3. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Na contemporaneidade, somos provocados a construir dispositivos clínicos
diferentes daqueles que sempre foram utilizados classicamente como a
poltrona e o divã.
◦ A questão é: como montar esse dispositivo clínico em instituições? Como
criar uma situação onde mesmo diferente do consultório, obtém-se o
controle e guarda uma situação que constitui o enquadre para a escuta
psicanalítica?
04/10/2023
4. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Levando em consideração a relativa brevidade da psicanálise como
teoria em crescente introdução no campo das políticas públicas e
instituições em geral, como distinguimos o que se trata de um
trabalho psicanalítico nos ambientes para além do consultório?
04/10/2023
5. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Em Freud (1923/2011) temos uma descrição objetiva da psicanálise, tratada
como um procedimento de investigação dos processos psíquicos, um método
para o tratamento de distúrbios neuróticos baseados nessa investigação.
◦ Esse método de investigação leva em consideração a existência de processos
mentais inconscientes, o reconhecimento da teoria da resistência e da repressão,
considera a sexualidade e o complexo de Édipo, como fundamentais no
processo da constituição psíquica, sendo esses os principais conteúdos e
fundamentos da psicanálise.
04/10/2023
6. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Esses fundamentos são o que caracterizam a psicanálise, entretanto o procedimento psicanalítico não
tem o caráter universalizante, mesmo dentro do consultório enquanto lidamos com a
singularidade do sujeito.
◦ Fora do consultório, não devemos recuar em exercer a psicanálise, mesmo diante de uma demanda
em que os moldes assumem outra configuração, tendo em vista que nosso denominador comum
certamente não é outro senão o sujeito.
◦ Lacan (1998, p.331) nos comunica de maneira irônica e certeira: “... uma psicanálise, padrão ou
não, é o tratamento que se espera de um psicanalista”. Ou seja, a psicanálise está onde está o
psicanalista, ou ainda, onde se encontra presente o desejo do analista.
04/10/2023
7. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Figueiredo (1997) destaca algumas condições mínimas para que se considere um trabalho psicanalítico, e sua
distinção do campo das psicoterapias em geral.
◦ A realidade psíquica, onde vemos a especificidade da psicanálise em dar primazia às produções que o sujeito traz
em sua fala, nos remetendo à regra fundamental da psicanálise, a associação livre;
◦ A transferência, a qual Freud a considerava não ser um fenômeno que se manifestasse exclusivamente na situação
clínica, mas também está presente em nossas relações do cotidiano, não sendo diferente do sujeito inserido na
instituição;
◦ a terceira condição se refere a uma posterioridade da palavra do analista, já que a temporalidade no inconsciente
não obedece ao nosso tempo cronológico, possibilitam-se elaborações posteriores por parte do sujeito de forma
que a palavra produz deslocamentos sucessivos que fazem variar a repetição, subvertendo assim a posição do
sujeito em sua realidade psíquica.
04/10/2023
8. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Esse dispositivo clínico da psicanálise pode ser um espaço psíquico que faz
falar e falando o sujeito se revela. E essa função pode acontecer em qualquer
instituição, pois “é importante entender que clínica não é igual a consultório: o
consultório é uma das clínicas possíveis” (BROIDE, 2019, p. 56).
◦ O psicanalista na instituição teria o que a dizer ao lado de outras áreas do saber que
sustentam uma verdade ou uma resposta para o sujeito?
04/10/2023
9. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Oury (2009), em seu seminário “O Coletivo”, problematiza que no espaço coletivo há uma
fragilidade desconhecida, sobretudo, porque existem ciladas, proteções que desviam a atenção.
◦ As pessoas se encontram em estado de adoecimento, vulnerabilidades sociais, expostos a
violências, e então surge o questionamento: o que fazer com essa “parafernália” psicanalítica?
Nesse ponto, ele afirma que há uma decisão a tomar, se decide-se que não nada há fazer,
não haverá nada a fazer.
◦ Ele se apoia em Lacan, para aprofundar a questão, citando que “não há fatos que não sejam
fatos de discurso”, a menos que a equipe possa construir o caminho para um “algo a fazer
possível”.
04/10/2023
10. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ O trabalho do psicanalista possibilita colocar em questão as relações
transferenciais no âmbito institucional.
