Marquinhos está procurando um livro para dar de presente para sua professora no Dia dos Professores. Ao abrir vários livros na livraria mágica, ele acaba conversando com personagens literários que saem dos livros. Primeiro conversa com Bentinho de Dom Casmurro, depois com o Gato de Botas e bruxas de contos de fadas. Finalmente conversa com Arlequim, personagem que tenta enganá-lo.
1. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
A
LIVRARIA MÁGICA
DE BETHO RAGUSA
Personagens:
Elisa
Marquinhos, Luizinho, ana, bia
Bentinho (Dom Casmurro)
O Gato de Botas
A bruxa da Branca de Neve
Bruxa de João Maria
Arlequim (A história de Pierrôt, Arlequim e Colombina)
Hamlet (William Shakespeare)
O feiticeiro da Floresta de Hulcãn “Gardan” (Betho Ragusa)
2009
2. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Cena 1
(Abre o pano e Elisa entra com Marquinhos, lhe mostrando onde estão os livros).
Elisa: É pra você mesmo, ou para dar de presente?
Marquinhos: Vou dar de presente para minha professora. “Dia dos professores”.
Elisa: Ela deve ser uma excelente professora, mas talvez ela já tenha lido a
maioria os livros que aqui estão à venda...
Marquinhos: Impossível...
Elisa: Fique a vontade, e qualquer coisa me chame...
Marquinhos: Tá bom, obrigado. Esse eu já li, feliz rever livros que já li, esse
gostaria de ter lido, mas não teve oportunidade, ah Dom Casmurro, pega e senta
numa cadeira ainda com o livro fechado, pensa em voz alta) esse livro (abre) Dom
Casmurro (um garoto estranho aparece) oi?
Bentinho: Olá, sabe eu “Tinha-me lembrado a definição que José Dias dera deles,
“olhos de cigana oblíqua e dissimulada”. Eu não sabia o que era oblíqua, mas
dissimulada sabia, e queria ver se podiam chamar assim”
Marquinhos: Está brincando... É alguma brincadeira isso...
Bentinho: Nunca falei tão sério em toda minha vida. “Não me acode imagem
capaz de dizer, sem quebra da dignidade do estilo, o que eles foram e me fizeram.
Olhos de ressaca? Vá, de ressaca. É o que me dá idéia daquela feição nova.
Traziam não sei que fluido misterioso e enérgico, uma força que arrastava para
dentro, como a vaga que se retira da praia, nos dias de ressaca”.
Marquinhos: Eu sei o que é oblíqua, sorte sua, oblíqua é “falsa, dupla”. (acorda)
Como posso acreditar nisso? Como você saiu do livro? E ainda jovem...
Bentinho: Da mesma maneira que vou entrar, pela primeira página. Alguma
pergunta? Queres dar um presente para a professora, pode acreditar, ela já leu
Dom Casmurro...
Marquinhos: Quem não leu? É perfeito! Eu ralei um pouquinho...
Bentinho: Publicado em Mil oitocentos e noventa e nove, fazendo, portanto parte
do Realismo Brasileiro.
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3. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Marquinhos: Sei disso, no século dezenove, os escritores realistas desejavam
retratar o homem e a sociedade em sua totalidade. Não bastava mostrar a face
sonhadora e idealizada da vida como fizeram os românticos; era preciso mostrar a
face nunca antes revelada: a do cotidiano massacrante, do amor adúltero, da
falsidade e do egoísmo humano, da impotência do homem comum diante dos
poderosos (pode haver necessidade de um resumo mais simples do Realismo).
Mudando de assunto, sua história é considerada a obra prima de Machado de
Assis sabia?
Bentinho: Você o conhece?
Marquinhos: Não tive tempo, ainda (olha no fundo da capa) você acha que ele
pode aparecer?
Bentinho: Não é impossível, tenho muitas perguntas para fazer-lhe. Mas ele ainda
não apareceu. Já andei conversando com a Branca de neve e com a Tia Nastácia
outro dia.
Marquinhos: A Tia Nastácia do Sítio do pica-pau amarelo?
Bentinho: A própria.
Marquinhos: Sabe, se todas as pessoas do mundo lessem este livro, iriam ficar
maravilhadas, com um dicionário ao lado, claro. (lembra da parte da dúvida sobre a
traição de Capitu) você está tão feliz e enamorado, preste atenção viu, te achei
ciumento demais (Bentinho faz cara feia) Todo leitor tem uma opinião diferente
sobre o livro que lê.
