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Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 127
Benjamim Bley de Brito Neves et al.Revista Brasileira de Geociências 34(1):127-134, março de 2004
O SISTEMA TAFROGÊNICO TERCIÁRIO DO SALIENTE ORIENTAL
NORDESTINO NA PARAÍBA: UM LEGADO PROTEROZÓICO
BENJAMIM BLEY DE BRITO NEVES1
, CLAUDIO RICCOMINI1
,
TÂNIA MARIA GOMES FERNANDES2
& LUCY GOMES SANT’ANNA3
1 - Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, Pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, Rua do
Lago 562, CEP 05508-080, São Paulo, SP, Brasil, e-mail: bbleybn@usp.br
2 - Instituto de Geociências, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, SP, Brasil, doutoranda.
3 - Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo e Bolsista de Pós-Doutoramento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo -
FAPESP
Abstract THE TERTIARY TAPHROGENIC SYSTEM OF THE EASTERN PARAÌBA SALIENT, NORTHEASTERN
BRAZIL: A PROTEROZOIC LEGACY This paper presents data on the E-W to ENE-WNW-trending graben and horst system
in the easternmost part of Paraíba State, Brazil. The installation of this Tertiary tectonic unit was performed following previous
structural trends of the Precambrian basement, comprising as a typical case of brittle-ductile structures reactivation. The graben and
horst system are positioned in the easternmost part of the Borborema Province, whose main evolutionary phase occurred from the
Late Neoproterozoic to the Cambrian, superposing lithostructural units of the Neoproterozoic Alto Moxotó terrane (to the south),
composed of orthogneisses and peraluminous supracrustal rocks, and of the Eo-Neoproterozoic Alto Pajeú Terrane (to the north),
comprising volcano-sedimentary supracrustal rocks metamorphosed under amphibolite facies. During the closing events of the
Brasiliano Cycle, these terranes were penetrated by Cambrian fissural basic intrusives that crop out along the WNW-ESE direction
(most of them). This basic dyke swarm is reported here for the first time. During the Tertiary, the most important period for the
regional geomorphological evolution, the main structural Brasiliano trends were reactivated as extensional faults, leading to the
formation of the taphrogenic system discussed here. At that time, some new faults of extensional character were also formed. As
similar occurrences have been described elsewhere (e. g. Rio Grande do Norte State), these facts bring new elements for the discussion
of the regional geology of Borborema Province, especially in terms of geomorphological evolution (certainly, a new aspect to be
considered) and groundwater resources (heavily demanded in such semi-arid area). Additionally, the occurrence of such brittle
Tertiary tectonism in the (next) interior of the continent necessarily opens again the problem of the structural behavior of the
Cretaceous coastal basins, in order to investigate the formation of structural traps for hydrocarbon during this period.
Keywords: taphrogenic system, Tertiary, Borborema Province, Alto Moxotó Terrane, Alto Pakeú Terrane, tectonic reactivation.
Resumo Este trabalho procura arregimentar os principais dados obtidos sobre um sistema de grábens ehorststerciários implantados
no extremo leste da Paraíba (a leste do meridiano 36° W), de direção geral E-W a ENE-WSW. A implantação destas estruturas ocorreu
consoante nítido proveito das linhas estruturais do embasamento, processo típico de reativação tectônica. O sistema tafrogênico
desenvolveu-se no extremo leste da Província Borborema. A evolução tectônica desta província teve lugar principalmente durante o
Neoproterozóico – Cambriano, sobre unidades litoestruturais paleoproterozóicas do Terreno Alto Moxotó, localizado mais ao sul e
composto por ortognaisses e rochas supracrustais peraluminosas, e Eo-Neoproterozóicos do Terreno Alto Pajeú, localizado mais ao
norte e que é composto de rochas supracrustais vulcano-sedimentares de fácies anfibolito. No fecho de desenvolvimento geotectônico
proterozóico (Ciclo Brasiliano), estes terrenos foram penetrados por intrusivas fissurais básicas de idade cambriana, que formam um
enxame expressivo de direção geral WNW-ESE e são apresentadas pela primeira vez neste trabalho. No Terciário, as principais linhas
rupturaisforamretomadascomcaráterdistensivo,consignandoosistematafrogênicoagoraabordado.Comoocorrênciassimilares têm
sido freqüentemente descobertas, a presença destes sistemas tafrogênicos traz importante repercussão na análise da geologia regional
básica, principalmente em termos da geomorfologia, onde surge ponto de vista inteiramente novo, e no tocante aos recursos hídricos
subterrâneos, já que a região apresenta alta demanda deste bem. Pode-se incluir neste tópico de importância o reexame, agora
necessário, do comportamento das bacias costeiras, que devem ter sido também submetidas a esta tectônica rúptil, carecendo a
investigação complementar sobre a viabilidade de formação, no Terciário, de armadilhas para hidrocarbonetos.
Palavras-chave: sistema tafrogênico, Terciário, Província Borborema, Terreno alto Moxotó, Terreno Alto Pajeú, reativação tectônica
INTRODUÇÃO Este trabalho aborda os primeiros dados
geológicos e estruturais sobre um sistema tafrogênico terciário de
direçãoE-WaENE-WSWocorrentenochamado“salienteoriental
nordestino”, na região da Província Borborema situada a leste do
meridiano 36°W. Este sistema está situado principalmente no
domínio geográfico do Estado da Paraíba, com pequena extensão
no nordeste do Estado de Pernambuco (Fig. 1).
A tectônica distensional é marcadamente posterior ao
arqueamento pós-Cretáceo Superior que sucedeu o remate de
formação do Atlântico, quando da coalescência final dos tratos
oceânicos Equatorial e Central, no Maastrichtiano. Todas as linhas
estruturaisobservadastomaramproveitoflagrantedeantigaszonas
de falhas pré-cambrianas, tanto de cisalhamento simples como de
transpressão, do final do Neoproterozóico a início do Cambriano,
Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004128
O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico
que estiveram ativas durante a cratonização da Província
Borborema.AmovimentaçãoverticalprocedidanoTerciárioretratou
em parte os comportamentos reológicos dos distintos terrenos
pré-cambrianos subjacentes aos depósitos terciários, oTerreno
AltoMoxotó-TAMeTerrenoAltoPajeú-TAP(BritoNevesetal.
2001a, b), conforme esquematizado nas figuras 1 e 2.
Embora nossas observações estejam centradas entre os
paralelos 6° 30’ e 7°30’S, principalmente na Paraíba, pode-se
adiantar que a presença de eventos distensionais terciários e mais
recentestêmsidomodernamentecomprovadosemtodaaProvíncia
Borborema, especialmente nas zonas mais costeiras, consoante
uma série de trabalhos apresentados nos últimos Simpósios de
Figura 1 - Esquema sinóptico da geologia regional, mostrando a distribuição das principais falhas e dos sedimentos terciários.
Localidades mencionadas: BV – Boa Vista; CAJ – Faz. Cajazeiras; LP – Lagoa da Pedra; SJP – São José do Pilar; SA – Fazenda Sto.
Antônio; MA – Maneco; PV – Faz. Primavera.
Figura 2 - Seção geológica esquemática NNW-SSE exibindo a compartimentação do sistema tafrogênico terciário do saliente
oriental nordestino na Paraíba. A designação de terrenos pode ser vista de forma mais completa em Brito Neves et al. (2001 a, b).
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1. S u bs trato pa leo p roteroz óic o
2. S u prac ru s ta is m e so /n e o prote ro z ó ic as
PR O V ÍN C IA CO ST E IR A
G ru po B a rreiras
G ru po P araíb a
D e pó s itos terc iá rios em gráb e n s
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S.JoséPilar
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M e tag ra uva c a s , b iotita -gn a is s e s , x is to s
O rto g n a is se s , m ig m a tito s , g ra nu lito s
M e tag ra uva c a s , x is to s p e ralu m in o s os
(C o m p le x o S e rtâ n ia )
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Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 129
Benjamim Bley de Brito Neves et al.
Geologia do Nordeste da Sociedade Brasileira de Geologia (vide
as atas dos simpósios de Recife, 2000 e Natal, 2001). Trabalhos
recentes(e.g.Amaro1998,Bezerraetal. 1998,2001,MoraisNeto
1999,MoraisNeto&Alkmin1999,2001,Bezerra&Vita-Finzi2000,
Barreto et al.2002)vêmgradativamentemostrandoumpanorama
interessanteeimportantedemovimentaçãotectônica,nãosomente
extensional, durante o Cenozóico na província.
Na verdade, informações e outras alusões de movimentação
tectônica (inclusive magmatismo básico) do Terciário nesta
província têm circulado ora informalmente, ora de forma muito
restrita, desde os anos 70. Mas, como o Terciário foi o período
importante do desenvolvimento geomorfológico regional, o
tratamento desta questão tectônica foi de certa forma relegado ou
tratado muito qualitativamente. A importância maior presumida e
a maior divulgação foi para amplos arqueamentos e sucessão de
formaçãoescalonada,dolitoralparaointerior,depediplanos,mais
subordinada ao fator paleoclima, idéias vigentes desde o clássico
trabalho de Andrade & Lins (1965) (com muitos seguidores e
compiladores). A ênfase sempre foi - em termos de estudos e
bibliografia - para amplos ensaios geomorfológicos, com grande
profusão de nomes de “superfícies”e/ou “pediplanos”. Uma
espécie de síntese conclusiva destas versões mais “geomorfoló-
gicas” foi feita por Mabesoone & Castro (1975), já contando com
o apoio dos mapas topográficos 1/100.000 da Superintendência
do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE, mas que passou ao
largo muitas observações geológicas e geomorfológicas.
O substrato pré-cambriano da área, a parcela mais oriental da
Província Borborema, foi objeto de dois trabalhos recentes de
cunho geotectônico e geocronológico (Brito Neves et al. 2001a,
b). São reconhecidos, de norte para o sul, três terrenos tectono-
estratigráficos distintos: o Terreno Rio Grande do Norte,
representado pela área de exposição do Maciço São José do
Campestre (composto por rochas paleoproterozóicas com núcleos
arqueanos), ao norte do Lineamento Patos; o Terreno Alto Pajeú,
na porção mais central, composto de supracrustais e ortognaisses
eo-neoproterozóicos, imediatamente ao sul do Lineamento de
Patos; e o Terreno Alto Moxotó, na parte mais ao sul. Este último
previamentedesignadodeMaciçodeCaldasBrandão(designação
esta abandonada por obsoleta) é composto em parte por diversos
tipos de ortognaisses e por outra parte, mais ao sul, imediações
sul de Itabaiana-PB, caracterizada por biotita-gnaisses
peraluminosos (incluídos no Complexo Sertânea).