◦ Outros profissionais podem desconhecer esse fenômeno, mas o analista na
instituição considera a transferência como a manifestação de uma compulsão à
repetição, uma repetição de necessidades pulsionais que não foram preenchidas
no seu tempo no passado,
◦ e quando há a possibilidade da transferência ser interrogada na sua
manifestação, podemos colocar em trabalho os impulsos eróticos escondidos e
recalcados do paciente, ação crucial para o tratamento.
04/10/2023
11. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ Há nos espaços institucionais, a possibilidade de encontro do sujeito com o
analista, Oury (2009), coloca que quando isso ocorre, há mudança estrutural,
relacionando esses encontros com as diferentes formas de transferência.
◦ A instituição deve ser capaz de levar em conta e não de esmagar as dimensões
frágeis, mas de grande importância da ordem da transferência. Na instituição a
transferência pode ser entendida como o que permite ao sujeito manifestar
através da emergência de um “dizer”, o que pode ser a coisa mais difícil de
preservar, visto que a maior parte das instituições passa ao lança chamas em
toda possibilidade de emergência do dizer.
04/10/2023
12. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES/ GRUPOS
◦ No texto Psicologia das massas e analise do Eu (1921/2011), Freud aponta
que todas as relações são objetos privilegiados da pesquisa psicanalítica.
Quando se fala de psicologia social ou das massas, existe o costume de abstrair
dessas relações, e isolar como objeto de investigação a influência que um
grande número de pessoas exerce simultaneamente sob o indivíduo, pessoas às
quais ele se acha ligado de algum modo, mas em muitos aspectos elas podem
parecer estranhas.
04/10/2023
13. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES / GRUPOS
◦ Ainda no mesmo texto, Freud recorre à contribuição da teoria de Le Bon, o qual
coloca que deve-se levar em consideração, que ao se reunirem em uma massa, todas
as inibições individuais caem por terra, e todos os impulsos cruéis, brutais, destrutivos
que dominam o ser humano são despertados para a livre satisfação. Se inserido em
uma massa, o indivíduo isoladamente não se sente responsável por suas ações, pois,
está protegido pela legitimação dos demais e esse fator, permite de certa forma, a
liberação de instintos agressivos... há ainda outro fator psicológico relevante,
designado pelo termo técnico de Identificação, a mais antiga manifestação e original
forma de ligação afetiva; nas circunstâncias de formação de sintomas, ou seja, da
repressão e do predomínio dos mecanismos do inconsciente.
04/10/2023
14. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES / GRUPOS
◦ Estamos todos vulneráveis a essas identificações assim como ao efeito que a massa
produz, dificilmente se é vacinado contra esse efeito da massa que pode se tornar uma
“doença institucional” sendo assim, não somos imunes aos sintomas que ela pode
causar.
◦ Visto que somos seres inconscientes e o inconsciente é inalcançável por completo,
assim, é preciso ficar em uma lógica particular, e, para transpor essa dificuldade
alcançar a lógica do “não tudo” que é o mínimo. Em psicanálise, não dispomos de
garantias, mas apostamos na formação do analista como efeito capaz de sustentar
essa lógica.
04/10/2023
15. ESCUTA ANALÍTICA EM INSTITUIÇÕES
◦ A clínica psicanalítica não deve se limitar a um lugar geográfico, mas a um
método que possibilita uma relação com o sofrimento ali onde um profissional
escuta o outro, demonstrando que reconhece ali o sofrimento de alguém com o
objetivo de tratar o sujeito, tendo em vista que tratar nem sempre é a mesma
coisa que curar. Sendo assim, não devemos recuar diante desses novos
contextos onde o psicanalista está inserido, como instituições de saúde,
hospitais, escola, abrigos, empresas, na rua e até nas universidades.
04/10/2023
16. Referências:
◦ FIGUEIREDO, Ana Cristina. Vastas confusões e atendimentos imperfeitos: a clínica psicanalítica no
ambulatório público. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1997.
◦ FREUD, Sigmund. O Caso Schreber, Artigos sobre Técnica e outros textos (1911-1913). Tradução e
notas Paulo Cezar de Souza. – São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
◦ __________1856-1939. Psicologia das massas e análise do eu e outros textos (1920- 1923)/ Sigmund
Freud; tradução Paulo César de Souza – São Paulo: Companhia das Letras, 2011.
◦ LACAN, Jacques. O seminário VII: a ética da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008.
◦ OURY, Jean.O Coletivo; tradução Antoine Ménard... [et al.]. – São Paulo: Editora Hucitec, 2009.
04/10/2023