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Departamento de Ciências Sociais
A ESCOLA E O MUNDO DO ALUNO
Aluno: Mariana Junqueira Camasmie
Orientador: Marcelo Burgos
Introdução
O projeto Escola e Favela, de cuja equipe faço parte, tem por objetivo estudar a
relação das escolas públicas com o “mundo dos alunos”, boa parte morador de favelas e
territórios segregados1
. Pesquisas de campo realizadas pela equipe têm evidenciado que
a maioria dos professores conhece muito pouco a realidade de seu aluno, e nesse vazio
crescem estereótipos que criam barreiras sociais que comprometem a relação de ensino-
aprendizagem, além de dificultar o desenvolvimento do trabalho de socialização escolar
voltado para a formação cidadã.
De modo a aprofundar nosso conhecimento qualitativo e confirmar os dados
quantitativos de nossa pesquisa, optamos por participar de algumas atividades escolares
que envolvessem os responsáveis pedagógicos. A partir do estreitamento de nossa
relação com as escolas pudemos observar mais de perto esta realidade ora por
solicitação de nossa parte, ora por convite da própria escola.
Uma das atividades das quais participamos e que nos forneceu importantes
informações sobre o tema que pesquisamos foi a última reunião de pais do primeiro
semestre de 2012, a qual nós pedimos permissão para assistir, tendo sido muito bem
recebidos nas nove escolas estudadas, todas localizadas no entorno da PUC-Rio.
Com isso pudemos notar pontos de articulação com a bibliografia que temos
utilizado, e que tem por objeto privilegiado o estudo dos espaços de interação entre a
escola, a família e a vizinhança. Para tanto, partimos de um referencial bibliográfico que
chama a atenção para os efeitos que a escola têm sofrido como consequência da
democratização de seu público, e para os desafios que ela precisa enfrentar para se
reestruturar e conseguir oferecer educação de qualidade.
Desenvolvimento
Ao longo das décadas de 1970, 80, 90, ocorreu a democratização do acesso à
escola pública, com a entrada de crianças e adolescentes pobres. Com isso, a escola foi
sendo obrigada a assumir novas responsabilidades como a da “gestão da pobreza”. Ao
mesmo tempo, a escola foi se “desinstitucionalizando”, isto é, perdendo capacidade de
realizar sua principal missão que é a de socializar as novas gerações na educação
escolar, pois junto à entrada maciça dos pobres nas escolas, ocorreu uma evasão da
classe média [1].
Alguns autores têm chamado a atenção para o fato de que, para se compreender
os efeitos da democratização do acesso à escola, também é necessário considerar
variáveis como a especificidade dos territórios de moradia dos alunos. Esse aspecto é
particularmente importante para cidades como o Rio de Janeiro, na qual as escolas
atendem basicamente famílias moradoras de favelas. Neste caso, é muito evidente a
presença daquilo que a bibliografia tem caracterizado como “efeitos do lugar”, que se
1
- O Projeto Escola e Favela envolve 30 pessoas, incluindo os dois coordenadores, professores Marcelo
Burgos (Ciências Sociais) e Ralph Bannel (Educação), dois professores de ensino básico da rede pública, e
estudantes de graduação e pós graduação de Ciências Sociais e Educação.
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manifesta, por exemplo, na imagem negativa que os professores têm de seus alunos e de
suas famílias, percebendo no fato de morarem em favelas uma barreira quase
indestrutível para o bom desenvolvimento do projeto escolar. Para esses professores, o
problema não estaria no método de ensino-aprendizagem, e sim nos obstáculos que a
vizinhança e suas famílias representariam para o projeto escolar[2].
O diagnóstico sobre a fragilidade institucional da escola está bem consolidado
na bibliografia, e tem dado lugar a todo um novo esforço de pesquisa e reflexão sobre
diferentes aspectos da gestão escolar [3]. A necessidade de fortalecimento institucional
tem sido apontada como um fator essencial para que as escolas possam alcançar
resultados positivos, capazes de gerar oportunidades de acesso à educação de qualidade,
independentemente da origem ou classe social do aluno. O reconhecimento da
diversidade cultural passa a ser fundamental para que se possa alcançar um horizonte de
equidade [4].
Esse tipo de abordagem coloca em cena a importância de se valorizar a relação
da escola com a família. Afinal, o aluno deve ser encarado como um “agente de
ligação” entre dois universos, um mediador na relação escola-família [5]. E isso é ainda
mais importante quando se trata de alunos pobres moradores de territórios que sofrem
os efeitos da segregação urbana. A relação escola-família demanda, portanto, um
investimento mais complexo, com repercussões sobre as relações entre a escola e a
sociedade, e, entre a educação e o Estado [6].
Objetivo
De modo mais específico, esta pesquisa tem por objetivo estudar a relação que
nove escolas públicas de ensino fundamental, localizadas no entorno da PUC-Rio, na
Gávea e na Rocinha, têm com seus alunos. Com base nela, pretendemos valorizar o
estudo das contradições existentes entre o universo escolar e a sociabilidade do mundo
do aluno, tornando mais visível os aspectos relacionados à fragilidade institucional da
escola para lidar com alunos moradores de favelas, e a distância que separa o mundo do
aluno do padrão de educabilidade esperado pela escola.
Através de nossas idas às escolas e ao analisar os relatos dos pesquisadores,
podemos perceber que em diversas escolas ainda existe uma barreira muito grande e
uma padrão de relacionamento assimétrico. Essa situação é bem conhecida na
bibliografia internacional, afinal, como nota Montadon [6] para a escola “os pais de
grande parte dos alunos são considerados ignorantes e também precisam ser educados.”
(P.13). Mas é ainda mais agravada quando se considera que as escolas com que temos
trabalhado lidam basicamente com famílias populares, moradoras de favelas.
Tal situação coloca em questão a equidade educacional. Segundo Néstor López [4], para
alcançar equidade educacional é necessário que todos tenham as mesmas oportunidades
de acesso à educação, os mesmos recursos e condições para ir à escola e participar das
práticas educativas, independentemente de sua origem ou classe social. Contudo, essa
noção de equidade só será possível, segundo López, se houver o reconhecimento da
diversidade cultural, podendo assim definir um horizonte de política educacional que
garanta a igualdade em meio a uma realidade desigual. Para isso, López considera
necessário que se considere as condições de educabilidade. A noção de educabilidade
está relacionada a um duplo processo: de um lado, as condições de vida do estudante,
que devem ser capazes de permitir que ele participe do jogo escolar; e de outro, à
capacidade da descola para lidar com o aluno real. Assim é que para que a
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educabilidade seja assegurada é necessário uma combinação de políticas sociais e
educativas.
Com uma interação positiva entre o contexto social e o sistema de ensino, a
desigualdade escolar se diluiria e todos podem ter condições de participar das práticas
educativas em um sistema que estaria preparado para lidar com qualquer tipo de aluno.
A leitura do material qualitativo produzido pela pesquisa será feita a partir desse marco
analítico, o que permitiu que prestássemos especial atenção na forma como as escolas
lidam com as famílias e a realidade de seus alunos.
Metodologia
A principal premissa que está na base da formulação de nossas estratégias
metodológicas tem sido a de que existe uma barreira entre os profissionais da escola e o
mundo do aluno e que, apesar de muitas vezes apresentarem disposição para mudar a
atual situação, ainda não dispõem de ferramentas cognitivas e de cultura de informação
que os ajude a perceber o valor que as famílias populares dão à educação escolar.
Este fato veio a se confirmar a partir do momento em que nossa esquipe realizou
algumas apresentações para os professores da pesquisa quantitativa com
pais/responsáveis realizada no ano de 2010/11. Naquela pesquisa, ficava nítido que a
percepção dos pais/responsáveis é muito distinta da visão corrente entre os profissionais
sobre o grau de comprometimento familiar com o projeto escolar. Mas nas exposições
daquela pesquisa aos professores notamos que mesmo diante de evidências empíricas os
profissionais das escolas apresentavam um alto grau de naturalização da visão negativa
em face da família, visão essa que tende a responsabiliza-la pelo fracasso escolar.
Tal situação levou nossa equipe à formulação de estratégias qualitativas
voltadas para a observação da relação face a face com a família. Neste relatório
conferimos especial atenção ao material produzido a partir da observação da última
reunião de pais do primeiro semestre de 2012.
As reuniões de pais realizadas pelas nove escolas aconteceram todas no mesmo
dia(sábado) e horário(a partir das 9hs), o que fez com que nossa equipe mobilizasse 10
pesquisadores para atuar simultaneamente nas escolas, sendo eles Julia Ventura,
Marcelo Burgos, Rafael Dutton, Gabriel de Melo, Mariana Junqueira, Fernanda Lopes,
Laura Rossi, Bernardo, Leo Ramos e Sarah Monteiro.
A incursão etnográfica foi realizada em seis escolas situadas no bairro da Gávea
(Escola Municipal Christiano Hamann, Escola Municipal Oscar Tenório, Escola
Municipal Luiz Delfino, Escola Municipal Artur Ramos, Escola Municipal Julio de
Castilhos e Escola Municipal Manoel Cícero); duas na favela da Rocinha (Escola
Municipal Paula Brito e Ciep Bento Rubião) A Escola Municipal Abelardo Chacrinha
Barbosa, embora originalmente localizada na Rocinha, funciona provisoriamente no
bairro do Horto.
Cada uma das reuniões observadas gerou um relatório que nos ajudou a entender
melhor a relação escola-família e o mundo do aluno.
A observação obedeceu a um roteiro previamente discutido pela equipe, e que
tinha como foco observar em cada escola:
1- a forma pela qual ela recebia os pais, incluindo as condições de conforto;
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2- a estrutura da exposição feita pelas escolas, incluindo o espaço para o
diálogo com as famílias.
3- Respeito ao horário, e tempo destinado a cada atividade.
Além disso, a equipe também decidiu que era importante chegar na escola em
torno de 20 ou 10 minutos antes do horário marcado para o início, pois dessa forma
poderíamos observar a chegada das famílias, suas conversas antes da reunião começar,
bem como a forma como os responsáveis seriam recebidos e os preparativos da escola
para este dia. Decidiu, também, que nossa presença não deveria interferir no andamento
da reunião e que não nos pronunciaríamos sobre nenhum assunto tratado, estando ali
somente para observar.
Finalmente, é importante observar que tomamos o cuidado de solicitar
autorização prévia da direção das escolas para assistirmos às reuniões.
Conclusões
Essas conclusões partem de uma leitura dos relatórios produzidos a partir da
observação das nove reuniões. Essa leitura procura destacar os pontos recorrentes
identificados nas escolas por nós pesquisadas. Pontos esses que a todo o tempo nos
remeteram às referências bibliográficas que têm servido de base à nossa pesquisa.
Para a exposição da pesquisa, importa lembrar que substituímos o nome das
escolas por números, de modo a preservar sua identidade.
Vale à pena ressaltar que, de acordo com nossas observações, afluência dos
responsáveis às reuniões foi alta e, em alguns casos, parece ter surpreendido as escolas,
que não estavam preparadas para receber tanta gente.
Entre os pontos mais recorrentes identificados pela pesquisa, vale a pena citar,
em primeiro lugar a falta de autonomia e ao mesmo tempo de preparo dos profissionais
das escolas, não somente de professores para lidar com a complexidade própria a esse
tipo de reunião. Muitos diretores não tiveram a preocupação de ao menos se apresentar
aos responsáveis, da mesma forma que não se preocuparam em saber os nomes destes
mesmos, tratando-os como “mãe e pai”, além de por vezes jogarem a responsabilidade
de acontecimentos dentro do ambiente escolar para a prefeitura.
Com isso, muitas vezes deixaram os responsáveis sem uma resposta concreta
para alguns problemas que são questionados, como por exemplo, segundo o pesquisador
Rafael Dutton observou, o fato de o diretor da escola [9] ter iniciado a reunião sem falar
seu nome e seu cargo. E mais a frente desculpar-se pelo fato de a reunião ser em um
sábado, justificando-se com a afirmação de que a decisão não partiu dele: “Eu levo essa
questão, mas ela continua sendo marcada aos sábados.” Ainda que evite mencionar o
nome da pessoa ou instituição de onde partiu a deliberação, fica claro aos responsáveis
que falava da prefeitura.
Outro aspecto recorrente é o fato de que em muitas escolas constatou-se que os
responsáveis são infantilizados pelos profissionais. Na escola observada por Rafael
Dutton, a diretora adjunta se referia aos alunos como “gatinho(a)” e “filhote” e aos
responsáveis como “pai” e “mãe”. Assim como Marcelo Burgos em sua observação da
escola [4] cita um momento em que a diretora fala: “Vamos começar pelo Cartão
Família Carioca, quem trouxe o papel que mandei para casa? Segundo Burgos alguns
pouco responsáveis levantam a mão e ela diz: “Fizeram direitinho o dever de casa”.
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Mas nossa observação também identificou uma certa diversidade de situações.
Dentre as nove escolas observadas cinco iniciaram a reunião com atraso.
A escola [1] que atende ao 1º segmento, iniciou sua reunião às 9:20, tanto em função da
falta de organização da escola no processo de recolhimento da assinatura dos
responsáveis para que fosse confirmada a presença.
Apesar do atraso, a escola demonstrou preocupação na hora de receber os responsáveis,
preparando uma mesa de café da manhã, e se mostrou organizada na forma como
apresentou a reunião. Porém a pauta da reunião acompanhou a sequência de slides da
apresentação, não permitindo a participação dos responsáveis. Quando houve uma
pronúncia, foi por alguma indagação feita dos profissionais da escola aos responsáveis.
A diretora falou de alguns projetos e convidou os responsáveis a participar dos mesmos;
solicitou sua presença na escola com o projeto “Pais na Escola” que é valorizado pela
diretora, segundo a pesquisadora Laura Rossi, como “uma liga entre nós e a
comunidade da Rocinha” (projeto da UNESCO que chama os pais a participarem do
“projeto da horta” que utiliza de materiais reciclados, como potes de sorvete e garrafas
PET para fazer a horta.)
A escola contou com a participação de um homem identificado pelos responsáveis como
uma espécie de guia-turístico que leva “gringos” para a Rocinha. Segundo a
pesquisadora Laura Rossi uma responsável que estava ao seu lado cochichou: “esse cara
é quem leva os gringos lá na Rocinha, ele tá sempre cheio de gringos”. Ele foi falar do
projeto “Bairro Educador”, da Secretaria de Educação, que trabalha na relação da
comunidade com a escola e por isso exige a participação dos pais, convocando-os para
as reuniões que acontecem as sextas-feiras no complexo esportivo da Rocinha.
No fim da reunião foi passado um clipe da música “Família” do Titãs em homenagem
aos responsáveis.
Apesar da valorização da parceria com os pais, pode-se perceber que os responsáveis já
chegam ao fim da reunião um pouco impacientes, levantando com frequência para ir até
a mesa de café da manhã, ficando clara também a tendência “infantilizadora” em
alguns momentos quando as responsáveis são chamadas de “mãe”.
A escola [2] que atende ao 2º segmento, chamou a atenção pela falta de organização e
também de respeito com os responsáveis que estavam esperando a reunião começar,
pois quando começou a se questionar o atraso foi-lhes dada a informação pela porteira
da escola, de que a reunião estaria marcada para as 9:30(informação contrária ao aviso
que tinha sido enviado aos responsáveis). Os profissionais da escola aos poucos foram
chegando e a reunião só foi iniciada às 9:45. Entretanto, os comentários sobre a escola e
a direção eram os melhores, como por exemplo, quando a pesquisadora Julia Ventura
cita o momento em que uma responsável diz que a diretora é maravilhosa e diz: ”Ela é
tudo aqui”. Entretanto a pesquisadora Julia cita um momento em que uma responsável
critica a diretora adjunta dizendo: “abusada, acha que só porque a gente é da favela é
igual a pano de chão”.
Segundo a pesquisadora, em cada sala de reunião havia uma cartaz escrito “Matriz
Fofa”, que dizia respeito às características de cada turma daquele ano escolar. Fato que
remete um pouco ao trabalho que vem sendo feito por nossa equipe de valorizar a
interação com os alunos ao saber mais sobre eles e sua realidade.
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Os responsáveis se mostraram extremamente interessados nos assuntos apresentados
pelos profissionais da escola. Ao término da reunião os responsáveis procuraram os
professores para obter mais informações, deixando claro o interesse sobre a escola e a
educação de seus filhos.
A escola [3], que é de 1º segmento, só abriu os seus portões para receber os
responsáveis as 9:25. Mas a diretora da escola os saudou segundo o pesquisador
Bernardo, de forma carinhosa e ao mesmo tempo infantilizando os responsáveis ao
dizer: “Aqui mãe, entre aí, fiquem aqui no pátio um pouquinho até os outros pais e mães
chegarem para começarmos”. Mas os recepcionou muito bem com uma explicação dos
assuntos mais gerais para depois encaminhá-los para as salas onde seria realizada a
entrega dos boletins.
A diretora se colocou à disposição dos responsáveis para quem tivesse interesse sobre
assuntos do CEC (Conselho Escolar). E enfatiza que o CEC serve para tratar de
assuntos como por exemplo o fato de não ser permitido que se leve biscoitos e/ou
comida para a escola, mas se esquivando da responsabilidade quando diz: “não fui eu
que fiz a lei”, segundo o pesquisador Bernardo, referindo-se à norma que proíbe que os
alunos levem alimento para a escola.
A escola preparou uma mesa de café da manhã para a recepção dos responsáveis, mas
ao mesmo tempo a diretora se desculpou pois o início da reunião seria com todos de pé
no pátio da escola para tratar dos assuntos gerais. Somente na hora da entrega de
boletins e assinaturas é que os responsáveis foram encaminhados para as salas.
A escola [4] que atende aos dois segmentos, iniciou a reunião às 9:12, um pequeno
atraso, porém a maneira como se iniciou a reunião foi o que chamou a atenção. Pois
houve uma falta de organização quanto às acomodações para os responsáveis. Muitos
assistiram a reunião de pé. E quando todos estavam presentes à espera da reunião, os
profissionais da escola ainda tentavam montar uma estrutura de power point, que mais
atrapalhou do que ajudou, pois as informações apresentadas na tela não estavam em
sintonia com o que a diretora falava.
Pode-se perceber que a reunião e os profissionais envolvidos não valorizaram
minimamente a participação dos responsáveis. Ao contrário, pois segundo o
pesquisador Marcelo Burgos, as poucas pessoas que tentaram falar sentiram que aquele
esforço era inútil. Dessa forma não se criou um espaço de diálogo com os responsáveis
para assim estreitar a relação escola-família.
A diretora foi a figura central da reunião, quase sempre utilizando o método pergunta-
resposta como por exemplo, quando o pesquisador Marcelo Burgos cita o momento em
que ela pergunta aos responsáveis se eles sabem o motivo da reunião e ela mesma
responde, ou quando ela tenta convencer os responsáveis de participar do
CEC(Conselho Escolar) dizendo: “ Se eu não tiver o CEC completo não vou receber o
dinheiro?” “Mas é só para cuidar do dinheiro o CEC?” Ela mesma responde: “não, ele
tem outras funções. Por exemplo solicitar um quebra-molas aqui em frente à escola para
que ninguém seja atropelado”. Segundo o pesquisador Marcelo, neste momento o
auditório fica sabendo que um aluno foi atropelado em frente à escola na semana
anterior.