A alternância de terrenos de alto grau do embasamento mais
antigo e faixas de rochas supracrustais paleoproterozóicas e eo-
neoproterozóicas retrabalhadas no Brasiliano, de norte para o sul,
foi determinada pela ação de linhas de falhas inversas e zonas de
cisalhamento de direção E-W a ENE-WSW da fase final do Ciclo
Brasiliano. Estas falhas foram aproveitadas na implantação e no
desenho do sistema tafrogênico. A estruturação primordial
reaproveitada ordenou o esquema de altos e baixos estruturais e,
conseqüentemente, toda hidrografia regional.
No ciclo erosivo atual, a rede de drenagem está promovendo
forte dissecação nos depósitos terciários, provavelmente sob a
égide de novo pulso de soerguimento regional. Particularmente,
nocontextodosistemadegrábensdeMamanguape,apreservação
dos depósitos sedimentares é bastante rarefeita.
A identificação destes processos rupturais terciários reabre
necessariamente o estudo das bacias costeiras do saliente oriental
nordestino, de Touros (RN) a Maragogi (PE), etapa de pesquisa
que reconhecemos como irresistível e imediata. Uma revisão nos
tabuleiros terciários (geomorfologia l.s. e estruturas) se faz
doravante necessária, principalmente com o apoio de métodos
geofísicos.
O SUBSTRATO PRÉ-CAMBRIANO O Maciço São José do
Campestre(MSJC),aonorte,éaexpressãomaisorientaldoTerreno
RioGrandedoNorte,grandefraçãodacolagempaleoproterozóica,
parcela do “Supercontinente Atlântica”, arrastada destralmente e
postadaaonortedaáreanofinaldoBrasilianopeloLineamentode
Patos, que é o seu limite tectônico sul desde então. Trata-se de um
maciço paleoproterozóico caracterizado por exposição de rochas
de alto grau, de afinidades cálcio-alcalinas, envolvendo alguns
núcleos arqueanos catalisadores da colagem (seed nuclei), cuja
melhor descrição é disponível em Dantas et al. (1998).
O Lineamento de Patos é uma zona de cisalhamento destral de
caráter transcontinental (Brito Neves et al. 2001a), do final do
Ciclo Brasiliano, na sua fase de escape tectonics, que na costa
brasileira se caracteriza por apresentar splays com ramificações:
João Câmara (N-S), Cacerengo (NE-SW) e Remígio - Pocinhos
(ENE-WSW,quenocasofazolimitesuldoMSJC).Asduasúltimas
são diagonais ao saliente oriental nordestino e muito importantes
em todos os processos de reativação cenozóica. Na sua porção
maisocidental,oLineamentodePatosreativadojáeradehámuito
reconhecido como delimitador de bacias sedimentares cretácicas,
na fronteira entre os estados da Paraíba e do Ceará, na região ao
norte da Chapada do Araripe.
O Terreno Alto Pajeú é a fração mais importante do
desenvolvimento do Ciclo Cariris Velhos na Zona Transversal da
Borborema(videSantos&Medeiros1999),doEo-neoproterozóico.
É representado sobretudo por rochas metamórficas psamo-
pelíticas, biotita gnaisses, metagrauvacas, biotita-muscovita
gnaisses (“Complexo São Caetano) e sheets de ortognaisses
sienograníticos,graníticosegranodioríticos,geralmentedecaráter
mesozonal (“ortognaisses Cariris Velhos”). Em grande parte, na
área em estudo estas rochas estão contidas nos baixos estruturais
terciários, e foram privilegiadamente recobertas por sedimentos
neste período, conquanto hoje estes sedimentos apresentem-se
de forma bastante esparsada devido a ação do ciclo erosivo atual.
Estafaixacompõeoflanconortedagrandezonaantiformaldaárea
em apreço e os seus limites são marcados por importantes linhas
de falhas, originalmente proterozóicas.
O Terreno Alto Moxotó/TAM está exposto na área em duas
partes: uma central, na zona axial antiformal proterozóica,
suportando o Horst de Boqueirão e pequena parcela do norte do
Gráben de Cariatá, com ortognaisses graníticos e granodioríticos;
a outra parte mais ao ao sul, no flanco da antiforma paleoprotero-
zóicaedomínioprincipaldoGrábendeCariatá,comrochasvulcano-
sedimentaresmetamorfizadasnafaciesanfibolito.Estaporçãomais
ao sul, de biotita xistos, biotita gnaisses e metagrauvacas, muitas
vezes com sillimanita e apresentando migmatização freqüente, é
muito típica das áreas de Itabaiana e Salgado do São Felix (PB).
Este contexto foi recentemente reconhecido como uma extensão
para o leste do Complexo Sertânia (Nutman et al. 2001), de idade
paleoproterozóica, assim como os ortognaisses da zona de
Boqueirão (Brito Neves et al. 2001a, b). Enquanto a porção mais
ao norte do TAM sustenta o alto estrutural de Boqueirão, a sua
porção mais ao sul está recoberta de forma destacada pelos
sedimentos do Gráben de Cariatá (Figs. 1 e 2). Vários dados
geocronológicos, por diferentes métodos, Rb-Sr, U-Pb e Sm-Nd,
são disponíveis na literatura para estas rochas do TAM, apontando
idades paleoproterozóicas, com retrabalhamento no Eo-
neoproterozóico(ca.960Ma)eNeoproterozóicoterminal(ca.550-
Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004130
O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico
500Ma).Estadisposiçãocomoum“terreno”nadireçãogeralE-W
é injunção da tectônica do Brasiliano, assim como é do Brasiliano
amega-antiformarepresentada(Fig.2),identificadacomodeuma
quartageraçãodeestruturasdúcteis(Dn+3),conformeBritoNeves
etal.(2001b).
MAGMATISMOBÁSICOEOPALEOZÓICO Asmanifestações
magmáticas da área (Fig. 1) ainda são pouco conhecidas, e estão
em fase de estudo petrográfico e paleomagnético. O destaque
primeiro é para as ocorrências ao longo do leito do Rio Paraíba,
entre as localidades de Guaritas (ponte da rede ferroviária) e
Fazenda Cajazeiras, entre 5 e 9 km ao oeste de Itabaiana (PB), no
interior do Gráben de Cariatá. Nesta região foi detectado um
persistente enxame de diques máficos, com corpos de espessura
decimétrica,compoucaalteraçãoemgeralecomposiçãodeolivina
diabásios. Este enxame de diques apresenta direções principais
aoredordeWSW-ESE,azimutes110-125,ecortadiagonalmente
tanto os ortognaisses e migmatitos como as rochas supracrustais
vulcano-sedimentares do TAM (Fig. 3A).
Indicadores cinemáticos nas bordas dos diques indicam que a
sua colocação não se deu em um contexto distensional puro, mas
sim com certa componente transtracional, ora destral ora sinistral
(Fig. 3A). A direção subparalela entre as prováveis direções de
distensão associadas tanto à colocação dos diques como à
geração do sistema tafrogênico levou os autores, num primeiro
momento, a pensar numa idade terciária para os diques. A
determinação Ar-Ar de quatro amostras da Fazenda Cajazeiras
mostrou consistentes valores de platôs na faixa de 540-510 Ma
(Paulo Vasconcelos, Centro de Pesquisas Geocronológicas, USP,
comunicação escrita), o que as situa no Cambriano. As amostras
dográbenmaisaonorte,naFazendaPrimavera(Fig.1),semostraram
com excesso de argônio e sem valores confiáveis de idade. Estes
dados geocronológicos e outros de cunho petrográfico e
paleomagnético carecem de aprofundamento, e estudos neste
sentido estão em processo.
Este evento magmático relaciona-se, provavelmente, à fase de
extrusão tectônicadoCicloBrasilianoeécontemporâneodeoutras
manifestaçõesextrusionaisdafase escapetectonics,comformação
de bacias vulcano-sedimentares ditas eopaleozóicas de toda a
Borborema.OGrábendeCariatápareceterherdado,aomenosem
parte, condições distensionais semelhantes àquelas do
Eopaleozóico, tendo se utilizado de falhas do embasamento
sotoposto.
Em todo o Cambriano da Província Borborema preexistem
evidências de processos distensionais, consorciados -bacias pull
apart, transtracionais, de extrusão- ou não aos grandes
lineamentos. O melhor exemplo disto é o noroeste do Ceará (vide
Brito Neves 1983), com manifestações básicas expressivas por
toda a zona entre os lineamentos Sobral e Senador Pompeu. Estes
fatos são evocados para interpretar a área de Itabaiana, como
hipótese de trabalho, uma vez que os diques máficos também se
dispõem lateralmente às grandes falhas que separam os diferentes
contextos lito-estruturais do TAM, aguardando posterior
detalhamento.
O SISTEMA TAFROGÊNICO TERCIÁRIO O sistema
tafrogênico é composto por três compartimentos: o Gráben de
Cariatá, o Horst de Boqueirão e o sistema de grábens do Rio
Mamanguape.
OGrábendeCariatá OGrábendeCariatá,aquidesignado,tem
sua melhor expressão pouco a leste de Itabaiana (PB), numa área
onde estão situados a lagoa e o povoado de Cariatá. Para oeste o
gráben torna-se gradativamente menos definido, com menor
espessura de sedimentos preservados; termina ao sul de Itatuba
(PB),tendocomolimiteumalinhadefalhatransversalNNE-SSW.
Em direção ao litoral, no sentido das cidades de Cruz do Espírito
Santo e João Pessoa, as coberturas arenosas –atribuídas ao Grupo
Barreiras e outros depósitos aluviais se espessam bastante, mas
falta ainda um controle subsuperficial da extensão deste gráben
para a platforma continental, o que é sugerido pelas curvas
gravimétricas de reconhecimento. Ao norte, este gráben está
limitadoporumasérieescalonadadefalhasnormaisnosarredores
de São José do Pilar, de direção ENE-WSW, estas aparentemente
sem heranças de falhas do embasamento, e que no seu
prolongamento para WSW delimitam o contraforte do Horst de
Boqueirão (Fig. 3B). Para o sul, a sedimentação esmaece
gradativamente e termina junto à falha de Camutanga (que no
Proterozóico funcionou como falha inversa), cuja atividade
distensional no Terciário elevou e consignou toda a zona de
fronteiraParaíba-Pernambuco(Fig.3C).
