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dacom uma deficiencia nao e, de modo algum, inferior a vida 
semuma deficiencia? Ao procurarem assistencia medica para 
superar e eliminar a deficiencia, quando tal assistencia se acha 
disponivel, os proprios deficientes mostram que a preferencia 
por uma vida sem deficiencia nao e urn mero preconceito. Al-gunsdeficientes 
poderiam dizer que so fazem essa escolha por-quea 
sociedade coloca tantos obstaculos no seu caminho. Afir- 
IJ1amque 0 que os torna deficientes saD as condiyoes sociais, 
e nao a sua condiyao fisica ou intelectual. Essa afirmayao dis-torce 
a verdade mais limitada, segundo a qual as condiyoes so-dais 
tornam a vida dos deficientes muito mais dificil do que 
precisaria ser, e a transforma numa total falsidade. Ser capaz 
deandar, de ver, de ouvir, de estar relativamente livre da dor 
e do mal-estar, conseguir comunicar-se bern, saD coisas que, 
!ob virtualmente quaisquer condiyoes sociais, constituem be-neficiosinquestionaveis. 
Dizer isto nao significa negar que as 
pessoas as quais faltam essas aptidoes possam triunfar sobre 
as suas deficiencias e viver vidas de uma riqueza e diversidade 
mrpreendentes. Nao obstante, nao demonstramos preconcei-to 
contra os deficientes se preferimos, seja para nos mesmos 
ou para os nossos filhos, nao nos deparar com obstaculos tao 
grandes que 0 simples fato de supera-Ios ja constitui em si 
urn triunfo. ' , 
Igualdade para os animais? 
No capitulo anterior, ofereci motivos para se acreditar que 
o principio fundamental da igualdade, no qual se fundamenta 
a igualdade de todos os seres humanos, e 0 principio da igual 
considerayao de interesses. So urn principio moral basico des-se 
tipo pode permitir que defendamos uma forma de igualda-de 
que inclua todos os seres humanos, com todas as diferenyas 
que existem entre eles. Afirmarei agora que, ao mesmo tempo 
que esse principio proporciona uma base adequada para a igual-dade 
humana, essa base nao pode ficar restrita aos seres huma-nos. 
Em outras palavras, you sugerir que, tendo aceito 0 prin-cipio 
de igualdade como uma s6lida base moral para as rela-yoes 
com outros seres de nossa pr6pria especie, tambem somos 
obrigados a aceita-Ia como uma s6lida base moral para as re-layoes 
com aqueles que nao pertencem a nossa especie: os ani-mais 
nao-humanos. . 
A primeira vista, a sugestao pode parecer bizarra. Esta-mos 
habituados a ver a discriminayao contra membros de mi-norias 
raciais, ou contra mulheres, como fatos que se encon-tram 
entre as mais importantes questoes morais e polfticas com 
as quais se defronta 0 mundo em que vivemos. Sao problemas 
serios, merecedores do tempo e das energias de qualquer pes-soa 
que nao seja alienada. Mas que dizer dos animais? 0 bem-estar 
dos animais nao se insere numa categoria totalmente di-versa, 
uma hist6ria para pessoas loucas por caes e gatos? Co-mo 
e possive! que alguem perca 0 seu tempo tratando da igual-dade 
dos animais, quando a verdadeira igualdade e negada a 
tantos seres humanos?
Essa atitude reflete urn preconceito popular contra 0 fato 
d_es~ levarem a serio os interesses dos animais - urn preconceito 
tao mfundado quanto aquele que leva os brancos proprietarios 
de escravos a nao considerarem com a devida seriedade os inte-resses. 
de seus escravos africanos. Para nos, e facil criticar os pre-c; 
onceltos de nossos avos, dos quais os nossos pais se libertaram. 
E mais dificil nos distanciarmos de nossos proprios pontos de vista, 
de tal modo que possamos, imparcialmente, procurar preconcei-tos 
entre as cren<;:ase os valores que defendemos. a que se preci-sa, 
agora, e de boa vontade para seguir os argumentos por onde 
~le~nos levam, sem a ideia preconcebida de que 0 problema nao 
e dlgno de nossa aten<;:ao. 
a argumento para estender 0 principio de igualdade alem da 
nossa propria especie e simples, tao simples que nao requer mais 
do q~e um~ clar~ compreensao da natureza do principio da igual 
consldera<;:ao de mteresses. Como ja vimos, esse principio implica 
que a nossa preocupa<;:ao com os outros nao deve depender de co-mo 
sao, ou das aptid6es que possuem (muito embora 0 que essa 
preocupa<;:ao exige precisamente que fa<;:amospossa variar con- 
~orme as caracteristicas dos que SaDafetados por nossas a~6es). 
E com ~ase nisso que podemos afirmar que 0 fato de algumas pes-soas 
nao serem membros de nossa ra<;:anao nos da 0 direito de 
explora-Ias e, da mesma forma, que 0 fato de algumas pessoas se-rem 
menos inteligentes que outras nao significa que os seus inte-resses 
possam ser colocados em segundo plano. a principio con-tudo, 
tambem implica 0 fato de que os seres nao pertence;em a 
nossa especie nao nos da 0 direito de explora-Ios, nem significa 
que, por serem os outros animais menos inteligentes do que nos 
possamos deixar de levar em conta os seus interesses. ' 
No capitulo anterior, vimos que, de uma forma ou de ou- 
~ra, muitos filosofos tern defendido a igual considera<;:ao de 
mteresses como urn principio moral basico. Poucos admitiram 
que 0 principio tern aplica<;:6es alem de nossa propria especie. 
Urn dos poucos a faze-Io foi Jeremy Bentham 0 criador do 
utilitarismo moderno. Num trecho premonitorio escrito nu-ma 
epoca em que os escravos africanos das poss~ss6es ingle-sas 
alllda eram tratados quase do mesmo modo como hoje tra-tamos 
os animais, Bentham escreveu: 
Talvez chegue 0 dia em que 0 restante da cria9ao animal venha 
a adquirir os direitos dos quais jamais poderiam ter sido privados, 
a nao ser pela mao da tirania. Os franceses ja descobriram que 
o escuro da pele nao e motivo para que urn ser humano seja aban: 
donado, irreparavelmente, aos caprichos de urn torturador. E 
possivel que algum dia se reconhel;a que 0 numero depernas, 
a vilosidade da pele ou a termina9ao do os sacrum SaGmotivos 
igualmente insuficientes para se abandonar urn ser sensivel ao 
mesmo destino. 0 que mais deveria tra9ar a linha insuperavel? 
A faculdade da razao, ou, talvez, a capacidade de falar? Mas, 
para la de toda compara9ao possivel, urn cavalo ou urn cao adul-tos 
SaGmuito mais racionais, alem de bem mais sociaveis, do 
que urn bebe de urn dia, uma semana, ou ate mes~o urn ~es. 
Imaginemos, porem, que as coisas nao fossem aSSlm; que lm-porHincia 
teria tal fato? A questao nao e saber se SaGcapazes 
de raciocinar, ou se conseguemjalar, mas, sim, se sao pass{veis 
de sojrimento. 
Neste trecho, Bentham chama a aten<;:ao para a capacida-de 
de sofrimento como a caracteristica vital que confere, a urn 
ser, 0 direito a igual considera<;:ao. A capacidade de sofrimen-to 
- ou, mais estritamente, de sofrimento e/ou frui<;:ao ou fe-licidade 
- nao e apenas mais uma caracteristica, como a ca-pacidade 
de falar ou para a matemMica pura. Bentham nao 
esta dizendo que os que tentam marcar a "linha insuperavel", 
que determina se os interesses de urn determinado ser devem 
ser levados em conta, tenham por acaso escolhido a caracte-ristica 
errada. A capacidade de sofrer e de desfrutar as coisas 
e uma condi<;:ao previa para se ter quaisquer interesses, condi- 
<;:aoque e preciso satisfazer antes de se poder falar de interes-ses 
e falar de urn modo significativo. Seria absurdo dizer que 
na~ fazia parte dos interesses de uma pedra 0 fato de ter sido 
chutada por urn garoto a c(l.minho da escola. Uma pedra nao 
tern interesses, pois nao e capaz de sofrer. Nada que venha-mos 
a fazer-Ihe podera significar uma diferen<;:apara 0 seu bem-estar. 
Por outro lado, urn rata tern, inegavelmente, urn inte-resse 
em nao ser atormentado, pois os ratos sofrerao se vie-rem 
a ser tratados assim. 
Se urn ser sofre, nao po de haver nenhuma justificativa de 
ordem moral para nos recusarmos a levar esse sofrimento em 
considera<;:ao. Seja qual for a natureza do ser, 0 principio de 
igualdade exige que 0 sofrimento seja levado em conta em ter-mos 
de igualdade com 0 sofrimento semelhante - ate onde 
possamos fazer compara<;:6es aproximadas - de qualquer ou-
J!TICA PRATICA 
t~o S~r.Quan?~ urn ser nao for capaz de sofrer, nem de sentir 
~ egn~ ou, felIcldade, n~o haveni nada a ser levado em consi-erac,; 
ao.E por esse motivo ~ue 0 limite de sensibilidade (para 
usarmos 0 termo com 0 sentldo aprapriado, quando nao ri 0- 
~ol~a~e~te ~xat.o,.da ~a~acidade de sofrer ou sentir alegria gou 
. e ICI a e) e o.umco lImIte defensavel da preocupac,;ao com os 
lllt~r:sses alhelOs. Demarcar esse limite atraves de uma carac 
tenstIca, como a inteligencia ou a racionalidade equ' I .- 
ad' emarca- I d ' Iva ena 0 e modo arbitnirio. Por que nao escolher algu-ma 
ooutra ca'r.acteristica, como ' por exemplo , a cor dape Ie?. 
. ~ racistas vlOlam 0 principio de igualdade ao d 
malOr Importa.n~iaaos interesses dos membras de sua rac,;a~:: 
pre que se venfica urn choque entre os seus interesses e os in-teress: 
s dos que pertencem a outra rac,;a.Sintomaticamente 
os racistas de descendencia europeia nao admitiram que ' 
exemplo, a do~ imp?rta tanto quando e sentida por afric~~~~ 
como quando e se~tIda por europeus. Da mesma forma, aque- 
~esque eu chamana de "especistas" atribuem maior peso aos 
lllteresses de membros de sua propria especie quando ha urn 
choque entre os ~~usinteresses e os interesses dos que perten-cern 
a .o~tras ~species. Os especistas humanos nao admitem que 
~ d01~e tao ma quando sentida por porcos ou ratos como quan-o 
sac os seres humanos que a sentem 
. l~i esta, poi~, o. afl~umento para es~ender 0 principio de 
Ig~~ ade aos ammms nao-humanos; mas pode haver algumas 
dU;l.das a respeit.o daquilo a que essa igualdade equivale na 
pratIca. Em partIcular, a ultima frase do paragrafo anterior 
pode levar algumas pessoas a darem a seguinte resposta: "Com 
toda a certeza a dor sentida por ratos nao e tao ma quanto 
a que .:ent.eurn ser humano. Os seres humanos tern muito mais 
consclencl~ do que l?es esta acontecendo, 0 que faz com que 
o seu sofn:nento seJa maior. Para ficarmos apenas em urn 
exemplo, nao se pode comparar 0 sofrimento de uma pessoa 
q~: morre len~amente de cancer Com0 de urn rato de labora-tone 
qu~ esteJa suportanto 0 mesmo destino." 
AceIt~ plenamente 0 ponto de vista segundo 0 qual no 
cas? descnto, a vitima humana do cancer normalmente s~fre 
I~SmSs do qru'e a vitima nao-humana. De modo algum,pore.m o cons Itm urn obstaculo a extensao da igual considerac,;a~ 
de interesses aos nao-humanos. Significa, pelo contrario, que 
precisamos ter cuidado, sempre que compararmos os interes-ses 
de diferentes especies. Em algumas situac,;6es,urn membra 
de uma especie sofreni mais do que urn membra de outra. Neste 
caso, devemos ainda aplicar 0 principio da igual considerac,;ao 
de interesses, mas a consequencia de faze-Io sera, e claro, dar 
prioridade ao aHvio do sofrimento maior. Urn caso mais sim-ples 
pode ajudar a esclarecer essa questao. 
Se der urn tapa com a mao aberta na anca de urn cavalo, 
ele pode sobressaltar-se, mas provavelmente nao sentira gran-de 
dor. Sua pele e grossa 0 suficiente para protege-lo contra 
urn simples tapa. Contudo, se eu der 0 mesmo tapa num bebe, 
ele vai chorar e e quase certo que sinta uma grande dor, pois 
tern a pele mais sensivel. Portanto, e pior dar urn tapa num 
bebe do que num cavalo, desde que os dois tapas sejam dados 
com a mesma forc,;a.Mas deve existir algum tipo de golpe - 
nao sei exatamente qual seria, mas, digamos, urn golpe com 
urn pedac,;ode pau - que fara 0 cavalo sentir tanta dor quan-to 
sentiu a crianc,;aao receber urn simples tapa. E isso 0 que 
quera dizer com "igual quantidade de dor"; e, se achamos er-rado 
infligir tanta dor a urn bebe sem nenhum motivo, entao, 
a menos que sejamos especistas, devemos achar igualmente er-rado 
infligir, sem motivo algum, a mesma quantidade de dor 
a urn cavalo. 
Entre os seres humanos e os animais, existem outras dife-renc,; 
asque levam a outras complicac,;6es.Os adultos normais 
tern aptid6es mentais que, em determinadas circunstancias, 
levam-nos a sofrer mais do que sofreriam os animais nas mes-mas 
circunstancias. Se, por exemplo, decidfssemos realizar ex-periencias 
cientificas extremamente dolorosas ou letais com 
adultos normais, levados a forc,;ados parques publicos com essa 
finalidade, os adultos que entrassem nos parques ficariam com 
medo de ser agarrados. 0 terror resultante seria uma forma 
adicional de sofrimentp, vindo somar-se a dor provocada pela 
experiencia. Quando feitas com animais, as mesmas experien-cias 
provocariam menos sofrimento, visto que eles nao sofre-riam, 
por antecipac,;ao, 0 medo de serem raptados e submeti-dos 
a uma experiencia. Isso nao significa, evidentemente, que 
seria correto fazer a experiencia comanimais, mas apenas que 
existe uma razao - uma razao que nao e especista - para que,
sempre que se va fazer a experiencia, se de preferencia a ani-mais, 
e nao a seres humanos. Considere-se, porem, que esse 
mesmo argumento nos da uma razao para preferirmos usar 
recem-nascidos humanos - ormos, talvez - ou seres hum a-nos 
com graves deficiencias mentais, em vez de adultos, para 
a realiza<;ao da experiencia, uma vez que os recem-nascidos e 
os seres humanos com graves deficiencias mentais tambem nao 
fariam ideia alguma do que lhes iria acontecer. No que diz res-peito 
a esse argumento, animais, recem-nascidos e seres hu-manos 
com graves deficiencias mentais pertencem a mesma ca-tegoria; 
e, se 0 usarmos para justificar as experiencias com ani-mais, 
temos de nos perguntar se estamos preparados para ad-mitir 
que sejam feitas as mesmas experiencias com recem-nascidos 
humanos e adultos com graves deficiencias mentais. 
Se fizermos uma distin<;ao entre os animais e esses seres hu-manos, 
cabera tambem a pergunta: de que modo poderemos 
faze-la, a nao ser com base numa preferencia moralmente in-defensavel 
por membros de nossa propria especie? 
Ha muitas areas nas quais as aptidoes mentais superiores 
de adultos humanos normais fazem uma diferen<;a: previsao, 
memoria mais detalhada, maior conhecimento do que esta 
acontecendo, etc. Essas diferen<;as explicam por que urn ser 
humano que esta morrendo de cancer provavelmente sofre mais 
do que urn rato. A angustia mental e 0 que torna a situa<;ao 
humana tao mais dificil de suportar. Contudo, essas diferen- 
<;asnao sugerem urn maior sofrimento por parte do ser huma-no 
normal. As vezes, os animais podem sofrer mais em decor-rencia 
de sua compreensao mais limitada. Se, por exemplo, es-tamos 
fazendo prisioneiros em tempo de guerra, podemos 
explicar-Ihes que, desde que se submetam a captura, ao inter-rogatorio 
e a prisao, nenhum outro mallhes sera feito, e serao 
libertados assim que cessarem as hostilidades. Se capturarmos 
animais selvagens, porem, nao teremos como explicar-Ihes que 
nao estamos amea<;ando as suas vidas. Urn animal selvagem 
nao e capaz de distinguir uma tentativa de subjugar e prender 
de uma tentativa de matar; ambas iraQ provocar-Ihe 0 mesmo 
terror. 
Pode-se objetar que e impossivelfazer compara<;6es en-tre 
os sofrimentos de especies diferentes e que, por esse moti-vo, 
quando os interesses de animais e seres humanos entram 
IGUALDADE PARA OS ANIMAlS? 
, " d ' ualdade nao oferece orienta<;ao 
em choque, 0 prlllclPlO e 19 ra<;oesdo sofrimento entre 
alguma. E verdade que as comp~ dem ser feitas com exa-membros 
de especi~s diferen~es ~~~ POodeser feita com exati-tidao; 
a esse respelto, tambe~ 0 soirimento de diferentes se-dao 
qualquer compar,a~ao e.n r~ fundamental. Como veremos 
res humanos. A preclsao n:od~vessemos impedir a imposi<;ao 
dentro em pouco, mes~o ~ nas quando os interesses dos 
de sofrimentos a9s alllmalS ~P: dos tanto quanta os animais 
seres hum~nos nao fo~sem ~ e ~ transforma<;6es radicais em 
o sao, senamos for<;a o~ a .aztransforma<;oes que diriam res-nosso 
tratament~ dos an:mals, 'todos de cultivo da terra, 
peito a nossa ahmenta<;a.o, aos .me mu'ltos campos da cien-aoS 
proce d·Imentos exp. enmentals emda ca<;a a captura de alll.- 
cia, a abordagem da VIdasel~ag~~e:soes co~o circos, rodeios 
mais e "ao uso dEe suas pelqeisie, nacsl.a a quan t'1dade total de sofri-e 
ZOOIOglCOS.m co.nse dem~nte reduzida, tao grandemente 
mento provocado. sena gran d a de atitude moral que pro-que 
e dificil imaglll~r o~tra mudai oma total do sofrimento 
vocasse uma redu<;aotao gran e a s 
existente no universo. 
