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1
6 lendas da Região de Leiria
A Senhora da Gaiola
A tomada do castelo de Leiria
(a partir das lendas do Corvo de Leiria e da princesa Zara)
As Três portas da Sé
A Lenda da Ponte Cavaleiro
A Fonte da Barroquinha
Versão dramática de
Constantino Mendes Alves
2
A Senhora da Gaiola
Por Constantino Alves
Algures na Lusitânia
O público entra e está em cena um mouro que canta, só quando o
público se cala, entretanto um músico toca tambor mouro (musica
berbere).
Apaga-se a luz da sala.
Mouro canta: Fatuma, Fatuma, quereis saber de mim?, fiquei em
alma no deserto chamando por ti. (Faz variações de voz com a
palavra Fatuma que serve de refrão.)
Entram dois soldados mouros com um homem cristão agarrado,
preso
Cena 1
Soldado um: Por Maomé, vai chamar o califa, encontrámos o
traidor
O cantor sai, o músico ajuda o soldado dois a amarrar o cristão.
Soldado dois: Não perdes pela demora, o que acabaste de fazer
vai-te perder, cristão (cospe-o, depois de o amarrar)
Músico: (voz finíssima, fracote) estes cristãozitos deviam ser todos
mortos (medricas vai a medo pisar o cristão, dá-lhe beliscões a
fugir, com medo)
Entra o califa com o soldado um (se possível com outros mouros)
Califa: com quem então és tu? O que sabes do tesouro? Onde
está? Diz responde, agora não te resta mais nada que a vida. A tua
3
mulher já pertence ao meu harém, poderei agora desfrutar dela, a
tua filha dei-a ao meu cunhado que, sabes, está muito agradado
com ela, beija como ninguém. Quere-las de volta? Responde ao
que te digo, onde está o tesouro? Quem o guarda?
Cristão: Nada responderei.
Califa: não? Pensas que escapas à morte? Que vem o teu Deus
salvar-te?
Cristão: O meu Deus é o teu também.
Califa: pois, Alá, é o que queres dizer?
Cristão: Deus pai todo-poderoso, senhor de todo Universo, deus só
há um, o teu Alá, é Deus, o seu Filho, Jesus Cristo filho de Maria
(levanta a cabeça ao céu)
Califa: injuriador, dêem-lhe.
Soldados batem no cristão.
Califa: Já não estás na tua terra, cristão. Isto agora é território
almoâda e berbere. Os teus santos morreram com a nossa vitória
sobre os reis Cristão. Quem não professar a nossa religião, de
Maomé, (agacha-se em sinal de vénia), será morto, ou vem para a
nossa religião. Muitos como tu aprenderam a amar Maomé, o nosso
profeta (vénia), aprenderam o Corão e agora são dos nossos. Claro
com derrotados, os vossos bens pertencem-nos, as vossas
mulheres (ri-se), não é isto que se faz quando se vence outro povo,
outro país? O que fariam vocês de nós? … a mesma coisa por
certo, Neste tempo de guerra não há piedade. (pede um assento,
senta-se, bebe um gole de vinho)
Tendes bom vinho aqui na terra, como se chama esta terra?
Soldado dois: Cortes, alteza. Uma terra de bom fruto, no que se
refere ao vinho, por contrário, temos recebido enorme resistência
deste povo, que parece amar mais os seus santos que a própria
terra, a própria vida.
4
Califa: (dirigindo-se a um conselheiro): o que sabeis desse tesouro,
que teimam em esconder?
Conselheiro: É um diz-se, diz-se, que vale mais que a própria vida,
a julgar pela maneira como defendem o segredo, não conseguimos
arrancar qualquer palavra a ninguém, até agora…o que se diz é que
é melhor que oiro, de uma matéria que brilha mais que a fé, de um
valor mais que vida, é o que sabemos, pensamos que se trata de
um antigo tesouro guardado, que pertencia a antigos chefes
Lusitanos.
Califa: Pois esses chefes Lusitanos, que eles tanto prezam, já ouvi
falar de um antigo chefe, Um Vi..riato, parece-me que era muito
valente, um forte guerreiro, devia era ser um medricas como todos
os Lusitanos e cristãos, o que sabeis deste homem?
Conselheiro: Foi dos primeiros a dizer que rezava já a Maomé
(vénia), era nosso colaborador, mas viemos a descobrir que
ajudava à fuga de outros cristãos, e sabe-se, que uma noite destas,
num luar de lua cheia, foi visto com outros homens carregando um
grosso fardo, julgamos que é o tesouro.
Califa: Vai, não me faças perder tempo, as minhas mulheres, a tua
mulher esperam-me, uma tarde amor.
Responde, onde está o tesouro?
Cristão (magoado com tantas vergastadas). Não te digo, não
responderei, só te digo que é oiro que nunca conseguirás ver, tens
ambição, maldade, liberta a minha mulher e filha, elas não têm nada
a ver com isto. (silêncio) (à parte) Que deus e Jesus Cristo me
perdoem, é por Vós, (ergue a cabeça novamente ao céu), que me
sacrifico, Senhor olhai pela minha família, que eu não posso negar-
Te (um soldado mata-o)
Cena 2
Uma feira nas Cortes. Gentes que vendem, outras compram,
miúdos brincam com uma bola de trapos. Soldados mouros vigiam.
Ouvem-se alto os seguintes à partes, sem que os soldados ouçam.
5
Vendedora um (para um cliente): Que ela já lá está!
Cliente um, para um garoto: vai diz que ela já lá está!
Garoto para outra cliente: Sra., que ela já lá está!
(Por aí fora, o segredo anda de boca em ouvido)
Soldado um: agarra um garoto: Anda cá miúdo, o que andas a
dizer ?
Miúdo: Que o vinho é bom, que pode ser comprado, e as maçãs
também, o Sr. Mouro não quer, eu dou-lhe uma, rouba uma maçã
do vendedor, soldado um come a maçã, o vendedor dá pela falta da
maçã, gera-se a confusão, atrás do garoto, todos perseguem, o
garoto esgueira-se por todo o lado, depois saem atrás do miúdo.
Fica só o soldado.
Come outra maçã da banca deserta.
Soldado um: depois de ter comido: boa maçã, bom vinho, bebe de
um fole, bons ares respira, bom sol, leva outra maçã, ao sair deixa
sair um som estranho do cu.
Cena 3
Tudo escuro.
Vozes na escuridão:
(ouve-se de vários locais do palco)
- É hoje
- É agora
- É já
- Vem
- Espera por mim
- Eu também quero ir
- Oh virgem santíssima eu vou chamar a minha irmã
- Acende, vá
- Espera
- Vá
(uma a uma acendem-se 10 velas)
6
- É pesado
- Mas precioso
- Vê lá se vem alguém
- Todos em fila, só eu sei o caminho
(as luzes em fila indiana)
- Estás-me a pisar, ai
- Desculpa
- Isto é a maior aventura em que me meti
- Estamos em perigo de vida
- Temos de falar baixo
- Ninguém nos pode ouvir
- a nossa carga
- Calado, ninguém pode ouvir
- Cuidado com ela
- É pesado
- É por aqui
- Não é por ali
(andam só com o som dos grilos, em silêncio)
- É aqui
- Upa
- Agora é que é
- Os mouros nunca descobrirão isto
- Ninguém,
- Fizemos um bom trabalho
- Rezemos
- Rezam uma avé Maria
- Vamos embora
- É para já.
(apagam-se as velas ao mesmo tempo)
7
Cena 4
Um pastor com o seu rebanho. Faz mímica, ouvem-se balidos de
ovelhas.
O pastor canta
Pastor – Viva, viva El rei de Portugal.
Afonso I, guerreiro sem igual,
Vai mouro, vai para alá,
Que já o cristão manda cá.
(Repete)
Meu amor eu vou para a guerra,
Contra o mouro do deserto,
Para cuidar da nossa terra,
Onde viver contigo perto.
(Repete o refrão)
Ai amor, tem piedade
De mim e não do mouro,
Não olhes com caridade
Quem guerreia por amor.
(refrão)
(um cão inexistente cheira uma árvore)
Pastor: o que cuidais aí? A que te cheira?
Será coelho, ou pássaro?
Ai reinador outra vez a brincar?
Nota qualquer coisa na árvore.
Pastor: Mas o que é isto? (olha para dentro da árvore) Ai nossa
Senhora!
(sai uma luz forte da árvore, vê-se uma imagem de nossa Senhora)
pastor ajoelha-se, ouve-se uma música crescendo, alta, forte.
8
Pastor reza:
Ai senhora, Senhora, pelos santos e o céu,
Vinde alumiar o meu caminho
Por tanto pecado eu tenho tido.
Deita-se, beijando o chão, ai milagre de todo o céu, juro com fé em
todo o mundo,
Depois refaz-se, corre de um lado para outro a ver o que há-de
fazer.
Arranja, umas canas e uns paus, faz um altar, e uma jaula para a
imagem de nossa Senhora.
Entupido de espanto, tenta falar, não consegue, tenta, tenta, até
que consegue soltar a voz.
Pastor: Oh gente, ou boa gente de Cortes, que aconteceu um
milagre, A senhor desceu do céu, sai
Entra logo muita gente
Todos juntos ao mesmo tempo
Multidão: Ah a Senhora, A senhora da Gaiola, ajoelham-se e rezam
Fim
9
A tomada do castelo de Leiria
( a partir das lendas do Corvo de Leiria e da princesa Zara)
Por Constantino Mendes Alves
Cena 1
Ano de 1135 DC
Sons de batalha, gritos, trompas
Abre o pano ou acende-se a luz
No fundo o cenário, módulo/painel, do castelo de Leiria, ao lado em módulo
independente uma árvore de grande porte.
Mouros e Portugueses lutam em dura e encarniçada batalha
Devem lutar com espada (adagas e espadas), deve fazer coreografia adequada,
por vezes perto do caricato mas nunca resvalando totalmente para isso (alguns
truques como girar em 360º, fugir entre as pernas do inimigo, prender a
espada no chão, espetada ou por vezes sem espada lutar de corpo contra
corpo), (devem gritar uns, “por Alá”, “pelo profeta”, “pelo sagrado Corão”,
“morre infiel”, “por Portucale”, “pelo rei”, “por Deus”, “por Cristo”, “morre
infiel”)
Deve haver bandeiras, o crescente, e a bandeira da independência do tempo de
D. Afonso Henriques (branca com uma cruz azul)
Toca uma trompa, as tropas portuguesas retiram (saem de cena), os mouros
gritam por Vitória, dando vivas ao profeta e Alá
Califa: Por hoje já têm a sua conta. Alá esteve connosco hoje,
vamos celebrar, tenho dito.
Transporta-se os feridos.
Cena 2
Começam a tocar tambores berberes, mulheres dançam, a maior parte dos
árabes senta-se no chão.
No meio da dança, baixa-se o som dos tambores
Cavaleiro árabe, para o Califa. Afonso insiste, malvado cristão, não
tem medida a sua ambição.
Califa, que fuma cachimbo árabe: Pois (parece inebriado com o fumo)
Cavaleiro árabe: Apesar de tudo foi uma luta aguerrida,
encarniçada.
Califa: Pois (entre uma baforada de fumo)
Cavaleiro árabe: Mas o nosso Deus é maior do que o deles…
Califa: Pois!
Cavaleiro árabe: Alá está connosco (grita, levanta-se)
10
Todos: Alá, Alá, Alá!
Califa, sempre sentado alheio a tudo: Pois!
Cavaleiro árabe, sentado novamente, dirige-se novamente ao Califa: Com
o sagrado comando de Alá nunca perderemos o castelo de Leiria.
Califa: Pois!
Cavaleiro árabe, vira-se para a lateral do teatro: Já não tenho mais
deixas, o que faço, ele não responde!
Voz vinda de fora: Tirem-lhe a ganza.
Cavaleiro árabe tira o cachimbo ao Califa. O Califa, acorda um pouco, levanta-
se
Califa: Por hoje é tudo boa noite, que Alá esteja,
rebéubéu,béu,béu, isso por aí fora (quando sai ainda se ouve) Eh pá
estou mesmo ganzado.
A festa desfaz-se, cada um vai para seu lado, rindo-se, cantando-se, agarrando
nas dançarinas.
Fica a cena vazia, ouve-se uma melodia árabe muito baixinho, a luz
diminui de intensidade, apenas o castelo iluminado, e
provavelmente uma lua de luz no ciclorama.
Cena 3
Entra Zara, na ameia do castelo, entoa uma canção:
Zara: Ai mouro, meu cavaleiro,
como me deixas neste cativeiro,
já o sol do deserto me fez nascer tão só.
(repete várias vezes)
Do outro lado do palco, aproximam-se dois cavaleiros portugueses, como que
chamados por aquela sublime voz. Olham Zara. Um é jovem outro mais velho e
barbudo.
Jovem cavaleiro: Sublime voz, olhai o cabelo à lua, tão belo…
Barbudo: É Zara, a filha do Califa, é moura, tira daí ideias…
Jovem cavaleiro: A beleza não conhece o sangue, nunca vi
mulher tão bela.
Barbudo: Bonita é, não há dúvida, anda, vamos embora não é para
o teu dente, nem o meu (aproveita para mexer num dente que tem quase
a cair) Olha este está mesmo a ir embora!
11
Jovem Cavaleiro: Vou-me aproximar, quero vê-la inteira.
Barbudo: Não ides, anda por ai moirama, tem cuidado, não te
chegou a tareia de hoje, ainda me doem as costas (o jovem aproxima-
se sem que este dê conta), levei uma carga de porrada, Ena pá, eram
mais de cinco (olha para a mão) um, dois (conta pelos dedos) três,
quatro, olha falta-me um dedo, ah não está aqui o gorduchinho (fala
com os dedos) então não sabia de ti, igualzinho ao dono,
gorduchinho, vem para o pé dos outros, um, dois, três, quatro cinco
assim é que é, eram cinco… (olha para o lado e não vê o jovem) … eh
lá, onde estás … (procura) Vem para aqui (fala em surdina mas muito
irado) O que vais fazer, vais-te matar, prometi à tua mãe que
tomava conta de ti, (aparte) Ai se a Dona Ana me vir sem ele, enfia-
me no poço ou aperta-me o pescoço (desfaz o aparte) vem cá, raios,
vou buscar reforços… (sai)
O jovem põe-se por baixo do castelo, onde está Zara.