Todo o baixo curso do Rio Paraíba mostra-se profundamente
influenciado pelo Gráben de Cariatá (Fig. 1), sendo necessário
enfatizar que o curso deste rio à montante do gráben era de
orientação aproximadamente N-S, cercanias das cidades de de
Umbuzeiro e Natuba, e foi bruscamente capturado e desviado
para E-W, das proximidades de Itatuba-PB até o litoral. Como já
preliminarmente discutido, o embasamento deste gráben reúne
tanto rochas de alto grau do TAM (ortognaisses do flanco da
antiforma de Boqueirão), como supracrustais mesozonais deste
terreno (de Itabaiana para o sul), parte do Complexo Sertânia.
Acoberturasedimentarépredominantementearenosa,atingindo
localmente cerca de 45 m de espessura, o que é apenas um resíduo
da enérgica ação desmanteladora do ciclo erosivo atual. Os
depósitos compreendem lamitos seixosos a arenosos (Fig. 3D),
conglomerados e arenitos, em geral pobremente organizados, mas
com esparsas indicações de paleocorrentes para NE e ENE.
Ocorrem também alguns diques clásticos de conglomerado com
espessura decimétrica. De certa forma, estes sedimentos lembram
bastante as áreas ditas clássicas do Grupo Barreiras,
particularmente a Formação Guararapes. Estes depósitos estão
sendo interpretados, preliminarmente, por suas feições gerais de
exposição,comolequesaluviais localmenteassociadosaplanícies
de rios entrelaçados.
Devido ao panorama geral de tabuleiros - cotas inferiores a 120
memgeral-sãopoucososperfísverticaisdisponíveisparaanálise
destes sedimentos. Com poucas variáveis, geralmente as rochas
doembasamentocostumamseexpornaslinhasdedrenagem mais
contundentes, com a conseqüente formação em vários pontos de
exsudações de águas subterrâneas no contato sedimento-
cristalino. Nos topos dos tabuleiros, a paisagem de areais, com
predominantes culturas de mandioca e cana de açucar é comum,
assim como a presença de lagoas circulares a sub-circulares, uma
característica fisiográfica do leste da Paraíba, onde presente estes
depósitos terciários.
O Horst de Boqueirão O Horst de Boqueirão é sustentado por
rochasortognáissicasgranodioríticasdoTAMnapartemaiscentral
e oriental deste terreno, tendo seu topo balizado por cotas de 390
m, e franco destaque regional, como suporte orográfico que é dos
primeiros contrafortes da chamada Serra da Borborema. Seu
desmantelamento e profunda dissecação pelo ciclo erosivo atual
se faz aproveitando um vigoroso sistema de fraturas WNW e NS-
Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 131
Benjamim Bley de Brito Neves et al.
Figura 3 - Aspectos geológicos e geomorfológicos do sistema tafrogênico. A - migmatitos proterozóicos , biotita gnaisses migmatizados
do TAM, seccionados por dique cambriano de olivina diabásio, nas proximidades da Fazenda Cajazeiras, a oeste de Itabaiana;
observar desplacamento das encaixantes (xenólitos) nas bordas do dique, indicando cinemática destral durante a sua colocação;
B - Visão regional do Gráben de Cariatá e sua morfologia plana preenchida pelos sedimentos terciários; tendo ao fundo o Horst de
Boqueirão, como limite norte. C - Visão regional do Gráben de Cariatá, tendo ao fundo a Serra de Manoel Matos, horst delimitado
pela Falha de Camutanga, como limite sul. D - Lamitos seixosos a arenosos do Gráben de Cariatá, ao sul de Pilar. E - Conglomerados
com calhaus do sistema de grábens do Rio Mamanguape, ao norte de Mulungu, bairro Nova Mulungu. F- Escarpa da Falha de São
José do Pilar, nas proximidades da localidade topônima, borda norte do Gráben de Cariatá.
A B
C D
E F
NNE. Mais para leste, este sistema de fraturas foi capaz de romper
o alto estrutural e estabelecer novas áreas de sedimentação - de
Cajá, Caldas Brandão, até a costa - e até a conexão entre o Gráben
doCariatáeaquelesistemadoRioMamanguape,conformeexposto
na Fig. 1. Na região situada entre Cajá e a costa, ao longo da BR-
230,asexposiçõesdoembasamentosãomuitorarefeitaslocalizadas
e,pormaisde50km,passaapredominarumpanoramadeareiaise
vegetação/culturas de tuberculados típica. Por seu turno, de
Boqueirão para oeste cada vez mais vão sendo encontrados
patamares elevados da Serra da Borborema, até cotas de 750 m a
noroeste de Campina Grande.
OsistemadegrábensdoRioMamanguape Osistemadegrábens
do Rio Mamanguape está condicionado por falhas normais
reativando antigas zonas de cisalhamento de Mari - Barro Branco
ou do Rio Gurinhenzinho, ao sul, e o trecho norte do lineamento
Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004132
O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico
Galante-Guarabira,queéfascicularequevaisejuntaraoLineamento
de Patos. Em geral, os sedimentos dos baixos estruturais deste
sistema estão muito dissecados atualmente pelo ciclo erosivo
predominante. A melhor exposição dos tratos sedimentares, com
perfís verticais bem expostos, pode ser vista na estrada que vai de
Mulungu para Alagoinha (PB). Na maior parte da área se percorre
zonas mais ou menos aplainadas com restos de sedimentos sobre
chãs cristalinas. Este foi a razão pela qual muitos levantamentos
prévios não diagnosticaram a presença desta rarefeita cobertura
sedimentar, então confundida como raña e/ou terraços atuais dos
rios regionais. A melhor expressão dos movimentos tectônicos
diferenciais pode ser feita, por exemplo, no baixo curso do Rio
Mamanguape,cortadoperpendicularmenteinclusivepelaBR-101,
onde exposições de rochas do embasamento cristalino do TAP
ficam face a face, em mesma cota, com depósitos sedimentares do
Grupo Barreiras, basculado. Nesta parte, toda margem norte do
Rio Mamanguape mostra exposição de rochas do embasamento
soerguidas,principalmentedosgranitoscommuscovita,intrusivos
nas rochas do TAP.
Os depósitos sedimentares deste sistema de grábens incluem
conglomerados com grande quantidade de blocos (calhaus) numa
matriz arenosa (Fig. 3E), lamitos seixosos e arenosos pobremente
organizados. Devem ser mencionadas as manchas de sedimentos
arenosos e conglomeráticos que ocorrem no topo de tabuleiros
rebaixadosnacotade100-120m,cenáriotambémparaumamultidão
variada de lagoas, produto do comportamento aqüífugo destes
depósitos pouco espessos e, mais do que no caso de Cariatá, ao
sul, são inúmeras as exposições de rochas do embasamento ao
longo dos talvegues da maioria das linhas de drenagem.
Osubstratodestesistemaécompostoessencialmenteporrochas
do TAP, como biotita-gnaisses e metagrauvacas com duas micas,
localmente migmatizadas, e pelos granitos neoproterozóicos
intrusivos nestas rochas. Algumas ocorrências de diques máficos
de orientação WNW a NW foram encontradas a leste de Mulungu
(PB), da Fazenda Maravilha para leste. Este diques máficos, com
xenólitos de rochas do embasamento, estão deutericamente
alterados; submetidos à análise geocronológica pelo método Ar-
Ar produziram resultados incoerentes e inconclusivos, o que está
sendoatribuídoaprocessosdealteraçãosobrepostos.Poranalogia
com o caso de Cariatá, acreditamos que se tratam de rochas
magmáticas cambrianas, mas isto fica como problema em aberto,
objeto de etapa posterior de estudos.
MAGMATISMO CENOZÓICO A área clássica das argilas
lacustres bentoníticas de Boa Vista, está situada a sudoeste de
CampinaGrande(PB),nacontinuidadeoestedoGrábendeCariatá,
do qual pode ser um testemunho mais ocidental isolado pela
dissecação promovida pelo ciclo erosivo atual. Os depósitos
lacustressãocapeados porrochasbasálticasdatadasdoOligoceno
(29,5+3Ma)pelométodoK-Ar(Sial1975).Nestaáreafoicoletada
uma amostra do basalto olivínico mais superior da seqüência, o
qual apresentou consistente idade Ar-Ar de 21,0 ± 2 Ma (Paulo
Vasconcelos, Centro de Pesquisas Geocronológicas, USP,
comunicação escrita), ou seja, na parte mais inferior - Andar
Aquitaniano - do Neógeno. Esta idade permitiria admitir que a
sedimentação no sistema tafrogênico ocorreu no Paleógeno a
início do Neógeno.
Na área ao norte de Itapororoca (PB) foram detectadas algumas
anomalias: geomorfológica, platô elevado, até 200 m, acima das
chãs de cristalino esculpidas nas rochas do TAP, em torno de 100
m; hidrogeológica, com predominante fluxo centrifugo das águas
subterrâneas; e geofísica, zona de fortes anomalias gravimétricas
negativas. O platô é encimado por uma duricrust fortemente
silicificada e rica em magnetita, designado preliminarmente de
“unidade estratigráfica Piriri do Vigário” . O seu significado está
em fase presente de pesquisas, podendo vir ser cobertura de
complexo alcalinos (Brito Neves et al. 2001c), pelas semelhanças
com outras existentes no sudeste brasileiro. Por deduções
morfológicas, e outras inferências, a idade esperada para as rochas
destacoberturaédaparteinferiordoNeógeno,pré-GrupoBarreiras.
TECTÔNICARÚPTILCENOZÓICA Paraacaracterizaçãodo
tectonismocenozóicoedeterminaçãodospaleocamposdetensões
foi efetuada a análise estrutural de falhas e juntas, procurando-se
obteromaiornúmerodedadospossívelporafloramento.Osdados
estruturais foram tratados empregando-se os programas
computacionais TRADE (ARTG50), desenvolvido pelo Instituto
de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A.
(Campanha et al. 1996), e QUICKPLOT (Van Everdingen & Van
Gool 1990). Os diagramas estruturais apresentados correspondem
à rede de Schmidt-Lambert, tendo como referência a semi-esfera
inferior.
Foram possíveis de serem registrados dados estruturais
preservados de apenas algumas falhas e respectivas estrias de
atrito, distribuídos pela área de estudo. Para um dos locais
investigados, correspondente à Falha de São José do Pilar, na
localidadehomônima,dedireçãoENE-WSWenocontatotectônico
da borda norte do Gráben de Cariatá (Fig. 3F), pode ser efetuada a
determinação dos eixos de tensão. São vários planos de falhas
sub-paralelos, orientados segundo a direção ENE-WSW, com
estrias oblíquas. O exame de pequenos ressaltos ou degraus indica
deslocamento normal com componente sinistral. A análise da
população de falhas pelo método gráfico (Angelier & Mechler
1977, Angelier 1994) permitiu situar o eixo de tensão principal
máxima, s1, na posição subvertical, o eixo de tensão principal
mínima,s3,segundoadireçãoNNW-SSE,subhorizontal,eoeixo
intermediário, s2, segundo a direção ENE-WSW, subhorizontal
(Fig. 4A). As falhas estudadas são paralelas aos diques clásticos
já referidos, o que indicaria a presença de tectonismo sin-
sedimentar.