Ate aqui, fiz.mU.itasaf~r:~~o~~s~~~~eb~:~~~~~~~ ~:r~~ 
frimentos aos ~lll.malS,.~~iberada. A aplica<;ao do principio 
mortos. A or~ll~saof?l_ ofrimentos e, teoricamente pelo 
de igualdade a Imp,o~l<;aode ~nder A dor e 0 sofrimento sao 
menos, basta~te facIl de ent te cia ra<;a do sexo ou da espe-coisas 
mas e, llldependentemen 'tados o~ mitigados. 0 maior 
cie do ser que ~ofre, devem serd~vlor uma dor depende de quao 
ou menor sofnmento provo~a ps as dores de mesma intensi-intensa 
ela e e de s_ua.dur~<;aO't~~as sejam elas sentidas por 
dade e dura<;ao saD 19ua.me~ Qua~do refletimos sobre 0 va-seres 
humanos ou Pdoralll~.a~; tao confiantemente assim, que 
lor da vida, nao po, emos. lZl~ente valiosa seja ela humana 
uma vida e u~a vl~a, e 19u.a f mar qu~ a vida· de urn ser 
ou animal. Na~ sena es~ecls~~s~:ento abstrato, de planejar 
consciente de Sl, capaz elp atos de comunica<;ao, etc., se-o 
futu!O, d~ realizar comp.exo~e urn ser que nao possu~ es~~s 
ja malS vaho~a do que.a vl~a esse ponto de vista e JUStlfl-aptidoes. 
(Nao estou dlzen 0 que ao se pode simplesmente 
cavel ou nao, mas, apenas, que n
r~jeita-Io como especista, pois nao esta na base da especie em 
Sl0 pressuposto de que uma vida seja considerada mais valio-sa 
do que outra.) 0 valor da vida e urn problema etico de no-t? 
ria dificuldade, e so podemos chegar a uma conclusao ra-clOnal 
sobre 0 valor comparado das vidas humana e animal 
depoi.s de term os discutido 0 valor da vida em termos gerais. 
E~s.ee urn tema que exige urn capitulo it parte. Enquanto isso, 
ha lmportantes conclus6es a serem extraidas do fato de se en-tender 
para aIem de nossa especie 0 principio da igual consi-derac; 
ao de interesses, independentemente de nossas conclus6es 
sobre 0 valor da vida. 
Para a maior parte das pessoas que vivem nas sociedades 
m~der.nas e urbanizadas, a principal forma de contato com os 
a~lmalS acontece it hora das refeic;6es. 0 uso de animais como 
ahmento talvez seja a mais antiga e a mais difundida forma 
de uso animal. Ha tambem urn sentido em que se pode ve-Ia 
como a forma mais basic a de uso animal, a pedra angular so-bre 
a qual repousa a crenc;a de que os animais existem para 0 
nosso prazer e a nossa conveniencia. 
Se os animais sao importantes POI'si mesmos, 0 uso ali-mental' 
que deles fazemos torna-se questionavel _ sobretudo 
qua~do. a carne ~nimal e urn luxo, e nao uma necessidade. Os 
esqUlm~S, que Vlvemnum ambiente que os coloca diante das 
alternatlVas de matar os animais para come-Ios ou morrer de 
fome, podem ser justificados quando afirmam que 0 seu inte-resse 
em sobreviver sobrep6e-se ao dos animais que matam. 
P?uCOS, dentre nos, poderiam defender nesses termos a sua 
ahment~c;ao. Os cidadaos das sociedades industrializadas po-d~ 
m facI1?1enteconseguir uma alimentac;ao adequada sem que 
seJa preClSOrecorrer it carne animal. 0 peso avassalador do 
t~stemunho medico indica que a carne animal nao e necessa-r: 
a par.a a boa sau~e ou a longevidade. Alem disso, a produ-c; 
ao anll~al nas socledades industrializadas nao constitui uma 
forma eflCazde produc;ao de alimentos, visto que a maior parte 
IGUALDADE PARA OS ANIMAlS? 
dos animais consumidos foi engordada com graos e outros al~- 
mentos que poderiamos tel' comido diretamente. Quando ah-mentamos 
esses animais com graos, somente cerca de dez por 
cento do valor nutritivo permanecem em forma de ~ar~e p~ra 
o consumo humano. Portanto, com excec;aodos ammals cna-dos 
inteiramente em terras improprias para 0 cultivo de leg~- 
mes, frutas ou graos, nao se pode afirmar que sejam consuml-dos 
para melhorar a nossa saude ou para aume~t~r a noss.a 
provisao de alimentos. A sua carne e urn luxo, e so e consuml-da 
porque as pessoas apreciam-Ihe 0 saboL . 
Ao refletirmos sobre a etica do uso de carne ammal para 
a alimentac;ao humana nas sociedades indu~trializadas, esta-mos 
examinando uma situac;ao na qual urn mteresse humano 
relativamente menor deve ser confrontado com as vidas e ? 
bem-estar dos animais envolvidos. 0 principio da igu~l conSI-derac; 
ao de interesses nao permite que os interesses maJores se-jam 
sacrificados em func;ao dos in~ere~sesmenores. . 
o arrazoado contra 0 uso de ammalS para a nossa ahmen-tac; 
ao fica mais contundente nos casos em que os animais sao 
submetidos a vidas miseniveis para que a sua carne se torne 
acessivel aos seres humanos ao mais baixo custo possivel. As , 
formas modernas de criac;aointensiva aplicam a ciencia e a te~- 
nologia de acordo com 0 ponto de vista s~gundo 0 qual os am-mais 
sao objetos a serem usados por nos. Para que a carne 
chegue as mesas das pessoas a urn prec;o acessivel, a noss.a so-ciedade 
tolera metodos de produc;ao de carne que confmam 
animais sensiveis em condic;6es improprias e espac;os exiguos 
durante toda a durac;ao de suas vidas. Os animais sao tratados 
como maquinas que transformam forragem em carne, e tod~ 
inovac;ao que resulte numa maior "tax~ de conversao" ~era 
muito provavelmente adotada. Como aflfmou uma autonda-de 
no assunto, "a crueldade so e admitida q~ando ~essam os 
lucros". Para evitar 0 especismo, devemos pOI'urn flm a essas 
prMicas. Nosso habito e 0 apoio de que necessitam os "faze~- 
deiros industriais". A decisao de deixar de dar-Ihes esse apolO 
pode ser dificil, mas e menos dificil do que ter~a sido, p~ra urn 
sulista branco, opor-se as tradic;6es de sua socle~a~e e h~ertar 
os seus escravos; se nao mudarmos os nossos habltos ahmen-tares 
como poderemos censurar os proprietarios de escravos 
que ~e recusavam a mudar 0 seu modo de vida?
· Ess~s argu.mentos aplicam-se aos animais que tern sido 
cnados mdustnalmente - 0 que significa que nao devemos 
comer frango, porco ou vitela, a menos que saibamos que a 
~arne q.u~estamos comendo nao foi produzida pelos metodos 
mdustnms. a mesmo se aplica a carne bovina proveniente de 
gado comprimido em instalac;oesde confinamento onde se cos-tuma 
eng~rdar os ani.mais (como e 0 caso da maior parte da 
carne .bovma consumida nos Estados Unidos). as ovos virao 
d: galmhas presas em pequenas gaiolas, tao pequenas que elas 
nao cor:seguem ~e.m mesmo esticar as asas, a menos que os 
ovos seJam especificamente vendidos como "de galinhas cria-das 
em ~i~~rdade" (ou a menos que se viva num pais relativa- 
~ente cI~lhzad~ como a Suic;a, onde nao se permite que as ga-lmhas 
seJam cnadas em gaiolas). 
E~ses argumentos nao nos forc;am a adotar, na integra, 
urr:a ahmentac;ao vegetariana, ja que alguns animais - os car-n~ 
lros, por exemplo, e, em alguns paises, 0 gado - ainda sao 
cnados em pastagens naturais. Mas isso po de mudar. a siste-ma, 
norte-americano de engordar 0 gado em confinamento ja 
esta se espalhando por outros paises. Enquanto isso a vida 
dos anim.ais ~ria~os em liberdade e sem duvida melho; do que 
~ dos ammalS cnados em "fazendas industriais". Ainda as-s~ 
m,pe:mane.ce a duvida sobre se e compativel com a igual con- 
~Iderac;aod~ mteresses usa-los como alimento. Urn problema, 
e claro, esta em que 0 seu uso como alimento implica ter de 
mata-los - mas esse e urn problema que, como afirmei, sera 
retomad~ quand~ tiver~os discutido 0 valor da vida no capi-tulo 
segumte. AIem de tirar as suas vidas, muitas outras coi-sas 
s~o feitas aos animais para que eles cheguem a nossa mesa 
a bmxo prec;o. A castrac;ao, a separac;ao de maes e filhotes 
a separac;ao de rebanhos, as marcas com ferro em brasa ~ 
transporte e, finalmente, os momentos do abate - coisas q~e, 
provavelmente, envolvem sacrificio e nao levam em conside-ra7~ 
0 os interesses d.os~nimais. Esses procedimentos talvez per-mltlsse~ 
que os ammms fossem criados em pequena escala e 
sem sofnmento, mas nao parece economico ou prcitico faze-lo 
na escal~ ex~gida pela alimentac;ao dos grandes contingentes 
pop~la~lOnms urbanos. De qualquer modo, 0 mais import an-te. 
nao e saber se a carne animalpoderia ser produzida sem so-fnmento, 
mas se a carne que estamos pensando em comprar 
joi produzida sem sofrimento. A menos ~ue po_ssam~sestar 
certos de que foi, 0 principio da igual considerac;ao de mteres-ses 
implica que foi errado sacrificar importantes interesses do 
animal para a satisfac;ao de interesses menores nossos; por con-seguinte, 
deveriamos boicotar 0 resultado ~in~l,d~sseprocesso. 
Para os que vivem em cidades onde e dlflCIl saber como 
os animais que poderiamos comer viveram e morreram, e.sta 
conclusao praticamente implica a opc;ao por urn modo de vIda 
vegetariano. Vou examinar algumas objec;oesque se podem le-vantar 
contra este fato na ultima parte deste capitulo. ~ 
Experiencias com animais 
Talvez 0 campo no qual 0 especismo possa ser mais cla-ramente 
observado seja 0 da utilizac;ao de animais em expe-riencias. 
Aqui, a questao se coloca em toda a sua pleni~ud~, 
pois os que fazem tais experiencias quase sempre tent am JUStl-ficar 
a sua realizac;ao com animais com a alegac;ao de que as 
experiencias nos levam a descobertas sobre os seres h~man~s; 
se assim for, essas pessoas devem concordar com a afirmac;ao 
de que os seres humanos e os animais sao semelhantes em as-pectos 
cruciais. Por exemplo: se 0 fato de forc;ar urn rat~ .a 
escolher entre morrer de fome e atravessar uma grade eletnfl-cada 
para conseguir comida nos diz alguma coisa ~~bre as rea-c; 
oesdos seres humanos ao estresse, devemos admitir que 0 ra-to 
sente estresse quando colocado nesse tipo de situac;ao. . 
As pessoas as vezes pensam que as experiencias ~o~ ~m-mais 
atendem a objetivos medicos vitais e podem ser JustlfIca-das 
com base no fato de que aliviam mais sofrimento. do que 
provocam. Essa confortavel crenc;anao pas~~de urn enga_no.as 
laborat6rios testam novos xampus e cosmeticos que estao pre-tendendo 
comercializar pingando soluc;oesconcentradas desses 
produtos nos olhos dos coelhos, num teste con~ecido como."teste 
de Draize" . (As pressoes exercidas pelos mOVlmentosde hberta-c; 
aodos animais fizeram com que varias industrias aban~on~s-sem 
essa prcitica. Urn teste alternativo, que nao usa ammms, 
foi descoberto ha pouco. Mesmo assim, ainda sao muitas as 
indus trias e dentre elas as maiores do ramo, que continuam 
a fazer 0 teste de Draize.) as aditivos alimenticios, inclusive
corantes e conservantes artificiais, sao testados com 0 que se 
conhece como LDso - urn teste que tern por finalidade encon-t~ 
ar ~ "dose letal", ou 0 nivel de consumo que levani a morte 
cmquenta por cento de uma amostra de animais. Ao longo do 
proces.so, quase todos os animais ficam doentes, ate que al-guns 
fmalmente morrem, e outros se restabelecem. Esses tes-tes 
nao sao necessarios para impedir 0 sofrimento humano. 
mesmo que nao existisse outra alternativa ao uso de animai~ 
para test~r. a seguranC;ados produtos, ja dispomos de urn mi-mero 
~ufIcIente de xampus e corantes para alimentos. Nao ha 
necess~dadealguma de desenvolver outros, que podem mostrar-se 
pengosos. 
Em muitos paises, as forc;as armadas fazem experiencias 
atrozes com animais, que raramente chegam ao conhecimento 
do publico. Para ficarmos apenas num exemplo: no Instituto 
de Radiobiologia das Forc;asArmadas dos Estados Unidos em 
Be~hesda, Maryland, os macacas do genero Rhesus tern ~ido 
tremados para correr dentro de uma grande roda. Se reduzi-rem 
muito a velocidade, aroda faz 0 mesmo, e os macacos 
levam urn choque eletrico. Quando os macacas ja foram trei-nados 
para correr por longos periodos, recebem uma dose le-tal 
de radiac;~o. E entao, sentindo-se mal e vomitando, sao for-c; 
a~osa c0.ntmuar correndo ate cair. A suposta finalidade dis- 
S? e obter mformac;6es sobre a capacidade dos soldados de con-tmuarem 
a lutar depois de urn ataque nuclear. 
~o m~smo modo, nem todas as experiencias realizadas pe-las 
umve~s~dades~odem ser defendidas com base na alegac;ao 
~e que alIvI~m ~ms sofrimentos do que provocam. Tres cien-tIsta~ 
da Un}versId~de de Princeton deixaram 256 ratinhos sem 
camIda ou agua ate r.n0rrerem. Concluiram que, em condic;6es 
de sede e fome fatms, os ratinhos sao muito mais ativos do 
que ratos adultos normais que recebem agua e comida. Numa 
famosa serie de experiencias feitas durante mais de quinze anos, 
~. F. H~rlow,.do ~entro de Pesquisas com Primatas de Ma-dIson, 
WISCO?Sm, cnou macacos em condic;6esde privac;aoma-terna 
e total Isolamento. Descobriu que, assim, podia reduzir 
os macacos a urn estado em que, ao serem colocados entre ma-cacas 
nor~ais, ficavam agachados num canto, em condic;6es 
de depressao e medo continuos. Harlow tambem produziu en-tre 
as macacas, maes tao neur6ticas que esmagavam 0 r~sto 
de seus filhos no chao, e depois os esfregavam para a frente 
e para tras. Harlow ja morreu, mas, em outras universidades 
dos Estados Unidos, alguns de seus ex-alunos continuam a fa-zer 
variac;6es de suas experiencias. 
Nesses casos, e em muitos outros parecidos, os beneficios 
para os seres humanos sao inexistentes ou muito incertos; ao 
mesmo tempo, porem, as perdas para membros de outras es-pecies 
sao concretas e inequivocas. Consequentemente, as ex-periencias 
indicam uma falha na atribuic;ao de igual conside-rac; 
ao aos interesses de todos os seres, a despeito da especie 
a que pertenc;am. 
No passado, 0 debate sobre as experiencias com animais 
quase sempre negligenciou esse ponto, pois era colocado em 
termos absolutos: 0 adversario da experiencia estaria prepara-do 
para deixar que milhares morressem de uma doenc;a terri-vel, 
cuja cura poderia ser encontrada mediante experiencias em 
urn animal? Trata-se de uma questao meramente hipotetica, 
uma vez que as experiencias nao tern resultados tao espeta-culares 
assim; contudo, contanto que seja clara sua natureza 
hipotetica, acredito que a pergunta deva ser respondida afir-mativamente 
- em outras palavras, se urn animal, ou ate mes-mo 
uma duzia deles, devesse ser submetido a experiencias pa-ra 
salvar milhares de pessoas, eu acharia correto e de acordo 
com a igual considerac;ao de interesses que assim fosse feito. 
Pelo menos, esta e a resposta que deve ser dada por urn utili-tarista. 
as que acreditam em direitos absolutos poderiam afir-mar 
que e sempre urn erro sacrificar urn ser, seja ele humano 
ou animal, tendo em vista 0 beneficio de outro. Neste caso, 
a experiencia nao deve ser realizada, sejam quais forem as con-sequencias. 
Diante da pergunta hipotetica a respeito de salvar milha-res 
de pessoas atraves de uma unica experiencia com urn ani-mal, 
os adversarios do especismo podem responder com outra 
pergunta hipotetica: os que fazem as experiencias estariam pre-parados 
para faze-Ias com seres humanos 6rfaos com les6es 
cerebrais graves e irreversiveis, se esta fosse a unica maneira 
de salvar milhares de outras pessoas? (Digo "6rfiios" para evi-tar 
a complicac;ao dos sentimentos dos pais humanos.) Se os 
cientistas nao estiverem preparados para usar 6rfiios humanos 
com les6es cerebrais graves e irreversiveis, sua aceitac;aodo usa
de animais para os mesmos fins parece ser discriminatoria uni-camente 
,com base na especie, uma vez que macacos, dies, ga-tos: 
e ate ~esmo camundongos e ratos sao mais inteligentes, 
malS consclente~ do que se passa com eles, mais sensiveis a dor, 
etc" do que mUltos seres humanos com graves lesoes cerebrais 
que mal sobrevivem em enfermarias de hospitais e outras ins~ 
tituil;oes. Da parte de tais seres humanos, parece nao existir 
nenhu~a c.aracteristicamoralmente relevante que esteja ausente 
nos ammalS. Portanto, os cientistas revelam preconceitos em 
favor de sua propria especie sempre que fazem experiencias 
c?m ~nimais para finalidades que, segundo pensam, nao se-nam 
19ualmente justificadas se fossem feitas com seres hum a-nos 
dotados de urn igual (ou menor) nivel de sensibilidade 
consciencia, etc. Se esse preconceito fosse eliminado 0 lllime~ 
ro de experiencias realizadas com animais seria sensivelmente 
reduzido. 
