O documento discute as novas leis que regulamentam os direitos dos trabalhadores domésticos no Brasil. As leis garantem sete novos direitos como adicional noturno, FGTS e seguro-desemprego. Apesar dos avanços, muitos trabalhadores domésticos ainda enfrentam informalidade e dilatação de horários. A juíza Maria Edilene diz que a consciência dos direitos entre os trabalhadores está aumentando, levando a mais processos na justiça.
1. GERAIS
4
BELÉM, DOMINGO, 12 DE JULHO DE 2015
DIREITO GARANTIDO EM LEITRABALHADORESDOMÉSTICOSCOMEMORAMCONQUISTAS,MASAINDAESBARRAMNAINFORMALIDADENARELAÇÃOCOMOSPATRÕES
rotina sacrificante do traba-
lho doméstico, com normas
e direitos distorcidos e esca-
las e horários dilatados, começa
a virar coisa do passado. Mudan-
ças recentes nas leis que regem a
relação entre patrões e emprega-
dos garantem à classe conquistas
que uma década atrás pareciam
distantes. Em junho, a presiden-
te Dilma Rousseff sancionou a lei
150/2015, que regulamenta os di-
reitos dos trabalhadores domés-
ticos garantidos com a promulga-
çãodaEmendaConstitucionalnº.
72, em abril de 2013, que ficou co-
nhecida como PEC das Domésti-
cas. Entre outros avanços, a nova
leiigualaacategoriaaostrabalha-
doresruraiseurbanos.
O Dia Internacional do Traba-
lhador Doméstico, comemorado
no próximo dia 22, é, também,
uma celebração de conquistas. A
PEC das Domésticas deu, a todo
trabalhador doméstico, sete no-
vos direitos fundamentais: adi-
cional noturno; obrigatoriedade
do recolhimento do FGTS por
parte do empregador; seguro-
desemprego; salário-família; au-
xílio-creche e pré-escola; seguro
contraacidentesdetrabalho;ein-
denização em caso de despedida
semjustacausa.
“A gente é trabalhador como
todo mundo. Na casa em que tra-
balho, faço tudo, tenho ainda tem-
po de descanso, de ver televisão e
de cuidar de mim. Estou lá há cin-
co anos e, desde 2013, assinaram
minha carteira de trabalho e ficou
melhorporquemedámaisdireitos
esegurança”,contaFátimaDuarte,
40anos,quetrabalhaemumacasa
defamíliaemBelém.
Entre as determinações da
nova lei, está o prazo de 120 dias,
contados a partir de 1º de junho
de 2015, para regulamentar o cha-
mado Simples Doméstico, um sis-
temanoqualtodasascontribuições
(incluindo FGTS, seguro contra
acidentes de trabalho, INSS e fun-
do para demissão sem justa causa,
além do recolhimento do Imposto
deRendadevidopelotrabalhador),
serão reunidos. Elas serão pagas
pelo empregador em um único
boleto bancário, a ser gerado pela
internet. O Ministério do Traba-
lho publicará portaria sistemati-
zando o pagamento e facilitando
avidadepatrõeseempregados.
“A gente étrabalhadorcomotodo mundo”, diz Fátima Duarte, que teve a carteira assinada há dois anos
AKIRAONUMA/AMAZÔNIA
CLEIDE MAGALHÃES
da redação
A
AS NOVAS REGRAS DO TRABALHO NO LAR
Quem é trabalhador doméstico?
Pela legislação brasileira, empregado doméstico é aquele que presta serviços
de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito
residencial destas (artigo 1º da Lei 5.859 de 11/12/1972). São considerados como
empregadosdomésticoscozinheiros,governantas,babás,alavadeiras,faxineiras,
motorista particular, enfermeiros do lar, jardineiros, copeiros e caseiros (quando o
sítio ou local de trabalho não possua finalidade lucrativa).
Salário
Tem o direito de receber, ao menos, um salário mínimo ao mês, inclusive
quem recebe remuneração variável.
Jornada de trabalho
Deve cumprir jornada de 8 horas diárias e 44 horas semanais.
Hora extra
Tem direito a receber pelas horas extras trabalhadas, com adicional de 50%
sobre a hora. Não pode exceder 2 horas extras por dia.
Intervalo
Mínimo de 1 hora e máximo de 2 horas. O horário de intervalo não é contabi-
lizado na jornada de trabalho.
Segurança no trabalho
Tem direito a trabalhar em local onde sejam observadas todas as normas de
higiene, saúde e segurança
FGTS
Tem direito ao depósito do FGTS por parte do empregador, de 8% do salário.
Discriminação
Não pode sofrer diferenças de salários, de exercício de funções e de critério
de admissão por motivos de sexo, idade, cor ou estado civil ou para portador de
deficiência
Adicional noturno
O projeto define trabalho noturno como o realizado entre as 22h e as 5h. A
hora do trabalho noturno deve ser computada como de 52,5 minutos - ou seja,
cada hora noturna sofre a redução de 7 minutos e 30 segundos ou ainda 12,5%
sobre o valor da hora diurna. A remuneração do trabalho noturno deverá ter acrés-
cimo de 20% sobre o valor da hora diurna.