A dinâmica da reunião denota falta de organização e preparo quando os slides passados
não estão de acordo com a fala da diretora. E segundo o pesquisador Marcelo, o barulho
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feito pelos responsáveis que estavam à espera na fila para registrar presença e inscrição
no Cartão Família Carioca aumenta gradativamente junto à falta de interesse daqueles
que estão assistindo à reunião.
O pesquisador Marcelo Burgos identificou a dinâmica da reunião com muita falta de
empenho, experiência e competência para esse tipo de situação.
A escola [5] que é de 1º e 2º segmento, teve um pequeno atraso, iniciando sua reunião
às 9:15, mas demonstrou preocupação com os responsáveis, na maneira como se
preparou para os receber. Esta a escola recebeu os responsáveis com uma mesa de café
da manhã, e com uma música ambiente que tornava o clima mais agradável. A diretora
recebeu todos os responsáveis muito bem, encaminhando-os para as respectivas salas
onde seriam realizadas as reuniões por turma.
Houve um breve diálogo entre os profissionais da escola e os responsáveis. Notou-se
uma preocupação mais de alguns professores do que de outros que apressavam um
pouco com a reunião. Mas em ambos os casos a oportunidade de falar era dada aos
responsáveis, porém sem muita ênfase no assunto questionado, salvo exceção de uma
turma onde a professora fala dos assuntos da pauta e se estende ao falar de “namoricos”
dos alunos que estão entrando na adolescência, atendendo a pedidos de responsáveis
para que fique de olho, ou assuntos de faltas quando uma responsável questiona as faltas
do filho, e a professora explica com atenção o fato de que se estão justificadas não irão
atrapalhar.
Em outras turmas a oportunidade de falar era dada aos responsáveis, porém quando era
feita alguma pergunta a resposta era sucinta e logo o assunto era interrompido. E
algumas vezes pode-se notar o fato de que os profissionais da escola tiram de si a
responsabilidade de alguns acontecimentos, como por exemplo quando uma professora
diz que precisa da ajuda dos pais, pois não tem a ajuda da Secretaria de Educação, e
uma responsável se manifesta dizendo: “Mas é papel da diretora falar com a Secretaria”
e a professora diz: “é culpa da Prefeitura que não dá dinheiro para comprar pilha para o
microfone, que a sala dos professores ficou sem água durante cinco dias...” Assuntos
que não dizem respeito aos responsáveis são colocados como um problema na reunião
para tratar dos alunos.
A escola [6], que é de 1º segmento, se esforçou ao organizar apresentações dos alunos
de diferentes turmas cantando e recitando poemas em homenagem aos pais e mães ali
presentes. Houve alguns problemas com o som, mas a atitude demonstrou empenho dos
profissionais da escola. Um profissional de saúde foi convidado para alertar os
responsáveis sobre a vacina da gripe e paralisia infantil, bem como as datas e as faixas
etárias que devem ser vacinadas as crianças. Pode-se perceber que os professores
incentivaram o diálogo com a tentativa de estreitar a relação escola-família. Entretanto,
os responsáveis não demonstraram um real interesse nas atrações, pois segundo os
pesquisadores Leo Ramos e Sarah Monteiro, muitos deles levantaram no meio da
reunião transitando pelo espaço da escola, e a diretora ao perceber a movimentação se
preocupou em informar que quem tivesse filho em outra escola não precisaria se
preocupar, pois a presença dele seria registrada ali e não haveria problema de falta.
A forma como a escola conduziu a reunião parece ser resultado do esforço que
realizamos através da pesquisa. Por exemplo, a percepção que os pesquisadores Leo
Ramos e Sarah Monteiro tiveram de que a iniciativa de uma diálogo partia sempre dos
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professores, e a diretora se disponibilizando a conversas posteriores a reunião quando
fosse da vontade dos responsáveis.
A escola [7] que é de 1º segmento, parece não ter se organizado de forma adequada para
receber todos os responsáveis. Prova disso é que a reunião foi realizada por ordem de
chegada, já que não tinha espaço para todos. A recepção foi organizada e a diretora
demonstrou um caráter autoritário ao lidar com os responsáveis, como por exemplo,
quando ainda não era 9hrs e um responsável reclamou que teria de trabalhar e segundo o
pesquisador Gabriel de Melo, a diretora foi categórica ao dizer em tom de voz mais alto
que a reunião estava marcada para as 9hs e que não queria que ninguém conturbasse a
manhã dela, disse para esperar e o responsável com um pequeno sorriso aceitou.
Além disso, somente a diretora teve autonomia para conduzir a reunião, dificultando
ainda mais o diálogo entre professores e responsáveis. Assim embora os responsáveis
tenham sido bem recebidos não tiveram espaço efetivo para dialogar com a escola.
A diretora alguma vezes teve uma atitude que segundo o pesquisador Gabriel, intimidou
os responsáveis como por exemplo quando ela diz não aceitar a ideia de os pais
criticarem a escola e enfatiza que é com disciplina e rigor que a escola chega ao
progresso, e dizer que a escola não era de qualidade era um desrespeito que segunda ela:
“não admito desrespeito e se desrespeitar, se isso acontecer vou chamar apara
conversar”. Segundo o pesquisador Gabriel, a diretora deixa claro que os alunos devem
ter uniformes decentes e não blusa rasgada e encardida, enfatizando: “Muitas crianças
chegam aqui igual a uma “mulambinho”.
Segundo Gabriel, a segunda parte da reunião, que foi feita com os responsáveis que
foram chegando depois, já se notava um pouco mais de impaciência da parte dos
responsáveis, tendo que a diretora intervir quando alguns queriam ir embora.
De acordo com o relato da pesquisadora Fernanda Lopes, a escola [8] que é de 1ºº
segmento, procurou organizar uma reunião mais objetiva, tratando de assuntos gerais
como Cartão Família Carioca, Bolsa Família e outros. A reunião também contou com a
participação de profissionais de saúde para alertar os responsáveis sobre aqueles alunos
que vão para a escola com piolho e pede que os pais não mandem seus filhos para aula
quando estiverem com piolho, e diz “temos remédio, mas eu peço para que vocês em
casa cuidem também.” A técnica de enfermagem, assim apresentada, pede que os
responsáveis coloquem o telefone atualizado na agenda dos alunos para que possa ser
feito contato. Fato que remete ao esforço de nossa equipe feito durante nossa pesquisa
dentro das escolas nas fichas de matrícula que eram desprovidas de informações como
endereço e telefone dos responsáveis.
Ao final da reunião da escola [8] foi feita a entrega de boletins.
A escola [9], também de 1º segmento, dividiu a reunião por salas, e segundo o
pesquisador Rafael Dutton, o diretor informou que o assunto da reunião era
especificamente sobre o Cartão Família Carioca, mas que os professores se
disponibilizaram a realizar a entrega de boletins e assuntos diversos no mesmo dia.
Antes do início da reunião o pesquisador Rafael relata ter ouvido comentários dos
responsáveis do tipo: “Pelo amor de Deus, não tem nem café!” , “Eu só vim por causa
do CFC(Cartão Família Carioca)” , “Essa reunião é pra que?”.
Departamento de Ciências Sociais
A falta de organização da escola levou alguns responsáveis a assistirem a reunião de pé.
Contudo, o diretor se preocupou com o fato de alguns responsáveis estarem do lado de
fora da sala em pé, convidando-os para entrar e participar da reunião. Fato que
demonstrou um mínimo de preocupação.
O diretor da escola se desculpou pelo fato de a reunião ser em um sábado ao mesmo
tempo em que jogou a responsabilidade para a prefeitura. E ao falar do assunto principal
da reunião o diretor utilizou um método de pergunta-resposta, “Quem recebe o Bolsa
Família tem direito ao Cartão Família Carioca? Eu não sei!” E dessa forma o assunto
principal da reunião ficou sem ser explicado para os responsáveis que estavam ali para
isso.
Os responsáveis não tiveram oportunidade de fazer perguntas já que o diretor falou
muito rapidamente dos assuntos e segundo o pesquisador Rafael perguntou
apressadamente: “Mais alguma dúvida?”, mas não deu tempo para que fossem tiradas as
dúvidas, se estas existissem. O diretor terminou o reunião sem uma despedida formal e
sem anunciar o término.
Todas as reuniões tiveram que percorrer assuntos comuns como informações sobre o
Bolsa Família, o Cartão Família Carioca (O CFC caba aqueles que já tem o Bolsa
Família e tem as mesmas obrigatoriedades, como uma alta frequência dos alunos.), as
eleições para o Conselho Escolar o CEC, e a questão das faltas dos alunos (por
preocupação ao RioCard que é o que segundo os professores é o que contabiliza as
faltas pois eles tem que passar o RioCard em uma máquina quando chegam na escola,
como uma espécie de carteirinha.
Todas as escolas seguiram esta pauta, porém, algumas se mostraram muito mais
preocupadas com os responsáveis, com seus questionamentos do que outras que por
vezes nem chegaram a responder perguntas feitas por eles.
De uma maneira geral, nossa pesquisa constatou dois aspectos fundamentais, que
precisarão ser aprofundados através de novas observações:
1 – uma certa falta de preparo das escolas para receberem uma presença maciça de
responsáveis, que se refletiu em problemas de logística, como falta de cadeiras para
todos poderem assistir à reunião sentado e de forma confortável; problemas de acústica;
utilização inadequada de power point, etc.
2 – falta de treino dos diretores e professores para efetivamente promoverem um
dialogo com os responsáveis, situação que reflete uma baixa capacidade da escola para
contribuir para a melhoria da educabilidade, nos termos anteriormente apresentados.
Apesar dessas duas constatações, que de certo modo correspondem ao que a
bibliografia vem apontando, também verificamos em alguns casos uma disposição dos
profissionais da escola para mudar seu padrão de relação com as famílias.
Uma das pretensões dessa pesquisa é justamente a de que ela possa contribuir para que
as escolas possam melhorar a forma como lidam com as famílias, tornando-se, com
isso, mais próximas do mundo de seus alunos.
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Referências Bibliográficas
[1] PEREGRINO, Monica - TRAJETÓRIAS DESIGUAIS: Um estudo sobre os
processos de escolarização pública de jovens pobres. Ed Garamond,2009.
[2] BURGOS, Marcelo e PAIVA, Ângela – A Escola e a Favela. Editora PUC-
Rio/Pallas, Rio de Janeiro, 2009
[3] BURGOS, Marcelo Baumann & CANEGAL, Ana Carolina (2011) – ”Diretores
Escolares em um contexto de reforma da educação”. Revista Pesquisa e Debate em
educação. Revista do Programa de Pós-Graduação Profissional Gestão e Avaliação da
Educação Pública. V1. N.1, 2011.
[4] LOPEZ, Néstor – Equidad Educativa Y Desigualdad Social. Desafíos a la educación
en el nuevo escenario latinoamericano. IIPE – UNESCO, Buenos Aires, 2005.
[5] MONTADON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe – Entre pais e professores, um diálogo
impossível?. Celta Editora, Oeiras, 2001.
[6] SILVA, Pedro – Escola-Família, uma Relação Armadilhada. Interculturalidade e
Relações de Poder. Edições Afrontamento, Porto, 2003.
ANEXO
Neste anexo apresento as resenhas dos textos lidos ao longo do primeiro semestre de 2012, e
que foram sendo feitas a partir dos seminários semanais de discussão dos textos realizados
com o professor orientador.
As resenhas contemplam capítulos dos seguintes livros:
PEREGRINO, Monica - TRAJETÓRIAS DESIGUAIS: Um estudo sobre os processos de
escolarização pública de jovens pobres. Ed Garamond,2009.
BURGOS, Marcelo e PAIVA, Ângela – A Escola e a Favela. Editora PUC-Rio/Pallas,
Rio de Janeiro, 2009
BURGOS, Marcelo Baumann & CANEGAL, Ana Carolina (2011) – ”Diretores
Escolares em um contexto de reforma da educação”. Revista Pesquisa e Debate em
educação. Revista do Programa de Pós-Graduação Profissional Gestão e Avaliação da
Educação Pública. V1. N.1, 2011.
LOPEZ, Néstor – Equidad Educativa Y Desigualdad Social. Desafíos a la educación en
el nuevo escenario latinoamericano. IIPE – UNESCO, Buenos Aires, 2005.
MONTADON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe – Entre pais e professores, um diálogo
impossível?. Celta Editora, Oeiras, 2001.
SILVA, Pedro – Escola-Família, uma Relação Armadilhada. Interculturalidade e
Relações de Poder. Edições Afrontamento, Porto, 2003.
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Texto Resenhado:
PEREGRINO, Monica - TRAJETÓRIAS DESIGUAIS: Um estudo sobre os
processos de escolarização pública de jovens pobres.
A escola como “espaço social”:
Na escola estudada, a autora tenta denominar as turmas, porém, conforme dá
continuidade ao seu estudo, ela muda um dos codinomes escolhidos. As turmas que ela
chamara de “terminais”, por terem em comum o fato de ser o último estágio antes da
saída da escola, já não são vistas somente por esse ângulo. Essa mudança ocorreu após
diversos fatores diante de sua observação.
Para a autora, essas turmas somam todos os efeitos das precariedades escolares e
sociais, junto a todos os “estranhamentos” referentes à instituição. Ela observa alguns
padrões de turmas dentro da escola, cada uma com a sua “personalidade”.
Ao mesmo tempo em que a autora encanta-se com uma das turmas, pela multiplicidade
de experiência que incorporava, ela também se sente um pouco afastada de uma outra
turma e, acaba culpando-se pelo fato de ter “habilidade” com turmas “difíceis”, e
contudo isso ter limitado seu trabalho com turmas mais “tranqüilas”. Ela chega a fazer
uma comparação com o trabalho nas escolas de classe média, diante dessas turmas, as
quais ela deu o nome de “turmas plenas”.
Após sua observação, a autora coloca em questão: “o que produz essas divisões no
interior da escola?” Chegando à conclusão que essas divisões nada mais são do que uma
hierarquização como forma de justificar socialmente a distinção feita dentro de uma
escola que produz desigualdade.
As turmas “plenas” (“tranquilas”) são as primeiras a receberem os livros didáticos, pois
na escola são as turmas que as próprias escolas denominam como as “turmas do “topo”.
Por conta dessa distribuição injusta, muitos alunos e turmas da categoria mais “baixa”,
ficam sem os livros didáticos. Até mesmo os professores são escolhidos de acordo com
essa hierarquização feita sobre as turmas. Contudo, a autora esclarece que, as escolas
são realmente “espaços hierárquicos com bons espaços de seleção que (ainda) são.”
O meu entendimento sobre o texto está de acordo com a visão da autora, pois não pode
ser negado ou privado de uma turma, livros didáticos ou outros bens simbólicos que
fazem parte do aparelho escolar, “considerados como precariamente legítimos, ou
mesmo ilegítimos...” somente porque essas turmas concentrem atributos negativos.
Seleção e segregação nas trajetórias escolares das décadas de 1970, 1980 e 1990:
Inicialmente a autora nos mostra a firma como fora realizada a sua pesquisa, quais os
seus objetivos e a busca pelo entendimento sobre as mudanças nas manifestações das
desigualdades no interior da escola.
A pesquisa levantou os dados a partir da década de 1970.
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Os dados incorporados a trajetória escolar dos alunos como: ano de nascimento, local de
moradia e profissão dos pais, recordou-me a pesquisa da qual participo atualmente.
Deixei de fora a presença ou ausência do atestado de pobreza, pois como a autora
mesma disse, este era exclusivamente para a década de 1970.
A autora nos mostra que a década de 1980 fora marcada pela construção dos CIEPs, e as
trajetórias foram colhidas ainda sob o impacto do governo de Leonel Brizola.
O levantamento das escolas de origem dos alunos está presente até os dias de hoje em
pesquisas como a que participo.
No momento em que a autora fala da moradia em favela e o fato de assim, essas
crianças ocuparem a mais precária posição social da cidade, me chamou atenção a
citação de Telles, 1999, p.85-86 (pág. 117 do livro), pois ela descreve quase que
poeticamente o problema do qual a autora se refere.
“Como problema que inquieta e choca a sociedade, a pobreza aparece sempre como
sinal do atraso, pesado tributo que o passado legou ao presente e que envergonha um
país que se acostumou a pensar ser “o país do futuro”. Tal como num jogo de espelhos
invertidos, a pobreza incomoda ao encenar o avesso do Brasil que se quer moderno e
que se espelha na imagem – ou miragem-projetada das luzes do Primeiro Mundo. Neste
registro, a pobreza é transformada em natureza, resíduo que escapou à potência
civilizadora da modernização e que ainda tem que ser capturado e transformado pelo
progresso.”
Um problema que passa da década de 1970 para 1980, deixando a marca da separação
entre os desiguais e, uma nítida delimitação que marca as diferenças entra favela e
asfalto.
Outra marca que fica clara, referente as duas décadas citadas anteriormente, é a inversão
dos estudantes de escola pública moradores de bairros no asfalto para moradores de
favelas, e essa inversão se concretiza na década de 1990.
A autora cita também a precariedade das fichas de matrícula e o momento caótico de
seu preenchimento. Então, novamente faço uma relação com a pesquisa da qual
participo e, se confirma um problema ainda existente nas escolas públicas do Estado do
Rio de Janeiro.
A década de 1990 é marcada pelas mudanças drásticas em relação a profissionalização
dos pais dos alunos da escola estudada, porém, dentre essas drásticas mudanças,
houveram também discretas variações quando fora colocado em comparação o tipo de
trabalho dos pais. A autora cita também as peculiaridades relativas ao levantamento das
categorias profissionais em cada uma das décadas pesquisadas.
É importante notar a mudança, ou até mesmo, a redução do tipo de trabalho dos pais a
cada década estudada, através das peculiaridades que a autora cita.
Ela faz um trabalho que permite a nós leitores, identificar dentro do texto, o que ela
chama de “os desiguais”, e o porque, de haver uma “seletividade” desses “desiguais”
dentro da escola pública.
Nas décadas estudadas havia o atestado de pobreza e, durante sua etnografia, a autora se
deparou com diversas contradições relativas às condições sociais daqueles que tinham
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esse atestado, quando colocado em comparação a outros registros escolares como, o
local de moradia e profissão dos pais, os quais haviam sido informados também na hora
de pedir o atestado de pobreza, porém, as informações eram outras nas fichas de
matrícula escolar.
A situação dos alunos dentro da escola era basicamente dividida entre “extremos” e
“não extremos”. Esses espaços eram bem demarcados dentro da escola, entre seus
turnos e turmas.
A década de 1980 passa por um processo de evasão escolar em todo o país e, junto a
evasão, a escola sofre um processo de inversão, e assim os alunos freqüentadores de
escolas públicas, passam a ser os pertencentes a faixas cada vez mais vulneráveis da
sociedade.
Torna-se notória a inversão através do aumento da proporção de favelados que supera a
de moradores do asfalto.
Saber da precariedade do Ensino Público, todos nós sabemos, porém, é triste saber tão
detalhadamente, sobre o descaso relativo ao Plano de Desenvolvimento Econômico e
Social do Estado do Rio de Janeiro. Saber que, mesmo com todos os problemas
diagnosticados, optaram por não tratar a educação como uma prioridade no governo da
nossa cidade.
A autora mostra que, na década de 1990, o fator de inversão se mantém, relativo a
década anterior e, aumenta em relação a década de 1970.
Alguns fatores tornam-se repetitivos, como por exemplo: “o grande número de alunos
moradores do asfalto, filhos de pais com ocupações ligadas aos serviços domésticos, em
especial diaristas, domésticas e porteiros.”
