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Amor de Perdição, Camilo Castelo Branco
Algumas notas
 Amor de Perdição tem como tema predominante o amor. Não o amor feliz, de
salvação, mas antes, como o título indica, um amor que leva à desgraça, à perdição. Com
efeito, o amor narrado nesta obra de Camilo é o amor-paixão, ou seja, é um amor vivido
intensamente, até às últimas consequências; é um amor que se alimenta do sofrimento,
da expiação e da morte. Aliás, os três amantes, figuras centrais da intriga amorosa -
Simão, Teresa e Mariana - serão vítima desse sentimento exacerbado.
 A obra é constituída por:
 uma intriga principal, que diz respeito aos amores contrariados entre Simão
Botelho e Teresa de Albuquerque;
 uma intriga secundária, que surge por encaixe e se reporta à história de amor
do irmão do protagonista, Manuel Botelho, e uma açoriana.
A intriga secundária surge com o propósito de sublinhar o contraste que existe entre
Simão Botelho, o herói romântico, e Manuel Botelho, valorizando, naturalmente, o
primeiro.
2
Progressão da intriga amorosa
 Simão Botelho vê Teresa pela primeira vez “para
amá-la sempre”. Teresa ama-o também. [Cap. II]
Introdução
O Amor
 Teresa recusa casar com Baltasar Coutinho, o outro
pretendente, desobedecendo, assim, ao pai. É ameaçada
de clausura. Simão decide ir a Viseu ver Teresa. [Cap. IV]
 Encontro com Baltasar Coutinho. [Cap. V]
Armadilha preparada por Baltasar Coutinho para matar
Simão. Simão fica ferido. [Cap. VI]
 Entrada de Teresa num convento em Viseu. [Cap. VII]
 Teresa é informada de que vai ser transferida para o
convento de Monchique no Porto. [Cap. IX]
 Antes da partida para o Porto, Simão decide ir ver
Teresa ao convento. Confronto com Baltasar Coutinho.
Simão mata Baltasar e entrega-se à Justiça. [Cap. X]
 Simão é preso. [Cap. XI]
 Simão é condenado à forca. [Cap. XII]
 Teresa chega ao convento de Monchique e sabe da
condenação de Simão. Simão é transferido para a Cadeia
da Relação do Porto. Estado frágil de Teresa, alterado
perante a perspetiva de salvação que Simão lhe transmite
numa carta. [Cap. XIII]
 Tadeu de Albuquerque pretende levar a filha para
Viseu. Teresa é irredutível: não sai do convento. [Cap.
XIV]
 Simão é condenado ao degredo. [Cap. XVI]
 Simão recusa cumprir 10 anos de prisão em Vila Real.
[Cap. XVIII]
 Partida para o degredo. Morte de Teresa. [Cap. XX]
 Morte de Simão e de Mariana. [Conclusão]
Desenvolvimento
A Perdição
Conclusão
A Morte
3
Simão: a construção do herói romântico
Partindo do carácter arruaceiro de Simão, da sua prisão e condenação ao degredo,
Camilo construiu um verdadeiro herói romântico, definido pelos seguintes traços:
temperamento violento e imprudente - “génio sanguinário” [Cap. I];
virilidade - “Os quinze anos de Simão têm aparências de vinte. É forte de compleição”
[Cap. I]
rebeldia - Simão escolhe os seus amigos e companheiros “na plebe de Viseu” e
“zomba das genealogias” [Cap. I]; na academia “convive com os mais famosos
perturbadores” [Cap. I]; mesmo o seu amor por Teresa não deixa de ser um ato rebelde,
um desafio à ordem estabelecida;
força dos sentimentos e impulsividade - Simão deixa-se governar e dominar pelos
sentimentos, sejam eles o amor-paixão, a raiva (quando mata Baltasar), a gratidão (para
com João da Cruz, pela proteção e disponibilidade demonstradas, e para com Mariana,
pela atenção e cuidados) ou a piedade (por exemplo quando diz a João da Cruz para não
matar o criado de Baltasar Coutinho);
bravura - Simão não teme ir ao encontro de Teresa à noite ou ir vê-la ao convento;
nobreza de carácter - depois de matar o seu rival, Simão recusa fugir, entrega-se à
justiça e assume o seu ato; mesmo depois de condenado, inicialmente à forca e depois
ao degredo, aceita a pena de não tenta nunca obter benevolência devido às ligações
familiares;
fatalidade - apesar de Simão ter mudado radicalmente de comportamento em virtude
de se ter perdido de amores por Teresa, o amor-paixão provocar-lhe-á estados de raiva
e de violência que o conduzirão ao crime (assassinato de Baltasar), ao castigo (degredo),
e em última instância à própria morte; por outro lado, todos os que dele se aproximam
terão o mesmo destino fatal (João da Cruz, Teresa e Mariana) e Simão tem bem
consciência disso: “Tanta gente desgraçada que eu fiz...” [Conclusão];
valorização do amor e da verdade - Simão vive o amor como um absoluto, como uma
religião; é algo de sagrado e por isso está disposto a sacrificar-se por esse sentimento; o
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amor representa a verdade, a verdade do coração e dos sentimentos, que se opõe à
razão e à honra, tal como as concebiam o seu pai e o pai de Teresa.
Capítulos I, IV, X e XIX: pontos fundamentais
CAPÍTULO I
A família de Simão Botelho
“Domingos José Correia Botelho de Mesquita e Meneses, fidalgo de linhagem, e
um dos mais antigos solarengos de Vila Real de Trás-os-Montes, era, em 1779, juiz de
fora de Cascais, e nesse mesmo ano casara com uma dama do Paço, D. Rita Teresa
Margarida Preciosa da Veiga Caldeirão Castelo Branco, filha dum capitão de cavalos, e
neta de outro, António de Azevedo Castelo Branco Pereira da Silva, tão notável por sua
jerarquia, como por um, naquele tempo, precioso livro acerca da Arte da Guerra.”
 Finalidade do Capítulo I: estabelecer os antecedentes da intriga amorosa,
apresentando a família, a sua genealogia e o próprio protagonista.
 Domingos José Correia Botelho de Mesquita e Meneses: pai de Simão e de Manuel
Botelho, casado com D. Rita Teresa Margarida Preciosa da Veiga Caldeirão Castelo
Branco; “era extremamente feio”; “faltavam-lhe bens de fortuna” (situação financeira
desfavorável); rude; sabia tocar flauta - “Domingos Botelho devia ter uma vocação
qualquer, e tinha: era excelente flautista; foi a primeira flauta do seu tempo; e a tocar
flauta se sustentou dois anos em Coimbra...”
 D. Rita Teresa Margarida Preciosa da Veiga Caldeirão Castelo Branco: mãe de Simão
e Manuel Botelho, casada com Domingos José Correia Botelho de Mesquita e Meneses;
formosa.
 Relação entre os pais de Simão: o narrador fala em “desgostoso viver” do qual
resultaram, todavia, cinco filhos; relata ainda breves episódios sobre a vivência do casal,
sobretudo em Vila Real.
5
 É mencionado um tio paterno de Simão Botelho, Luís Botelho, que cometera
homicídio. Em nota de rodapé, o autor coloca o seguinte: “Há vinte anos que eu ouvi de
um coevo do facto a história do assassínio, assim contada: Era em Quinta-Feira Santa.
Marcos Botelho, irmão de Domingos, estava na festa de Endoenças, em S. Francisco,
defrontando com uma dama, namorada sua, e desleal dama que ela era. Noutro ponto
da igreja estava, apontado em olhos e coração à mesma mulher, um alferes de
infantaria. Marcos enfreou o seu ciúme até ao final do ofício da Paixão. À saída do
templo encarou no militar e provocou-o. O alferes tirou da espada, e o fidalgo do
espadim. Terçaram as armas longo tempo sem desaire, nem sangue. Amigos de ambos
tinham conseguido aplacá-los, quando Luís Botelho, outro irmão de Marcos, desfechou
uma clavina no peito do alferes, e ali, à entrada da «rua do Jogo da Bola», o derribou
morto. O homicida foi livre por graça régia.”
