Daniela Lima, Arquitecta, Mestrado em Urbanismo e Desenvolvimento pela UCL. Foi a prelectora no Espaço do Debate a Sexta feira do dia 07 de Dezembro. Ao longo da sua aclaração, falou sobre a urbanização e a dimensão social dos espaços religiosos em Luanda, conflitos e negociações na co-produção do espaço urbano, fruto do seu trabalho final para o nível de Mestre em Urbanismo e Desenvolvimento
2. “...Talvez daqui a 50 anos não haja nenhuma Igreja em Angola.”
Presidente AntónioAgostinho Neto, 21 de Maio, 1977
3. “As igrejas são importantes parceiros do Estado, sobretudo
quando cumprem o seu papel espiritual e social. Devemos
estudar as medidas necessárias para impedir que certas
denominações e seitas religiosas confundam fé com
negócio e actividade espiritual e social com actividade
empresarial.”
Presidente João Lourenço, 16 de Outubro, 2017
4. “... as instituições religiosas surgem (e/ou actuam), como lugares de
refúgio e/ou escapatórias, redes de solidariedades e,
necessariamente, sistemas de respostas aos anseios que de um
modo geral afligem as sociedades e as comunidades em particular.”
INAR, 2010, p.12
5.
6. A DIMENSÃO SOCIAL DA RELIGIÃO
DURKHEIM MARX FOUCAULTALTHUSSER WEBER
Fenómeno social e coletivo
Crenças e ideais morais
comuns partilhados por uma
comunidade – coesão social
Representações colectivas
que expressam realidades
colectivas da sociedade
Crenças, rituais e a ‘Igreja’ (as
pessoas)
Dualidade - Sagrado e
profano
“o ópio do povo”
A Religião como
compensação/consolação/jus
tificação
Resposta ao sofrimento
causado pela opressão
Uma classe dominante que
controla os meios de
produção e as ideias,
incluindo a religião que é
também usada para reforçar
a liderança e a hierarquia
existente e dominar as
massas
Estabelece uma relação
entre Ideologia e Economia
“Ideological State
Apparatus”
Analisa a Educação como
uma ferramenta usada para
promover a ideologia do
Estado e os interesses
económicos dominantes,
legitimando as hierarquias de
classes existentes
A Religião enquanto
ideologia constituinte do
mundo social é também uma
força que contribui para o
sistema capitalista
“uma representação da
relação imaginária entre os
indivíduos e as suas reais
condições de existência”
Estudou especialmente as
relações de poder existentes
na religião e definiu a
religião como uma força
política
Estudou o sistema pastoral
cristão no mundo ocidental e
como este deu origem a uma
forma de poder e disciplina,
produzido através de
processos de
individualização
’apparatus’, ‘dispositif’ e
‘governamentality’
O poder pastoral influenciou
a sociedade e foi a base para
os sistemas de governação
moderna
A influência da religião
protestante na formação da
sociedade capitalista e vice-
versa
Conexões entre capitalismo,
razão e conhecimento
cientifico, modernidade,
individualismo e
industrialização
“Descontentamento do
mundo”
Crenças tradicionais são
esquecidas e abandonadas
Ideias que alimentam a
‘teoria da secularização’
7. TEORIA DA SECULARIZAÇÃO
BERGER
Assistiu-se a uma ‘universalização’ de perspectivas ‘eurocêntricas’ da religião
Considerando que a religião estaria associada ao colectivo, e a modernidade estaria associada à
individualização da sociedade, muitos consideraram que a religião iria diminuir ou desaparecer –
‘Teoria da Secularização’.
O Secularismo enquanto princípio de estado, define-se como a separação entre a autoridade
política e religiosa e assegura a liberdade religiosa para todos os cidadãos – conceito semelhante ao
Laicismo.
A Secularização é uma teoria que descreve um processo societário e histórico de diminuição de
religiosidade
Definiu dois tipos de Secularização:
1 – Processo em que determinados sectores da
sociedade e cultura saem do domínio das Instituições
religiosas – exemplo: Igrejas cristãs sujeitas a
expropriação de propriedade e objectos, perda de
controle sobre a educação, separação da autoridade
política
2- Perda de crença, fé e significado e interesse na
religião – ‘secularização da consciência’.