Diante de todos os levantamentos feitos pela autora, constata-se que, mesmo a escola da
década de 1990 assemelhando-se à escola dos anos de 1980, houve uma melhora
significativa e uma mudança, a qual chamaram de: “o sentido da escolarização.” Assim,
a escola da década de 1990, começa a ter dignidade, porém, em termos de processo
educativo, os projetos realizados acabam por não deixar marcas das metas desejadas.
É a chamada: “escolarização sem escola”.
A pressão seletiva diminuiu na década de 1990, contudo não foi eliminada e, se mantém
com o mesmo método, o de beneficiar os “não extremos”.
Segundo a autora, a segregação dos desiguais precede a seleção, mas a década tem sua
peculiaridade, e um mecanismo de “segregação positiva”, “com uma capacidade de
atualizar as formas de “separação dos melhores” das duas décadas anteriores: separando
turmas como na década de 1970 e recuperando a experiência acumulada na década de
1980, inserindo os “seletos” nas “primeiras turmas”.”
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Texto Resenhado:
BURGOS, Marcelo e PAIVA, Ângela – A Escola e a Favela.
A Escola e A Favela
As escolas públicas que atendem crianças moradoras de favela não têm profissionais
que conheçam a realidade desses alunos, causando um distanciamento maior ainda além
da distância social já existente, a qual eles sofrem diariamente. Distância essa, ainda
mais forte nas escolas situadas em bairros de classe média e alta dessa cidade.
Nessa realidade, até quem tem que dar força e incentivo para as escolas e seus
professores e diretores, não acredita em seu próprio trabalho e no poder que tem nas
mãos para melhorar o que ainda está em tempo de ser feito, ou acredita, mas não quer se
dar o trabalho por achar que do jeito que está, está bom.
A pesquisa de opinião dos professores e diretores mostra que a falta de apoio e
estrutura familiar, atrapalha no desenvolvimento e na organização escolar do aluno, e
que a cultura na qual eles são criados dificulta muito na mudança de maus hábitos
desses alunos. Essa fala é recorrente.
Porém, a maioria dos profissionais visualizam somente esse lado da história, deixando
de fora a falta de estrutura escolar na qual eles vivem diariamente, junto a falta de
segurança e algumas vezes de professores desinteressados. Esses são fatores que se
fossem criadas melhorias, a escola com certeza estaria melhor e o respeito dos alunos
seria evidente.
A visão passada é a de que essas crianças não são tratadas com amor, carinho e respeito
por seus pais e familiares, e que desde cedo já lhes são dadas responsabilidades, e a
infância vai ficando para depois. Quando na verdade a única responsabilidade que essas
crianças deveriam ter, é a de estudar.
Essa fala dos professores me recordou muito a nossa pesquisa, das vezes em que fui a
alguma escola para tentar achar um responsável do aluno e não conseguia, pronto, já era
motivo para ouvir que os pais não estavam nem aí para os filhos, e que viviam largados.
É realmente essa visão que a escola em geral tem dos pais. A distância entre esses “dois
mundos”, atrapalha de verdade, pois os professores não conhecem a realidade em que
eles vivem , mas as crianças conhecem as duas realidades, porém só tem acesso direto à
uma delas.
Torna-se cada vez mais notório que, a falta de estrutura escolar é uma das principais
causadoras do desinteresse dessas crianças pelos estudos. Contudo, é apenas uma das
causas.
O professor agindo sozinho, tem algum efeito, mas falta um apoio que vai além da sala
de aula e da diretoria, como cursos, oficinas, para os alunos e para os próprios
professores, para que eles sejam incentivados a dar uma boa aula, para que adquiram
novos conhecimentos e tenham novidades para a turma, e assim os alunos venham a se
interessar.
O diálogo entre professor e aluno é natural, saudável, os alunos realmente gostam e
sentem-se mais à vontade para ter aula com alguém que tenham mais intimidade. Então
quando se tem um professor tão desmotivado quanto o aluno, fica difícil a convivência,
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pois se ele já não tem mais paciência para lecionar, imagina para falar de algum assunto
que não seja da matéria.
Conforme mantive a leitura, pude observar que, mesmo com o esforço de uma das
escolas em intensificar o apoio através de ONGs, ainda assim o poder público não
valoriza esse tipo de atitude, e não enxerga o quão seria importante para todas as
escolas, que tivessem esse tipo de apoio. Mais uma vez faço uma relação com a
pesquisa da qual participo.
Ao passar para o capítulo seguinte, encontro uma breve explicação em relação ao rumo
que as escolas públicas tomaram desde a década de 1960. O crescimento escolar não
acompanhou o crescimento populacional brasileiro, e um problema antigo, mas que se
mantém atual, onde os gastos com a educação não estão de acordo com as necessidades
que as escolas têm.
E para falar um pouco do tráfico, é triste observar como as pessoas moradoras de favela
ficam reféns das leis de onde moram, assim como quem mora onde existe a “milícia”, e
mais triste ainda é perceber que algumas pessoas, mesmo não sendo moradores de
favela, acreditam que uma das duas formas de “governo”, possa trazer algum tipo de
melhora para a vida escolar dessas crianças.
Uns falam como se o tráfico colocasse medo e a “milícia” viesse a impor respeito,
contudo, não conseguem enxergar que os dois colocam medo. Os moradores ficam
amedrontados e viram reféns das leis que são impostas pelos chefes de onde moram.
A realidade é que as duas favelas da pesquisa tem muita violência, mas onde existe a
“milícia” é uma violência velada, pois eles querem que pareça um lugar de
tranquilidade, exatamente para não chamar atenção. Já com o tráfico fica tudo às claras,
é aquela história de que eles não têm nada a perder.
Texto Resenhado:
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BURGOS, Marcelo Baumann & CANEGAL, Ana Carolina (2011) – ”Diretores
Escolares em um contexto de reforma da educação”. Revista Pesquisa e Debate em
educação.
O texto fala de uma imersão etnográfica realizada em quatro escolas públicas ao fim do
ano de 2010, duas dessas escolas situadas em Recife (PE), pertencentes à rede estadual,
e duas no Rio de Janeiro, sendo uma da rede municipal e outra da rede estadual. Ambas
atendem crianças e adolescentes de regiões periféricas.
Os atores principais dessa pesquisa são os diretores das escolas. O diretor deve estar
apto para ouvir e tentar resolver os problemas da escola, dos professores, dos alunos, e
seguindo as regras do sistema. A impressão que passa o texto é a de que o diretor está
na instituição como água, ocupando todos os espaços e, como dizem os autores, “...ele
tende a se confundir com a instituição, imprimindo um padrão personalista à sua
atuação – o que não deixa de evidenciar a fragilidade institucional da escola.” (p.22)
A ideia de autonomia escolar discutida no texto não se fortalece, pois, dentro do
ambiente escolar cada um age sozinho. O sindicato está preocupado com os interesses
dos professores, os pais preocupam-se apenas com os interesses de seus filhos, e a
direção da escola se vê sozinha tendo que resolver todos e quaisquer problemas que
venham a aparecer.
De acordo com os autores, a escola pública está submetida às políticas de gestão de
pobreza desde os anos de 1980 e 1990. E, ao mesmo tempo, essas escolas têm que ser
capazes de lidar com o fracasso da autonomia escolar que surgiu junto à
redemocratização do país.
Os autores falam da universalização do acesso ao Ensino Fundamental, consolidada em
meados dos anos de 1990, que teve seu início nos anos de 1970.
O trabalho etnográfico mostra que a escola não estava preparada para lidar com esse
alunado. As políticas de valorização do desempenho escolar implantadas pelo sistema,
não surtiram efeito fazendo com que a fraqueza institucional permaneça, tanto em
Recife, quanto no Rio de Janeiro.
Burgos/Carolina falam da descentralização como um fortalecimento da autonomia
administrativa das unidades escolares, o que geraria o incentivo a uma participação mais
consistente das comunidades escolares através de processos de reforma educacional.
Porém esse processo foi sendo deixado para trás com o surgimento da avaliação da
eficiência escolar.
A pesquisa mostra modelos diferentes, mas segundo os autores, o propósito é o mesmo;
a criação de mecanismos eficientes de ensino e aprendizagem.
Uma das conclusões obtidas da pesquisa é a de que uma escola só terá autonomia se
houver participação de toda a equipe, da comunidade escolar e do sistema.
Segundo Neubauer e Silveira, citados por Burgos/Carolina, “somente existe autonomia
se houver um ambiente de gestão compartilhada.” (p.29) Porém, a dificuldade de se
construir uma escola participativa em países com historia de autoritarismo como o
Brasil, é reconhecida pelas autoras.
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A partir dos anos de 1990, a avaliação do ensino é utilizada como um parâmetro para
que se possa punir ou premiar e não mais com o intuito de que os alunos tivessem uma
real aprendizagem daquilo que estava sendo ensinado.
Assim foi sendo implantado o sistema de responsabilização, que serve para analisar o
desempenho de cada escola e, a partir desse ponto classifica-las.
Ainda que sem ter o apoio necessário, o diretor se vê pressionado pelo vértice do
sistema, tendo que prestar contas aos sistemas de responsabilização e vendo cada vez
mais distante a ideia de autonomia.
Como já foi dito, a pesquisa realizada nas quatro escolas denomina o perfil das diretoras
como personalista, pelo fato de comandarem a escola de maneira pessoal.
Principalmente nas escolas 1, 2 e 3, nota-se que as diretoras estabelecem relações
interpessoais com os funcionários, fazendo com que a confiança muitas vezes dependa
menos do exercício do papel do que de laços de amizade e até de compaixão. Nessas
escolas, a proximidade com os alunos também é evidente, e os pesquisadores dão como
exemplo a forma pela qual os alunos adentram a sala da direção sem precisar
autorização para isso.
Mas na escola 4 é diferente, pois a diretora mantém um papel mais institucional.
A pesquisa mostra diversos problemas, e as diretoras estão sempre prontas para
resolver, sejam eles de administração, portaria, alimentação, entre outros. Isso se dá pela
baixa divisão do trabalho nas escolas e pela falta de profissionais capacitados para
determinadas funções. A confirmação dessa precariedade se deu quando os
pesquisadores foram solicitados para realizar algumas funções dentro da escola onde
estavam trabalhando.
Esse perfil personalista não aparece na escola 4 porque, segundo o pesquisador, lá “a
direção atua como uma extensão da administração central.” (p.39)
As outras três escolas manifestam um desconforto ao receberem ordem de pessoas que,
segundo a direção, não fazem parte da rotina escolar.
Outro fator citado no texto, que dificulta uma melhor relação entre a escola, a
comunidade escolar e o sistema, é a resistência da direção em se atualizar ao sistema de
informática, pelo fato de serem gerenciados pela administração central, mantendo assim
suas formas tradicionais de controle escolar.
Para que esse perfil personalista deixe de fazer parte da direção de uma instituição
escolar, é preciso, segundo os resultados da pesquisa, que “as reformas educacionais se
preocupem mais com o fortalecimento institucional da escola.” (p.41)
O diretor deve ter autonomia para que assim a escola tenha condições de ter um bom
desenvolvimento, mas essa autonomia não pode estar referida ao seu personalismo, que
os coloca em meio aos sentimentos de solidão e de mal-estar.
A pesquisa mostra a dedicação dos diretores e a vontade que eles têm de trabalhar,
porém, “faltam-lhes competências técnicas mais específicas para a gestão de um
ambiente tão complexo como são as escolas” (p.42)
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É necessário que o diretor reveja seus conceitos e sua maneira de agir, aceitando
modificar sua forma tradicional de lidar com a gestão, e investir numa capacitação
técnica para que nem ele, nem a escola, nem seus alunos sejam prejudicados.
Texto Resenhado:
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LOPEZ, Néstor – Equidad Educativa Y Desigualdad Social. Desafíos a la educación
en el nuevo escenario latinoamericano.
Após a leitura dos capítulos 2, 3 e 6, do livro a que me refiro, pude observar que,
segundo López , desenvolver estratégias adequadas de institucionalização é essencial
para alcançar resultados positivos dentro das escolas pesquisadas. Mas antes que sejam
desenvolvidas essas estratégias, é preciso conhecer o ambiente escolar, suas
necessidades e a realidade das pessoas que o habitam, para assim, haver interação entre
educação e equidade social.
Segundo López, para alcançar equidade educacional, é necessário que todos tenham as
mesmas oportunidades de acesso à educação, os mesmos recursos e condições para ir à
escola e participar das práticas educativas, independentemente de sua origem ou classe
social. Contudo, essa noção de equidade só será possível, segundo López, se houver o
reconhecimento da diversidade cultural, podendo assim definir um horizonte de política
educacional e garantir igualdade dentro de uma realidade desigual. Realidade essa que é
oposta à realidade das escolas, a qual não tem capacidade de fornecer um ensino de
qualidade a todos, onde muitos alunos e suas famílias não detém os recursos necessários
para receber esse ensino de qualidade.
Segundo López, a noção de educabilidade deve estar relacionada com o ensino que os
professores têm a oferecer e o desenvolvimento e aprendizagem dos alunos a partir
desse ensino. Mas para haver essa relação, a educação de todas as crianças e
adolescentes deve ser o ponto de partida das práticas educativas, em uma ação conjunta
de políticas sociais e educativas.
Havendo uma interação entre o contexto social e o sistema de ensino, a desigualdade se
diluiria e todos poderiam ter condições de participar das práticas educativas em um
sistema que estaria preparado para lidar com qualquer tipo de aluno.
Segundo o autor, os professores se veem limitados a exercer sua função didática por não
estarem preparados para o que é chamado no texto de aluno “real”, e por estarem
sempre esperando o aluno “ideal”. Isso acaba criando um afastamento cada vez maior
com o aluno e a família. Porém, os sistemas educativos não podem agir sozinhos, mas
devem treinar seus professores para que estejam preparados para situações diversas de
ensino. Deve haver também um conjunto de ações externas à escola relacionadas a
políticas econômicas, sociais e culturais, com uma sociedade criando condições para
que crianças e adolescentes tenham os recursos necessários para aumentar a
educabilidade e com isso tornar o aluno “real” mais próximo do “ideal”.
Dessa forma é possível obter uma mudança na visão que os professores e diretores têm
de seus alunos, como o desinteresse pelos estudos, e da família, como a falta de
interesse dos pais pelos assuntos escolares. Desconstruindo esta visão, a dificuldade que
professores tem em dar aula para crianças e adolescentes oriundas de famílias pobres
diminuiria junto ao desafio de oferecer uma educação intercultural, e assim as condições
de educabilidade se fortificariam.
Essa ausência de recursos e apoio de um corpo institucional deixa clara a falta de
solidez e legitimidade que a escola sofre. Mesmo assim os professores e diretores
exercem sua função de maneira a improvisar a forma de ensino, deixando a
impessoalidade de lado e agindo da forma como acham que devem agir.
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A fraqueza institucional afeta não só a comunidade escolar, como também a família dos
alunos, que às vezes mudam até de cidade para achar um lugar que forneça uma melhor
estrutura de ensino a seus filhos.
Em um Estado onde a equidade não é prioridade, como mostra o texto, onde uma
educação de qualidade está longe de ser disponibilizada para os setores mais pobres,
López questiona como é possível gerar uma dinâmica de acordo com o novo cenário
social das escolas, diante de um sistema com uma enorme fragilidade institucional como
este.
Todos esses problemas e essa desvalorização da escola causam uma frustração não só
nos professores e diretores pelas condições em que tem de trabalhar, mas também nos
pais em relação à educação que seus filhos recebem.
Segundo López, é necessário utilizar de políticas sociais para que se reverta este quadro,
o qual é denominado no texto como deterioração das escolas, junto a uma articulação
com políticas educativas, para assim alcançar uma equidade no acesso ao conhecimento.
Porém, a institucionalização de cada escola deve estar de acordo com o cenário social
em que se encontra, para que não se produza mais desigualdade.
A fragilidade das instituições e do Estado gera a falta de estrutura e oportunidades
dentro das escolas, e isso acaba fortalecendo o envolvimento pessoal dos professores em
suas ações profissionais. Para que se desconstrua esse perfil de “desinstitucionalização”
é necessário ultrapassar os desafios existentes para articular os diferentes setores do
Estado, criando projetos de políticas mais efetivas de qualidade e mais equidade, onde a
escola, professores e diretores tenham a garantia de uma trajetória de sucesso, e os
alunos tenham acesso a uma educação de qualidade e suas famílias estejam satisfeitas
com essa educação que seus filhos estão a receber.
Texto Resenhado:
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MONTADON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe – Entre pais e professores, um diálogo
impossível?
O texto do qual falarei aborda o capítulo 1 deste livro.
Inicialmente Montadon fala da relação que as famílias de camadas populares do século
XIX, não tinham com a escola.
Segundo a autora, a maioria destas famílias não tinham vós dentro da escola pública,
pois a preocupação das autoridades escolares com a opinião dos pais de alunos era
pouca e, “os pais de grande parte dos alunos eram considerados ignorantes que era
preciso educar.” (P.13) Já as família privilegiadas não passavam por esse tipo de
problema, pois tinham condições de matricular seus filhos em escolas particulares ou
pagar por um professor particular.
Porém Montadon diz que, alguns pais de camadas populares fizeram-se ouvir ao
expressar seus descontentamentos em relação à escola burguesa, mas estes pais não
eram admitidos na esfera escolar e as relações família-escola praticamente não existiam
nas cidades. Entretanto, em comunidades menores como vilas e aldeias, “os pais tinham
uma maior intervenção no plano pedagógico.”(P.14) Intervenção esta que se deu através
de uma relação que os professores das áreas rurais estabeleceram com os pais de alunos.
Segundo Montadon, algumas mudanças ocorridas nas instituições e também na forma
de se pensar fizeram com que a relação família-escola evoluísse.
A autora fala também da relação entre pais e filhos muitas vezes pautada por discursos
de pediatras, psicólogos e psiquiatras que mudam suas teses ao passar do tempo, e dessa
forma os pais têm uma relação com os filhos quase que profissionalizante. Mas por
outro lado, os pais ficam coagidos e acabam agindo de forma instrumental a respeito do
futuro de seus filhos.
Segundo Montadon, “as duas tendências provocam um aumento do interesse que a
família dirige à criança.” (P.16) Fora outros fatores, como por exemplo o controle do
nascimento e da redução de mortalidade infantil que contribuíram para que as estruturas
familiares se estabilizassem e mudassem a forma de ver as crianças.
Montadon diz que o sistema da escola também sofreu transformações, como a
escolaridade obrigatória, a democratização da educação, as mudanças nos conteúdos do
ensino, entre outros.
É destacado no texto a forma de desenvolvimento de uma “relação utilitarista com o
saber” pela qual “os alunos aprendem cada vez menos para dominar um saber
valorizado enquanto tal e cada vez mais para satisfazer as exigências de
seleção.”(Perrenoud. P.17)
Segundo Montadon, mesmo com tantas transformações no sistema escolar e influências
na vida quotidiana das famílias com filhos escolarizados, as famílias continuam sendo
insubstituíveis. Diante destes motivos a autora constata que, a relação família-escola se
alargou consideravelmente.
Montadon fala da criança em desafio de socialização no plano afetivo e no plano
instrumental. E para a escola a criança é um tipo de aposta no plano afetivo, ao agir de
maneira personalizada, o professor pode invadir o território afetivo da família. Da
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mesma forma que a família vê a criança como uma ponte para acessar as atividades
profissionais dentro da escola.