 Neste capítulo, ficamos ainda a saber que “Formara-se Domingos Botelho em 1767,
e fora a Lisboa ler no Desembargo do Paço, iniciação banal dos que aspiravam à carreira
da magistratura. Já Fernão Botelho, pai do bacharel, fora bem aceite em Lisboa, e
mormente ao duque de Aveiro, cuja estima lhe teve a cabeça em risco, na tentativa
regicida de 1758. O provinciano saiu das masmorras da Junqueira ilibado da infamante
nódoa[...]”.1 A menção de factos históricos, neste caso a tentativa de regicídio de 1758,
1
No dia 3 de setembro de 1758, D. José I seguia incógnito numa carruagem que percorria uma rua
secundária nos arredores de Lisboa. O rei regressava para as tendas da Ajuda de uma noite com a amante
a “marquesinha” Távora, D. Teresa Leonor. Pelo caminho, a carruagem foi intercetada por três homens,
que dispararam sobre os ocupantes. D. José I foi ferido num braço, o seu condutor também ficou ferido
gravemente, mas ambos sobreviveram e regressaram à Ajuda. Sebastião José de Melo (Marquês de
Pombal) tomou o controle imediato da situação, que aproveitou para retirar poder à família nobre dos
Távoras, acusando-os de regicídio e traição. Poucos dias depois do atentado, dois homens foram presos
e torturados. Os homens confessaram a culpa e que tinham tido ordens da família dos Távoras, que
estavam a conspirar pôr o duque de Aveiro, José Mascarenhas, no trono. Ambos foram enforcados no dia
seguinte, mesmo antes da tentativa de regicídio ter sido tornada pública. Nas semanas que se seguem, a
marquesa Leonor de Távora, o seu marido, o conde de Alvor, todos os seus filhos, filhas e netos foram
encarcerados. Os conspiradores, o duque de Aveiro e os genros dos Távoras, o marquês de Alorna e o
conde de Atouguia foram presos com as suas famílias. Gabriel Malagrida, o jesuíta confessor de Leonor
de Távora foi igualmente preso.
Foram todos acusados de alta traição e de regicídio. A sentença ordenou a execução de todos, incluindo
mulheres e crianças. Apenas as intervenções da Rainha Mariana e de Maria Francisca, a herdeira do trono,
salvaram a maioria deles. A marquesa, porém, não seria poupada. Ela e outros acusados que tinham sido
sentenciados à morte foram torturados e executados publicamente em 13 de janeiro de 1759 num
descampado, perto de Lisboa, próximo à Torre de Belém.
6
é uma estratégia seguida pelo autor-narrador para conferir veracidade àquilo que
narra.2
Caracterização de Simão: o “génio sanguinário”
“Em 1801, achamos Domingos José Correia Botelho de Mesquita corregedor em
Viseu.
Manuel, o mais velho de seus filhos, tem vinte e dois anos, e frequenta o segundo
ano jurídico. Simão, que tem quinze, estuda humanidades em Coimbra. As três meninas
são o prazer e a vida toda do coração de sua mãe.
O filho mais velho escreveu a seu pai queixando-se de não poder viver com seu
irmão, temeroso do génio sanguinário dele. Conta que a cada passo se vê ameaçado na
vida, porque Simão emprega em pistolas o dinheiro dos livros, convive com os mais
famosos perturbadores da academia, e corre de noite as ruas insultando os habitantes
e provocando-os à luta com assuadas. O corregedor admira a bravura do seu filho Simão,
e diz à consternada mãe que o rapaz é a figura e o génio de seu bisavô Paulo Botelho
Correia, o mais valente fidalgo que dera Trás-os-Montes.”
 Simão é, deste modo, desde o primeiro momento caracterizado como um rebelde,
um arruaceiro, um jovem conduzido por impulsos e violência. Contudo, o pai admira-o
e compara-o a outra figura da família - o bisavô.
Simão: o herói romântico
A caracterização de Simão continua, sublinhando o seu perfil de herói romântico:
“Os quinze anos de Simão têm aparências de vinte. É forte de compleição; belo
homem com as feições de sua mãe, e a corpulência dela; mas de todo avesso em génio.
Na plebe de Viseu é que ele escolhe amigos e companheiros. Se D. Rita lhe censura a
indigna eleição que faz, Simão zomba das genealogias, e mormente do General
Caldeirão que morreu frito. Isto bastou para ele granjear a malquerença de sua mãe. O
2
O mesmo verificamos no início da obra, quando o autor, Camilo Castelo Branco, afirma ter encontrado
a informação sobre Simão Botelho nos registos da Cadeia da Relação do Porto, enquanto esteve preso
devido à sua relação adúltera com Ana Plácido.
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corregedor via as coisas pelos olhos de sua mulher, e tomou parte no desgosto dela, e
na aversão ao filho. As irmãs temiam-no, tirante Rita, a mais nova, com quem ele
brincava puerilmente, e a quem obedecia, se lhe ela pedia, com meiguices de criança,
que não andasse com pessoas mecânicas.”
 Deste excerto, ressalta a relação entre Simão e os pais e entre o jovem e a irmã. É
neste contexto familiar que nascerá o amor de Simão por Teresa e esse contexto acabará
por influenciar o desenlace desse mesmo amor.
 O capítulo termina com a narração de um “grande dissabor”: o episódio da
pancadaria na fonte, um “trágico espetáculo” que serve para acentuar o “génio
sanguinário” do herói e ainda para explicar, posteriormente, o ódio entre os Botelho e
os Albuquerque, uma vez que alguns dos homens que Simão espancou eram criados de
Tadeu de Albuquerque, pai de Teresa.
CAPÍTULO IV
Caracterização de Teresa: a heroína romântica
O capítulo IV inicia-se com considerações do narrador que revelam a sua
omnisciência:3
“O coração de Teresa estava mentindo. Vão lá pedir sinceridade ao coração!
Para finos entendedores, o diálogo do anterior capítulo definiu a filha de Tadeu de
Albuquerque. É mulher varonil, tem força de carácter, orgulho fortalecido pelo amo,
despego das vulgares apreensões, se são apreensões a renúncia que uma filha faz do
alvedrio às imprevidentes e caprichosas vontades de seu pai. Diz boa gente que não, e
eu abundo sempre no voto da gente boa. Não será aleive atribuir-lhe uma pouca de
astúcia, ou hipocrisia, se quiserem; perspicácia seria mais correto dizer. Teresa adivinha
que a lealdade tropeça a cada passo na estrada real da vida, e que os melhores fins se
atingem por atalhos onde não cabem a franqueza e a sinceridade. Estes ardis são raros
na idade inexperta de Teresa; mas a mulher do romance quase nunca é trivial, e esta,
3
Narrador omnisciente é aquele que conhece toda a história e detalhes da trama, sabendo até o que
cada uma das personagens pensa ou sente.
8
de que rezam os meus apontamentos, era distintíssima. A mim me basta, para crer em
sua distinção, a celebridade que ela veio a ganhar à conta da desgraça.”
 O narrador claramente sabe o vai no coração de Teresa e conta-o ao leitor (narrador
omnisciente), ao mesmo tempo que a caracteriza psicologicamente e de forma muito
elogiosa, configurando o perfil da heroína romântica: Teresa tem “força de carácter”,
orgulho e perspicácia. Mas, como o narrador anuncia, cairá em desgraça, como heroína
romântica que é.
 No capítulo anterior (Cap. III), depois de revelar a seu primo Baltasar Coutinho que
não o ama e que por isso não pode casar com ele, Teresa é ameaçada pelo pai de ir para
um convento. Porém, acaba por prometer “julgar-se morta para todos os homens,
menos para seu pai”. É precisamente a essa promessa que o narrador alude quando
menciona que “O coração de Teresa estava mentindo. Vão lá pedir sinceridade ao
coração!”. Isto revela a perspicácia de Teresa ao mentir ao pai para evitar consequências
menos agradáveis. Devido a esta atitude, ...
“Parecia bonançoso o céu de Teresa. Seu pai não falava em claustro nem em
casamento. Baltasar Coutinho voltara ao seu solar de Castro Daire. A tranquila menina
dava semanalmente estas boas-novas a Simão, que, aliando às venturas do coração as
riquezas do espírito, estudava incessantemente, e desvelava as noites arquitetando o
seu edifício de futura glória.”