Bentinho: Meu jovem, eu preciso ir... Pode me mandar de volta, por favor?
Marquinhos: Como te mandar de volta?
Bentinho: Que tal fechar o livro (ele fecha e Bentinho desaparece)
Marquinhos (boquiaberto): Estou sonhando... (se levanta, devolve o livro e
encontra “O Gato de Botas”) eu já li, será que se eu abrisse (dúvida) bom se foi
sonho não vai se repetir (abre, e ninguém aparece, mas o Gato logo surge com
suas botas e chapéu com pena) Veja o gato mais astuto dos contos de fadas. Seja
bem vindo!
Gato: Silêncio, o rei pode nos ouvir...
Marquinhos: Não se preocupe, ele não aparecerá por aqui...
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4. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Gato: Você quer ajuda, deixe-me ver o que posso fazer por você... Caçar um
coelho, duas perdizes, e espatifar com um ogro do palácio aonde existe ao redor
um enorme campo de trigo, tudo para sua professora.
Marquinhos: Seria ótimo, mas eu só quero um livro no momento.
Gato: Oh, entendo jovem , vou lhe contar uma coisa: talvez o que procure pode
estar mais perto do que você imagina. E a imaginação pode nos surpreender às
vezes. É uma arma poderosa!
Marquinhos: Eu gostaria de parabenizá-lo pelo que você fez por seu “amo”.
Provou que inteligência vale mais que um moinho e um burro.
Gato: Agradeço os votos, bem como não aceitas minha oferta, posso me retirar?
Marquinhos: Claro (fecha o livro).
Gato: Até mais ver (desaparece)
Marquinhos: Minha nossa... Que livro eu poderia abrir agora? (avista um livro)
“Branca de Neve e os sete anões”, já imaginou a bagunça que sete anões fariam
numa livraria? (abre, nada acontece) foi sonho (uma senhora entra devagar
carregando uma cesta) Eu esperava outras pessoas (faz sinal indicando anões).
Bruxa: Eu estava a caminho da casinha daqueles anõezinhos fedidos, quero dizer
anõezinhos queridos, quando você abriu o livro. Sua professora já leu esse livro,
ela e toda criatura que existir na Terra. Poderia me mandar de volta por favor?
Marquinhos: Tão simpática, gentil... É qualquer um cairia no conto do vigário, lobo
em pele de cordeiro. Eu sei o que carrega na cesta...
Bruxa (olhando pra platéia): Coitadinho, ele sabe o que carrego na cesta
(gargalha) e quem não sabe... Maças, claro. Saborosas. Aceitas uma?
Marquinhos: Não obrigado, eu não gosto de maça.
Bruxa: Neste caso, posso tirar qualquer fruta desta cesta, meu menino. Escolha
uma fruta que goste. Uma pêra, melancia... Jaca...
Marquinhos: Exagerou, jaca? Era só o que faltava...Não, obrigado. Já estou
satisfeito (levanta e pega o livro João e Maria) sabe, acho que vou trazer mais
alguém para nossa conversa, e se for quem estou pensando, será uma conversa
proveitosa (risos, abre o livro e a bruxa aparece) agora é que está ficando bom...
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5. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Bruxa: Quem será que me tirou da casinha. Eu estava prestes a verificar se João
está mais gordinho... Maria faz muita comida todo dia e nada dele engordar,
Marquinhos: Não diga senhora, ,e responda uma coisa, quem foi o mestre de
obras que construiu uma casa feita de doces com o telhado de biscoito com
sorvete?
Bruxa: Não sejas tolo meu menino. Hum, que cheiro de gente gorda...
Bruxa da Branca de Neve: É uma vergonha ter uma bruxa cega num conto de
fadas.
Marquinhos: Fique quieta, desmancha prazeres, essa é a sorte de João e Maria.
(A bruxa da Branca de neve observa tudo inconformada).
Bruxa: Se aproxime menino deixe me ver se está no ponto para ser assado
(Marquinhos procura rapidamente uma caneta em seus bolsos e estica a caneta
para que ela pegue).
Marquinhos: Eu como pouco. Quase não tenho fome. Sou seco mesmo.
Bruxa: Você poderia me acompanhar até minha humilde casa onde eu te
alimentaria com guloseimas e você ficaria bem gordinho.
Marquinhos (para a Bruxa da Branca de Neve): Eu acho que vou aceitar aquela
maça saborosa que me ofereceu há pouco.
