração do meio ambiente está se
tomando fonte de inquietação polCtica e tensão internacional. A
recente destruição, na África. de grande parte da produção agrf
cola de terras áridas foi mais grave do que se um exército invasor
tivesse devastado essas terras. No entanto, a maioria dos gover
nos dos pafses afetados ainda gasta hem mais para proteger seus
povos de exércitos invasores do que de desertos em expansão.
Em termos globais, os gastos militares totalízam cerca de US$l
trilhão por ana e não cessam de subir. Em muitos países, os gas
tos militares consomem uma proporção táo grande do produto na
cional bruto que chegam a prejudicar bastante os esforços desen
volvimentistas dessas sociedades. Os governos costumam tratar a
7
15. A Comissão buscou meios pano que no século XXI o desen
'Olvimenlo global possa vir a ser sustentável. Cerca de 5
mil dias separam a publicação de nosso relat6rio elo primeiro
dia elo século XXI. Que crises ambientais nos estãO reserva
das nesses S mil dias?
Na década de 70, o número de pessoas atingidas por cu
lJi.,trofes "naturais" a cada ano dobrou em relação à década
de 60. As catástrofes mais diretamente ligadas à má admi
nistração do meio ambiente e do desenvolvimento - secas e
inundaç<les - foram as que afetaram o maior número de pes
soas e as que se intensificaram mais drasticamente em ter..
mos de vítimas. Cerca de ISS milhões de pessoas sofreram
anualmente os efeitus da seca nos anos 60; 24,4 milhões,
questão "segurança" à base de defmições tradicionais. Istu fica
patente nas tentativas de obter segurança por meio de sistemas de
armas nucleares capazes de destruir o planeta. Os estudos indicam
que o inverno nuclear, frio e escuro~ que se seguiria a uma guerra
nuclear mesmo limitada poderia destruir ecossistemas vegetais e
animais e deixar aos sobreviventes humanos um planeta devasta
do, muito diferente daquele que herdaram.
A corrida annamentista - em todos os quadrantes elo munelo
drena recursos que poderiam ser usados de modo mais produtivo
pano diminuir as ameaças à segurança gerada por conflitos am
bientais e ressentimentos alimentados pela pobreza generalizada.
Muitos dos atuais esforços para manter o progresso humano,
pano atender às necessidades humanas e para realizar as ambições
humanas são simplesmente insustentáveis - tanto nas nações ricas
quanto nas pobres. Elas retimm demais, e a um ritmo acelerado
demais, de uma conta de recursos ambientais já a descoberto, e no
futuro não poderão esperar outra coisa que não a insolvência des
sa conta. Podem apresentar lucros nos balancetes da geração
atual, mas nossos mhos herdarão os prejuízos. Tomamos wn ca
pital ambiental emprestado às gerações futuras, sem qualquer in
tenção ou perspectiva de devolvê-lo. Elas podem até nos maldizer
por nossos atos perdulários, mas jamais poderão cobrar a dIvida
que temos para COm elas. Agimos desta forma porque podemos
escapar impones: as gerações futuras não votam, não possuem
poder poIltico ou financeiro, não têm como opor-sea nossas deci
sões. .
~1
'.
•
.j'
nos anos 70. Houve 5,2 milhIIes de vítimas de inundações
por ano na década de 60; 15,4 milhões nos anos 70. O nú
mero de vítimas de ciclones e terremotos também disparou,
já que cada veZ fuais pessoas pobres constroem casas precá
rias em terreno perigoso.
Ainda não há dados definitivos para o. anos 80. Mas. 56
na África, 35 milhões de pessoas foram atingidas pela seca,
e na lndia dezenas de milhões sofremm os efeitos de uma
seca mal. bem administrada e portanto menos divulgada.
Inundações assolaram os Andes e.o Himalaia desflorestados
com wn vigor sempre crescente. Ao que parece, essa ten
dência sinistra dos anos 80 se transformará numa crise que
deverá durar toda a década de 90.
Mas os efeitos da dissipação atual estão rapidamente acabando
com as opções das gerações futuras. Muitos dos responsáveis pe
las decisões tomadas hoje estarão mortos antes que o planeta ve
nha a sentir os efeitos mais sérios da chuva ácida, do aquecimentu
da Tetta, da redução da camada de ozônio, da desertiflCação ge
neralizada ou da extinção de espécies. A maioria dos jovens
eleitores de hoje ainda eStará viva. Nas audiências da Comissão,
partiram dos jovens, dos que têm mais a perder, as críticas mal.
deras à atual administração do planeta.
1.3 De!lenvolvlmento _tentável
A humanidade é capaz de tomar o desenvolvimento sustentável
de garantir que ele atenda as necessidades do presente sem com
prometer a capacidade de as gerações futuras atenderem também
às suas. O conceito de desenvolvimento sustentável tem, é claro,
limites - não limites absolutos, mas limitações impostas pelo es
tágio atual da tecnologia e da organização social, no tocante aoS
recursos ambientais, e pela capacidade da biosfera de absorver os
efeitos da atividade humana. Mas tanto a tecnologia quanto a or
ganização social podem ser geridas e aprimoradas a fun de pro
porcionar uma nova era de crescimento econômico. Para a Comis
são, a pobreza generalizada já não é inevitável. A pobreza não é
apenas um mal em si mesma, mas pano haver wn desen..olvimento
sustentável é preciso atender às necessidades blisicas de todo. e
dar a todos a oportunidade de realizar suas aspirações de uma vi
8 9
16. da melhor. Um mundo onde a pobreza é endêmica estará sempre
IllljelIO a cattlslmfes, ecológicas ou de outra datuteza.
O atendimenlO das necessidades básicas requer não só uma
nova. era de crescimento econômico para as nações cuja maioria
da população é pobre, como a garantia de que esses pobres rece
berão uma pareela justa dos recursos necessários Patll manter esse
crescimento. Tal eqüidade seria facilitada por sistema~ políticos
que assegurassem a participação efetiva dos cidadãos na tomada
de decisões é por processos mais democráticos na tomada de de
cisões em âmbito internacional.
Para que haja um desenvolvimento global sustentável é neces
sário que os mais ricos adntem estilos de vida compatíveis com os
recursos ecológicos do planeia - quanto ao conswno de energia.
por exemplo. Além disso, o rápido aumento populacional pode
intensificar a pressão sobre os recursos e retardar qualquer eleva
ção dos padrões de vida; portanto, só se pode buscar o desenvol
vimento sustentável se o lamanho e o aumento da população esti
verem em harmonia com o potencial produtivo cambiante do
ecossistema. .
Afinal, o. desenvolvimento sustentável não é um estado perma
nente de harmonia, mas um processo de mudança no qual a explo
ração dos recursos, a orientação dos investimentos. os rumos do
desenvolvimento tecnológico e a mudança institucional estão de
acordo com as necessidades atuais e futuras. Sabemos que este
não é um processo fácil, sem Impeços. Escolhas difíceis terão de
ser feitas. Assim, em última análise, o desenvolvimento sustentá
vel depende do empenho político.