O conflito entre Teresa e o pai
A bonança termina, contudo, num domingo de junho de 1803. Nessa manhã,
Teresa é surpreendida por estas palavras do pai:
“- Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha. É preciso que
te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres este passo difícil,
conhecerás que a tua felicidade é daquelas que precisam de ser impostas pela violência.
Mas repara, minha querida filha, que a violência de um pai é sempre amor. Amor tem
sido a minha condescendência e brandura para contigo. Outro teria subjugado a tua
desobediência com maus tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque
do teu grande património. Eu, não. Esperei que o tempo de aclarasse o juízo, e felicito-
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me de te julgar desassombrada do diabólico prestígio que acordou o teu inocente
coração.”
 O discurso de Tadeu de Albuquerque mostra bem como funcionava a sociedade
naquela época, uma sociedade regida pela violência, pela submissão total da mulher ao
pai e/ou ao marido. E é precisamente essa sociedade que Camilo critica e contra a qual
Simão e Teresa se manifestam.
 Na sequência das palavras de seu pai, a resposta de Teresa é elucidativa dessa
posição que denota um desejo de mudança e de afirmação da sua liberdade: “[...] Meu
pai... [...] mate-me; mas não me force a casar com meu primo. É escusada a violência,
porque eu não caso!...”
 Neste diálogo entre Teresa e o pai, Tadeu de Albuquerque, é visível o indício de que
o amor entre Simão e Teresa está condenado, que é um amor de perdição, pois Teresa
fala em “sacrifício”, ódio e “morte”, palavras com uma forte conotação ominosa.4
Caracterização de Simão: rebeldia e paixão
Neste capítulo, assistimos ainda à reação de Simão perante este acontecimento.
Ao saber, por carta, do sucedido e inclusive das ameaças de Baltasar, Simão, que tinha
sofrido uma mudança espantosa em virtude do amor, assume de novo o seu “génio
sanguinário”, a sua rebeldia:
“O académico, chegando ao período das ameaças, já não tinha clara luz nos olhos
para decifrar o restante da carta. Tremia sezões, e as artérias frontais arfavam-lhe
entumecidas. Não era sobressalto do coração apaixonado: era a índole arrogante que
lhe escaldava o sangue. Ir dali a Castro Daire e apunhalar o primo de Teresa na sua
própria casa, foi o primeiro conselho que lhe segredou a fúria do ódio. Neste propósito
saiu, alugou cavalo, e recolheu a vestir-se de jornada. Já preparado, a cada minuto de
espera assomava-se em frenesis. [...] «E tudo há de acabar assim? - pensava ele, com a
face entre as mãos, encostado à sua banca de estudo. - Ainda há pouco eu era tão feliz!...
4
Ominoso: que anuncia ou traz mau agouro, desventura, infelicidade; agourento, funesto, nefasto.
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Feliz! - repetiu ele, erguendo-se de golpe. - Quem pode ser feliz com a desonra duma
ameaça impune?!... Mas eu perco-a! Nunca mais eu hei de vê-la... Fugirei como um
assassino, e meu pai será meu primeiro inimigo, e ela mesma há de horrorizar-se da
minha vingança... A ameaça só ela a ouviu; e, se eu tivesse sido aviltado no conceito de
Teresa pelos insultos do miserável, talvez que ela os não repetisse...»
Simão Botelho releu a carta duas vezes, e à terceira leitura achou menos
afrontosas as bravatas do fidalgo cioso. As linhas finais desmentiam formalmente a
suspeita do aviltamento com que o seu orgulho o atormentava [...].
Quando o arrieiro bateu à porta, Simão Botelho já não pensava em matar o
homem de Castro Daire; mas resolvera ir a Viseu, entrar de noite, esconder-se e ver
Teresa.”
 No calor do momento é a sua “índole arrogante” e o seu orgulho que despertam; é a
faceta do herói romântico que sobressai. Simão pensa em matar o seu rival, num
prenúncio que acabará por acontecer, mas reflete melhor e conclui que o seu orgulho e
a sua honra não estavam manchados. Por isso, muda o seu plano e decide ir a Viseu.
 Neste ponto da narrativa são introduzidas duas novas personagens: o ferrador João
da Cruz, em casa de quem Simão se instala nos arredores de Viseu; e a mendiga, elo de
ligação entre Simão e Teresa, visto que será esta que entrega as cartas de ambos daí em
diante.
 Simão é visto, neste capítulo, sob um outro ângulo, também ele característico do
herói romântico - o de jovem apaixonado, puro, tímido, ansioso. Teresa, ao saber que
Simão estava em Viseu, marca um encontro com ele5, à noite, no quintal. Simão “não
esperava tanto” e o seu coração fica “sobressaltado”:
“Não esperava tanto o académico. O que ele pedir era falar-lhe da rua para a janela do
seu quarto, e receava impossível este prazer, que ele avaliava o máximo. Apertar-lhe a
mão, sentir-lhe o hálito, abraçá-la talvez, cometer a ousadia de um beijo, estas
5
Este encontro é narrado no Capítulo V.
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esperanças, tão além de suas modestas e honestas ambições, igualmente o enleavam e
assustavam.”
CAPÍTULO X
 Neste capítulo, é narrado o assassinato de Baltasar Coutinho, o qual conduzirá,
inevitavelmente, o protagonista ao seu destino fatal.
O encontro de Mariana e Teresa
 A ação desenrola-se nas imediações ou no convento de Viseu, onde se encontra
Teresa de Albuquerque. Mariana vai ao seu encontro, servindo de intermediária entre
ela e Simão.
 O diálogo entre Teresa e Mariana evidencia a nobreza dos sentimentos desta última:
o seu amor por Simão (“Se eu fosse amada como ela...”) e a sua dignidade ao recusar a
oferta de Teresa de um anel de ouro (“A receber alguma paga há de ser de quem me cá
mandou. Fique com Deus, minha senhora, e oxalá que seja feliz.”).
 Mariana é portadora da notícia da transferência de Teresa para o convento de
Monchique, no Porto, a ocorrer nessa madrugada. Ao saber disto, e apesar de Teresa
ter pedido a Simão o contrário, ele decide ir vê-la antes da sua partida, instigado pelo
facto de o primo a acompanhar nessa viagem:
“A filha do ferrador deu o recado, e sem alteração de palavra. Simão escutara-a
placidamente até ao ponto em que ela disse que o primo Baltasar a acompanhava ao
Porto.
- O primo Baltasar!... - murmurou ele com um sorriso sinistro. - Sempre este primo
Baltasar cavando a sua sepultura e a minha!...
- A sua, fidalgo?! - exclamou João da Cruz. - Morra ele, que o levem trinta milhões
de diabos! Mas vossa senhoria há de viver enquanto eu for João. [...]
- Eu hei de vê-la antes de partir para Coimbra - disse Simão.
- Olhe que ela recomendou-me muito que não fosse lá - acudiu Mariana.
- Por causa do primo? - tornou o académico ironicamente.”
12
Simão: a perdição por amor
Se anteriormente Simão conseguira dominar a sua raiva em relação ao seu rival, ela
renasce impelida pela honra e pelo coração (“eu hei de fazer o que a honra e o coração
me aconselharem”). Por isso, embora João da Cruz tente, com a sua simples filosofia de
vida, persuadir Simão de que não vale a pena perder-se por amor (“Paixões... que as
leve o diabo, e mais quem com elas engorda. Por causa de uma mulher, ainda que ela
seja filha do rei, não se há de um homem botar a perder.”), o jovem académico não se
demove da sua posição e a carta que escreve a Teresa, nessa noite, confirma-o:
“«Considero-te perdida, Teresa. O sol de amanhã pode ser que eu o não veja.
Tudo, em volta de mim, tem uma cor de morte. Parece que o frio da minha sepultura
me está passando o sangue e os ossos.
Não posso ser o que tu querias que eu fosse. A minha paixão não se conforma com
a desgraça. Eras a minha vida: tinha a certeza de que as contrariedades me não privavam
de ti. Só o receio de perder-te me mata. O que me resta do passado é a coragem de ir
buscar uma morte digna de mim e de ti. Se tens força para uma agonia lenta, eu não
posso com ela.