Seguro desemprego
O seguro desemprego poderá ser pago durante no máximo três meses.
Salário-família
O texto também dá direito ao salário-família, que é um benefício pago pela
PrevidênciaSocial.OtrabalhadorautônomocomrendadeatéR$725,02ganhaR$
37,18 por filho de até 14 anos incompletos ou inválidos. Quem ganha acima desse
valor R$ 1.089,72 tem direito a R$ 26,20 por filho.
Auxílio-creche e pré-escola
O pagamento de auxílio-creche dependerá de convenção ou acordo coletivo
entre sindicatos de patrões e empregadas.
Indenização em caso de demissão sem justa causa
O empregador deverá depositar mensalmente 3,2% do valor do salário será
em uma espécie de poupança que deverá ser usada para o pagamento da multa
dos 40% de FGTS que hoje o trabalhador tem direito quando é demitido sem justa
causa. Se o trabalhador for demitido por justa causa, ele não tem direito a receber
os recursos da multa e a poupança fica para o empregador.
A quantidade de processos
quechegamàJustiçadoTrabalho
da 8ª Região envolvendo patrões
e empregados domésticos cresce
a cada ano. Em 2013, foram aber-
tos 1.281 processos, 107 processos
pormês,3pordia.Em2014,foram
2.024processos-169pormês.Em
2015, até abril, 550 foram recebi-
dos,umamédia138pormês.
De acordo com a juíza Maria
Edilene de Oliveira Franco, ti-
tular da 8ª Vara do Trabalho de
Belém, o aumento é reflexo não
somente da ampliação de direi-
tos, mas também de uma maior
consciência da categoria. “Antes,
o Brasil dispunha de uma classe
de subempregados, praticamente
emsituaçãodeservidão,sendoque
esta ampliação de direitos é um
avançohistóricoecivilizatório.Era
inconcebível que no século XXI, os
domésticosvivessemàmargemda
seguridade trabalhista no Brasil.
Está praticamente equiparado o
emprego doméstico com os traba-
lhadoresgerais.AConsolidaçãodas
LeisdoTrabalho(CLT)existedesde
1945 e não era estendida para eles.
Com a nova lei, ampliaram-se os
direitos”, acrescenta Maria Edilene
deOliveiraFranco.
EMPREGADO ESTÁ MAIS CONSCIENTE DE SEUS DIREITOS, DIZ JUÍZA
Ocontroledejornadapodeser
feito de três formas: manual, me-
cânico e eletrônico. Segundo José
RobertoDias,diretordaAssociação
Brasileira das Empresas Fabrican-
tes de Equipamentos Eletrônicos
de Ponto (Abrep), por causa da de-
mora na regulamentação da PEC
dasDomésticas,de2013a2014,au-
mentou em apenas 10% a procura
peloRegistradorEletrônicodePon-
to (Reps), aparelho que controla de
formaefetivaamarcaçãode ponto
e emite um cupom, um recibo
da marcação do horário. Com a
aprovação da lei, a expectativa é
que a procura pelo Reps aumente
em pelo menos 7%.
“Prevemosvender137milapa-
relhos para o mercado brasileiro,
dos quais 90% para empresas e
10% para uso de empregadores
domésticos. O Pará adquire pelo
menos cinco mil equipamentos
porano,dosquais500paraemprega-
dordoméstico”,explicaJoséDias.
CONTROLE DE JORNADA DE TRABALHO PODE SER FEITO MANUALMENTE
Outro problema que a nova lei
vai tornar mais nítido é o da dila-
tação de horários. “A nova lei traz
a obrigatoriedade do cartão de
ponto manual ou eletrônico. Essa
questão deve ter uma alternativa,
porquemuitosempregadoresnão
têm como fiscalizar os emprega-
dos porque trabalham o dia in-
teiro fora. Se a lei traz a obrigato-
riedade do cartão de ponto, para
poder provar a jornada, o empre-
gador terá que trazer o cartão de
ponto. Então, a orientação é que
os empregadores coloquem um
cartão de ponto, porque o traba-
lho que tinha muita informalida-
de agora precisa ter um contrato
escrito, como a compensação de
jornada, o trabalho de 12 por 36
horas e a diminuição do interva-
lo entre a jornada, que é de uma
hora, e nessa lei para doméstica
foi autorizado que sejam 30 mi-
nutos. Mas isso sempre passa por
essa formalização, de acordar no
contrato escrito”, orienta a juíza
Maria Edilene de Oliveira Franco,
titular da 8ª Vara do Trabalho de
Belém. “É importante sempre ga-
rantir recibo”, explica a juíza Ma-
ria Edilene Franco. “Se a pessoa é
um empregador hoje tem que ter
todos os cuidados que uma em-
presadevetercomseusemprega-
dos. Muitas vezes o empregador
atépagouosdireitos,masnãotem
esses cuidados e, na Justiça,preci-
sadecomprovações”,ressalta.
ASSOCIAÇÃO ESPERA AUMENTO DE DEMANDA