As argilas lacustres bentoníticas de Boa Vista (PB) estão
seccionadas por falhas de componentes normais, com rejeitos
verticaisdecimétricos,orientadasnadireçãoNE-SWaENE-WSW,
indicando distensão compatível com aquela observada nos
arredores de São José do Pilar.
Dados referentes a famílias de juntas foram coletados ao longo
da estrutura rúptil de direção NNW-SSE que limita o flanco leste
do Horst de Boqueirão, nas localidades de Maneco, ao norte,
Lagoa da Pedra, ao sul e Fazenda Santo Antônio, na parte centro
sul da linha de falha. Na localidade de Maneco (Fig. 4B) as
estruturas apresentam orientação predominante segundo NNW-
SSEcommergulhosintermediáriosaaltos,configurandoumafamília
de juntas conjugadas de extensão (Hancock & Engelder 1989),
com s1 horizontal, orientado segundo NNW-SSE, s3 horizontal,
orientado segundo ENE-WSW, e s2 vertical. Em Lagoa da Pedra
(Fig. 4C) as estruturas configuram um espectro de juntas (Dunne
&Hancock1994)comdireçõesentreNNE-SSWeENE-WSW.A
posição estimada para s1 é o eixo do espectro, ou seja na direção
NE-SW,s3nadireçãoNW-SE,horizontal,es2vertical.NaFazenda
Santo Antonio (Fig. 4D e 4E) as estruturas são subverticais a
verticais, ocorrendo o franco predomínio de juntas de direção N-S
a NNW-SSE, sobre juntas ortogonais, de direção E-W a ENE-
Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 133
Benjamim Bley de Brito Neves et al.
Figura 4 - A - Resultado da aplicação do método gráfico de
determinação de paleotensões para a população de falhas
normais de direção ENE-WSW com componentes direcionais
sinistrais medidas em pedreira na Falha de São José do Pilar. As
isolinhas de maior porcentagem indicam o campo de maior
probabilidade de ocorrência do eixo de tensão principal
compressivo (s1). B a E - Populações de juntas medidas ao longo
da falha da borda leste do Horst de Boqueirão. B - Juntas
conjugadasdedistensãodedireçãoNNW-SSE,FazendaManeco.
C-EspectrodejuntascomdireçõesentreNNE-SSWeENE-WSW,
Lagoa da Pedra. E - Juntas de distensão de direção N-S a NNW-
SSE e juntas conjugadas cruzadas - cross joints - secundárias de
direção E-W a ENE-WSW, medidas em dois locais na Fazenda
Santo Antônio. Tonalidades de cinza mais escuro indicam as
direções predominantes. Rede de Schmidt-Lambert, semi-esfera
inferior.
N
0
0
50
50100
100
n=7
1
1
3
3A
NN
n=12
NN
n=42
B C
D E
n=41 n=37
WSW. O trend predominante constitui provável família de juntas
deextensão(Hancock&Engelder1989),coms1orientadosegundo
NNW-SSE,horizontal,s3,ENE-WSW,horizontales2vertical.As
direções secundárias, menos sistemáticas, parecem representar
crossjoints(Hancock&Engelder1989).Fraturasabertasdedireção
NNW-SSE em gnaisses dos arredores de Cajá são consistentes
com a direção de compressão segundo NNW-SSE.
As observações de campo e a análise das estruturas rúpteis
indicam a existência de dois regimes tectônicos superimpostos,
um transcorrente, com compressão NNW-SSE horizontal, e outro
normal oblíquo, com extensão NNW-SSE horizontal. O
preenchimento sedimentar do Gráben de Cariatá parece registrar
unicamente as deformações relacionadas ao evento distensivo.
Assim, sugere-se que o evento distensivo NNW-SSE tenha
sucedido o compressivo de mesma direção, podendo representar
um relaxamento dos esforços da fase inicial, com permutação de
s1 por s3, e formação do gráben.
Estudos estruturais detalhados realizados no Planalto da
Borborema, na região limítrofe entre os estados da Paraíba e Rio
GrandedoNorte(MoraisNeto1999,MoraisNeto&Alkmin2001),
indicaram uma tensão compressiva orientada segundo NW-SE
para a nucleação das famílias de estruturas rúpteis mais
penetrativas na Formação Serra dos Martins, esta de idade
supostamenteeoterciária.Éumadireçãodeesforçodistintadaquela
obtida para as falhas que afetam os depósitos sedimentares do
sistematafrogênicooraemestudo,oqueadmiteváriasexplicações,
como diferenças nos regimes tectônicos, idades das falhas e/ou
dos sedimentos (ou ambas).
CONCLUSÕES O sistema tafrogênico do saliente oriental
nordestino compreende grábens e horsts de direção geral E-W a
ENE-WSW, localizados a leste do meridiano 36° W, no Estado da
Paraíba. A instalação deste sistema tafrogênico resultou
principalmentedareativaçãotectônicadecomponentedistensional
ao longo de antigas zonas de cisalhamento dúcteis do
embasamento proterozóico. A tectônica distensional é posterior
ao arqueamento pós-Cretáceo Superior que sucedeu a ligação
dos segmentos Equatorial e Central do Oceano Atlântico, no
Maastrichtiano.
O sistema tafrogênico compreende três compartimentos: o
Gráben de Cariatá, o Horst de Boqueirão e o sistema de grábens
do Rio Mamanguape. O preenchimento sedimentar dos grábens,
descontínuo em função da ação do ciclo erosivo recente, é
constituído essencialmente por depósitos rudáceos -
conglomerados, lamitos seixosos a arenosos e arenitos -
relacionados provavelmente a sistemas de leques aluviais e
planícies de rios entrelaçados. Dados de paleocorrentes, embora
localizados, indicam direção de transporte sedimentar para NE e
ENE.
Os depósitos lacustres contendo argilas bentoníticas da
localidade de Boa Vista (PB) parecem representar um testemunho
ocidental do Gráben de Cariatá, atualmente isolado. Datação Ar-
Ar de basalto que capeia a sucessão sedimentar desta localidade
forneceu idade confiável de 21+2 Ma, o que permitiria situar a
sedimentação do sistema tafrogênico no Palógeno a início do
Neógeno.
A análise das estruturas tectônicas rúpteis indica a existência
dedoisregimestectônicossuperimpostos.Omaisantigoapresenta
direção de compressão NNW-SSE horizontal e o mais novo, que
afetaopreenchimentosedimentar,exibedireçãodeextensãoNNW-
SSE horizontal. O evento distensivo NNW-SSE provavelmente
sucedeu o compressivo de mesma direção e pode representar um
relaxamento dos esforços da fase inicial, com permutação de s1
por s3, e formação dos grábens.
Aestruturadosistematafrogênicodestaca-sedeformamarcante
na paisagem atual, seja na configuração dos planaltos elevados,
seja no controle da rede de drenagem.
O contexto regional apresenta várias peculiaridades
interessantes, com um intensivo dissecamento pelo ciclo erosivo
Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004134
O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico
atual, Paraguassú, o que demonstra a sobreposição de novas fases
tectônicas. Torna-se portanto necessário um aprofundamento na
escala de trabalhos, tanto pelo lado do tratamento tectônico (parte
científica), como pelo ponto de vista prático, uma vez que as
acumulações sedimentares geradas e agora sendo exumadas de
forma contundente por esta tectônica tem implicações sócio-
econômicas de vulto, como nos problemas de recursos hídricos
subterrâneos e superficiais e também na distribuição e natureza
dos solos. Em adição, a influência deste tectonismo terciário
próximodamargematlânticaadjacente,ecomdireçõesestruturais
marcantementediagonaisaestamargemcretácico-terciáriarequer
estudosquepermitamavaliarasuaeventualimportâncianageração
e/ou destruição de armadilhas estruturais para hidrocarbonetos.
Agradecimentos Este trabalho foi realizado no âmbito de um
projetofinanciadopelaFundaçãodeAmparoàPesquisadoEstado
deSãoPaulo-FAPESP(Processo1998/07696-9)aquemosautores
agradecem pelo apoio. O CNPq de várias formas, incluindo-se
entreelasasbolsasdeprodutividadeacadêmicadosdoisprimeiros
autores. Aos revisores da RBG pelas sugestões ao manuscrito.
