Três frases:
Joana estava muito estressada cuidando das filhas sozinha após a morte do marido. Sua amiga Neli a encorajou a passar mais tempo de qualidade com as filhas, especialmente lendo com Débora. Joana decidiu parar de trabalhar tanto e focar mais nas filhas, o que melhorou significativamente suas relações familiares.
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Ana Cláudia Lucena de Azevedo, Parnamirim (RN), 1º lugar Contos (acima
de 17 anos)
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Mary Jones: exemplo para os dias de hoje
Joana estava muito cansada. Sentada na cama com o note-book em cima das
pernas, olhou para o relógio de pulso: meia noite... o travesseiro parecia fazer um
convite: “ venha deitar-se...” e o seminário que estava preparando desafiava:
termine-me!
Era uma sexta-feira, havia passado todo o dia trabalhando, a maioria do tempo em
pé, pois era enfermeira em um grande hospital. O fim de semana seria reservado a
apresentação do seminário no curso de especialização. Descansar, portanto não
parecia ser uma opção.
Além do sono, uma sensação incômoda a atormentava naquela noite. Uma
preocupação intermitente que só fazia diminuir o seu já combalido ânimo.
O motivo atendia pelo nome de Débora, sua filha de 14 anos. Além dela, Joana
ainda era mãe de Raquel, uma espevitada garota de 8.
Mas era Débora que lhe afligia no momento. Ia mal na escola. Suas notas estavam
tão baixas, que precisaria de um verdadeiro milagre para não ser reprovada.
O pior era o jeito como a adolescente encara o problema: reclamava que os
professores não explicavam direito, que não tinha tempo para estudar, que Joana
não lhe ajudava nas lições... ufa!
A relação com a filha estava desgastada e repetitiva: todos os dias havia uma
discussão. Sempre pelos mesmos motivos. Débora reclamava da escola, da
quantidade de louça para lavar, da mãe, etc. Joana reclamava do mal humor de
Débora e do jeito lento e desleixado com que fazia tudo.
1:00 hora. Desligou o computador e deitou-se. Não ficou lá muito bom, mas pelo
menos havia terminado o trabalho. Amanhã sairia bem cedo. Deixara um bilhete
em cima da mesa lembrando Débora que preparasse o café para a irmã. Já
imaginava a cara feira que a filha mais velha faria. O final de semana prometia ser
daqueles!
Trim... trim... trim... o celular tocava enquanto Joana, envergonhada, procurava-o
dentro da bolsa.
- Um momento... Saiu da sala de aula e atendeu.
- Não tem pão de fôrma...
- O que?
- Não tem pão de forma, mãe... como vamos tomar café|
- Débora, eu estou no meio da aula...
- Eu sei, mas... o que eu faço|
- Coma pão francês, oras...
- Você sabe que eu não gosto de pão francês...
- Débora, por favor, agora não...
- Ok, ok, ok... você não tem tempo, né? Tá bom eu fico sem comer!!! Débora
desligou na cara da mãe. Uma fúria subiu à cabeça de Joana. Vontade de correr
para casa e dizer umas verdades àquela malcriada. Controlou-se, porém. Assistiria
a aula e mais tarde conversariam. – O que? O que mais diria à filha que já não
tivesse dito antes? Sentada na lanchonete, durante o intervalo, Joana remoia sua
angústia.
Desde que o marido morrera dois anos antes, as coisas pareciam ter virado de
cabeça para baixo. Após os meses de luto decidira fazer o possível para organizar a
rotina da família, mas Débora resistia a isso. Ela lembrava freqüentemente a Joana,
que as coisas não estavam bem.
2. - Olá... tem alguém aí?
- Oi Nelí... desculpe... não tinha te visto...
- Também... você está com os pensamentos nas nuvens, menina...
- Quem me dera que eles estivessem nas nuvens...
- Posso ajudar em alguma coisa?
- Pode orar por mim e pelas meninas. Principalmente por Débora.
- Ah, sim... você já havia me contado que ela anda meio rebelde, né?