Concentrei-me no uso de animais enquanto alimento e ob-j~ 
to de pesquisas, uma vez que se trata de exemplos de espe- 
Cismo sistematico e praticado em grande escala. Nao consti-tue~, 
sem~uvid~, as unicas areas nas quais 0 principio da igual 
conslderal;ao de mteresses, levado alem da especie humana tern 
i~plical;oes praticas. Ha muitas outras areas que colocam ~ues-toes 
semelhantes, inclusive 0 comercio de peles, a cal;a em to-d, 
as.as suas diversas modalidades, os circos, os rodeios, os zoo- 
10giCOSe os negocios que envolvem animais de estimal;ao. Da-do 
que as questoes filos6ficas colocadas por esses problemas 
nao sao muito diferentes dascolocadas pelo usa de animais 
nas esfe~as da alimental;ao e da pesquisa, deixarei que 0 leitor 
lhes aphque os principios eticos apropriados. 
Em 1973, apresentei pela primeira vez os pontos de vista 
esboyados neste capitulo. Naquela epoca, nao existia nenhum 
mOVlmentode libertal;ao ou de direitos dos animais. Desde en-tao, 
surgiu urn movimento, e alguns dos mais graves abusos 
cometidos contra os animais, como 0 teste de Draize e 0 LDso, 
tornaram-se menos comuns - ainda que nao tenham sido to-talmente 
eliminados. 0 comercio de peles vem sendo muito ata-cado 
e, em conseqiiencia, as vendas de peles cafram drastic a-mente 
em pafses como a Inglaterra, os Pafses Baixos, a Aus-tralia 
e os Estados Unidos. Alguns pafses tambem estao co-mel; 
ando a eliminar por etapas as formas de confinamento mais 
extremas das fazendas industriais. Como ja foi aqui mencio-nado, 
a Suil;a proibiu 0 sistema de aprisionar em gaiolas as 
galinhas poedeiras. A Inglaterra tornou ilegal a crial;ao de be-zerros 
em estabulos individuais, e esta eliminando por etapas 
os chiqueiros individuais. Como em outros campos das refor-mas 
sociais, a Suecia tambem esta na lideranl;a no que diz res-peito 
a essas inoval;oes: em 1988, 0 Parlamento sueco apro- 
YOUuma lei que, ao longo de urn periodo de dez anos, levara 
a eliminal;ao de todos os sistemas que, nas fazendas industriais, 
confinam os animais por muito tempo e nao permitem que vi-yam 
conforme 0 seu comportamento natural. 
A despeito dessa crescente aceital;ao de muitos aspectos 
da questao da libertal;ao dos animais e do avanl;O lento, mas 
tangivel, que ja se fez em nome de seu bem-estar, inumeras 
objel;oes tern sido levantadas, algumas delas mais simple.se pre-visfveis 
outras mais sutis e inesperadas. Nesta parte fmal do 
capftul;, tentarei responder as mais importantes dessas obje-l; 
oes, comel;ando pelas mais simples. 
Nao podemos nunca sentir a dor de urn outro ser, seja 
ele humano ou nao. Quando vejo minha filha cair e esfolar 
o joelho, sei que ela sente dor pela maneira como se comporta 
- chora, diz-me que 0 joelho esta doendo, esfrega 0 lugar ma-chucado, 
etc. Sei que eu mesmo me comporto de urn jeito pa-recido 
- urn pouco mais discreto - quando sinto dor, e en-tao 
admito que minha filha esta sentindo alguma coisa que se 
assemelha ao que sinto quando esfolo 0 meu joelho. 
o fundamento de minha convicl;ao de que os animais po-dem 
sentir dor e semelhante ao fundamento de minha convic-
<;aode que a minha filha pode sentir dor. Quando sentem al-guma 
dor, os animais se comportam de urn jeito muito pareci-do 
com 0 dos humanos, e 0 seu comportamento e suficiente 
para justificar a convic<;aode que eles sentem dOL E verdade 
que, com exce<;aodos macacos que aprenderam a comunicar-se 
atraves de uma linguagem de sinais, eles nao tern como di-zer 
que estao sentindo alguma dor - mas, quando era muito 
nova, minha filha tambem nao falava. No entanto, ela encon-trava 
outras formas de tornar aparentes os seus estados inte-riores, 
com.0 que demo~strav~ que podemos ter certeza de que 
urn determmado ser esta sentmdo dor, ainda que ele nao con-te 
com 0 recurso da linguagem. 
Em apoio a nossa inferencia do comportamento animal, po-demos 
chamar a aten<;aopara 0 fato de que 0 sistema nervoso 
de todos os vertebrados, sobretudo 0 de passaros e mamiferos 
e basicamente parecido. As partes do sistema nervoso human~ 
que dizem respeito a sensa<;aode dor sao relativamente antigas 
em termos de evolu<;ao.Ao contrario do cortex cerebral, que so 
se desenvolveu plenamente depois que nossos ancestrais se dife-renciaram 
dos outros mamiferos, 0 sistema nervoso basico evo-luiu 
em ancestrais mais distantes, comuns a nos e nos outros ani-mais 
"superiores". Esta semelhan<;aanat6mica torna provavel 
que a, capacidade de sentir dos animais seja similar a nossa. 
E significat.ivoque nenhu.m dos motivos em que nos apoia-mos 
para acredItar que os ammais sentem dor se apliquem as 
~lantas. Nao temos como observar urn comportamento suges-tIVOde 
dor - as sensacionais afirma<;oes em contrario nao se 
most.raram bem-fundamentadas -, e as plantas nao possuem 
urn sIstema nervoso centralmente organizado, como 0 nosso. 
as animais comem uns aos outros; por que, 
entiio, niio dever[amos come-los? 
Esta obje<;aopoderia ser chamada de "Obje<;ao Benjamin 
Fran~lin". Em sua autobiografia, Franklin conta que foi ve-getanano 
durante algum tempo, mas que a sua abstinencia de 
carne animal chegou ao fim quando observava alguns amigos 
preparando-se pa.ra frit.ar urn peixe que tinham acabado de pes- 
C~LQuando 0 peIxe fO!aberto, descobriu-se que tinha urn pei-xmho 
no seu est6mago. "Bern", disse Franklin de si para si, 
"ja que voces se comem entre si, nao vejo por que deixaria-mos 
de come-Ios." Desde entao, voltou a comer carne. 
Franklin foi, pelo menos, honesto. Ao contar essa histo-ria, 
confessou que so se deixou convencer da validade da ob-je<; 
aodepois que 0 peixe ja estava na frigideira, com urn "cheiro 
delicioso". Observou, tambem, que uma das vantagens de ser 
uma "criatura racional" esta no fato de se poder encontrar 
uma razao para tudo que se quer fazer. As respostas que po-dem 
ser dadas a sua obje<;ao sao tao obvias que a sua aceita- 
<;ao,da parte de Franklin, constitui urn testemunho mais elo-qiiente 
de seu gosto por peixe frito do que de sua capacidade 
de raciocinio. Em primeiro lugar, a maior parte dos animais 
que mata em busca de alimento nao conseguiria sobreviver se 
nao 0 fizesse, enquanto nos nao temos necessidade de comer 
carne animal. Depois, e estranho que os seres humanos, que 
normalmente encaram 0 comportamento animal como "sel-vagem", 
venham a usar, sempre que lhes convem, urn argu-mento 
do qual se po de inferir que devemos buscar orienta<;ao 
moral nos animais. 0 ponto fundamental, porem, e 0 de que] 
os animais nao sao capazes de refletir sobre as alternativas que 
se apresentam a eles, nem de ponderar sobre a etica de sua ali-menta<; 
ao. Portanto, e impossivel considerar os animais res-ponsaveis 
pelo que fazem, ou concluir que, pelo fato de mata-rem 
"merecem" ser tratados da mesma maneira. Por outro 
lad;, os que estao lendo estas palavras devem refletir sobre 
a justificabilidade de seus habitos alimentares. Nao se po de 
fugir a responsabilidade atraves da imita<;ao de seres que nao 
sao capazes de fazer essa op<;ao. 
As vezes, as pessoas chamam a aten<;aopara 0 fato de que 
os animais se comem entre si para introduzir urn ponto ligei-ramente 
diferente. Esse fato, pensam eles, sugere nao que os· 
animais mere<;amser comidos, mas, pelo contrario, que existe 
uma lei natural segundo a qual os mais fortes devoram os mais 
fracos, uma especie de "sobrevivencia dos mais aptos" dar-winiana 
atraves da qual, ao comermos outros animais, esta-mos 
simplesmente fazendo a nossa parte. 
Essa interpreta<;ao da obje<;aocomete dois erros basicos: 
urn deles, urn erro de fato, 0 outro urn erro de raciocinio. 0 
erro factual esta no pressuposto de que 0 nosso consumo de 
carne animal faz parte do processo evolutivo natural. Isto po-
liTICA PRATICA 
d~ria ser verdadeiro no caso de algumas culturas primitivas que 
alllda ca<;ampara obter alimento, mas nao tern nada a ver com 
a produ<;ao em massa de animais nas fazendas industriais. 
Suponh~mos; porem, que ca<;assemospara conseguir ali-mento 
e que IStOflzesse parte de algum processo evolutivo na-tural. 
Ainda haveria urn erro de raciocinio no pressupor que 
por ser natural, esse processo e correto. E sem duvida "na~ 
tura 1" que as mulheres gerem uma crian<;aa" cada ano ou dois 
da pUb~rdade ~ menopausa, mas isto nao significa que sej~ 
errado. lllterfenr nesse processo. Precisamos conhecer as leis 
n.aturaIs que nos afetam para podermos avaliar as conseqiien- 
Clas do que fazemos; mas nao temos de admitir que a forma 
natural de fazer alguma coisa e incapaz de ser aperfei<;oada. 
o fato de existir urn abismo insondavel entre os seres hu-manos 
~ <:sa?imais.n~? foi questionado ao longo de quase to-da. 
a eXlst;ncla da clvlhza<;aoocidental. A base dessa hipotese 
fOl.destrUldapela descoberta darwiniana de nossas origens ani-malS 
e p~la conseqiiente perda de credibilidade da historia de 
nos~a Cna<;ao Divina, feitos a imagem de Deus com uma- al-ma 
lmo.rtal. Alguns acharam dificil aceitar que as diferen<;as 
entre nos e os outros animais sejam muito mais diferen<;as de 
~rau d? ~~e.de especie. Procuraram maneiras de tra<;ar uma 
Illlha dlvlsona ent:e ?S ser:s humanos e os animais. Ate a pre-sente 
data, esses hmltes tem-se mostrado de vida curta. Por 
exemplo: costumava-se dizer que so os humanos usavam fer-ramentas, 
ate que se descobriu que 0 pica-pau das ilhas Gala-pagos 
usava urn espinho de cacto para arrancar insetos de bu-ra~ 
os ~as arvores. Depois sugeriu-se que, mesmo que outros 
ammaIS usassem ferramentas, os humanos eram os unicos se-re~ 
a fazer.em as suas. Jane Goodall, porem, descobriu que os 
chlmpanzes das ~orestas da Tanzania mascavam folhas para 
fazer uma espon]a que Ihes permitia absorver agua, e arranca-yam 
as fol~as dos galhos para fazer ferramentas destinadas 
a apanhar lllsetos. 0 usa da linguagem era outra linha limi-trofe 
- mas a~ora temos chimpanzes, gorilas e orangotangos 
aprendendo a llllguagem de sinais dos surdos, e ha indicios de 
que as baleias e os golfinhos podem ter uma complex a lingua-gem 
propria. 
Se essas tentativas de tra<;ar uma linha divisoria entre os 
seres humanos e os animais se tivessem ajustado aos fatos da 
situa<;ao, ainda assim nao seriam portadoras de nenhum peso 
moral. Como afirmou Bentham, 0 fato de urn ser nao usar al- i gum tipo de li?-guagem,nem faz~r suas fer:amentas dificilmente 
poderia ser VlStOcomo urn motlvo para 19norarmos 0 seu so-frimento. 
Alguns filosofos tern afirmado que existe uma dife-ren<; 
amais profunda. Segundo eles, os animais nao sao capa-zes 
de pensar ou raciocinar e, em decorrencia disso, nao tern 
uma concep<;ao ou uma consciencia de si mesmos. Vivem 0 
aqui e 0 agora, e nao se veem como entidades distintas, com 
urn passado e urn futuro. Tambem nao tern autonomia, a ca-pacidade 
de escolher 0 modo como preferem viver as suas vi-das. 
Ja se sugeriu que os seres aut6nomos e autoconscientes 
sao, de alguma forma, mais valiosos e moralmente importan-tes 
do que os que so vivem de momenta a momento, sem ca-pacidade 
de perceberem-se como seres distintos que tern urn 
passado e urn futuro. Segundo esta concep<;ao, os interesses 
dos seres aut6nomos e conscientes devem, normalmente, ter 
prioridade sobre os interesses de outros seres. 
Nao YOUdiscutir, agora, se alguns animais sao conscien-tes 
e aut6nomos. 0 motivo dessa omissao esta em que nao creio 
que, no presente contexto, muita coisa dependa dessa ques-tao. 
No momento, estamos apenas examinando a aplica<;aodo 
principio da igual considera<;ao de interesses. No capitulo se-guinte, 
quando discutirmos as questoes relativas ao valor da 
vida, veremos que existem raz6es para sustentar que a cons-ciencia 
de si e crucial nos debates sobre 0 direito, ou nao, que 
urn ser tern a vida, e entao examinaremos os indicios desse ti-po 
de consciencia nos animais. Enquanto isso, a questao mais 
importante e: 0 fato de urn ser ter consciencia de si habilita-o ' 
a algum tipo de prioridade de considera<;ao? 
A alega<;aode que os seres autoconscientes tern esse tipo 
de prioridade so e compatlvel com 0 principio da igual consi-dera<; 
ao de interesses se nao for alem da alega<;aode que cer-tas 
coisas que acontecem com os seres autoconscientes podem 
ser contrarias aos seus interesses, enquanto acontecimentos se-melhantes 
nao seriam contrarios aos interesses dos seres que
liTICA PRATICA 
nilo s~o aut.oconscientes. Isso porque a criatura autoconscien- 
~~ete~la malOr c0.nsciencia do que esta acontecendo, poderia 
msenr 0 ~conteclmento no contexto geral de urn periodo de 
temp~ mars l~~go,.teria desejos diferentes, etc. Mas esta e uma 
quest~o qu.eJa del por certa ao iniciar este capitulo e, desde 
que nao seJa levada a extremos absurdos - como insistir em 
que, se sou autoconsciente e uma vitela nao e, 0 fato de privar-me 
de s~a carne traz mais sofrimentos do que privar a vitela 
~e sua hberdade q: andar, esticar-se e comer grama -, nao 
: negada pelas cntlcas que fiz as experiencias com animais e 
as fazendas industriais. 
Seria ben: difere_ntese se alegasse que, mesmo quando urn 
ser aut?COnSclentenao sofresse mais do que urn ser meramen-te 
senclente, 0 sofrimento do ser autoconsciente e mais impor-tant~ 
pelo fato .de serem esses os mais valiosos tipos de ser. 
Isso l~trodu~ aflrm~r;oes de valor nao-utilitarias - afirmar;oes 
que na~ denv~m, slmplesmente, do fato de se adotar urn pon-to 
de vIsta umversal, do modo como foi descrito na parte fi-nal 
do C~pitulo 1. Vma vez que 0 argumento utilitarista ali 
de~envolvldo era. confessamente sujeito a provas, nao posso 
usa-Io para exclmr todos os valores nilo-utilitaristas. Nao obs-t~ 
nte, temos 0 direito de perguntar por que os seres autocons- 
Clentesdevem ser cons.iderados mais valiosos e, em particular, 
por que 0 suposto malOr valor de urn ser autoconsciente deve 
resultar er.ndar preferencia aos interesses menores de urn ser 
autoconsclente em detrimento dos interesses maiores de urn ser 
me:ame:rte se~cien~e,mesmo quando a autoconsciencia do pri-melro 
nao esta ~mJogo. Este ultimo ponto e importante, pois, 
no momento, nao ~stamos examinando casos em que as vidas 
dos seres autocons~lentes estilo em risco, mas sim casos em que 
os seres ~utoconscl~ntes continuarao vivos e com as suas fa-culdad. 
e l~ta.ctas, seJa qual for a nossa decisao. Nesses casos, 
se a eXlstencrada autoconsciencia nao afeta a natureza dos in-te: 
esses _emcotejo, nao fica claro por que deveriamos forr;ar 
a l~clusao da aut~consciencia na discussao, nem por que de-v~ 
namos forr;ar a mclusao de especie, rar;a ou sexo em discus-soes 
semelhantes. Interesses sao interesses e devem ser consi-derados 
~or i~ual- sejam eles os interesses de seres humanos 
ou de ammalS, com ou sem consciencia de si. 
Ha outra resposta possivel a afirmar;ao de que a autocons-ciencia, 
a autonomia, ou qualquer caracteristica semelhante, po-dem 
servir para distinguir os seres humanos dos animais: lem-bremo- 
nos de que existem seres humanos com deficiencias men-tais 
que podemos considerar menos autoconscientes ou autono-mos 
do que muitos animais. Se usarmos essas caracteristicas pa-ra 
colocar urn abismo entre os seres humanos e outros animais, 
estaremos colocando esses seres humanos menos capazes do ou-tro 
lado do abismo; e, se 0 abismo for usado para marcar uma 
diferenr;a de status moral, entao esses seres humanos teriam 0 
status moral de animais, e nilo de seres humanos. 