Montadon cita a diferenciação das classes sociais, e diz que apesar de algumas famílias
serem desfavorecidas e outras privilegiadas, pode-se observar que houve uma evolução
da escola que afetou fortemente a relação instrumental das famílias com seus filhos
como antes não ocorria.
A autora fala das mudanças culturais que contribuíram para tornar evidente a
necessidade de uma melhor comunicação, apontando primeiramente para a questão da
“ideologia da participação”. Dessa maneira os pais puderam ter mais voz para falar dos
métodos educativos.
Montadon explica que, nos anos de 1960 pediam aos pais que encorajassem seus filhos
nas atividades escolares, nos anos 70 a complementaridade entre a escola e a família era
muito vaga e nos anos 80 passou a ser recomendado aos professores que estreitassem a
relação com os pais de maneira a melhorar a relação do aluno com a escola e da escola
com os pais.
A autora diz que esta nova forma de relação tem dois lados. Um é a iniciativa da família
de criar associações de pais de alunos, outra é a iniciativa da escola de abrir suas portas
para a família. Entretanto, Montadon explica que as associações por vezes encontram
problemas não só da parte da escola, como também em sua própria base, e completa
dizendo que, alguns destes problemas “são típicos do movimento associativo: a
sociedade industrial suscita a criação de associações ao mesmo tempo que vai erguendo
barreiras à sua participação.” (P.21)
A autora destaca o fato de que apesar de as relações entre a escola e a família terem
evoluído consideravelmente, ainda se mantém ligadas às opções ideológicas e aos
sistemas políticos onde estão inseridas.
Montadon diz que os pais são vistos pela escola como pessoas que não sabem nada de
pedagogia e gestão, e por isso sua participação pode ser considerada pelas autoridades
escolares uma perda de tempo e de eficácia. Porém existem os defensores da
participação que fazem um recorte das vantagens a serem oferecidas às autoridades
escolares. A autora diz que na maioria das vezes os professores estão satisfeitos com o
funcionamento da escola e “não são favoráveis a uma participação ativa dos pais.”(P.24)
Contudo, Montadon diz que existem os pais que evitam as relações com a escola por
diversos fatores, pois todos têm comportamentos muito diferentes e nem todos tem o
desejo de participar da vida pública.
Montadon explica que o fato de as escolas terem se entreaberto aos poucos, fez com que
os pais a procurassem cada vez mais, por isso se deu essa evolução nas relações entre
escola e família. Mas o debate continua junto ao questionamento relativo às vantagens e
desvantagens para famílias de médias e superiores ou de camadas populares.
Segundo Montadon, “sem dúvida, as relações família-escola reservam-nos ainda muitos
desenvolvimentos, tanto no plano empírico como teórico.”(P.26)
Perrenoud inicia o segundo capítulo falando da relação entre escola e família,
mostrando o quanto o valor de se comunicar é desperdiçado. Mesmo as crianças que são
a via mais próxima que os professores têm de se relacionar com os pais, segundo
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Perrenoud, não são vistas como uma ponte indispensável de comunicação entre pais e
professores.
O autor fala da questão de crianças e adolescentes pertencerem a diversos grupos e
também a diferentes classes sociais e, “desde logo, como a maior parte dos adultos, a
criança partilha o seu tempo com família e outros grupos de pertença.” (P.31)
Perrenoud fala da expressão go-between como uma figura sociológica que pode
funcionar como um “agente de ligação” se ambos os grupos, escola e família, tiverem
uma relação de cooperação. Dessa maneira, se houver um conflito entre os grupos o go-
between poderá atuar como uma espécie de mediador.
Perrenoud explica que a criança é definida em nossa sociedade como um ser que ainda
não tem capacidade para conduzir sua vida autonomamente, por isso os adultos e,
sobretudo, a escola tem o dever de educar, cuidar, proteger e vigiar essas crianças.
O autor fala da interdependência existente entre a família e a escola, a qual muitas vezes
é gerada pela questão da divisão do trabalho educativo, onde pais e professores estão a
todo o tempo vigiando o trabalho um do outro. E segundo Perrenoud mesmo quando se
rompem as relações diretas entre pais e professores, a criança faz com que se mantenha
essa interdependência entre ambos. Porém, o autor explica que “a ambiguidade, que está
sempre presente na comunicação direta, não pode deixar de acentuar-se quando as
trocas são feitas através de um go-between”. (P.34)
Perrenoud explica que o fato de a criança ter o controle parcial dos contatos diretos
entre pais e professores pode por vezes ajudar ou atrapalhar essa comunicação, pois a
mensagem que a criança passa tanto na escola quanto em casa pode não ser interpretada
de maneira desejada por pais ou professores.
O autor diz que a realidade da criança não é uma coisa simples e para que a família e a
escola tenham êxito em seus objetivos de transformar a criança em um ser de
responsabilidades, de boa conduta, feliz e saudável, é preciso, segundo o autor, que
cheguem a um consenso.
Perrenoud fala da forma como é pensado o futuro de uma criança sem que essa mesma
seja consultada para a discussão de seu próprio destino, e explica que dessa maneira as
crianças acabam se afastando dos adultos de quem mais dependem por muitas vezes
perceberem que falam delas como se estivessem ausentes.
Perrenoud coloca o encontro entre pais e professores como um movimento de
metacomunicação, onde ocorre a tentativa de clarificar o sentido dos contatos indiretos
realizados pelas crianças. Contudo, o autor questiona se a criança realmente deseja que
tudo fique esclarecido entre seus pais e professores e conclui que não, pelo fato de que
ao se manter como mediadora a criança pode, “fornecendo aos pais e professores
versões contraditórias de seus motivos, impedi-los de compreender exatamente s sua
conduta e logo definir uma linha de ação comum.” (P.37)
O autor fala do poder que essas crianças têm enquanto mensageiras. Já que se sentem no
direito de alterar ou simplesmente não entregar uma mensagem onde elas não são a
parte favorecida. Porém, Perrenoud explica que esse fato não é uma regra, mas deixa
claro que a criança como mensageira exerce um certo controle sobre a comunicação. E,
para que se evite esse tipo de ação os pais e professores devem permitir que as crianças
participem mais da formulação das mensagens enviadas falando sobre elas mesmas.
Departamento de Ciências Sociais
Perrenoud fala das intenções “teleguiadas”, onde as crianças agem conforme a vontade
dos pais ou dos professores por simplesmente não perceberem que estão sendo
“teleguiadas”, ou por jogar o jogo de ambos os grupos.
Segundo Perrenoud, “pais e professores querem em princípio, o bem da criança. Mas
nem sempre partilham uma imagem comum desse bem.” (P.43)
Perrenoud mostra no texto que no ambiente familiar e escolar circulam diversos tipos de
julgamento a respeito da criança. Sejam eles conflituosos ou positivos, o fato de estarem
em constante circulação ajuda a estabelecer uma forma de haver uma comunicação,
mesmo que indireta, entre a família e a escola.
O autor fala de uma preocupação dos professores em relação à percepção que os alunos
têm de suas ações e como isso pode ser passado para os pais. Entretanto, Perrenoud diz
que, “nem todas têm a preocupação de contar aos pais o que aconteceu. Mas o professor
nunca sabe exatamente o que os alunos perceberam, o que compreenderam e o que irão
contar.” (P.48)
Por outro lado, Perrenoud mostra que as crianças costumam contar muito de sua vida
familiar na escola e, no entanto, os pais nem sempre têm essa preocupação quanto ao
assunto que pode ser contado sobre a sua intimidade.
Segundo Perrenoud, esta preocupação se dá apenas quando a família considera que tem
algo a esconder, diferentemente dos professores que se preocupam com a interpretação
dos alunos.
Perrenoud explica que pelo fato de a criança pertencer aos dois universos, familiar e
escolar, acaba se tornando uma espécie de “agente duplo” que age nas duas esferas de
maneira espontânea e solidária.
Para Perrenoud a criança é a expressão de sua família dentro da escola e “dificilmente
um professor abandona o sentimento de que uma criança exprime as atitudes, valores e
hábitos dos pais, de uma forma mais completa e sincera do que estes alguma vez o
farão, mesmo num frente a frente.” (P.51) Assim como, segundo o autor, a criança é
também a expressão da escola no ambiente familiar.
Perrenoud conclui dizendo que não se deve reduzir a relação entre escola e a família às
formas diretas de encontro entre o pai e o professor, pois ela está sempre referida ao
papel de mediador desempenhado pela criança. “Entre...” (p.54).
Dessa maneira, explica Perrenoud, haverá um progresso no que ele chama de “insucesso
escolar”.
Texto Resenhado:
Departamento de Ciências Sociais
SILVA, Pedro – Escola-Família, uma Relação Armadilhada. Interculturalidade e
Relações de Poder.
Pedro Silva inicia este capítulo falando sobre a relação existente desde sempre entre a
escola e a família. Relação esta que nem sempre foi tão harmoniosa, ora mais direta, ora
mais indireta.
O autor apresenta a relação escola-família em duas vertentes. De um lado está a casa
onde os pais interagem com seus filhos, e de outro está a escola, onde talvez os pais e
com certeza os filhos interagem com o todo.
Segundo Silva, “ambas as vertentes tendem, contudo, a ser objeto de atenção estatal,
quando não mesmo de regulamentação explícita.” (P.29)
Silva questiona o fato de haver um consenso legislativo entre países com histórias tão
distintas, em torno da relação escola-família, e cita diversos autores preocupados com o
mesmo tema: distância entre escolas e famílias parece ser universal.
Silva então conclui que o problema que se refere a esta relação existe na maioria dos
países ocidentais e não exclusivamente em Portugal, e este fato o ajuda a encontrar
pistas para o caso português.
O autor explica que a participação formal das famílias nos estabelecimentos de ensino
se deu a partir dos anos de 1960, e neste período havia uma emergência para a
participação parental na educação e para uma educação permanente. Estas mudanças
tornaram notórias as limitações das instituições escolares da época.
Silva pontua este fato como uma crise de legitimação política que deveria ser encarada
como uma “ampla reestruturação estratégica da engrenagem do Estado.”(P.32)
O autor fala do estudo de um sociólogo britânico (Beattie), que diz respeito à evolução
dos sistemas de parent participation em quatro países ocidentais com diferentes
características e tradições distintas. São estes, França, Itália, Alemanha, Inglaterra e País
de Gales. Silva diz que, segundo Beattie, este repentino surto de participação parental só
poderia ser de total compreensão se estivesse inserido não só nestes quatro países, mas
também em um movimento que englobasse boa parte do mundo ocidental com a
tentativa de democratização dos postos de trabalho. Entretanto, Silva julga ser
necessário a realização de medidas políticas para tentar uma regulação estatal e assim
gerar democracia.
Porém, Silva fala da existência do paradigma da Crise Geral de Habermas, em que
dentro do sentido de participação parental estabelecem tentativas de restaurar o apoio
público sem gerar uma real democratização. E a ideia que antes Beattie tinha sobre a
democratização em torno da parent participation passa a ser vista agora por Silva como
um subproduto do controle público.
O autor cita o sociólogo britânico Philip Brown e sua teoria sobre a relação escola-
família, em que consiste a história da educação escolar que atualmente pode ser
caracterizada pelo predomínio da “ideologia da parentocracia”. Ideologia já que a
parentocracia existe somente no papel, e na realidade o que vale é a Estadocracia, que
acaba reforçando as desigualdades sociais, pois “é o poder central do Estado que sai
reforçado e não o dos pais”.(P.35)
Departamento de Ciências Sociais
A explicação que Silva dá sobre as conclusões de Brown, confirma um problema
existente em diversos países onde o Estado controla os sistemas educativos e reproduz
desigualdades sociais ao mesmo tempo em que joga a responsabilidade do sucesso ou
insucesso escolar para as famílias. Dessa maneira, as vítimas que são as famílias,
acabam levando a culpa dos efeitos causados pelas políticas estatais. Desde então surgiu
um debate sobre o papel dos pais no processo educativo escolar.
Silva fala da questão dos pais como consumidores, a escola e os professores como
produtores e o aluno como produto. Quando se analisa a situação, os professores têm o
papel de ensinar os alunos e os pais como consumidores deste “produto” têm o direito
de cobrar um bom resultado, e caso não estejam satisfeitos podem decidir mudar seus
filhos de escola.
Segundo Silva, esta ideia de colocar os pais como consumidores engloba uma
perspectiva de ideologia liberal, em que os pais têm o direito de escolher onde seus
filhos irão estudar. E para Silva, isto é sinônimo de “mercadorização” da educação, um
fator que reforça as desigualdades sociais e culturais, entretanto, a perspectiva que
acentua a liberdade individual dos pais, constitui uma espécie de bandeira desta teoria
na medida em que diz reforçar assim a democracia. Este “embrulho ideológico torna-a
naturalmente, mais atrativa.” (P.38)
Silva diz que, geralmente, os pais escolhem onde seus filhos irão estudar de acordo com
a lista hierarquizada das escolas em função dos resultados obtidos pelos alunos, assim
como o Estado deseja, mas nem sempre é desta maneira. Segundo Silva, os pais
consideram uma série de fatores na hora de sua escolha, inclusive os sociais.
Conforme mostra o autor, o fato de a família escolher a escola por diversas
características acaba fazendo com que as escolas menos escolhidas fechem por falta de
alunos e as mais solicitadas tenham que recusar alunos por estar superlotadas. E assim
Silva explica que, há uma hipótese de que as escolas escolhidas ganhem cada vez mais
recursos tanto materiais quanto sociais e as restantes estarão cada vez mais distantes da
cultura socialmente valorizada.
Segundo Silva, esta situação resultará em uma inversão de papéis e a escola passará a
escolher seus alunos e não mais os pais escolherão as escolas. Dessa forma, ao invés de
escolhidas, as famílias talvez sejam excluídas por diversos fatores como, por exemplo,
sua classe social.
Silva cita outros autores que analisam os pais como gestores e o papel conservador que
eles exercem pelo fato de, primeiramente defender os interesses particulares de seus
filhos, apesar de agir coletivamente.
Silva ressalta o fato de ser “basicamente os pais brancos, da classe média e de profissões
liberais, que integram estes órgãos, mesmo em áreas onde predominam a classe
trabalhadora ou minorias étnicas.” (P. 48)
O autor explica que, a participação parental raramente é imposta por movimento sociais,
quem realmente a impõe é o Estado.
Silva fala da ideia de Pamela Munn, em que consiste o fato de a obrigatoriedade da
participação induzir novos hábitos, e assim, países com esta tradição quase que
inexistente, se acostumariam com o fato e o tornaria um hábito. Dessa maneira seria
possível que a participação parental ajudasse a redefinir a cultura profissional dos
Departamento de Ciências Sociais
docentes, mas não em um maior controle das escolas e seus professores ou em uma
democracia mais participativa. No entanto, Silva diz que pais e professores se mantém
em grupos distintos.
Silva agora coloca os pais como consumidores cidadãos, o que engloba um conceito
mais ampliado de consumidor, onde são criadas condições sociais que tornam útil o
papel dos pais como consumidores, gerando uma interdependência entre “cidadãos” e
“consumidores” junto ao crescente consumo coletivo e a intervenção estatal.
Silva explica que, ao fortalecer o consumidor-cidadão, haverá uma mudança nas
relações de poder e influência, assim, a relação entre produtores e consumidores será
modificada. Esta mudança, “consiste em encará-los como atores sociais de fato; alguém
com que tem de se contar, que faz sentir: estamos aqui, existimos, contem conosco.
Queiram ou não, gostem ou não.” (P. 55)
Silva cita Philip Woods, que defende a participação dos pais no processo educativo
escolar de seus filhos enquanto parceiros da escola, associando este fato à ideia dps pais
como consumidores-cidadãos.
A perspectiva dos pais enquanto educadores, não é ainda apoiada por professores e
gestores, pois acreditam na falta de competência educacional dos pais.
Segundo Silva, essa articulação entre pais e professores, tem uma perspectiva
progressista, onde ambos devem apender uns com os outros e entender que suas funções
educacionais são distintas e deveriam ser divididas em benefícios de seus filhos e
alunos.
Segundo Silva, aí entra a ideia do pai como parceiro/colaborador. E, esta colaboração
poderá trazer benefícios não só para os alunos, mas também para pais e gestores.
Silva diz que, no período do pós-guerra, o governo de esquerda via o envolvimento dos
pais como uma forma de aprofundar a democracia e assim contribuir para uma
sociedade com mais equidade social, já o de direita, valorizava a liberdade individual.
Segundo Silva, esta última maneira de enxergar a participação parental é típica dos
adeptos da “mercadorização” da educação que consiste em criar falsas divisões.
Silva diz que, ““mercadorizar” privatizando ou não, também já vimos que não eleva a
qualidade geral do ensino, tendendo antes a produzir “mais do mesmo”, para além de
aumentar consideravelmente as desigualdades escolares e sociais.” (P. 59)
Silva questiona o fato de haver uniformidade dentro do sistema educativo e diz que,
segundo Bourdieu, a maneira de se tratar os alunos como iguais na organização dos
sistemas educativos é o que causa a discriminação destes mesmos.
Silva explica que a questão da escolha parental pode gerar um “alto clima social
educacional positivo” onde os pais desejem melhorar a escola em função de terem sido
escolhidos como parceiros na participação. Isto pode aprofundar a democracia.
Segundo Silva, para obter ênfase no aprofundamento da relação escola e família, é
preciso que se altere as relações entre a escola e a sociedade, e, entre a educação e o
Estado, pois estas ainda são contraditórias.
Departamento de Ciências Sociais
Silva diz que, a questão da democracia pedagógica engloba diversos aspectos da relação
escola-família e que constitui um problema político que ultrapassa o interior da escola.
“Como lembra Beattie; a participação parental está muito longe de constituir um
assunto puramente educacional.” (P. 63)
Segundo o autor, ao colocar os pais como colaboradores, faz-se com que a escola,
particularmente os professores, veja-os como uma extensão de seu trabalho e tendem a
entender esta interação como uma relação profissional, ao mesmo tempo em que
enxergam esses pais como leigos.
Segundo Silva, este estreitamento da relação escola-família e o interesse na participação
parental “está mais próxima de uma operação cosmética do que perante uma verdadeira
mudança na relação entre ambos.” (P. 66)
Com isso Silva cita diversos autores que apontam para o fato de que as reuniões de pais
convocadas pela administração das escolas contribuem para aumentar as distâncias
sociais e culturais ao invés de diminuí-las, mesmo com a escola olhando para as
famílias como um apoio externo, tornando essa relação mais assimétrica.
Silva tenta nos mostrar a lógica da escola enquanto instituição social, a forma como
trabalham e o controle de seu poder que tende a imperar, e chega à conclusão de que
abrir espaço para os pais terem na escola uma relação mais informal, ou estar presente
no quotidiano familiar, não significa o achado de uma solução milagrosa, mas se for
assim realizado junto a uma política de aproximação e respeito pelas culturas locais,
“podem constituir esquemas com potencialidade democrática.” (P. 70)
Silva mostra no texto que, os pais são cidadãos de classes sociais diversas, com
profissões e relações sociais das mais variadas com o poder e as instituições. Estes fatos
levam o autor a citar uma ideia de Mary Henry, que é semelhante a sua, em que consiste
o fato de os professores estipularem outros tipos de relação com o aluno de acordo com
as características dos pais. Isso acaba colocando as crianças de classe baixa em uma
enorme desvantagem.
