Síntese Crítica ao livro de Seymour Papert "A Máquina das Crianças: Repensand...
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1. Zygmunt Bauman: "Há uma crise de atenção"
Por Bruno Alfano/O Globo - 14.09.2015|
Uma busca no Google com os termos “modernidade líquida" rende 187 mil
resultados em 0,34 segundo. São, todos eles, “fragmentos deconhecimento",
na visão do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, que discursounestesábado
no evento Educação 360.
O pensador defendeu que os educadores precisam estimular determinadas
características que ficam prejudicadas com a utilização da tecnologia,
"paciência, atenção e a habilidade de ocupar esse local estável, sólido, no
mundo que está em constante movimento. É preciso trabalhar a capacidade
de se manter focado." Leia mais abaixo:
— A educação é vítima da modernidade líquida, que é um conceito meu. O
pensamento está sendo influenciado pela tecnologia. Há uma crise de
atenção, porexemplo. Concentrar-se e se dedicar porum longo tempo é uma
questão muito importante. Somos cada vez menos capazes de fazer isso da
forma correta — disse o pensador. — Isso se aplica aos jovens, em grande
parte. Os professores reclamam porque eles não conseguem lidar com isso.
Até mesmo um artigo que vocêpeça para a próxima aula eles não conseguem
ler. Buscam citações, passagens, pedaços.
Como o próprio Bauman mencionou, a modernidade líquida — definida nos
resultados do Google como a época em que vivemos, caracterizada por
“volatilidade" , “incerteza" e “insegurança" — norteou as obras do filósofo;
2. ele escreveu cerca de 30 livros apenas em torno dessa maneira de enxergar a
contemporaneidade.
— Não há como contestar que a internet nos trouxe grandes vantagens. A
facilidade de acesso à informação, a facilidade comque podemos ignorar as
distâncias... Lembro-me de que, quando era jovem, passava muito tempo na
biblioteca tentando ler cem livros para encontrar um pedacinho de
informação de que precisava. Agora, bastapedir para o Google. Em décimos
de segundo ele dá milhares de respostas. Um problema foi eliminado: nós
não precisamos passarhoras na biblioteca. Mas há um novo problema. Como
vou compreender essas milhares de respostas? — questionou Bauman, logo
recorrendo à Grécia Antiga para para continuar. — Só agora, idoso, consegui
entender Sócrates: “Só sei que nada sei".
Há ainda, na visão de Bauman, outras crises que chegam com a internet e
precisam ser superadas. O filósofo defende que vivemos com cada vez
menos paciência, pela quantidade de informação que recebemos ao mesmo
tempo. E, quando não temos isso, o resultado é a irritação.
— Sedemoramos mais deum minuto para acessara internet quando ligamos
o computador, ficamos furiosos. Um minuto só! Nosso limiar de paciência
diminuiu. As informações mais bem-sucedidas, que têm mais probabilidade
de serem consumidas, são apenas pedaços — diz o polonês. — Outra coisa
é a persistência. Conseguir algo contém em si um número de fracassos que
faz comque você percatempo e tenha que recomeçar do zero. E isso é muito
complicado. Não é fácil manter essa persistência nesse ambiente com tanto
ruído e tantas informações que fluem ao mesmo tempo de todos os lados.
Todo essenovo cenário, explicou o pensadoràplateia deeducadores, desafia
e transforma a posição secular do docente. Para Bauman, “não há como
voltar à situação em que o professor é o único conhecedor, a única fonte, o
único guia". E dá caminhos:
— Não há como conceber a sociedade do futuro sem tecnologia. Então, se
não pode vencê-la, una-se a ela. Tente contrabalancear o impacto negativo,
como a crise da atenção, da persistência e de paciência. É preciso ter
determinadas qualidades se você deseja construir conhecimento e não só
agregá-lo: paciência, atenção e a habilidade de ocupar esse local estável,
3. sólido, no mundo que está em constante movimento. É preciso trabalhar a
capacidade de se manter focado.
Educação desigual
Hoje, de acordo com o filósofo, a educação reproduz privilégios em vez de
aperfeiçoar a sociedade. Ele lembra que, nos EUA, 70% dos alunos na
universidade vêm das classes mais altas, enquanto só 3% são das camadas
de renda mais baixa. Segundo Bauman, essa é “uma forma de reafirmar a
desigualdade social", tema do livro “A riqueza de poucos favorece a todos
nós?", o mais recente lançamento (no mês passado) do escritor no Brasil.
— Uma das tarefas da educação é conferir a todas as pessoas que tenham
talento a possibilidade de adquirir conhecimento para que isso acabe tendo
um uso criativo para a sociedade. Mas esse objetivo não está sendo
perseguido em muitos lugares. Na Grã-Bretanha, os preços, em vez de
diminuírem para as pessoas com menos dinheiro, vão subindo. E cada vez
menos pais têm a possibilidade de economizar a quantia necessária para seus
filhos cursarem a universidade.
O problema, segundo Bauman, é que a educação está pressionada pela
política e pelos interesses corporativos. E isso, explica ele, se reflete na
mente do estudante. O polonês critica o fato de os alunos escolherem a área
de estudos baseados “no fato de se vão conseguir emprego ou não".
— Se você quer conhecimentos especializados, que são as condições para
um bom emprego, precisa estudar quatro ou cinco anos, e isso requer muito
esforço. Mas, se você está sendo guiado pelo atual estado de coisas, tudo vai
mudar nesse tempo de estudo. E você vai perceber que não vai conseguir
encontrar um uso rentável para o tipo de qualificação e habilidade que
adquiriu nesses anos de trabalho árduo na faculdade — argumenta.
Mesmo após toda essalista de desafios, a mensagem que o dono de uma das
mais influentes mentes no mundo deixou para o auditório na noite de ontem
foi de pura esperança:
— Educar, senhoras e senhores, é fazer um investimento nos próximos cem
anos.