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de sensoriamento remoto do setor extremo nordeste da Província
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Manusscrito A-1427
Recebido em 17 de abril de 2003
Revisão dos autores em 25 de outubro de 2003
Revisão aceita em 05 de novembro de 2003

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  • 1. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 127 Benjamim Bley de Brito Neves et al.Revista Brasileira de Geociências 34(1):127-134, março de 2004 O SISTEMA TAFROGÊNICO TERCIÁRIO DO SALIENTE ORIENTAL NORDESTINO NA PARAÍBA: UM LEGADO PROTEROZÓICO BENJAMIM BLEY DE BRITO NEVES1 , CLAUDIO RICCOMINI1 , TÂNIA MARIA GOMES FERNANDES2 & LUCY GOMES SANT’ANNA3 1 - Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, Pesquisador do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, Rua do Lago 562, CEP 05508-080, São Paulo, SP, Brasil, e-mail: bbleybn@usp.br 2 - Instituto de Geociências, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, SP, Brasil, doutoranda. 3 - Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo e Bolsista de Pós-Doutoramento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP Abstract THE TERTIARY TAPHROGENIC SYSTEM OF THE EASTERN PARAÌBA SALIENT, NORTHEASTERN BRAZIL: A PROTEROZOIC LEGACY This paper presents data on the E-W to ENE-WNW-trending graben and horst system in the easternmost part of Paraíba State, Brazil. The installation of this Tertiary tectonic unit was performed following previous structural trends of the Precambrian basement, comprising as a typical case of brittle-ductile structures reactivation. The graben and horst system are positioned in the easternmost part of the Borborema Province, whose main evolutionary phase occurred from the Late Neoproterozoic to the Cambrian, superposing lithostructural units of the Neoproterozoic Alto Moxotó terrane (to the south), composed of orthogneisses and peraluminous supracrustal rocks, and of the Eo-Neoproterozoic Alto Pajeú Terrane (to the north), comprising volcano-sedimentary supracrustal rocks metamorphosed under amphibolite facies. During the closing events of the Brasiliano Cycle, these terranes were penetrated by Cambrian fissural basic intrusives that crop out along the WNW-ESE direction (most of them). This basic dyke swarm is reported here for the first time. During the Tertiary, the most important period for the regional geomorphological evolution, the main structural Brasiliano trends were reactivated as extensional faults, leading to the formation of the taphrogenic system discussed here. At that time, some new faults of extensional character were also formed. As similar occurrences have been described elsewhere (e. g. Rio Grande do Norte State), these facts bring new elements for the discussion of the regional geology of Borborema Province, especially in terms of geomorphological evolution (certainly, a new aspect to be considered) and groundwater resources (heavily demanded in such semi-arid area). Additionally, the occurrence of such brittle Tertiary tectonism in the (next) interior of the continent necessarily opens again the problem of the structural behavior of the Cretaceous coastal basins, in order to investigate the formation of structural traps for hydrocarbon during this period. Keywords: taphrogenic system, Tertiary, Borborema Province, Alto Moxotó Terrane, Alto Pakeú Terrane, tectonic reactivation. Resumo Este trabalho procura arregimentar os principais dados obtidos sobre um sistema de grábens ehorststerciários implantados no extremo leste da Paraíba (a leste do meridiano 36° W), de direção geral E-W a ENE-WSW. A implantação destas estruturas ocorreu consoante nítido proveito das linhas estruturais do embasamento, processo típico de reativação tectônica. O sistema tafrogênico desenvolveu-se no extremo leste da Província Borborema. A evolução tectônica desta província teve lugar principalmente durante o Neoproterozóico – Cambriano, sobre unidades litoestruturais paleoproterozóicas do Terreno Alto Moxotó, localizado mais ao sul e composto por ortognaisses e rochas supracrustais peraluminosas, e Eo-Neoproterozóicos do Terreno Alto Pajeú, localizado mais ao norte e que é composto de rochas supracrustais vulcano-sedimentares de fácies anfibolito. No fecho de desenvolvimento geotectônico proterozóico (Ciclo Brasiliano), estes terrenos foram penetrados por intrusivas fissurais básicas de idade cambriana, que formam um enxame expressivo de direção geral WNW-ESE e são apresentadas pela primeira vez neste trabalho. No Terciário, as principais linhas rupturaisforamretomadascomcaráterdistensivo,consignandoosistematafrogênicoagoraabordado.Comoocorrênciassimilares têm sido freqüentemente descobertas, a presença destes sistemas tafrogênicos traz importante repercussão na análise da geologia regional básica, principalmente em termos da geomorfologia, onde surge ponto de vista inteiramente novo, e no tocante aos recursos hídricos subterrâneos, já que a região apresenta alta demanda deste bem. Pode-se incluir neste tópico de importância o reexame, agora necessário, do comportamento das bacias costeiras, que devem ter sido também submetidas a esta tectônica rúptil, carecendo a investigação complementar sobre a viabilidade de formação, no Terciário, de armadilhas para hidrocarbonetos. Palavras-chave: sistema tafrogênico, Terciário, Província Borborema, Terreno alto Moxotó, Terreno Alto Pajeú, reativação tectônica INTRODUÇÃO Este trabalho aborda os primeiros dados geológicos e estruturais sobre um sistema tafrogênico terciário de direçãoE-WaENE-WSWocorrentenochamado“salienteoriental nordestino”, na região da Província Borborema situada a leste do meridiano 36°W. Este sistema está situado principalmente no domínio geográfico do Estado da Paraíba, com pequena extensão no nordeste do Estado de Pernambuco (Fig. 1). A tectônica distensional é marcadamente posterior ao arqueamento pós-Cretáceo Superior que sucedeu o remate de formação do Atlântico, quando da coalescência final dos tratos oceânicos Equatorial e Central, no Maastrichtiano. Todas as linhas estruturaisobservadastomaramproveitoflagrantedeantigaszonas de falhas pré-cambrianas, tanto de cisalhamento simples como de transpressão, do final do Neoproterozóico a início do Cambriano,
  • 2. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004128 O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico que estiveram ativas durante a cratonização da Província Borborema.AmovimentaçãoverticalprocedidanoTerciárioretratou em parte os comportamentos reológicos dos distintos terrenos pré-cambrianos subjacentes aos depósitos terciários, oTerreno AltoMoxotó-TAMeTerrenoAltoPajeú-TAP(BritoNevesetal. 2001a, b), conforme esquematizado nas figuras 1 e 2. Embora nossas observações estejam centradas entre os paralelos 6° 30’ e 7°30’S, principalmente na Paraíba, pode-se adiantar que a presença de eventos distensionais terciários e mais recentestêmsidomodernamentecomprovadosemtodaaProvíncia Borborema, especialmente nas zonas mais costeiras, consoante uma série de trabalhos apresentados nos últimos Simpósios de Figura 1 - Esquema sinóptico da geologia regional, mostrando a distribuição das principais falhas e dos sedimentos terciários. Localidades mencionadas: BV – Boa Vista; CAJ – Faz. Cajazeiras; LP – Lagoa da Pedra; SJP – São José do Pilar; SA – Fazenda Sto. Antônio; MA – Maneco; PV – Faz. Primavera. Figura 2 - Seção geológica esquemática NNW-SSE exibindo a compartimentação do sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba. A designação de terrenos pode ser vista de forma mais completa em Brito Neves et al. (2001 a, b). ~ ~ ~ ~ ~ ~ lllllllll lllllllllllllllllll l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l l v v v v v v v v v vv v v v vv v v C A M P IN A G R A N D E J O Ã O P E S S O A P irp iritub a E s p e ra n ç a J .T á v o ra In g á M a r i S a p é Ita b a ia na R io C am a ra tu ba R io M a m a n g u a p e R io M iriri R io P a ra íb a 1 0 k m llll B V G u a r a b ira P V M A S A S J P L P C JA PR É-C A M B RIA N O IN DIF ER E N C IA D O 1. S u bs trato pa leo p roteroz óic o 2. S u prac ru s ta is m e so /n e o prote ro z ó ic as PR O V ÍN C IA CO ST E IR A G ru po B a rreiras G ru po P araíb a D e pó s itos terc iá rios em gráb e n s vv O c orrê ncias d e vu lcân ica s bás ica s v v A n o m a lia g rav im é tric a Itap oro roc a v v v vv 7 S o 3 5 Wo N N W S SE Pirpirituba "ZCRP" Guarabira RioAraçagi "ZCBBM" BR-230 S.JoséPilar RioParaíba ZonaFronteira PE-PB RioMamanguape "Mulungu" T ER R E N O R IO G R A N D E DO N O R T E T ER R E N O A LTO PA JE Ú "R IF T E M A M A N G U A PE " "R IF T E C AR IAT Á " T ER R E N O A LTO M O X O T Ó 8 k m R o c h a s c a ta c lá s tic a s "s h e a r z o ne s " F a lh a s n o rm a is s o b re p o s tas D e p ó s ito s c lá s tic o s a re no s o s G ra nito s po rfirític os M e tag ra uva c a s , b iotita -gn a is s e s , x is to s O rto g n a is se s , m ig m a tito s , g ra nu lito s M e tag ra uva c a s , x is to s p e ralu m in o s os (C o m p le x o S e rtâ n ia ) 6 0 0 4 0 0 2 0 0 0 + + .. . ... ..