- Meio? Completamente, para falar a verdade. Mas o que realmente está me
preocupando são as notas dela. Acho que vai acabar reprovando.
- Nossa!!! O que está havendo?
- Sinceramente eu não sei.
- O que ela fala sobre isso?
- Ela reclama de tudo. Tudo é muito difícil e complicado para Débora. As matérias,
a louça, cuidar da irmã enquanto eu trabalho...
- Você tem se ausentado muito?
- Eu tenho pego alguns plantões durante a semana e a especialização uma vez por
mês.
- E quando está em casa|
- Bem... tem muita coisa para arrumar, sabe?
- Porque acha que ela está tirando notas baixas?
- Eu... realmente não sei...
- Não sentou com ela para olhar os cadernos?
- Não... ando sem tempo...
- Bem... vai precisar fazer isso para entender o que está havendo.
- Eu aconselho tanto... se pelo menos ela escutasse....
- Não adianta só aconselhar. Precisa enfrentar este problema junto com ela... se
envolver.
Joana calou-se. Sabia que a amiga tinha razão, mas por algum motivo não
conseguia aproximar-se mais da filha.
- Vou te propor algo... estou aqui com um livro. Ele é muito interessante e conta a
história de uma menina com mais ou menos a mesma idade da Débora.
Neli pegou um livro em sua pasta: A história de Mary Jones. Uma linda gravura
trazia uma criança trajando longo vestido azul. Ela corria feliz, enquanto o vento
fazia rodopiar folhas outonais ao seu redor.
- Acha que este livro pode ajudar Débora?
- Acho que sim... principalmente se você ler junto com ela.
- Ler com ela? Mas o meu tempo...
- Leia a história junto com Débora. Depois me diga o que achou, está bem?
Não adiantava argumentar com Neli. Ela era uma pessoa determinada. Nada do que
Joana dissesse poderia convencê-la dos seus motivos para não disponibilizar tempo
para a filha.
- Eu trouxe algo para você. Entregou o livro e esperou a reação. A adolescente o
observou por alguns instantes, mas não pareceu empolgada.
- Um livro?
- A Neli emprestou. Disse que é ótimo.
- Deixa eu ver! Raquel rapidamente puxou o livro das mãos da irmã. – Que lindo!!!
Quem é essa menina, mamãe?
- O nome dela é Mary Jones. Eu não conheço a história ainda, mas pensei que
poderíamos ler juntas.
Débora levantou uma sobrancelha. Parecia um estranho convite. A mãe nunca tinha
tempo para uma programação que envolvesse prazer.
- Eu tomei café após o jantar e estou sem sono. Podíamos deitar na cama e ler.
sugeriu Joana. – Cada uma, lê uma página, que tal?
- Oba!!! Comemorou Raquel, animada.
- Nem pensar... marquei de conversar no MSN com a Ana Carla daqui a pouco.
3. - Ah! Que pena... eu realmente gostaria... não conseguiu terminar a frase. Era tão
estranho dizer à filha que gostaria de estar junto com ela! Como estavam distantes,
meu Deus!!!
Débora já não a ouvia. Sentada no computador parecia absorta com algo muito
mais interessante. Restava-lhe Raquel. Foram para o quarto e começaram a ler o
livro.
No dia seguinte Neli ligou para saber as novidades.
- E então... como foi a leitura?
- Ah, foi ótima... pelo menos para a Raquel, que adorou a história...
- Ué... a Débora não leu com vocês?
- Ela não quis... disse que tinha coisas melhores para fazer. Eu fiz o que você
pediu... convidei-a mas ela simplesmente recusou.
- E você não insistiu?
- Não...
- Joana, a Débora é uma adolescente... ainda não sabe o que é melhor para ela. Às
vezes insistir para fazer o que é certo é necessário.
- eu conheço a minha filha, Nelí... se tivesse insistido, ela teria vindo chateada e aí
não aproveitaria o livro.
- Você não parece muito disposta a estar com Débora. Pontuou Nelí.