Esta resposta e forr;ada, pois a maior parte de nos acha 
horrivel a ideia de usar seres humanos com deficiencias men-tais 
em experiencias dolorosas, ou de engorda-Ios para fins gas-tronomicos. 
Alguns filosofos, porem, tern afirmado que essas 
conseqiiencias nilo decorreriam realmente do usa de uma ca-racteristica 
como a autoconsciencia, ou a autonomia, para dis-tinguir 
os humanos de outros animais. Vou examinar tres des-sas 
propostas. 
A primeira sugestilo e que os seres humanos com graves 
deficiencias mentais, que nao possuem as aptidoes que distin-guem 
0 ser humano normal dos outros animais, devem, nao 
obstante, ser tratados como se as possuissem, uma vez que per-tencem 
a uma especie cujos membros normalmente as possuem. 
Em outras palavras, a sugestao e que tratemos os individuos 
nilo de acordo com as suas verdadeiras qualidades, mas de acor-do 
com as qualidades que sao normais na sua especie. 
E interessante que essa sugestao seja feita para defender 
o argumento de que os membros de nossa especie devem ser 
mais bem-tratados que os de outras especies, ao passe que se-ria 
firmemente rejeitada caso a usassemos para justificar urn 
tratamento dos membros de nossa rar;a ou sexo melhor que 
o dispensado aos membros de outra rar;a ou sexo. No capitulo 
anterior, ao discutir 0 impacto de possiveis diferenr;as de Q.I. 
entre membros de grupOS etnicos diferentes, fiz a afirmar;ao 
obvia de que, seja qual for a diferenr;a entre as pontuar;oes me-dias 
de grupos diferentes, alguns membros do grupo com a pon-tuar; 
ilo media mais baixa vao sair-se melhor do que alguns 
membros de grupos com a pontuar;ao media mais alta, e de 
que, portanto, devemos tratar as pessoas como individuos, e
liTICA FRATICA 
nao de aco~do com 0 ~ivel medio de seu grupo etnico, quais-q~ 
er que seJam as explrca<;oesdessa media. Se aceitamos isso 
nao podemos, coerentemente, aceitar a sugestao de que, ao li~ 
darmos com seres humanos com graves deficiencias mentais 
dev~~os as~egurar-Ihes 0 status ou os direitos normais de su~ 
es~ecle. POlSqual e 0 significado do fato de que, desta vez, 
a lmha ~ev: ser tra<;ada.ao.r~dor da especie, e nao da ra<;aou 
do sex? ~~o podemos mSlstIr em que os seres sejam tratados 
como mdlvlduos no primeiro caso, e como membros de urn 
~rup? no outro. A condi<;ao de membro de uma especie nao 
e malS relevante, nessas circunsUincias, do que a condi<;ao de 
pertencer a uma ra<;a ou a urn sexo. 
Vma segunda sugestao e que, muito embora os seres hu-m_ 
anosco~ gra;res deficiencias mentais possam nao ter apti-does 
supenores as dos outros animais, ainda assim eles saDse-r~ 
s.human<:s e, enquanto tais, temos com eles liga<;oesespe-clms 
que ~ao temos com os outros animais. Como escreveu 
urn resenhlsta de Animal Liberation: "A parcialidade para com 
a nossa p:opria espec~ee, dentro dela, para com grupos bem 
menores e, como 0 umverso, uma coisa que seria melhor acei-tarm, 
o~. (... ~0 perig?~: uma tentativa de eliminar as afei<;oes 
parCla!S_esta na posslbllrdade de se destruir a origem de todas 
as afewoes." 
. J?sse ~rgumento liga fortemente a moralidade as nossas 
afe~<;oes.E claro que algumas pessoas podem manter, com 0 
n:ms consumad.o e irr~versivel dos doentes mentais, urn rela-clOnamen~ 
omms estre,lto do que manteriam com qualquer ani- 
~al, e sena abs~rdo dlzer-Ihes que devem abrir mao desse sen-tIme~ 
to. Elas slmplesmente tern esses sentimentos e, enquan-to 
tms, nao ha nele~ nada de born ou de mau. A questao e sa-ber 
se devemos aceltar que as nossas obriga<;oes morais para 
c~m .um ser d~l?endam desse modo dos nossos sentimentos. E 
publrco e notono que alguns seres humanos se relacionam me-l~ 
or com 0 se.ugato do que com os seus vizinhos. Os que asso-c: 
am a morahdade as afei<;oesaceitariam que essas pessoas es-tao 
certas quando, durante urn incendio, tentam primeiro sal-var 
os seus gat~s, e so depois os vizinhos? E, acredito, mesmo 
aqueles que estao preparados para dar uma resposta afirmati-va 
a essa p~rgunta nao desejariam concordar com os racist as 
para os qums, se as pessoas mantem rela<;oesmais naturais co~ 
outras de sua propria ra<;a e por elas sentem maior afei<;ao, 
estao certas ao darem preferencia aos interesses de outros mem-bros 
de sua propria ra<;a. A etica nao exige que eliminemos 
as rela<;oespessoais e as afei<;oesparciais, mas exige que, em 
nossas a<;oes,levemos em conta as reivindica<;oes morais dos 
que saDafetados por elas, e que 0 fa<;amoscom urn certo grau 
de independencia de nossos sentimentos por eles. 
A terceira sugestao invoca 0 argumento bastante difundi-do 
da "ladeira escorregadia". Na base desse argumento esta 
a ideia de que, uma vez que ja demos urn passo em certa dire- 
<;ao,estaremos numa ladeira escorregadia e teremos de escor-regar 
mais do que seria a nossa vontade. No presente contex-to, 
0 argumento e usado para sugerir que precisamos de uma 
linha nitida para separar os seres com os quais podemos fazer 
experiencias, ou que podemos engordar para comer, daqueles 
com os quais nao podemos fazer tais coisas. A condi<;ao de 
membro de uma especie estabelece uma linha divisoria bem ni-tida, 
ao mesmo tempo em que os niveis de autoconsciencia, 
de autonomia ou sensibilidade nao 0 fazem. Ainda segundo 
o argumento, se admitirmos que urn ser humano com deficien-cias 
mentais nao tern urn status moral superior ao de urn ani-mal, 
ja teremos come<;ado a deslizar por uma ladeira cujo ni-vel 
seguinte e a nega<;ao dos direitos dos desajustados sociais 
e cujo fundo e urn governo totalitario, que descarta os grupos 
que nao the agradam classificando-os de subumanos. 
o argumento da ladeira escorregadia pode ser uma valio-sa 
advertencia em alguns contextos, mas nao resiste muito. Se, 
como afirmei neste capitulo, acreditamos que 0 status espe-cial 
que hoje atribuimos aos humanos permite que ignoremos 
os interesses de bilhoes de criaturas sencientes, nao devemos 
dissuadir-nos de tentar corrigir essa situa<;aopor causa da me-ra 
possibilidade de que os principios em que fundamentamos 
essa tentativa serao mal utilizados por governantes inescrupu-losos 
em seu interesse. E nao passa de uma possibilidade. A 
mudan<;a que sugeri poderia nao fazer diferenp alguma para 
o tratamento que dispensamos aos seres humanos, ou pode-ria, 
ate mesmo, aperfei<;oa-Io. 
No fim, nenhuma linha etica arbitrariamente tra<;ada po-de 
ser segura. 0 melhor sera encontrar uma linha que possa 
ser defendida aberta e honestamente. Quando discutirmos a
cutanasia no Capitulo 7, veremos que uma linha tra<;ada no 
lugar errado po de ter resultados funestos, ate mesmo para os 
que se situam no lado mais alto, ou humano, desta linha. Tam-bem 
e importante lembrar que 0 objetivo do meu argumento 
e elevar 0 status dos animais, e nao diminuir 0 dos sereshu-manos. 
Nao desejo sugerir que os deficientes mentais devam 
ser for<;ados a ingerir alimentos com corantes ate que a meta-de 
deles mona - ainda que, sem duvida, no que diz respeito 
a saber se a substancia e ou nao segura para os seres huma-nos, 
este procedimento certamente nos daria indica<;6es mais 
precisas do que 0 teste feito com coelhos ou cachorros. Gosta-ria 
que a nossa convic<;ao de que seria err ado tratar os defi-cientes 
mentais dessa maneira fosse transferida para os ani-mais 
nao-humanos em niveis semelhantes de autoconsciencia 
e com uma capacidade semelhante de sofrimento. E excessi-vamente 
pessimista abster-se de tentar modificar as nossas ati-tudes 
com base na ideia de que poderiamos come<;ar a tratar 
o~ deficientes mentais com a mesma falta de considera<;ao que 
dlspensamos aos animais, em vez de tratar estes ultimos com 
a maior considera<;ao que dedicamos aos seres humanos com 
deficiencias mentais. 
Na mais antiga obra de filosofia moral que a tradi<;ao oci-dental 
nos legou, a Repziblica de Platao, encontramos a se-guinte 
concep<;ao da etica: 
Afirmam que, por natureza, cometer injusti<;ase born e sofrer uma 
injusti<;ae mau; mas tambem se afirma que hi mais mal na ultima 
do que bem na primeira. Portanto, quando os homens tiverem 
feito e sofrido a injusti<;a,e tiverem a experiencia de ambas as coi-sas, 
todos os que nao forem capazes de evitar uma e obter a outra 
pensarao que fariam melhor em concordar que 0 melhor e nao 
ter nenhuma; em decorrencia disso, come<;ama criar leis e con- 
;en<;6es ~utuas; e chamam de legitimo e justo tudo aquilo que 
e determmado pela lei. E essa, afirma-se, a origem e a natureza 
dajusti<;a - trata-se de urn meio-termo, entre amelhor das alter-nativas, 
que e cometer injusti<;a e nao ser punido, e a pior delas, 
que e sofrer injusti<;a sem 0 poder de retalia<;ao. 
IGUALDADE PARA OS ANIMAlS? 
Nao era este 0 ponto de vista do pr6prio Platao; ele 0 co-loca 
na boca de Glauco para permitir qu~ S6crates, 0 pr~ta-gonista 
do seu dialogo, possa refuta-Io. E urn po~to de ~Ista 
que nunca teve aceita<;ao geral, mas que nem por ISS,od~I~OU 
de existir. Ecos dele podem ser encontrados nas teon~s etIcas 
de fil6sofos contemporaneos como John Rawls e DavId o.au-thier 
e tern sido usado, por estes e outros fil6sofos, para JUs-tific~ 
r a exclusao dos animais da esfera da etica, ou, pelo me-nos, 
de sua parte central. Pois, se a base da etica esta em que 
eu me abstenha de fazer coisas mas aos outros, desde que ta~- 
bem nao me fa<;am nada de mau, nada justifica que eu p.ratI-que 
esses atos contra aqueles que sao incapazes de apreCl~r a 
minha absten<;ao de tais praticas e controlar, em conformIda-de 
com ela sua conduta com rela<;ao a mim. De urn modo ge-ral, 
os ani~ais pertencem a essa categoria. Quando :stou sur-fando 
bem longe da praia e urn tubarao me ataca, mmha con-sidera<; 
ao para com os animais de nada ~e valera; e provave~ 
que eu seja comido com a mesma voracIdade com que 0 sera 
o pr6ximo surfista, ainda que ele passe todas as tardes de do-mingo 
dando tiros nos tubar6es de den~ro de um barco. Co-mo 
os animais sao incapazes de atos reCIprocos, eles ~e ~ncon-tram, 
de acordo com esse ponto de vista, fora dos lImItes do 
contrato etico. 
Ao levarmos em conta essa concep<;ao da etica, devemos 
fazer uma distin<;ao entre as explicar6es da origem ~os j~izos 
eticos e asjustijicar6es desses mesmos juizos. A explIca<;ao da 
origem da etica, em termos de urn contrato tacito entre as pes-soas 
tendo em vista 0 seu beneficio mutuo, tem.u~a certa ?~au-sibilidade 
(ainda que, em vista das norm as SOCIalSqu~se-etIcas 
que se tern observado nas sociedades de outros mamIfer?s, na 
verdade se trate de uma fantasia hist6rica). Mas podenamos 
aceitar esse relata como uma explica<;ao hist6rica sem que, ao 
mesmo tempo, nos comprometessemos com qu~isquer .c?ncep~ 
<;6es a respeito do carater justo ou injust? do sIste~a etIco ?~I 
resultante. Por mais interesseiras que seJam as ongen~ da etI-ca, 
e possivel que, uma vez que come<;amos a pensar etIca.men-te, 
somos levados alem dessas premissas mundan.as. POlS ~o-mos 
capazes de raciocinio, e a razao na~ ~ subordmada ao m-teresse 
pessoal. Ao refletirmos sobre a etIca, estamos us~ndo 
conceitos que, como vimos no primeiro capitulo deste lIvro,
nos levam alem do nosso interesse pessoal, ou mesmo do inte-r~ 
sse de algum grupo especifico. De acordo com 0 ponto de 
vIsta contratual da etica, esse processo de universalizal;:ao de-ve 
deter-se nas fronteiras da nossa comunidade· mas uma vez 
iniciado 0 processo, podemos descobrir que na~ seri'a coeren-te 
com as nossas outras convicl;:oesparar nesse ponto. Assim 
como os primeiros matematicos, que podem ter comel;:ado a 
contar. para manter-se informados do numero de pessoas de 
su~s tnbos, nao faziam a menor ideia de estarem dando os pri-melros 
passos num caminho que levari a ao caIculo infinitesi-mal, 
a origem da etica nada nos diz a respeito de onde ela vai 
terminar. 
Ao nos voltarmos para a questao da justifical;:ao, pode-mos 
ver que as consideral;:oes contratuais da etica tem muitos 
problemas. Claramente, tais consideral;:oes excluem da esfera 
etica muito mais do que os animais. Vma vez que os seres hu-manos 
com deficiencias graves sao igualmente incapazes de um 
comportamento reciproco, devem ser tambem excluidos. 0 
mesmo se aplica aos bebes ou as crianl;:as muito novas; mas 
os problemas da concepl;:ao contratual nao se limitam a esses 
c~sos especiais. De acordo com essa concepl;:ao, a principal ra-zao 
para se celebrar 0 contrato etico e 0 interesse pessoal. A 
menos que um novo elemento universal seja introduzido, um 
grupo de pessoas nao tem motivos para lidar eticamente com 
outro, desde que nao seja de seu interesse faze-Io. Se levarmos 
~s~oa serio, teremos de rever drasticamente os nossos juizos 
etIcos. Por exemplo: os traficantes de escravos que levaram 
escravos africanos para a America nao tinham nenhuma ra-zao 
pessoal para tratar os africanos melhor do que tratavam. 
Os africanos nao tinham como retaliar. Se fossem contratua-listas, 
os traficantes de escravos poderiam ter contestado os 
abolicionistas, explicando-Ihes que a etica para nas fronteiras 
da comunidade e, como os africanos nao pertencem a sua co-munidade, 
nao tem quaisquer obrigal;:oes para com eles. 
Nao sao apenas as praticas antigas que seriam afetadas 
se 0 modelo contratual fosse seriamente adotado. Ainda que 
as pessoas falem tanto sobre 0 mundo de hoje como uma uni-ca 
comunidade, nao ha duvida de que no Chade, por exem-plo, 
0 poder do povo para retribuir tanto 0 bem quanta 0 mal 
que, digamos, lhes fazem os cidadaos do Estados Vnidos , e 
l11uitolimitado. Assim, nao parece que a concepl;:ao contra-lual 
estabelel;:aquaisquer obrigal;:oesda parte das nal;:oesricas 
para com as mais pobres. 
Mais surpreendente do que tudo e 0 imp acto do modelo 
contratual sobre a nossa atitude diante das geral;:oesfuturas. 
"Por que devo fazer alguma coisa para a posteridade? 0 que 
C que a posteridade fez para mim?" seria 0 ponto de vIsta que 
deveriamos assumir se aqueles que podem exercer um compor-tamento 
reciproco estivessem dentro da esfera da etica. Os que 
vao estar vivos no ana 2100 nao tem como tomar as nossas 
vidas melhores ou piores. Portanto, se as obrigal;:oes so exis-tem 
onde pode haver reciprocidade, nao precisamos nos preo-cupar 
com problemas como 0 manejo do lixo nuclear. E ver-dade 
que uma parte do lixo nuclear continuara sendo mortal 
durante duzentos e cinquenta mil anos, mas, desde que 0 co-loquemos 
em conteineres que 0 manten~~m lo~ge de no,s por 
cem anos, teremos feito tudo 0 que a etIca eXIgede nos. 
Esses exemplos devem ser suficientes para mostrar que, 
seja qual for a sua origem, a etica que temos hoje realmente 
vai alem de um tacito entendimento entre seres capazes de re-ciprocidade. 
A perspectiva de retomar a tal ?ase n~o sera, .ima-gino, 
atraente. Vma vez que nenhuma consIdera~ao da onge~ 
da moralidade nos forl;:aa basear a nossa morahdade na reCI-procidade, 
e uma vez que nenhum outro argumento em favor 
dessa conclusao foi oferecido, devemos rejeitar essa concep-l;: 
aoda etica. .. 
A esta altura da discussao, alguns teoncos contratUaIS re-correm 
a uma concepl;:ao mais flexivel da ideia de contrato, 
instando conosco para que incluamos na comunidade moral 
todos aqueles que tem, ou terao, a capacidade de fazer parte 
de um acordo reciproco, sem levar em consideral;:ao 0 fato de 
eles serem, ou nao, capazes de reciprocidade e independente-mente 
tambem de saber quando terao essa capacidade. Cla-ramente 
essa c~ncepl;:aonao mais se baseia em reciprocidade 
alguma,' pois (a menos que tenhamos uma preocupal;:ao o~- 
sessiva com a limpeza do nosso tumulo, ou com a preserval;:ao 
de nossa memoria ate 0 fim dos tempos) as geral;:oesfuturas 
evidentemente nao tedo como estabelecer relal;:oesreciprocas 
conosco, ainda que algum dia adquiram ?- capacidade de um 
comportamento reciproco. Contudo, se os teoricos do contra-
to abandonam desse modo a reciprocidade, 0 que sobra do mo-tivo 
do contrato? Por que adota-Io? E por que restringir a mo-ralidade 
aqueles que tern a capacidade de fazer acordos conos-co, 
se, de fato, nao existe possibilidade alguma de que venham 
urn dia a faze-Io? Em vez de nos aferrarmos as ruin as de uma 
concep<;ao contratual que perdeu a sua essencia, seria melhor 
abandomi-Ia de vez e, com base na universabilidade, refletir 
sobre quais seres devem ser incluidos na esfera da moralidade~
Titulo original: PRACTICAL ETHICS - Second Edition, 
publicado POI' Press Syndicate of the University ofCambn'dge. 