1.4 As 'acnnas institucionais
A meia do desenvolvimentO' sustentável e a natureza indissociável
dO'S desafiO'S impostos pelo meio ambiente e o desenvolvimento
glohais constituem um problema para as instituições nacionais
e internacionais criadas a partir de preocupações restritas e Com
partimenladas. De modo geral, a reação dos governos à rapidez e
à amplitude das mudanças globais tepl sido a relutância em reco
nhecer devidamente a necessidade de eles mesmos mudarem. Os
desafios são interdependentes e complemenlares, exigindo por_
tanto abordagens abrangentes e participação popular.
Mas a maioria das instituições que enfrentam esses desafios
tende a ser independente, fragmentada, com atribuições relativa
mente limitadas e processos de decisão rechados. As responsáveis
pela administração dO'S recursos naturais e a proteção do meio
ambiente estio desvinculadas das que se dedicam à administração
da economia. O mundo real de sistemas econômicos e ecológicos
interligados não mudará; mas é preciso que mudem as políticas e
as instituições envolvidas.
T0'm8-se cada vez mais necessária uma cooperação internacio
nal efetiva para lidar com a interdependência ecológica e econô
mica. Contudo, verifica-se ao mesmo tempo um decréscimo de
:,' confiança nas organizações internacionais e uma redução do
apoio que lhes é dado.
Outra grande falha institucional, no que tange a enfrentar os
desafioo do meio ambiente e do desenvolvimento é a incapacidade
dos governos de fazer com que os organismos cujas práticas dete
rioram o meio ambiente se comprometam a adotar medidas que
evitem essa deterioração. A preocupação com o meio .&mbiente
adveio dos danO's causados pelo rápido crescimento econômico
que se segoiu 11 II Guerra Mundial. Os goveinDs, pressionados
por seus cidadãos, perceberam a necessidade de reparar esses da
nos e, para tanto, criaram ministérios e órgãos ambientais. De fa
to, muitos deles conseguiram - dentro dos limites de suas atribui
ções - melhorar a qualidade do ar e da água e aumentar outros re
cursos. Mas em gerai sua atuação concentra-se necessariamente
na reparação de estragos já causados: ",florestarnento, "'genera
·,t ção de terras desérticas, r<!Construção de ambientes urbanos,
restauração de habitats naturais e recuperação de regiões agres
tes.
A existência desses órgãos deu a muitos governos e cidadãO'S a
falsa impressão de que os mesmos eram capazes de, sozinhos.
proteger e aumentar a base de recursos ambientais. Contudo,
muitos países industrializados e a maioria dos em desenvolvi
mento arcam com pesados ônus decorrentes de problemas herda
dos, como poluição do ar e da água, esgolamento dos lençóis
subterdlneos, proliferação de produtos quúnícos tóxicos e de re
jeitos perigosos. A esses problemas vieram juntar-se outros mais
recentes - erosão, desertificaçlio, acidificação, novos produtos
qul'micos e novos tipos de rejeitos - direlamente relacionadO'S com
, políticas e práticas agncolas,.industríais, energéticas,-florestais e
viárias.
As atribuições dos ministérios econômicos, centrais e setoriais,
são também, com freqüência, muito limitadas, muito volladas para
aspectoo quantitativos da produçllo ou do crescimento. Entre as
atribuições dO'S ministérios da indOstria estão as metas de produ
ção, enquanto a poluição daí decorren"" fica a cargo dos ministé
rios do meio ambiente. Os órgãos responsãveis pela eletricidade
produzem energia, mas a limpeza da poluição !lcida que também
produzem é deixada para outros organismos. O desafio atual con
siste em atribuir aos ministérios econômicos~ centrais e setoriais.
a responsabilidade pela qualidade das áreas do meio ambiente
.~
11
10
17. a
humano afetadas por suas decisões, e em dar mais poder aos ór
gãos ambientais para enfrentarem os efeítos do desenvolvimento
não-sustentável.
Também os órgãos internacionals que tratam de empréstimos
para o desenvolvimento, regulamentação do comércio, desenvol
vimento agrícola etc. necessitam de mudanças. Esses órgãos cus
taram a dar importância aos efeitos de suas atividades sobre o
meio ambiente, embora alguns estejam tentandô fazer isso.
Para que os danos ao meio ambiente possam ser previstos e
evitados é preciso levar em conta não s6 os aspectos ecológicos
das políticas. mas também os aspectos econômicos, comerciais,
energéticos, agrícolas e outros. Todos eles devem ser levados em
consideração nas mesmas agendas e uas mesmas instituições na~
denais e internacionais.
Essa reorientação é um dos principais desaÍlOs institucionais
para os anos 90 e os seguintes. Realizá-Ia exigirá g1'andes refor
mas institucionais. Muitos países. por serem pobres ou pequenos
demais ou por disporem de pouca capacidade administrativa, te
rão dificuldade em empreender essa tarefa sem ajuda. Precisarão
de assistência financeira e técnica, além de fonnação profissional.
Mas há necessidade de mudanÇas em todos os países, grandes e
pequenos, ricos e pobres.
Z. AS DIRETRIZES DE POLÍTICA
A Comissão concentrou sua atenção nas áreas de população, se
gurança alimentar, extinção de espécies e esgotamento de recUr
sos genéticos~ energia. indústria e assentamentos humanos - por
entender que todas se interligam e não podem ser tratadas isola
damente. Este item contém apenas algumas das muitas recomen
dações da Comissão.
1.1 População e recu.-- hum'anos
Em muitas partes do mundo, a população vem aumentando a taxas
incompatíveis com os recursos ambientais disponíveis, e que
frustram qualquer expectativa razoável de obter progressos em
áreas como habitação, serviços sanitários, segurança alimentar ou
fornecimento de energia.
O problema não está apenas no número de pessoas, mas na re
lação entre esse número e os recursos disponíveis. Assim, o
"problema populacional" tem de ser soluciollado por meio de es
forços para eliminar a pobreza generalizada, a fim de garantir um
acesso mais justo aos recursos e~ por meio da educação, a fim de
,~ .
aprimorar o potencial humano para administrar esses recursos.
São necessárias medidas urgentes para conter as elevadas taxas
de awnento populacional. As opções feitas agora influenciarão o
nível em que a população se estabilizará no próximo século - por
volta de 6 bilhões de pessoas. Mas esta não é apenas uma questão
demográfica; dar às pessoas os meios e a educação necessários
para que decidam sobre o tamanho de suas famflias é um modo de
assegurar - especialmente às mulheres - o direito humano básico
da livre escolha.