Jovem cavaleiro: Se eu pudesse vê-la melhor, esta doce cotovia
que faz esquecer a noite, parece antecipar o dia com tamanha
beleza.
Jovem imita o som do grilo. Zara pára de cantar, parece querer ouvir os sons
da noite.
Afonso imita o som do grilo.
Princesa Zara, debruçando-se na amurada: Ai que noite cheia, que luz a
tua lua, pareces amar tão cheia. Que som lindo, os grilos, depois da
guerra parecem anunciar a paz, a calma (sonhadora), que quereis
Senhor grilo, quereis casar, aqui está esta princesa pronta a amar.
Cavaleiro jovem: Ah! Se ela soubesse, que o grilo lateja de amor,
Ai que linda noite!
Zara: Ai que linda noite, e o cheiro de alecrim, as plantas também
vieram à noite? Ai que belo casamento se está a pôr, o meu noivo,
o sério grilo que lateja de amor, a lua, a madrinha que faz cor, e as
plantas, com Sr., alecrim no seu odor a convidar-me a dizer sim,
ah!Ah! (ri-se, romântica e feliz)
Jovem cavaleiro: Como é linda esta bela rosa, que o seu espinho
seja só ela ser moura. Vou falar com ela, é para já.
O grilo diz também que sim, (mostra-se à princesa).
12
A princesa surpreende-se
Zara: Quem é lá?
Jovem cavaleiro: Sou o grilo apaixonado pela mais bela rosa de
um só espinho.
Zara: Olha bem para ele, (o luar incide bem na cara dele, ela ri-se
envergonhada e diz), sois belo, grilo, tão belo como o teu cantar
apaixonado, era por mim?
Jovem cavaleiro: Não há outra rosa de que eu possa estar
apaixonado, ela tem um só espinho de que eu não me posso
enganar.
Zara: Que espinho? (olhando para ela própria)
Jovem cavaleiro: É de estares do outro lado, desta muralha, quer
dizer de outra bandeira, que eu quebrarei se me quiseres aí a teu
lado.
Zara: Que súbito (ri-se) e não tenhais medo de perder a cabeça, o
mouro pode vir de qualquer lado.
Jovem cavaleiro: Já a perdi, por tão bela rosa do Califado, deixai-
me subir…
Zara: Se não tinhais medo subi, quero ver-te aqui.
Jovem sobe.
(Olham-se nos olhos, jovem pega-lhe na mão leva-as ao rosto dela),
Jovem cavaleiro: Nunca vi olhos mais belos, duas estrelas de
esmeralda, aqui perto, o meu coração está certo, bate para o teu
lado.
Zara: Que galante, jovem português, não tens rodeios nem
porquês. O teu amor é verdadeiro?
Jovem cavaleiro: Tão verdadeiro como esta lua que te deixa ver
por inteiro.
Zara: Não falais da Lua incerta, jura-me primeiro, que me amas
Com o coração que é mais verdadeiro.
Jovem, beija-a subitamente.
Ouve-se uma voz fora do Califa: Oh Zara, Zarinha, Zara, não me
ouves?
Zara: depressa vai-te embora vem lá meu pai.
Jovem atira-se para baixo, esconde-se
13
Entra o Califa: Ah! Estás aqui, não viste o meu cachimbo? Não sei
onde o pus, queria fumar daquilo outra vez, era cá uma, mas que
raio onde o pus.
Zara: Não meu pai, aqui só está a lua e um grilo a cantar
Califa. Um grilo? (ouve-se o grilo cantado pelo jovem cavaleiro) Ah! Um
grilo pois e a lua pois, vou procurar o cachimbo, é pá aquilo é que
era,
Zara: Não fumes tanto pai, isso dá cabo de ti…
Califa: Eu sei, eu sei (sai)
Zara debruçando-se na amurada: Ainda aí estás, grilo?
Jovem cavaleiro: Estou, e apaixonado!
Zara, ri-se: Pois meu amor, e como te chamas grilo, nem sequer sei
o teu nome.
Jovem cavaleiro: Afonso, como o meu rei.
Zara: Quando te verei?
Jovem cavaleiro: Quando te conquistar, (sai correndo), quando te
comquistar. (sai)
Cena 4
Dois corvos, duas marionetas. Podem ser duas canas compridas com os corvos
na ponta, têm um mecanismo de bater as asas, podem ser comandadas por
dois manipuladores que vestidos de negro se mostram ao público.
Os 2 corvos voam, piam, pousam na árvore
Corvo 1: Que sabeis da Primavera?
Corvo 2: Que está a chegar..
Corvo 1: Já vi flores, por aí a desabrochar, parecem já mais belas
Do que outro qualquer lugar.
Corvo 2: Por ser Leiria, e no seu castelo haver uma princesa a
amar
Corvo 1: Como se chama ela?
Corvo 2: É Zara, de olhos esmeralda, uma estrela a brilhar
Corvo 1: É na verdade bela, e quem ama essa flor?
Corvo 2: é Afonso, um cavaleiro de Portucale.
Corvo 1: O rei
Corvo 2: Não, um jovem cavaleiro é tudo o que sei.
Corvo 1: E como vai ser?
14
Corvo 2: Quando de amor se fala não se sabe o que pode
acontecer.
Toca uma trompa dos soldados portugueses.
Corvo 1: A manhã já se estende ao acampamento do Conquistador
Corvo 2: Será que o rei Afonso já prepara as tropas para o mouro
guerrear?
Corvo 1:O meu instinto de pássaro diz-me que o rei Afonso não se
vai deixar ficar.
Corvo 2: Mas ele é já rei?
Corvo 1: Não, mas ele diz que sim, e quer esta terra toda dos
montes hermínios até ao mar
Corvo 2: Será valente nação, se esta terra souberem amar como
com tanta coragem sabem lutar.
Corvo 1: Estás por Afonso ou Califa?
Corvo 2: Pela pátria da língua que estou a usar.
Corvo 1 - És poeta, vamos embora, vamos ver o que se está a
preparar…
Voam para fora da cena.
Fecha-se a luz.
Cena 5
Campo militar português.
Rei Afonso discursa.
Rei: Cavaleiros e peões! Não desistis! (os outros gritam “Viva” salve”)
Os mouros não podem ficar com estas terras, são nossas, do nosso
reino de Portucale, território da antiga Lusitânia, nossa terra. O
mouro não é daqui, porque teimam em ficar? Não têm uma basta
terra, para além mar, de onde vêm? Temos de lutar por nós, pelos
nossos filhos, a nossa família, os nossos antepassados, Quereis ficar
sob o jugo muçulmano, rezar a outro Deus, esconder a vossa fé?
(gritam de novo não).
15
Os mouros são em maior número, a sua hoste é muito superior à
nossa, temos de ser mais espertos e inteligentes para conseguirmos
conquistar este castelo. Não vamos arredar pé daqui, não
voltaremos para trás, temos à espera um país! (todos aplaudem, dão
vivas)
Reunirei com os meus generais.
Sai com outros.
Fica o jovem Afonso com o barbudo limpando as armas, os capacetes,
preparando-se para a guerra.
Barbudo: Ontem procurei-te por todo lado, não te vi
Jovem cavaleiro: Passei a noite em claro, depois que a vi.
Barbudo: Não me digas que falaste com ela?
Jovem cavaleiro: Mais que isso, jurei-lhe o meu coração, beijei-a!
Barbudo, levantando-se: Por Santiago, como pudeste?
Jovem cavaleiro: Saltei o muro, fiquei com ela.
Barbudo: Arriscaste a pele, ninguém te viu?
Jovem cavaleiro: Não, fomos interrompidos pelo seu pai, tive de
me vir embora, agora só penso nela,… tens de me ajudar…
Barbudo: Em quê? (sorrindo-se), em conquistar Leiria sozinho?
Jovem cavaleiro: Não ouviste D. Afonso, a conquista é certa…
Barbudo: A conquista é certa, pois mas é preciso conquistá-la, a
Leiria e a Zara, que grande história arranjaste.
Jovem cavaleiro: Zara ficará comigo, mas preciso de depois
encontrá-la, terás de me ajudar nessa altura.
Barbudo: Pois se ainda estiver vivo…
Jovem Cavaleiro: Viverás, estou certo disso, um certo corvo mo
disse quando voltava para cá, fiquei com a ideia, que serás tu que
me ajudarás a consegui-la.
Barbudo: Um corvo, dizem que é sinal de sorte.
Jovem cavaleiro: Pois é isso que não me tira da ideia…
Volta D. Afonso com o seu séquito, um general diz:
General: Todos às armas em guarda, Leiria será nossa esta matina.
Todos às armas, preparem-se, Portucale se fará!
Fecha a luz.
16
Cena 6
O rei Afonso observa o castelo na companhia de um general e o jovem
cavaleiro.
Rei: Está tudo em sossego, do silêncio desconfio, também do nada
se pode fazer uma guerra.
Aparecem dois corvos voando, poisam na árvore, piam.
Jovem cavaleiro: Senhor estais enganado, o corvo quebrou o
silêncio, é bom agoiro
General: É verdade há um dito antigo que diz o pio do corvo como
sinal de sorte
Rei: Talvez será, então será boa hora, de lá ir, mandar o mouro
embora.
Jovem cavaleiro: Alteza, há lá uma dama, uma princesa de nome
Zara, uma luz de esmeralda…
Rei: Que tem a tal princesa, quereis ficar com ela?
Jovem cavaleiro: Ela ouviu falar de mim e eu dela (tímido)
Rei: Ai o jovem sangue, o amor na flor da pele, o que andaste a
fazer?
Jovem cavaleiro: Via-a uma vez tão bela, de tão longe mas
parecia perto.
Rei: Ah! Ah! Rindo-se, o Amor, o Amor, com o corvo, tudo vai dar
certo.
Fecha-se a luz.
Cena 7
Castelo. Zara penteia o longo cabelo de seu pai, o Califa, este está fumando o
seu cachimbo.
Zara: Pai! O amor tem fronteiras?
Califa: Pois!
Zara: Acaso já alguma vez ouviste de um amor impossível?
Califa: Pois
17
Zara: Por exemplo uma Castelhana apaixonar-se por um português,
ou uma turca com um judeu?
Califa: Pois!
Zara: Eu acho que o amor não tem limite, …(com ar intencional) podia
muito bem acontecer uma moura casar com um português!
Califa: (mais uma fumarada): pois
Zara: Mal não achais?
Califa: pois!
Zara reparando na paisagem o mato deslocando-se (soldados portugueses
escondidos por trás do mato aproximando-se do castelo).
Zara: Pai! Pai! O Mato anda?
Califa: Pois!
Zara, tirando-lhe o cachimbo, acordando-o, repete a pergunta: Pai, o mato
anda?
Califa, Parece acordado: Se o mato anda? Anda, se o levam, se o
levam anda. Dá-me cá isso, (continua fumando)
Zara fica a olhar para o mato. Quando o mato se aproxima do castelo, o rei
Afonso atira:
Rei: Por Santiago, entrai por esta porta, Leiria será nossa, ainda se
erguerá aqui neste castelo a bandeira do Condado.
Tropas portuguesas atacam. Fecha-se a luz momentaneamente, para tirar
cenário do castelo e árvore. Luta renhida entre mouros e portugueses.
O Jovem cavaleiro luta bravamente, no meio da batalha salva barbudo de
morte certa, diz para ele
Jovem cavaleiro: Ainda não é a tua hora, o corvo me disse, que
tu me ajudarás a salvar Zara.
Continuam batalhando.
Cena 8
Num lado do palco surge Zara puxada por um capitão, esta grita pede socorro,
Barbudo, aparece…
Barbudo: Largai-a imediatamente por minha vontade senão
arrepender-te-ás.
18
Capitão: E quem és tu, para me dizeres o que fazer, esta noite
esta moura será minha no meu leito (desfere um golpe mortal no
Barbudo)
Barbudo, jaz no chão: Senhor, esta noiva está prometida, ao jovem
Afonso nosso nobre cavaleiro.
Capitão: Quero lá saber disso, este corpo jovem… o sangue me
atiça, defendeis uma moura, soldado, quem és tu afinal?
Barbudo já quase morrendo: Um bom soldado, fiel à honra e
amizade, do pouco, como homem fui, este será o meu mais nobre
acto (atira uma lança do chão ao capitão que o mata instantaneamente),
(para Zara), Vinde, ficai junto de mim, com quem faz um cuidar,
ninguém te matará, Afonso não tarda virá, (morrendo) que lindos
olhos, assim se morre feliz (morre)
Zara: (chorando) Não, não morras nobre amigo.
Chega o jovem cavaleiro.
Jovem cavaleiro: Zara! Meu amor!
Zara: Morreu este teu amigo, para me salvar.
Jovem cavaleiro: Meu bom amigo, eu sabia…
Acaba a batalha, os portugueses ganharam, dão-se “vivas” e “Portucale” . D.
Afonso no meio.
Rei: Trazei-me o Califa.
Soldados trazem o Califa, agarrado ao seu cachimbo, como
hipnotizado.
Rei: Rendes-te mouro ao rei de Portucale?
Califa: Pois!
Rei: Levem-no.
Muita gente, soldados dançam, pegam em mulheres, sons de gaita de foles ,
uma festa.
D. Afonso à frente do palco fala com o seu general.
19
Rei: O Corvo foi de bom agoiro, tudo correu muito bem, quantas
baixas.
General: 13 homens morreram, 23 estão feridos.
Rei: Não está mal, afinal estamos em guerra, e o jovem Afonso
meu cavaleiro, onde está ele?
