1. A executada opôs-se à execução alegando que nunca recebeu cópia do contrato de crédito e tentou anular o pedido menos de 24 horas após a assinatura.
2. O tribunal considerou provado que a exequente não entregou cópia do contrato à executada, o que anula o contrato.
3. A execução foi julgada totalmente procedente e extinta, mas não foi provado que a exequente agiu de má-fé.
1. Documento assinado electronicamente. Esta assinatura
electrónica substitui a assinatura autógrafa.
Dr(a). Helena Cabrita
Tribunal Judicial de Cantanhede
2º Juízo
Rua dos Bombeiros Voluntários - 3060-163 Cantanhede
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Proc.Nº 318/08.4TBCNT-A
2038296
CONCLUSÃO - 11-12-2012
(Termo eletrónico elaborado por Escrivão Auxiliar Rosália Carmo F. Figueiredo)
=CLS=
I – RELATÓRIO
CLÁUDIA MELO MONTEIRO, executada nos autos de execução aos quais
estes se encontram apensos, veio deduzir a presente oposição à execução contra
CRÉDIBOM – INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DE CRÉDITO, S.A., pedindo o
indeferimento liminar da execução e o cancelamento das penhoras efectuadas.
Para tanto, alegou que desconhece o conteúdo da proposta de crédito que
assinou, uma vez que nunca lhe foi entregue uma cópia, e que, porque foi sujeita a
uma situação de pressão, passado menos de 24 horas contactou telefonicamente a
funcionária interveniente no processo para anular o pedido de financiamento,
tendo-lhe sido dito que bastaria anular a autorização de débito em conta no seu
banco. Peticiona ainda a condenação da exequente como litigante de má fé.
A exequente apresentou contestação, na qual alegou que a executada
recebeu uma cópia do contrato de crédito, tendo a mesma declarado que lhe foi
entregue um exemplar na proposta que assinou, e que a mesma apenas em
25/03/2006 enviou uma carta à exequente a comunicar que pretendia rescindir o
contrato, pelo que tal revogação é extemporânea.
Teve lugar a audiência de julgamento, com observância da formalidade legal.
Procedeu-se à fixação da matéria de facto, da qual não houve reclamações.
Inexistem quaisquer excepções ou nulidades que obstem ao conhecimento
do mérito da causa.
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Proc.Nº 318/08.4TBCNT-A
Em concreto, importa apreciar a questão da falta de entrega do contrato à
executada e da anulação do mesmo.
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II – FUNDAMENTAÇÃO
2.1. – Fundamentos de Facto
Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
1 – Nos autos principais, a exequente pede a cobrança coerciva da quantia de
€ 5.673 (cinco mil seiscentos e setenta e três euros), sendo € 5.636,89 (cinco mil
seiscentos e trinta e seis euros e oitenta e nove cêntimos) a título de capital em
dívida e € 36,11 (trinta e seis euros e onze cêntimos) a título de juros vencidos até
19/03/2008, acrescida dos juros vincendos.
2 – A execução referida em 1) foi intentada com base no documento intitulado
“proposta/contrato de crédito” de fls. 9 dos autos de execução, que aqui dou por
integralmente reproduzido.
3 – Para a celebração do acordo referido em 2), a executada disponibilizou
cópia do seu BI e NIF, bem como comprovativo do NIB da sua conta bancária na
Caixa de Crédito Agrícola Mútuo.
4 – No dia 25 de Março de 2006, a executada enviou uma carta à exequente a
comunicar que pretendia rescindir o acordo referido em 2), por não se encontrar com
capacidade financeira para cumprir as obrigações nele assumidas (cfr. doc. de fls.
20v, que aqui dou por integralmente reproduzidas).
5 – Em 7 de Abril de 2006, a exequente remeteu à executada a carta
constante de fls. 21, que aqui dou por integralmente reproduzida.
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2.2 – Fundamentos de Direito
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Conforme começou por referir-se, importa apreciar a questão da falta de
entrega do contrato à executada e da anulação do mesmo.
Ora, quanto à primeira questão enunciada, invoca a executada que
desconhece o conteúdo da proposta de crédito que assinou, uma vez que nunca lhe
foi entregue uma cópia.
Por seu turno, a exequente alega que a executada recebeu uma cópia do
contrato de crédito, tendo a mesma declarado que lhe foi entregue um exemplar na
proposta que assinou.
Vejamos então.
A executada baseia a sua pretensão nos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º, n.º 1, do
Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de Setembro.
Conforme resulta dos artigos 1.º e 2.º do referido diploma, o mesmo aplica-se
aos contratos de crédito ao consumo, entendendo-se por contrato de crédito o
contrato por meio do qual um credor concede ou promete conceder a um
consumidor um crédito sob a forma de diferimento de pagamento, mútuo, utilização
de cartões de crédito ou qualquer outro acordo de financiamento semelhante.
