1. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS
NATURAIS RENOVÁVEIS
SUPERINTENDÊNCIA NO ESTADO DE PERNAMBUCO
CENTRO DE TRIAGEM DE ANIMAIS SILVESTRES
PARECER TÉCNICO 01/2010 CETAS/IBAMA/SUPES/PE
Assunto: Jacarés presentes no corpo d’água do terreno no Hospital Barão
de Lucena – OFICIO/DG N° 0318/2010
OBJETO:
O Hospital Barão de Lucena (HBL) está passando por processo de
qualificação junto à Secretaria Estadual de Saúde, que apontou como
problema de segurança a presença de jacarés na área do Hospital. Diante
desse fato, o HBL solicitou parecer do IBAMA quanto ao problema.
DA SITUAÇÃO NO HOSPITAL BARÃO DE LUCENA
O HBL apresenta em sua área um corpo d’água (coordenadas:
08°12’19.67’’S; 34°56’18.69’’W) de área aproximada 1560,41m2,
considerando-se o aumento e a diminuição em sua área nos períodos de
chuva e de seca, respectivamente. Junto ao corpo d’água, o hospital tem
em sua área um pequeno fragmento de Mata com cerca de 14.396m2.
Segundo os servidores presentes na reunião, listados na Ata da reunião
encaminhada pelo OFÍCIO/DG Nº 0318/2010, aproximadamente 40 animais
já foram avistados no local.
De acordo com a Diretora Geral, Cláudia Miranda, o HBL está passando
por um processo de qualificação. Durante a análise do HBL, foi apontado,
no quesito segurança, a presença dos jacarés na área um dos itens
desfavoráveis à segurança no Hospital. Andréa Peixoto, da Secretaria
Estadual de Saúde de Pernambuco, exemplificou o problema da existência
dos jacarés na área pela possibilidade de alguma criança (paciente ou
não) entrar no corpo d’água e se acidentar, ou mesmo da ocorrência de
acidentes com pessoas da comunidade do entorno que entram na área
do hospital para pescar camarões-de-água-doce no referido corpo
d’água.
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2. DA ESPÉCIE
Jacaré-do-papo-amarelo (Caiman latirostris)
Aspectos Biológicos
Do habitat
O jacaré-do-papo-amarelo habita ambientes alagados, tais como
manguezais, pântanos e banhados, próximo de habitats
associados a rios e riachos que drenam para o Oceano Atlântico.
É comum também a ocorrência de indivíduos em ambientes
urbanos, tais como corpo d’águas e lagoas naturais ou artificiais.
Da alimentação
A dieta do jacaré-do-papo-amarelo inclui tanto animais mortos
quanto vivos. Sua composição é variada de acordo com o
tamanho do animal, incluindo principalmente pequenos mamíferos,
peixes e crustáceos, como camarões de água doce. Um
importante componente da dieta desses animais são os moluscos
gastrópodes (caramujos e caracóis), inclusive o Biomphalaria glabrata,
hospedeiro intermediário no ciclo de vida do verme causador da
esquistossomose (Schistosoma mansoni), além de se alimentar também
do Achatina fulica, gastrópode exótico causador de grandes
problemas nos ecossistemas brasileiros.
Do habito
O jacaré-do-papo-amarelo tem vida quase que exclusivamente
aquática, onde captura a maior parte dos animais componentes
de sua dieta. É comum que a caça seja realizada no período
noturno. Embora de aparência semelhante aos dinossauros, o que
impressiona o público em geral, e da alta eficiência de caça e
capacidade de destruição das partes corporais das presas, os
jacarés-do-papo-amarelo não são animais agressivos, e não
perseguem outros animais ativamente.
Por experiência em campo com esses animais, constatei que,
dentro da água, eles tendem a se afastar, provavelmente devido
ao maior tamanho dos seres humanos em relação ao animal, o
que causa uma movimentação de grande massa de água. Isso,
associado ao alto desempenho na natação, favorece o
distanciamento do animal da fonte de distúrbio. Em terra esses
animais não perseguem suas presas, sejam elas humanas ou não.
As investidas que ocorrem em terra têm por finalidade a defesa, e
ocorrem em explosão, subitamente, quando o agente perturbador
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3. está muito próximo do animal. Assim sendo, os acidentes
ocorridos com esses animais são oriundos de manejo
inadequado, geralmente por pessoas não treinadas para tal fim, e
muitas vezes de um manejo desnecessário, por curiosos.
Em geral os jacarés-do-papo-amarelo têm habito solitário, e são
bastante territorialistas, caso em que podem ocorrer disputas
entre os indivíduos.
Esses animais apresentam um comportamento particular,
denominado homing behavior, em que os animais, uma vez deslocados
do local de nascimento, apresentam tendência natural a retornar
esse local.