- Sabe de uma coisa? Eu estou cansada. Estar com Débora é ter que ouvir
reclamações o tempo todo e eu realmente não faço questão disso.
- Sabe qual é o seu problema? Você sempre está cansada demais para cuidar das
suas filhas. Trabalha duro para sustentá-las, faz um curso de pós graduação para
conseguir melhores oportunidades, arruma a casa, deixa tudo organizado e no fim
das contas não faz o principal!
A amiga parecia ter o dom de dizer verdades que Joana não queria enfrentar.
Estava a ponto de explodir com aquela conversa.
- E você poderia me dizer o que eu estou deixando de fazer?
- Ah... com todo o prazer... você está deixando de sorrir... está deixando de curtir
as suas filhas... de ajudá-las em suas tarefas de casa... de ouvi-las.
Joana pensou por alguns segundos. Sabia que a amiga falava uma verdade, mas
não entregaria os pontos facilmente.
- Mary Jones também fez um grande esforço para conseguir o que queria!
- Concordo, mas Mary, semelhante a Paulo, “combateu o bom combate”. Lembra-
se? Está em II Tim 4:7.
- Como assim?
- Olhe pelo que está lutando: trabalho em excesso, pós graduação, casa limpa...
controlar as filhas...
- você fala de um jeito! Estou apenas tentando viver de forma organizada.
- Para que?
- Como para que? Por elas! Para que tenham segurança!
- Nada dará mais segurança às suas filhas do que a sua presença. Não essa que
você tem oferecido: ocupada, preocupada, nervosa... você precisa encontrar prazer
em desfrutar da companhia delas. Veja o exemplo de Mary... pelo que ela lutou...
quis ter uma bíblia para aprender sobre a palavra de Deus. Você imagina o quanto
isso foi bom para ela? O quanto Mary pôde desenvolver-se espiritualmente, lendo a
sua tão preciosa bíblia? Eis um bom motivo para alguém se esforçar.
Lágrimas teimosas começaram a escorrer pelo rosto de Joana. As palavras de Neli
tocaram em algo muito dolorido. Do outro lado da linha, Nelí esperava em silêncio.
- Eu quero orar por você minha amiga...
Joana curvou a cabeça. Não tinha mais nada a dizer. Rendia-se aos fatos.
Reconhecia que aquela irmã, com sua característica franqueza estava sendo usada
por Deus, para apontar suas falhas e sugerir caminhos melhores para a sua vida:
4. “Amado Deus, eu te peço agora por Joana, esta minha amiga, tão sofrida, cuja vida
foi transformada inesperadamente com a morte do esposo. Tu sabes de todas as
coisas, Senhor e não iremos questionar os Seus desígnios, mas te peço agora, que
restaure o coração desta mulher. Que ela possa voltar a sentir prazer em desfrutar
tempo com sua família, que ela possa ter sabedoria para ajudar a sua filha mais
velha e firmeza para exercer autoridade sobre ela. Senhor, que Joana possa
acordar para a vida novamente e perceber o quão maravilhosa, ela é. Obrigada, por
Seu imenso amor por nós. Amém.
Joana desligou o telefone. Sentia-se cansada, mas uma paz de espírito e um
sentimento de esperança a acompanhavam agora. Percebera naquela conversa o
que estava fazendo da sua vida.
Saiu do quarto e foi até a sala. Débora estava sentada com os livros escolares
esparramados sobre a mesa.
- Olá filha...
- Oi mãe... tudo bem?
- Não filha... não está tudo bem...
- O que houve? Você estava chorando?
- Sim...
- Por minha causa?
- Também... mas principalmente por minha causa. Precisamos ter uma conversa.
Débora olhou-a atenta. Percebeu que a mãe iria dizer algo muito importante. Joana
respirou profundamente antes de continuar.