Copyright © Cambridge University Press, 1993. 
Copyright © 1993, Liwaria Martins Fontes Editora Ltda., 
Sao Paulo, para a presente edifao. 
1'" edi«;ao 
fevereiro de 1994 
3!! edi«;ao 
setembro de 2002 1. Sobre a etica . 
2. A igualdade e suas implica<;6es . 
/ 3. Igualdade para os animais? . 
4. 0 que hi de err ado em matar? . 
5. Tirar a vida: os animais . 
-6: Tirar a vida: 0 embrHio e 0 feto . 
7. Tirar a vida: os seres humanos . 
8. Ricos e pobres . 
9. Os de dentro e os de fora . 
T 10. 0 meio ambiente . 
11. Fins e meios . 
12. Por que agir moralmente? . 
Revisao da tradUl;ao 
Eduardo Branddo 
Revisao grafica 
Marise Simoes-Leal 
Silvana Cohucci Leite 
Produ«;ao grafica 
Geraldo Alves 
Composi«;ao 
Antonio Cruz 
Dados Internacionais de Cataloga~ao na Pnblica¢o (CIP) 
(Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) 
Singer, Peter 
Etica pratica / Peter Singer; tradw;ao-Jefferson Luiz Camargo]. 
- 3!!ed, - Sao Paulo: Martins Fontes, 2002, - (Colerrao biblioteca 
universal) 
Apendice: Sobre ter sido silenciado na Alemanha 355 
Notas, rejerencias e leituras complementares 379 
Indices para catilogo sistematico: 
I, Etica: Filosofia 170 
Todos os direitos desta edir;lio para 0 Brasil reservados a 
, Livraria Martins Fontes Editora Ltda. 
Rua Conselheiro Ramalho, 3301340 01325-000 Slio Paulo SP Brasil 
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Singer igualdade para os animais

  • 1. dacom uma deficiencia nao e, de modo algum, inferior a vida semuma deficiencia? Ao procurarem assistencia medica para superar e eliminar a deficiencia, quando tal assistencia se acha disponivel, os proprios deficientes mostram que a preferencia por uma vida sem deficiencia nao e urn mero preconceito. Al-gunsdeficientes poderiam dizer que so fazem essa escolha por-quea sociedade coloca tantos obstaculos no seu caminho. Afir- IJ1amque 0 que os torna deficientes saD as condiyoes sociais, e nao a sua condiyao fisica ou intelectual. Essa afirmayao dis-torce a verdade mais limitada, segundo a qual as condiyoes so-dais tornam a vida dos deficientes muito mais dificil do que precisaria ser, e a transforma numa total falsidade. Ser capaz deandar, de ver, de ouvir, de estar relativamente livre da dor e do mal-estar, conseguir comunicar-se bern, saD coisas que, !ob virtualmente quaisquer condiyoes sociais, constituem be-neficiosinquestionaveis. Dizer isto nao significa negar que as pessoas as quais faltam essas aptidoes possam triunfar sobre as suas deficiencias e viver vidas de uma riqueza e diversidade mrpreendentes. Nao obstante, nao demonstramos preconcei-to contra os deficientes se preferimos, seja para nos mesmos ou para os nossos filhos, nao nos deparar com obstaculos tao grandes que 0 simples fato de supera-Ios ja constitui em si urn triunfo. ' , Igualdade para os animais? No capitulo anterior, ofereci motivos para se acreditar que o principio fundamental da igualdade, no qual se fundamenta a igualdade de todos os seres humanos, e 0 principio da igual considerayao de interesses. So urn principio moral basico des-se tipo pode permitir que defendamos uma forma de igualda-de que inclua todos os seres humanos, com todas as diferenyas que existem entre eles. Afirmarei agora que, ao mesmo tempo que esse principio proporciona uma base adequada para a igual-dade humana, essa base nao pode ficar restrita aos seres huma-nos. Em outras palavras, you sugerir que, tendo aceito 0 prin-cipio de igualdade como uma s6lida base moral para as rela-yoes com outros seres de nossa pr6pria especie, tambem somos obrigados a aceita-Ia como uma s6lida base moral para as re-layoes com aqueles que nao pertencem a nossa especie: os ani-mais nao-humanos. . A primeira vista, a sugestao pode parecer bizarra. Esta-mos habituados a ver a discriminayao contra membros de mi-norias raciais, ou contra mulheres, como fatos que se encon-tram entre as mais importantes questoes morais e polfticas com as quais se defronta 0 mundo em que vivemos. Sao problemas serios, merecedores do tempo e das energias de qualquer pes-soa que nao seja alienada. Mas que dizer dos animais? 0 bem-estar dos animais nao se insere numa categoria totalmente di-versa, uma hist6ria para pessoas loucas por caes e gatos? Co-mo e possive! que alguem perca 0 seu tempo tratando da igual-dade dos animais, quando a verdadeira igualdade e negada a tantos seres humanos?
  • 2. Essa atitude reflete urn preconceito popular contra 0 fato d_es~ levarem a serio os interesses dos animais - urn preconceito tao mfundado quanto aquele que leva os brancos proprietarios de escravos a nao considerarem com a devida seriedade os inte-resses. de seus escravos africanos. Para nos, e facil criticar os pre-c; onceltos de nossos avos, dos quais os nossos pais se libertaram. E mais dificil nos distanciarmos de nossos proprios pontos de vista, de tal modo que possamos, imparcialmente, procurar preconcei-tos entre as cren<;:ase os valores que defendemos. a que se preci-sa, agora, e de boa vontade para seguir os argumentos por onde ~le~nos levam, sem a ideia preconcebida de que 0 problema nao e dlgno de nossa aten<;:ao. a argumento para estender 0 principio de igualdade alem da nossa propria especie e simples, tao simples que nao requer mais do q~e um~ clar~ compreensao da natureza do principio da igual consldera<;:ao de mteresses. Como ja vimos, esse principio implica que a nossa preocupa<;:ao com os outros nao deve depender de co-mo sao, ou das aptid6es que possuem (muito embora 0 que essa preocupa<;:ao exige precisamente que fa<;:amospossa variar con- ~orme as caracteristicas dos que SaDafetados por nossas a~6es). E com ~ase nisso que podemos afirmar que 0 fato de algumas pes-soas nao serem membros de nossa ra<;:anao nos da 0 direito de explora-Ias e, da mesma forma, que 0 fato de algumas pessoas se-rem menos inteligentes que outras nao significa que os seus inte-resses possam ser colocados em segundo plano. a principio con-tudo, tambem implica 0 fato de que os seres nao pertence;em a nossa especie nao nos da 0 direito de explora-Ios, nem significa que, por serem os outros animais menos inteligentes do que nos possamos deixar de levar em conta os seus interesses. ' No capitulo anterior, vimos que, de uma forma ou de ou- ~ra, muitos filosofos tern defendido a igual considera<;:ao de mteresses como urn principio moral basico. Poucos admitiram que 0 principio tern aplica<;:6es alem de nossa propria especie. Urn dos poucos a faze-Io foi Jeremy Bentham 0 criador do utilitarismo moderno. Num trecho premonitorio escrito nu-ma epoca em que os escravos africanos das poss~ss6es ingle-sas alllda eram tratados quase do mesmo modo como hoje tra-tamos os animais, Bentham escreveu: Talvez chegue 0 dia em que 0 restante da cria9ao animal venha a adquirir os direitos dos quais jamais poderiam ter sido privados, a nao ser pela mao da tirania. Os franceses ja descobriram que o escuro da pele nao e motivo para que urn ser humano seja aban: donado, irreparavelmente, aos caprichos de urn torturador. E possivel que algum dia se reconhel;a que 0 numero depernas, a vilosidade da pele ou a termina9ao do os sacrum SaGmotivos igualmente insuficientes para se abandonar urn ser sensivel ao mesmo destino. 0 que mais deveria tra9ar a linha insuperavel? A faculdade da razao, ou, talvez, a capacidade de falar? Mas, para la de toda compara9ao possivel, urn cavalo ou urn cao adul-tos SaGmuito mais racionais, alem de bem mais sociaveis, do que urn bebe de urn dia, uma semana, ou ate mes~o urn ~es. Imaginemos, porem, que as coisas nao fossem aSSlm; que lm-porHincia teria tal fato? A questao nao e saber se SaGcapazes de raciocinar, ou se conseguemjalar, mas, sim, se sao pass{veis de sojrimento. Neste trecho, Bentham chama a aten<;:ao para a capacida-de de sofrimento como a caracteristica vital que confere, a urn ser, 0 direito a igual considera<;:ao. A capacidade de sofrimen-to - ou, mais estritamente, de sofrimento e/ou frui<;:ao ou fe-licidade - nao e apenas mais uma caracteristica, como a ca-pacidade de falar ou para a matemMica pura. Bentham nao esta dizendo que os que tentam marcar a "linha insuperavel", que determina se os interesses de urn determinado ser devem ser levados em conta, tenham por acaso escolhido a caracte-ristica errada. A capacidade de sofrer e de desfrutar as coisas e uma condi<;:ao previa para se ter quaisquer interesses, condi- <;:aoque e preciso satisfazer antes de se poder falar de interes-ses e falar de urn modo significativo. Seria absurdo dizer que na~ fazia parte dos interesses de uma pedra 0 fato de ter sido chutada por urn garoto a c(l.minho da escola. Uma pedra nao tern interesses, pois nao e capaz de sofrer. Nada que venha-mos a fazer-Ihe podera significar uma diferen<;:apara 0 seu bem-estar. Por outro lado, urn rata tern, inegavelmente, urn inte-resse em nao ser atormentado, pois os ratos sofrerao se vie-rem a ser tratados assim. Se urn ser sofre, nao po de haver nenhuma justificativa de ordem moral para nos recusarmos a levar esse sofrimento em considera<;:ao. Seja qual for a natureza do ser, 0 principio de igualdade exige que 0 sofrimento seja levado em conta em ter-mos de igualdade com 0 sofrimento semelhante - ate onde possamos fazer compara<;:6es aproximadas - de qualquer ou-
  • 3. J!TICA PRATICA t~o S~r.Quan?~ urn ser nao for capaz de sofrer, nem de sentir ~ egn~ ou, felIcldade, n~o haveni nada a ser levado em consi-erac,; ao.E por esse motivo ~ue 0 limite de sensibilidade (para usarmos 0 termo com 0 sentldo aprapriado, quando nao ri 0- ~ol~a~e~te ~xat.o,.da ~a~acidade de sofrer ou sentir alegria gou . e ICI a e) e o.umco lImIte defensavel da preocupac,;ao com os lllt~r:sses alhelOs. Demarcar esse limite atraves de uma carac tenstIca, como a inteligencia ou a racionalidade equ' I .- ad' emarca- I d ' Iva ena 0 e modo arbitnirio. Por que nao escolher algu-ma ooutra ca'r.acteristica, como ' por exemplo , a cor dape Ie?. . ~ racistas vlOlam 0 principio de igualdade ao d malOr Importa.n~iaaos interesses dos membras de sua rac,;a~:: pre que se venfica urn choque entre os seus interesses e os in-teress: s dos que pertencem a outra rac,;a.Sintomaticamente os racistas de descendencia europeia nao admitiram que ' exemplo, a do~ imp?rta tanto quando e sentida por afric~~~~ como quando e se~tIda por europeus. Da mesma forma, aque- ~esque eu chamana de "especistas" atribuem maior peso aos lllteresses de membros de sua propria especie quando ha urn choque entre os ~~usinteresses e os interesses dos que perten-cern a .o~tras ~species. Os especistas humanos nao admitem que ~ d01~e tao ma quando sentida por porcos ou ratos como quan-o sac os seres humanos que a sentem . l~i esta, poi~, o. afl~umento para es~ender 0 principio de Ig~~ ade aos ammms nao-humanos; mas pode haver algumas dU;l.das a respeit.o daquilo a que essa igualdade equivale na pratIca. Em partIcular, a ultima frase do paragrafo anterior pode levar algumas pessoas a darem a seguinte resposta: "Com toda a certeza a dor sentida por ratos nao e tao ma quanto a que .:ent.eurn ser humano. Os seres humanos tern muito mais consclencl~ do que l?es esta acontecendo, 0 que faz com que o seu sofn:nento seJa maior. Para ficarmos apenas em urn exemplo, nao se pode comparar 0 sofrimento de uma pessoa q~: morre len~amente de cancer Com0 de urn rato de labora-tone qu~ esteJa suportanto 0 mesmo destino." AceIt~ plenamente 0 ponto de vista segundo 0 qual no cas? descnto, a vitima humana do cancer normalmente s~fre I~SmSs do qru'e a vitima nao-humana. De modo algum,pore.m o cons Itm urn obstaculo a extensao da igual considerac,;a~ de interesses aos nao-humanos. Significa, pelo contrario, que precisamos ter cuidado, sempre que compararmos os interes-ses de diferentes especies. Em algumas situac,;6es,urn membra de uma especie sofreni mais do que urn membra de outra. Neste caso, devemos ainda aplicar 0 principio da igual considerac,;ao de interesses, mas a consequencia de faze-Io sera, e claro, dar prioridade ao aHvio do sofrimento maior. Urn caso mais sim-ples pode ajudar a esclarecer essa questao. Se der urn tapa com a mao aberta na anca de urn cavalo, ele pode sobressaltar-se, mas provavelmente nao sentira gran-de dor. Sua pele e grossa 0 suficiente para protege-lo contra urn simples tapa. Contudo, se eu der 0 mesmo tapa num bebe, ele vai chorar e e quase certo que sinta uma grande dor, pois tern a pele mais sensivel. Portanto, e pior dar urn tapa num bebe do que num cavalo, desde que os dois tapas sejam dados com a mesma forc,;a.Mas deve existir algum tipo de golpe - nao sei exatamente qual seria, mas, digamos, urn golpe com urn pedac,;ode pau - que fara 0 cavalo sentir tanta dor quan-to sentiu a crianc,;aao receber urn simples tapa. E isso 0 que quera dizer com "igual quantidade de dor"; e, se achamos er-rado infligir tanta dor a urn bebe sem nenhum motivo, entao, a menos que sejamos especistas, devemos achar igualmente er-rado infligir, sem motivo algum, a mesma quantidade de dor a urn cavalo. Entre os seres humanos e os animais, existem outras dife-renc,; asque levam a outras complicac,;6es.Os adultos normais tern aptid6es mentais que, em determinadas circunstancias, levam-nos a sofrer mais do que sofreriam os animais nas mes-mas circunstancias. Se, por exemplo, decidfssemos realizar ex-periencias cientificas extremamente dolorosas ou letais com adultos normais, levados a forc,;ados parques publicos com essa finalidade, os adultos que entrassem nos parques ficariam com medo de ser agarrados. 0 terror resultante seria uma forma adicional de sofrimentp, vindo somar-se a dor provocada pela experiencia. Quando feitas com animais, as mesmas experien-cias provocariam menos sofrimento, visto que eles nao sofre-riam, por antecipac,;ao, 0 medo de serem raptados e submeti-dos a uma experiencia. Isso nao significa, evidentemente, que seria correto fazer a experiencia comanimais, mas apenas que existe uma razao - uma razao que nao e especista - para que,
  • 4. sempre que se va fazer a experiencia, se de preferencia a ani-mais, e nao a seres humanos. Considere-se, porem, que esse mesmo argumento nos da uma razao para preferirmos usar recem-nascidos humanos - ormos, talvez - ou seres hum a-nos com graves deficiencias mentais, em vez de adultos, para a realiza<;ao da experiencia, uma vez que os recem-nascidos e os seres humanos com graves deficiencias mentais tambem nao fariam ideia alguma do que lhes iria acontecer. No que diz res-peito a esse argumento, animais, recem-nascidos e seres hu-manos com graves deficiencias mentais pertencem a mesma ca-tegoria; e, se 0 usarmos para justificar as experiencias com ani-mais, temos de nos perguntar se estamos preparados para ad-mitir que sejam feitas as mesmas experiencias com recem-nascidos humanos e adultos com graves deficiencias mentais. Se fizermos uma distin<;ao entre os animais e esses seres hu-manos, cabera tambem a pergunta: de que modo poderemos faze-la, a nao ser com base numa preferencia moralmente in-defensavel por membros de nossa propria especie? Ha muitas areas nas quais as aptidoes mentais superiores de adultos humanos normais fazem uma diferen<;a: previsao, memoria mais detalhada, maior conhecimento do que esta acontecendo, etc. Essas diferen<;as explicam por que urn ser humano que esta morrendo de cancer provavelmente sofre mais do que urn rato. A angustia mental e 0 que torna a situa<;ao humana tao mais dificil de suportar. Contudo, essas diferen- <;asnao sugerem urn maior sofrimento por parte do ser huma-no normal. As vezes, os animais podem sofrer mais em decor-rencia de sua compreensao mais limitada. Se, por exemplo, es-tamos fazendo prisioneiros em tempo de guerra, podemos explicar-Ihes que, desde que se submetam a captura, ao inter-rogatorio e a prisao, nenhum outro mallhes sera feito, e serao libertados assim que cessarem as hostilidades. Se capturarmos animais selvagens, porem, nao teremos como explicar-Ihes que nao estamos amea<;ando as suas vidas. Urn animal selvagem nao e capaz de distinguir uma tentativa de subjugar e prender de uma tentativa de matar; ambas iraQ provocar-Ihe 0 mesmo terror. Pode-se objetar que e impossivelfazer compara<;6es en-tre os sofrimentos de especies diferentes e que, por esse moti-vo, quando os interesses de animais e seres humanos entram IGUALDADE PARA OS ANIMAlS? , " d ' ualdade nao oferece orienta<;ao em choque, 0 prlllclPlO e 19 ra<;oesdo sofrimento entre alguma. E verdade que as comp~ dem ser feitas com exa-membros de especi~s diferen~es ~~~ POodeser feita com exati-tidao; a esse respelto, tambe~ 0 soirimento de diferentes se-dao qualquer compar,a~ao e.n r~ fundamental. Como veremos res humanos. A preclsao n:od~vessemos impedir a imposi<;ao dentro em pouco, mes~o ~ nas quando os interesses dos de sofrimentos a9s alllmalS ~P: dos tanto quanta os animais seres hum~nos nao fo~sem ~ e ~ transforma<;6es radicais em o sao, senamos for<;a o~ a .aztransforma<;oes que diriam res-nosso tratament~ dos an:mals, 'todos de cultivo da terra, peito a nossa ahmenta<;a.o, aos .me mu'ltos campos da cien-aoS proce d·Imentos exp. enmentals emda ca<;a a captura de alll.- cia, a abordagem da VIdasel~ag~~e:soes co~o circos, rodeios mais e "ao uso dEe suas pelqeisie, nacsl.a a quan t'1dade total de sofri-e ZOOIOglCOS.m co.nse dem~nte reduzida, tao grandemente mento provocado. sena gran d a de atitude moral que pro-que e dificil imaglll~r o~tra mudai oma total do sofrimento vocasse uma redu<;aotao gran e a s existente no universo. Ate aqui, fiz.mU.itasaf~r:~~o~~s~~~~eb~:~~~~~~~ ~:r~~ frimentos aos ~lll.malS,.~~iberada. A aplica<;ao do principio mortos. A or~ll~saof?l_ ofrimentos e, teoricamente pelo de igualdade a Imp,o~l<;aode ~nder A dor e 0 sofrimento sao menos, basta~te facIl de ent te cia ra<;a do sexo ou da espe-coisas mas e, llldependentemen 'tados o~ mitigados. 0 maior cie do ser que ~ofre, devem serd~vlor uma dor depende de quao ou menor sofnmento provo~a ps as dores de mesma intensi-intensa ela e e de s_ua.dur~<;aO't~~as sejam elas sentidas por dade e dura<;ao saD 19ua.me~ Qua~do refletimos sobre 0 va-seres humanos ou Pdoralll~.a~; tao confiantemente assim, que lor da vida, nao po, emos. lZl~ente valiosa seja ela humana uma vida e u~a vl~a, e 19u.a f mar qu~ a vida· de urn ser ou animal. Na~ sena es~ecls~~s~:ento abstrato, de planejar consciente de Sl, capaz elp atos de comunica<;ao, etc., se-o futu!O, d~ realizar comp.exo~e urn ser que nao possu~ es~~s ja malS vaho~a do que.a vl~a esse ponto de vista e JUStlfl-aptidoes. (Nao estou dlzen 0 que ao se pode simplesmente cavel ou nao, mas, apenas, que n