General: Não se sabe, não está entre os mortos nem os feridos,
mas sabe-se também que desapareceu Zara, a princesa
Rei: Que melhor desenlace este (piscando o olho), não há melhor
final, um castelo mais e…com certeza um casamento que
aumentará Portucale.
Fecha a luz ou o pano.
Fim
20
As Três portas da Sé
Por Constantino Mendes Alves
Ano de 1400 DC
Faz-se um círculo de luz no chão.
Entra devagar o Avarento com uma candeia acesa para o meio do círculo.
Cena 1
Avarento, muito baixinho: Está aí alguém? Está? Não está? Ah! Estão
aqui (vira-se para o público), é que eu tenho medo, quer dizer, não
gosto de falar com as pessoas (mentindo), sou muito tímido
(simulando), vai-se rindo baixinho, falo convosco directamente, por
causa da quarta parede, esta, invisível (põe a mão à frente), a parede
que separa a história do público, (fica contente), assim vocês não
podem vir para aqui, porque são público e eu sou história, sou
teatro, vocês não existem para mim e eu não existo para vocês, não
é? É tudo uma suposição, ficção, imaginação (sempre baixinho, parece
que por vezes se baba) mas, se calhar mesmo assim esta situação é
perigosa, (faz um compasso de espera vai olhando sempre para todos os
lados), e se, se, se, se, por acaso, porventura, até se estiver aí o
autor desta história, Urrrr! (arrepio), ele consegue vir até aqui, ai
meu Deus que eu não tinha pensado nisso, digam-me, digam-me
depressa o autor está por aí, o dramaturgo, dramaturgo é um nome
por onde ele se esconde para escrever histórias de teatro, Sr.
Autor? (chama) Sr. Autor, Sr. Drama-tur-go, ele gosta mais deste
nome, Ai parece que não está, deve estar a dormir ou a escrever
outra história. Bom assim estou mais à vontade. Chamo-me Brás,
José, e sou negociante de… não digo do quê, senão ficavam a saber
o mesmo que eu. (de repente, olha para o chão), mas, mas, o que está
isto a fazer aqui, ai o meu dia de sorte, começa a cantarolar (agora
fala alto), isto é, isto é um cêntimo! Ora viva Sr. Dinheiro, é o meu
dia de sorte, ai que eu não tinha nenhum dinheiro nos meus
bolsinhos,
(ouve-se a mulher a chamar)
Mulher, voz de fora: ó Brás, vem cá, que não consigo abrir a pipa,
Brás vem cá!
21
Avarento: ó raio de mulher não me deixa descansado, deixa-me
mas é guardar o meu cêntimo aqui no bolso.
Mulher ,outra vez fora: Vem cá Brás, não me obrigues a ir-te buscar
aí, olha que eu vou aí
Avarento: Não vens, não tens autorização para vir aqui, bem sabes
que não podes entrar aqui.
Mulher: não vou, isso é que tu te enganas, (começa a bater à porta)
deixa-me entrar, vá deixa-me entrar
Fecha-se o círculo de luz, abre-se outro num lado do palco, Avarento corre para
lá, imita que segura a porta.
Avarento: não te deixo entrar, não te deixo entrar
Lutam.
Mulher: Ó Brás, que horas são?
(Brás larga a porta para ver as horas): são 30 minutos para o meio-dia.
Como Rodrigues larga a porta, a mulher entra com toda força e derruba-o
Rebolam no escuro
Rodrigues: Ò mulher o que estás fazer, o que queres de mim, olha
que eu sou muito velho:
Mulher: larga-me homem, o queres fazer ainda nessa idade, olha-
me isto só me faltava mais esta.
Acabam a luta, a mulher segura a candeia que há muito estava no chão e
acende um candeeiro maior, faz luz geral, o público vê todo o cenário, uma
mina cheia de tesouros, jóias, baús cheios de moedas, castiçais, lustres, tudo a
reluzir de oiro e prata.
Mulher: ai credo que me vai dar um achaque mas o que é isto? O
que é isto meu deus?
Desmaia, o avarento não sabe o que fazer, por fim decide
Avarento, despeja um balde água, (pode ser simulação): já estás
melhorzinha?
22
Mulher: ó credo (tonta, acordada) que é isto que dia é hoje, estou
em Lisboa? (pergunta para a plateia), tenho que ir à escola já é tarde,
(o choque é tão grande que ela não diz coisa com coisa)
Por fim, acalma-se
Mulher: mas Ó marido, maridinho, isto é tudo teu
Avarento, muito contrariado: É,É, é um tesouro, é meu, no meu
negócio de emprestar dinheiro, com juros de 20% ao dia, m (começa
com uma ladainha, tipo reclame da televisão, façam um texto que mais vos
agradar, dizendo tudo até aquelas simulações de crédito com condições
especiais, tudo muito rápido dando ar de vigarice)
Mulher: Mas isto, (levanta-se) isto é um verdadeiro tesouro, ai que
vou abaixo outra vez.
A cena repete-se, o avarento vai buscar um balde água, tenta reanimá-la de
várias maneiras. Até que acorda, vem de novo à vida.
Mulher: mas este tesouro é nosso maridinho, meu queridinho, meu
lindo homenzinho,
Começa a cantar e sonhar
Mulher: Ai o que eu vou gastar, jóias Truffault, champanhe
Francês, seda de Caxemira, vou à boite, à discoteca Stress-less, vou
à piscina, às Bermudas (á parte) ter muitos amantes (desfaz o à parte)
oiro, jóias no meu colo, piercings no umbigo, escravas de
diamantes, diademas (podem improvisar muito sobre riquezas e luxúria)
Avarento: que há muito vai abanando a cabeça: Não, Não, (vai
cantando e depois fica irado) não e não e não, não, não, não, não NÃO!
Não!Não!Não! (improvisar)
Mulher, dá-lhe outro achaque, a cena repete-se
Mulher, recuperada: começa num grande choro, ai, ai, ai, ai, meu
desgraçado
Avarento: este dinheiro (muito atrapalhado para justificar), este
dinheiro mulher é para nos prevenirmo-nos de qualquer coisa que
23
aconteça, de pagar o telefone atrasado, uma telha que se pode
partir, de um vidro de uma janela, de uma árvore derrubada pelo
vento, pois o vento e se vem uma tempestade e derruba a casa,
estás a perceber (a mulher abana a cabeça), posso ter um furo de
bicicleta, comprar uma calças novas, que estas já estão rotas em
três sítios, se calhar é melhor comprar outras, o que acham
meninos, vale a pena desperdiçar dinheiro numas calças novas? Não
,pois não, ainda aguentam bem mais dez anos, ( se o publico o
contrariar, dizendo que ele devia comprar, ele deve chamar-lhes gastadores)
A Mulher interrompe-o: (virada para o publico) sabem o que vou fazer,
vou-me embora, (humilhada), este homem é um monstro. Eu todos
os dias com a lida da casa, a prender botões já gastos, porque ele
não quer comprar novos, a comprar batatas já podres porque são
mais baratas, cenouras com grelo, alfaces estragadas, maçãs
cervadas , anda de bicicleta com um pneu furado. Tenho sido uma
escrava, eu que na juventude era invejada, e ainda sou bela, deixa-
me cá ver (vai-se alindando, puxando os cabelos, torcendo as ancas) ainda
sou bela? O que acham,
vou procurar marido,
coisa que este não tem sido.
Sai.
Avarento fica só: E se ela disser o que viu, vou ficar bem arranjado,
ai meu deus, meu deus (começa às voltas ao palco) o que terei de
fazer, se os ladrões vêm, se se souber que eu guardo um tesouro,
um tesouro, umas coisecas que eu fui juntando.
Corre uma cortina à frente do cenário, por exemplo.
Cena 2
Numa rua movimentada, muita ente passa sem olhar o avarento que olha para
todos desconfiado.
Diálogo entre dois homens, Avarento ouve as conversas
Homem um: Parece que há um tesouro
Homem dois: tesouro , nunca ouvi falar
Homem um: um tesouro, mas tesouro de rei
24
Homem dois: e onde é isso.
Homem dois: não sei.
Avarento vai reagindo ao desenrolar das conversas com gestos e intergeições
tudo em à parte, tipo, Ai, aui, agora é que é, será? Ui, ui, e Ah aliviado por não
se saber tudo
Noutro sítio do palco outros dois homens.
Homem três: um rei que fugiu de um mouro deixou-o aqui, em
Leiria
Homem quatro: um tesouro o quê? Em Leiria?
Homem três: guardado algures numa casa de um negociante?
Homem quatro: não sei?
Outro par. (podem ser os mesmos actores disfarçados)
Homem cinco: um negociante que tem um tesouro inigualável,
uma afronta à pobreza
Homem seis: por certo roubado
Homem cinco: e onde estará?
Homem seis: Alguém o procura?
Homem cinco: Olha se fossemos nós a achá-lo.
Homem seis: ou a roubá-lo, por uma fortuna como essa até
matava a minha mulher.
Vão –se todos embora. Fica o Avarento.
Avarento: ai meu deus senhor todo-poderoso, o que vai ser de
mim e do meu pequeno pé-de-meia, ajudai (virado para o céu) ajudai
Senhor este pobre homem, humilde a Deus e (à parte) ao dinheiro.
Vai saindo, lamuriando-se.
25
Cena 3
Mesma cena do inicio, mina do tesouro. Avarento sentado ao centro contando
dinheiro, atirando moedas para um baú.
Avarento: Quatrocentos e trinta e dois triliões, trezentos e
sessenta e três biliões, novecentos milhões, duzentos mil e
novecentos e noventa e nove coroas, e um cêntimo mais
(pode ir repetindo o número acrescentando um cêntimo)
Voz cansada, termina a contagem
Avarento: Isto em moedas, ainda tenho que contar as jóias, e o
resto, que vale seguramente o quíntuplo disto tudo (aponta o baú) (ao
mexer nas moedas, parece que fica electrizado, com desejo de tocar o dinheiro,
mexe, mexe e remexe no dinheiro)
Ai meu amigo dinheirinho, tão bonitinho, e é macio, durável, bom
amigo do ambiente, dinheiro, o magnífico dinheiro (vai subindo a voz)
dinheiro, Sr. Dinheiro, Viva o Dinheiro, eu quero mais dinheiro,
dinheiro (som de caixas de registar muito alto, canta, grita, toma banho de
moedas, volúpia, luxúria)
Por fim cansado deita-se no baú cheio de dinheiro, com uma perna de fora.
Batem à parte
Voz exterior: Ei, está aí alguém, o que está aí a fazer
Avarento, com voz de velhinho: sou eu o Sr. Brás, estou aqui a passar
a roupa, a minha mulher deixou-me aqui pobrezinho sem dinheiro
(quando diz a palavra dinheiro até treme de frémito), estou muito
pobrezinho, (chora) ai a minha vidinha, mas quem fala, quem é
Voz: Sou o guarda do rei, Andrade, ando à procura de dois ladrões
perigosíssimos que andam por estas bandas à solta por Leiria, Se vir
alguma coisa, diga-nos.
26
Avarento: Pois, digo, pois digo, mas eu sou muito pobrezinho não
tenho dinheiro nenhum (desconfiado), Nem um cêntimozinho, por
acaso não tem aí um cêntimozinho, para o leitinho da manhã, meu
caro guarda Andrade
Voz: Ó pobre homem, tome lá uma coroa, para se poder alimentar,
ponho por baixo da porta.
Atiram a moeda, avarento corre com um cão a um osso para a apanhar,
Avarento: ai moedinha, moedinha vem cã, Obrigado Sr. GUARDA
ATÉ MAIS VER!
Voz: Adeus, tenha cuidado consigo.
Avarento: cuidado comigo, pois tenho de ter o máximo cuidado,
(começa tremer das pernas) Ai os ladrões, e se eles vêm para aqui
(começa às voltas pelo palco)
O que tenho de fazer para guardar o meu tesouro, o que farei, o
que tenho de fazer
Até que por fim diz.
Avarento: Eureka
Apaga-se a luz
Cena 4
Dois ladrões em frente a três arcos com portas fechadas
Ladrão um: É aqui
Ladrão dois olhando para todos os lados: será
Ladrão um: A lenda dizia assim:
Vai até à Sé de Leiria, vira à direita, aí encontrarás o grande tesouro
do Brás.
Ladrão dois. É aqui, não há engano
Ladrão um: está aqui um aviso, que dirá, não sei ler, nunca andei
na escola.
Ladrão dois: diz assim (lê painel ao pé das portas)
27
Três portas abrirás, mas só uma em paz, porque outra tem a fome
que te come, e na terceira a peste, para que nada de ti reste.
Ladrão um: Ó raios, mas assim é impossível, e se não acertarmos
logo na primeira?
Ladrão dois: Morrerás, morreremos, como vamos saber qual a
verdadeira, como é meninos (dirigindo-se ao público, as crianças dão
respostas, os actores ripostam argumentando que não querem perder a vida, a
única solução é desistir)
Ladrões: Não, não, perder a vida não, vamos embora, vou roubar
telemóveis, é melhor
(cantam, saindo)
Será a primeira, ou a segunda, e porque não a terceira,
Vamos mas é embora antes que morramos de esperteira
Fim
28
A Lenda da Ponte Cavaleiro
Por Constantino Mendes Alves
Personagens
Narrador
Soldado um
Soldado dois
Discípulo um
Discípulo dois
Venónio, senhor Romano
Matrona
Escrava
__
Abre o pano ou a faz luz
Narrador: Era uma vez, Era uma vez, por uma vez serei
capaz de contar a história, mete muitos personagens,
actores transformados noutras pessoas, Fala do
Cristianismo, na religião de Cristo (benze-se), ai nossa
Senhora nem sei se hei-de falar disto…Ah! Bem deixa cá
ver Era uma vez, pois naquele tempo ninguém tinha uma
verdadeira religião, era assim reza aqui reza acolá, ou aqui
ou lá, ou lá ou aqui, tanto dá…. A ponte de Cavaleiro
e…fim.