Poderia viver com a paixão infeliz; mas este rancor sem vingança é um inferno.
Não hei de dar barata a vida, não. Ficarás sem mim, Teresa; mas não haverá um infame
que te persiga depois da minha morte. Tenho ciúmes de todas as tuas horas. [...]
Tu verás esta carta quando eu estiver num outro mundo, esperando as orações
das tuas lágrimas. As orações! Admiro-me desta faísca de fé que me alumia nas minhas
trevas!... Tu deras-me com o amor a religião, Teresa. Ainda creio; não se apaga a luz que
é tua; mas a providência divina desamparou-me. [...]»”
 Simão deixa-se dominar pelo rancor, pelos ciúmes. O tom da carta é de desespero,
angústia e amargura. O amor-paixão de Simão e Teresa é, pois, um amor associado ao
sofrimento, à desgraça, ao sacrifício e à morte. É uma espécie de religião - a religião do
amor - como o próprio protagonista afirma (“Tu deras-me com o amor a religião.”).
 Todas as cartas que surgem ao longo da narrativa são de extrema importância
porque:
 dão-nos a conhecer o mundo interior das personagens;
13
 apresentam, por vezes, factos já conhecidos do leitor, mas sob uma nova
perspetiva;
 conferem variedade e riqueza ao discurso, alternando com o diálogo, a
narração e os poucos momentos de descrição.
 Determinado e impelido pela força do destino (“Hei de sair, porque me mataria, se
não saísse.”; “O destino há de cumprir-se... Seja o que ´Céu quiser.”), como herói
romântico que é, Simão, deixa, então, a casa do ferrador durante a noite e dirige-se ao
convento de Viseu. Mariana pressente o que vai acontecer, mas nada pode fazer (“É a
última vez que ponho a mesa ao senhor Simão em minha casa!”; “Choro, porque me
parece que o não tornarei a ver; ou, se o vir, será de modo que oxalá que eu morresse
antes de o ver.”)
Confronto entre Simão e Baltasar
 Defronte do convento, vemos, pelos olhos de Simão, o encontro entre Teresa de
Albuquerque, o pai e o primo. Teresa mantém-se inabalável perante o pai (“[...] O meu
destino é o convento. Esquecê-lo nem por morte. Serei filha desobediente, mas
mentirosa é que nunca.”) e frontal e crítica perante o primo (“[...] porque os covardes
escondem-se nas costas dos criados que se deixam matar.”)
 Tudo se encaminha para o momento decisivo - o confronto entre os dois rivais (Simão
Botelho e Baltasar Coutinho. Num diálogo vivo e de poucas linhas, o narrador relata os
insultos e ofensas trocadas entre Simão e Baltasar que culminaram no assassinato deste
último.
“Baltasar, espavorido do encontro, fitando os olhos nele, duvidava ainda.
- É incrível que este infame aqui viesse! - exclamou o de Castro Daire.
Simão deu alguns passos, e disse placidamente:
- Infame... eu! e porquê?
- Infame, e infame assassino! - replicou baltasar. - Já fora da minha presença!
- É parvo este homem! - disse o académico. [...]
- Que diz este patife?! - exclamou Tadeu.
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- Vem aqui insultá-lo, meu tio! - respondeu Baltasar. - Tem a petulância de se
apresentar a sua filha a confortá-la na sua malvadez! Isto é de mais! Olhe que eu
esmago-o aqui, seu vilão!
- Vilão é o desgraçado que me ameaça, sem ousar avançar para mim um passo -
redarguiu o filho do corregedor.
- Eu não o tenho feito - exclamou enfurecidamente Baltasar - por entender que
me avilto, castigando-o na presença de criados de meu tio, que tu podes supor meus
defensores, canalha!
- Se assim é - tornou Simão, sorrindo -, espero nunca me encontrar de rosto com
sua senhoria. Reputo-o tão covarde, tão sem dignidade, que o hei de mandar azorragar
pelo primeiro mariola das esquinas.
Baltasar Coutinho lançou-se de ímpeto a Simão. Chegou a apertar-lhe a garganta
nas mãos, mas depressa perdeu o vigor dos dedos. Quando as damas chegaram a
interpor-se entre os dois, Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala que lhe
entrara na fronte. Vacilou um segundo e caiu desamparado aos pés de Teresa.
Tadeu de Albuquerque gritava a altos brados. Os liteireiros e criados rodearam
Simão, que conservava o dedo no gatilho da outra pistola.”
 Deste modo, está, portanto, desfeito o triângulo amoroso. Na sequência deste ato, e
à boa maneira romântica, Simão assume corajosamente o seu crime, confirmando a sua
perdição e entregando-se ao meirinho6:
“- Fuja que a égua está ao cabo da rua - disse o ferrador ao seu hóspede.
- Não fujo... Salve-se, e depressa - respondeu Simão. [...]
- Está perdido! - tornou João da Cruz.
- Já o estava. [...]
- Prendam-no, prendam-no, que é um matador - exclamava Tadeu de
Albuquerque.
- Qual? - perguntou o meirinho-geral.
- Sou eu - respondeu o filho do corregedor.
6
Meirinho - antiga designação de um empregado judicial, correspondente ao que é hoje um oficial de
justiça.
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- Vossa senhoria! - disse o meirinho, espantado; e, aproximando-se, acrescentou
a meia voz: - Venha, que eu deixo-o fugir.
- Eu não fujo - tornou Simão. - Estou preso. Aqui tem as minhas armas.”
CAPÍTULO XIX
Com a prisão de Simão e a clausura de Teresa num convento, aproxima-se o fatal
desenlace final. A desgraça parece ter-se abatido sobre ambos, o que leva o narrador a
questionar-se: “A desgraça afervora ou quebranta o amor?”.
Simão: a opção pelo degredo
 À pergunta anterior não é dada resposta, uma vez que o narrador afirma “Factos e
não teses é o que eu trago para aqui.” E os factos neste ponto da narrativa são: ao fim
de dezanove meses na prisão, Simão deseja ardentemente a liberdade. Por isso, em vez
de aceitar a comutação da pena - 10 anos de prisão em Vila Real - prefere o degredo,
porque “Ânsia de viver era a sua; não era já ânsia de amar” e porque “O que é o coração,
o coração dos dezoito anos, o coração sem remorsos, o espírito anelante de glórias, ao
cabo de dezoito meses de estagnação da vida?”.
 Teresa, muito doente (“As ânsias, a lividez, o deperecimento tinham voltado. O
sangue, que criara novo, já lhe saía em golfadas com a tosse.”), pedira-lhe que aceitasse
os dez anos de prisão, mas Simão já não tinha qualquer esperança:
“«Não esperes nada, mártir - escrevia-lhe ele- - A luta com a desgraça é inútil, e eu
não posso já lutar. Foi um atroz engano o nosso encontro. Não temos nada neste
mundo. Caminhemos ao encontro da morte... Há um segredo que só no sepulcro se
sabe. Ver-nos-emos?
Vou. Abomino a pátria, abomino a minha família; todo este solo está aos meus
olhos coberto de forcas, e quantos homens falam a minha língua, creio que os ouço
vociferar as imprecações do carrasco. Em Portugal, nem a liberdade com a opulência;
nem já agora a realização das esperanças que me dava o teu amor, Teresa!
Esquece-te de mim, e adormece no seio do nada. Eu quero morrer, mas não aqui.
Apague-se a luz de meus olhos; mas a luz do céu, quero-a! Quero ver o céu no meu
último olhar.
16
Não me peças que aceite dez anos de prisão. Tu não sabes o que é a liberdade
cativa dez anos! Não compreendes a tortura dos meus vinte meses. [...]
Salva-te, se podes, Teresa. Renuncia ao prestígio dum grande desgraçado. [...] E,
senão, morre, Teresa, que a felicidade é a morte[...]».”
 Da leitura do excerto acima percebemos a desesperança e a desistência de Simão.
Mas, para além disso, é bem visível a sua aversão ao país e à família, que representavam
uma sociedade estagnada, preconceituosa e corrompida pela honra e pelo dinheiro.
Simão, tal como Teresa, opõe-se a essa sociedade; neste sentido, o seu amor representa
uma mudança na sociedade, ou melhor, o desejo de mudança.