Bruxa da Branca de neve: Impossível, só faltava além de cega ser burra...
Bruxa: Eu sou cega, não surda. Olhe para ela, vive numa terra aonde a mulher
mais bonita do mundo não é ela (gargalha) não consegue dar cabo dela nem dos
sete pigmeus desastrados. Pega leve, só podia ser a Bruxa da Branca de neve!
Bruxa da branca de Neve: São anões sua velha cega. E pelo menos não moro
numa floresta perdida aonde de vez em quando aparecem duas crianças mortas
de fome que são alimentadas sem saberem que serão o prato principal no próximo
dia, só podia ser a Bruxa de João e Maria!
Marquinhos: Ei, ei, vamos parar por aqui por favor? D. Bruxa de João e Maria, a
senhora poderia aceitar uma maça? Foi colhida agora a pouco.
Bruxa: Esta maça está envenenada meu querido...
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6. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Marquinhos: Ah, você conhece a história.
Bruxa: Eu avisei que não sou burra nem surda, só um pouco cega. Vou voltar para
lá, venha comigo, o convite ainda está valendo, venha comer guloseimas, sorvetes,
bombons e caramelo, chocolate... Você ficará junto com João, e poderão brincar o
dia todo.
Marquinhos: Oh bruxa insistente! Vai embora (fecha o livro).
Bruxa da branca de neve: Se não for comer a maça, me devolva! Preciso ir,
tenho uma visita para fazer...
Marquinhos: Espere um momento, leve isso para a branca de Neve (escreve um
bilhete e entrega a Bruxa) não leia, é falta de educação...
Bruxa da branca de Neve (lendo): “Não aceite maças, estão todas envenenadas”
(gargalha) Ótima tentativa garoto.
Marquinhos: Sua Bruxa! (fecha o livro).
Bruxa da Branca de Neve: Pois não, ouço alguém me chamando (gargalha e sai).
Marquinhos: Bruxas... São todas iguais... (continua a procura) “Viagem ao centro
da terra”, não... “Vinte mil léguas submarinas”, socorro. Tenho medo de água.
“Quem roubou meu queijo?” Eu não fui... (e vai lendo as capas e fazendo
observações engraçadas, até que encontra um com a capa chamativa) Pierrot,
Arlequim e Colombina, será que a professora já leu? (abre, e nada acontece até
que Arlequim lhe dá um susto) Danado! Queria me matar do coração?
Arlequim: Aposto vinte pratas que você não conseguirá encontrar um livro para
ela...
Marquinhos: Sou otimista, e você um vigarista, meu nome é Marcos, mas pode
me chamar de Marquinhos.
Arlequim: Meu nome é Arlequim, mas pode me chamar do que quiser, posso ser
qualquer coisa que imaginar...
Marquinhos: Não passa de um galanteador, um malandro, que só apronta
bobagens e depois remenda tudo...
Arlequim (drama): Me recebes assim com esses elogios? (leva os dedos aos
olhos retirando as lágrimas e depositando num saquinho de pano, entregando a
Marquinhos em seguida).
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7. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Marquinhos: Lágrimas, de um homem arrependido (Marquinhos abre e o saquinho
gruda na mão dele (Arlequim ri sem limites) você me paga seu trapaceiro (Arlequim
dança e faz acrobacias enquanto ri) Muito esperto você!
Elisa (entrando): E essa barulheira, (vê Arlequim) quem é esse?
Arlequim: Permita me apresentar, (reverencia) sou Arlequim ao seu dispor
senhorita (tira um buquê de flores murchas de algum lugar e entrega para ela que
fica encantada)
Elisa: Quanta gentileza...
Marquinhos: Vamos agilizar. Elisa, ele é um personagem fanfarrão, preguiçoso e
tenta convencer todo mundo de sua ingenuidade e estupidez...
Elisa: Imagine, é um homem incrível...
Arlequim: É Marquinhos, sou um homem do bem (abraça Elisa, mas Marquinhos
os separa).
Marquinhos: Por que eu fui abrir esse livro? Sr. Gentileza, poderia me dar um
minuto de sua atenção? E Elisa... Poderia voltar para a recepção?
Elisa (saindo brava): Estraga prazeres... (mostra a língua).
Marquinhos: Eu te trouxe para me ajudar, lembra?
Arlequim: Arlequim sabe de tudo. Essa professora, ela assim.. É bonita?
Marquinhos: Tenha modos, você realmente não serve para me ajudar, volte para
o lugar de onde veio (Arlequim esconde o livro, Marquinhos começa a procurar)
aonde está o livro?