Voz de dentro: vai-te embora, safado, estás a estragar o
espectáculo
(atiram-lhe qualquer coisa. Narrador sai.)
Cena 1
Dois cavaleiros romanos passeiam a cavalo.
Soldado um: Está um bom dia, muito bom
Soldado dois (gordo): pois, estava bem era a dormir uma
soneca na minha tenda.
29
Soldado um: Pois mas se estivesses na fortificação,
estavas a limpar o gáudio, se calhar a limpar as latrinas, é
melhor fazer o turno, de vigia
Soldado dois: Pois é, mas o que procuramos afinal?
Podíamos caçar uma codorniz, assávamo-la, comíamo-la,
sem o centurião saber.
Soldado um: deixa-te de gastronomias, de comezainas,
precisamos saber se o povo, paga o seu tributo, se obedece
a Roma. Se está tudo calmo.
Soldado dois que tinha estado a beber desde o princípio:
ips, pois deixa lá Roma, Roma está muito longe daqui, bebe
um golo vá lá.
Chegam dois discípulos de São Tiago
Cena 2
Discípulo um: Podeis dizer onde ficam as Cortes?
Discípulo dois tenta esconder uma cruz
Soldado um: não sois daqui, quem são vocês?
Discípulo um, somos apóst…
Interrompido por discípulo dois
Discípulo dois: somos apostadores, apostámos os dois a
uma bilha de vinho, como os srs. Legionários não sabíamos
o caminho para as Cortes.
Discípulo um: Apostadores, pois, pareciam-me que iam a
dizer apóstolos, não gosto nada disso, Essas religiões…
Não são Cristãos, pois não?
Discípulo dois, não cristãos não, vimos de Roma por
aquela via.
Soldado dois: ips, essa via, vai dar a Roma, pois todos os
caminhos vão dar a Roma, olha a novidade.
Soldado um, preocupado com o espectáculo que o colega
estava a dar: sigam, sigam por ali, não liguem ao meu
colega, está muito sol, avé
Discípulos: Avé
30
Saem
Cena 3
Venónio, senhor Romano, come uvas no divã, a mulher
toca lira.
Uma rapariga dança.
Venónio: lá, lá, lá, ra lá lá (canta, come uvas bago a
bago). Salta, dança, gira pula, esta escrava é um
espectáculo, faz tudo o que quero, agora ri, chora etc
Entretêm-se um bocado assim.
Ouve-se palmas batendo, interrompendo o espectáculo
Pás, pás, pás
Matrona que toca lira: Quem vem lá, (manda a escrava
abrir a porta)
Venónio: algum vendedor de cavalos por certo, ou então
qualquer cristão a pedir para a Senhora da Gaiola, vai lá,
vai, vai, (dá-lhe palmadinhas no traseiro).
A escrava volta
Escrava: São dois homens, dizem que vieram por bem,
enviados por Dona Loba, que vive aqui a meia légua de
distância.
Venónio: A Dona Loba, (à parte) não me lembro quem
será, alguma matrona com quem namorei por ai, ora deixa-
me lá ver, Engrácia, Luísa, Dores, ai a dores que dores no
coração me fazia, a Helena, a Dido, Dona Loba)
Deixa o à parte
Ah a Dona Loba a do Pomar ao pé da Ponte do rio Lis, a
minha amiga que me manda sempre um cestinho de fruta,
lembra-te dela Lorena, a fruta? A parte, e eu a pensar que
a fruta era outra.
31
Que entre, que entrem pois então amigos dos meus
amigos, amigos são
Entram os discípulos
Discípulo dois: tira a cruz que traz debaixo da túnica) que
a paz do senhor esteja nesta casa.
Todos os romanos fogem a sete pés da cruz, como o diabo
da cruz, torna-se tudo numa farsa
Discípulo um manda guardar a cruz, todos regressam,
durante o resto da cena o discípulo dois, volta e meia
mostra a cruz, oportunamente quando tiver sentido, todos
reagem.
Discípulo um: O que me traz aqui é a fé cristã e São
Tiago. Dona Loba
Quer pedir-lhe uma opinião, deu-nos esta carta de
apresentação.
Venónio lê a carta em à parte, alto.
Lê como se fosse Dona Loba a ler, com voz de cana
rachada e parola, a cantar à moda de Leiria.
Senhor Venónio, meu caro senhor,
São Tiago quer que professe a religião cristã, mandou estes
dois apóstolos de Cristo, para me converterem, para que eu
reze a Cristo, e confie nas suas sábias palavras Santas. Mas
eu não sei, meu caro senhor se faço bem ou mal, tenho
medo de ir fazer uma grande asneira, Se professo a religião
Cristã, já não serei pagã, deixo de adorar esses deuses
todos que o Sr. Me está sempre a dizer que são também
bons.
E se eu ficasse com os deuses todos, podia rezar a todos ,
uma a um por cada dia, o que acha, oiça-me sr. Estes
apóstolos que são pessoas santas e só querem fazer o bem,
ainda agora me tiraram um calo do pe, e também um
joanete, e endireitaram-me as costas.
32
Manda- me a resposta a sua resposta por eles outra vez,
está bem?.
P.S. depois mando-lhe mais um cestinho de maçãs.
A sua Dona Loba.
Venónio fica irado quando termina de ler a carta, faz um
espectáculo de ira,
A matrona improvisa, tentando acalmá-lo
Venónio: Cristão, Cristão odeio os Cristãos, vai dizendo
várias vezes
Venónio: Chamem os guardas
Vêm os soldados, prendem os apóstolos
Cena 4
Os Dois discípulos na prisão, rezam
Discípulo um: Senhor ouve-me, peço-te em nome do que
é mais sagrado, do cálice santo, da hóstia sagrada, ouvi,
estás me ouvir Senhor?
Discípulo dois: Se calhar não está, está a fazer milagres,
ou saiu para ouvir qualquer confissão
Discípulo dois: Não deus é omnipotente e omnipresente,
deus está em todo o lado
Discípulo dois: pois menos aqui, fazia agora um jeitão,
(entusiasmado) podia fazer um milagre, tipo homem
aranha, super maxi ( os dois vão-se entusiasmando,
lembrando super heróis.)
Voz gravada muito alta, interrompe-os:
33
Sou Deus, todo Poderoso, (tudo treme)
(relâmpagos)
Hei, estão-me a ouvir, agora são vocês que não ouvem,
(assobia,)
Sou Deus Todo Poderoso, mas ninguém me liga? Sou Deus
poderoso mais alto e com trovões, por fim ouvi-vos mas
por favor da próxima rezem mais alto, e não façam tanto
disparate, Enviarei um anjo para vos libertar.
Vem um anjo, pode ser projectado no cenário, e os
apóstolos fogem
Imediatamente ouve-se um silvo, pode ser um assobio
Os dois soldados a cavalo perseguem os apóstolos, mímica
em câmara lenta, música do Vangelis, por exemplo (tema
“momentos de glória)
Estendem-se umas cordas como se fosse uma ponte
Passam os apóstolos e aparece um anjo outra vez
Os soldados tentam passá-la mas caem quando a ponte se
parte ao meio.
Quando aparece o anjo, há o seguinte diálogo:
Soldado dois: o que é isto, estou bêbado ou quê (soldado
um temente a Deus, começa tremer)
Ouve-se a voz gravada outra vez:
Sou Deus Todo Poderoso (trovões, relâmpagos fortes) S ou
Deus único,
Pai de Cristo, todo-poderoso, Saiam da ponte que vai cair
(soldado foge a sete pés)
34
Soldado dois: Vai o quê, cair o quê? (perdido de bêbado)
vai cair vinho, vais fazer chover vinho, venha de lá um
copo.
A ponte começa a cair
Soldado dois: è pá esta coisa vai cair, oh Deus não podes
fazer isso a um distinto cavaleiro, eu ainda tenho de passar
à espada aqueles mafarricos que iam a fugir.
Cai a ponte.
Fecha-se a luz
Volta o Narrador empurrado por outros actores
Narrador: E, e, e cá vai, e como caiu um cavaleiro com a
ponte, que interrompeu a perseguição dos dois cristãos,
começou-se a chamar a esta ponte a meia légua das
Cortes, A ponte do Cavaleiro
Real, Real, não há história igual
Vitória, Vitória acabou a História
Tira uma placa da barriga dizendo fim.
Fim
35
A Fonte da Barroquinha
Por Constantino Mendes Alves
Cena 1
Cortejo real. Dois ou três actores fazem de cavalos, os cavaleiros podem fingir
que montam, mas ficam ao lado dos cavalos, como acharem melhor. Ouve-se
galopar
Rei: Tenho sede, dai-me de beber
Bobo: o rei tem sede, dá-lhe de beber
Pajem: Senhor, já não resta mais água para beber, há muito que
não encontramos poço
Com água boa para beber, água potável (em aparte)
Rei: (com os olhos fechados): Dai-me de beber, tenho sede.
Bobo: (imitando o rei) dai-me água, dai-me água que eu vou morrer
(cai no chão, dá uma cambalhota)
Pajem: É como vos digo Senhor, sua Alteza bebeu toda a água que
nos restava, já não há mais água.
Bobo: (fazendo caretas) não há, acabou, niente, rien, nada de nada x
nada igual a nada, senhor tendes nada de água para beber
Rei (quase hipnotizado): dai-me dessa água
O bobo finge dar-lhe um fole de água.
O Rei (segura e bebe): Que boa água, mas continuo com sede.
Bobo: É porque não digeriste bem ainda (esfrega a mão na barriga)
Rei: continuemos.
Ouve-se outra vez o galopar (fazer uma composição cénica engraçada com
muito jogo dramático, que dê uma imagem de cortejo pesado e caricaturado de
um cortejo real)
Mais adiante
Rei: Ai que tenho sede, tenho as vísceras secas, pajem dai-me
água para beber
Bobo: vai rapaz, dá-lhe água não ouviste (faz um gesto com o dedo na
cabeça, como quem diz que o rei não regula lá muito bem)
36
Quando passa o pajem o bobo dá-lhe um pontapé no cu.
O pajem cai no chão.
Bobo: Ó rapaz, ainda deitas toda a água no chão, descuidado.
O pajem fica furibundo, corre atrás do bobo, andam ali às voltas atrás um do
outro com o bobo a esgueirar-se a passar por baixo dos cavalos, escondendo-
se dando pulos, etc
Rei: Tenho sede, dai-me água para beber.
Os outros dois param o pajem dirige-se ao rei.
Pajem: Senhor, Sua alteza, já não há mais, água , eu ainda há
pouco lhe disse, não encontrámos nenhum poço faz mais de 10
léguas daqui.
Rei: Pois dessa água beberei.
O pajem fica sem saber o que fazer.
O bobo encolhe os ombros e fala assim,
Bobo: Senhor, aqui tendes mais água, desta boa da imaginação,
água vai!
O rei bebe do fole imaginário.
Continuam a marcha. Galope
O rei cai no chão.
Cena 2
O Rei parece que acorda com a queda. Onde estão eles, onde estão,
(puxa da espada), quereis lutar (luta com o bobo, este vai-lhe dizendo quem
é e vai-se defendendo das estocadas)
Bobo: Senhor sou eu, o teu bobo, uh uh! Estais – me a ouvir,
senhor, sou eu o Malaquias (cheio de medo) não me matais (chora)
depois quem vos dirá as piadas, te fará rir, olha eu conheço uma
anedota muito engraçada de um rei Castelhano (vai fugindo), do teu
primo, Senhor, não quereis rir do teu primo (foge) (aparece noutro
sírio, o rei corre para ele com a espadana mão) o Seu primo, rei, queria
um traje muito fino, Ai, Ai, (esquiva.se), mandou chamar um alfaiate
(trepa para as cavalitas de um outro cavaleiro) e o alfaiate, Senhor, agora
não me apanhas, (jogam), ouvi (por vezes o rei pára para ouvir e solta
37
expressões como, estais-me a mentir, sois um mouro, vou-te matar, ou fica
interessado na conversa, mas depois investe contra o bobo) o bobo continua a
história: e o alfaiate fabricou um traje maravilhoso e levou-o ao rei.
(foge para a plateia, o rei corre atrás dele) mas quando apresentou o
traje ninguém na corte viu o traje, o alfaiate disse que só as
pessoas inteligentes é que o podiam ver (por fim o rei encurrala-o, põe-
lhe o gume da espada junto da garganta)
Rei: Ah!Ah! Agora não me escapas
Bobo: o fim, o fim
Rei: o quê, pois é o teu fim
Bobo: o fim, o fim da história
Rei: ah sim, conta lá
Bobo: o Senhor seu primo como era muito vaidoso, disse que sim
que o traje era muito bonito, que eu via maravilhosamente.
Rei: E então? Responde, quero saber o resto da história que estou a
ficar cheio de sede outra vez.
Bobo: desaperta, desa-perta
Rei: desaperto o quê?
Bobo: o meu pescoço (numa voz sufocada)
O rei liberta-o um pouco
Bobo: E assim, o Senhor seu primo, saiu à rua em corteja todo nu,
só com o fato invisível, todos à sua passagem, baixaram as cabeças
em sinal de respeito, elogiando o seu traje, mas houve uma criança
que disse, olha o rei vai nu, todos olharam e depois de olharem uns
para os outros desataram às gargalhadas.
Rei, começa também a rir: Ah! Ah!
A gargalhada estende-se por toda a comitiva, incluindo cavalos também e deve
estender-se ao público.
Até que o rei cai no chão.
Rei: tenho sede ai que tenho sede
Pajem: Senhor não temos nenhuma água.
O Rei levanta-se aos poucos
Rei: Tem de haver água por perto, um rei não pode morrer de
sede, só morrerei pela espada em combate. (olha para todos os lados.
Monta a cavalo. De um dos lados está uma rocha)
Rei: vamos procurar água, a nossa vida depende disso.