  • 5. r~jeita-Io como especista, pois nao esta na base da especie em Sl0 pressuposto de que uma vida seja considerada mais valio-sa do que outra.) 0 valor da vida e urn problema etico de no-t? ria dificuldade, e so podemos chegar a uma conclusao ra-clOnal sobre 0 valor comparado das vidas humana e animal depoi.s de term os discutido 0 valor da vida em termos gerais. E~s.ee urn tema que exige urn capitulo it parte. Enquanto isso, ha lmportantes conclus6es a serem extraidas do fato de se en-tender para aIem de nossa especie 0 principio da igual consi-derac; ao de interesses, independentemente de nossas conclus6es sobre 0 valor da vida. Para a maior parte das pessoas que vivem nas sociedades m~der.nas e urbanizadas, a principal forma de contato com os a~lmalS acontece it hora das refeic;6es. 0 uso de animais como ahmento talvez seja a mais antiga e a mais difundida forma de uso animal. Ha tambem urn sentido em que se pode ve-Ia como a forma mais basic a de uso animal, a pedra angular so-bre a qual repousa a crenc;a de que os animais existem para 0 nosso prazer e a nossa conveniencia. Se os animais sao importantes POI'si mesmos, 0 uso ali-mental' que deles fazemos torna-se questionavel _ sobretudo qua~do. a carne ~nimal e urn luxo, e nao uma necessidade. Os esqUlm~S, que Vlvemnum ambiente que os coloca diante das alternatlVas de matar os animais para come-Ios ou morrer de fome, podem ser justificados quando afirmam que 0 seu inte-resse em sobreviver sobrep6e-se ao dos animais que matam. P?uCOS, dentre nos, poderiam defender nesses termos a sua ahment~c;ao. Os cidadaos das sociedades industrializadas po-d~ m facI1?1enteconseguir uma alimentac;ao adequada sem que seJa preClSOrecorrer it carne animal. 0 peso avassalador do t~stemunho medico indica que a carne animal nao e necessa-r: a par.a a boa sau~e ou a longevidade. Alem disso, a produ-c; ao anll~al nas socledades industrializadas nao constitui uma forma eflCazde produc;ao de alimentos, visto que a maior parte IGUALDADE PARA OS ANIMAlS? dos animais consumidos foi engordada com graos e outros al~- mentos que poderiamos tel' comido diretamente. Quando ah-mentamos esses animais com graos, somente cerca de dez por cento do valor nutritivo permanecem em forma de ~ar~e p~ra o consumo humano. Portanto, com excec;aodos ammals cna-dos inteiramente em terras improprias para 0 cultivo de leg~- mes, frutas ou graos, nao se pode afirmar que sejam consuml-dos para melhorar a nossa saude ou para aume~t~r a noss.a provisao de alimentos. A sua carne e urn luxo, e so e consuml-da porque as pessoas apreciam-Ihe 0 saboL . Ao refletirmos sobre a etica do uso de carne ammal para a alimentac;ao humana nas sociedades indu~trializadas, esta-mos examinando uma situac;ao na qual urn mteresse humano relativamente menor deve ser confrontado com as vidas e ? bem-estar dos animais envolvidos. 0 principio da igu~l conSI-derac; ao de interesses nao permite que os interesses maJores se-jam sacrificados em func;ao dos in~ere~sesmenores. . o arrazoado contra 0 uso de ammalS para a nossa ahmen-tac; ao fica mais contundente nos casos em que os animais sao submetidos a vidas miseniveis para que a sua carne se torne acessivel aos seres humanos ao mais baixo custo possivel. As , formas modernas de criac;aointensiva aplicam a ciencia e a te~- nologia de acordo com 0 ponto de vista s~gundo 0 qual os am-mais sao objetos a serem usados por nos. Para que a carne chegue as mesas das pessoas a urn prec;o acessivel, a noss.a so-ciedade tolera metodos de produc;ao de carne que confmam animais sensiveis em condic;6es improprias e espac;os exiguos durante toda a durac;ao de suas vidas. Os animais sao tratados como maquinas que transformam forragem em carne, e tod~ inovac;ao que resulte numa maior "tax~ de conversao" ~era muito provavelmente adotada. Como aflfmou uma autonda-de no assunto, "a crueldade so e admitida q~ando ~essam os lucros". Para evitar 0 especismo, devemos pOI'urn flm a essas prMicas. Nosso habito e 0 apoio de que necessitam os "faze~- deiros industriais". A decisao de deixar de dar-Ihes esse apolO pode ser dificil, mas e menos dificil do que ter~a sido, p~ra urn sulista branco, opor-se as tradic;6es de sua socle~a~e e h~ertar os seus escravos; se nao mudarmos os nossos habltos ahmen-tares como poderemos censurar os proprietarios de escravos que ~e recusavam a mudar 0 seu modo de vida?
  • 6. · Ess~s argu.mentos aplicam-se aos animais que tern sido cnados mdustnalmente - 0 que significa que nao devemos comer frango, porco ou vitela, a menos que saibamos que a ~arne q.u~estamos comendo nao foi produzida pelos metodos mdustnms. a mesmo se aplica a carne bovina proveniente de gado comprimido em instalac;oesde confinamento onde se cos-tuma eng~rdar os ani.mais (como e 0 caso da maior parte da carne .bovma consumida nos Estados Unidos). as ovos virao d: galmhas presas em pequenas gaiolas, tao pequenas que elas nao cor:seguem ~e.m mesmo esticar as asas, a menos que os ovos seJam especificamente vendidos como "de galinhas cria-das em ~i~~rdade" (ou a menos que se viva num pais relativa- ~ente cI~lhzad~ como a Suic;a, onde nao se permite que as ga-lmhas seJam cnadas em gaiolas). E~ses argumentos nao nos forc;am a adotar, na integra, urr:a ahmentac;ao vegetariana, ja que alguns animais - os car-n~ lros, por exemplo, e, em alguns paises, 0 gado - ainda sao cnados em pastagens naturais. Mas isso po de mudar. a siste-ma, norte-americano de engordar 0 gado em confinamento ja esta se espalhando por outros paises. Enquanto isso a vida dos anim.ais ~ria~os em liberdade e sem duvida melho; do que ~ dos ammalS cnados em "fazendas industriais". Ainda as-s~ m,pe:mane.ce a duvida sobre se e compativel com a igual con- ~Iderac;aod~ mteresses usa-los como alimento. Urn problema, e claro, esta em que 0 seu uso como alimento implica ter de mata-los - mas esse e urn problema que, como afirmei, sera retomad~ quand~ tiver~os discutido 0 valor da vida no capi-tulo segumte. AIem de tirar as suas vidas, muitas outras coi-sas s~o feitas aos animais para que eles cheguem a nossa mesa a bmxo prec;o. A castrac;ao, a separac;ao de maes e filhotes a separac;ao de rebanhos, as marcas com ferro em brasa ~ transporte e, finalmente, os momentos do abate - coisas q~e, provavelmente, envolvem sacrificio e nao levam em conside-ra7~ 0 os interesses d.os~nimais. Esses procedimentos talvez per-mltlsse~ que os ammms fossem criados em pequena escala e sem sofnmento, mas nao parece economico ou prcitico faze-lo na escal~ ex~gida pela alimentac;ao dos grandes contingentes pop~la~lOnms urbanos. De qualquer modo, 0 mais import an-te. nao e saber se a carne animalpoderia ser produzida sem so-fnmento, mas se a carne que estamos pensando em comprar joi produzida sem sofrimento. A menos ~ue po_ssam~sestar certos de que foi, 0 principio da igual considerac;ao de mteres-ses implica que foi errado sacrificar importantes interesses do animal para a satisfac;ao de interesses menores nossos; por con-seguinte, deveriamos boicotar 0 resultado ~in~l,d~sseprocesso. Para os que vivem em cidades onde e dlflCIl saber como os animais que poderiamos comer viveram e morreram, e.sta conclusao praticamente implica a opc;ao por urn modo de vIda vegetariano. Vou examinar algumas objec;oesque se podem le-vantar contra este fato na ultima parte deste capitulo. ~ Experiencias com animais Talvez 0 campo no qual 0 especismo possa ser mais cla-ramente observado seja 0 da utilizac;ao de animais em expe-riencias. Aqui, a questao se coloca em toda a sua pleni~ud~, pois os que fazem tais experiencias quase sempre tent am JUStl-ficar a sua realizac;ao com animais com a alegac;ao de que as experiencias nos levam a descobertas sobre os seres h~man~s; se assim for, essas pessoas devem concordar com a afirmac;ao de que os seres humanos e os animais sao semelhantes em as-pectos cruciais. Por exemplo: se 0 fato de forc;ar urn rat~ .a escolher entre morrer de fome e atravessar uma grade eletnfl-cada para conseguir comida nos diz alguma coisa ~~bre as rea-c; oesdos seres humanos ao estresse, devemos admitir que 0 ra-to sente estresse quando colocado nesse tipo de situac;ao. . As pessoas as vezes pensam que as experiencias ~o~ ~m-mais atendem a objetivos medicos vitais e podem ser JustlfIca-das com base no fato de que aliviam mais sofrimento. do que provocam. Essa confortavel crenc;anao pas~~de urn enga_no.as laborat6rios testam novos xampus e cosmeticos que estao pre-tendendo comercializar pingando soluc;oesconcentradas desses produtos nos olhos dos coelhos, num teste con~ecido como."teste de Draize" . (As pressoes exercidas pelos mOVlmentosde hberta-c; aodos animais fizeram com que varias industrias aban~on~s-sem essa prcitica. Urn teste alternativo, que nao usa ammms, foi descoberto ha pouco. Mesmo assim, ainda sao muitas as indus trias e dentre elas as maiores do ramo, que continuam a fazer 0 teste de Draize.) as aditivos alimenticios, inclusive
  • 7. corantes e conservantes artificiais, sao testados com 0 que se conhece como LDso - urn teste que tern por finalidade encon-t~ ar ~ "dose letal", ou 0 nivel de consumo que levani a morte cmquenta por cento de uma amostra de animais. Ao longo do proces.so, quase todos os animais ficam doentes, ate que al-guns fmalmente morrem, e outros se restabelecem. Esses tes-tes nao sao necessarios para impedir 0 sofrimento humano. mesmo que nao existisse outra alternativa ao uso de animai~ para test~r. a seguranC;ados produtos, ja dispomos de urn mi-mero ~ufIcIente de xampus e corantes para alimentos. Nao ha necess~dadealguma de desenvolver outros, que podem mostrar-se pengosos. Em muitos paises, as forc;as armadas fazem experiencias atrozes com animais, que raramente chegam ao conhecimento do publico. Para ficarmos apenas num exemplo: no Instituto de Radiobiologia das Forc;asArmadas dos Estados Unidos em Be~hesda, Maryland, os macacas do genero Rhesus tern ~ido tremados para correr dentro de uma grande roda. Se reduzi-rem muito a velocidade, aroda faz 0 mesmo, e os macacos levam urn choque eletrico. Quando os macacas ja foram trei-nados para correr por longos periodos, recebem uma dose le-tal de radiac;~o. E entao, sentindo-se mal e vomitando, sao for-c; a~osa c0.ntmuar correndo ate cair. A suposta finalidade dis- S? e obter mformac;6es sobre a capacidade dos soldados de con-tmuarem a lutar depois de urn ataque nuclear. ~o m~smo modo, nem todas as experiencias realizadas pe-las umve~s~dades~odem ser defendidas com base na alegac;ao ~e que alIvI~m ~ms sofrimentos do que provocam. Tres cien-tIsta~ da Un}versId~de de Princeton deixaram 256 ratinhos sem camIda ou agua ate r.n0rrerem. Concluiram que, em condic;6es de sede e fome fatms, os ratinhos sao muito mais ativos do que ratos adultos normais que recebem agua e comida. Numa famosa serie de experiencias feitas durante mais de quinze anos, ~. F. H~rlow,.do ~entro de Pesquisas com Primatas de Ma-dIson, WISCO?Sm, cnou macacos em condic;6esde privac;aoma-terna e total Isolamento. Descobriu que, assim, podia reduzir os macacos a urn estado em que, ao serem colocados entre ma-cacas nor~ais, ficavam agachados num canto, em condic;6es de depressao e medo continuos. Harlow tambem produziu en-tre as macacas, maes tao neur6ticas que esmagavam 0 r~sto de seus filhos no chao, e depois os esfregavam para a frente e para tras. Harlow ja morreu, mas, em outras universidades dos Estados Unidos, alguns de seus ex-alunos continuam a fa-zer variac;6es de suas experiencias. Nesses casos, e em muitos outros parecidos, os beneficios para os seres humanos sao inexistentes ou muito incertos; ao mesmo tempo, porem, as perdas para membros de outras es-pecies sao concretas e inequivocas. Consequentemente, as ex-periencias indicam uma falha na atribuic;ao de igual conside-rac; ao aos interesses de todos os seres, a despeito da especie a que pertenc;am. No passado, 0 debate sobre as experiencias com animais quase sempre negligenciou esse ponto, pois era colocado em termos absolutos: 0 adversario da experiencia estaria prepara-do para deixar que milhares morressem de uma doenc;a terri-vel, cuja cura poderia ser encontrada mediante experiencias em urn animal? Trata-se de uma questao meramente hipotetica, uma vez que as experiencias nao tern resultados tao espeta-culares assim; contudo, contanto que seja clara sua natureza hipotetica, acredito que a pergunta deva ser respondida afir-mativamente - em outras palavras, se urn animal, ou ate mes-mo uma duzia deles, devesse ser submetido a experiencias pa-ra salvar milhares de pessoas, eu acharia correto e de acordo com a igual considerac;ao de interesses que assim fosse feito. Pelo menos, esta e a resposta que deve ser dada por urn utili-tarista. as que acreditam em direitos absolutos poderiam afir-mar que e sempre urn erro sacrificar urn ser, seja ele humano ou animal, tendo em vista 0 beneficio de outro. Neste caso, a experiencia nao deve ser realizada, sejam quais forem as con-sequencias. Diante da pergunta hipotetica a respeito de salvar milha-res de pessoas atraves de uma unica experiencia com urn ani-mal, os adversarios do especismo podem responder com outra pergunta hipotetica: os que fazem as experiencias estariam pre-parados para faze-Ias com seres humanos 6rfaos com les6es cerebrais graves e irreversiveis, se esta fosse a unica maneira de salvar milhares de outras pessoas? (Digo "6rfiios" para evi-tar a complicac;ao dos sentimentos dos pais humanos.) Se os cientistas nao estiverem preparados para usar 6rfiios humanos com les6es cerebrais graves e irreversiveis, sua aceitac;aodo usa