  • 3. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 129 Benjamim Bley de Brito Neves et al. Geologia do Nordeste da Sociedade Brasileira de Geologia (vide as atas dos simpósios de Recife, 2000 e Natal, 2001). Trabalhos recentes(e.g.Amaro1998,Bezerraetal. 1998,2001,MoraisNeto 1999,MoraisNeto&Alkmin1999,2001,Bezerra&Vita-Finzi2000, Barreto et al.2002)vêmgradativamentemostrandoumpanorama interessanteeimportantedemovimentaçãotectônica,nãosomente extensional, durante o Cenozóico na província. Na verdade, informações e outras alusões de movimentação tectônica (inclusive magmatismo básico) do Terciário nesta província têm circulado ora informalmente, ora de forma muito restrita, desde os anos 70. Mas, como o Terciário foi o período importante do desenvolvimento geomorfológico regional, o tratamento desta questão tectônica foi de certa forma relegado ou tratado muito qualitativamente. A importância maior presumida e a maior divulgação foi para amplos arqueamentos e sucessão de formaçãoescalonada,dolitoralparaointerior,depediplanos,mais subordinada ao fator paleoclima, idéias vigentes desde o clássico trabalho de Andrade & Lins (1965) (com muitos seguidores e compiladores). A ênfase sempre foi - em termos de estudos e bibliografia - para amplos ensaios geomorfológicos, com grande profusão de nomes de “superfícies”e/ou “pediplanos”. Uma espécie de síntese conclusiva destas versões mais “geomorfoló- gicas” foi feita por Mabesoone & Castro (1975), já contando com o apoio dos mapas topográficos 1/100.000 da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE, mas que passou ao largo muitas observações geológicas e geomorfológicas. O substrato pré-cambriano da área, a parcela mais oriental da Província Borborema, foi objeto de dois trabalhos recentes de cunho geotectônico e geocronológico (Brito Neves et al. 2001a, b). São reconhecidos, de norte para o sul, três terrenos tectono- estratigráficos distintos: o Terreno Rio Grande do Norte, representado pela área de exposição do Maciço São José do Campestre (composto por rochas paleoproterozóicas com núcleos arqueanos), ao norte do Lineamento Patos; o Terreno Alto Pajeú, na porção mais central, composto de supracrustais e ortognaisses eo-neoproterozóicos, imediatamente ao sul do Lineamento de Patos; e o Terreno Alto Moxotó, na parte mais ao sul. Este último previamentedesignadodeMaciçodeCaldasBrandão(designação esta abandonada por obsoleta) é composto em parte por diversos tipos de ortognaisses e por outra parte, mais ao sul, imediações sul de Itabaiana-PB, caracterizada por biotita-gnaisses peraluminosos (incluídos no Complexo Sertânea). A alternância de terrenos de alto grau do embasamento mais antigo e faixas de rochas supracrustais paleoproterozóicas e eo- neoproterozóicas retrabalhadas no Brasiliano, de norte para o sul, foi determinada pela ação de linhas de falhas inversas e zonas de cisalhamento de direção E-W a ENE-WSW da fase final do Ciclo Brasiliano. Estas falhas foram aproveitadas na implantação e no desenho do sistema tafrogênico. A estruturação primordial reaproveitada ordenou o esquema de altos e baixos estruturais e, conseqüentemente, toda hidrografia regional. No ciclo erosivo atual, a rede de drenagem está promovendo forte dissecação nos depósitos terciários, provavelmente sob a égide de novo pulso de soerguimento regional. Particularmente, nocontextodosistemadegrábensdeMamanguape,apreservação dos depósitos sedimentares é bastante rarefeita. A identificação destes processos rupturais terciários reabre necessariamente o estudo das bacias costeiras do saliente oriental nordestino, de Touros (RN) a Maragogi (PE), etapa de pesquisa que reconhecemos como irresistível e imediata. Uma revisão nos tabuleiros terciários (geomorfologia l.s. e estruturas) se faz doravante necessária, principalmente com o apoio de métodos geofísicos. O SUBSTRATO PRÉ-CAMBRIANO O Maciço São José do Campestre(MSJC),aonorte,éaexpressãomaisorientaldoTerreno RioGrandedoNorte,grandefraçãodacolagempaleoproterozóica, parcela do “Supercontinente Atlântica”, arrastada destralmente e postadaaonortedaáreanofinaldoBrasilianopeloLineamentode Patos, que é o seu limite tectônico sul desde então. Trata-se de um maciço paleoproterozóico caracterizado por exposição de rochas de alto grau, de afinidades cálcio-alcalinas, envolvendo alguns núcleos arqueanos catalisadores da colagem (seed nuclei), cuja melhor descrição é disponível em Dantas et al. (1998). O Lineamento de Patos é uma zona de cisalhamento destral de caráter transcontinental (Brito Neves et al. 2001a), do final do Ciclo Brasiliano, na sua fase de escape tectonics, que na costa brasileira se caracteriza por apresentar splays com ramificações: João Câmara (N-S), Cacerengo (NE-SW) e Remígio - Pocinhos (ENE-WSW,quenocasofazolimitesuldoMSJC).Asduasúltimas são diagonais ao saliente oriental nordestino e muito importantes em todos os processos de reativação cenozóica. Na sua porção maisocidental,oLineamentodePatosreativadojáeradehámuito reconhecido como delimitador de bacias sedimentares cretácicas, na fronteira entre os estados da Paraíba e do Ceará, na região ao norte da Chapada do Araripe. O Terreno Alto Pajeú é a fração mais importante do desenvolvimento do Ciclo Cariris Velhos na Zona Transversal da Borborema(videSantos&Medeiros1999),doEo-neoproterozóico. É representado sobretudo por rochas metamórficas psamo- pelíticas, biotita gnaisses, metagrauvacas, biotita-muscovita gnaisses (“Complexo São Caetano) e sheets de ortognaisses sienograníticos,graníticosegranodioríticos,geralmentedecaráter mesozonal (“ortognaisses Cariris Velhos”). Em grande parte, na área em estudo estas rochas estão contidas nos baixos estruturais terciários, e foram privilegiadamente recobertas por sedimentos neste período, conquanto hoje estes sedimentos apresentem-se de forma bastante esparsada devido a ação do ciclo erosivo atual. Estafaixacompõeoflanconortedagrandezonaantiformaldaárea em apreço e os seus limites são marcados por importantes linhas de falhas, originalmente proterozóicas. O Terreno Alto Moxotó/TAM está exposto na área em duas partes: uma central, na zona axial antiformal proterozóica, suportando o Horst de Boqueirão e pequena parcela do norte do Gráben de Cariatá, com ortognaisses graníticos e granodioríticos; a outra parte mais ao ao sul, no flanco da antiforma paleoprotero- zóicaedomínioprincipaldoGrábendeCariatá,comrochasvulcano- sedimentaresmetamorfizadasnafaciesanfibolito.Estaporçãomais ao sul, de biotita xistos, biotita gnaisses e metagrauvacas, muitas vezes com sillimanita e apresentando migmatização freqüente, é muito típica das áreas de Itabaiana e Salgado do São Felix (PB). Este contexto foi recentemente reconhecido como uma extensão para o leste do Complexo Sertânia (Nutman et al. 2001), de idade paleoproterozóica, assim como os ortognaisses da zona de Boqueirão (Brito Neves et al. 2001a, b). Enquanto a porção mais ao norte do TAM sustenta o alto estrutural de Boqueirão, a sua porção mais ao sul está recoberta de forma destacada pelos sedimentos do Gráben de Cariatá (Figs. 1 e 2). Vários dados geocronológicos, por diferentes métodos, Rb-Sr, U-Pb e Sm-Nd, são disponíveis na literatura para estas rochas do TAM, apontando idades paleoproterozóicas, com retrabalhamento no Eo- neoproterozóico(ca.960Ma)eNeoproterozóicoterminal(ca.550-
  • 4. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004130 O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico 500Ma).Estadisposiçãocomoum“terreno”nadireçãogeralE-W é injunção da tectônica do Brasiliano, assim como é do Brasiliano amega-antiformarepresentada(Fig.2),identificadacomodeuma quartageraçãodeestruturasdúcteis(Dn+3),conformeBritoNeves etal.(2001b). MAGMATISMOBÁSICOEOPALEOZÓICO Asmanifestações magmáticas da área (Fig. 1) ainda são pouco conhecidas, e estão em fase de estudo petrográfico e paleomagnético. O destaque primeiro é para as ocorrências ao longo do leito do Rio Paraíba, entre as localidades de Guaritas (ponte da rede ferroviária) e Fazenda Cajazeiras, entre 5 e 9 km ao oeste de Itabaiana (PB), no interior do Gráben de Cariatá. Nesta região foi detectado um persistente enxame de diques máficos, com corpos de espessura decimétrica,compoucaalteraçãoemgeralecomposiçãodeolivina diabásios. Este enxame de diques apresenta direções principais aoredordeWSW-ESE,azimutes110-125,ecortadiagonalmente tanto os ortognaisses e migmatitos como as rochas supracrustais vulcano-sedimentares do TAM (Fig. 3A). Indicadores cinemáticos nas bordas dos diques indicam que a sua colocação não se deu em um contexto distensional puro, mas sim com certa componente transtracional, ora destral ora sinistral (Fig. 3A). A direção subparalela entre as prováveis direções de distensão associadas tanto à colocação dos diques como à geração do sistema tafrogênico levou os autores, num primeiro momento, a pensar numa idade terciária para os diques. A determinação Ar-Ar de quatro amostras da Fazenda Cajazeiras mostrou consistentes valores de platôs na faixa de 540-510 Ma (Paulo Vasconcelos, Centro de Pesquisas Geocronológicas, USP, comunicação escrita), o que as situa no Cambriano. As amostras dográbenmaisaonorte,naFazendaPrimavera(Fig.1),semostraram com excesso de argônio e sem valores confiáveis de idade. Estes dados geocronológicos e outros de cunho petrográfico e paleomagnético carecem de aprofundamento, e estudos neste sentido estão em processo. Este evento magmático relaciona-se, provavelmente, à fase de extrusão tectônicadoCicloBrasilianoeécontemporâneodeoutras manifestaçõesextrusionaisdafase escapetectonics,comformação de bacias vulcano-sedimentares ditas eopaleozóicas de toda a Borborema.OGrábendeCariatápareceterherdado,aomenosem parte, condições distensionais semelhantes àquelas do Eopaleozóico, tendo se utilizado de falhas do embasamento sotoposto. Em todo o Cambriano da Província Borborema preexistem evidências de processos distensionais, consorciados -bacias pull apart, transtracionais, de extrusão- ou não aos grandes lineamentos. O melhor exemplo disto é o noroeste do Ceará (vide Brito Neves 1983), com manifestações básicas expressivas por toda a zona entre os lineamentos Sobral e Senador Pompeu. Estes fatos são evocados para interpretar a área de Itabaiana, como hipótese de trabalho, uma vez que os diques máficos também se dispõem lateralmente às grandes falhas que separam os diferentes contextos lito-estruturais do TAM, aguardando posterior detalhamento. O SISTEMA TAFROGÊNICO TERCIÁRIO O sistema tafrogênico é composto por três compartimentos: o Gráben de Cariatá, o Horst de Boqueirão e o sistema de grábens do Rio Mamanguape. OGrábendeCariatá OGrábendeCariatá,aquidesignado,tem sua melhor expressão pouco a leste de Itabaiana (PB), numa área onde estão situados a lagoa e o povoado de Cariatá. Para oeste o gráben torna-se gradativamente menos definido, com menor espessura de sedimentos preservados; termina ao sul de Itatuba (PB),tendocomolimiteumalinhadefalhatransversalNNE-SSW. Em direção ao litoral, no sentido das cidades de Cruz do Espírito Santo e João Pessoa, as coberturas arenosas –atribuídas ao Grupo Barreiras e outros depósitos aluviais se espessam bastante, mas falta ainda um controle subsuperficial da extensão deste gráben para a platforma continental, o que é sugerido pelas curvas gravimétricas de reconhecimento. Ao norte, este gráben está limitadoporumasérieescalonadadefalhasnormaisnosarredores de São José do Pilar, de direção ENE-WSW, estas aparentemente sem heranças de falhas do embasamento, e que no seu prolongamento para WSW delimitam o contraforte do Horst de Boqueirão (Fig. 3B). Para o sul, a sedimentação esmaece gradativamente e termina junto