38
Ao passar por uma rocha, desesperado disse:
Rei: “Maldito cavalo que não escoicinha esta rocha até fazer água a
fartar.”
”Palavras não eram ditas e o cavalo real, como se tivesse compreendido a fala
irada do seu dono, dá uma forte parelha de coices na rocha que fez estremecer
céu e terra.
A escoicinhadela foi tão violenta que o rei teve de se amparar com a sua
espada na rocha, no mesmo sítio onde o cavalo do rei escoiçara. Mas a espada,
de fraca resistência, encontrou e furou a rocha, e, do furo aberto, jorrou água
abundante e fresquinha que dessedentou o rei e toda a sua comitiva”
Bobo: Senhor, um verdadeiro milagre, podeis ser santo, ai que
água tão fresquinha.
Rei: de tanta mágoa se fez a água,
Todos riem.
Rei: E aí ficou toda a sede minha,
Na fonte, na fonte da barroquinha
Bobo: Vitória, Vitória, acabou-se a história
Fecha o pano e a luz
FIM

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Seis lendas da região de Leiria

  • 1. 1 6 lendas da Região de Leiria A Senhora da Gaiola A tomada do castelo de Leiria (a partir das lendas do Corvo de Leiria e da princesa Zara) As Três portas da Sé A Lenda da Ponte Cavaleiro A Fonte da Barroquinha Versão dramática de Constantino Mendes Alves
  • 2. 2 A Senhora da Gaiola Por Constantino Alves Algures na Lusitânia O público entra e está em cena um mouro que canta, só quando o público se cala, entretanto um músico toca tambor mouro (musica berbere). Apaga-se a luz da sala. Mouro canta: Fatuma, Fatuma, quereis saber de mim?, fiquei em alma no deserto chamando por ti. (Faz variações de voz com a palavra Fatuma que serve de refrão.) Entram dois soldados mouros com um homem cristão agarrado, preso Cena 1 Soldado um: Por Maomé, vai chamar o califa, encontrámos o traidor O cantor sai, o músico ajuda o soldado dois a amarrar o cristão. Soldado dois: Não perdes pela demora, o que acabaste de fazer vai-te perder, cristão (cospe-o, depois de o amarrar) Músico: (voz finíssima, fracote) estes cristãozitos deviam ser todos mortos (medricas vai a medo pisar o cristão, dá-lhe beliscões a fugir, com medo) Entra o califa com o soldado um (se possível com outros mouros) Califa: com quem então és tu? O que sabes do tesouro? Onde está? Diz responde, agora não te resta mais nada que a vida. A tua
  • 3. 3 mulher já pertence ao meu harém, poderei agora desfrutar dela, a tua filha dei-a ao meu cunhado que, sabes, está muito agradado com ela, beija como ninguém. Quere-las de volta? Responde ao que te digo, onde está o tesouro? Quem o guarda? Cristão: Nada responderei. Califa: não? Pensas que escapas à morte? Que vem o teu Deus salvar-te? Cristão: O meu Deus é o teu também. Califa: pois, Alá, é o que queres dizer? Cristão: Deus pai todo-poderoso, senhor de todo Universo, deus só há um, o teu Alá, é Deus, o seu Filho, Jesus Cristo filho de Maria (levanta a cabeça ao céu) Califa: injuriador, dêem-lhe. Soldados batem no cristão. Califa: Já não estás na tua terra, cristão. Isto agora é território almoâda e berbere. Os teus santos morreram com a nossa vitória sobre os reis Cristão. Quem não professar a nossa religião, de Maomé, (agacha-se em sinal de vénia), será morto, ou vem para a nossa religião. Muitos como tu aprenderam a amar Maomé, o nosso profeta (vénia), aprenderam o Corão e agora são dos nossos. Claro com derrotados, os vossos bens pertencem-nos, as vossas mulheres (ri-se), não é isto que se faz quando se vence outro povo, outro país? O que fariam vocês de nós? … a mesma coisa por certo, Neste tempo de guerra não há piedade. (pede um assento, senta-se, bebe um gole de vinho) Tendes bom vinho aqui na terra, como se chama esta terra? Soldado dois: Cortes, alteza. Uma terra de bom fruto, no que se refere ao vinho, por contrário, temos recebido enorme resistência deste povo, que parece amar mais os seus santos que a própria terra, a própria vida.
  • 4. 4 Califa: (dirigindo-se a um conselheiro): o que sabeis desse tesouro, que teimam em esconder? Conselheiro: É um diz-se, diz-se, que vale mais que a própria vida, a julgar pela maneira como defendem o segredo, não conseguimos arrancar qualquer palavra a ninguém, até agora…o que se diz é que é melhor que oiro, de uma matéria que brilha mais que a fé, de um valor mais que vida, é o que sabemos, pensamos que se trata de um antigo tesouro guardado, que pertencia a antigos chefes Lusitanos. Califa: Pois esses chefes Lusitanos, que eles tanto prezam, já ouvi falar de um antigo chefe, Um Vi..riato, parece-me que era muito valente, um forte guerreiro, devia era ser um medricas como todos os Lusitanos e cristãos, o que sabeis deste homem? Conselheiro: Foi dos primeiros a dizer que rezava já a Maomé (vénia), era nosso colaborador, mas viemos a descobrir que ajudava à fuga de outros cristãos, e sabe-se, que uma noite destas, num luar de lua cheia, foi visto com outros homens carregando um grosso fardo, julgamos que é o tesouro. Califa: Vai, não me faças perder tempo, as minhas mulheres, a tua mulher esperam-me, uma tarde amor. Responde, onde está o tesouro? Cristão (magoado com tantas vergastadas). Não te digo, não responderei, só te digo que é oiro que nunca conseguirás ver, tens ambição, maldade, liberta a minha mulher e filha, elas não têm nada a ver com isto. (silêncio) (à parte) Que deus e Jesus Cristo me perdoem, é por Vós, (ergue a cabeça novamente ao céu), que me sacrifico, Senhor olhai pela minha família, que eu não posso negar- Te (um soldado mata-o) Cena 2 Uma feira nas Cortes. Gentes que vendem, outras compram, miúdos brincam com uma bola de trapos. Soldados mouros vigiam. Ouvem-se alto os seguintes à partes, sem que os soldados ouçam.
  • 5. 5 Vendedora um (para um cliente): Que ela já lá está! Cliente um, para um garoto: vai diz que ela já lá está! Garoto para outra cliente: Sra., que ela já lá está! (Por aí fora, o segredo anda de boca em ouvido) Soldado um: agarra um garoto: Anda cá miúdo, o que andas a dizer ? Miúdo: Que o vinho é bom, que pode ser comprado, e as maçãs também, o Sr. Mouro não quer, eu dou-lhe uma, rouba uma maçã do vendedor, soldado um come a maçã, o vendedor dá pela falta da maçã, gera-se a confusão, atrás do garoto, todos perseguem, o garoto esgueira-se por todo o lado, depois saem atrás do miúdo. Fica só o soldado. Come outra maçã da banca deserta. Soldado um: depois de ter comido: boa maçã, bom vinho, bebe de um fole, bons ares respira, bom sol, leva outra maçã, ao sair deixa sair um som estranho do cu. Cena 3 Tudo escuro. Vozes na escuridão: (ouve-se de vários locais do palco) - É hoje - É agora - É já - Vem - Espera por mim - Eu também quero ir - Oh virgem santíssima eu vou chamar a minha irmã - Acende, vá - Espera - Vá (uma a uma acendem-se 10 velas)
  • 6. 6 - É pesado - Mas precioso - Vê lá se vem alguém - Todos em fila, só eu sei o caminho (as luzes em fila indiana) - Estás-me a pisar, ai - Desculpa - Isto é a maior aventura em que me meti - Estamos em perigo de vida - Temos de falar baixo - Ninguém nos pode ouvir - a nossa carga - Calado, ninguém pode ouvir - Cuidado com ela - É pesado - É por aqui - Não é por ali (andam só com o som dos grilos, em silêncio) - É aqui - Upa - Agora é que é - Os mouros nunca descobrirão isto - Ninguém, - Fizemos um bom trabalho - Rezemos - Rezam uma avé Maria - Vamos embora - É para já. (apagam-se as velas ao mesmo tempo)
  • 7. 7 Cena 4 Um pastor com o seu rebanho. Faz mímica, ouvem-se balidos de ovelhas. O pastor canta Pastor – Viva, viva El rei de Portugal. Afonso I, guerreiro sem igual, Vai mouro, vai para alá, Que já o cristão manda cá. (Repete) Meu amor eu vou para a guerra, Contra o mouro do deserto, Para cuidar da nossa terra, Onde viver contigo perto. (Repete o refrão) Ai amor, tem piedade De mim e não do mouro, Não olhes com caridade Quem guerreia por amor. (refrão) (um cão inexistente cheira uma árvore) Pastor: o que cuidais aí? A que te cheira? Será coelho, ou pássaro? Ai reinador outra vez a brincar? Nota qualquer coisa na árvore. Pastor: Mas o que é isto? (olha para dentro da árvore) Ai nossa Senhora! (sai uma luz forte da árvore, vê-se uma imagem de nossa Senhora) pastor ajoelha-se, ouve-se uma música crescendo, alta, forte.
  • 8. 8 Pastor reza: Ai senhora, Senhora, pelos santos e o céu, Vinde alumiar o meu caminho Por tanto pecado eu tenho tido. Deita-se, beijando o chão, ai milagre de todo o céu, juro com fé em todo o mundo, Depois refaz-se, corre de um lado para outro a ver o que há-de fazer. Arranja, umas canas e uns paus, faz um altar, e uma jaula para a imagem de nossa Senhora. Entupido de espanto, tenta falar, não consegue, tenta, tenta, até que consegue soltar a voz. Pastor: Oh gente, ou boa gente de Cortes, que aconteceu um milagre, A senhor desceu do céu, sai Entra logo muita gente Todos juntos ao mesmo tempo Multidão: Ah a Senhora, A senhora da Gaiola, ajoelham-se e rezam Fim
  • 9. 9 A tomada do castelo de Leiria ( a partir das lendas do Corvo de Leiria e da princesa Zara) Por Constantino Mendes Alves Cena 1 Ano de 1135 DC Sons de batalha, gritos, trompas Abre o pano ou acende-se a luz No fundo o cenário, módulo/painel, do castelo de Leiria, ao lado em módulo independente uma árvore de grande porte. Mouros e Portugueses lutam em dura e encarniçada batalha Devem lutar com espada (adagas e espadas), deve fazer coreografia adequada, por vezes perto do caricato mas nunca resvalando totalmente para isso (alguns truques como girar em 360º, fugir entre as pernas do inimigo, prender a espada no chão, espetada ou por vezes sem espada lutar de corpo contra corpo), (devem gritar uns, “por Alá”, “pelo profeta”, “pelo sagrado Corão”, “morre infiel”, “por Portucale”, “pelo rei”, “por Deus”, “por Cristo”, “morre infiel”) Deve haver bandeiras, o crescente, e a bandeira da independência do tempo de D. Afonso Henriques (branca com uma cruz azul) Toca uma trompa, as tropas portuguesas retiram (saem de cena), os mouros gritam por Vitória, dando vivas ao profeta e Alá Califa: Por hoje já têm a sua conta. Alá esteve connosco hoje, vamos celebrar, tenho dito. Transporta-se os feridos. Cena 2 Começam a tocar tambores berberes, mulheres dançam, a maior parte dos árabes senta-se no chão. No meio da dança, baixa-se o som dos tambores Cavaleiro árabe, para o Califa. Afonso insiste, malvado cristão, não tem medida a sua ambição. Califa, que fuma cachimbo árabe: Pois (parece inebriado com o fumo) Cavaleiro árabe: Apesar de tudo foi uma luta aguerrida, encarniçada. Califa: Pois (entre uma baforada de fumo) Cavaleiro árabe: Mas o nosso Deus é maior do que o deles… Califa: Pois! Cavaleiro árabe: Alá está connosco (grita, levanta-se)
  • 10. 10 Todos: Alá, Alá, Alá! Califa, sempre sentado alheio a tudo: Pois! Cavaleiro árabe, sentado novamente, dirige-se novamente ao Califa: Com o sagrado comando de Alá nunca perderemos o castelo de Leiria. Califa: Pois! Cavaleiro árabe, vira-se para a lateral do teatro: Já não tenho mais deixas, o que faço, ele não responde! Voz vinda de fora: Tirem-lhe a ganza. Cavaleiro árabe tira o cachimbo ao Califa. O Califa, acorda um pouco, levanta- se Califa: Por hoje é tudo boa noite, que Alá esteja, rebéubéu,béu,béu, isso por aí fora (quando sai ainda se ouve) Eh pá estou mesmo ganzado. A festa desfaz-se, cada um vai para seu lado, rindo-se, cantando-se, agarrando nas dançarinas. Fica a cena vazia, ouve-se uma melodia árabe muito baixinho, a luz diminui de intensidade, apenas o castelo iluminado, e provavelmente uma lua de luz no ciclorama. Cena 3 Entra Zara, na ameia do castelo, entoa uma canção: Zara: Ai mouro, meu cavaleiro, como me deixas neste cativeiro, já o sol do deserto me fez nascer tão só. (repete várias vezes) Do outro lado do palco, aproximam-se dois cavaleiros portugueses, como que chamados por aquela sublime voz. Olham Zara. Um é jovem outro mais velho e barbudo. Jovem cavaleiro: Sublime voz, olhai o cabelo à lua, tão belo… Barbudo: É Zara, a filha do Califa, é moura, tira daí ideias… Jovem cavaleiro: A beleza não conhece o sangue, nunca vi mulher tão bela. Barbudo: Bonita é, não há dúvida, anda, vamos embora não é para o teu dente, nem o meu (aproveita para mexer num dente que tem quase a cair) Olha este está mesmo a ir embora!