CONSIDERAÇÕES
Com relação ao quesito segurança, os exemplos supracitados não devem
ser entendidos como decorrentes da existência dos jacarés, mas de
segurança das pessoas presentes na área do hospital. A possibilidade de
uma criança cair no corpo d’água não deve existir, independente da
presença dos jacarés. Pessoas do entorno entrando na área do Hospital
deve ser um ponto forte no quesito segurança do processo de
qualificação: as pessoas até então entram para pescar no corpo d’água
(sem ocorrência de acidentes com os jacarés, enfatizo), mas pode
ocorrer de pessoas mal intencionadas entrarem na área do hospital, e
nesse caso, as conseqüências não seriam decorrentes da existência dos
jacarés-do-papo-amarelo.
Assim, a translocação dos jacarés-do-papo-amarelo, além de
desnecessária, é tecnicamente incorreta pois essa trasnferência para
outro local geraria um problema onde os animais seriam soltos, por conta
do homing behavior, já que os jacarés tenderiam a sair do ponto onde foram
soltos para voltar à área do HBL. Nesse caso, mesmo que não
conseguissem fazê-lo, certamente causariam problema em outra
localidade por findarem aparecendo nas áreas urbanas, demandando
nova ação de recolhimento e destinação em um processo cíclico.
Diante do exposto, considero que o HBL está alocando tempo, dinheiro e
recursos humanos no problema de forma errônea. Por apresentar uma
área verde considerável, o HBL poderia solicitar à CPRH parecer quanto
ao manejo da área para criação de um jardim, onde as pessoas
(pacientes ou parentes destes) poderiam descansar, diminuindo o
estresse decorrente das enfermidades a serem tratadas no Hospital.
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4. Para isso, medidas mínimas de segurança podem ser adotadas pelo HBL,
mediante parecer favorável da CPRH relativo a cada um dos procedimentos, em relação ao
corpo d’água e aos jacarés. Por exemplo:
1. Colocação de cercas em todo o perímetro do corpo d’água,
considerando-se o período de maior volumetria. Isso impediria,
prontamente, a saída dos jacarés da área do corpo d’água para o
estacionamento ou outras áreas do HBL. Duas cercas seriam o
ideal, uma interna e uma externa, distantes 1,5m uma da outra. A
cerca interna poderia ainda apresentar um batente de cimento, com
cerca de 20cm de altura, o que já impede a saída do animal, embora
este não seja essencial.
2. Como a comunicação do corpo d’água com a malha hídrica é, por
mim, desconhecida, o HBL poderia solicitar à CPRH informações a
esse respeito. Assim, a esquematização da montagem das cercas
poderia ser feita de modo que não impeça o fluxo dos indivíduos
entre o corpo d’água e as outras áreas de ocorrência do animal
pelas vias naturais hoje utilizadas.
3. A colocação de seguranças em maior densidade na área, visando a
evitar que as pessoas pulem a cerca para qualquer fim, assim como
evitar que a população do entorno venha a ter acesso ao corpo
d’água.
Ainda assim, caso o HBL insista na remoção dos animais, deverá,
também, proceder à remoção do corpo d’água, uma vez que este atrairá
outros jacarés do entorno, gerando novamente o mesmo problema
tratado neste Parecer. E para tal, faz-se necessária manifestação da
CPRH, tendo em vista a possibilidade da área do entorno do corpo
d’água ser considerada uma Área de Preservação Permanente-APP.
Mesmo no caso de a CPRH ser favorável ao aterramento do corpo
d’água, a remoção desses animais, a priori, não é permitida. A norma que
regulamenta o manejo de animais sinantrópicos, a Instrução Normativa
IBAMA 141/2006 diz, em seu Art. 3º, que “Excluem-se desta Instrução Normativa
atividades de controle de espécies que constem nas listas oficiais municipais, estaduais ou federal
de fauna brasileira ameaçada de extinção ou nos Anexos I e II da Convenção sobre o Comércio
Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Ameaçadas de Extinção - CITES.”, e as
populações brasileiras do jacaré-do-papo-amarelo estão inclusas no
Anexo I da CITES.
CONCLUSÃO
A remoção dos animais não é necessária como medida que venha a
aumentar a segurança do Hospital. O mais apropriado tecnicamente, além
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5. de proporcionar bem-estar aos pacientes do Hospital seria a utilização da
área como local de lazer e descanso, após parecer da CPRH, dessas
pessoas que estão invariavelmente passando por momentos difíceis, em
decorrência das enfermidades suas ou de seus parentes.
Edson Victor Euclides de Andrade
Analista Ambiental
Matricula 171.439-3
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