Outros estudos contrariaram a teoria da secularização
alargando a análise a outros contextos indicando que
em alguns locais não só a religiosidade não reduziu
mas cresceu
Surgem as críticas à teoria da secularização
8. CRÍTICAS ÀTEORIA DA
SECULARIZAÇÃO
CASANOVA LUCKMAN HABERMASSTARKE E FINKE KNOTT
O mundo não pode ser
considerado eurocêntrico, não
existindo apenas um conceito
de modernidade mas sim
‘múltiplas modernidades’
diferentes
Identifica uma outra forma de
religião ‘invisível’, a religião
ganha uma forma privada e
individualizada
Contrariam a teoria da
secularização, indicando que
o que existe é um pluralismo
religioso, mais diversidade e
não diminuição
O religioso e o secular existem
em simultâneo e deve fazer-
se uma pesquisa mais
localizada e contextualizada
A divisão entre
público/privado é que levou à
ideia da religião como algo da
consciência individual e a
concepção de uma arena
pública de ‘não-religião’
KING
A invenção das teorias da secularização resultou no
afastamento e exclusão da religião da esfera
política levando em alguns casos à erosão da
autoridade das religiões institucionalizadas
BUCHARDT
As cidades são o local para desconstruir as teorias
unilaterais e as versões modernistas da secularização
‘A cidade religiosa moderna’ - Diversidade causada
por migração histórica e transnacional e globalização
– pluralismo religioso
ORSI
‘religião urbana’ – cidade é o lugar para visões e
vozes contrastantes e convergentes, práticas e
orientações, que emergem de desejos complexos,
necessidades e medos de muitas pessoas
diferentes
9. DIMENSÕES ESPACIAIS E URBANAS
KNOTT
BUCHARDT E
HOHNE
A religião é social e deve existir e manifestar-se no espaço e através do espaço, é preciso analisar o espaço no tempo e em relação com outros espaços
É necessário analisar as práticas que definem as fronteiras do sagrado e as convenções de público e privado, analisar a cultura as acções e discursos para identificar as
categorizações e negociações do espaço
Olhar para além de uma abordagem universalista e relacionar espaço – sociedade - política – economia
Propõe o uso da tríade do espaço de Lefebvre, aplicada à análise do espaço religioso
Locais e Edifícios religiosos são mediadores de relações sociais e interligam pessoas numa rede, como uma infraestrutura, facilitando práticas usos e trocas, e são
símbolos materiais que devem comunicar com públicos diversos.
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14. De acordo com a Constituição, Angola é um Estado Laico, que
reconhece e respeita o pluralismo religioso com todas as
diferentes denominações, que são livres de organizar e
desenvolver as suas actividades, desde que estas respeitem a
Constituição, no entanto, existe uma Lei que estabelece que as
confissões devem ser reconhecidas pelo estado.
Eventos recentes têm trazido o assunto da proliferação religiosa
a debate. De acordo com um Relatório da Assembleia Nacional
apresentado em 2017, o Governo Angolano controla
actualmente mais de 1000 denominações religiosas e cerca de
827 continuam ilegais ou à espera de reconhecimento.
Discussões recentes incluem: a relação entre religião e política,
uma percepção negativa de ‘proliferação’ enquanto
denominações já estabelecidas se sentem ameaçadas por novas
denominações ou ‘seitas’, a alegada imposição de influências
‘estrangeiras’ não alinhadas com os valores locais, a criação de
negócios em vez da promoção da fé ou falsas promessas de
‘milagres’ e ‘cura’.