  • 11. 11 Jovem Cavaleiro: Vou-me aproximar, quero vê-la inteira. Barbudo: Não ides, anda por ai moirama, tem cuidado, não te chegou a tareia de hoje, ainda me doem as costas (o jovem aproxima- se sem que este dê conta), levei uma carga de porrada, Ena pá, eram mais de cinco (olha para a mão) um, dois (conta pelos dedos) três, quatro, olha falta-me um dedo, ah não está aqui o gorduchinho (fala com os dedos) então não sabia de ti, igualzinho ao dono, gorduchinho, vem para o pé dos outros, um, dois, três, quatro cinco assim é que é, eram cinco… (olha para o lado e não vê o jovem) … eh lá, onde estás … (procura) Vem para aqui (fala em surdina mas muito irado) O que vais fazer, vais-te matar, prometi à tua mãe que tomava conta de ti, (aparte) Ai se a Dona Ana me vir sem ele, enfia- me no poço ou aperta-me o pescoço (desfaz o aparte) vem cá, raios, vou buscar reforços… (sai) O jovem põe-se por baixo do castelo, onde está Zara. Jovem cavaleiro: Se eu pudesse vê-la melhor, esta doce cotovia que faz esquecer a noite, parece antecipar o dia com tamanha beleza. Jovem imita o som do grilo. Zara pára de cantar, parece querer ouvir os sons da noite. Afonso imita o som do grilo. Princesa Zara, debruçando-se na amurada: Ai que noite cheia, que luz a tua lua, pareces amar tão cheia. Que som lindo, os grilos, depois da guerra parecem anunciar a paz, a calma (sonhadora), que quereis Senhor grilo, quereis casar, aqui está esta princesa pronta a amar. Cavaleiro jovem: Ah! Se ela soubesse, que o grilo lateja de amor, Ai que linda noite! Zara: Ai que linda noite, e o cheiro de alecrim, as plantas também vieram à noite? Ai que belo casamento se está a pôr, o meu noivo, o sério grilo que lateja de amor, a lua, a madrinha que faz cor, e as plantas, com Sr., alecrim no seu odor a convidar-me a dizer sim, ah!Ah! (ri-se, romântica e feliz) Jovem cavaleiro: Como é linda esta bela rosa, que o seu espinho seja só ela ser moura. Vou falar com ela, é para já. O grilo diz também que sim, (mostra-se à princesa).
  • 12. 12 A princesa surpreende-se Zara: Quem é lá? Jovem cavaleiro: Sou o grilo apaixonado pela mais bela rosa de um só espinho. Zara: Olha bem para ele, (o luar incide bem na cara dele, ela ri-se envergonhada e diz), sois belo, grilo, tão belo como o teu cantar apaixonado, era por mim? Jovem cavaleiro: Não há outra rosa de que eu possa estar apaixonado, ela tem um só espinho de que eu não me posso enganar. Zara: Que espinho? (olhando para ela própria) Jovem cavaleiro: É de estares do outro lado, desta muralha, quer dizer de outra bandeira, que eu quebrarei se me quiseres aí a teu lado. Zara: Que súbito (ri-se) e não tenhais medo de perder a cabeça, o mouro pode vir de qualquer lado. Jovem cavaleiro: Já a perdi, por tão bela rosa do Califado, deixai- me subir… Zara: Se não tinhais medo subi, quero ver-te aqui. Jovem sobe. (Olham-se nos olhos, jovem pega-lhe na mão leva-as ao rosto dela), Jovem cavaleiro: Nunca vi olhos mais belos, duas estrelas de esmeralda, aqui perto, o meu coração está certo, bate para o teu lado. Zara: Que galante, jovem português, não tens rodeios nem porquês. O teu amor é verdadeiro? Jovem cavaleiro: Tão verdadeiro como esta lua que te deixa ver por inteiro. Zara: Não falais da Lua incerta, jura-me primeiro, que me amas Com o coração que é mais verdadeiro. Jovem, beija-a subitamente. Ouve-se uma voz fora do Califa: Oh Zara, Zarinha, Zara, não me ouves? Zara: depressa vai-te embora vem lá meu pai. Jovem atira-se para baixo, esconde-se
  • 13. 13 Entra o Califa: Ah! Estás aqui, não viste o meu cachimbo? Não sei onde o pus, queria fumar daquilo outra vez, era cá uma, mas que raio onde o pus. Zara: Não meu pai, aqui só está a lua e um grilo a cantar Califa. Um grilo? (ouve-se o grilo cantado pelo jovem cavaleiro) Ah! Um grilo pois e a lua pois, vou procurar o cachimbo, é pá aquilo é que era, Zara: Não fumes tanto pai, isso dá cabo de ti… Califa: Eu sei, eu sei (sai) Zara debruçando-se na amurada: Ainda aí estás, grilo? Jovem cavaleiro: Estou, e apaixonado! Zara, ri-se: Pois meu amor, e como te chamas grilo, nem sequer sei o teu nome. Jovem cavaleiro: Afonso, como o meu rei. Zara: Quando te verei? Jovem cavaleiro: Quando te conquistar, (sai correndo), quando te comquistar. (sai) Cena 4 Dois corvos, duas marionetas. Podem ser duas canas compridas com os corvos na ponta, têm um mecanismo de bater as asas, podem ser comandadas por dois manipuladores que vestidos de negro se mostram ao público. Os 2 corvos voam, piam, pousam na árvore Corvo 1: Que sabeis da Primavera? Corvo 2: Que está a chegar.. Corvo 1: Já vi flores, por aí a desabrochar, parecem já mais belas Do que outro qualquer lugar. Corvo 2: Por ser Leiria, e no seu castelo haver uma princesa a amar Corvo 1: Como se chama ela? Corvo 2: É Zara, de olhos esmeralda, uma estrela a brilhar Corvo 1: É na verdade bela, e quem ama essa flor? Corvo 2: é Afonso, um cavaleiro de Portucale. Corvo 1: O rei Corvo 2: Não, um jovem cavaleiro é tudo o que sei. Corvo 1: E como vai ser?
  • 14. 14 Corvo 2: Quando de amor se fala não se sabe o que pode acontecer. Toca uma trompa dos soldados portugueses. Corvo 1: A manhã já se estende ao acampamento do Conquistador Corvo 2: Será que o rei Afonso já prepara as tropas para o mouro guerrear? Corvo 1:O meu instinto de pássaro diz-me que o rei Afonso não se vai deixar ficar. Corvo 2: Mas ele é já rei? Corvo 1: Não, mas ele diz que sim, e quer esta terra toda dos montes hermínios até ao mar Corvo 2: Será valente nação, se esta terra souberem amar como com tanta coragem sabem lutar. Corvo 1: Estás por Afonso ou Califa? Corvo 2: Pela pátria da língua que estou a usar. Corvo 1 - És poeta, vamos embora, vamos ver o que se está a preparar… Voam para fora da cena. Fecha-se a luz. Cena 5 Campo militar português. Rei Afonso discursa. Rei: Cavaleiros e peões! Não desistis! (os outros gritam “Viva” salve”) Os mouros não podem ficar com estas terras, são nossas, do nosso reino de Portucale, território da antiga Lusitânia, nossa terra. O mouro não é daqui, porque teimam em ficar? Não têm uma basta terra, para além mar, de onde vêm? Temos de lutar por nós, pelos nossos filhos, a nossa família, os nossos antepassados, Quereis ficar sob o jugo muçulmano, rezar a outro Deus, esconder a vossa fé? (gritam de novo não).
  • 15. 15 Os mouros são em maior número, a sua hoste é muito superior à nossa, temos de ser mais espertos e inteligentes para conseguirmos conquistar este castelo. Não vamos arredar pé daqui, não voltaremos para trás, temos à espera um país! (todos aplaudem, dão vivas) Reunirei com os meus generais. Sai com outros. Fica o jovem Afonso com o barbudo limpando as armas, os capacetes, preparando-se para a guerra. Barbudo: Ontem procurei-te por todo lado, não te vi Jovem cavaleiro: Passei a noite em claro, depois que a vi. Barbudo: Não me digas que falaste com ela? Jovem cavaleiro: Mais que isso, jurei-lhe o meu coração, beijei-a! Barbudo, levantando-se: Por Santiago, como pudeste? Jovem cavaleiro: Saltei o muro, fiquei com ela. Barbudo: Arriscaste a pele, ninguém te viu? Jovem cavaleiro: Não, fomos interrompidos pelo seu pai, tive de me vir embora, agora só penso nela,… tens de me ajudar… Barbudo: Em quê? (sorrindo-se), em conquistar Leiria sozinho? Jovem cavaleiro: Não ouviste D. Afonso, a conquista é certa… Barbudo: A conquista é certa, pois mas é preciso conquistá-la, a Leiria e a Zara, que grande história arranjaste. Jovem cavaleiro: Zara ficará comigo, mas preciso de depois encontrá-la, terás de me ajudar nessa altura. Barbudo: Pois se ainda estiver vivo… Jovem Cavaleiro: Viverás, estou certo disso, um certo corvo mo disse quando voltava para cá, fiquei com a ideia, que serás tu que me ajudarás a consegui-la. Barbudo: Um corvo, dizem que é sinal de sorte. Jovem cavaleiro: Pois é isso que não me tira da ideia… Volta D. Afonso com o seu séquito, um general diz: General: Todos às armas em guarda, Leiria será nossa esta matina. Todos às armas, preparem-se, Portucale se fará! Fecha a luz.
  • 16. 16 Cena 6 O rei Afonso observa o castelo na companhia de um general e o jovem cavaleiro. Rei: Está tudo em sossego, do silêncio desconfio, também do nada se pode fazer uma guerra. Aparecem dois corvos voando, poisam na árvore, piam. Jovem cavaleiro: Senhor estais enganado, o corvo quebrou o silêncio, é bom agoiro General: É verdade há um dito antigo que diz o pio do corvo como sinal de sorte Rei: Talvez será, então será boa hora, de lá ir, mandar o mouro embora. Jovem cavaleiro: Alteza, há lá uma dama, uma princesa de nome Zara, uma luz de esmeralda… Rei: Que tem a tal princesa, quereis ficar com ela? Jovem cavaleiro: Ela ouviu falar de mim e eu dela (tímido) Rei: Ai o jovem sangue, o amor na flor da pele, o que andaste a fazer? Jovem cavaleiro: Via-a uma vez tão bela, de tão longe mas parecia perto. Rei: Ah! Ah! Rindo-se, o Amor, o Amor, com o corvo, tudo vai dar certo. Fecha-se a luz. Cena 7 Castelo. Zara penteia o longo cabelo de seu pai, o Califa, este está fumando o seu cachimbo. Zara: Pai! O amor tem fronteiras? Califa: Pois! Zara: Acaso já alguma vez ouviste de um amor impossível? Califa: Pois
  • 17. 17 Zara: Por exemplo uma Castelhana apaixonar-se por um português, ou uma turca com um judeu? Califa: Pois! Zara: Eu acho que o amor não tem limite, …(com ar intencional) podia muito bem acontecer uma moura casar com um português! Califa: (mais uma fumarada): pois Zara: Mal não achais? Califa: pois! Zara reparando na paisagem o mato deslocando-se (soldados portugueses escondidos por trás do mato aproximando-se do castelo). Zara: Pai! Pai! O Mato anda? Califa: Pois! Zara, tirando-lhe o cachimbo, acordando-o, repete a pergunta: Pai, o mato anda? Califa, Parece acordado: Se o mato anda? Anda, se o levam, se o levam anda. Dá-me cá isso, (continua fumando) Zara fica a olhar para o mato. Quando o mato se aproxima do castelo, o rei Afonso atira: Rei: Por Santiago, entrai por esta porta, Leiria será nossa, ainda se erguerá aqui neste castelo a bandeira do Condado. Tropas portuguesas atacam. Fecha-se a luz momentaneamente, para tirar cenário do castelo e árvore. Luta renhida entre mouros e portugueses. O Jovem cavaleiro luta bravamente, no meio da batalha salva barbudo de morte certa, diz para ele Jovem cavaleiro: Ainda não é a tua hora, o corvo me disse, que tu me ajudarás a salvar Zara. Continuam batalhando. Cena 8 Num lado do palco surge Zara puxada por um capitão, esta grita pede socorro, Barbudo, aparece… Barbudo: Largai-a imediatamente por minha vontade senão arrepender-te-ás.
  • 18. 18 Capitão: E quem és tu, para me dizeres o que fazer, esta noite esta moura será minha no meu leito (desfere um golpe mortal no Barbudo) Barbudo, jaz no chão: Senhor, esta noiva está prometida, ao jovem Afonso nosso nobre cavaleiro. Capitão: Quero lá saber disso, este corpo jovem… o sangue me atiça, defendeis uma moura, soldado, quem és tu afinal? Barbudo já quase morrendo: Um bom soldado, fiel à honra e amizade, do pouco, como homem fui, este será o meu mais nobre acto (atira uma lança do chão ao capitão que o mata instantaneamente), (para Zara), Vinde, ficai junto de mim, com quem faz um cuidar, ninguém te matará, Afonso não tarda virá, (morrendo) que lindos olhos, assim se morre feliz (morre) Zara: (chorando) Não, não morras nobre amigo. Chega o jovem cavaleiro. Jovem cavaleiro: Zara! Meu amor! Zara: Morreu este teu amigo, para me salvar. Jovem cavaleiro: Meu bom amigo, eu sabia… Acaba a batalha, os portugueses ganharam, dão-se “vivas” e “Portucale” . D. Afonso no meio. Rei: Trazei-me o Califa. Soldados trazem o Califa, agarrado ao seu cachimbo, como hipnotizado. Rei: Rendes-te mouro ao rei de Portucale? Califa: Pois! Rei: Levem-no. Muita gente, soldados dançam, pegam em mulheres, sons de gaita de foles , uma festa. D. Afonso à frente do palco fala com o seu general.