Na verdade, conforme referiu o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão
datado de 13/11/2008 (disponível em www.dgsi.pt), o Decreto-Lei n.º 359/91, de 21
de Setembro, veio regular os contratos de crédito ao consumo e, nomeadamente e
para o que ora nos interessa, disciplinar os casos em que o crédito, concedido sob a
forma de contrato de mútuo, se destina a financiar a aquisição de serviços,
esclarecendo as especiais implicações decorrentes da ligação funcional que, nesse
caso, existe entre o mútuo e a aquisição.
Ora, do ponto 2) dos fundamentos de facto resulta que o título executivo
consiste num contrato de crédito mediante o qual a exequente acordou com a
executada emprestar a esta a quantia de € 4.641, com vista à aquisição de um
cartão de desconto Key Club, que esta se comprometeu a restituir em prestações
mensais, durante quarenta e oito meses.
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Verifica-se, pois, que estamos perante um contrato de crédito ao consumo, na
acepção dada pelo Decreto-Lei n.º 359/91, de 21 de Setembro, sendo que não se
aplica qualquer das exclusões previstas no artigo 3.º do mesmo.
Ora, resulta das disposições conjugadas dos artigos 6.º, n.º 1, e 7.º, n.º 1, do
referido diploma que o contrato de crédito deve ser reduzido a escrito e assinado
pelos contraentes, sendo obrigatoriamente entregue um exemplar ao consumidor no
momento da respectivo assinatura, importando a violação desta prescrição a
nulidade do contrato de crédito.
Mais dispõe o n.º 4 do artigo 7.º que a inobservância destes requisitos
presume-se imputável ao credor e a invalidade do contrato só pode ser invocada
pelo consumidor.
Daqui resulta que cabe ao credor (neste caso à exequente) alegar e provar
que efectivamente entregou uma cópia do contrato de crédito que constitui o título
executivo à executada.
Contudo, conforme resulta dos fundamentos de facto, muito embora a
exequente tenha efectivamente alegado tal factualidade, a mesma resultou não
provada.
Tal implica, pois, a nulidade do contrato de crédito que constitui o título
executivo.
A este propósito, considerou o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão
datado de 7/07/2009, que: “I. Nos termos do art. 6º, nº 1 e do art. 7º, nº 4 do
Decreto-Lei nº 359/91 de 21/09, num contrato de crédito ao consumo, a falta de
entrega de um exemplar do contrato ao mutuário-consumidor, na data da assinatura
por este do mesmo contrato, implica a nulidade daquele contrato, apenas invocável
pelo consumidor. II. Havendo um contrato de crédito ao consumo cujo produto
mutuado se destinou ao pagamento do preço de um veículo vendido por terceiro ao
mutuário e tendo o montante mutuado sido directamente entregue ao vendedor, a
nulidade dos contratos não obriga o mutuário - que nada recebeu em virtude do
contrato de mútuo -, a restituir o montante mutuado, nos termos do art. 289º do Cód.
Civil” (disponível em www.dgsi.pt).
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Nesta conformidade, por que se trata de contrato de crédito ao consumo, não
tendo sido alegado nem demonstrado que o montante mutuado tenha sido entregue
à executada, sendo que, pelo contrário, corresponde à normalidade do acontecer
que este tenha sido directamente entregue ao vendedor, igualmente se conclui que,
sendo o contrato nulo, a executada não se encontra obrigada, por esta via, a restituir
o montante mutuado, que não recebeu.
Alega ainda a executada que tentou anular telefonicamente o contrato
passado menos de 24 horas da respectiva celebração.
Ora, ainda que o conhecimento de tal questão não tivesse ficado prejudicado
com a declaração de nulidade do contrato, sempre se dirá que tal matéria resultou
inteiramente não provada.
Nestes termos, porque o contrato que serve de título executivo à execução à
qual estes autos se encontram apensos é nulo, será a presente oposição à
execução julgada procedente.
No que concerne ao pedido de condenação da exequente como litigante de
má fé, cumpre chamar à colação o disposto no artigo 456.º, n.º 2, do Código de
Processo Civil, o qual dispõe que:
“Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia
ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a
decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente
reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da
verdade, entorpecer a acção da Justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito
em julgado da decisão.”
No presente caso, é certo que as versões apresentadas pelas partes são
contraditórias e que a versão da exequente resultou não provada, mas, por outro
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lado, da prova produzida não resultou demonstrado que a exequente tenha actuado
com dolo ou negligência grave, pelo que tal pretensão não é de proceder.
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III – DISPOSITIVO
Nos termos e pelos fundamentos expostos, decide este Tribunal:
- julgar a presente oposição à execução totalmente procedente, por provada,
e, em consequência, determinar a extinção da execução à qual estes autos se
encontram apensos, em que é exequente CRÉDIBOM – INSTITUIÇÃO
FINANCEIRA DE CRÉDITO, S.A. e executada CLÁUDIA MELO MONTEIRO;
- julgar improcedente, por não provado, o pedido de condenação da
exequente como litigante de má fé deduzido pela executada.
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Custas pela exequente – artigo 446.º do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
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Cantanhede, 18-12-2012