 Perante a desistência de Simão, Teresa responde: “Morrerei, Simão, morrerei.
Perdoa tu ao meu destino... Perdi-te... Bem sabes que sorte eu queria dar-te... e morro,
porque não posso, nem poderei jamais resgatar-te.”
 Simão recebe a intimação para a viagem rumo ao degredo e prepara-se para a
mesma.

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Amor de perdição algumas notas

  • 1. 1 Amor de Perdição, Camilo Castelo Branco Algumas notas  Amor de Perdição tem como tema predominante o amor. Não o amor feliz, de salvação, mas antes, como o título indica, um amor que leva à desgraça, à perdição. Com efeito, o amor narrado nesta obra de Camilo é o amor-paixão, ou seja, é um amor vivido intensamente, até às últimas consequências; é um amor que se alimenta do sofrimento, da expiação e da morte. Aliás, os três amantes, figuras centrais da intriga amorosa - Simão, Teresa e Mariana - serão vítima desse sentimento exacerbado.  A obra é constituída por:  uma intriga principal, que diz respeito aos amores contrariados entre Simão Botelho e Teresa de Albuquerque;  uma intriga secundária, que surge por encaixe e se reporta à história de amor do irmão do protagonista, Manuel Botelho, e uma açoriana. A intriga secundária surge com o propósito de sublinhar o contraste que existe entre Simão Botelho, o herói romântico, e Manuel Botelho, valorizando, naturalmente, o primeiro.
  • 2. 2 Progressão da intriga amorosa  Simão Botelho vê Teresa pela primeira vez “para amá-la sempre”. Teresa ama-o também. [Cap. II] Introdução O Amor  Teresa recusa casar com Baltasar Coutinho, o outro pretendente, desobedecendo, assim, ao pai. É ameaçada de clausura. Simão decide ir a Viseu ver Teresa. [Cap. IV]  Encontro com Baltasar Coutinho. [Cap. V] Armadilha preparada por Baltasar Coutinho para matar Simão. Simão fica ferido. [Cap. VI]  Entrada de Teresa num convento em Viseu. [Cap. VII]  Teresa é informada de que vai ser transferida para o convento de Monchique no Porto. [Cap. IX]  Antes da partida para o Porto, Simão decide ir ver Teresa ao convento. Confronto com Baltasar Coutinho. Simão mata Baltasar e entrega-se à Justiça. [Cap. X]  Simão é preso. [Cap. XI]  Simão é condenado à forca. [Cap. XII]  Teresa chega ao convento de Monchique e sabe da condenação de Simão. Simão é transferido para a Cadeia da Relação do Porto. Estado frágil de Teresa, alterado perante a perspetiva de salvação que Simão lhe transmite numa carta. [Cap. XIII]  Tadeu de Albuquerque pretende levar a filha para Viseu. Teresa é irredutível: não sai do convento. [Cap. XIV]  Simão é condenado ao degredo. [Cap. XVI]  Simão recusa cumprir 10 anos de prisão em Vila Real. [Cap. XVIII]  Partida para o degredo. Morte de Teresa. [Cap. XX]  Morte de Simão e de Mariana. [Conclusão] Desenvolvimento A Perdição Conclusão A Morte
  • 3. 3 Simão: a construção do herói romântico Partindo do carácter arruaceiro de Simão, da sua prisão e condenação ao degredo, Camilo construiu um verdadeiro herói romântico, definido pelos seguintes traços: temperamento violento e imprudente - “génio sanguinário” [Cap. I]; virilidade - “Os quinze anos de Simão têm aparências de vinte. É forte de compleição” [Cap. I] rebeldia - Simão escolhe os seus amigos e companheiros “na plebe de Viseu” e “zomba das genealogias” [Cap. I]; na academia “convive com os mais famosos perturbadores” [Cap. I]; mesmo o seu amor por Teresa não deixa de ser um ato rebelde, um desafio à ordem estabelecida; força dos sentimentos e impulsividade - Simão deixa-se governar e dominar pelos sentimentos, sejam eles o amor-paixão, a raiva (quando mata Baltasar), a gratidão (para com João da Cruz, pela proteção e disponibilidade demonstradas, e para com Mariana, pela atenção e cuidados) ou a piedade (por exemplo quando diz a João da Cruz para não matar o criado de Baltasar Coutinho); bravura - Simão não teme ir ao encontro de Teresa à noite ou ir vê-la ao convento; nobreza de carácter - depois de matar o seu rival, Simão recusa fugir, entrega-se à justiça e assume o seu ato; mesmo depois de condenado, inicialmente à forca e depois ao degredo, aceita a pena de não tenta nunca obter benevolência devido às ligações familiares; fatalidade - apesar de Simão ter mudado radicalmente de comportamento em virtude de se ter perdido de amores por Teresa, o amor-paixão provocar-lhe-á estados de raiva e de violência que o conduzirão ao crime (assassinato de Baltasar), ao castigo (degredo), e em última instância à própria morte; por outro lado, todos os que dele se aproximam terão o mesmo destino fatal (João da Cruz, Teresa e Mariana) e Simão tem bem consciência disso: “Tanta gente desgraçada que eu fiz...” [Conclusão]; valorização do amor e da verdade - Simão vive o amor como um absoluto, como uma religião; é algo de sagrado e por isso está disposto a sacrificar-se por esse sentimento; o
  • 4. 4 amor representa a verdade, a verdade do coração e dos sentimentos, que se opõe à razão e à honra, tal como as concebiam o seu pai e o pai de Teresa. Capítulos I, IV, X e XIX: pontos fundamentais CAPÍTULO I A família de Simão Botelho “Domingos José Correia Botelho de Mesquita e Meneses, fidalgo de linhagem, e um dos mais antigos solarengos de Vila Real de Trás-os-Montes, era, em 1779, juiz de fora de Cascais, e nesse mesmo ano casara com uma dama do Paço, D. Rita Teresa Margarida Preciosa da Veiga Caldeirão Castelo Branco, filha dum capitão de cavalos, e neta de outro, António de Azevedo Castelo Branco Pereira da Silva, tão notável por sua jerarquia, como por um, naquele tempo, precioso livro acerca da Arte da Guerra.”  Finalidade do Capítulo I: estabelecer os antecedentes da intriga amorosa, apresentando a família, a sua genealogia e o próprio protagonista.  Domingos José Correia Botelho de Mesquita e Meneses: pai de Simão e de Manuel Botelho, casado com D. Rita Teresa Margarida Preciosa da Veiga Caldeirão Castelo Branco; “era extremamente feio”; “faltavam-lhe bens de fortuna” (situação financeira desfavorável); rude; sabia tocar flauta - “Domingos Botelho devia ter uma vocação qualquer, e tinha: era excelente flautista; foi a primeira flauta do seu tempo; e a tocar flauta se sustentou dois anos em Coimbra...”  D. Rita Teresa Margarida Preciosa da Veiga Caldeirão Castelo Branco: mãe de Simão e Manuel Botelho, casada com Domingos José Correia Botelho de Mesquita e Meneses; formosa.  Relação entre os pais de Simão: o narrador fala em “desgostoso viver” do qual resultaram, todavia, cinco filhos; relata ainda breves episódios sobre a vivência do casal, sobretudo em Vila Real.