Os governos que precisam agir dessa forma devem adotar pc>
líticas populacionais multifacetadas e de longo prazo, e empreen
der wna campanha visando a amplos objetivos demográficos:
fortaIecer as motivações sociais, culturais e econômicas para o
planejamento familiar e fornecer a todos os interessados a educa
ção, 0$ contraceptivos e os serviços necessários.
O desenvolvimento dos recursos humanos é requisito básico
não sÓ para a aquisição de aptidões e conhecimentos técnicos,
mas também para o estabelecimento de novos valores que ajudem
os indivíduos e as nações a enfrentarem as :realidades sociais, am
bientais e de desenvolvimento que se encontram em rápida trans
formação. Se o mundo partilhar o conhecimento, haverá maior
entendimento mútuo e maior empenho em partilhar eqüitativa
mente os recursos globais.
Os povos tribais e indígenas vão requerer especial atenção, já
que as forças do desenvolvimento econômico conturbam seus es
tilos tradicionais de vida - estilos que muitao lições têm a dar às
sociedades modernas no tocante à administração de recursos em
ecossistemas complexos de florestas, montanhas e terras áridas.
Alguns desses povos estão ameaçados de extinção devido a um
desenvolvimento insensível, sobre o qual não têm qualquer con
trole. Seus direitos tradicionais deveriam ser reconhecidos e eles
deveriam ter voz ativa na fonnulação de políticaS relativas a de
senvolvimento de recursos nas áreas onde vivem. (Ver capítulo 4
para uma análise mais ampla dessas questões e recomeodações,)
1.1 Seaunmça alimentar, manter fi potencial
O crescimento da produção mundial de cereais vem invariavel
mente suplantando o da população do mundo. Mesmo assim, a
cada ano é maior o n1lmero de pessoas que não obtêm alimentos
em quantidade suficiente. A agrícultura mundial tem condições de
produzir alimentos para todos, mas com freqüência não há ali
mento disponível onde é necessário.
Nos países industrializados, a produção tem sido em gerai
muito subsidiada e protegida da concorrência internacíooai. Esses
13
12
18. subsídios estimularam o USO abusivo do solo e de produtos quúni
cos, a contaminação dos recursos hídricos e dos alimentos com
esses produtos, e a delerioração das áreas rurais. Muitos desses
esforços geraram excedenle., mas também ônus financeiros. E
parte desses excedentes foi "enviada. em condiçl5es subvencionais.
a países em desenvolvimento, prejudicando suas polnicas agríco
las. Contudo, alguns países estão tomando maior consciência das
conseqüências ambientais e econômicas dessas práticas, e agora
suas polfticas agrícolas dão ênfase à conservação.
Por outro lado, muitos países em desenvolvimento têm passado
pelo problema oposto: não há apoio suficiente aos agricultores.
Em alguns desses países, a combinação de tecnologia mais avan
çada, incentivos através dos preços e serviços pl'iblicos produziu
um aumento repentino e marcaole na produção de alimentos. Mas
em outros, os pequenos produtores de alimentos foram negligen
ciados. Contando cOm tecnologias quase sempre inadequadas e
poucos incentivos econômicos, muitos são forçados a trabalhar
terras marginais: muito secas, muito encharcadas, ou pobres em
nutrientes. Florestas são derrubadas e terras áridas produtivas tor
nam-se estéreis.
A maioria dos países em desenvolvimento necessita de siste
mas de incentivos mais eficazes para estimular a produção, s0
bretudo de culturas alimentares. Em suma, é preciso que as "rela
ções de troca" passem a favorecer o pequeno agricultor. Já a
maioria dos países industrializados deve alterar os sistemas atuais,
a fim de cortar excedentes, reduzir a concorrência desleal com os
países que possam ter vantagens comparativas reais, e promover
práticas agrfcolas sensatas do ponto de vista ecológico.
A segurança alimentar exige que se atenle para questões de
distribuição, pois a fome quase sempre advém da falta de poder
aquisitivo e não da falta de alimentos. Pode ser propiciada por ...,..
formas agrárias e por políticas de proteção aos agricultores de
subsistência, aos pequenos pecuaristas e aos sem-terra - grupos
vulneráveis que por volta do ano 2000 compreenderão 220 mi
lhões de faruflias. Sua maior pro'speridade dependerá de um de
senvolvimento rural integrado que aumenle as oportunidades de
trabalho tanto na agricultura como em outros setores. (Ver capí
tulo 5 para uma análise mais ampla dessas questões e recomenda
ções.)
1.3 EspécIes e eeossisteroas: l'eaIrsos para o desenvolvimento
As espécies do planeta estão em risco. Há um consenso científico
cada vez mais generalizado de que certas espécies desaparecem
do planeta a wn ritmo sem precedenle, embora tarubém haja con
14
•
trovérsias quanto a esse ritmo e os riscos que acarreta. Mas ainda
está em tempo de deter esse processo.
A diversidade de espécies é necessãria ao funcionamento nor
mai dos ecossistemas e da biosfera. O material genético das espé
cies selvagens contribui anualmenle com bilhões de dÓlares para a
economia mundial sob a fonna de cultivos melhorados. novas
drogas e medicamentos, e matérias-primas para a indústria. Mas,
além da utilidade, há também razões morais, éticas, culturais, es
téticas e puramente científicas para a conservação da vida selva
gem.
Uma prioridade básica é fazer com que o problema das espé
cies em extinção e dos ecossistemas ameaçados conste nas agen
das políticas como item da maior importância no tocante à eco
nomia e aos recursos.
Os governos podem sustar a destraição de florestas tropicais
e outras reservas de diversidade biolÓgica, e ao mesmo tempo de
senvolvê-Ias economicamente. A refonnulação dos termos de
concessão e dos sistemas de receitas florestais poderia gerar bi
lhões de dÓlares de receitas adicionais, promover um uso mais
eficiente e de longo prazo dos recursos florestais e conter o des
matamento.
O conjunto de áreas protegidas de que o mundo precisará no
futuro deve abranger áreas muito mais amplas que contem com
algwn tipo de proJeção. Assim, o custo da conservação se elevará
diretamenle e em tennos de oportunidades de desenvolvimento.
Mas a longo prazo as oportunidades de desenvolvimento serão
favorecidas. Portanto, as agêndas internacionais de desenvolvi
mento deveriam dar atenção detida e sistemática aos problemas e
oportunidades da conservação de espécies.
Os governos deveriam considerar a possibilidade de estabele
cerem uma "Convenção das E.~pécies". semelhante em espírito e
objetivos a outras convenções internacionais atinentes a princípios
relativos a Hrecursos universaisH• Também deveriam pensar em
acordos financeiros internacionais para custear a implementação
dessa convenção. (Ver capítuio 6 para uma análise mais ampla
dessas questões e recomendações.)