  • 8. de animais para os mesmos fins parece ser discriminatoria uni-camente ,com base na especie, uma vez que macacos, dies, ga-tos: e ate ~esmo camundongos e ratos sao mais inteligentes, malS consclente~ do que se passa com eles, mais sensiveis a dor, etc" do que mUltos seres humanos com graves lesoes cerebrais que mal sobrevivem em enfermarias de hospitais e outras ins~ tituil;oes. Da parte de tais seres humanos, parece nao existir nenhu~a c.aracteristicamoralmente relevante que esteja ausente nos ammalS. Portanto, os cientistas revelam preconceitos em favor de sua propria especie sempre que fazem experiencias c?m ~nimais para finalidades que, segundo pensam, nao se-nam 19ualmente justificadas se fossem feitas com seres hum a-nos dotados de urn igual (ou menor) nivel de sensibilidade consciencia, etc. Se esse preconceito fosse eliminado 0 lllime~ ro de experiencias realizadas com animais seria sensivelmente reduzido. Concentrei-me no uso de animais enquanto alimento e ob-j~ to de pesquisas, uma vez que se trata de exemplos de espe- Cismo sistematico e praticado em grande escala. Nao consti-tue~, sem~uvid~, as unicas areas nas quais 0 principio da igual conslderal;ao de mteresses, levado alem da especie humana tern i~plical;oes praticas. Ha muitas outras areas que colocam ~ues-toes semelhantes, inclusive 0 comercio de peles, a cal;a em to-d, as.as suas diversas modalidades, os circos, os rodeios, os zoo- 10giCOSe os negocios que envolvem animais de estimal;ao. Da-do que as questoes filos6ficas colocadas por esses problemas nao sao muito diferentes dascolocadas pelo usa de animais nas esfe~as da alimental;ao e da pesquisa, deixarei que 0 leitor lhes aphque os principios eticos apropriados. Em 1973, apresentei pela primeira vez os pontos de vista esboyados neste capitulo. Naquela epoca, nao existia nenhum mOVlmentode libertal;ao ou de direitos dos animais. Desde en-tao, surgiu urn movimento, e alguns dos mais graves abusos cometidos contra os animais, como 0 teste de Draize e 0 LDso, tornaram-se menos comuns - ainda que nao tenham sido to-talmente eliminados. 0 comercio de peles vem sendo muito ata-cado e, em conseqiiencia, as vendas de peles cafram drastic a-mente em pafses como a Inglaterra, os Pafses Baixos, a Aus-tralia e os Estados Unidos. Alguns pafses tambem estao co-mel; ando a eliminar por etapas as formas de confinamento mais extremas das fazendas industriais. Como ja foi aqui mencio-nado, a Suil;a proibiu 0 sistema de aprisionar em gaiolas as galinhas poedeiras. A Inglaterra tornou ilegal a crial;ao de be-zerros em estabulos individuais, e esta eliminando por etapas os chiqueiros individuais. Como em outros campos das refor-mas sociais, a Suecia tambem esta na lideranl;a no que diz res-peito a essas inoval;oes: em 1988, 0 Parlamento sueco apro- YOUuma lei que, ao longo de urn periodo de dez anos, levara a eliminal;ao de todos os sistemas que, nas fazendas industriais, confinam os animais por muito tempo e nao permitem que vi-yam conforme 0 seu comportamento natural. A despeito dessa crescente aceital;ao de muitos aspectos da questao da libertal;ao dos animais e do avanl;O lento, mas tangivel, que ja se fez em nome de seu bem-estar, inumeras objel;oes tern sido levantadas, algumas delas mais simple.se pre-visfveis outras mais sutis e inesperadas. Nesta parte fmal do capftul;, tentarei responder as mais importantes dessas obje-l; oes, comel;ando pelas mais simples. Nao podemos nunca sentir a dor de urn outro ser, seja ele humano ou nao. Quando vejo minha filha cair e esfolar o joelho, sei que ela sente dor pela maneira como se comporta - chora, diz-me que 0 joelho esta doendo, esfrega 0 lugar ma-chucado, etc. Sei que eu mesmo me comporto de urn jeito pa-recido - urn pouco mais discreto - quando sinto dor, e en-tao admito que minha filha esta sentindo alguma coisa que se assemelha ao que sinto quando esfolo 0 meu joelho. o fundamento de minha convicl;ao de que os animais po-dem sentir dor e semelhante ao fundamento de minha convic-
  • 9. <;aode que a minha filha pode sentir dor. Quando sentem al-guma dor, os animais se comportam de urn jeito muito pareci-do com 0 dos humanos, e 0 seu comportamento e suficiente para justificar a convic<;aode que eles sentem dOL E verdade que, com exce<;aodos macacos que aprenderam a comunicar-se atraves de uma linguagem de sinais, eles nao tern como di-zer que estao sentindo alguma dor - mas, quando era muito nova, minha filha tambem nao falava. No entanto, ela encon-trava outras formas de tornar aparentes os seus estados inte-riores, com.0 que demo~strav~ que podemos ter certeza de que urn determmado ser esta sentmdo dor, ainda que ele nao con-te com 0 recurso da linguagem. Em apoio a nossa inferencia do comportamento animal, po-demos chamar a aten<;aopara 0 fato de que 0 sistema nervoso de todos os vertebrados, sobretudo 0 de passaros e mamiferos e basicamente parecido. As partes do sistema nervoso human~ que dizem respeito a sensa<;aode dor sao relativamente antigas em termos de evolu<;ao.Ao contrario do cortex cerebral, que so se desenvolveu plenamente depois que nossos ancestrais se dife-renciaram dos outros mamiferos, 0 sistema nervoso basico evo-luiu em ancestrais mais distantes, comuns a nos e nos outros ani-mais "superiores". Esta semelhan<;aanat6mica torna provavel que a, capacidade de sentir dos animais seja similar a nossa. E significat.ivoque nenhu.m dos motivos em que nos apoia-mos para acredItar que os ammais sentem dor se apliquem as ~lantas. Nao temos como observar urn comportamento suges-tIVOde dor - as sensacionais afirma<;oes em contrario nao se most.raram bem-fundamentadas -, e as plantas nao possuem urn sIstema nervoso centralmente organizado, como 0 nosso. as animais comem uns aos outros; por que, entiio, niio dever[amos come-los? Esta obje<;aopoderia ser chamada de "Obje<;ao Benjamin Fran~lin". Em sua autobiografia, Franklin conta que foi ve-getanano durante algum tempo, mas que a sua abstinencia de carne animal chegou ao fim quando observava alguns amigos preparando-se pa.ra frit.ar urn peixe que tinham acabado de pes- C~LQuando 0 peIxe fO!aberto, descobriu-se que tinha urn pei-xmho no seu est6mago. "Bern", disse Franklin de si para si, "ja que voces se comem entre si, nao vejo por que deixaria-mos de come-Ios." Desde entao, voltou a comer carne. Franklin foi, pelo menos, honesto. Ao contar essa histo-ria, confessou que so se deixou convencer da validade da ob-je<; aodepois que 0 peixe ja estava na frigideira, com urn "cheiro delicioso". Observou, tambem, que uma das vantagens de ser uma "criatura racional" esta no fato de se poder encontrar uma razao para tudo que se quer fazer. As respostas que po-dem ser dadas a sua obje<;ao sao tao obvias que a sua aceita- <;ao,da parte de Franklin, constitui urn testemunho mais elo-qiiente de seu gosto por peixe frito do que de sua capacidade de raciocinio. Em primeiro lugar, a maior parte dos animais que mata em busca de alimento nao conseguiria sobreviver se nao 0 fizesse, enquanto nos nao temos necessidade de comer carne animal. Depois, e estranho que os seres humanos, que normalmente encaram 0 comportamento animal como "sel-vagem", venham a usar, sempre que lhes convem, urn argu-mento do qual se po de inferir que devemos buscar orienta<;ao moral nos animais. 0 ponto fundamental, porem, e 0 de que] os animais nao sao capazes de refletir sobre as alternativas que se apresentam a eles, nem de ponderar sobre a etica de sua ali-menta<; ao. Portanto, e impossivel considerar os animais res-ponsaveis pelo que fazem, ou concluir que, pelo fato de mata-rem "merecem" ser tratados da mesma maneira. Por outro lad;, os que estao lendo estas palavras devem refletir sobre a justificabilidade de seus habitos alimentares. Nao se po de fugir a responsabilidade atraves da imita<;ao de seres que nao sao capazes de fazer essa op<;ao. As vezes, as pessoas chamam a aten<;aopara 0 fato de que os animais se comem entre si para introduzir urn ponto ligei-ramente diferente. Esse fato, pensam eles, sugere nao que os· animais mere<;amser comidos, mas, pelo contrario, que existe uma lei natural segundo a qual os mais fortes devoram os mais fracos, uma especie de "sobrevivencia dos mais aptos" dar-winiana atraves da qual, ao comermos outros animais, esta-mos simplesmente fazendo a nossa parte. Essa interpreta<;ao da obje<;aocomete dois erros basicos: urn deles, urn erro de fato, 0 outro urn erro de raciocinio. 0 erro factual esta no pressuposto de que 0 nosso consumo de carne animal faz parte do processo evolutivo natural. Isto po-
  • 10. liTICA PRATICA d~ria ser verdadeiro no caso de algumas culturas primitivas que alllda ca<;ampara obter alimento, mas nao tern nada a ver com a produ<;ao em massa de animais nas fazendas industriais. Suponh~mos; porem, que ca<;assemospara conseguir ali-mento e que IStOflzesse parte de algum processo evolutivo na-tural. Ainda haveria urn erro de raciocinio no pressupor que por ser natural, esse processo e correto. E sem duvida "na~ tura 1" que as mulheres gerem uma crian<;aa" cada ano ou dois da pUb~rdade ~ menopausa, mas isto nao significa que sej~ errado. lllterfenr nesse processo. Precisamos conhecer as leis n.aturaIs que nos afetam para podermos avaliar as conseqiien- Clas do que fazemos; mas nao temos de admitir que a forma natural de fazer alguma coisa e incapaz de ser aperfei<;oada. o fato de existir urn abismo insondavel entre os seres hu-manos ~ <:sa?imais.n~? foi questionado ao longo de quase to-da. a eXlst;ncla da clvlhza<;aoocidental. A base dessa hipotese fOl.destrUldapela descoberta darwiniana de nossas origens ani-malS e p~la conseqiiente perda de credibilidade da historia de nos~a Cna<;ao Divina, feitos a imagem de Deus com uma- al-ma lmo.rtal. Alguns acharam dificil aceitar que as diferen<;as entre nos e os outros animais sejam muito mais diferen<;as de ~rau d? ~~e.de especie. Procuraram maneiras de tra<;ar uma Illlha dlvlsona ent:e ?S ser:s humanos e os animais. Ate a pre-sente data, esses hmltes tem-se mostrado de vida curta. Por exemplo: costumava-se dizer que so os humanos usavam fer-ramentas, ate que se descobriu que 0 pica-pau das ilhas Gala-pagos usava urn espinho de cacto para arrancar insetos de bu-ra~ os ~as arvores. Depois sugeriu-se que, mesmo que outros ammaIS usassem ferramentas, os humanos eram os unicos se-re~ a fazer.em as suas. Jane Goodall, porem, descobriu que os chlmpanzes das ~orestas da Tanzania mascavam folhas para fazer uma espon]a que Ihes permitia absorver agua, e arranca-yam as fol~as dos galhos para fazer ferramentas destinadas a apanhar lllsetos. 0 usa da linguagem era outra linha limi-trofe - mas a~ora temos chimpanzes, gorilas e orangotangos aprendendo a llllguagem de sinais dos surdos, e ha indicios de que as baleias e os golfinhos podem ter uma complex a lingua-gem propria. Se essas tentativas de tra<;ar uma linha divisoria entre os seres humanos e os animais se tivessem ajustado aos fatos da situa<;ao, ainda assim nao seriam portadoras de nenhum peso moral. Como afirmou Bentham, 0 fato de urn ser nao usar al- i gum tipo de li?-guagem,nem faz~r suas fer:amentas dificilmente poderia ser VlStOcomo urn motlvo para 19norarmos 0 seu so-frimento. Alguns filosofos tern afirmado que existe uma dife-ren<; amais profunda. Segundo eles, os animais nao sao capa-zes de pensar ou raciocinar e, em decorrencia disso, nao tern uma concep<;ao ou uma consciencia de si mesmos. Vivem 0 aqui e 0 agora, e nao se veem como entidades distintas, com urn passado e urn futuro. Tambem nao tern autonomia, a ca-pacidade de escolher 0 modo como preferem viver as suas vi-das. Ja se sugeriu que os seres aut6nomos e autoconscientes sao, de alguma forma, mais valiosos e moralmente importan-tes do que os que so vivem de momenta a momento, sem ca-pacidade de perceberem-se como seres distintos que tern urn passado e urn futuro. Segundo esta concep<;ao, os interesses dos seres aut6nomos e conscientes devem, normalmente, ter prioridade sobre os interesses de outros seres. Nao YOUdiscutir, agora, se alguns animais sao conscien-tes e aut6nomos. 0 motivo dessa omissao esta em que nao creio que, no presente contexto, muita coisa dependa dessa ques-tao. No momento, estamos apenas examinando a aplica<;aodo principio da igual considera<;ao de interesses. No capitulo se-guinte, quando discutirmos as questoes relativas ao valor da vida, veremos que existem raz6es para sustentar que a cons-ciencia de si e crucial nos debates sobre 0 direito, ou nao, que urn ser tern a vida, e entao examinaremos os indicios desse ti-po de consciencia nos animais. Enquanto isso, a questao mais importante e: 0 fato de urn ser ter consciencia de si habilita-o ' a algum tipo de prioridade de considera<;ao? A alega<;aode que os seres autoconscientes tern esse tipo de prioridade so e compatlvel com 0 principio da igual consi-dera<; ao de interesses se nao for alem da alega<;aode que cer-tas coisas que acontecem com os seres autoconscientes podem ser contrarias aos seus interesses, enquanto acontecimentos se-melhantes nao seriam contrarios aos interesses dos seres que
  • 11. liTICA PRATICA nilo s~o aut.oconscientes. Isso porque a criatura autoconscien- ~~ete~la malOr c0.nsciencia do que esta acontecendo, poderia msenr 0 ~conteclmento no contexto geral de urn periodo de temp~ mars l~~go,.teria desejos diferentes, etc. Mas esta e uma quest~o qu.eJa del por certa ao iniciar este capitulo e, desde que nao seJa levada a extremos absurdos - como insistir em que, se sou autoconsciente e uma vitela nao e, 0 fato de privar-me de s~a carne traz mais sofrimentos do que privar a vitela ~e sua hberdade q: andar, esticar-se e comer grama -, nao : negada pelas cntlcas que fiz as experiencias com animais e as fazendas industriais. Seria ben: difere_ntese se alegasse que, mesmo quando urn ser aut?COnSclentenao sofresse mais do que urn ser meramen-te senclente, 0 sofrimento do ser autoconsciente e mais impor-tant~ pelo fato .de serem esses os mais valiosos tipos de ser. Isso l~trodu~ aflrm~r;oes de valor nao-utilitarias - afirmar;oes que na~ denv~m, slmplesmente, do fato de se adotar urn pon-to de vIsta umversal, do modo como foi descrito na parte fi-nal do C~pitulo 1. Vma vez que 0 argumento utilitarista ali de~envolvldo era. confessamente sujeito a provas, nao posso usa-Io para exclmr todos os valores nilo-utilitaristas. Nao obs-t~ nte, temos 0 direito de perguntar por que os seres autocons- Clentesdevem ser cons.iderados mais valiosos e, em particular, por que 0 suposto malOr valor de urn ser autoconsciente deve resultar er.ndar preferencia aos interesses menores de urn ser autoconsclente em detrimento dos interesses maiores de urn ser me:ame:rte se~cien~e,mesmo quando a autoconsciencia do pri-melro nao esta ~mJogo. Este ultimo ponto e importante, pois, no momento, nao ~stamos examinando casos em que as vidas dos seres autocons~lentes estilo em risco, mas sim casos em que os seres ~utoconscl~ntes continuarao vivos e com as suas fa-culdad. e l~ta.ctas, seJa qual for a nossa decisao. Nesses casos, se a eXlstencrada autoconsciencia nao afeta a natureza dos in-te: esses _emcotejo, nao fica claro por que deveriamos forr;ar a l~clusao da aut~consciencia na discussao, nem por que de-v~ namos forr;ar a mclusao de especie, rar;a ou sexo em discus-soes semelhantes. Interesses sao interesses e devem ser consi-derados ~or i~ual- sejam eles os interesses de seres humanos ou de ammalS, com ou sem consciencia de si. Ha outra resposta possivel a afirmar;ao de que a autocons-ciencia, a autonomia, ou qualquer caracteristica semelhante, po-dem servir para distinguir os seres humanos dos animais: lem-bremo- nos de que existem seres humanos com deficiencias men-tais que podemos considerar menos autoconscientes ou autono-mos do que muitos animais. Se usarmos essas caracteristicas pa-ra colocar urn abismo entre os seres humanos e outros animais, estaremos colocando esses seres humanos menos capazes do ou-tro lado do abismo; e, se 0 abismo for usado para marcar uma diferenr;a de status moral, entao esses seres humanos teriam 0 status moral de animais, e nilo de seres humanos. Esta resposta e forr;ada, pois a maior parte de nos acha horrivel a ideia de usar seres humanos com deficiencias men-tais em experiencias dolorosas, ou de engorda-Ios para fins gas-tronomicos. Alguns filosofos, porem, tern afirmado que essas conseqiiencias nilo decorreriam realmente do usa de uma ca-racteristica como a autoconsciencia, ou a autonomia, para dis-tinguir os humanos de outros animais. Vou examinar tres des-sas propostas. A primeira sugestilo e que os seres humanos com graves deficiencias mentais, que nao possuem as aptidoes que distin-guem 0 ser humano normal dos outros animais, devem, nao obstante, ser tratados como se as possuissem, uma vez que per-tencem a uma especie cujos membros normalmente as possuem. Em outras palavras, a sugestao e que tratemos os individuos nilo de acordo com as suas verdadeiras qualidades, mas de acor-do com as qualidades que sao normais na sua especie. E interessante que essa sugestao seja feita para defender o argumento de que os membros de nossa especie devem ser mais bem-tratados que os de outras especies, ao passe que se-ria firmemente rejeitada caso a usassemos para justificar urn tratamento dos membros de nossa rar;a ou sexo melhor que o dispensado aos membros de outra rar;a ou sexo. No capitulo anterior, ao discutir 0 impacto de possiveis diferenr;as de Q.I. entre membros de grupOS etnicos diferentes, fiz a afirmar;ao obvia de que, seja qual for a diferenr;a entre as pontuar;oes me-dias de grupos diferentes, alguns membros do grupo com a pon-tuar; ilo media mais baixa vao sair-se melhor do que alguns membros de grupos com a pontuar;ao media mais alta, e de que, portanto, devemos tratar as pessoas como individuos, e