  • 5. 5  É mencionado um tio paterno de Simão Botelho, Luís Botelho, que cometera homicídio. Em nota de rodapé, o autor coloca o seguinte: “Há vinte anos que eu ouvi de um coevo do facto a história do assassínio, assim contada: Era em Quinta-Feira Santa. Marcos Botelho, irmão de Domingos, estava na festa de Endoenças, em S. Francisco, defrontando com uma dama, namorada sua, e desleal dama que ela era. Noutro ponto da igreja estava, apontado em olhos e coração à mesma mulher, um alferes de infantaria. Marcos enfreou o seu ciúme até ao final do ofício da Paixão. À saída do templo encarou no militar e provocou-o. O alferes tirou da espada, e o fidalgo do espadim. Terçaram as armas longo tempo sem desaire, nem sangue. Amigos de ambos tinham conseguido aplacá-los, quando Luís Botelho, outro irmão de Marcos, desfechou uma clavina no peito do alferes, e ali, à entrada da «rua do Jogo da Bola», o derribou morto. O homicida foi livre por graça régia.”  Neste capítulo, ficamos ainda a saber que “Formara-se Domingos Botelho em 1767, e fora a Lisboa ler no Desembargo do Paço, iniciação banal dos que aspiravam à carreira da magistratura. Já Fernão Botelho, pai do bacharel, fora bem aceite em Lisboa, e mormente ao duque de Aveiro, cuja estima lhe teve a cabeça em risco, na tentativa regicida de 1758. O provinciano saiu das masmorras da Junqueira ilibado da infamante nódoa[...]”.1 A menção de factos históricos, neste caso a tentativa de regicídio de 1758, 1 No dia 3 de setembro de 1758, D. José I seguia incógnito numa carruagem que percorria uma rua secundária nos arredores de Lisboa. O rei regressava para as tendas da Ajuda de uma noite com a amante a “marquesinha” Távora, D. Teresa Leonor. Pelo caminho, a carruagem foi intercetada por três homens, que dispararam sobre os ocupantes. D. José I foi ferido num braço, o seu condutor também ficou ferido gravemente, mas ambos sobreviveram e regressaram à Ajuda. Sebastião José de Melo (Marquês de Pombal) tomou o controle imediato da situação, que aproveitou para retirar poder à família nobre dos Távoras, acusando-os de regicídio e traição. Poucos dias depois do atentado, dois homens foram presos e torturados. Os homens confessaram a culpa e que tinham tido ordens da família dos Távoras, que estavam a conspirar pôr o duque de Aveiro, José Mascarenhas, no trono. Ambos foram enforcados no dia seguinte, mesmo antes da tentativa de regicídio ter sido tornada pública. Nas semanas que se seguem, a marquesa Leonor de Távora, o seu marido, o conde de Alvor, todos os seus filhos, filhas e netos foram encarcerados. Os conspiradores, o duque de Aveiro e os genros dos Távoras, o marquês de Alorna e o conde de Atouguia foram presos com as suas famílias. Gabriel Malagrida, o jesuíta confessor de Leonor de Távora foi igualmente preso. Foram todos acusados de alta traição e de regicídio. A sentença ordenou a execução de todos, incluindo mulheres e crianças. Apenas as intervenções da Rainha Mariana e de Maria Francisca, a herdeira do trono, salvaram a maioria deles. A marquesa, porém, não seria poupada. Ela e outros acusados que tinham sido sentenciados à morte foram torturados e executados publicamente em 13 de janeiro de 1759 num descampado, perto de Lisboa, próximo à Torre de Belém.
  • 6. 6 é uma estratégia seguida pelo autor-narrador para conferir veracidade àquilo que narra.2 Caracterização de Simão: o “génio sanguinário” “Em 1801, achamos Domingos José Correia Botelho de Mesquita corregedor em Viseu. Manuel, o mais velho de seus filhos, tem vinte e dois anos, e frequenta o segundo ano jurídico. Simão, que tem quinze, estuda humanidades em Coimbra. As três meninas são o prazer e a vida toda do coração de sua mãe. O filho mais velho escreveu a seu pai queixando-se de não poder viver com seu irmão, temeroso do génio sanguinário dele. Conta que a cada passo se vê ameaçado na vida, porque Simão emprega em pistolas o dinheiro dos livros, convive com os mais famosos perturbadores da academia, e corre de noite as ruas insultando os habitantes e provocando-os à luta com assuadas. O corregedor admira a bravura do seu filho Simão, e diz à consternada mãe que o rapaz é a figura e o génio de seu bisavô Paulo Botelho Correia, o mais valente fidalgo que dera Trás-os-Montes.”  Simão é, deste modo, desde o primeiro momento caracterizado como um rebelde, um arruaceiro, um jovem conduzido por impulsos e violência. Contudo, o pai admira-o e compara-o a outra figura da família - o bisavô. Simão: o herói romântico A caracterização de Simão continua, sublinhando o seu perfil de herói romântico: “Os quinze anos de Simão têm aparências de vinte. É forte de compleição; belo homem com as feições de sua mãe, e a corpulência dela; mas de todo avesso em génio. Na plebe de Viseu é que ele escolhe amigos e companheiros. Se D. Rita lhe censura a indigna eleição que faz, Simão zomba das genealogias, e mormente do General Caldeirão que morreu frito. Isto bastou para ele granjear a malquerença de sua mãe. O 2 O mesmo verificamos no início da obra, quando o autor, Camilo Castelo Branco, afirma ter encontrado a informação sobre Simão Botelho nos registos da Cadeia da Relação do Porto, enquanto esteve preso devido à sua relação adúltera com Ana Plácido.
  • 7. 7 corregedor via as coisas pelos olhos de sua mulher, e tomou parte no desgosto dela, e na aversão ao filho. As irmãs temiam-no, tirante Rita, a mais nova, com quem ele brincava puerilmente, e a quem obedecia, se lhe ela pedia, com meiguices de criança, que não andasse com pessoas mecânicas.”  Deste excerto, ressalta a relação entre Simão e os pais e entre o jovem e a irmã. É neste contexto familiar que nascerá o amor de Simão por Teresa e esse contexto acabará por influenciar o desenlace desse mesmo amor.  O capítulo termina com a narração de um “grande dissabor”: o episódio da pancadaria na fonte, um “trágico espetáculo” que serve para acentuar o “génio sanguinário” do herói e ainda para explicar, posteriormente, o ódio entre os Botelho e os Albuquerque, uma vez que alguns dos homens que Simão espancou eram criados de Tadeu de Albuquerque, pai de Teresa. CAPÍTULO IV Caracterização de Teresa: a heroína romântica O capítulo IV inicia-se com considerações do narrador que revelam a sua omnisciência:3 “O coração de Teresa estava mentindo. Vão lá pedir sinceridade ao coração! Para finos entendedores, o diálogo do anterior capítulo definiu a filha de Tadeu de Albuquerque. É mulher varonil, tem força de carácter, orgulho fortalecido pelo amo, despego das vulgares apreensões, se são apreensões a renúncia que uma filha faz do alvedrio às imprevidentes e caprichosas vontades de seu pai. Diz boa gente que não, e eu abundo sempre no voto da gente boa. Não será aleive atribuir-lhe uma pouca de astúcia, ou hipocrisia, se quiserem; perspicácia seria mais correto dizer. Teresa adivinha que a lealdade tropeça a cada passo na estrada real da vida, e que os melhores fins se atingem por atalhos onde não cabem a franqueza e a sinceridade. Estes ardis são raros na idade inexperta de Teresa; mas a mulher do romance quase nunca é trivial, e esta, 3 Narrador omnisciente é aquele que conhece toda a história e detalhes da trama, sabendo até o que cada uma das personagens pensa ou sente.