1.4 Energia: opçiies para o meio ambiente
e o desenvolvimento
Uma via energética segura e duradoura é indispensável ao desen
volvimento sustentável; ainda não a encontramos. As taxas de
aumento de consumo de energia estão declinando. Mas a indus
trialização, o desenvolvimento agrícola e as populações que au
mentam em ritmo acelerado nos países em desenvolvimento preci
lS
19. -- - - --- ---
~
sarão de muito mais energia, Hoje~ o indivíduo médio numa eco
nomia industrial de mercado consome mais de 80 vezes mais
energia que um habitante da África subsaariana. Portanto, qual
quer cenário energético global realista deve contar com um au
mento substancial no consumo de energia primária nos países em
desenvolvimento.
Para que, por volta do ano 2025, os países em desenvolvi
mento consumam tanta energia quanto os industrializados. seria
preciso aumentar cinco vezes o atual consumo global. O eoossis~
tema planetário não suportaria isso. sobretudo se esses aumentos
se concenmu,sem em combustíveis fósseis não-renováveis, Os ris
cos de aquecimento do planeta e acidificação do meio ambiente
muito provarelmente descartam até mesmo uma duplicação do
consumo de energia mediante as atuais combinações de fontes
primárias.
Uma nova era de crescimento econômico deve, portanto. con
sumir menos energia que o crescimento passado. As políticas de
rendimento energético devem ser a pedra-de-toque das estratégias
energéticas nacionais para um desenvolvimento sustentável, e há
muitas possibilidades de melhoria nesse sentido. As aparelhagens
modernas podem ser reformulada. de modo a fornecer o mesmo
rendimento usando apenas dois terços ou mesmo a metade dos in
sumOs energéticos primários necessários ao funcionamento dos
equipamentos tradicionais. E as medidas que visam a ampliar o
rendimento energético em geral são eficientes em função dos
custos.
Após quase 40 anos de intensQ esforço tecnológico, o uso da
energia nuclear ampliou-se bastante. Mas nesse período, a nature
za de seus custos. riscos e beneficios tomou-se mais evidente,
servindo de tema a ardentes controvérsias. Vários pafses, em todo
o mundo, adotam posições diferentes quanto ao uso da energia
nuclear. Os debates no âmbito da Comissão também refletiram es
sas opiniões e atitudes diferentes. No entanto, todos foram unâ
nimes em que a geração de energia nuclear só se justifica se hou
ver soluções seguras para os problemas que acarreta. Há que dar
prioridade máxima à busca de alternativas sensatas do ponto de
vista ambiental e ecológico, bem como de meios para tomar a
energia nuclear maís segura.
No que se refere ao rendimento energético, cabe apenas espe
rar que o mundo formule vias alternativas de baixo consumo
energétíco com base em fontes renováveis~ que deverão ser o ali
cerce da estrutura energética global do século XXI. A maioria
dessas fontes apresenta hoje problemas, mas, com inovações, p0
derão fornecer a mesma quantidade de energia primária que o
planeta consome atualmente. Contudo. para atingir esses níveis de
16
..
consumo será preciso um programa coordenado de pesquisa.. e
projetos de demonstração .que disponha dos recursos financeiros
necessários para garantir o lápido desenvolvimento da energia re
nováveL Os países em desenvolvimento terão de ser assistidos pa.
ra alterar seus padrões de consumo de energia nesse sentido.
No mundo em desenvolvimenlo, milhOes de pessoas carecem
de combustível vegetal, a principal fonte de energia doméstica de
metade da humanidade, e esse número vem aumentando. As na
ções com pouca madeira devem organizar seus setores agrícolas
de rondo a produzir grandes quantidades de lenha e outros com
bustíveis vegetais.
A atual silllação energética do mundo exige grandes mudanças,
mas, dado o papel preponderante dos governos como produlores
de energia e sua importância como consumidores, estas não serão
obtidas apenas mediante pressões do mercado. Para manter e am
pliar a tendência recente de ganhos anuais de rendimento energé
tico, os governos têm de transformá-Ia num objetivo explícito de
suas políticas de fIXação de preços de energia para os consumido
res. Há vários meios de chegar a preços que estimulem a adoção
de medidas poupadoras de energia. Embora a Comissão não ex
presse preferências, a "fixação de preços de conservação" requer
uma análise a longo prazo dos custos e beneficios das várias me
didas. Dada a importância dos preços do peb'Óleo para a política
energética internacional~ deveriam ser tentados novos mecanismos
para encorajar o diálogo entre consomidores e produtores.
Uma estratégia energética segura, viável do ponto de vista am
biental e econômico, capaz de manter o progresso humano até um
futuro distante, é evidentemente unperativa. E também possfvel.
Mas para chegar a ela serão necessários um empenho político e
uma cooperação institucional renovados. (Ver capítulo 7 para
uma análise mais ampla dessas questões e recomendações.)
l.S Indústria: com menos, produzir mais
Hoje o mundo fabrica sete vezes mais produtos do que o fazia há
'relativamente pouco tempo, nos anos 50. Considerando as taxas
de aumento populacional, será necessário elevar de cinco a 10 ve
zes a produção de manufaturados apenas para fazer com que o
consumo desses bens no mundo em desenvolvimento atinja os ní
veis do mundo industrializado quando as taxas de aumento popu
lacional se nivelarem no próximo século.
A experiência dos países industrializados demonstrou que, no
tocante aos danos evitados para a saúde, a propriedade e o meio
ambiente, a tecnologia pntipoluição foi eficiente em função dos
custos. Além disso, fez com que muitall inddstrias se tomassem
17
20. mais lucrativas por usarem os recursos com mais eficiência. Em
bora o crescimento econômico tenha prosseguido. o conswno de
matérias-primsB se manteve estável ou mesmo declinou. e novas
tecnologias prometem ser ainda mais eficientes.
As nações têm de arcar com os custos da industrialização ina·
dequada, e muitos pafses em desenvolvimento estáo percebendo
que não dispõem nem de recmsos nem de tempo - dada a rapidez
das mudanças tecnol<Sgicas - para danificar agora seu meio amo
biente e mais tarde recuperá-Io. Mas também precisam de assis
tência e de infOI1llaÇÕeS das nações industrializadas, a fim de.usar
a tecnologia da melhor forma possível. Cabe em especial às em
presas transnacionais a respollB8bilidade de facilitar a industriali
zação das nações em que operam.
As tecnologias emergentes prometem maior produtividade.
mais eficiência e menos poluição, mas muitas apresentam o riaco
de novos produtos qufmioos e rejeito. t6xicos e de graves aci·
dentes que superam em natureza e proporções os atuais mecaniS"
mos para enfrentá·los. Urge Controlar mais rigomsamente a ex
portação de produtos químicos agrícolas e industriais perigosos.
O. atuais controles sobre o despejo de rejeito. perigosos deve
riam ser mais rígidos.