Silva coloca em comparação duas escolas, uma de classe média superior e uma de
comunidade operária, constatando que, “ambos os grupos de pais valorizam bastante a
educação escolar dos filhos.” (P. 71)
Para fortalecer esta comparação Silva cita Lareau, que explica a relação escola-família
dentro da classe operária como uma ideia de separação, e na classe média superior de
ligação. E esta situação acaba gerando uma discriminação na forma de lidar com os
pais, pois os requisitos da escola muitas vezes não estão de acordo com o capital
cultural dos pais e a colaboração que eles têm a oferecer.
Silva conclui este capítulo mostrando que a relação escola-família constitui uma
reprodução social e cultural, e, o fato de a comunidade escolar tratar os pais como iguais
gera uma discriminação, que Silva chama de relação armadilhada.

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  • 1. Departamento de Ciências Sociais A ESCOLA E O MUNDO DO ALUNO Aluno: Mariana Junqueira Camasmie Orientador: Marcelo Burgos Introdução O projeto Escola e Favela, de cuja equipe faço parte, tem por objetivo estudar a relação das escolas públicas com o “mundo dos alunos”, boa parte morador de favelas e territórios segregados1 . Pesquisas de campo realizadas pela equipe têm evidenciado que a maioria dos professores conhece muito pouco a realidade de seu aluno, e nesse vazio crescem estereótipos que criam barreiras sociais que comprometem a relação de ensino- aprendizagem, além de dificultar o desenvolvimento do trabalho de socialização escolar voltado para a formação cidadã. De modo a aprofundar nosso conhecimento qualitativo e confirmar os dados quantitativos de nossa pesquisa, optamos por participar de algumas atividades escolares que envolvessem os responsáveis pedagógicos. A partir do estreitamento de nossa relação com as escolas pudemos observar mais de perto esta realidade ora por solicitação de nossa parte, ora por convite da própria escola. Uma das atividades das quais participamos e que nos forneceu importantes informações sobre o tema que pesquisamos foi a última reunião de pais do primeiro semestre de 2012, a qual nós pedimos permissão para assistir, tendo sido muito bem recebidos nas nove escolas estudadas, todas localizadas no entorno da PUC-Rio. Com isso pudemos notar pontos de articulação com a bibliografia que temos utilizado, e que tem por objeto privilegiado o estudo dos espaços de interação entre a escola, a família e a vizinhança. Para tanto, partimos de um referencial bibliográfico que chama a atenção para os efeitos que a escola têm sofrido como consequência da democratização de seu público, e para os desafios que ela precisa enfrentar para se reestruturar e conseguir oferecer educação de qualidade. Desenvolvimento Ao longo das décadas de 1970, 80, 90, ocorreu a democratização do acesso à escola pública, com a entrada de crianças e adolescentes pobres. Com isso, a escola foi sendo obrigada a assumir novas responsabilidades como a da “gestão da pobreza”. Ao mesmo tempo, a escola foi se “desinstitucionalizando”, isto é, perdendo capacidade de realizar sua principal missão que é a de socializar as novas gerações na educação escolar, pois junto à entrada maciça dos pobres nas escolas, ocorreu uma evasão da classe média [1]. Alguns autores têm chamado a atenção para o fato de que, para se compreender os efeitos da democratização do acesso à escola, também é necessário considerar variáveis como a especificidade dos territórios de moradia dos alunos. Esse aspecto é particularmente importante para cidades como o Rio de Janeiro, na qual as escolas atendem basicamente famílias moradoras de favelas. Neste caso, é muito evidente a presença daquilo que a bibliografia tem caracterizado como “efeitos do lugar”, que se 1 - O Projeto Escola e Favela envolve 30 pessoas, incluindo os dois coordenadores, professores Marcelo Burgos (Ciências Sociais) e Ralph Bannel (Educação), dois professores de ensino básico da rede pública, e estudantes de graduação e pós graduação de Ciências Sociais e Educação.
  • 2. Departamento de Ciências Sociais manifesta, por exemplo, na imagem negativa que os professores têm de seus alunos e de suas famílias, percebendo no fato de morarem em favelas uma barreira quase indestrutível para o bom desenvolvimento do projeto escolar. Para esses professores, o problema não estaria no método de ensino-aprendizagem, e sim nos obstáculos que a vizinhança e suas famílias representariam para o projeto escolar[2]. O diagnóstico sobre a fragilidade institucional da escola está bem consolidado na bibliografia, e tem dado lugar a todo um novo esforço de pesquisa e reflexão sobre diferentes aspectos da gestão escolar [3]. A necessidade de fortalecimento institucional tem sido apontada como um fator essencial para que as escolas possam alcançar resultados positivos, capazes de gerar oportunidades de acesso à educação de qualidade, independentemente da origem ou classe social do aluno. O reconhecimento da diversidade cultural passa a ser fundamental para que se possa alcançar um horizonte de equidade [4]. Esse tipo de abordagem coloca em cena a importância de se valorizar a relação da escola com a família. Afinal, o aluno deve ser encarado como um “agente de ligação” entre dois universos, um mediador na relação escola-família [5]. E isso é ainda mais importante quando se trata de alunos pobres moradores de territórios que sofrem os efeitos da segregação urbana. A relação escola-família demanda, portanto, um investimento mais complexo, com repercussões sobre as relações entre a escola e a sociedade, e, entre a educação e o Estado [6]. Objetivo De modo mais específico, esta pesquisa tem por objetivo estudar a relação que nove escolas públicas de ensino fundamental, localizadas no entorno da PUC-Rio, na Gávea e na Rocinha, têm com seus alunos. Com base nela, pretendemos valorizar o estudo das contradições existentes entre o universo escolar e a sociabilidade do mundo do aluno, tornando mais visível os aspectos relacionados à fragilidade institucional da escola para lidar com alunos moradores de favelas, e a distância que separa o mundo do aluno do padrão de educabilidade esperado pela escola. Através de nossas idas às escolas e ao analisar os relatos dos pesquisadores, podemos perceber que em diversas escolas ainda existe uma barreira muito grande e uma padrão de relacionamento assimétrico. Essa situação é bem conhecida na bibliografia internacional, afinal, como nota Montadon [6] para a escola “os pais de grande parte dos alunos são considerados ignorantes e também precisam ser educados.” (P.13). Mas é ainda mais agravada quando se considera que as escolas com que temos trabalhado lidam basicamente com famílias populares, moradoras de favelas. Tal situação coloca em questão a equidade educacional. Segundo Néstor López [4], para alcançar equidade educacional é necessário que todos tenham as mesmas oportunidades de acesso à educação, os mesmos recursos e condições para ir à escola e participar das práticas educativas, independentemente de sua origem ou classe social. Contudo, essa noção de equidade só será possível, segundo López, se houver o reconhecimento da diversidade cultural, podendo assim definir um horizonte de política educacional que garanta a igualdade em meio a uma realidade desigual. Para isso, López considera necessário que se considere as condições de educabilidade. A noção de educabilidade está relacionada a um duplo processo: de um lado, as condições de vida do estudante, que devem ser capazes de permitir que ele participe do jogo escolar; e de outro, à capacidade da descola para lidar com o aluno real. Assim é que para que a
  • 3. Departamento de Ciências Sociais educabilidade seja assegurada é necessário uma combinação de políticas sociais e educativas. Com uma interação positiva entre o contexto social e o sistema de ensino, a desigualdade escolar se diluiria e todos podem ter condições de participar das práticas educativas em um sistema que estaria preparado para lidar com qualquer tipo de aluno. A leitura do material qualitativo produzido pela pesquisa será feita a partir desse marco analítico, o que permitiu que prestássemos especial atenção na forma como as escolas lidam com as famílias e a realidade de seus alunos. Metodologia A principal premissa que está na base da formulação de nossas estratégias metodológicas tem sido a de que existe uma barreira entre os profissionais da escola e o mundo do aluno e que, apesar de muitas vezes apresentarem disposição para mudar a atual situação, ainda não dispõem de ferramentas cognitivas e de cultura de informação que os ajude a perceber o valor que as famílias populares dão à educação escolar. Este fato veio a se confirmar a partir do momento em que nossa esquipe realizou algumas apresentações para os professores da pesquisa quantitativa com pais/responsáveis realizada no ano de 2010/11. Naquela pesquisa, ficava nítido que a percepção dos pais/responsáveis é muito distinta da visão corrente entre os profissionais sobre o grau de comprometimento familiar com o projeto escolar. Mas nas exposições daquela pesquisa aos professores notamos que mesmo diante de evidências empíricas os profissionais das escolas apresentavam um alto grau de naturalização da visão negativa em face da família, visão essa que tende a responsabiliza-la pelo fracasso escolar. Tal situação levou nossa equipe à formulação de estratégias qualitativas voltadas para a observação da relação face a face com a família. Neste relatório conferimos especial atenção ao material produzido a partir da observação da última reunião de pais do primeiro semestre de 2012. As reuniões de pais realizadas pelas nove escolas aconteceram todas no mesmo dia(sábado) e horário(a partir das 9hs), o que fez com que nossa equipe mobilizasse 10 pesquisadores para atuar simultaneamente nas escolas, sendo eles Julia Ventura, Marcelo Burgos, Rafael Dutton, Gabriel de Melo, Mariana Junqueira, Fernanda Lopes, Laura Rossi, Bernardo, Leo Ramos e Sarah Monteiro. A incursão etnográfica foi realizada em seis escolas situadas no bairro da Gávea (Escola Municipal Christiano Hamann, Escola Municipal Oscar Tenório, Escola Municipal Luiz Delfino, Escola Municipal Artur Ramos, Escola Municipal Julio de Castilhos e Escola Municipal Manoel Cícero); duas na favela da Rocinha (Escola Municipal Paula Brito e Ciep Bento Rubião) A Escola Municipal Abelardo Chacrinha Barbosa, embora originalmente localizada na Rocinha, funciona provisoriamente no bairro do Horto. Cada uma das reuniões observadas gerou um relatório que nos ajudou a entender melhor a relação escola-família e o mundo do aluno. A observação obedeceu a um roteiro previamente discutido pela equipe, e que tinha como foco observar em cada escola: 1- a forma pela qual ela recebia os pais, incluindo as condições de conforto;
  • 4. Departamento de Ciências Sociais 2- a estrutura da exposição feita pelas escolas, incluindo o espaço para o diálogo com as famílias. 3- Respeito ao horário, e tempo destinado a cada atividade. Além disso, a equipe também decidiu que era importante chegar na escola em torno de 20 ou 10 minutos antes do horário marcado para o início, pois dessa forma poderíamos observar a chegada das famílias, suas conversas antes da reunião começar, bem como a forma como os responsáveis seriam recebidos e os preparativos da escola para este dia. Decidiu, também, que nossa presença não deveria interferir no andamento da reunião e que não nos pronunciaríamos sobre nenhum assunto tratado, estando ali somente para observar. Finalmente, é importante observar que tomamos o cuidado de solicitar autorização prévia da direção das escolas para assistirmos às reuniões. Conclusões Essas conclusões partem de uma leitura dos relatórios produzidos a partir da observação das nove reuniões. Essa leitura procura destacar os pontos recorrentes identificados nas escolas por nós pesquisadas. Pontos esses que a todo o tempo nos remeteram às referências bibliográficas que têm servido de base à nossa pesquisa. Para a exposição da pesquisa, importa lembrar que substituímos o nome das escolas por números, de modo a preservar sua identidade. Vale à pena ressaltar que, de acordo com nossas observações, afluência dos responsáveis às reuniões foi alta e, em alguns casos, parece ter surpreendido as escolas, que não estavam preparadas para receber tanta gente. Entre os pontos mais recorrentes identificados pela pesquisa, vale a pena citar, em primeiro lugar a falta de autonomia e ao mesmo tempo de preparo dos profissionais das escolas, não somente de professores para lidar com a complexidade própria a esse tipo de reunião. Muitos diretores não tiveram a preocupação de ao menos se apresentar aos responsáveis, da mesma forma que não se preocuparam em saber os nomes destes mesmos, tratando-os como “mãe e pai”, além de por vezes jogarem a responsabilidade de acontecimentos dentro do ambiente escolar para a prefeitura. Com isso, muitas vezes deixaram os responsáveis sem uma resposta concreta para alguns problemas que são questionados, como por exemplo, segundo o pesquisador Rafael Dutton observou, o fato de o diretor da escola [9] ter iniciado a reunião sem falar seu nome e seu cargo. E mais a frente desculpar-se pelo fato de a reunião ser em um sábado, justificando-se com a afirmação de que a decisão não partiu dele: “Eu levo essa questão, mas ela continua sendo marcada aos sábados.” Ainda que evite mencionar o nome da pessoa ou instituição de onde partiu a deliberação, fica claro aos responsáveis que falava da prefeitura. Outro aspecto recorrente é o fato de que em muitas escolas constatou-se que os responsáveis são infantilizados pelos profissionais. Na escola observada por Rafael Dutton, a diretora adjunta se referia aos alunos como “gatinho(a)” e “filhote” e aos responsáveis como “pai” e “mãe”. Assim como Marcelo Burgos em sua observação da escola [4] cita um momento em que a diretora fala: “Vamos começar pelo Cartão Família Carioca, quem trouxe o papel que mandei para casa? Segundo Burgos alguns pouco responsáveis levantam a mão e ela diz: “Fizeram direitinho o dever de casa”.
  • 5. Departamento de Ciências Sociais Mas nossa observação também identificou uma certa diversidade de situações. Dentre as nove escolas observadas cinco iniciaram a reunião com atraso. A escola [1] que atende ao 1º segmento, iniciou sua reunião às 9:20, tanto em função da falta de organização da escola no processo de recolhimento da assinatura dos responsáveis para que fosse confirmada a presença. Apesar do atraso, a escola demonstrou preocupação na hora de receber os responsáveis, preparando uma mesa de café da manhã, e se mostrou organizada na forma como apresentou a reunião. Porém a pauta da reunião acompanhou a sequência de slides da apresentação, não permitindo a participação dos responsáveis. Quando houve uma pronúncia, foi por alguma indagação feita dos profissionais da escola aos responsáveis. A diretora falou de alguns projetos e convidou os responsáveis a participar dos mesmos; solicitou sua presença na escola com o projeto “Pais na Escola” que é valorizado pela diretora, segundo a pesquisadora Laura Rossi, como “uma liga entre nós e a comunidade da Rocinha” (projeto da UNESCO que chama os pais a participarem do “projeto da horta” que utiliza de materiais reciclados, como potes de sorvete e garrafas PET para fazer a horta.) A escola contou com a participação de um homem identificado pelos responsáveis como uma espécie de guia-turístico que leva “gringos” para a Rocinha. Segundo a pesquisadora Laura Rossi uma responsável que estava ao seu lado cochichou: “esse cara é quem leva os gringos lá na Rocinha, ele tá sempre cheio de gringos”. Ele foi falar do projeto “Bairro Educador”, da Secretaria de Educação, que trabalha na relação da comunidade com a escola e por isso exige a participação dos pais, convocando-os para as reuniões que acontecem as sextas-feiras no complexo esportivo da Rocinha. No fim da reunião foi passado um clipe da música “Família” do Titãs em homenagem aos responsáveis. Apesar da valorização da parceria com os pais, pode-se perceber que os responsáveis já chegam ao fim da reunião um pouco impacientes, levantando com frequência para ir até a mesa de café da manhã, ficando clara também a tendência “infantilizadora” em alguns momentos quando as responsáveis são chamadas de “mãe”. A escola [2] que atende ao 2º segmento, chamou a atenção pela falta de organização e também de respeito com os responsáveis que estavam esperando a reunião começar, pois quando começou a se questionar o atraso foi-lhes dada a informação pela porteira da escola, de que a reunião estaria marcada para as 9:30(informação contrária ao aviso que tinha sido enviado aos responsáveis). Os profissionais da escola aos poucos foram chegando e a reunião só foi iniciada às 9:45. Entretanto, os comentários sobre a escola e a direção eram os melhores, como por exemplo, quando a pesquisadora Julia Ventura cita o momento em que uma responsável diz que a diretora é maravilhosa e diz: ”Ela é tudo aqui”. Entretanto a pesquisadora Julia cita um momento em que uma responsável critica a diretora adjunta dizendo: “abusada, acha que só porque a gente é da favela é igual a pano de chão”. Segundo a pesquisadora, em cada sala de reunião havia uma cartaz escrito “Matriz Fofa”, que dizia respeito às características de cada turma daquele ano escolar. Fato que remete um pouco ao trabalho que vem sendo feito por nossa equipe de valorizar a interação com os alunos ao saber mais sobre eles e sua realidade.