15. Implantação do Cristianismo
DURANTE O PERÍODO COLONIAL
ANTES DA CHEGADA DO CRISTIANISMO
RELIGIÃO EM ANGOLA
Igreja Católica é implementada por Missionários
O Catolicismo é a religião oficial do regime colonial
No séc. XIX as Missões Protestantes começam a implementar-se no País
Exemplos: Baptistas no norte, Metodistas em Luanda, Congregacionais no centro
1ª metade do séc. XX :
Evolução do domínio Católico
Estabelecimento de Missões Protestantes
Penetração de movimentos proféticos de origem africana – Kimbanguismo e Tocoísmo
Movimentos de libertação apoiados por movimentos religiosos protestantes
“um universo religioso” (Henderson,2013)
Diversas formas de expressão
Rituais e crenças específicos praticados por diferentes grupos
Diversidade associada à localização
Modo de vida comunitário, valorização de laços de parentesco e antepassados
16. Controle, regulação e parcerias
1980 - 2002
DURANTE A GUERRA CIVIL
A partir de 1980, o Governo assume uma atitude de controle e regulamentação
Em 1987 são reconhecidas pelo Estado 12 denominações cristãs
Principalmente após 1991 as Instituições religiosas assumem um papel de parceiro do estado
Parceria na distribuição de serviços, assistência social e ajuda humanitária
Mesquitas Islâmicas estabelecem-se em Luanda
Liberalização da economia e abertura do País
Chegada de movimentos neopentecostais, carismáticos e revivalistas
“confronto ideológico” (Henderson, 2013)
1975 - 1980
PÓS – INDEPENDÊNCIA / INÍCIO DE GUERRA CIVIL
Em causa estavam assuntos de controle simbólico e também material
Regime socialista de partido único de ideologia ‘Marxista-Leninista’
Esforços para remover a religião da esfera pública
Nacionalização e confisco de propriedade pertencente a instituições religiosas
Perseguição e prisão de líderes religiosos
Entre 1975 a 1980 – repressão – religião sobrevivia a portas fechadas
A guerra civil coloca movimentos históricos protestantes em lados opostos, Metodistas e
Congregacionalistas estabelecem influências em diferentes lados políticos
17. proliferação
2002 - ….
PÓS-GUERRA
A guerra destruiu as infraestruturas físicas e humanas
Num contexto de desigualdade e pobreza as Instituições religiosas assumem um papel
importante apoiando as comunidades
Com a migração e a imigração, a proliferação e a diversidade religiosa aumentam
principalmente nas principais cidades do país
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29. As relações entre o Estado e as Instituições religiosas foram sempre marcadas por alguma tensão e competição
e o que hoje pode parecer uma parceria na distribuição de serviços sociais e sensibilização cívica inclui também
uma negociação de interesses e de dependência mútua
Os espaços visitados, embora pertencentes a diferentes correntes (católica, histórico-protestante e islâmica) e
com diferentes localizações (Cazenga, Golfe I, Mártires) têm todos um carácter infraestrutural
Existe uma relação entre localização e legitimidade institucional, áreas peri-urbanas ou de carácter mais
informal são a opção disponível para denominações não reconhecidas pelo Estado, enquanto o centro da cidade
ou áreas urbanas mais consolidadas são ocupadas pelas denominações reconhecidas ou com boas relações com
o Estado
As relações (históricas e actuais) com o Estado e a legitimidade institucional juntamente com a capacidade
financeira influenciam a localização e as funções dos espaços religiosos
A localização influencia na formação da identidade dos espaços religiosos, influenciando a forma como o espaço
é concebido, vivido e percebido
30. Elementos que contribuíram para o aumento da presença da espaços religiosos em Luanda:
Sentido comunitário da sociedade que assume a religião como algo colectivo e parte do quotidiano
A guerra civil causou uma crise humanitária e uma população em busca de suporte
O Estado não conseguiu assegurar as necessidades da população “expectativas sociais não realizadas”
As Instituições religiosas serviram de suporte e ofereceram apoio e serviços à população estando presentes
onde o Estado não estava, com capacidade de mobilização, sistemas de organização estabelecidos e redes
nacionais - preencheram vazios
Carácter infraestrutural dos espaços religiosos que acabam por funcionar como espaço público, de socialização
e redes de solidariedade
O sistema de registo de denominações religiosas e regulação de actividades religiosas não funcionou como
esperado