Muitas das necessidades humanu básicas só podem ser atendi
das por bens e serviços industriais, e a transição para o cresci·
mento sustentável deve ser estimulada por um fluJ<O contínuo de
riqueza proveniente da indllstria. (Ver capítulo 8 para uma análise
mais ampla dessas questões e recomendações.)
2.6 O desafio urbano
Na viradà do século, quase metade da humanidade viverá em cio
dades; o mundo do século XXI será predominantemente urbano.
Em apenas 65 anos. a população urbana do mundo em desenvol
vimento decuplicou. passando de aproximadamente 100 milhões
em 1920 a I bilhão hoje. Em 1940. de cada 100 pessoas, uma vivia
em cidades com I milhão ou mais de habitantes; em 1980. isto
ocoma com uma em cada 1Q. De 1985 até o ano 2000, as cidades
do Terceiro Mundo poderão abrigar mais de 750 milhões de pes
soas. Isto indica que. nos pr6ximos anos. o mundo em desenvol
vimento precisa aumentar em 65% sua capacidade de proporcio
nar infra-estrutura. serviços e moradias urilanos apenas para
manter as condições atuais. quase sempre bastante precárias.
Poucos governos municipais do mundo em desenvolvimento
dispõem de poder, recursos e pessoal qualificado para fornecer a
suas populações em rápido crescimento as terras, os serviços e as
instalações que a qualidade da vida humana reqUer: água potável,
18
saneamento, escolas e transportes. O resultado é a pmlifemção de
assentamentos ilegais. com instalações primitivas, populações em
crescimento desenfreado e índices aiarmantes de doenças conju
gados a um ambiente insalubre. Muitas cidades do mundo .indos
trializado também enfrentam problemas: infra-estrotura em deca
dência, degeneração do tneio ambiente. deterioração dos centros
urbanos e descaracterização de bairros. Mas como dispõem dos
tneios e recursos para combater essa sitoação, o problema da
maioria dos-países industrializados restringe-se a uma opção poJ(
tica e social. Este não é o caso dos países em desenvolvimento,
que se vêem a braços com uma grave crise urilana.
Os governos terão de formular estratégias de assentamento
bem definidas para orientar o processo de urbanização. desafogar
os grandes centros urbanos e erguer cidades menores, integrando
as mais estreitamente às áreas interioranas. Isto sigoifica rever e
alterar outras polftjcas - tributação, fixação de preços de alimen
tos, transporte. saúde, industrialização -. que se opõem aos obje
tivos das estratégias de assentamento.
Uma boa administração municipal requer a descentralização
de recursos, de poder polftjco e de pessoal- em favor das autori
dades locais.'que estão em melhor sitoação para avaliar e prover
as necessidades de sua área. Mas o desenvolvimento sustentável
das cidades depende de uma cooperação mais estreita com as
maiorias pobres UIbanas, que são os verdadeiros construtores das
cidades. somando suas aptidões e recursos àqueles do "setor in
fonnal". Muito pode ser feito por tneio de projetos "comunitá
rios" que proporeionem às famílias serviços básicos em tomo dos
quais se possam construir habitações mais sólidas. (Ver capftolo 9
para uma anlllise mais ampla dessas questões e recomendações.)
3, COOPERAÇÃO INTERNACIONAL
E REFORMA DAS INSTITUIÇÕES
3.10 papel da economia Internadonal
Para que os intercâmbios econômicos internacionais beneficiem a
todas as partes envolvidas, é preciso que antes sejam atendidas
duas condições: a manutenção dos ecossistemas dos quais depen
de a economia global deve ser garantida; e os parceims econômi
cos têm de estar convencidos de que o intereâmbio se processa
numa base justa. No caso de muitos países em desenvolvimento.
nenhuma dessas condições é atendida.
Em muitos desses países, o crescimento vem sendo contido
pela queda dos preços dos produtos básicos, pelo p....tecíonismo.
19
21. pelo intolerável ônus da díVida e pela redução dos fluxos de fi
nanciamento do desenvolvimento, Para que os padrões de vida sé
elevem e aliviem a pobreza. é preciso inverter essas tendências.
Nesse sentido, cabe ao Banco Mundial e à Associação mtema
cianal de Desenvolvimento a maior parcela de responsabiIi<iaQ;:"
já que constituem o principal canal .de financiamento multilateral
para países em desenvolvimento. No que respeita a fluxos fman
ceiros constantemente ampliados, o Banco Mundial pode custear
projetos e polfticas que sejam benéficos ao meio ambiente. No to
cante ao financiamento para ajustes estruturais, o Fundo Monetá
rio mternacional deveria apoiar objetivos 'de desenvolvimento
mais amplos e de mais longo prazo que os atuais: crescímento,
metas sociais e efeitos sobre o meio ambiente.
O nível atual do serviço'da dívida de muitos países, sobretudo
na África e na América Latina, não se coaduna com o desenvol
vimento sustentável. Os devedores estão sendo instados a recorrer
a excedentes comerciais para pagar o serviço de suas dívidas e,
para tanto, exploram em excesso seus recursos não-renováveis.
São necessárias medidas urgentes para aliviar o ônus da dívida,
de mudo a que baja uma divisão mais justa de responsabilidades e
obrigações entre devedores e credores.
Os atuais acordos sobre produtos básicos poderiam ser bas
tante aperfioiçoados: mais fmanciamento compensatório para con
trabalançar os choques econômicos encorajaria os produtpres a
adotarem uma perspectiva de mais longo prazo e a não produzir
mercadorias em excesso; e os programas de diversificação p0de
riam prestar maior assistência. Os acordos exclusivamente ati
nentes a produtos básicos podem seguir o modelo do Acordo m
ternacional sobre Madeiras Tropicais, um dos poucos a incluir es
pecificamente deteI;!IÚnaç6es ecol6gicas.
As empresas multinacionais têm importante papel a desempe
nhar no desenvolvimento sustentável, sobretudo à medida que os
países em desenvolvimento passam a depender mafs de capital so
cial estraogeiro. Mas para que essas empresas influam de modo
positivo no desenvolvimento, a capacidade de negociação dos
países em desenvolvimento em relação às multinacionais deve ser
fortalecida, a flnl de que obtenham condições que respeitem seus
interesses ambientais.
Mas essas medidas específicas devem estar inseridas num
contexto mais amplo de cooperação efetiva para gerar um sistema
econômico internacional comprometido com o crescimento e a
eliminação da pobreza no mundo. (Ver capítulo 3 para uma análi
se mais ampla das questões e recomendações sobre economia in
ternacionaL)
3.2 Administrando OS bens <OmWJS
As formas tradicionais de soberania nacional geram problemas
específicos quanto à administração dos "bens comuns do globo"
e de seus ecossistemas - os oceanos,. o espaço c6smico e a Antár
tida. Já se obteve algum progresso nas três áreas, mas ainda há
muito que fazer,
A Conferência das Nações Unidas sobre Direito Marítimo foi
a tentativa mais ambiciosa jamais feita para se chegar a um regi
me internacionalmente aceito de administração dos oceanos. To
das as nações deveriam ratificar o mais rápido possível o Tratado
sobre Direito Marítimo. Seria preciso fortalecer os acordos de
, pesca para impedir a superexploração que hoje se verifica. e tam
bém as convenções para controlar e regulamentar o despejo de
rejeitos perigosos no mar.