  • 6. Departamento de Ciências Sociais Os responsáveis se mostraram extremamente interessados nos assuntos apresentados pelos profissionais da escola. Ao término da reunião os responsáveis procuraram os professores para obter mais informações, deixando claro o interesse sobre a escola e a educação de seus filhos. A escola [3], que é de 1º segmento, só abriu os seus portões para receber os responsáveis as 9:25. Mas a diretora da escola os saudou segundo o pesquisador Bernardo, de forma carinhosa e ao mesmo tempo infantilizando os responsáveis ao dizer: “Aqui mãe, entre aí, fiquem aqui no pátio um pouquinho até os outros pais e mães chegarem para começarmos”. Mas os recepcionou muito bem com uma explicação dos assuntos mais gerais para depois encaminhá-los para as salas onde seria realizada a entrega dos boletins. A diretora se colocou à disposição dos responsáveis para quem tivesse interesse sobre assuntos do CEC (Conselho Escolar). E enfatiza que o CEC serve para tratar de assuntos como por exemplo o fato de não ser permitido que se leve biscoitos e/ou comida para a escola, mas se esquivando da responsabilidade quando diz: “não fui eu que fiz a lei”, segundo o pesquisador Bernardo, referindo-se à norma que proíbe que os alunos levem alimento para a escola. A escola preparou uma mesa de café da manhã para a recepção dos responsáveis, mas ao mesmo tempo a diretora se desculpou pois o início da reunião seria com todos de pé no pátio da escola para tratar dos assuntos gerais. Somente na hora da entrega de boletins e assinaturas é que os responsáveis foram encaminhados para as salas. A escola [4] que atende aos dois segmentos, iniciou a reunião às 9:12, um pequeno atraso, porém a maneira como se iniciou a reunião foi o que chamou a atenção. Pois houve uma falta de organização quanto às acomodações para os responsáveis. Muitos assistiram a reunião de pé. E quando todos estavam presentes à espera da reunião, os profissionais da escola ainda tentavam montar uma estrutura de power point, que mais atrapalhou do que ajudou, pois as informações apresentadas na tela não estavam em sintonia com o que a diretora falava. Pode-se perceber que a reunião e os profissionais envolvidos não valorizaram minimamente a participação dos responsáveis. Ao contrário, pois segundo o pesquisador Marcelo Burgos, as poucas pessoas que tentaram falar sentiram que aquele esforço era inútil. Dessa forma não se criou um espaço de diálogo com os responsáveis para assim estreitar a relação escola-família. A diretora foi a figura central da reunião, quase sempre utilizando o método pergunta- resposta como por exemplo, quando o pesquisador Marcelo Burgos cita o momento em que ela pergunta aos responsáveis se eles sabem o motivo da reunião e ela mesma responde, ou quando ela tenta convencer os responsáveis de participar do CEC(Conselho Escolar) dizendo: “ Se eu não tiver o CEC completo não vou receber o dinheiro?” “Mas é só para cuidar do dinheiro o CEC?” Ela mesma responde: “não, ele tem outras funções. Por exemplo solicitar um quebra-molas aqui em frente à escola para que ninguém seja atropelado”. Segundo o pesquisador Marcelo, neste momento o auditório fica sabendo que um aluno foi atropelado em frente à escola na semana anterior. A dinâmica da reunião denota falta de organização e preparo quando os slides passados não estão de acordo com a fala da diretora. E segundo o pesquisador Marcelo, o barulho
  • 7. Departamento de Ciências Sociais feito pelos responsáveis que estavam à espera na fila para registrar presença e inscrição no Cartão Família Carioca aumenta gradativamente junto à falta de interesse daqueles que estão assistindo à reunião. O pesquisador Marcelo Burgos identificou a dinâmica da reunião com muita falta de empenho, experiência e competência para esse tipo de situação. A escola [5] que é de 1º e 2º segmento, teve um pequeno atraso, iniciando sua reunião às 9:15, mas demonstrou preocupação com os responsáveis, na maneira como se preparou para os receber. Esta a escola recebeu os responsáveis com uma mesa de café da manhã, e com uma música ambiente que tornava o clima mais agradável. A diretora recebeu todos os responsáveis muito bem, encaminhando-os para as respectivas salas onde seriam realizadas as reuniões por turma. Houve um breve diálogo entre os profissionais da escola e os responsáveis. Notou-se uma preocupação mais de alguns professores do que de outros que apressavam um pouco com a reunião. Mas em ambos os casos a oportunidade de falar era dada aos responsáveis, porém sem muita ênfase no assunto questionado, salvo exceção de uma turma onde a professora fala dos assuntos da pauta e se estende ao falar de “namoricos” dos alunos que estão entrando na adolescência, atendendo a pedidos de responsáveis para que fique de olho, ou assuntos de faltas quando uma responsável questiona as faltas do filho, e a professora explica com atenção o fato de que se estão justificadas não irão atrapalhar. Em outras turmas a oportunidade de falar era dada aos responsáveis, porém quando era feita alguma pergunta a resposta era sucinta e logo o assunto era interrompido. E algumas vezes pode-se notar o fato de que os profissionais da escola tiram de si a responsabilidade de alguns acontecimentos, como por exemplo quando uma professora diz que precisa da ajuda dos pais, pois não tem a ajuda da Secretaria de Educação, e uma responsável se manifesta dizendo: “Mas é papel da diretora falar com a Secretaria” e a professora diz: “é culpa da Prefeitura que não dá dinheiro para comprar pilha para o microfone, que a sala dos professores ficou sem água durante cinco dias...” Assuntos que não dizem respeito aos responsáveis são colocados como um problema na reunião para tratar dos alunos. A escola [6], que é de 1º segmento, se esforçou ao organizar apresentações dos alunos de diferentes turmas cantando e recitando poemas em homenagem aos pais e mães ali presentes. Houve alguns problemas com o som, mas a atitude demonstrou empenho dos profissionais da escola. Um profissional de saúde foi convidado para alertar os responsáveis sobre a vacina da gripe e paralisia infantil, bem como as datas e as faixas etárias que devem ser vacinadas as crianças. Pode-se perceber que os professores incentivaram o diálogo com a tentativa de estreitar a relação escola-família. Entretanto, os responsáveis não demonstraram um real interesse nas atrações, pois segundo os pesquisadores Leo Ramos e Sarah Monteiro, muitos deles levantaram no meio da reunião transitando pelo espaço da escola, e a diretora ao perceber a movimentação se preocupou em informar que quem tivesse filho em outra escola não precisaria se preocupar, pois a presença dele seria registrada ali e não haveria problema de falta. A forma como a escola conduziu a reunião parece ser resultado do esforço que realizamos através da pesquisa. Por exemplo, a percepção que os pesquisadores Leo Ramos e Sarah Monteiro tiveram de que a iniciativa de uma diálogo partia sempre dos
  • 8. Departamento de Ciências Sociais professores, e a diretora se disponibilizando a conversas posteriores a reunião quando fosse da vontade dos responsáveis. A escola [7] que é de 1º segmento, parece não ter se organizado de forma adequada para receber todos os responsáveis. Prova disso é que a reunião foi realizada por ordem de chegada, já que não tinha espaço para todos. A recepção foi organizada e a diretora demonstrou um caráter autoritário ao lidar com os responsáveis, como por exemplo, quando ainda não era 9hrs e um responsável reclamou que teria de trabalhar e segundo o pesquisador Gabriel de Melo, a diretora foi categórica ao dizer em tom de voz mais alto que a reunião estava marcada para as 9hs e que não queria que ninguém conturbasse a manhã dela, disse para esperar e o responsável com um pequeno sorriso aceitou. Além disso, somente a diretora teve autonomia para conduzir a reunião, dificultando ainda mais o diálogo entre professores e responsáveis. Assim embora os responsáveis tenham sido bem recebidos não tiveram espaço efetivo para dialogar com a escola. A diretora alguma vezes teve uma atitude que segundo o pesquisador Gabriel, intimidou os responsáveis como por exemplo quando ela diz não aceitar a ideia de os pais criticarem a escola e enfatiza que é com disciplina e rigor que a escola chega ao progresso, e dizer que a escola não era de qualidade era um desrespeito que segunda ela: “não admito desrespeito e se desrespeitar, se isso acontecer vou chamar apara conversar”. Segundo o pesquisador Gabriel, a diretora deixa claro que os alunos devem ter uniformes decentes e não blusa rasgada e encardida, enfatizando: “Muitas crianças chegam aqui igual a uma “mulambinho”. Segundo Gabriel, a segunda parte da reunião, que foi feita com os responsáveis que foram chegando depois, já se notava um pouco mais de impaciência da parte dos responsáveis, tendo que a diretora intervir quando alguns queriam ir embora. De acordo com o relato da pesquisadora Fernanda Lopes, a escola [8] que é de 1ºº segmento, procurou organizar uma reunião mais objetiva, tratando de assuntos gerais como Cartão Família Carioca, Bolsa Família e outros. A reunião também contou com a participação de profissionais de saúde para alertar os responsáveis sobre aqueles alunos que vão para a escola com piolho e pede que os pais não mandem seus filhos para aula quando estiverem com piolho, e diz “temos remédio, mas eu peço para que vocês em casa cuidem também.” A técnica de enfermagem, assim apresentada, pede que os responsáveis coloquem o telefone atualizado na agenda dos alunos para que possa ser feito contato. Fato que remete ao esforço de nossa equipe feito durante nossa pesquisa dentro das escolas nas fichas de matrícula que eram desprovidas de informações como endereço e telefone dos responsáveis. Ao final da reunião da escola [8] foi feita a entrega de boletins. A escola [9], também de 1º segmento, dividiu a reunião por salas, e segundo o pesquisador Rafael Dutton, o diretor informou que o assunto da reunião era especificamente sobre o Cartão Família Carioca, mas que os professores se disponibilizaram a realizar a entrega de boletins e assuntos diversos no mesmo dia. Antes do início da reunião o pesquisador Rafael relata ter ouvido comentários dos responsáveis do tipo: “Pelo amor de Deus, não tem nem café!” , “Eu só vim por causa do CFC(Cartão Família Carioca)” , “Essa reunião é pra que?”.
  • 9. Departamento de Ciências Sociais A falta de organização da escola levou alguns responsáveis a assistirem a reunião de pé. Contudo, o diretor se preocupou com o fato de alguns responsáveis estarem do lado de fora da sala em pé, convidando-os para entrar e participar da reunião. Fato que demonstrou um mínimo de preocupação. O diretor da escola se desculpou pelo fato de a reunião ser em um sábado ao mesmo tempo em que jogou a responsabilidade para a prefeitura. E ao falar do assunto principal da reunião o diretor utilizou um método de pergunta-resposta, “Quem recebe o Bolsa Família tem direito ao Cartão Família Carioca? Eu não sei!” E dessa forma o assunto principal da reunião ficou sem ser explicado para os responsáveis que estavam ali para isso. Os responsáveis não tiveram oportunidade de fazer perguntas já que o diretor falou muito rapidamente dos assuntos e segundo o pesquisador Rafael perguntou apressadamente: “Mais alguma dúvida?”, mas não deu tempo para que fossem tiradas as dúvidas, se estas existissem. O diretor terminou o reunião sem uma despedida formal e sem anunciar o término. Todas as reuniões tiveram que percorrer assuntos comuns como informações sobre o Bolsa Família, o Cartão Família Carioca (O CFC caba aqueles que já tem o Bolsa Família e tem as mesmas obrigatoriedades, como uma alta frequência dos alunos.), as eleições para o Conselho Escolar o CEC, e a questão das faltas dos alunos (por preocupação ao RioCard que é o que segundo os professores é o que contabiliza as faltas pois eles tem que passar o RioCard em uma máquina quando chegam na escola, como uma espécie de carteirinha. Todas as escolas seguiram esta pauta, porém, algumas se mostraram muito mais preocupadas com os responsáveis, com seus questionamentos do que outras que por vezes nem chegaram a responder perguntas feitas por eles. De uma maneira geral, nossa pesquisa constatou dois aspectos fundamentais, que precisarão ser aprofundados através de novas observações: 1 – uma certa falta de preparo das escolas para receberem uma presença maciça de responsáveis, que se refletiu em problemas de logística, como falta de cadeiras para todos poderem assistir à reunião sentado e de forma confortável; problemas de acústica; utilização inadequada de power point, etc. 2 – falta de treino dos diretores e professores para efetivamente promoverem um dialogo com os responsáveis, situação que reflete uma baixa capacidade da escola para contribuir para a melhoria da educabilidade, nos termos anteriormente apresentados. Apesar dessas duas constatações, que de certo modo correspondem ao que a bibliografia vem apontando, também verificamos em alguns casos uma disposição dos profissionais da escola para mudar seu padrão de relação com as famílias. Uma das pretensões dessa pesquisa é justamente a de que ela possa contribuir para que as escolas possam melhorar a forma como lidam com as famílias, tornando-se, com isso, mais próximas do mundo de seus alunos.
  • 10. Departamento de Ciências Sociais Referências Bibliográficas [1] PEREGRINO, Monica - TRAJETÓRIAS DESIGUAIS: Um estudo sobre os processos de escolarização pública de jovens pobres. Ed Garamond,2009. [2] BURGOS, Marcelo e PAIVA, Ângela – A Escola e a Favela. Editora PUC- Rio/Pallas, Rio de Janeiro, 2009 [3] BURGOS, Marcelo Baumann & CANEGAL, Ana Carolina (2011) – ”Diretores Escolares em um contexto de reforma da educação”. Revista Pesquisa e Debate em educação. Revista do Programa de Pós-Graduação Profissional Gestão e Avaliação da Educação Pública. V1. N.1, 2011. [4] LOPEZ, Néstor – Equidad Educativa Y Desigualdad Social. Desafíos a la educación en el nuevo escenario latinoamericano. IIPE – UNESCO, Buenos Aires, 2005. [5] MONTADON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe – Entre pais e professores, um diálogo impossível?. Celta Editora, Oeiras, 2001. [6] SILVA, Pedro – Escola-Família, uma Relação Armadilhada. Interculturalidade e Relações de Poder. Edições Afrontamento, Porto, 2003. ANEXO Neste anexo apresento as resenhas dos textos lidos ao longo do primeiro semestre de 2012, e que foram sendo feitas a partir dos seminários semanais de discussão dos textos realizados com o professor orientador. As resenhas contemplam capítulos dos seguintes livros: PEREGRINO, Monica - TRAJETÓRIAS DESIGUAIS: Um estudo sobre os processos de escolarização pública de jovens pobres. Ed Garamond,2009. BURGOS, Marcelo e PAIVA, Ângela – A Escola e a Favela. Editora PUC-Rio/Pallas, Rio de Janeiro, 2009 BURGOS, Marcelo Baumann & CANEGAL, Ana Carolina (2011) – ”Diretores Escolares em um contexto de reforma da educação”. Revista Pesquisa e Debate em educação. Revista do Programa de Pós-Graduação Profissional Gestão e Avaliação da Educação Pública. V1. N.1, 2011. LOPEZ, Néstor – Equidad Educativa Y Desigualdad Social. Desafíos a la educación en el nuevo escenario latinoamericano. IIPE – UNESCO, Buenos Aires, 2005. MONTADON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe – Entre pais e professores, um diálogo impossível?. Celta Editora, Oeiras, 2001. SILVA, Pedro – Escola-Família, uma Relação Armadilhada. Interculturalidade e Relações de Poder. Edições Afrontamento, Porto, 2003.
  • 11. Departamento de Ciências Sociais Texto Resenhado: PEREGRINO, Monica - TRAJETÓRIAS DESIGUAIS: Um estudo sobre os processos de escolarização pública de jovens pobres. A escola como “espaço social”: Na escola estudada, a autora tenta denominar as turmas, porém, conforme dá continuidade ao seu estudo, ela muda um dos codinomes escolhidos. As turmas que ela chamara de “terminais”, por terem em comum o fato de ser o último estágio antes da saída da escola, já não são vistas somente por esse ângulo. Essa mudança ocorreu após diversos fatores diante de sua observação. Para a autora, essas turmas somam todos os efeitos das precariedades escolares e sociais, junto a todos os “estranhamentos” referentes à instituição. Ela observa alguns padrões de turmas dentro da escola, cada uma com a sua “personalidade”. Ao mesmo tempo em que a autora encanta-se com uma das turmas, pela multiplicidade de experiência que incorporava, ela também se sente um pouco afastada de uma outra turma e, acaba culpando-se pelo fato de ter “habilidade” com turmas “difíceis”, e contudo isso ter limitado seu trabalho com turmas mais “tranqüilas”. Ela chega a fazer uma comparação com o trabalho nas escolas de classe média, diante dessas turmas, as quais ela deu o nome de “turmas plenas”. Após sua observação, a autora coloca em questão: “o que produz essas divisões no interior da escola?” Chegando à conclusão que essas divisões nada mais são do que uma hierarquização como forma de justificar socialmente a distinção feita dentro de uma escola que produz desigualdade. As turmas “plenas” (“tranquilas”) são as primeiras a receberem os livros didáticos, pois na escola são as turmas que as próprias escolas denominam como as “turmas do “topo”. Por conta dessa distribuição injusta, muitos alunos e turmas da categoria mais “baixa”, ficam sem os livros didáticos. Até mesmo os professores são escolhidos de acordo com essa hierarquização feita sobre as turmas. Contudo, a autora esclarece que, as escolas são realmente “espaços hierárquicos com bons espaços de seleção que (ainda) são.” O meu entendimento sobre o texto está de acordo com a visão da autora, pois não pode ser negado ou privado de uma turma, livros didáticos ou outros bens simbólicos que fazem parte do aparelho escolar, “considerados como precariamente legítimos, ou mesmo ilegítimos...” somente porque essas turmas concentrem atributos negativos. Seleção e segregação nas trajetórias escolares das décadas de 1970, 1980 e 1990: Inicialmente a autora nos mostra a firma como fora realizada a sua pesquisa, quais os seus objetivos e a busca pelo entendimento sobre as mudanças nas manifestações das desigualdades no interior da escola. A pesquisa levantou os dados a partir da década de 1970.
  • 12. Departamento de Ciências Sociais Os dados incorporados a trajetória escolar dos alunos como: ano de nascimento, local de moradia e profissão dos pais, recordou-me a pesquisa da qual participo atualmente. Deixei de fora a presença ou ausência do atestado de pobreza, pois como a autora mesma disse, este era exclusivamente para a década de 1970. A autora nos mostra que a década de 1980 fora marcada pela construção dos CIEPs, e as trajetórias foram colhidas ainda sob o impacto do governo de Leonel Brizola. O levantamento das escolas de origem dos alunos está presente até os dias de hoje em pesquisas como a que participo. No momento em que a autora fala da moradia em favela e o fato de assim, essas crianças ocuparem a mais precária posição social da cidade, me chamou atenção a citação de Telles, 1999, p.85-86 (pág. 117 do livro), pois ela descreve quase que poeticamente o problema do qual a autora se refere. “Como problema que inquieta e choca a sociedade, a pobreza aparece sempre como sinal do atraso, pesado tributo que o passado legou ao presente e que envergonha um país que se acostumou a pensar ser “o país do futuro”. Tal como num jogo de espelhos invertidos, a pobreza incomoda ao encenar o avesso do Brasil que se quer moderno e que se espelha na imagem – ou miragem-projetada das luzes do Primeiro Mundo. Neste registro, a pobreza é transformada em natureza, resíduo que escapou à potência civilizadora da modernização e que ainda tem que ser capturado e transformado pelo progresso.” Um problema que passa da década de 1970 para 1980, deixando a marca da separação entre os desiguais e, uma nítida delimitação que marca as diferenças entra favela e asfalto. Outra marca que fica clara, referente as duas décadas citadas anteriormente, é a inversão dos estudantes de escola pública moradores de bairros no asfalto para moradores de favelas, e essa inversão se concretiza na década de 1990. A autora cita também a precariedade das fichas de matrícula e o momento caótico de seu preenchimento. Então, novamente faço uma relação com a pesquisa da qual participo e, se confirma um problema ainda existente nas escolas públicas do Estado do Rio de Janeiro. A década de 1990 é marcada pelas mudanças drásticas em relação a profissionalização dos pais dos alunos da escola estudada, porém, dentre essas drásticas mudanças, houveram também discretas variações quando fora colocado em comparação o tipo de trabalho dos pais. A autora cita também as peculiaridades relativas ao levantamento das categorias profissionais em cada uma das décadas pesquisadas. É importante notar a mudança, ou até mesmo, a redução do tipo de trabalho dos pais a cada década estudada, através das peculiaridades que a autora cita. Ela faz um trabalho que permite a nós leitores, identificar dentro do texto, o que ela chama de “os desiguais”, e o porque, de haver uma “seletividade” desses “desiguais” dentro da escola pública. Nas décadas estudadas havia o atestado de pobreza e, durante sua etnografia, a autora se deparou com diversas contradições relativas às condições sociais daqueles que tinham
  • 13. Departamento de Ciências Sociais esse atestado, quando colocado em comparação a outros registros escolares como, o local de moradia e profissão dos pais, os quais haviam sido informados também na hora de pedir o atestado de pobreza, porém, as informações eram outras nas fichas de matrícula escolar. A situação dos alunos dentro da escola era basicamente dividida entre “extremos” e “não extremos”. Esses espaços eram bem demarcados dentro da escola, entre seus turnos e turmas. A década de 1980 passa por um processo de evasão escolar em todo o país e, junto a evasão, a escola sofre um processo de inversão, e assim os alunos freqüentadores de escolas públicas, passam a ser os pertencentes a faixas cada vez mais vulneráveis da sociedade. Torna-se notória a inversão através do aumento da proporção de favelados que supera a de moradores do asfalto. Saber da precariedade do Ensino Público, todos nós sabemos, porém, é triste saber tão detalhadamente, sobre o descaso relativo ao Plano de Desenvolvimento Econômico e Social do Estado do Rio de Janeiro. Saber que, mesmo com todos os problemas diagnosticados, optaram por não tratar a educação como uma prioridade no governo da nossa cidade. A autora mostra que, na década de 1990, o fator de inversão se mantém, relativo a década anterior e, aumenta em relação a década de 1970. Alguns fatores tornam-se repetitivos, como por exemplo: “o grande número de alunos moradores do asfalto, filhos de pais com ocupações ligadas aos serviços domésticos, em especial diaristas, domésticas e porteiros.” Diante de todos os levantamentos feitos pela autora, constata-se que, mesmo a escola da década de 1990 assemelhando-se à escola dos anos de 1980, houve uma melhora significativa e uma mudança, a qual chamaram de: “o sentido da escolarização.” Assim, a escola da década de 1990, começa a ter dignidade, porém, em termos de processo educativo, os projetos realizados acabam por não deixar marcas das metas desejadas. É a chamada: “escolarização sem escola”. A pressão seletiva diminuiu na década de 1990, contudo não foi eliminada e, se mantém com o mesmo método, o de beneficiar os “não extremos”. Segundo a autora, a segregação dos desiguais precede a seleção, mas a década tem sua peculiaridade, e um mecanismo de “segregação positiva”, “com uma capacidade de atualizar as formas de “separação dos melhores” das duas décadas anteriores: separando turmas como na década de 1970 e recuperando a experiência acumulada na década de 1980, inserindo os “seletos” nas “primeiras turmas”.”