à falha de Camutanga (que no Proterozóico funcionou como falha inversa), cuja atividade distensional no Terciário elevou e consignou toda a zona de fronteiraParaíba-Pernambuco(Fig.3C). Todo o baixo curso do Rio Paraíba mostra-se profundamente influenciado pelo Gráben de Cariatá (Fig. 1), sendo necessário enfatizar que o curso deste rio à montante do gráben era de orientação aproximadamente N-S, cercanias das cidades de de Umbuzeiro e Natuba, e foi bruscamente capturado e desviado para E-W, das proximidades de Itatuba-PB até o litoral. Como já preliminarmente discutido, o embasamento deste gráben reúne tanto rochas de alto grau do TAM (ortognaisses do flanco da antiforma de Boqueirão), como supracrustais mesozonais deste terreno (de Itabaiana para o sul), parte do Complexo Sertânia. Acoberturasedimentarépredominantementearenosa,atingindo localmente cerca de 45 m de espessura, o que é apenas um resíduo da enérgica ação desmanteladora do ciclo erosivo atual. Os depósitos compreendem lamitos seixosos a arenosos (Fig. 3D), conglomerados e arenitos, em geral pobremente organizados, mas com esparsas indicações de paleocorrentes para NE e ENE. Ocorrem também alguns diques clásticos de conglomerado com espessura decimétrica. De certa forma, estes sedimentos lembram bastante as áreas ditas clássicas do Grupo Barreiras, particularmente a Formação Guararapes. Estes depósitos estão sendo interpretados, preliminarmente, por suas feições gerais de exposição,comolequesaluviais localmenteassociadosaplanícies de rios entrelaçados. Devido ao panorama geral de tabuleiros - cotas inferiores a 120 memgeral-sãopoucososperfísverticaisdisponíveisparaanálise destes sedimentos. Com poucas variáveis, geralmente as rochas doembasamentocostumamseexpornaslinhasdedrenagem mais contundentes, com a conseqüente formação em vários pontos de exsudações de águas subterrâneas no contato sedimento- cristalino. Nos topos dos tabuleiros, a paisagem de areais, com predominantes culturas de mandioca e cana de açucar é comum, assim como a presença de lagoas circulares a sub-circulares, uma característica fisiográfica do leste da Paraíba, onde presente estes depósitos terciários. O Horst de Boqueirão O Horst de Boqueirão é sustentado por rochasortognáissicasgranodioríticasdoTAMnapartemaiscentral e oriental deste terreno, tendo seu topo balizado por cotas de 390 m, e franco destaque regional, como suporte orográfico que é dos primeiros contrafortes da chamada Serra da Borborema. Seu desmantelamento e profunda dissecação pelo ciclo erosivo atual se faz aproveitando um vigoroso sistema de fraturas WNW e NS-
  • 5. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 131 Benjamim Bley de Brito Neves et al. Figura 3 - Aspectos geológicos e geomorfológicos do sistema tafrogênico. A - migmatitos proterozóicos , biotita gnaisses migmatizados do TAM, seccionados por dique cambriano de olivina diabásio, nas proximidades da Fazenda Cajazeiras, a oeste de Itabaiana; observar desplacamento das encaixantes (xenólitos) nas bordas do dique, indicando cinemática destral durante a sua colocação; B - Visão regional do Gráben de Cariatá e sua morfologia plana preenchida pelos sedimentos terciários; tendo ao fundo o Horst de Boqueirão, como limite norte. C - Visão regional do Gráben de Cariatá, tendo ao fundo a Serra de Manoel Matos, horst delimitado pela Falha de Camutanga, como limite sul. D - Lamitos seixosos a arenosos do Gráben de Cariatá, ao sul de Pilar. E - Conglomerados com calhaus do sistema de grábens do Rio Mamanguape, ao norte de Mulungu, bairro Nova Mulungu. F- Escarpa da Falha de São José do Pilar, nas proximidades da localidade topônima, borda norte do Gráben de Cariatá. A B C D E F NNE. Mais para leste, este sistema de fraturas foi capaz de romper o alto estrutural e estabelecer novas áreas de sedimentação - de Cajá, Caldas Brandão, até a costa - e até a conexão entre o Gráben doCariatáeaquelesistemadoRioMamanguape,conformeexposto na Fig. 1. Na região situada entre Cajá e a costa, ao longo da BR- 230,asexposiçõesdoembasamentosãomuitorarefeitaslocalizadas e,pormaisde50km,passaapredominarumpanoramadeareiaise vegetação/culturas de tuberculados típica. Por seu turno, de Boqueirão para oeste cada vez mais vão sendo encontrados patamares elevados da Serra da Borborema, até cotas de 750 m a noroeste de Campina Grande. OsistemadegrábensdoRioMamanguape Osistemadegrábens do Rio Mamanguape está condicionado por falhas normais reativando antigas zonas de cisalhamento de Mari - Barro Branco ou do Rio Gurinhenzinho, ao sul, e o trecho norte do lineamento
  • 6. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004132 O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico Galante-Guarabira,queéfascicularequevaisejuntaraoLineamento de Patos. Em geral, os sedimentos dos baixos estruturais deste sistema estão muito dissecados atualmente pelo ciclo erosivo predominante. A melhor exposição dos tratos sedimentares, com perfís verticais bem expostos, pode ser vista na estrada que vai de Mulungu para Alagoinha (PB). Na maior parte da área se percorre zonas mais ou menos aplainadas com restos de sedimentos sobre chãs cristalinas. Este foi a razão pela qual muitos levantamentos prévios não diagnosticaram a presença desta rarefeita cobertura sedimentar, então confundida como raña e/ou terraços atuais dos rios regionais. A melhor expressão dos movimentos tectônicos diferenciais pode ser feita, por exemplo, no baixo curso do Rio Mamanguape,cortadoperpendicularmenteinclusivepelaBR-101, onde exposições de rochas do embasamento cristalino do TAP ficam face a face, em mesma cota, com depósitos sedimentares do Grupo Barreiras, basculado. Nesta parte, toda margem norte do Rio Mamanguape mostra exposição de rochas do embasamento soerguidas,principalmentedosgranitoscommuscovita,intrusivos nas rochas do TAP. Os depósitos sedimentares deste sistema de grábens incluem conglomerados com grande quantidade de blocos (calhaus) numa matriz arenosa (Fig. 3E), lamitos seixosos e arenosos pobremente organizados. Devem ser mencionadas as manchas de sedimentos arenosos e conglomeráticos que ocorrem no topo de tabuleiros rebaixadosnacotade100-120m,cenáriotambémparaumamultidão variada de lagoas, produto do comportamento aqüífugo destes depósitos pouco espessos e, mais do que no caso de Cariatá, ao sul, são inúmeras as exposições de rochas do embasamento ao longo dos talvegues da maioria das linhas de drenagem. Osubstratodestesistemaécompostoessencialmenteporrochas do TAP, como biotita-gnaisses e metagrauvacas com duas micas, localmente migmatizadas, e pelos granitos neoproterozóicos intrusivos nestas rochas. Algumas ocorrências de diques máficos de orientação WNW a NW foram encontradas a leste de Mulungu (PB), da Fazenda Maravilha para leste. Este diques máficos, com xenólitos de rochas do embasamento, estão deutericamente alterados; submetidos à análise geocronológica pelo método Ar- Ar produziram resultados incoerentes e inconclusivos, o que está sendoatribuídoaprocessosdealteraçãosobrepostos.Poranalogia com o caso de Cariatá, acreditamos que se tratam de rochas magmáticas cambrianas, mas isto fica como problema em aberto, objeto de etapa posterior de estudos. MAGMATISMO CENOZÓICO A área clássica das argilas lacustres bentoníticas de Boa Vista, está situada a sudoeste de CampinaGrande(PB),nacontinuidadeoestedoGrábendeCariatá, do qual pode ser um testemunho mais ocidental isolado pela dissecação promovida pelo ciclo erosivo atual. Os depósitos lacustressãocapeados porrochasbasálticasdatadasdoOligoceno (29,5+3Ma)pelométodoK-Ar(Sial1975).Nestaáreafoicoletada uma amostra do basalto olivínico mais superior da seqüência, o qual apresentou consistente idade Ar-Ar de 21,0 ± 2 Ma (Paulo Vasconcelos, Centro de Pesquisas Geocronológicas, USP, comunicação escrita), ou seja, na parte mais inferior - Andar Aquitaniano - do Neógeno. Esta idade permitiria admitir que a sedimentação no sistema tafrogênico ocorreu no Paleógeno a início do Neógeno. Na área ao norte de Itapororoca (PB) foram detectadas algumas anomalias: geomorfológica, platô elevado, até 200 m, acima das chãs de cristalino esculpidas nas rochas do TAP, em torno de 100 m; hidrogeológica, com predominante fluxo centrifugo das águas subterrâneas; e geofísica, zona de fortes anomalias gravimétricas negativas. O platô é encimado por uma duricrust fortemente silicificada e rica em magnetita, designado preliminarmente de “unidade estratigráfica Piriri do Vigário” . O seu significado está em fase presente de pesquisas, podendo vir ser cobertura de complexo alcalinos (Brito Neves et al. 2001c), pelas semelhanças com outras existentes no sudeste brasileiro. Por deduções morfológicas, e outras inferências, a idade esperada para as rochas destacoberturaédaparteinferiordoNeógeno,pré-GrupoBarreiras. TECTÔNICARÚPTILCENOZÓICA Paraacaracterizaçãodo tectonismocenozóicoedeterminaçãodospaleocamposdetensões foi efetuada a análise estrutural de falhas e juntas, procurando-se obteromaiornúmerodedadospossívelporafloramento.Osdados estruturais foram tratados empregando-se os programas computacionais TRADE (ARTG50), desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A. (Campanha et al. 1996), e QUICKPLOT (Van Everdingen & Van Gool 1990). Os diagramas estruturais apresentados correspondem à rede de Schmidt-Lambert, tendo como referência a semi-esfera inferior. Foram possíveis de serem registrados dados estruturais preservados de apenas algumas falhas e respectivas estrias de atrito, distribuídos pela área de estudo. Para um dos locais investigados, correspondente à Falha de São José do Pilar, na localidadehomônima,dedireçãoENE-WSWenocontatotectônico da borda norte do Gráben de Cariatá (Fig. 3F), pode ser efetuada a determinação dos eixos de tensão. São vários planos de falhas sub-paralelos, orientados segundo a direção ENE-WSW, com estrias oblíquas. O exame de pequenos ressaltos ou degraus indica deslocamento normal com componente sinistral. A análise da população de falhas pelo método gráfico (Angelier & Mechler 1977, Angelier 1994) permitiu situar o eixo de tensão principal máxima, s1, na posição subvertical, o eixo de tensão principal mínima,s3,segundoadireçãoNNW-SSE,subhorizontal,eoeixo intermediário, s2, segundo a direção ENE-WSW, subhorizontal (Fig. 4A). As falhas estudadas são paralelas aos diques clásticos já referidos, o que indicaria a presença de tectonismo sin- sedimentar. As argilas lacustres bentoníticas de Boa Vista (PB) estão seccionadas por falhas de componentes normais, com rejeitos verticaisdecimétricos,orientadasnadireçãoNE-SWaENE-WSW, indicando distensão compatível com aquela observada nos arredores de São José do Pilar. Dados referentes a famílias de juntas foram coletados ao longo da estrutura rúptil de direção NNW-SSE que limita o flanco leste do Horst de Boqueirão, nas localidades de Maneco, ao norte, Lagoa da Pedra, ao sul e Fazenda Santo Antônio, na parte centro sul da linha de falha. Na localidade de Maneco (Fig. 4B) as estruturas apresentam orientação predominante segundo NNW- SSEcommergulhosintermediáriosaaltos,configurandoumafamília de juntas conjugadas de extensão (Hancock & Engelder 1989), com s1 horizontal, orientado segundo NNW-SSE, s3 horizontal, orientado segundo ENE-WSW, e s2 vertical. Em Lagoa da Pedra (Fig. 4C) as estruturas configuram um espectro de juntas (Dunne &Hancock1994)comdireçõesentreNNE-SSWeENE-WSW.A posição estimada para s1 é o eixo do espectro, ou seja na direção NE-SW,s3nadireçãoNW-SE,horizontal,es2vertical.NaFazenda Santo Antonio (Fig. 4D e 4E) as estruturas são subverticais a verticais, ocorrendo o franco predomínio de juntas de direção N-S a NNW-SSE, sobre juntas ortogonais, de direção E-W a ENE-