Há uma preocupação cada vez maior com a administração do
espaço orbital, centrada no uso da tecnologia dos satélites para
controlar os sistemas planetários, no uso mais eficiente possível
das capacidades restritas da órbita geossinCfÔnica para satélites de
comunicações, e na contenção do entulho espacial. A colocação
de armas em órbita e os testes espaciais aumentariam bastante es
se entulho. A comunidade internacional deveria tentar elaborar e
pôr em prática um regime espacial que assegurasse a manutenção
do espaço corno ambiente pacífico, para o benefício de todos.
A Antártida está submetida ao Tratado Antártico de 1959.
Contudo. muitas nações que não participam desse pacto conside
ram o sistema do Tratado limitado demais. tanto no tocante à par
ticipação quanto na abrangência de suas medidas conservacionis
tas, As recomendações da CODÚssão referem-se à salvaguarda do
que já.se conseguiu, à incorporação de todas as jazidas minerais
num regime administrativo, e a várias opções para o futuro. (Ver
capítulo 10 para uma análise mafs ampla das questões e recomen
dações relativas à administração dos bens comuns.)
3.3 Paz, segurança, desenvolvimenlo e o melo ambiente
Dentre os perigos a que o meio ambiente está exposto. a possibi
lidade de uma guerra nuclear é sem dúvida o mais sério. Certos
aspectos das questões de paz e segurança relacionam-se direta
mente com o conceito de desenvolvimento sustentáveL A noção
de segurança, tal como tradicionalmente entendida - em tennos
de ameaças políticas e militares à soberania nacional -, tem de ser
ampliada para abranger os efeitos cada vez mais graves do des
gaste ambiental - em nível local, nacional, regional e mundial.
Não há soluções DÚlitares para a "insegurança ambiental".
20
21
22. No tocante à segurança, os governos e as agências internacio
nais deveriam avaliar a efICiência, em função dos custos, do di
nheiro gasto em annamentos em comparação com o dinheiro gasto
na redução da pobreza ou na recuperação de um meio ambiente
devastado.
Porém o mais importante é conseguir um melhor relaciona
mento entre as grandes potências capazes de desenvolver aIn)8S
de destruição em massa. Isto é necessário para que se chegue a
um consenso quanto ao controle mais rigoroso da proliferação e
da testagem de vários tipos de aml8S de destruição em massa
nucleares ou não - inclusive as que afetam o meio ambíente. (Ver
capítulo 11 para uma análise mais ampla das questões e recomen
dações sobre os vínculos entre paz, segurança, desenvolvimento e
meio ambiente.)
3.4 Mudança InstltucioPal e legal
Ao longo deste relatório (e especialmente no capítulo 12) há
muitas recomendações específicas para mudanças institucionais e
legais que não podem ser resumidas aqui de fonna adequada. Mas
as principais propostas da Comissão estão contidas em seis áreas
prioritárias.
3.4.1 Ch4gando àsjorues
Este é o momento de os governos começarem a responsabilizar
diretamente as principais agências nacionais, econômicas e seto
riais pela fonnulação de poHticas, programas e orçamentos que
apóiem um desenvolvimento econômico e ecologicamente sus
tentável.
Por sinal, as várias organizações regionais precisam se empe
nhar mais para incorporar plenamente o meio ambiente em suas
metas e atividades. Há necessidade sobretudo de novos acordos
regionais entre países em desenvolvimento para lidar com ques
tões ambientais que ultrapassem fronteiras.
Todos os principais organismos e agências internacionais de
veriam certificar-se de que seus programas estimulam e apóiam o
desenvolvimento sustentável,. e também aperfeiçoar muito mals
sua coordenação e cooperação. Dentro do sistema da Organização
das Nações Unidas, o Secretariado Geral deveria constitui....se em
um mlcleo de liderança de alto nível, capaz de avaliar, aconse
lhar, dar assistência e divulgar os progressos oesse sentido.
3.4.2 Lidantk> com os efeitos
Os governos deveriam também reforçar o papel e a capacidade
dos órgãos de proteção ao meio ambiente e de administração de
recursos. Isto é necessário em muitos países industrializados, po..
rém da maior urgência nos países em desenvolvimento, que preci
sarão de assistência para fortalecer suas instituições. O Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) deveria ser
prestigiado, já que é a principal fonte de coleta. avaliação e di
vulgação de dados sobre o meio ambiente, e o principal defensor
e instrumento de mudanças e de cooperação internacional em
questões criticas relativas à proteção dos recursos naturais e do
meío ambiente.
3.4.3 Avaliando os riscos globais
Deve-se aprimorar e ampliar sem demora a capacidade de identi
ficar. avaliar e dívulgar os riscos de danos irreversíveis aos siste~
mas naturais e as ameaças à sobrevivência. à segurança e ao bem
estar da comunidade mundial. Os governos, isoladamente ou em
grupo, são os principais responsáveis por isso. O Programa de
Vigilãncia Mundial, do PNUMA, deveria encabeçar o sistema de
avaliação de riscos da ONU.
Contudo, dada a delicada natureza política de muitos dos ris
cos mais graves, toma-se também necessário que os riscos globais
mais sérios sejam avaliados e divulgados de modo independente,
se bem que complementar. Para tanto, deveria ser criado um novo
programa internacional de cooperação entre organizações não-go
vemamentais, organismos científicos e grupos de indllstrias.
3.4.4 Fazentk> opções conscientes
As difíceis opções necessárias à obtenção de um desenvolvimento
sustentável dependerão do apoio e do envolvimento de um públi
co bem informado, de organizações não-governamentais, da co
munidade científica e da indtlstria. Todos eles deveriam ter am
pliados seus direitos, suas funções e sua participação no planeja
mento, na tomada de decisões e na implantação de ~rojetos de
senvolvimentistas.
3.4.5 ProvÍ<Ú!nciando os meios legais
O direito nacional e internacional ",.Iá cada vez mais defasado
devido ao ritmo acelerado e à dimensão crescente dos impactos
sobre a base ecológica do desenvolvimento. Por isso, cabe aos
22
2.3
23. governos: preencher as grandes lacunas que o direito nacional
e internacional apresenwn no tocante ao meio ambiente; buscar
meios de reconhecer e proteger os direitos das gerações presentes
e futoras a um meio ambiente adequado a sua saúde e bem-estar;
elaborar, sob oS auspfcios da ONU, uma Declaração universal s0
bre a proteção do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável,
e posteriormente uma Convenção; e aperfuiçoaros mecanismos
para evitar ou solucionar disputas sobre queslÓes relativas ao
meio ambiente e à administração de recursos.