  • 14. Departamento de Ciências Sociais Texto Resenhado: BURGOS, Marcelo e PAIVA, Ângela – A Escola e a Favela. A Escola e A Favela As escolas públicas que atendem crianças moradoras de favela não têm profissionais que conheçam a realidade desses alunos, causando um distanciamento maior ainda além da distância social já existente, a qual eles sofrem diariamente. Distância essa, ainda mais forte nas escolas situadas em bairros de classe média e alta dessa cidade. Nessa realidade, até quem tem que dar força e incentivo para as escolas e seus professores e diretores, não acredita em seu próprio trabalho e no poder que tem nas mãos para melhorar o que ainda está em tempo de ser feito, ou acredita, mas não quer se dar o trabalho por achar que do jeito que está, está bom. A pesquisa de opinião dos professores e diretores mostra que a falta de apoio e estrutura familiar, atrapalha no desenvolvimento e na organização escolar do aluno, e que a cultura na qual eles são criados dificulta muito na mudança de maus hábitos desses alunos. Essa fala é recorrente. Porém, a maioria dos profissionais visualizam somente esse lado da história, deixando de fora a falta de estrutura escolar na qual eles vivem diariamente, junto a falta de segurança e algumas vezes de professores desinteressados. Esses são fatores que se fossem criadas melhorias, a escola com certeza estaria melhor e o respeito dos alunos seria evidente. A visão passada é a de que essas crianças não são tratadas com amor, carinho e respeito por seus pais e familiares, e que desde cedo já lhes são dadas responsabilidades, e a infância vai ficando para depois. Quando na verdade a única responsabilidade que essas crianças deveriam ter, é a de estudar. Essa fala dos professores me recordou muito a nossa pesquisa, das vezes em que fui a alguma escola para tentar achar um responsável do aluno e não conseguia, pronto, já era motivo para ouvir que os pais não estavam nem aí para os filhos, e que viviam largados. É realmente essa visão que a escola em geral tem dos pais. A distância entre esses “dois mundos”, atrapalha de verdade, pois os professores não conhecem a realidade em que eles vivem , mas as crianças conhecem as duas realidades, porém só tem acesso direto à uma delas. Torna-se cada vez mais notório que, a falta de estrutura escolar é uma das principais causadoras do desinteresse dessas crianças pelos estudos. Contudo, é apenas uma das causas. O professor agindo sozinho, tem algum efeito, mas falta um apoio que vai além da sala de aula e da diretoria, como cursos, oficinas, para os alunos e para os próprios professores, para que eles sejam incentivados a dar uma boa aula, para que adquiram novos conhecimentos e tenham novidades para a turma, e assim os alunos venham a se interessar. O diálogo entre professor e aluno é natural, saudável, os alunos realmente gostam e sentem-se mais à vontade para ter aula com alguém que tenham mais intimidade. Então quando se tem um professor tão desmotivado quanto o aluno, fica difícil a convivência,
  • 15. Departamento de Ciências Sociais pois se ele já não tem mais paciência para lecionar, imagina para falar de algum assunto que não seja da matéria. Conforme mantive a leitura, pude observar que, mesmo com o esforço de uma das escolas em intensificar o apoio através de ONGs, ainda assim o poder público não valoriza esse tipo de atitude, e não enxerga o quão seria importante para todas as escolas, que tivessem esse tipo de apoio. Mais uma vez faço uma relação com a pesquisa da qual participo. Ao passar para o capítulo seguinte, encontro uma breve explicação em relação ao rumo que as escolas públicas tomaram desde a década de 1960. O crescimento escolar não acompanhou o crescimento populacional brasileiro, e um problema antigo, mas que se mantém atual, onde os gastos com a educação não estão de acordo com as necessidades que as escolas têm. E para falar um pouco do tráfico, é triste observar como as pessoas moradoras de favela ficam reféns das leis de onde moram, assim como quem mora onde existe a “milícia”, e mais triste ainda é perceber que algumas pessoas, mesmo não sendo moradores de favela, acreditam que uma das duas formas de “governo”, possa trazer algum tipo de melhora para a vida escolar dessas crianças. Uns falam como se o tráfico colocasse medo e a “milícia” viesse a impor respeito, contudo, não conseguem enxergar que os dois colocam medo. Os moradores ficam amedrontados e viram reféns das leis que são impostas pelos chefes de onde moram. A realidade é que as duas favelas da pesquisa tem muita violência, mas onde existe a “milícia” é uma violência velada, pois eles querem que pareça um lugar de tranquilidade, exatamente para não chamar atenção. Já com o tráfico fica tudo às claras, é aquela história de que eles não têm nada a perder. Texto Resenhado:
  • 16. Departamento de Ciências Sociais BURGOS, Marcelo Baumann & CANEGAL, Ana Carolina (2011) – ”Diretores Escolares em um contexto de reforma da educação”. Revista Pesquisa e Debate em educação. O texto fala de uma imersão etnográfica realizada em quatro escolas públicas ao fim do ano de 2010, duas dessas escolas situadas em Recife (PE), pertencentes à rede estadual, e duas no Rio de Janeiro, sendo uma da rede municipal e outra da rede estadual. Ambas atendem crianças e adolescentes de regiões periféricas. Os atores principais dessa pesquisa são os diretores das escolas. O diretor deve estar apto para ouvir e tentar resolver os problemas da escola, dos professores, dos alunos, e seguindo as regras do sistema. A impressão que passa o texto é a de que o diretor está na instituição como água, ocupando todos os espaços e, como dizem os autores, “...ele tende a se confundir com a instituição, imprimindo um padrão personalista à sua atuação – o que não deixa de evidenciar a fragilidade institucional da escola.” (p.22) A ideia de autonomia escolar discutida no texto não se fortalece, pois, dentro do ambiente escolar cada um age sozinho. O sindicato está preocupado com os interesses dos professores, os pais preocupam-se apenas com os interesses de seus filhos, e a direção da escola se vê sozinha tendo que resolver todos e quaisquer problemas que venham a aparecer. De acordo com os autores, a escola pública está submetida às políticas de gestão de pobreza desde os anos de 1980 e 1990. E, ao mesmo tempo, essas escolas têm que ser capazes de lidar com o fracasso da autonomia escolar que surgiu junto à redemocratização do país. Os autores falam da universalização do acesso ao Ensino Fundamental, consolidada em meados dos anos de 1990, que teve seu início nos anos de 1970. O trabalho etnográfico mostra que a escola não estava preparada para lidar com esse alunado. As políticas de valorização do desempenho escolar implantadas pelo sistema, não surtiram efeito fazendo com que a fraqueza institucional permaneça, tanto em Recife, quanto no Rio de Janeiro. Burgos/Carolina falam da descentralização como um fortalecimento da autonomia administrativa das unidades escolares, o que geraria o incentivo a uma participação mais consistente das comunidades escolares através de processos de reforma educacional. Porém esse processo foi sendo deixado para trás com o surgimento da avaliação da eficiência escolar. A pesquisa mostra modelos diferentes, mas segundo os autores, o propósito é o mesmo; a criação de mecanismos eficientes de ensino e aprendizagem. Uma das conclusões obtidas da pesquisa é a de que uma escola só terá autonomia se houver participação de toda a equipe, da comunidade escolar e do sistema. Segundo Neubauer e Silveira, citados por Burgos/Carolina, “somente existe autonomia se houver um ambiente de gestão compartilhada.” (p.29) Porém, a dificuldade de se construir uma escola participativa em países com historia de autoritarismo como o Brasil, é reconhecida pelas autoras.
  • 17. Departamento de Ciências Sociais A partir dos anos de 1990, a avaliação do ensino é utilizada como um parâmetro para que se possa punir ou premiar e não mais com o intuito de que os alunos tivessem uma real aprendizagem daquilo que estava sendo ensinado. Assim foi sendo implantado o sistema de responsabilização, que serve para analisar o desempenho de cada escola e, a partir desse ponto classifica-las. Ainda que sem ter o apoio necessário, o diretor se vê pressionado pelo vértice do sistema, tendo que prestar contas aos sistemas de responsabilização e vendo cada vez mais distante a ideia de autonomia. Como já foi dito, a pesquisa realizada nas quatro escolas denomina o perfil das diretoras como personalista, pelo fato de comandarem a escola de maneira pessoal. Principalmente nas escolas 1, 2 e 3, nota-se que as diretoras estabelecem relações interpessoais com os funcionários, fazendo com que a confiança muitas vezes dependa menos do exercício do papel do que de laços de amizade e até de compaixão. Nessas escolas, a proximidade com os alunos também é evidente, e os pesquisadores dão como exemplo a forma pela qual os alunos adentram a sala da direção sem precisar autorização para isso. Mas na escola 4 é diferente, pois a diretora mantém um papel mais institucional. A pesquisa mostra diversos problemas, e as diretoras estão sempre prontas para resolver, sejam eles de administração, portaria, alimentação, entre outros. Isso se dá pela baixa divisão do trabalho nas escolas e pela falta de profissionais capacitados para determinadas funções. A confirmação dessa precariedade se deu quando os pesquisadores foram solicitados para realizar algumas funções dentro da escola onde estavam trabalhando. Esse perfil personalista não aparece na escola 4 porque, segundo o pesquisador, lá “a direção atua como uma extensão da administração central.” (p.39) As outras três escolas manifestam um desconforto ao receberem ordem de pessoas que, segundo a direção, não fazem parte da rotina escolar. Outro fator citado no texto, que dificulta uma melhor relação entre a escola, a comunidade escolar e o sistema, é a resistência da direção em se atualizar ao sistema de informática, pelo fato de serem gerenciados pela administração central, mantendo assim suas formas tradicionais de controle escolar. Para que esse perfil personalista deixe de fazer parte da direção de uma instituição escolar, é preciso, segundo os resultados da pesquisa, que “as reformas educacionais se preocupem mais com o fortalecimento institucional da escola.” (p.41) O diretor deve ter autonomia para que assim a escola tenha condições de ter um bom desenvolvimento, mas essa autonomia não pode estar referida ao seu personalismo, que os coloca em meio aos sentimentos de solidão e de mal-estar. A pesquisa mostra a dedicação dos diretores e a vontade que eles têm de trabalhar, porém, “faltam-lhes competências técnicas mais específicas para a gestão de um ambiente tão complexo como são as escolas” (p.42)
  • 18. Departamento de Ciências Sociais É necessário que o diretor reveja seus conceitos e sua maneira de agir, aceitando modificar sua forma tradicional de lidar com a gestão, e investir numa capacitação técnica para que nem ele, nem a escola, nem seus alunos sejam prejudicados. Texto Resenhado:
  • 19. Departamento de Ciências Sociais LOPEZ, Néstor – Equidad Educativa Y Desigualdad Social. Desafíos a la educación en el nuevo escenario latinoamericano. Após a leitura dos capítulos 2, 3 e 6, do livro a que me refiro, pude observar que, segundo López , desenvolver estratégias adequadas de institucionalização é essencial para alcançar resultados positivos dentro das escolas pesquisadas. Mas antes que sejam desenvolvidas essas estratégias, é preciso conhecer o ambiente escolar, suas necessidades e a realidade das pessoas que o habitam, para assim, haver interação entre educação e equidade social. Segundo López, para alcançar equidade educacional, é necessário que todos tenham as mesmas oportunidades de acesso à educação, os mesmos recursos e condições para ir à escola e participar das práticas educativas, independentemente de sua origem ou classe social. Contudo, essa noção de equidade só será possível, segundo López, se houver o reconhecimento da diversidade cultural, podendo assim definir um horizonte de política educacional e garantir igualdade dentro de uma realidade desigual. Realidade essa que é oposta à realidade das escolas, a qual não tem capacidade de fornecer um ensino de qualidade a todos, onde muitos alunos e suas famílias não detém os recursos necessários para receber esse ensino de qualidade. Segundo López, a noção de educabilidade deve estar relacionada com o ensino que os professores têm a oferecer e o desenvolvimento e aprendizagem dos alunos a partir desse ensino. Mas para haver essa relação, a educação de todas as crianças e adolescentes deve ser o ponto de partida das práticas educativas, em uma ação conjunta de políticas sociais e educativas. Havendo uma interação entre o contexto social e o sistema de ensino, a desigualdade se diluiria e todos poderiam ter condições de participar das práticas educativas em um sistema que estaria preparado para lidar com qualquer tipo de aluno. Segundo o autor, os professores se veem limitados a exercer sua função didática por não estarem preparados para o que é chamado no texto de aluno “real”, e por estarem sempre esperando o aluno “ideal”. Isso acaba criando um afastamento cada vez maior com o aluno e a família. Porém, os sistemas educativos não podem agir sozinhos, mas devem treinar seus professores para que estejam preparados para situações diversas de ensino. Deve haver também um conjunto de ações externas à escola relacionadas a políticas econômicas, sociais e culturais, com uma sociedade criando condições para que crianças e adolescentes tenham os recursos necessários para aumentar a educabilidade e com isso tornar o aluno “real” mais próximo do “ideal”. Dessa forma é possível obter uma mudança na visão que os professores e diretores têm de seus alunos, como o desinteresse pelos estudos, e da família, como a falta de interesse dos pais pelos assuntos escolares. Desconstruindo esta visão, a dificuldade que professores tem em dar aula para crianças e adolescentes oriundas de famílias pobres diminuiria junto ao desafio de oferecer uma educação intercultural, e assim as condições de educabilidade se fortificariam. Essa ausência de recursos e apoio de um corpo institucional deixa clara a falta de solidez e legitimidade que a escola sofre. Mesmo assim os professores e diretores exercem sua função de maneira a improvisar a forma de ensino, deixando a impessoalidade de lado e agindo da forma como acham que devem agir.