  • 19. 19 Rei: O Corvo foi de bom agoiro, tudo correu muito bem, quantas baixas. General: 13 homens morreram, 23 estão feridos. Rei: Não está mal, afinal estamos em guerra, e o jovem Afonso meu cavaleiro, onde está ele? General: Não se sabe, não está entre os mortos nem os feridos, mas sabe-se também que desapareceu Zara, a princesa Rei: Que melhor desenlace este (piscando o olho), não há melhor final, um castelo mais e…com certeza um casamento que aumentará Portucale. Fecha a luz ou o pano. Fim
  • 20. 20 As Três portas da Sé Por Constantino Mendes Alves Ano de 1400 DC Faz-se um círculo de luz no chão. Entra devagar o Avarento com uma candeia acesa para o meio do círculo. Cena 1 Avarento, muito baixinho: Está aí alguém? Está? Não está? Ah! Estão aqui (vira-se para o público), é que eu tenho medo, quer dizer, não gosto de falar com as pessoas (mentindo), sou muito tímido (simulando), vai-se rindo baixinho, falo convosco directamente, por causa da quarta parede, esta, invisível (põe a mão à frente), a parede que separa a história do público, (fica contente), assim vocês não podem vir para aqui, porque são público e eu sou história, sou teatro, vocês não existem para mim e eu não existo para vocês, não é? É tudo uma suposição, ficção, imaginação (sempre baixinho, parece que por vezes se baba) mas, se calhar mesmo assim esta situação é perigosa, (faz um compasso de espera vai olhando sempre para todos os lados), e se, se, se, se, por acaso, porventura, até se estiver aí o autor desta história, Urrrr! (arrepio), ele consegue vir até aqui, ai meu Deus que eu não tinha pensado nisso, digam-me, digam-me depressa o autor está por aí, o dramaturgo, dramaturgo é um nome por onde ele se esconde para escrever histórias de teatro, Sr. Autor? (chama) Sr. Autor, Sr. Drama-tur-go, ele gosta mais deste nome, Ai parece que não está, deve estar a dormir ou a escrever outra história. Bom assim estou mais à vontade. Chamo-me Brás, José, e sou negociante de… não digo do quê, senão ficavam a saber o mesmo que eu. (de repente, olha para o chão), mas, mas, o que está isto a fazer aqui, ai o meu dia de sorte, começa a cantarolar (agora fala alto), isto é, isto é um cêntimo! Ora viva Sr. Dinheiro, é o meu dia de sorte, ai que eu não tinha nenhum dinheiro nos meus bolsinhos, (ouve-se a mulher a chamar) Mulher, voz de fora: ó Brás, vem cá, que não consigo abrir a pipa, Brás vem cá!
  • 21. 21 Avarento: ó raio de mulher não me deixa descansado, deixa-me mas é guardar o meu cêntimo aqui no bolso. Mulher ,outra vez fora: Vem cá Brás, não me obrigues a ir-te buscar aí, olha que eu vou aí Avarento: Não vens, não tens autorização para vir aqui, bem sabes que não podes entrar aqui. Mulher: não vou, isso é que tu te enganas, (começa a bater à porta) deixa-me entrar, vá deixa-me entrar Fecha-se o círculo de luz, abre-se outro num lado do palco, Avarento corre para lá, imita que segura a porta. Avarento: não te deixo entrar, não te deixo entrar Lutam. Mulher: Ó Brás, que horas são? (Brás larga a porta para ver as horas): são 30 minutos para o meio-dia. Como Rodrigues larga a porta, a mulher entra com toda força e derruba-o Rebolam no escuro Rodrigues: Ò mulher o que estás fazer, o que queres de mim, olha que eu sou muito velho: Mulher: larga-me homem, o queres fazer ainda nessa idade, olha- me isto só me faltava mais esta. Acabam a luta, a mulher segura a candeia que há muito estava no chão e acende um candeeiro maior, faz luz geral, o público vê todo o cenário, uma mina cheia de tesouros, jóias, baús cheios de moedas, castiçais, lustres, tudo a reluzir de oiro e prata. Mulher: ai credo que me vai dar um achaque mas o que é isto? O que é isto meu deus? Desmaia, o avarento não sabe o que fazer, por fim decide Avarento, despeja um balde água, (pode ser simulação): já estás melhorzinha?
  • 22. 22 Mulher: ó credo (tonta, acordada) que é isto que dia é hoje, estou em Lisboa? (pergunta para a plateia), tenho que ir à escola já é tarde, (o choque é tão grande que ela não diz coisa com coisa) Por fim, acalma-se Mulher: mas Ó marido, maridinho, isto é tudo teu Avarento, muito contrariado: É,É, é um tesouro, é meu, no meu negócio de emprestar dinheiro, com juros de 20% ao dia, m (começa com uma ladainha, tipo reclame da televisão, façam um texto que mais vos agradar, dizendo tudo até aquelas simulações de crédito com condições especiais, tudo muito rápido dando ar de vigarice) Mulher: Mas isto, (levanta-se) isto é um verdadeiro tesouro, ai que vou abaixo outra vez. A cena repete-se, o avarento vai buscar um balde água, tenta reanimá-la de várias maneiras. Até que acorda, vem de novo à vida. Mulher: mas este tesouro é nosso maridinho, meu queridinho, meu lindo homenzinho, Começa a cantar e sonhar Mulher: Ai o que eu vou gastar, jóias Truffault, champanhe Francês, seda de Caxemira, vou à boite, à discoteca Stress-less, vou à piscina, às Bermudas (á parte) ter muitos amantes (desfaz o à parte) oiro, jóias no meu colo, piercings no umbigo, escravas de diamantes, diademas (podem improvisar muito sobre riquezas e luxúria) Avarento: que há muito vai abanando a cabeça: Não, Não, (vai cantando e depois fica irado) não e não e não, não, não, não, não NÃO! Não!Não!Não! (improvisar) Mulher, dá-lhe outro achaque, a cena repete-se Mulher, recuperada: começa num grande choro, ai, ai, ai, ai, meu desgraçado Avarento: este dinheiro (muito atrapalhado para justificar), este dinheiro mulher é para nos prevenirmo-nos de qualquer coisa que
  • 23. 23 aconteça, de pagar o telefone atrasado, uma telha que se pode partir, de um vidro de uma janela, de uma árvore derrubada pelo vento, pois o vento e se vem uma tempestade e derruba a casa, estás a perceber (a mulher abana a cabeça), posso ter um furo de bicicleta, comprar uma calças novas, que estas já estão rotas em três sítios, se calhar é melhor comprar outras, o que acham meninos, vale a pena desperdiçar dinheiro numas calças novas? Não ,pois não, ainda aguentam bem mais dez anos, ( se o publico o contrariar, dizendo que ele devia comprar, ele deve chamar-lhes gastadores) A Mulher interrompe-o: (virada para o publico) sabem o que vou fazer, vou-me embora, (humilhada), este homem é um monstro. Eu todos os dias com a lida da casa, a prender botões já gastos, porque ele não quer comprar novos, a comprar batatas já podres porque são mais baratas, cenouras com grelo, alfaces estragadas, maçãs cervadas , anda de bicicleta com um pneu furado. Tenho sido uma escrava, eu que na juventude era invejada, e ainda sou bela, deixa- me cá ver (vai-se alindando, puxando os cabelos, torcendo as ancas) ainda sou bela? O que acham, vou procurar marido, coisa que este não tem sido. Sai. Avarento fica só: E se ela disser o que viu, vou ficar bem arranjado, ai meu deus, meu deus (começa às voltas ao palco) o que terei de fazer, se os ladrões vêm, se se souber que eu guardo um tesouro, um tesouro, umas coisecas que eu fui juntando. Corre uma cortina à frente do cenário, por exemplo. Cena 2 Numa rua movimentada, muita ente passa sem olhar o avarento que olha para todos desconfiado. Diálogo entre dois homens, Avarento ouve as conversas Homem um: Parece que há um tesouro Homem dois: tesouro , nunca ouvi falar Homem um: um tesouro, mas tesouro de rei
  • 24. 24 Homem dois: e onde é isso. Homem dois: não sei. Avarento vai reagindo ao desenrolar das conversas com gestos e intergeições tudo em à parte, tipo, Ai, aui, agora é que é, será? Ui, ui, e Ah aliviado por não se saber tudo Noutro sítio do palco outros dois homens. Homem três: um rei que fugiu de um mouro deixou-o aqui, em Leiria Homem quatro: um tesouro o quê? Em Leiria? Homem três: guardado algures numa casa de um negociante? Homem quatro: não sei? Outro par. (podem ser os mesmos actores disfarçados) Homem cinco: um negociante que tem um tesouro inigualável, uma afronta à pobreza Homem seis: por certo roubado Homem cinco: e onde estará? Homem seis: Alguém o procura? Homem cinco: Olha se fossemos nós a achá-lo. Homem seis: ou a roubá-lo, por uma fortuna como essa até matava a minha mulher. Vão –se todos embora. Fica o Avarento. Avarento: ai meu deus senhor todo-poderoso, o que vai ser de mim e do meu pequeno pé-de-meia, ajudai (virado para o céu) ajudai Senhor este pobre homem, humilde a Deus e (à parte) ao dinheiro. Vai saindo, lamuriando-se.
  • 25. 25 Cena 3 Mesma cena do inicio, mina do tesouro. Avarento sentado ao centro contando dinheiro, atirando moedas para um baú. Avarento: Quatrocentos e trinta e dois triliões, trezentos e sessenta e três biliões, novecentos milhões, duzentos mil e novecentos e noventa e nove coroas, e um cêntimo mais (pode ir repetindo o número acrescentando um cêntimo) Voz cansada, termina a contagem Avarento: Isto em moedas, ainda tenho que contar as jóias, e o resto, que vale seguramente o quíntuplo disto tudo (aponta o baú) (ao mexer nas moedas, parece que fica electrizado, com desejo de tocar o dinheiro, mexe, mexe e remexe no dinheiro) Ai meu amigo dinheirinho, tão bonitinho, e é macio, durável, bom amigo do ambiente, dinheiro, o magnífico dinheiro (vai subindo a voz) dinheiro, Sr. Dinheiro, Viva o Dinheiro, eu quero mais dinheiro, dinheiro (som de caixas de registar muito alto, canta, grita, toma banho de moedas, volúpia, luxúria) Por fim cansado deita-se no baú cheio de dinheiro, com uma perna de fora. Batem à parte Voz exterior: Ei, está aí alguém, o que está aí a fazer Avarento, com voz de velhinho: sou eu o Sr. Brás, estou aqui a passar a roupa, a minha mulher deixou-me aqui pobrezinho sem dinheiro (quando diz a palavra dinheiro até treme de frémito), estou muito pobrezinho, (chora) ai a minha vidinha, mas quem fala, quem é Voz: Sou o guarda do rei, Andrade, ando à procura de dois ladrões perigosíssimos que andam por estas bandas à solta por Leiria, Se vir alguma coisa, diga-nos.
  • 26. 26 Avarento: Pois, digo, pois digo, mas eu sou muito pobrezinho não tenho dinheiro nenhum (desconfiado), Nem um cêntimozinho, por acaso não tem aí um cêntimozinho, para o leitinho da manhã, meu caro guarda Andrade Voz: Ó pobre homem, tome lá uma coroa, para se poder alimentar, ponho por baixo da porta. Atiram a moeda, avarento corre com um cão a um osso para a apanhar, Avarento: ai moedinha, moedinha vem cã, Obrigado Sr. GUARDA ATÉ MAIS VER! Voz: Adeus, tenha cuidado consigo. Avarento: cuidado comigo, pois tenho de ter o máximo cuidado, (começa tremer das pernas) Ai os ladrões, e se eles vêm para aqui (começa às voltas pelo palco) O que tenho de fazer para guardar o meu tesouro, o que farei, o que tenho de fazer Até que por fim diz. Avarento: Eureka Apaga-se a luz Cena 4 Dois ladrões em frente a três arcos com portas fechadas Ladrão um: É aqui Ladrão dois olhando para todos os lados: será Ladrão um: A lenda dizia assim: Vai até à Sé de Leiria, vira à direita, aí encontrarás o grande tesouro do Brás. Ladrão dois. É aqui, não há engano Ladrão um: está aqui um aviso, que dirá, não sei ler, nunca andei na escola. Ladrão dois: diz assim (lê painel ao pé das portas)
  • 27. 27 Três portas abrirás, mas só uma em paz, porque outra tem a fome que te come, e na terceira a peste, para que nada de ti reste. Ladrão um: Ó raios, mas assim é impossível, e se não acertarmos logo na primeira? Ladrão dois: Morrerás, morreremos, como vamos saber qual a verdadeira, como é meninos (dirigindo-se ao público, as crianças dão respostas, os actores ripostam argumentando que não querem perder a vida, a única solução é desistir) Ladrões: Não, não, perder a vida não, vamos embora, vou roubar telemóveis, é melhor (cantam, saindo) Será a primeira, ou a segunda, e porque não a terceira, Vamos mas é embora antes que morramos de esperteira Fim
  • 28. 28 A Lenda da Ponte Cavaleiro Por Constantino Mendes Alves Personagens Narrador Soldado um Soldado dois Discípulo um Discípulo dois Venónio, senhor Romano Matrona Escrava __ Abre o pano ou a faz luz Narrador: Era uma vez, Era uma vez, por uma vez serei capaz de contar a história, mete muitos personagens, actores transformados noutras pessoas, Fala do Cristianismo, na religião de Cristo (benze-se), ai nossa Senhora nem sei se hei-de falar disto…Ah! Bem deixa cá ver Era uma vez, pois naquele tempo ninguém tinha uma verdadeira religião, era assim reza aqui reza acolá, ou aqui ou lá, ou lá ou aqui, tanto dá…. A ponte de Cavaleiro e…fim. Voz de dentro: vai-te embora, safado, estás a estragar o espectáculo (atiram-lhe qualquer coisa. Narrador sai.) Cena 1 Dois cavaleiros romanos passeiam a cavalo. Soldado um: Está um bom dia, muito bom Soldado dois (gordo): pois, estava bem era a dormir uma soneca na minha tenda.
