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Niemeyer
Coluna do senador Aécio Neves na Folha de São Paulo, em 19 de dezembro de 2012
Tenho o privilégio de conhecer Oscar Niemeyer e tive a felicidade de, quando governador,
levar de volta a Belo Horizonte seu legendário traço e seu extraordinário talento, eternizados
na realidade que é hoje a Cidade Administrativa, sede do governo de Minas, onde trabalham
16 mil servidores do Estado.
O reencontro de Niemeyer com Belo Horizonte teve, para muitos de nós, o sentido de um
reatamento amoroso. E daqueles que valem a pena. Foi na ainda acanhada capital mineira dos
anos 40 que o jovem arquiteto começou a dar vazão ao seu potencial de artista muito à frente
de seu tempo.
Sob a égide de Juscelino Kubitschek, o arquiteto novato concebeu -dizem que num pequeno
quarto de hotel- o magistral conjunto modernista da Pampulha, que marcou para sempre a
identidade da capital de Minas.
Daí floresceria a profícua parceria que produziu outro monumento ao futuro: Brasília. Dois
visionários, Juscelino e Niemeyer. De gente assim carece sempre uma nação que pretende ser
grande.
Niemeyer é uma das nossas raríssimas unanimidades: diferentes gerações de mineiros e
brasileiros guardam por ele um afeto incondicional.
Aos 104 anos, completados na última quinta-feira, mestre Oscar -ele insiste na informalidade
do primeiro nome-continua ativo. É dono de um humor invencível e de uma alegria de viver
que se renova, para os amigos, num permanente festival de surpresas.
Há pouco tempo, ele decidiu enveredar por nova experiência: a de cantor. A vida de Niemeyer
guarda importante lição para muitos de nós.
Somos, de certa forma, reféns do dia a dia. Nem sempre nos sobram tempo e disposição para
romper com o cotidiano e vislumbrar o que se descortina à nossa frente. Encastelados no
território confortável do presente, nos assalta, muitas vezes, a perplexidade do futuro.
Diante de tantos desafios, acabamos correndo o risco de nos rendermos às dificuldades,
quando deveríamos, sempre, transformar o nosso inconformismo em ousadia. São
personagens como Oscar Niemeyer, mensageiros da utopia, que nos ensinam, de forma
didática, diariamente, minuciosamente, a compreender os sobressaltos da modernidade.
Nosso arquiteto-símbolo captou a essência do Brasil em seu desenho sinuoso, com citações de
silhuetas femininas e de estruturas tão leves que parecem se equilibrar sob as nuvens -inimigo
declarado que sempre foi da linearidade cartesiana. A diferenciação de sua obra o tornou
único e elevou o Brasil a um novo patamar no mundo da arquitetura.
Leio que Oscar brinca que “104 anos ou 80 é a mesma coisa para quem gostaria de ter 20″. A
verdade é que, aos 104, ele tem a intensidade dos 20. Continua sendo um homem de muitas
paixões: a maior delas, o povo brasileiro.

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  • 1. Niemeyer Coluna do senador Aécio Neves na Folha de São Paulo, em 19 de dezembro de 2012 Tenho o privilégio de conhecer Oscar Niemeyer e tive a felicidade de, quando governador, levar de volta a Belo Horizonte seu legendário traço e seu extraordinário talento, eternizados na realidade que é hoje a Cidade Administrativa, sede do governo de Minas, onde trabalham 16 mil servidores do Estado. O reencontro de Niemeyer com Belo Horizonte teve, para muitos de nós, o sentido de um reatamento amoroso. E daqueles que valem a pena. Foi na ainda acanhada capital mineira dos anos 40 que o jovem arquiteto começou a dar vazão ao seu potencial de artista muito à frente de seu tempo. Sob a égide de Juscelino Kubitschek, o arquiteto novato concebeu -dizem que num pequeno quarto de hotel- o magistral conjunto modernista da Pampulha, que marcou para sempre a identidade da capital de Minas. Daí floresceria a profícua parceria que produziu outro monumento ao futuro: Brasília. Dois visionários, Juscelino e Niemeyer. De gente assim carece sempre uma nação que pretende ser grande. Niemeyer é uma das nossas raríssimas unanimidades: diferentes gerações de mineiros e brasileiros guardam por ele um afeto incondicional. Aos 104 anos, completados na última quinta-feira, mestre Oscar -ele insiste na informalidade do primeiro nome-continua ativo. É dono de um humor invencível e de uma alegria de viver que se renova, para os amigos, num permanente festival de surpresas. Há pouco tempo, ele decidiu enveredar por nova experiência: a de cantor. A vida de Niemeyer guarda importante lição para muitos de nós. Somos, de certa forma, reféns do dia a dia. Nem sempre nos sobram tempo e disposição para romper com o cotidiano e vislumbrar o que se descortina à nossa frente. Encastelados no território confortável do presente, nos assalta, muitas vezes, a perplexidade do futuro. Diante de tantos desafios, acabamos correndo o risco de nos rendermos às dificuldades, quando deveríamos, sempre, transformar o nosso inconformismo em ousadia. São personagens como Oscar Niemeyer, mensageiros da utopia, que nos ensinam, de forma didática, diariamente, minuciosamente, a compreender os sobressaltos da modernidade. Nosso arquiteto-símbolo captou a essência do Brasil em seu desenho sinuoso, com citações de silhuetas femininas e de estruturas tão leves que parecem se equilibrar sob as nuvens -inimigo declarado que sempre foi da linearidade cartesiana. A diferenciação de sua obra o tornou único e elevou o Brasil a um novo patamar no mundo da arquitetura. Leio que Oscar brinca que “104 anos ou 80 é a mesma coisa para quem gostaria de ter 20″. A verdade é que, aos 104, ele tem a intensidade dos 20. Continua sendo um homem de muitas paixões: a maior delas, o povo brasileiro.