  • 8. 8 de que rezam os meus apontamentos, era distintíssima. A mim me basta, para crer em sua distinção, a celebridade que ela veio a ganhar à conta da desgraça.”  O narrador claramente sabe o vai no coração de Teresa e conta-o ao leitor (narrador omnisciente), ao mesmo tempo que a caracteriza psicologicamente e de forma muito elogiosa, configurando o perfil da heroína romântica: Teresa tem “força de carácter”, orgulho e perspicácia. Mas, como o narrador anuncia, cairá em desgraça, como heroína romântica que é.  No capítulo anterior (Cap. III), depois de revelar a seu primo Baltasar Coutinho que não o ama e que por isso não pode casar com ele, Teresa é ameaçada pelo pai de ir para um convento. Porém, acaba por prometer “julgar-se morta para todos os homens, menos para seu pai”. É precisamente a essa promessa que o narrador alude quando menciona que “O coração de Teresa estava mentindo. Vão lá pedir sinceridade ao coração!”. Isto revela a perspicácia de Teresa ao mentir ao pai para evitar consequências menos agradáveis. Devido a esta atitude, ... “Parecia bonançoso o céu de Teresa. Seu pai não falava em claustro nem em casamento. Baltasar Coutinho voltara ao seu solar de Castro Daire. A tranquila menina dava semanalmente estas boas-novas a Simão, que, aliando às venturas do coração as riquezas do espírito, estudava incessantemente, e desvelava as noites arquitetando o seu edifício de futura glória.” O conflito entre Teresa e o pai A bonança termina, contudo, num domingo de junho de 1803. Nessa manhã, Teresa é surpreendida por estas palavras do pai: “- Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha. É preciso que te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que deres este passo difícil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que precisam de ser impostas pela violência. Mas repara, minha querida filha, que a violência de um pai é sempre amor. Amor tem sido a minha condescendência e brandura para contigo. Outro teria subjugado a tua desobediência com maus tratos, com os rigores do convento, e talvez com o desfalque do teu grande património. Eu, não. Esperei que o tempo de aclarasse o juízo, e felicito-
  • 9. 9 me de te julgar desassombrada do diabólico prestígio que acordou o teu inocente coração.”  O discurso de Tadeu de Albuquerque mostra bem como funcionava a sociedade naquela época, uma sociedade regida pela violência, pela submissão total da mulher ao pai e/ou ao marido. E é precisamente essa sociedade que Camilo critica e contra a qual Simão e Teresa se manifestam.  Na sequência das palavras de seu pai, a resposta de Teresa é elucidativa dessa posição que denota um desejo de mudança e de afirmação da sua liberdade: “[...] Meu pai... [...] mate-me; mas não me force a casar com meu primo. É escusada a violência, porque eu não caso!...”  Neste diálogo entre Teresa e o pai, Tadeu de Albuquerque, é visível o indício de que o amor entre Simão e Teresa está condenado, que é um amor de perdição, pois Teresa fala em “sacrifício”, ódio e “morte”, palavras com uma forte conotação ominosa.4 Caracterização de Simão: rebeldia e paixão Neste capítulo, assistimos ainda à reação de Simão perante este acontecimento. Ao saber, por carta, do sucedido e inclusive das ameaças de Baltasar, Simão, que tinha sofrido uma mudança espantosa em virtude do amor, assume de novo o seu “génio sanguinário”, a sua rebeldia: “O académico, chegando ao período das ameaças, já não tinha clara luz nos olhos para decifrar o restante da carta. Tremia sezões, e as artérias frontais arfavam-lhe entumecidas. Não era sobressalto do coração apaixonado: era a índole arrogante que lhe escaldava o sangue. Ir dali a Castro Daire e apunhalar o primo de Teresa na sua própria casa, foi o primeiro conselho que lhe segredou a fúria do ódio. Neste propósito saiu, alugou cavalo, e recolheu a vestir-se de jornada. Já preparado, a cada minuto de espera assomava-se em frenesis. [...] «E tudo há de acabar assim? - pensava ele, com a face entre as mãos, encostado à sua banca de estudo. - Ainda há pouco eu era tão feliz!... 4 Ominoso: que anuncia ou traz mau agouro, desventura, infelicidade; agourento, funesto, nefasto.
  • 10. 10 Feliz! - repetiu ele, erguendo-se de golpe. - Quem pode ser feliz com a desonra duma ameaça impune?!... Mas eu perco-a! Nunca mais eu hei de vê-la... Fugirei como um assassino, e meu pai será meu primeiro inimigo, e ela mesma há de horrorizar-se da minha vingança... A ameaça só ela a ouviu; e, se eu tivesse sido aviltado no conceito de Teresa pelos insultos do miserável, talvez que ela os não repetisse...» Simão Botelho releu a carta duas vezes, e à terceira leitura achou menos afrontosas as bravatas do fidalgo cioso. As linhas finais desmentiam formalmente a suspeita do aviltamento com que o seu orgulho o atormentava [...]. Quando o arrieiro bateu à porta, Simão Botelho já não pensava em matar o homem de Castro Daire; mas resolvera ir a Viseu, entrar de noite, esconder-se e ver Teresa.”  No calor do momento é a sua “índole arrogante” e o seu orgulho que despertam; é a faceta do herói romântico que sobressai. Simão pensa em matar o seu rival, num prenúncio que acabará por acontecer, mas reflete melhor e conclui que o seu orgulho e a sua honra não estavam manchados. Por isso, muda o seu plano e decide ir a Viseu.  Neste ponto da narrativa são introduzidas duas novas personagens: o ferrador João da Cruz, em casa de quem Simão se instala nos arredores de Viseu; e a mendiga, elo de ligação entre Simão e Teresa, visto que será esta que entrega as cartas de ambos daí em diante.  Simão é visto, neste capítulo, sob um outro ângulo, também ele característico do herói romântico - o de jovem apaixonado, puro, tímido, ansioso. Teresa, ao saber que Simão estava em Viseu, marca um encontro com ele5, à noite, no quintal. Simão “não esperava tanto” e o seu coração fica “sobressaltado”: “Não esperava tanto o académico. O que ele pedir era falar-lhe da rua para a janela do seu quarto, e receava impossível este prazer, que ele avaliava o máximo. Apertar-lhe a mão, sentir-lhe o hálito, abraçá-la talvez, cometer a ousadia de um beijo, estas 5 Este encontro é narrado no Capítulo V.
  • 11. 11 esperanças, tão além de suas modestas e honestas ambições, igualmente o enleavam e assustavam.” CAPÍTULO X  Neste capítulo, é narrado o assassinato de Baltasar Coutinho, o qual conduzirá, inevitavelmente, o protagonista ao seu destino fatal. O encontro de Mariana e Teresa  A ação desenrola-se nas imediações ou no convento de Viseu, onde se encontra Teresa de Albuquerque. Mariana vai ao seu encontro, servindo de intermediária entre ela e Simão.  O diálogo entre Teresa e Mariana evidencia a nobreza dos sentimentos desta última: o seu amor por Simão (“Se eu fosse amada como ela...”) e a sua dignidade ao recusar a oferta de Teresa de um anel de ouro (“A receber alguma paga há de ser de quem me cá mandou. Fique com Deus, minha senhora, e oxalá que seja feliz.”).  Mariana é portadora da notícia da transferência de Teresa para o convento de Monchique, no Porto, a ocorrer nessa madrugada. Ao saber disto, e apesar de Teresa ter pedido a Simão o contrário, ele decide ir vê-la antes da sua partida, instigado pelo facto de o primo a acompanhar nessa viagem: “A filha do ferrador deu o recado, e sem alteração de palavra. Simão escutara-a placidamente até ao ponto em que ela disse que o primo Baltasar a acompanhava ao Porto. - O primo Baltasar!... - murmurou ele com um sorriso sinistro. - Sempre este primo Baltasar cavando a sua sepultura e a minha!... - A sua, fidalgo?! - exclamou João da Cruz. - Morra ele, que o levem trinta milhões de diabos! Mas vossa senhoria há de viver enquanto eu for João. [...] - Eu hei de vê-la antes de partir para Coimbra - disse Simão. - Olhe que ela recomendou-me muito que não fosse lá - acudiu Mariana. - Por causa do primo? - tornou o académico ironicamente.”