  • 29. 29 Soldado um: Pois mas se estivesses na fortificação, estavas a limpar o gáudio, se calhar a limpar as latrinas, é melhor fazer o turno, de vigia Soldado dois: Pois é, mas o que procuramos afinal? Podíamos caçar uma codorniz, assávamo-la, comíamo-la, sem o centurião saber. Soldado um: deixa-te de gastronomias, de comezainas, precisamos saber se o povo, paga o seu tributo, se obedece a Roma. Se está tudo calmo. Soldado dois que tinha estado a beber desde o princípio: ips, pois deixa lá Roma, Roma está muito longe daqui, bebe um golo vá lá. Chegam dois discípulos de São Tiago Cena 2 Discípulo um: Podeis dizer onde ficam as Cortes? Discípulo dois tenta esconder uma cruz Soldado um: não sois daqui, quem são vocês? Discípulo um, somos apóst… Interrompido por discípulo dois Discípulo dois: somos apostadores, apostámos os dois a uma bilha de vinho, como os srs. Legionários não sabíamos o caminho para as Cortes. Discípulo um: Apostadores, pois, pareciam-me que iam a dizer apóstolos, não gosto nada disso, Essas religiões… Não são Cristãos, pois não? Discípulo dois, não cristãos não, vimos de Roma por aquela via. Soldado dois: ips, essa via, vai dar a Roma, pois todos os caminhos vão dar a Roma, olha a novidade. Soldado um, preocupado com o espectáculo que o colega estava a dar: sigam, sigam por ali, não liguem ao meu colega, está muito sol, avé Discípulos: Avé
  • 30. 30 Saem Cena 3 Venónio, senhor Romano, come uvas no divã, a mulher toca lira. Uma rapariga dança. Venónio: lá, lá, lá, ra lá lá (canta, come uvas bago a bago). Salta, dança, gira pula, esta escrava é um espectáculo, faz tudo o que quero, agora ri, chora etc Entretêm-se um bocado assim. Ouve-se palmas batendo, interrompendo o espectáculo Pás, pás, pás Matrona que toca lira: Quem vem lá, (manda a escrava abrir a porta) Venónio: algum vendedor de cavalos por certo, ou então qualquer cristão a pedir para a Senhora da Gaiola, vai lá, vai, vai, (dá-lhe palmadinhas no traseiro). A escrava volta Escrava: São dois homens, dizem que vieram por bem, enviados por Dona Loba, que vive aqui a meia légua de distância. Venónio: A Dona Loba, (à parte) não me lembro quem será, alguma matrona com quem namorei por ai, ora deixa- me lá ver, Engrácia, Luísa, Dores, ai a dores que dores no coração me fazia, a Helena, a Dido, Dona Loba) Deixa o à parte Ah a Dona Loba a do Pomar ao pé da Ponte do rio Lis, a minha amiga que me manda sempre um cestinho de fruta, lembra-te dela Lorena, a fruta? A parte, e eu a pensar que a fruta era outra.
  • 31. 31 Que entre, que entrem pois então amigos dos meus amigos, amigos são Entram os discípulos Discípulo dois: tira a cruz que traz debaixo da túnica) que a paz do senhor esteja nesta casa. Todos os romanos fogem a sete pés da cruz, como o diabo da cruz, torna-se tudo numa farsa Discípulo um manda guardar a cruz, todos regressam, durante o resto da cena o discípulo dois, volta e meia mostra a cruz, oportunamente quando tiver sentido, todos reagem. Discípulo um: O que me traz aqui é a fé cristã e São Tiago. Dona Loba Quer pedir-lhe uma opinião, deu-nos esta carta de apresentação. Venónio lê a carta em à parte, alto. Lê como se fosse Dona Loba a ler, com voz de cana rachada e parola, a cantar à moda de Leiria. Senhor Venónio, meu caro senhor, São Tiago quer que professe a religião cristã, mandou estes dois apóstolos de Cristo, para me converterem, para que eu reze a Cristo, e confie nas suas sábias palavras Santas. Mas eu não sei, meu caro senhor se faço bem ou mal, tenho medo de ir fazer uma grande asneira, Se professo a religião Cristã, já não serei pagã, deixo de adorar esses deuses todos que o Sr. Me está sempre a dizer que são também bons. E se eu ficasse com os deuses todos, podia rezar a todos , uma a um por cada dia, o que acha, oiça-me sr. Estes apóstolos que são pessoas santas e só querem fazer o bem, ainda agora me tiraram um calo do pe, e também um joanete, e endireitaram-me as costas.
  • 32. 32 Manda- me a resposta a sua resposta por eles outra vez, está bem?. P.S. depois mando-lhe mais um cestinho de maçãs. A sua Dona Loba. Venónio fica irado quando termina de ler a carta, faz um espectáculo de ira, A matrona improvisa, tentando acalmá-lo Venónio: Cristão, Cristão odeio os Cristãos, vai dizendo várias vezes Venónio: Chamem os guardas Vêm os soldados, prendem os apóstolos Cena 4 Os Dois discípulos na prisão, rezam Discípulo um: Senhor ouve-me, peço-te em nome do que é mais sagrado, do cálice santo, da hóstia sagrada, ouvi, estás me ouvir Senhor? Discípulo dois: Se calhar não está, está a fazer milagres, ou saiu para ouvir qualquer confissão Discípulo dois: Não deus é omnipotente e omnipresente, deus está em todo o lado Discípulo dois: pois menos aqui, fazia agora um jeitão, (entusiasmado) podia fazer um milagre, tipo homem aranha, super maxi ( os dois vão-se entusiasmando, lembrando super heróis.) Voz gravada muito alta, interrompe-os:
  • 33. 33 Sou Deus, todo Poderoso, (tudo treme) (relâmpagos) Hei, estão-me a ouvir, agora são vocês que não ouvem, (assobia,) Sou Deus Todo Poderoso, mas ninguém me liga? Sou Deus poderoso mais alto e com trovões, por fim ouvi-vos mas por favor da próxima rezem mais alto, e não façam tanto disparate, Enviarei um anjo para vos libertar. Vem um anjo, pode ser projectado no cenário, e os apóstolos fogem Imediatamente ouve-se um silvo, pode ser um assobio Os dois soldados a cavalo perseguem os apóstolos, mímica em câmara lenta, música do Vangelis, por exemplo (tema “momentos de glória) Estendem-se umas cordas como se fosse uma ponte Passam os apóstolos e aparece um anjo outra vez Os soldados tentam passá-la mas caem quando a ponte se parte ao meio. Quando aparece o anjo, há o seguinte diálogo: Soldado dois: o que é isto, estou bêbado ou quê (soldado um temente a Deus, começa tremer) Ouve-se a voz gravada outra vez: Sou Deus Todo Poderoso (trovões, relâmpagos fortes) S ou Deus único, Pai de Cristo, todo-poderoso, Saiam da ponte que vai cair (soldado foge a sete pés)
  • 34. 34 Soldado dois: Vai o quê, cair o quê? (perdido de bêbado) vai cair vinho, vais fazer chover vinho, venha de lá um copo. A ponte começa a cair Soldado dois: è pá esta coisa vai cair, oh Deus não podes fazer isso a um distinto cavaleiro, eu ainda tenho de passar à espada aqueles mafarricos que iam a fugir. Cai a ponte. Fecha-se a luz Volta o Narrador empurrado por outros actores Narrador: E, e, e cá vai, e como caiu um cavaleiro com a ponte, que interrompeu a perseguição dos dois cristãos, começou-se a chamar a esta ponte a meia légua das Cortes, A ponte do Cavaleiro Real, Real, não há história igual Vitória, Vitória acabou a História Tira uma placa da barriga dizendo fim. Fim
  • 35. 35 A Fonte da Barroquinha Por Constantino Mendes Alves Cena 1 Cortejo real. Dois ou três actores fazem de cavalos, os cavaleiros podem fingir que montam, mas ficam ao lado dos cavalos, como acharem melhor. Ouve-se galopar Rei: Tenho sede, dai-me de beber Bobo: o rei tem sede, dá-lhe de beber Pajem: Senhor, já não resta mais água para beber, há muito que não encontramos poço Com água boa para beber, água potável (em aparte) Rei: (com os olhos fechados): Dai-me de beber, tenho sede. Bobo: (imitando o rei) dai-me água, dai-me água que eu vou morrer (cai no chão, dá uma cambalhota) Pajem: É como vos digo Senhor, sua Alteza bebeu toda a água que nos restava, já não há mais água. Bobo: (fazendo caretas) não há, acabou, niente, rien, nada de nada x nada igual a nada, senhor tendes nada de água para beber Rei (quase hipnotizado): dai-me dessa água O bobo finge dar-lhe um fole de água. O Rei (segura e bebe): Que boa água, mas continuo com sede. Bobo: É porque não digeriste bem ainda (esfrega a mão na barriga) Rei: continuemos. Ouve-se outra vez o galopar (fazer uma composição cénica engraçada com muito jogo dramático, que dê uma imagem de cortejo pesado e caricaturado de um cortejo real) Mais adiante Rei: Ai que tenho sede, tenho as vísceras secas, pajem dai-me água para beber Bobo: vai rapaz, dá-lhe água não ouviste (faz um gesto com o dedo na cabeça, como quem diz que o rei não regula lá muito bem)
  • 36. 36 Quando passa o pajem o bobo dá-lhe um pontapé no cu. O pajem cai no chão. Bobo: Ó rapaz, ainda deitas toda a água no chão, descuidado. O pajem fica furibundo, corre atrás do bobo, andam ali às voltas atrás um do outro com o bobo a esgueirar-se a passar por baixo dos cavalos, escondendo- se dando pulos, etc Rei: Tenho sede, dai-me água para beber. Os outros dois param o pajem dirige-se ao rei. Pajem: Senhor, Sua alteza, já não há mais, água , eu ainda há pouco lhe disse, não encontrámos nenhum poço faz mais de 10 léguas daqui. Rei: Pois dessa água beberei. O pajem fica sem saber o que fazer. O bobo encolhe os ombros e fala assim, Bobo: Senhor, aqui tendes mais água, desta boa da imaginação, água vai! O rei bebe do fole imaginário. Continuam a marcha. Galope O rei cai no chão. Cena 2 O Rei parece que acorda com a queda. Onde estão eles, onde estão, (puxa da espada), quereis lutar (luta com o bobo, este vai-lhe dizendo quem é e vai-se defendendo das estocadas) Bobo: Senhor sou eu, o teu bobo, uh uh! Estais – me a ouvir, senhor, sou eu o Malaquias (cheio de medo) não me matais (chora) depois quem vos dirá as piadas, te fará rir, olha eu conheço uma anedota muito engraçada de um rei Castelhano (vai fugindo), do teu primo, Senhor, não quereis rir do teu primo (foge) (aparece noutro sírio, o rei corre para ele com a espadana mão) o Seu primo, rei, queria um traje muito fino, Ai, Ai, (esquiva.se), mandou chamar um alfaiate (trepa para as cavalitas de um outro cavaleiro) e o alfaiate, Senhor, agora não me apanhas, (jogam), ouvi (por vezes o rei pára para ouvir e solta
  • 37. 37 expressões como, estais-me a mentir, sois um mouro, vou-te matar, ou fica interessado na conversa, mas depois investe contra o bobo) o bobo continua a história: e o alfaiate fabricou um traje maravilhoso e levou-o ao rei. (foge para a plateia, o rei corre atrás dele) mas quando apresentou o traje ninguém na corte viu o traje, o alfaiate disse que só as pessoas inteligentes é que o podiam ver (por fim o rei encurrala-o, põe- lhe o gume da espada junto da garganta) Rei: Ah!Ah! Agora não me escapas Bobo: o fim, o fim Rei: o quê, pois é o teu fim Bobo: o fim, o fim da história Rei: ah sim, conta lá Bobo: o Senhor seu primo como era muito vaidoso, disse que sim que o traje era muito bonito, que eu via maravilhosamente. Rei: E então? Responde, quero saber o resto da história que estou a ficar cheio de sede outra vez. Bobo: desaperta, desa-perta Rei: desaperto o quê? Bobo: o meu pescoço (numa voz sufocada) O rei liberta-o um pouco Bobo: E assim, o Senhor seu primo, saiu à rua em corteja todo nu, só com o fato invisível, todos à sua passagem, baixaram as cabeças em sinal de respeito, elogiando o seu traje, mas houve uma criança que disse, olha o rei vai nu, todos olharam e depois de olharem uns para os outros desataram às gargalhadas. Rei, começa também a rir: Ah! Ah! A gargalhada estende-se por toda a comitiva, incluindo cavalos também e deve estender-se ao público. Até que o rei cai no chão. Rei: tenho sede ai que tenho sede Pajem: Senhor não temos nenhuma água. O Rei levanta-se aos poucos Rei: Tem de haver água por perto, um rei não pode morrer de sede, só morrerei pela espada em combate. (olha para todos os lados. Monta a cavalo. De um dos lados está uma rocha) Rei: vamos procurar água, a nossa vida depende disso.
  • 38. 38 Ao passar por uma rocha, desesperado disse: Rei: “Maldito cavalo que não escoicinha esta rocha até fazer água a fartar.” ”Palavras não eram ditas e o cavalo real, como se tivesse compreendido a fala irada do seu dono, dá uma forte parelha de coices na rocha que fez estremecer céu e terra. A escoicinhadela foi tão violenta que o rei teve de se amparar com a sua espada na rocha, no mesmo sítio onde o cavalo do rei escoiçara. Mas a espada, de fraca resistência, encontrou e furou a rocha, e, do furo aberto, jorrou água abundante e fresquinha que dessedentou o rei e toda a sua comitiva” Bobo: Senhor, um verdadeiro milagre, podeis ser santo, ai que água tão fresquinha. Rei: de tanta mágoa se fez a água, Todos riem. Rei: E aí ficou toda a sede minha, Na fonte, na fonte da barroquinha Bobo: Vitória, Vitória, acabou-se a história Fecha o pano e a luz FIM