Este artigo discute o surgimento de novos movimentos cívicos independentes em resposta à "crise" e ao modelo dominado pelos partidos políticos. Argumenta que os cidadãos estão se mobilizando espontaneamente para pedir um novo paradigma de governança fora do sistema partidário, e que as eleições autárquicas em Portugal dão uma oportunidade para esses movimentos apresentarem alternativas. Também destaca o exemplo do movimento SerCascais.
1. Por um novo paradigma
de governança
partidariamente descomprometido, a pedir
Debate Autárquicas 2013 um paradigma novo de governança.
Isabel Magalhães Esta atitude de cidadania activa não
pode deixar de ser valorizada e vista como
uito se tem escrito e falado positiva, no entanto, está ainda num estádio
M
sobre as ondas de choque da inicial. Os movimentos que têm surgido são
actual “crise” no quotidiano ainda muito desorganizados, sem lideranças
das sociedades ocidentais e claras e muitas vezes sem um conteúdo
na vida dos seus cidadãos, programático que seja orientador.
mas pouco se tem debatido Em Espanha, a recente criação do Partido
sobre as possíveis virtudes X — Partido do Futuro parece estar a querer
que poderão emanar dos dar um passo em frente, apresentando
tempos difíceis que se vivem. algumas ideias mais focadas e objectivas,
Correndo o risco de soar assumindo que quer ir mais longe que os
à mais simplista das banalidades, não deixa “Indignados” ou que o Movimento 15 M.
de ser uma evidência quase científica que Este partido, à semelhança de outros
qualquer crise tem a potencialidade de se movimentos de cidadania, e como este
transformar numa oportunidade ou, pelo jornal noticiou, inspira-se em “formas de
menos, de se materializar num momento intervenção cidadã na gestão política como
de ruptura com alguns paradigmas vigentes foi a redacção
já desactualizados e desajustados às da Constituição
necessidades dos tempos. islandesa ou os
E os sinais que se vão tendo, sobretudo gabinetes digitais da
nos últimos dois anos, são indiciadores de capital da Islândia,
que algo diferenciador está em marcha. Algo Reiquejavique, ou
novo. Os cidadãos começaram a fazer ouvir a
Algo novo está Porto Alegre, em Rio
sua voz. Mas, ao contrário de outros tempos em marcha. Grande do Sul” .
históricos de forte contestação social, desta Estas novas
vez as pessoas têm vindo para a rua sem
Os cidadãos “formas de
qualquer amarra política ou ideológica. começaram intervenção
Assiste-se a uma mobilização espontânea a fazer ouvir cidadã” podem
dos cidadãos contra um paradigma de assumir particular
governança (e não tanto contra o modelo a sua voz importância em
de sociedade) que consideram ter chegado momentos eleitorais,
ao fim. Um paradigma assente num sistema já que representam
político, dominado pela “partidocracia” uma nova opção
que, em vez do interesse geral, tem independente face
privilegiado lobbies e clientelismos e aos tradicionais
incapaz de criar governantes que dêem actores do sistema
resposta aos principais problemas das político.
sociedades contemporâneas, como se pode Em Portugal, os
ver, por exemplo, pela não regeneração do cidadãos e movimentos independentes vão
sistema financeiro e económico que, desde ter este ano uma excelente oportunidade
2008, tantos danos tem causado a países e para se mobilizarem enquanto alternativa
a cidadãos. à lógica reinante dos partidos instalados e
Conscientes dessa realidade, os cidadãos apresentarem projectos inspiradores nas
têm-se expressado, manifestado, revoltado… eleições autárquicas que se avizinham.
Por vezes, de forma maciça (embora Foi, aliás, nesta lógica que o movimento
ordeira), como ficou bem evidente na independente SerCascais, criado em 2010,
manifestação de 15 de Setembro do ano se está a organizar como grupo de cidadãos
passado, a maior de sempre em Portugal, eleitores para se candidatar às autárquicas
que juntou nas ruas de várias cidades deste ano no concelho de Cascais, com uma
portuguesas milhares de pessoas a exigir dinâmica distante dos interesses da lógica
uma nova atitude dos governantes. partidária e visando apresentar aos cidadãos
Já antes, a 12 de Março de 2011, a um nova forma de Ser, Estar e Governar.
iniciativa da autoproclamada “Geração É verdade que o sistema eleitoral
à Rasca” assumia-se como a maior português ainda está pouco receptivo às
manifestação desde os agitados tempos pós- candidaturas independentes, criando-
revolucionários do 25 de Abril. Daqui sairia lhes inúmeras dificuldades burocráticas
o Movimento 12 de Março. e administrativas. No entanto, tudo isto
Também em Espanha o mundo ficava não deve desmotivar os cidadãos de se
a conhecer o Movimento 15 de Março, mobilizarem, numa altura tão importante
resultado de uma dinâmica espontânea como esta, em projectos que acreditem
potenciada através das redes sociais, sob o ser portadores de uma nova abordagem à
lema Democracia Real Ya. gestão da causa pública.
São vários os exemplos que podem ser
dados, em diferentes países, mas todos Presidente do SerCascais – Movimento
têm em comum a voz do cidadão, política e Independente