  • 12. 12 Simão: a perdição por amor Se anteriormente Simão conseguira dominar a sua raiva em relação ao seu rival, ela renasce impelida pela honra e pelo coração (“eu hei de fazer o que a honra e o coração me aconselharem”). Por isso, embora João da Cruz tente, com a sua simples filosofia de vida, persuadir Simão de que não vale a pena perder-se por amor (“Paixões... que as leve o diabo, e mais quem com elas engorda. Por causa de uma mulher, ainda que ela seja filha do rei, não se há de um homem botar a perder.”), o jovem académico não se demove da sua posição e a carta que escreve a Teresa, nessa noite, confirma-o: “«Considero-te perdida, Teresa. O sol de amanhã pode ser que eu o não veja. Tudo, em volta de mim, tem uma cor de morte. Parece que o frio da minha sepultura me está passando o sangue e os ossos. Não posso ser o que tu querias que eu fosse. A minha paixão não se conforma com a desgraça. Eras a minha vida: tinha a certeza de que as contrariedades me não privavam de ti. Só o receio de perder-te me mata. O que me resta do passado é a coragem de ir buscar uma morte digna de mim e de ti. Se tens força para uma agonia lenta, eu não posso com ela. Poderia viver com a paixão infeliz; mas este rancor sem vingança é um inferno. Não hei de dar barata a vida, não. Ficarás sem mim, Teresa; mas não haverá um infame que te persiga depois da minha morte. Tenho ciúmes de todas as tuas horas. [...] Tu verás esta carta quando eu estiver num outro mundo, esperando as orações das tuas lágrimas. As orações! Admiro-me desta faísca de fé que me alumia nas minhas trevas!... Tu deras-me com o amor a religião, Teresa. Ainda creio; não se apaga a luz que é tua; mas a providência divina desamparou-me. [...]»”  Simão deixa-se dominar pelo rancor, pelos ciúmes. O tom da carta é de desespero, angústia e amargura. O amor-paixão de Simão e Teresa é, pois, um amor associado ao sofrimento, à desgraça, ao sacrifício e à morte. É uma espécie de religião - a religião do amor - como o próprio protagonista afirma (“Tu deras-me com o amor a religião.”).  Todas as cartas que surgem ao longo da narrativa são de extrema importância porque:  dão-nos a conhecer o mundo interior das personagens;
  • 13. 13  apresentam, por vezes, factos já conhecidos do leitor, mas sob uma nova perspetiva;  conferem variedade e riqueza ao discurso, alternando com o diálogo, a narração e os poucos momentos de descrição.  Determinado e impelido pela força do destino (“Hei de sair, porque me mataria, se não saísse.”; “O destino há de cumprir-se... Seja o que ´Céu quiser.”), como herói romântico que é, Simão, deixa, então, a casa do ferrador durante a noite e dirige-se ao convento de Viseu. Mariana pressente o que vai acontecer, mas nada pode fazer (“É a última vez que ponho a mesa ao senhor Simão em minha casa!”; “Choro, porque me parece que o não tornarei a ver; ou, se o vir, será de modo que oxalá que eu morresse antes de o ver.”) Confronto entre Simão e Baltasar  Defronte do convento, vemos, pelos olhos de Simão, o encontro entre Teresa de Albuquerque, o pai e o primo. Teresa mantém-se inabalável perante o pai (“[...] O meu destino é o convento. Esquecê-lo nem por morte. Serei filha desobediente, mas mentirosa é que nunca.”) e frontal e crítica perante o primo (“[...] porque os covardes escondem-se nas costas dos criados que se deixam matar.”)  Tudo se encaminha para o momento decisivo - o confronto entre os dois rivais (Simão Botelho e Baltasar Coutinho. Num diálogo vivo e de poucas linhas, o narrador relata os insultos e ofensas trocadas entre Simão e Baltasar que culminaram no assassinato deste último. “Baltasar, espavorido do encontro, fitando os olhos nele, duvidava ainda. - É incrível que este infame aqui viesse! - exclamou o de Castro Daire. Simão deu alguns passos, e disse placidamente: - Infame... eu! e porquê? - Infame, e infame assassino! - replicou baltasar. - Já fora da minha presença! - É parvo este homem! - disse o académico. [...] - Que diz este patife?! - exclamou Tadeu.
  • 14. 14 - Vem aqui insultá-lo, meu tio! - respondeu Baltasar. - Tem a petulância de se apresentar a sua filha a confortá-la na sua malvadez! Isto é de mais! Olhe que eu esmago-o aqui, seu vilão! - Vilão é o desgraçado que me ameaça, sem ousar avançar para mim um passo - redarguiu o filho do corregedor. - Eu não o tenho feito - exclamou enfurecidamente Baltasar - por entender que me avilto, castigando-o na presença de criados de meu tio, que tu podes supor meus defensores, canalha! - Se assim é - tornou Simão, sorrindo -, espero nunca me encontrar de rosto com sua senhoria. Reputo-o tão covarde, tão sem dignidade, que o hei de mandar azorragar pelo primeiro mariola das esquinas. Baltasar Coutinho lançou-se de ímpeto a Simão. Chegou a apertar-lhe a garganta nas mãos, mas depressa perdeu o vigor dos dedos. Quando as damas chegaram a interpor-se entre os dois, Baltasar tinha o alto do crânio aberto por uma bala que lhe entrara na fronte. Vacilou um segundo e caiu desamparado aos pés de Teresa. Tadeu de Albuquerque gritava a altos brados. Os liteireiros e criados rodearam Simão, que conservava o dedo no gatilho da outra pistola.”  Deste modo, está, portanto, desfeito o triângulo amoroso. Na sequência deste ato, e à boa maneira romântica, Simão assume corajosamente o seu crime, confirmando a sua perdição e entregando-se ao meirinho6: “- Fuja que a égua está ao cabo da rua - disse o ferrador ao seu hóspede. - Não fujo... Salve-se, e depressa - respondeu Simão. [...] - Está perdido! - tornou João da Cruz. - Já o estava. [...] - Prendam-no, prendam-no, que é um matador - exclamava Tadeu de Albuquerque. - Qual? - perguntou o meirinho-geral. - Sou eu - respondeu o filho do corregedor. 6 Meirinho - antiga designação de um empregado judicial, correspondente ao que é hoje um oficial de justiça.
  • 15. 15 - Vossa senhoria! - disse o meirinho, espantado; e, aproximando-se, acrescentou a meia voz: - Venha, que eu deixo-o fugir. - Eu não fujo - tornou Simão. - Estou preso. Aqui tem as minhas armas.” CAPÍTULO XIX Com a prisão de Simão e a clausura de Teresa num convento, aproxima-se o fatal desenlace final. A desgraça parece ter-se abatido sobre ambos, o que leva o narrador a questionar-se: “A desgraça afervora ou quebranta o amor?”. Simão: a opção pelo degredo  À pergunta anterior não é dada resposta, uma vez que o narrador afirma “Factos e não teses é o que eu trago para aqui.” E os factos neste ponto da narrativa são: ao fim de dezanove meses na prisão, Simão deseja ardentemente a liberdade. Por isso, em vez de aceitar a comutação da pena - 10 anos de prisão em Vila Real - prefere o degredo, porque “Ânsia de viver era a sua; não era já ânsia de amar” e porque “O que é o coração, o coração dos dezoito anos, o coração sem remorsos, o espírito anelante de glórias, ao cabo de dezoito meses de estagnação da vida?”.  Teresa, muito doente (“As ânsias, a lividez, o deperecimento tinham voltado. O sangue, que criara novo, já lhe saía em golfadas com a tosse.”), pedira-lhe que aceitasse os dez anos de prisão, mas Simão já não tinha qualquer esperança: “«Não esperes nada, mártir - escrevia-lhe ele- - A luta com a desgraça é inútil, e eu não posso já lutar. Foi um atroz engano o nosso encontro. Não temos nada neste mundo. Caminhemos ao encontro da morte... Há um segredo que só no sepulcro se sabe. Ver-nos-emos? Vou. Abomino a pátria, abomino a minha família; todo este solo está aos meus olhos coberto de forcas, e quantos homens falam a minha língua, creio que os ouço vociferar as imprecações do carrasco. Em Portugal, nem a liberdade com a opulência; nem já agora a realização das esperanças que me dava o teu amor, Teresa! Esquece-te de mim, e adormece no seio do nada. Eu quero morrer, mas não aqui. Apague-se a luz de meus olhos; mas a luz do céu, quero-a! Quero ver o céu no meu último olhar.
  • 16. 16 Não me peças que aceite dez anos de prisão. Tu não sabes o que é a liberdade cativa dez anos! Não compreendes a tortura dos meus vinte meses. [...] Salva-te, se podes, Teresa. Renuncia ao prestígio dum grande desgraçado. [...] E, senão, morre, Teresa, que a felicidade é a morte[...]».”  Da leitura do excerto acima percebemos a desesperança e a desistência de Simão. Mas, para além disso, é bem visível a sua aversão ao país e à família, que representavam uma sociedade estagnada, preconceituosa e corrompida pela honra e pelo dinheiro. Simão, tal como Teresa, opõe-se a essa sociedade; neste sentido, o seu amor representa uma mudança na sociedade, ou melhor, o desejo de mudança.  Perante a desistência de Simão, Teresa responde: “Morrerei, Simão, morrerei. Perdoa tu ao meu destino... Perdi-te... Bem sabes que sorte eu queria dar-te... e morro, porque não posso, nem poderei jamais resgatar-te.”  Simão recebe a intimação para a viagem rumo ao degredo e prepara-se para a mesma.