- Após a morte do seu pai eu tentei retomar as nossas vidas da melhor maneira
possível e me esforcei para que as coisas entrassem nos eixos. Como antes... mas
eu não percebi que estava fazendo as coisas de uma maneira... sabe... passando
tempo demais longe de vocês. O que eu quero dizer... é que sinto muito por estar
distante.. Por não me envolver com vocês de uma forma prazerora... divertida...
- você não gosta mais de se divertir com a gente, mamãe? Raquel veio do quarto.
Pelo jeito também estava ouvindo a conversa.
- Eu tenho estado cansada e triste nos últimos tempos, isso me tira a vontade de
brincar, de sorrir, de fazer coisas alegres. Mas quero que saibam que eu gosto
muito de estar com vocês e que quero aprender a me divertir novamente.
- Mãe... eu sinto muito por não ser uma filha melhor do que eu sou...
Joana parou. Antes que pudesse voltar a dizer qualquer coisa, Débora continuou:
- Hoje de manhã eu peguei o livro de Mary Jones. A Raquel pediu para eu ler com
ela. Fiquei pensando, sabe? Ela era tão esforçada, mãe... e tudo era muito mais
difícil para ela do que é para mim. Passou seis anos economizando para comprar
uma bíblia, trabalhando duro, enquanto eu tenho todos os livros de que preciso...
caminhou 40 km para conseguir aquela bíblia e eu reclamo por ter que lavar uma
louça. Agora percebo que preciso me esforçar mais, para que as coisas dêem certo
para mim.
Joana mal podia acreditar. Parecia estar presenciando um milagre: Débora
admitindo os seus erros.
- Fico feliz por você poder dizer isso, filha! E sabe... eu vou te ajudar. T odas as
noites vamos sentar juntas para ver quais as dificuldades que vocês está tendo nas
matérias.
- E o seu tempo, mãe? Perguntou a oportuna menina de 8 anos.
- Bem... vou sair dos plantões e da especialização. Estou precisando descansar e
quero realmente passar mais tempo com vocês.
- Oba!!! Mamãe não vai mais trabalhar à noite!!! Viva!!! Raquel pulava e sorria com
gosto. O que provocou em Joana uma alegria que já muito não sentia.
Naquele domingo, após o culto, as amigas conversaram outra vez e Joana contou
as novidades:
5. - As coisas estão tão diferentes lá em casa!
- Dá para perceber em seu semblante. É a primeira vez que a vejo feliz em dois
anos, Joana.
- É muito bom viver em paz, amiga... Graças a Deus por isso!!!
- O pessoal lá da especialização está sentindo sua falta, provocou Nelí.
- Pois é, mas eu vou dar um tempo antes de recomeçar a estudar. Agora não é o
momento. Estou combatendo o meu o bom combate e preciso de tempo e
disposição para vencê-lo.
- É assim que se fala... seu bom combate é cuidar dessas meninas lindas que Deus
te deu.
- É isso aí. Elas estão ótimas... Débora então... uma verdadeira benção. Não
reclama mais, está se esforçando na escola e é bastante solícita em casa.
- Vocês terminaram de ler o livro?
- Sim... aqui está ele... obrigada.
- Que bela história, hein!
- É mesmo. No livro está escrito que Mary Jones inspirou a criação de uma
sociedade, que já distribuiu exemplares da bíblia, em vários países. Essa sociedade
por sua vez inspirou a criação de outras. Gente de todo o mundo já foi beneficiada
com este trabalho. Por causa do esforço de Mary Jones, homens e mulheres têm se
mobilizado para ajudar as pessoas, a ter um exemplar da bíblia. E lá se vão mais
de duzentos anos de trabalho!
- Que legal!!! Você consegue imaginar quantas vidas já foram transformadas pela
oportunidade de ler a palavra de Deus?
- Sim... e nos mais variados ambientes: lares, escolas, hospitais, presídios...
- E tudo isso porque um dia, uma jovem andou 40 km para conseguir comprar a
sua bíblia.
- Ela foi um grande exemplo!
- É verdade e continua a ser um exemplo para os dias de hoje. Um exemplo de coragem, sabedoria,
perseverança e fé.