Arlequim: Que livro? (olha para os lados) não vi livro algum.
Marquinhos: Ai se arrependimento matasse (pensa) Sabe, vou trazer a Caipora
para dar um jeito em você! (ele devolve, Marquinhos fecha o livro e ele sai em
disparada) Ufa, já pensou passar uma semana ao lado desse traste? Pobre
Colombina, coitado de Pierrôt. (pega outro livro): Hamlet, William Shakespeare,
será que minha professora já leu esse? (abre).
Hamlet (entrando): “Ser ou não ser, eis a questão” (...).
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8. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Marquinhos: Me desculpe, mas gente indecisa aqui é o que menos preciso. De
indeciso já basta eu. E você sabe que procuro um livro, a livraria toda já sabe.
Hamlet (ignorando-o): “Ser ou não ser, eis a questão... Será mais nobre em nosso
espírito sofrer pedras e setas. Com que a Fortuna, enfurecida, nos alveja, ou
insurgir-nos contra um mar de provocações, e em luta por-lhes fim? Morrer...
dormir: não mais”.
Marquinhos (fechando o livro): Esta é uma das frases mais famosas da literatura
mundial.
Hamlet: Garoto corajoso este. Vou pegar minha espada e como dizem vocês, “vou
picar a mula”.
Marquinhos: Esse deve passear demais por aqui, já está até falando nossas
gírias... (procura mais livros, encontra um): Não conheço este. “Taressãnimus – Do
fundo do mar”, imponente, misterioso (abre).
Gardan: Ah, meu jovem... Tempos difíceis chegarão para os escolhidos...
Marquinhos: Que escolhidos?
Gardan: Este livro conta a história de uma antiga civilização que foi amaldiçoada
por uma sacerdotisa que traiu um reino antigo.
Marquinhos: Interessante, conte-me mais...
Gardan: Há um segredo no fundo do mar Cáspio. Há mais de quatro mil anos, a
sacerdotisa prendeu toda a civilização num livro e afundou a cidade toda no mar.
Marquinhos: Aventura épica...
Gardan: Não tão épico assim, os escolhidos para libertar Taressãnimus são de seu
mundo.
Marquinhos: Que massa! Vou dar este livro a minha professora (fecha o livro, o
feiticeiro se retira, Marquinhos deixa um livro aberto, e Elisa também fecha a
livraria).
Algum tempo depois...
Marquinhos: Professora: quero lhe dar um presente. (tira o embrulho e entrega).
Heloísa: Um livro! Obrigada.
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9. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
Marquinhos: Feliz Dia dos Professores. A senhora vai adorar a história...
Heloísa (abraçando-o): Obrigada.
E não muito longe dali...
Bruxa da Branca de neve: Estou perdida, (tira uma maça do bolso, olha com ar
falso): Alguém aceita uma maça, saborosa... Garanto que não é envenenada
(gargalha).
FIM
Nota: A concepção dessa peça trouxe aos atores e a todos os envolvidos o prazer
de ler. Algumas obras possuem mini-série, filmes baseados, etc... Leia, releia, os
livros destacados. Dom Casmurro nunca foi tão interessante e analisar as idéias e
pesquisar sobre Realismo Brasileiro foi tão divertido quanto encenar.
Elisa é jovem e está cansada de ver personagens perambulando por lá.
Marquinhos é o aluno nota dez, inteligente e tem sede de conhecimento. Heloísa é
uma professora meiga e atenciosa. Enfim, são personagens normais e basta uma
pitada de criatividade para criá-los.
Os personagens que saem dos livros são conhecidos (caso contrário conheça-os),
com excessão de “Gardan” feiticeiro sério e sábio que conta a história de sua terra
natal, Taressãnimus. Possui um cajado com uma pedra branca na ponta e carrega
um tacho de onde vê tudo que acontece. Era o feiticeiro responsável por proteger a
Ilha de Shore uma ilha que guarda muitos tesouros e o equilíbrio entre o bem e o
mal.
EM BREVE...
A LIVRARIA MÁGICA ll
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10. “T e m o s q u e f a z e r d o B r a s i l u m p a í s d e l e i t o r e s”
O INTRUSO
Parece que alguém permaneceu no mundo real, e agora... O que será dessa
livraria... E até do mundo...
Marquinhos terá uma missão na continuação da história... Como será que ele
irá se comportar? Afinal cinco anos se passaram...
Aguarde!
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