  • 7. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004 133 Benjamim Bley de Brito Neves et al. Figura 4 - A - Resultado da aplicação do método gráfico de determinação de paleotensões para a população de falhas normais de direção ENE-WSW com componentes direcionais sinistrais medidas em pedreira na Falha de São José do Pilar. As isolinhas de maior porcentagem indicam o campo de maior probabilidade de ocorrência do eixo de tensão principal compressivo (s1). B a E - Populações de juntas medidas ao longo da falha da borda leste do Horst de Boqueirão. B - Juntas conjugadasdedistensãodedireçãoNNW-SSE,FazendaManeco. C-EspectrodejuntascomdireçõesentreNNE-SSWeENE-WSW, Lagoa da Pedra. E - Juntas de distensão de direção N-S a NNW- SSE e juntas conjugadas cruzadas - cross joints - secundárias de direção E-W a ENE-WSW, medidas em dois locais na Fazenda Santo Antônio. Tonalidades de cinza mais escuro indicam as direções predominantes. Rede de Schmidt-Lambert, semi-esfera inferior. N 0 0 50 50100 100 n=7 1 1 3 3A NN n=12 NN n=42 B C D E n=41 n=37 WSW. O trend predominante constitui provável família de juntas deextensão(Hancock&Engelder1989),coms1orientadosegundo NNW-SSE,horizontal,s3,ENE-WSW,horizontales2vertical.As direções secundárias, menos sistemáticas, parecem representar crossjoints(Hancock&Engelder1989).Fraturasabertasdedireção NNW-SSE em gnaisses dos arredores de Cajá são consistentes com a direção de compressão segundo NNW-SSE. As observações de campo e a análise das estruturas rúpteis indicam a existência de dois regimes tectônicos superimpostos, um transcorrente, com compressão NNW-SSE horizontal, e outro normal oblíquo, com extensão NNW-SSE horizontal. O preenchimento sedimentar do Gráben de Cariatá parece registrar unicamente as deformações relacionadas ao evento distensivo. Assim, sugere-se que o evento distensivo NNW-SSE tenha sucedido o compressivo de mesma direção, podendo representar um relaxamento dos esforços da fase inicial, com permutação de s1 por s3, e formação do gráben. Estudos estruturais detalhados realizados no Planalto da Borborema, na região limítrofe entre os estados da Paraíba e Rio GrandedoNorte(MoraisNeto1999,MoraisNeto&Alkmin2001), indicaram uma tensão compressiva orientada segundo NW-SE para a nucleação das famílias de estruturas rúpteis mais penetrativas na Formação Serra dos Martins, esta de idade supostamenteeoterciária.Éumadireçãodeesforçodistintadaquela obtida para as falhas que afetam os depósitos sedimentares do sistematafrogênicooraemestudo,oqueadmiteváriasexplicações, como diferenças nos regimes tectônicos, idades das falhas e/ou dos sedimentos (ou ambas). CONCLUSÕES O sistema tafrogênico do saliente oriental nordestino compreende grábens e horsts de direção geral E-W a ENE-WSW, localizados a leste do meridiano 36° W, no Estado da Paraíba. A instalação deste sistema tafrogênico resultou principalmentedareativaçãotectônicadecomponentedistensional ao longo de antigas zonas de cisalhamento dúcteis do embasamento proterozóico. A tectônica distensional é posterior ao arqueamento pós-Cretáceo Superior que sucedeu a ligação dos segmentos Equatorial e Central do Oceano Atlântico, no Maastrichtiano. O sistema tafrogênico compreende três compartimentos: o Gráben de Cariatá, o Horst de Boqueirão e o sistema de grábens do Rio Mamanguape. O preenchimento sedimentar dos grábens, descontínuo em função da ação do ciclo erosivo recente, é constituído essencialmente por depósitos rudáceos - conglomerados, lamitos seixosos a arenosos e arenitos - relacionados provavelmente a sistemas de leques aluviais e planícies de rios entrelaçados. Dados de paleocorrentes, embora localizados, indicam direção de transporte sedimentar para NE e ENE. Os depósitos lacustres contendo argilas bentoníticas da localidade de Boa Vista (PB) parecem representar um testemunho ocidental do Gráben de Cariatá, atualmente isolado. Datação Ar- Ar de basalto que capeia a sucessão sedimentar desta localidade forneceu idade confiável de 21+2 Ma, o que permitiria situar a sedimentação do sistema tafrogênico no Palógeno a início do Neógeno. A análise das estruturas tectônicas rúpteis indica a existência dedoisregimestectônicossuperimpostos.Omaisantigoapresenta direção de compressão NNW-SSE horizontal e o mais novo, que afetaopreenchimentosedimentar,exibedireçãodeextensãoNNW- SSE horizontal. O evento distensivo NNW-SSE provavelmente sucedeu o compressivo de mesma direção e pode representar um relaxamento dos esforços da fase inicial, com permutação de s1 por s3, e formação dos grábens. Aestruturadosistematafrogênicodestaca-sedeformamarcante na paisagem atual, seja na configuração dos planaltos elevados, seja no controle da rede de drenagem. O contexto regional apresenta várias peculiaridades interessantes, com um intensivo dissecamento pelo ciclo erosivo
  • 8. Revista Brasileira de Geociências, Volume 34, 2004134 O sistema tafrogênico terciário do saliente oriental nordestino na Paraíba: um legado proterozóico atual, Paraguassú, o que demonstra a sobreposição de novas fases tectônicas. Torna-se portanto necessário um aprofundamento na escala de trabalhos, tanto pelo lado do tratamento tectônico (parte científica), como pelo ponto de vista prático, uma vez que as acumulações sedimentares geradas e agora sendo exumadas de forma contundente por esta tectônica tem implicações sócio- econômicas de vulto, como nos problemas de recursos hídricos subterrâneos e superficiais e também na distribuição e natureza dos solos. Em adição, a influência deste tectonismo terciário próximodamargematlânticaadjacente,ecomdireçõesestruturais marcantementediagonaisaestamargemcretácico-terciáriarequer estudosquepermitamavaliarasuaeventualimportâncianageração e/ou destruição de armadilhas estruturais para hidrocarbonetos. Agradecimentos Este trabalho foi realizado no âmbito de um projetofinanciadopelaFundaçãodeAmparoàPesquisadoEstado deSãoPaulo-FAPESP(Processo1998/07696-9)aquemosautores agradecem pelo apoio. O CNPq de várias formas, incluindo-se entreelasasbolsasdeprodutividadeacadêmicadosdoisprimeiros autores. Aos revisores da RBG pelas sugestões ao manuscrito. Amaro V.E. 1998. Análise conjunta dos dados geológicos, geofísicos e de sensoriamento remoto do setor extremo nordeste da Província Borborema, Nordeste do Brasil, com ênfase nas zonas de cisalhamentos dúcteis neoproterozóicas. Instituto de Geociênicas, Universidade de São Paulo, São Paulo, Tese de Doutoramento, 378p. Andrade G.O. & Lins R.C. 1965. Introdução à morfoclimatologia do NordestedoBrasil. Rev.InstitutodeCiênciasdaTerra,Universidade do Recife, 3/4:17-28 (2a. edição revisada). Angelier J. 1994. Fault slip analysis and paleostress reconstruction. In: P.L.Hancock(ed.)ContinentalDeformation.Oxford,PergamonPress, 53-100. Angelier J. & Mechler P. 1977. Sur une méthode graphique de recherche des constraintes principales également utilisable en tectonique et in séismologie: la méthode des dièdres droits. Bull. Soc. Géol. France, 7:1309-1318. Barreto A.M.F., Bezerra F.H.R., Suguio K., Tatumi S.H., Yee M., Paiva R.P., Munita C.S. 2002. Late Pleistocene marine terrace deposits in northeastern Brazil: sea-level change and tectonic implications. Palaeogeog. Palaeocl. Palaeoec., 179:57-69. Bezerra F.H.R. & Vita-Finzi C. 2000. How active is a passive margin? Paleoseismicity in northeastern Brazil. Geology, 28:591-594. Bezerra F.H.R., Lima-Filho F.P., Amaral R.F., Caldas L.H.O., Costa- Neto L.X. 1998. Holocene costal tectonics in NE Brazil. In: I.S. Stewart & C. Vita-Finzi (eds.) Coastal Tectonics. Geol. Soc. London, Special Publication, 146, 279-293. Bezerra F.H.R., Amaro, V.E., Vita-Finzi, C., Saadi, A. 2001. Pliocene- Quaternary fault control of sedimentation and coastal plain morphology in NE Brazil. J. Sou. 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Falhas reversas, falhas de rejeitos direcional e juntas na cobertura terciária das Serras de Cuité e Bom Bocadinho (PB): registros de um pulso compressional cenozóico? In: SBG/Núcleos Bahia e Sergipe, VII SNET,Anais, S4:17-20. Morais Neto J.M. & Alkmin F.F. 2001. A deformação das coberturas terciárias do Planalto da Borborema (PB-RN) e seu significado tectônico. Rev. Bras. Geoc., 31:95-106. Nutman A., Brito Neves B.B., Santos E.J. 2001. U-Pb shrimp ages of the Sertânia Complex: evidences for a basement terrane in the Zona Transversal Subprovince. In: SBG, Núcleo Nordeste, XIX Simp. Geol. Nordeste, Natal, Atas, 288-289 Santos E.J. & Medeiros V.C. 1999. Constraints from granitic plutonism on Proterozoic crustal growth of the Transverse Zone, Borborema Province, NE Brazil. Rev. Bras. Geoc., 29:73-84 Sial A.N. 1975. Significado tectônico do posicionamento de rochas basálticas pós-paleozóicas do Nordeste Brasileiro. SBG, Núcleo Nordeste, Boletim, 3:35-51. Van Everdingen D. & Van Gool J. 1990.QuickPlot, plotting program for orientation data. Newfoundland, Department of Earth Sciences, Memorial University of Newfoundland. Manusscrito A-1427 Recebido em 17 de abril de 2003 Revisão dos autores em 25 de outubro de 2003 Revisão aceita em 05 de novembro de 2003