3.4.6 Investindo em nossojururo
Na dltíma década, ficou demonstrada a eficiência glob..1, em fun
ção dos custos, dos investimentos destinados a deter a poluição.
O prejuízo crescente, tanto em tennos econômicos quanto ecoló
gicos, de não investir na proteção e melhoria do meio ambiente
wnbém já foi muitas vezes demonstrado - freqüentemente sob a
fonna cruel de inundações e fome. Mas há graves implicações fi
nancei~,seja para desenvolver a energia renovável, controlar a
poluição ou descobrir formas de agricultura que utilizem menos
recursos.
Neste sentido, o papel das instituições ftnanceiras multilaterais
é de capital importãocia. Atualmente, o Banco Mundial está in
cluindo em seus programas uma preocupação maior com o meio
ambiente. A isto se deveria somar um comprometimento básico do
Banco com o desenvolvimento sustentável. Também é essencial
que os bancos de desenvolvimento regionais e o Fundo Monetário
Internacional incluam objetivos similares em suas polítk:as e pr0
gramas. E as agências bilaterais de assistência wnbém devem
adotar novas prioridades.
Dada a dificuldade de aumentar os atuais fluxos de ajuda in
ternacional. os governos agora deveriam considerar seriamente as
propostas de obter receita adicionai com o uso dos bens CQmuns e
dos recursos naturais internacionais.
4. APELO Á AÇÁO
Ao longo deste século, o relacionamento entre o homem e o pla
neta que o sustenta passou por profunda mudança.
No início do século, nem o número de seres humanos nem a
tecnologia eram capazes de alterar radicalmente os sistemas pla
netários. No fmdar do século, não só o imenso nÚ1pero de seres
humanos e suas atividades são capazes distP, como estão ocor
rendo mudanças inesperadas na atmosfera, nos solos, nas águas.
na flora e na fauna, assim como nas relações entre todos eles. O
ritmo das mudanças vem suplantando os conhecimentos cient{fi
cos e nossa capacidade atual de avaliação e aconselhamento. Vem
frustrando as tentativas das instituições polfticas e econômicas de
se adaptarem a um mundo diferente, mais fragmentado. E causa
enorme preocupação às várias pessoas que buscam maneiras de
inserir essas questões nas agendas polfticas.
O ônus não recai sobre um grupo determinado de nações. Os
palses em desenvolvimento enfrentam as evidentes ameaças à vi
da representadas pela desertíficação, pelo desmatamento e pela
poluição, e suporwn grande parte da pobreza decorrente da dete
rioração ambiental. Toda a farnflia humana de nações sofreria ca
so desaparecessem as florestas tropicais. se extinguissem espécies
vegetais e animais e se alterassem os regimes pluviais. Os países
industrializados enfrenwn as ameaças à vida representadas por
produtos químicos tóxicos, rejeitos tóxicos e acidificação. Todas
as nações podem vir a sofrer com o lançamento na atmosfera
pelos países industrializados - de di6xido de carbono e gases que
reagem em contato com a camada de ozônio, ou então com uma
guerra futura que empregasse os arsenais nucleares controlados
por esses países. Compete a todas as nações f"".cr algo para alte
rar essas tendências e corrigir um sistema econômico internacio
nal que aumenta em vez de reduzir a desigualdade, que aumenta
em vez de reduzir o ndmero de pobres e famintos.
As próximas décadas serão vitais. É tempo de romper com os
modelos do passado. Se tentannos manter a estabilidade social e
ecológica por meio das velhas estratégias de desenvolvimento e
proteção ambiental, a instabilidade aumentará. A segurança deve
ser buscada na mudança. A Comissão relacionou uma série de
ações a serem empreendidas a fim de reduzir as ameaças à sobre
vivência e dar um rumo viável ao desenvolvimento futuro. Mas
estamos conscientes de que essa constante reorientação ultrapassa
a capacidade dos processos decisórios e dos acordos institucio
nais da atualidade, tanto nacionais Corno internacionais.
Esta Comissão cuidou em basear suas recomendações na reali
dade das instituições atuais, no que pode e deve ser feito no m0
mento. Mas para que as gerações futuras possam ter opções, a ge
ração atual deve começar a agir agora, e a agir unida.
Para que se realizem as mudanças necessárias, acreditamos ser
imperativo seguir as diretrizes contidas neste relatório. É com isto
em mente que apelamos à Assembléia Geral das Nações Unidas
para que, após as devidas considerações, transforme este relatório
num Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sus
tentável. As conferencias especiais poderiam ter infcio em âmbito
regional. Decorrido o tempo oportuno após a apresentação deste
24 25
24. -;
relatório à Assembléia Geral, uma conferência inbmlacional po
deria ser convocada para analisar os progressos obtidos e promo
ver os acordos complementares necessários ao estabelecimento de
pontos de referência e à manutenção do progresso humano.
Antes de tudo, esta Comissão preocupou-se com as pessoas
de IOdos os países e de todas as condições sociais. A elas é que
dirigimos nosso relatório. As mudanças que desejamos nas atitu
des bumanas dependelI de uma ampla campanha de educação,
debates e participação pliblica. Tal campanha deve iniciar-se ago
m, se quisennos chegar a um progresso humano sustentável.
Os membros da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e De
senvolvimento são oriundos de 21 países muito diferentes. Em
nossas discussões, discordamos com f!eqüência quanto a detalhes
e prioridades: Mas apesar da disparidade de nossas experiências e
da di""nidade de nossas responsabilidades nacionais e int.em.a
"ionais, fomos capazes de chegar a um consenso quanto ao rwoo
que se deve dar às mudanças.
É. unAnime a nossa convicção: a segurança, o bem-estar e a
própria sobrevivência do planeta dependem dessas mudanças, já..
Parte I
PREOCUPAÇÕES COMUNS
26
25. J. UM FUI'URO AMEAÇADO
Há só uma Terra, mas não um só mundo. Todos nós dependemos
de uma biosfera para conservannos nossas vidas. Mesmo at;sim,
cada comunidade, cada país luta pela sobrevivência e pela pros
peridade quase sem levar em consideração o impactb que causa
sobre os demais. Alguns consomem os recursos da Terra a um tal
ritmo que provavelmente pouco sobrará. para as gerações futuras.
Outros, em número muito maior. consomem pouco demais e vi·
Vem na perspectiva da fome, da tniséria, da doença e da morte
prematura.
Contudo, houve progressos. Em grande parte do mundo. as
crianças nascidas hoje podem esperar ter vida mais longá e edu
cação melhor que seus pais. Em muitos lugares, os recém-nasci
dos também podem esperar conseguir um padrão de vida mais
elevado, de modo geral. Esses progressos dão esperança quando
pensamos no que ainda é preciso fazer e quando avaliamos nossas
tentativas fracassadas de tornar esta Terra um lar melhor para DÓS
e para os que virão depois.