  • 20. Departamento de Ciências Sociais A fraqueza institucional afeta não só a comunidade escolar, como também a família dos alunos, que às vezes mudam até de cidade para achar um lugar que forneça uma melhor estrutura de ensino a seus filhos. Em um Estado onde a equidade não é prioridade, como mostra o texto, onde uma educação de qualidade está longe de ser disponibilizada para os setores mais pobres, López questiona como é possível gerar uma dinâmica de acordo com o novo cenário social das escolas, diante de um sistema com uma enorme fragilidade institucional como este. Todos esses problemas e essa desvalorização da escola causam uma frustração não só nos professores e diretores pelas condições em que tem de trabalhar, mas também nos pais em relação à educação que seus filhos recebem. Segundo López, é necessário utilizar de políticas sociais para que se reverta este quadro, o qual é denominado no texto como deterioração das escolas, junto a uma articulação com políticas educativas, para assim alcançar uma equidade no acesso ao conhecimento. Porém, a institucionalização de cada escola deve estar de acordo com o cenário social em que se encontra, para que não se produza mais desigualdade. A fragilidade das instituições e do Estado gera a falta de estrutura e oportunidades dentro das escolas, e isso acaba fortalecendo o envolvimento pessoal dos professores em suas ações profissionais. Para que se desconstrua esse perfil de “desinstitucionalização” é necessário ultrapassar os desafios existentes para articular os diferentes setores do Estado, criando projetos de políticas mais efetivas de qualidade e mais equidade, onde a escola, professores e diretores tenham a garantia de uma trajetória de sucesso, e os alunos tenham acesso a uma educação de qualidade e suas famílias estejam satisfeitas com essa educação que seus filhos estão a receber. Texto Resenhado:
  • 21. Departamento de Ciências Sociais MONTADON, Cléopâtre & PERRENOUD, Philippe – Entre pais e professores, um diálogo impossível? O texto do qual falarei aborda o capítulo 1 deste livro. Inicialmente Montadon fala da relação que as famílias de camadas populares do século XIX, não tinham com a escola. Segundo a autora, a maioria destas famílias não tinham vós dentro da escola pública, pois a preocupação das autoridades escolares com a opinião dos pais de alunos era pouca e, “os pais de grande parte dos alunos eram considerados ignorantes que era preciso educar.” (P.13) Já as família privilegiadas não passavam por esse tipo de problema, pois tinham condições de matricular seus filhos em escolas particulares ou pagar por um professor particular. Porém Montadon diz que, alguns pais de camadas populares fizeram-se ouvir ao expressar seus descontentamentos em relação à escola burguesa, mas estes pais não eram admitidos na esfera escolar e as relações família-escola praticamente não existiam nas cidades. Entretanto, em comunidades menores como vilas e aldeias, “os pais tinham uma maior intervenção no plano pedagógico.”(P.14) Intervenção esta que se deu através de uma relação que os professores das áreas rurais estabeleceram com os pais de alunos. Segundo Montadon, algumas mudanças ocorridas nas instituições e também na forma de se pensar fizeram com que a relação família-escola evoluísse. A autora fala também da relação entre pais e filhos muitas vezes pautada por discursos de pediatras, psicólogos e psiquiatras que mudam suas teses ao passar do tempo, e dessa forma os pais têm uma relação com os filhos quase que profissionalizante. Mas por outro lado, os pais ficam coagidos e acabam agindo de forma instrumental a respeito do futuro de seus filhos. Segundo Montadon, “as duas tendências provocam um aumento do interesse que a família dirige à criança.” (P.16) Fora outros fatores, como por exemplo o controle do nascimento e da redução de mortalidade infantil que contribuíram para que as estruturas familiares se estabilizassem e mudassem a forma de ver as crianças. Montadon diz que o sistema da escola também sofreu transformações, como a escolaridade obrigatória, a democratização da educação, as mudanças nos conteúdos do ensino, entre outros. É destacado no texto a forma de desenvolvimento de uma “relação utilitarista com o saber” pela qual “os alunos aprendem cada vez menos para dominar um saber valorizado enquanto tal e cada vez mais para satisfazer as exigências de seleção.”(Perrenoud. P.17) Segundo Montadon, mesmo com tantas transformações no sistema escolar e influências na vida quotidiana das famílias com filhos escolarizados, as famílias continuam sendo insubstituíveis. Diante destes motivos a autora constata que, a relação família-escola se alargou consideravelmente. Montadon fala da criança em desafio de socialização no plano afetivo e no plano instrumental. E para a escola a criança é um tipo de aposta no plano afetivo, ao agir de maneira personalizada, o professor pode invadir o território afetivo da família. Da
  • 22. Departamento de Ciências Sociais mesma forma que a família vê a criança como uma ponte para acessar as atividades profissionais dentro da escola. Montadon cita a diferenciação das classes sociais, e diz que apesar de algumas famílias serem desfavorecidas e outras privilegiadas, pode-se observar que houve uma evolução da escola que afetou fortemente a relação instrumental das famílias com seus filhos como antes não ocorria. A autora fala das mudanças culturais que contribuíram para tornar evidente a necessidade de uma melhor comunicação, apontando primeiramente para a questão da “ideologia da participação”. Dessa maneira os pais puderam ter mais voz para falar dos métodos educativos. Montadon explica que, nos anos de 1960 pediam aos pais que encorajassem seus filhos nas atividades escolares, nos anos 70 a complementaridade entre a escola e a família era muito vaga e nos anos 80 passou a ser recomendado aos professores que estreitassem a relação com os pais de maneira a melhorar a relação do aluno com a escola e da escola com os pais. A autora diz que esta nova forma de relação tem dois lados. Um é a iniciativa da família de criar associações de pais de alunos, outra é a iniciativa da escola de abrir suas portas para a família. Entretanto, Montadon explica que as associações por vezes encontram problemas não só da parte da escola, como também em sua própria base, e completa dizendo que, alguns destes problemas “são típicos do movimento associativo: a sociedade industrial suscita a criação de associações ao mesmo tempo que vai erguendo barreiras à sua participação.” (P.21) A autora destaca o fato de que apesar de as relações entre a escola e a família terem evoluído consideravelmente, ainda se mantém ligadas às opções ideológicas e aos sistemas políticos onde estão inseridas. Montadon diz que os pais são vistos pela escola como pessoas que não sabem nada de pedagogia e gestão, e por isso sua participação pode ser considerada pelas autoridades escolares uma perda de tempo e de eficácia. Porém existem os defensores da participação que fazem um recorte das vantagens a serem oferecidas às autoridades escolares. A autora diz que na maioria das vezes os professores estão satisfeitos com o funcionamento da escola e “não são favoráveis a uma participação ativa dos pais.”(P.24) Contudo, Montadon diz que existem os pais que evitam as relações com a escola por diversos fatores, pois todos têm comportamentos muito diferentes e nem todos tem o desejo de participar da vida pública. Montadon explica que o fato de as escolas terem se entreaberto aos poucos, fez com que os pais a procurassem cada vez mais, por isso se deu essa evolução nas relações entre escola e família. Mas o debate continua junto ao questionamento relativo às vantagens e desvantagens para famílias de médias e superiores ou de camadas populares. Segundo Montadon, “sem dúvida, as relações família-escola reservam-nos ainda muitos desenvolvimentos, tanto no plano empírico como teórico.”(P.26) Perrenoud inicia o segundo capítulo falando da relação entre escola e família, mostrando o quanto o valor de se comunicar é desperdiçado. Mesmo as crianças que são a via mais próxima que os professores têm de se relacionar com os pais, segundo
  • 23. Departamento de Ciências Sociais Perrenoud, não são vistas como uma ponte indispensável de comunicação entre pais e professores. O autor fala da questão de crianças e adolescentes pertencerem a diversos grupos e também a diferentes classes sociais e, “desde logo, como a maior parte dos adultos, a criança partilha o seu tempo com família e outros grupos de pertença.” (P.31) Perrenoud fala da expressão go-between como uma figura sociológica que pode funcionar como um “agente de ligação” se ambos os grupos, escola e família, tiverem uma relação de cooperação. Dessa maneira, se houver um conflito entre os grupos o go- between poderá atuar como uma espécie de mediador. Perrenoud explica que a criança é definida em nossa sociedade como um ser que ainda não tem capacidade para conduzir sua vida autonomamente, por isso os adultos e, sobretudo, a escola tem o dever de educar, cuidar, proteger e vigiar essas crianças. O autor fala da interdependência existente entre a família e a escola, a qual muitas vezes é gerada pela questão da divisão do trabalho educativo, onde pais e professores estão a todo o tempo vigiando o trabalho um do outro. E segundo Perrenoud mesmo quando se rompem as relações diretas entre pais e professores, a criança faz com que se mantenha essa interdependência entre ambos. Porém, o autor explica que “a ambiguidade, que está sempre presente na comunicação direta, não pode deixar de acentuar-se quando as trocas são feitas através de um go-between”. (P.34) Perrenoud explica que o fato de a criança ter o controle parcial dos contatos diretos entre pais e professores pode por vezes ajudar ou atrapalhar essa comunicação, pois a mensagem que a criança passa tanto na escola quanto em casa pode não ser interpretada de maneira desejada por pais ou professores. O autor diz que a realidade da criança não é uma coisa simples e para que a família e a escola tenham êxito em seus objetivos de transformar a criança em um ser de responsabilidades, de boa conduta, feliz e saudável, é preciso, segundo o autor, que cheguem a um consenso. Perrenoud fala da forma como é pensado o futuro de uma criança sem que essa mesma seja consultada para a discussão de seu próprio destino, e explica que dessa maneira as crianças acabam se afastando dos adultos de quem mais dependem por muitas vezes perceberem que falam delas como se estivessem ausentes. Perrenoud coloca o encontro entre pais e professores como um movimento de metacomunicação, onde ocorre a tentativa de clarificar o sentido dos contatos indiretos realizados pelas crianças. Contudo, o autor questiona se a criança realmente deseja que tudo fique esclarecido entre seus pais e professores e conclui que não, pelo fato de que ao se manter como mediadora a criança pode, “fornecendo aos pais e professores versões contraditórias de seus motivos, impedi-los de compreender exatamente s sua conduta e logo definir uma linha de ação comum.” (P.37) O autor fala do poder que essas crianças têm enquanto mensageiras. Já que se sentem no direito de alterar ou simplesmente não entregar uma mensagem onde elas não são a parte favorecida. Porém, Perrenoud explica que esse fato não é uma regra, mas deixa claro que a criança como mensageira exerce um certo controle sobre a comunicação. E, para que se evite esse tipo de ação os pais e professores devem permitir que as crianças participem mais da formulação das mensagens enviadas falando sobre elas mesmas.
  • 24. Departamento de Ciências Sociais Perrenoud fala das intenções “teleguiadas”, onde as crianças agem conforme a vontade dos pais ou dos professores por simplesmente não perceberem que estão sendo “teleguiadas”, ou por jogar o jogo de ambos os grupos. Segundo Perrenoud, “pais e professores querem em princípio, o bem da criança. Mas nem sempre partilham uma imagem comum desse bem.” (P.43) Perrenoud mostra no texto que no ambiente familiar e escolar circulam diversos tipos de julgamento a respeito da criança. Sejam eles conflituosos ou positivos, o fato de estarem em constante circulação ajuda a estabelecer uma forma de haver uma comunicação, mesmo que indireta, entre a família e a escola. O autor fala de uma preocupação dos professores em relação à percepção que os alunos têm de suas ações e como isso pode ser passado para os pais. Entretanto, Perrenoud diz que, “nem todas têm a preocupação de contar aos pais o que aconteceu. Mas o professor nunca sabe exatamente o que os alunos perceberam, o que compreenderam e o que irão contar.” (P.48) Por outro lado, Perrenoud mostra que as crianças costumam contar muito de sua vida familiar na escola e, no entanto, os pais nem sempre têm essa preocupação quanto ao assunto que pode ser contado sobre a sua intimidade. Segundo Perrenoud, esta preocupação se dá apenas quando a família considera que tem algo a esconder, diferentemente dos professores que se preocupam com a interpretação dos alunos. Perrenoud explica que pelo fato de a criança pertencer aos dois universos, familiar e escolar, acaba se tornando uma espécie de “agente duplo” que age nas duas esferas de maneira espontânea e solidária. Para Perrenoud a criança é a expressão de sua família dentro da escola e “dificilmente um professor abandona o sentimento de que uma criança exprime as atitudes, valores e hábitos dos pais, de uma forma mais completa e sincera do que estes alguma vez o farão, mesmo num frente a frente.” (P.51) Assim como, segundo o autor, a criança é também a expressão da escola no ambiente familiar. Perrenoud conclui dizendo que não se deve reduzir a relação entre escola e a família às formas diretas de encontro entre o pai e o professor, pois ela está sempre referida ao papel de mediador desempenhado pela criança. “Entre...” (p.54). Dessa maneira, explica Perrenoud, haverá um progresso no que ele chama de “insucesso escolar”. Texto Resenhado:
  • 25. Departamento de Ciências Sociais SILVA, Pedro – Escola-Família, uma Relação Armadilhada. Interculturalidade e Relações de Poder. Pedro Silva inicia este capítulo falando sobre a relação existente desde sempre entre a escola e a família. Relação esta que nem sempre foi tão harmoniosa, ora mais direta, ora mais indireta. O autor apresenta a relação escola-família em duas vertentes. De um lado está a casa onde os pais interagem com seus filhos, e de outro está a escola, onde talvez os pais e com certeza os filhos interagem com o todo. Segundo Silva, “ambas as vertentes tendem, contudo, a ser objeto de atenção estatal, quando não mesmo de regulamentação explícita.” (P.29) Silva questiona o fato de haver um consenso legislativo entre países com histórias tão distintas, em torno da relação escola-família, e cita diversos autores preocupados com o mesmo tema: distância entre escolas e famílias parece ser universal. Silva então conclui que o problema que se refere a esta relação existe na maioria dos países ocidentais e não exclusivamente em Portugal, e este fato o ajuda a encontrar pistas para o caso português. O autor explica que a participação formal das famílias nos estabelecimentos de ensino se deu a partir dos anos de 1960, e neste período havia uma emergência para a participação parental na educação e para uma educação permanente. Estas mudanças tornaram notórias as limitações das instituições escolares da época. Silva pontua este fato como uma crise de legitimação política que deveria ser encarada como uma “ampla reestruturação estratégica da engrenagem do Estado.”(P.32) O autor fala do estudo de um sociólogo britânico (Beattie), que diz respeito à evolução dos sistemas de parent participation em quatro países ocidentais com diferentes características e tradições distintas. São estes, França, Itália, Alemanha, Inglaterra e País de Gales. Silva diz que, segundo Beattie, este repentino surto de participação parental só poderia ser de total compreensão se estivesse inserido não só nestes quatro países, mas também em um movimento que englobasse boa parte do mundo ocidental com a tentativa de democratização dos postos de trabalho. Entretanto, Silva julga ser necessário a realização de medidas políticas para tentar uma regulação estatal e assim gerar democracia. Porém, Silva fala da existência do paradigma da Crise Geral de Habermas, em que dentro do sentido de participação parental estabelecem tentativas de restaurar o apoio público sem gerar uma real democratização. E a ideia que antes Beattie tinha sobre a democratização em torno da parent participation passa a ser vista agora por Silva como um subproduto do controle público. O autor cita o sociólogo britânico Philip Brown e sua teoria sobre a relação escola- família, em que consiste a história da educação escolar que atualmente pode ser caracterizada pelo predomínio da “ideologia da parentocracia”. Ideologia já que a parentocracia existe somente no papel, e na realidade o que vale é a Estadocracia, que acaba reforçando as desigualdades sociais, pois “é o poder central do Estado que sai reforçado e não o dos pais”.(P.35)
  • 26. Departamento de Ciências Sociais A explicação que Silva dá sobre as conclusões de Brown, confirma um problema existente em diversos países onde o Estado controla os sistemas educativos e reproduz desigualdades sociais ao mesmo tempo em que joga a responsabilidade do sucesso ou insucesso escolar para as famílias. Dessa maneira, as vítimas que são as famílias, acabam levando a culpa dos efeitos causados pelas políticas estatais. Desde então surgiu um debate sobre o papel dos pais no processo educativo escolar. Silva fala da questão dos pais como consumidores, a escola e os professores como produtores e o aluno como produto. Quando se analisa a situação, os professores têm o papel de ensinar os alunos e os pais como consumidores deste “produto” têm o direito de cobrar um bom resultado, e caso não estejam satisfeitos podem decidir mudar seus filhos de escola. Segundo Silva, esta ideia de colocar os pais como consumidores engloba uma perspectiva de ideologia liberal, em que os pais têm o direito de escolher onde seus filhos irão estudar. E para Silva, isto é sinônimo de “mercadorização” da educação, um fator que reforça as desigualdades sociais e culturais, entretanto, a perspectiva que acentua a liberdade individual dos pais, constitui uma espécie de bandeira desta teoria na medida em que diz reforçar assim a democracia. Este “embrulho ideológico torna-a naturalmente, mais atrativa.” (P.38) Silva diz que, geralmente, os pais escolhem onde seus filhos irão estudar de acordo com a lista hierarquizada das escolas em função dos resultados obtidos pelos alunos, assim como o Estado deseja, mas nem sempre é desta maneira. Segundo Silva, os pais consideram uma série de fatores na hora de sua escolha, inclusive os sociais. Conforme mostra o autor, o fato de a família escolher a escola por diversas características acaba fazendo com que as escolas menos escolhidas fechem por falta de alunos e as mais solicitadas tenham que recusar alunos por estar superlotadas. E assim Silva explica que, há uma hipótese de que as escolas escolhidas ganhem cada vez mais recursos tanto materiais quanto sociais e as restantes estarão cada vez mais distantes da cultura socialmente valorizada. Segundo Silva, esta situação resultará em uma inversão de papéis e a escola passará a escolher seus alunos e não mais os pais escolherão as escolas. Dessa forma, ao invés de escolhidas, as famílias talvez sejam excluídas por diversos fatores como, por exemplo, sua classe social. Silva cita outros autores que analisam os pais como gestores e o papel conservador que eles exercem pelo fato de, primeiramente defender os interesses particulares de seus filhos, apesar de agir coletivamente. Silva ressalta o fato de ser “basicamente os pais brancos, da classe média e de profissões liberais, que integram estes órgãos, mesmo em áreas onde predominam a classe trabalhadora ou minorias étnicas.” (P. 48) O autor explica que, a participação parental raramente é imposta por movimento sociais, quem realmente a impõe é o Estado. Silva fala da ideia de Pamela Munn, em que consiste o fato de a obrigatoriedade da participação induzir novos hábitos, e assim, países com esta tradição quase que inexistente, se acostumariam com o fato e o tornaria um hábito. Dessa maneira seria possível que a participação parental ajudasse a redefinir a cultura profissional dos
  • 27. Departamento de Ciências Sociais docentes, mas não em um maior controle das escolas e seus professores ou em uma democracia mais participativa. No entanto, Silva diz que pais e professores se mantém em grupos distintos. Silva agora coloca os pais como consumidores cidadãos, o que engloba um conceito mais ampliado de consumidor, onde são criadas condições sociais que tornam útil o papel dos pais como consumidores, gerando uma interdependência entre “cidadãos” e “consumidores” junto ao crescente consumo coletivo e a intervenção estatal. Silva explica que, ao fortalecer o consumidor-cidadão, haverá uma mudança nas relações de poder e influência, assim, a relação entre produtores e consumidores será modificada. Esta mudança, “consiste em encará-los como atores sociais de fato; alguém com que tem de se contar, que faz sentir: estamos aqui, existimos, contem conosco. Queiram ou não, gostem ou não.” (P. 55) Silva cita Philip Woods, que defende a participação dos pais no processo educativo escolar de seus filhos enquanto parceiros da escola, associando este fato à ideia dps pais como consumidores-cidadãos. A perspectiva dos pais enquanto educadores, não é ainda apoiada por professores e gestores, pois acreditam na falta de competência educacional dos pais. Segundo Silva, essa articulação entre pais e professores, tem uma perspectiva progressista, onde ambos devem apender uns com os outros e entender que suas funções educacionais são distintas e deveriam ser divididas em benefícios de seus filhos e alunos. Segundo Silva, aí entra a ideia do pai como parceiro/colaborador. E, esta colaboração poderá trazer benefícios não só para os alunos, mas também para pais e gestores. Silva diz que, no período do pós-guerra, o governo de esquerda via o envolvimento dos pais como uma forma de aprofundar a democracia e assim contribuir para uma sociedade com mais equidade social, já o de direita, valorizava a liberdade individual. Segundo Silva, esta última maneira de enxergar a participação parental é típica dos adeptos da “mercadorização” da educação que consiste em criar falsas divisões. Silva diz que, ““mercadorizar” privatizando ou não, também já vimos que não eleva a qualidade geral do ensino, tendendo antes a produzir “mais do mesmo”, para além de aumentar consideravelmente as desigualdades escolares e sociais.” (P. 59) Silva questiona o fato de haver uniformidade dentro do sistema educativo e diz que, segundo Bourdieu, a maneira de se tratar os alunos como iguais na organização dos sistemas educativos é o que causa a discriminação destes mesmos. Silva explica que a questão da escolha parental pode gerar um “alto clima social educacional positivo” onde os pais desejem melhorar a escola em função de terem sido escolhidos como parceiros na participação. Isto pode aprofundar a democracia. Segundo Silva, para obter ênfase no aprofundamento da relação escola e família, é preciso que se altere as relações entre a escola e a sociedade, e, entre a educação e o Estado, pois estas ainda são contraditórias.
  • 28. Departamento de Ciências Sociais Silva diz que, a questão da democracia pedagógica engloba diversos aspectos da relação escola-família e que constitui um problema político que ultrapassa o interior da escola. “Como lembra Beattie; a participação parental está muito longe de constituir um assunto puramente educacional.” (P. 63) Segundo o autor, ao colocar os pais como colaboradores, faz-se com que a escola, particularmente os professores, veja-os como uma extensão de seu trabalho e tendem a entender esta interação como uma relação profissional, ao mesmo tempo em que enxergam esses pais como leigos. Segundo Silva, este estreitamento da relação escola-família e o interesse na participação parental “está mais próxima de uma operação cosmética do que perante uma verdadeira mudança na relação entre ambos.” (P. 66) Com isso Silva cita diversos autores que apontam para o fato de que as reuniões de pais convocadas pela administração das escolas contribuem para aumentar as distâncias sociais e culturais ao invés de diminuí-las, mesmo com a escola olhando para as famílias como um apoio externo, tornando essa relação mais assimétrica. Silva tenta nos mostrar a lógica da escola enquanto instituição social, a forma como trabalham e o controle de seu poder que tende a imperar, e chega à conclusão de que abrir espaço para os pais terem na escola uma relação mais informal, ou estar presente no quotidiano familiar, não significa o achado de uma solução milagrosa, mas se for assim realizado junto a uma política de aproximação e respeito pelas culturas locais, “podem constituir esquemas com potencialidade democrática.” (P. 70) Silva mostra no texto que, os pais são cidadãos de classes sociais diversas, com profissões e relações sociais das mais variadas com o poder e as instituições. Estes fatos levam o autor a citar uma ideia de Mary Henry, que é semelhante a sua, em que consiste o fato de os professores estipularem outros tipos de relação com o aluno de acordo com as características dos pais. Isso acaba colocando as crianças de classe baixa em uma enorme desvantagem. Silva coloca em comparação duas escolas, uma de classe média superior e uma de comunidade operária, constatando que, “ambos os grupos de pais valorizam bastante a educação escolar dos filhos.” (P. 71) Para fortalecer esta comparação Silva cita Lareau, que explica a relação escola-família dentro da classe operária como uma ideia de separação, e na classe média superior de ligação. E esta situação acaba gerando uma discriminação na forma de lidar com os pais, pois os requisitos da escola muitas vezes não estão de acordo com o capital cultural dos pais e a colaboração que eles têm a oferecer. Silva conclui este capítulo mostrando que a relação escola-família constitui uma reprodução social e cultural, e, o fato de a comunidade escolar tratar os pais como iguais gera uma discriminação, que Silva chama de relação armadilhada.