  • 12. liTICA FRATICA nao de aco~do com 0 ~ivel medio de seu grupo etnico, quais-q~ er que seJam as explrca<;oesdessa media. Se aceitamos isso nao podemos, coerentemente, aceitar a sugestao de que, ao li~ darmos com seres humanos com graves deficiencias mentais dev~~os as~egurar-Ihes 0 status ou os direitos normais de su~ es~ecle. POlSqual e 0 significado do fato de que, desta vez, a lmha ~ev: ser tra<;ada.ao.r~dor da especie, e nao da ra<;aou do sex? ~~o podemos mSlstIr em que os seres sejam tratados como mdlvlduos no primeiro caso, e como membros de urn ~rup? no outro. A condi<;ao de membro de uma especie nao e malS relevante, nessas circunsUincias, do que a condi<;ao de pertencer a uma ra<;a ou a urn sexo. Vma segunda sugestao e que, muito embora os seres hu-m_ anosco~ gra;res deficiencias mentais possam nao ter apti-does supenores as dos outros animais, ainda assim eles saDse-r~ s.human<:s e, enquanto tais, temos com eles liga<;oesespe-clms que ~ao temos com os outros animais. Como escreveu urn resenhlsta de Animal Liberation: "A parcialidade para com a nossa p:opria espec~ee, dentro dela, para com grupos bem menores e, como 0 umverso, uma coisa que seria melhor acei-tarm, o~. (... ~0 perig?~: uma tentativa de eliminar as afei<;oes parCla!S_esta na posslbllrdade de se destruir a origem de todas as afewoes." . J?sse ~rgumento liga fortemente a moralidade as nossas afe~<;oes.E claro que algumas pessoas podem manter, com 0 n:ms consumad.o e irr~versivel dos doentes mentais, urn rela-clOnamen~ omms estre,lto do que manteriam com qualquer ani- ~al, e sena abs~rdo dlzer-Ihes que devem abrir mao desse sen-tIme~ to. Elas slmplesmente tern esses sentimentos e, enquan-to tms, nao ha nele~ nada de born ou de mau. A questao e sa-ber se devemos aceltar que as nossas obriga<;oes morais para c~m .um ser d~l?endam desse modo dos nossos sentimentos. E publrco e notono que alguns seres humanos se relacionam me-l~ or com 0 se.ugato do que com os seus vizinhos. Os que asso-c: am a morahdade as afei<;oesaceitariam que essas pessoas es-tao certas quando, durante urn incendio, tentam primeiro sal-var os seus gat~s, e so depois os vizinhos? E, acredito, mesmo aqueles que estao preparados para dar uma resposta afirmati-va a essa p~rgunta nao desejariam concordar com os racist as para os qums, se as pessoas mantem rela<;oesmais naturais co~ outras de sua propria ra<;a e por elas sentem maior afei<;ao, estao certas ao darem preferencia aos interesses de outros mem-bros de sua propria ra<;a. A etica nao exige que eliminemos as rela<;oespessoais e as afei<;oesparciais, mas exige que, em nossas a<;oes,levemos em conta as reivindica<;oes morais dos que saDafetados por elas, e que 0 fa<;amoscom urn certo grau de independencia de nossos sentimentos por eles. A terceira sugestao invoca 0 argumento bastante difundi-do da "ladeira escorregadia". Na base desse argumento esta a ideia de que, uma vez que ja demos urn passo em certa dire- <;ao,estaremos numa ladeira escorregadia e teremos de escor-regar mais do que seria a nossa vontade. No presente contex-to, 0 argumento e usado para sugerir que precisamos de uma linha nitida para separar os seres com os quais podemos fazer experiencias, ou que podemos engordar para comer, daqueles com os quais nao podemos fazer tais coisas. A condi<;ao de membro de uma especie estabelece uma linha divisoria bem ni-tida, ao mesmo tempo em que os niveis de autoconsciencia, de autonomia ou sensibilidade nao 0 fazem. Ainda segundo o argumento, se admitirmos que urn ser humano com deficien-cias mentais nao tern urn status moral superior ao de urn ani-mal, ja teremos come<;ado a deslizar por uma ladeira cujo ni-vel seguinte e a nega<;ao dos direitos dos desajustados sociais e cujo fundo e urn governo totalitario, que descarta os grupos que nao the agradam classificando-os de subumanos. o argumento da ladeira escorregadia pode ser uma valio-sa advertencia em alguns contextos, mas nao resiste muito. Se, como afirmei neste capitulo, acreditamos que 0 status espe-cial que hoje atribuimos aos humanos permite que ignoremos os interesses de bilhoes de criaturas sencientes, nao devemos dissuadir-nos de tentar corrigir essa situa<;aopor causa da me-ra possibilidade de que os principios em que fundamentamos essa tentativa serao mal utilizados por governantes inescrupu-losos em seu interesse. E nao passa de uma possibilidade. A mudan<;a que sugeri poderia nao fazer diferenp alguma para o tratamento que dispensamos aos seres humanos, ou pode-ria, ate mesmo, aperfei<;oa-Io. No fim, nenhuma linha etica arbitrariamente tra<;ada po-de ser segura. 0 melhor sera encontrar uma linha que possa ser defendida aberta e honestamente. Quando discutirmos a
  • 13. cutanasia no Capitulo 7, veremos que uma linha tra<;ada no lugar errado po de ter resultados funestos, ate mesmo para os que se situam no lado mais alto, ou humano, desta linha. Tam-bem e importante lembrar que 0 objetivo do meu argumento e elevar 0 status dos animais, e nao diminuir 0 dos sereshu-manos. Nao desejo sugerir que os deficientes mentais devam ser for<;ados a ingerir alimentos com corantes ate que a meta-de deles mona - ainda que, sem duvida, no que diz respeito a saber se a substancia e ou nao segura para os seres huma-nos, este procedimento certamente nos daria indica<;6es mais precisas do que 0 teste feito com coelhos ou cachorros. Gosta-ria que a nossa convic<;ao de que seria err ado tratar os defi-cientes mentais dessa maneira fosse transferida para os ani-mais nao-humanos em niveis semelhantes de autoconsciencia e com uma capacidade semelhante de sofrimento. E excessi-vamente pessimista abster-se de tentar modificar as nossas ati-tudes com base na ideia de que poderiamos come<;ar a tratar o~ deficientes mentais com a mesma falta de considera<;ao que dlspensamos aos animais, em vez de tratar estes ultimos com a maior considera<;ao que dedicamos aos seres humanos com deficiencias mentais. Na mais antiga obra de filosofia moral que a tradi<;ao oci-dental nos legou, a Repziblica de Platao, encontramos a se-guinte concep<;ao da etica: Afirmam que, por natureza, cometer injusti<;ase born e sofrer uma injusti<;ae mau; mas tambem se afirma que hi mais mal na ultima do que bem na primeira. Portanto, quando os homens tiverem feito e sofrido a injusti<;a,e tiverem a experiencia de ambas as coi-sas, todos os que nao forem capazes de evitar uma e obter a outra pensarao que fariam melhor em concordar que 0 melhor e nao ter nenhuma; em decorrencia disso, come<;ama criar leis e con- ;en<;6es ~utuas; e chamam de legitimo e justo tudo aquilo que e determmado pela lei. E essa, afirma-se, a origem e a natureza dajusti<;a - trata-se de urn meio-termo, entre amelhor das alter-nativas, que e cometer injusti<;a e nao ser punido, e a pior delas, que e sofrer injusti<;a sem 0 poder de retalia<;ao. IGUALDADE PARA OS ANIMAlS? Nao era este 0 ponto de vista do pr6prio Platao; ele 0 co-loca na boca de Glauco para permitir qu~ S6crates, 0 pr~ta-gonista do seu dialogo, possa refuta-Io. E urn po~to de ~Ista que nunca teve aceita<;ao geral, mas que nem por ISS,od~I~OU de existir. Ecos dele podem ser encontrados nas teon~s etIcas de fil6sofos contemporaneos como John Rawls e DavId o.au-thier e tern sido usado, por estes e outros fil6sofos, para JUs-tific~ r a exclusao dos animais da esfera da etica, ou, pelo me-nos, de sua parte central. Pois, se a base da etica esta em que eu me abstenha de fazer coisas mas aos outros, desde que ta~- bem nao me fa<;am nada de mau, nada justifica que eu p.ratI-que esses atos contra aqueles que sao incapazes de apreCl~r a minha absten<;ao de tais praticas e controlar, em conformIda-de com ela sua conduta com rela<;ao a mim. De urn modo ge-ral, os ani~ais pertencem a essa categoria. Quando :stou sur-fando bem longe da praia e urn tubarao me ataca, mmha con-sidera<; ao para com os animais de nada ~e valera; e provave~ que eu seja comido com a mesma voracIdade com que 0 sera o pr6ximo surfista, ainda que ele passe todas as tardes de do-mingo dando tiros nos tubar6es de den~ro de um barco. Co-mo os animais sao incapazes de atos reCIprocos, eles ~e ~ncon-tram, de acordo com esse ponto de vista, fora dos lImItes do contrato etico. Ao levarmos em conta essa concep<;ao da etica, devemos fazer uma distin<;ao entre as explicar6es da origem ~os j~izos eticos e asjustijicar6es desses mesmos juizos. A explIca<;ao da origem da etica, em termos de urn contrato tacito entre as pes-soas tendo em vista 0 seu beneficio mutuo, tem.u~a certa ?~au-sibilidade (ainda que, em vista das norm as SOCIalSqu~se-etIcas que se tern observado nas sociedades de outros mamIfer?s, na verdade se trate de uma fantasia hist6rica). Mas podenamos aceitar esse relata como uma explica<;ao hist6rica sem que, ao mesmo tempo, nos comprometessemos com qu~isquer .c?ncep~ <;6es a respeito do carater justo ou injust? do sIste~a etIco ?~I resultante. Por mais interesseiras que seJam as ongen~ da etI-ca, e possivel que, uma vez que come<;amos a pensar etIca.men-te, somos levados alem dessas premissas mundan.as. POlS ~o-mos capazes de raciocinio, e a razao na~ ~ subordmada ao m-teresse pessoal. Ao refletirmos sobre a etIca, estamos us~ndo conceitos que, como vimos no primeiro capitulo deste lIvro,
  • 14. nos levam alem do nosso interesse pessoal, ou mesmo do inte-r~ sse de algum grupo especifico. De acordo com 0 ponto de vIsta contratual da etica, esse processo de universalizal;:ao de-ve deter-se nas fronteiras da nossa comunidade· mas uma vez iniciado 0 processo, podemos descobrir que na~ seri'a coeren-te com as nossas outras convicl;:oesparar nesse ponto. Assim como os primeiros matematicos, que podem ter comel;:ado a contar. para manter-se informados do numero de pessoas de su~s tnbos, nao faziam a menor ideia de estarem dando os pri-melros passos num caminho que levari a ao caIculo infinitesi-mal, a origem da etica nada nos diz a respeito de onde ela vai terminar. Ao nos voltarmos para a questao da justifical;:ao, pode-mos ver que as consideral;:oes contratuais da etica tem muitos problemas. Claramente, tais consideral;:oes excluem da esfera etica muito mais do que os animais. Vma vez que os seres hu-manos com deficiencias graves sao igualmente incapazes de um comportamento reciproco, devem ser tambem excluidos. 0 mesmo se aplica aos bebes ou as crianl;:as muito novas; mas os problemas da concepl;:ao contratual nao se limitam a esses c~sos especiais. De acordo com essa concepl;:ao, a principal ra-zao para se celebrar 0 contrato etico e 0 interesse pessoal. A menos que um novo elemento universal seja introduzido, um grupo de pessoas nao tem motivos para lidar eticamente com outro, desde que nao seja de seu interesse faze-Io. Se levarmos ~s~oa serio, teremos de rever drasticamente os nossos juizos etIcos. Por exemplo: os traficantes de escravos que levaram escravos africanos para a America nao tinham nenhuma ra-zao pessoal para tratar os africanos melhor do que tratavam. Os africanos nao tinham como retaliar. Se fossem contratua-listas, os traficantes de escravos poderiam ter contestado os abolicionistas, explicando-Ihes que a etica para nas fronteiras da comunidade e, como os africanos nao pertencem a sua co-munidade, nao tem quaisquer obrigal;:oes para com eles. Nao sao apenas as praticas antigas que seriam afetadas se 0 modelo contratual fosse seriamente adotado. Ainda que as pessoas falem tanto sobre 0 mundo de hoje como uma uni-ca comunidade, nao ha duvida de que no Chade, por exem-plo, 0 poder do povo para retribuir tanto 0 bem quanta 0 mal que, digamos, lhes fazem os cidadaos do Estados Vnidos , e l11uitolimitado. Assim, nao parece que a concepl;:ao contra-lual estabelel;:aquaisquer obrigal;:oesda parte das nal;:oesricas para com as mais pobres. Mais surpreendente do que tudo e 0 imp acto do modelo contratual sobre a nossa atitude diante das geral;:oesfuturas. "Por que devo fazer alguma coisa para a posteridade? 0 que C que a posteridade fez para mim?" seria 0 ponto de vIsta que deveriamos assumir se aqueles que podem exercer um compor-tamento reciproco estivessem dentro da esfera da etica. Os que vao estar vivos no ana 2100 nao tem como tomar as nossas vidas melhores ou piores. Portanto, se as obrigal;:oes so exis-tem onde pode haver reciprocidade, nao precisamos nos preo-cupar com problemas como 0 manejo do lixo nuclear. E ver-dade que uma parte do lixo nuclear continuara sendo mortal durante duzentos e cinquenta mil anos, mas, desde que 0 co-loquemos em conteineres que 0 manten~~m lo~ge de no,s por cem anos, teremos feito tudo 0 que a etIca eXIgede nos. Esses exemplos devem ser suficientes para mostrar que, seja qual for a sua origem, a etica que temos hoje realmente vai alem de um tacito entendimento entre seres capazes de re-ciprocidade. A perspectiva de retomar a tal ?ase n~o sera, .ima-gino, atraente. Vma vez que nenhuma consIdera~ao da onge~ da moralidade nos forl;:aa basear a nossa morahdade na reCI-procidade, e uma vez que nenhum outro argumento em favor dessa conclusao foi oferecido, devemos rejeitar essa concep-l;: aoda etica. .. A esta altura da discussao, alguns teoncos contratUaIS re-correm a uma concepl;:ao mais flexivel da ideia de contrato, instando conosco para que incluamos na comunidade moral todos aqueles que tem, ou terao, a capacidade de fazer parte de um acordo reciproco, sem levar em consideral;:ao 0 fato de eles serem, ou nao, capazes de reciprocidade e independente-mente tambem de saber quando terao essa capacidade. Cla-ramente essa c~ncepl;:aonao mais se baseia em reciprocidade alguma,' pois (a menos que tenhamos uma preocupal;:ao o~- sessiva com a limpeza do nosso tumulo, ou com a preserval;:ao de nossa memoria ate 0 fim dos tempos) as geral;:oesfuturas evidentemente nao tedo como estabelecer relal;:oesreciprocas conosco, ainda que algum dia adquiram ?- capacidade de um comportamento reciproco. Contudo, se os teoricos do contra-
  • 15. to abandonam desse modo a reciprocidade, 0 que sobra do mo-tivo do contrato? Por que adota-Io? E por que restringir a mo-ralidade aqueles que tern a capacidade de fazer acordos conos-co, se, de fato, nao existe possibilidade alguma de que venham urn dia a faze-Io? Em vez de nos aferrarmos as ruin as de uma concep<;ao contratual que perdeu a sua essencia, seria melhor abandomi-Ia de vez e, com base na universabilidade, refletir sobre quais seres devem ser incluidos na esfera da moralidade~
  • 16. Titulo original: PRACTICAL ETHICS - Second Edition, publicado POI' Press Syndicate of the University ofCambn'dge. Copyright © Cambridge University Press, 1993. Copyright © 1993, Liwaria Martins Fontes Editora Ltda., Sao Paulo, para a presente edifao. 1'" edi«;ao fevereiro de 1994 3!! edi«;ao setembro de 2002 1. Sobre a etica . 2. A igualdade e suas implica<;6es . / 3. Igualdade para os animais? . 4. 0 que hi de err ado em matar? . 5. Tirar a vida: os animais . -6: Tirar a vida: 0 embrHio e 0 feto . 7. Tirar a vida: os seres humanos . 8. Ricos e pobres . 9. Os de dentro e os de fora . T 10. 0 meio ambiente . 11. Fins e meios . 12. Por que agir moralmente? . Revisao da tradUl;ao Eduardo Branddo Revisao grafica Marise Simoes-Leal Silvana Cohucci Leite Produ«;ao grafica Geraldo Alves Composi«;ao Antonio Cruz Dados Internacionais de Cataloga~ao na Pnblica¢o (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Singer, Peter Etica pratica / Peter Singer; tradw;ao-Jefferson Luiz Camargo]. - 3!!ed, - Sao Paulo: Martins Fontes, 2002, - (Colerrao biblioteca universal) Apendice: Sobre ter sido silenciado na Alemanha 355 Notas, rejerencias e leituras complementares 379 Indices para catilogo sistematico: I, Etica: Filosofia 170 Todos os direitos desta edir;lio para 0 Brasil reservados a , Livraria Martins Fontes Editora Ltda. Rua Conselheiro Ramalho, 3301340 01325-000 Slio Paulo SP Brasil Tel. (11) 3241.3677 Fax (11) 3105.6867 e-maiJ: info@martinsfontes.com.br http://www.martinsfontes.com.br 9 25 65 93 119 145 185 229 261 279 305 331