As falhas que precisamos conigir derivam da pobreza e do
modo equivocado com que temos freqüentemente buscado a pros
peridade. Muitas partes do mundo entraram numa espiral descen
dente viciosa: os povos pobres são obrigados a usar excessiva
mente seus recursos ambientais a fim de sobreviverem. e o fato de
empobrecerem seu meio ambiente os empobrece mais, tomando
sua sobrevivência ainda mais difícíl e incerta. A prosperidade
conseguida em algumas partes do mundo é com freqüência precá
ria, pois foi obtida mediante práticas agrícolas, florestais e indus··
mais que só trazem lucro e progresso a curto prazo.
As sociedades já sofreram tais pressões no passado e, como
nos recordam várias ruínas, às vezes sucumbiram a elas. Mas tais
pressões, de modo geral, eram localizadas. Hoje, a dimensão de
nossa intervenção na natureza é cada vez maior_e os efeitos fisÍ
cos de nossas decisões ultrapassam fronteiras nacionais. A cres
cente interação econômica das nações amplia as conseqüências
das decisõcs nacionais. A economia e a ecologia nos envolvem
em malhas cada vez mais apertadas. Muitas regiões correm o risco
de danos irreversíveis ao meio ambiente humano que ameaçam a
blllle do progresso humano.
Essas interconexões cada vez mais profundas são a justificati
va básica para o estabelecimento desta Cotnissáo, Viajamos pelo
29
26. mundo durante quase três anos, ouvindo as pessoas. Em audiên
cias póblicas especiais organizadas pela Comissão. ouvimos líde
res governamentais, cientistas e especialistas, ouvimos grupos de
cidadãos envolvidos em várias questões ligadas ao meio ambiente
e ao desenvolvimento. e ouvimos milhares de pessoas - agriculto
res. favelados. jovens.;ndustriaís e povos indígenas e tribais.
Encontral!JOS em toda parte uma grande preocupação com o
meio ambiente, que não sÓ levou a protestos como também, com
freqüência, gerou mudanças. O desafio que se nos apresenta é ga
rantir que esses novos valores se reflitam melhor nos princípios e
no funcionamento das estruturas políticas e econômicas.
Também encontramos motivos de e&pemnça; as pessoas que
rem cooperar na construção de um futuro mais próspero. mais
justo e mais seguro; é possível chegar a uma nova era de cresci
mento econômico, fundamentada em políticas que mantenham e
ampliem a base de recursos da Terra; Oprogresso que alguns des
frutaram no século passado pode ser vivido por todos nos próxi
mos anos. Mas para que isso aconteça, tamos de compreender
melhor os sintomas de desgaste que estão diante de DÓS. identifi
car suas causas e conceber novos métodos de administrar oS re
cursos ambientais e manter o desenvolvimento humano.
1.1 SINTOMAS li: CAUSAS
O desgaste do nieio ambiente foi com freqüência cunsiderado o
resultado da crescente demanda de recursos escassos e da polui
ção causada pela melhoria do padrão de vida dos relativamente
ricos. Mas a própria pobreza polui o meio ambiente. criando outro
tipo de desgaste ambiental. Para sobreviver, os pobres e os fa
mintos muitas vezes destroem seu próprio meio ambiente: derru
bam floresta", pennitem o pastoreio excessivo, exaurem as terras
marginais e acorrem em número cada vez maior para as cidades já
congestionadas. O efeito cumulativo dessas mudanças chega a
ponto de fazer da própria pobreza um dos maiores flagelos do
mundo.
Já nos casos em que o crescimento ecODÓmiCO permitiu a me
lhoria dos padrões de vida, isso foi por vezes conseguido à custa
de danos globais a longo prazo. As melhorias conseguidas no
passado basearam-se, em grande parte, no uso de quantidades ca
da vez maiores de matérias-primas, energia, produtos químicos e
sintéticos. e produziram urna poluição que não é adequadamente
levada em conta quando se estimam os custos dos processos de
produção. Tudo isso teve efeitos não-previstos sóbre o meio am
biente. Por isso, os problemas ambientais que enfrentamos hoje
derivam tanto da falta de desenvolvimento quanto de conseqüên
cias inesperadas de certas formas de crescimento económico.
1.1.1 Pobreza
Há hoje no mundo um número maior de pessoas famintas do que
jamais houve na história da humanidade, e este número está au
mentando. Em 1980, havia 340 milhões de pessoas, em 87 países
em desenvolvimento, que não ingeriam o número de calorias sufi
•
i cientes e por isso apresentavam deficiência de crescimento e grá
ves problemas de saóde. Esse total situava-se Iigeinamente abaixo
dos m.lmemo de 1970. em termos proporcionais à população mun
<;lial. mas em números absolutos representava um aumento de
14%. Segundo previsões do Banco Mundial, esses números de
vem continuar crescendo. I
Também cresce o número de pessoas que vivem em cortiços e
habitações miseráveis. Cada vez mais pessoas carecem de água
potável e de saneamento, ficando assim sujeitas às doenças que
tal carência pode provocar. Houve algum progresso, até impres
sionante em determinados lugares, mas de modo geral a pobreza
• continua e suas vftimas se multiplicam.
A pressão da pobreza deve ser considerada num contexto mais
amplo. Em nível internacional, há grandes disparidades na renda
per cupittl- que em 1984 variava de US$I90 nos países de baixa
renda (exceto China e tndia) até US$11.430 nas economias in
• dustriais de mercado. (Ver tabela 1.1).
Tais desigualdades representam grandes diferença., não apenas
quanto à atual qualidade de vida. mas também quanto à capacida
de das sociedades para melhorarem sua qualidade de vida no futu
m. A maioria dos países mais pobres do mundo depende, para
aumentar sua receita de exportação. de produtos agrfcolas tropi
cais vulneráveis a relações comerciai. instáveis ou em declínio.
Muitas vezes, a expansão só é possível à custa do desgaste ecoló
gico. Contudo, condições desvantajosas de transferência de tec
nologia, protecionismo e menores fluxos f"manceiros para os paí
ses que mais precisam de ímanciarnento internacioual impedem
uma diversificação que atenuaria ao mesmo tempo a pobreza e o
desgaste ecológico.2
Dentru dos paises, a pobreza foi exacerbada pela distribuição
desigual da terra e de outros bens. O rápido crescimento popula
cional prejudicou a capacidade de melhorar o padrão de vida. Es
ses fatores, aliados a uma necessidade cada vez maior de explorar
comereiaImente terras boas (muitas vezes para cultivar produtos
de exportação), levaram muitos agricultores de subsistência a se
transferirem para terras ruins, tirando-Ihes assim qualquer espe
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