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UNIVERSIDADE DO PORTO
Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física

PROJECTO DE FORMAÇÃO
EM FUTEBOL.
UM PASSO IMPORTANTE PARA A CONSTRUÇÃO DE UM
PROCESSO DE FORMAÇÃO DE QUALIDADE.
Estudo realizado no Departamento de Formação do
Clube Desportivo Trofense.

Hélder Manuel Teixeira Lemos
Dezembro de 2005
UNIVERSIDADE DO PORTO
Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física

PROJECTO DE FORMAÇÃO
EM FUTEBOL.
UM PASSO IMPORTANTE PARA A CONSTRUÇÃO DE UM
PROCESSO DE FORMAÇÃO DE QUALIDADE.
Estudo realizado no Departamento de Formação do
Clube Desportivo Trofense.

Trabalho monográfico realizado no âmbito
da disciplina de Seminário – Opção de
Futebol do 5º ano da Licenciatura em
Desporto e Educação Física, sob a
orientação do Mestre José Guilherme
Oliveira.

Hélder Manuel Teixeira Lemos
Dezembro de 2005
“Não gosto do futebol dos estádios vazios, desconfortáveis e inseguros.
Não gosto do futebol das ameaças e das chantagens. Não gosto dos
dirigentes que têm a mania que mandam no país. Não gosto de ver os
políticos de cócoras. Não gosto de ver leis atropeladas em razão de
outros valores. Não gosto de um futebol sem ética. Não gosto do futebol
impune. Não gosto de apelos e assomos à violência. Não gosto de ver
desculpabilizado o doping. Não gosto de ver o árbitro como figura central
do jogo. Não gosto de observar esta irritante mania de os jogadores se
atirarem para o chão. Não gosto de ver treinadores sem pedagogia. Enfim,
não gosto de um futebol em que se pretende ganhar a qualquer preço”.
Rui Santos (2003: 20)

“Treinar é tão importante como saber o que tenho para fazer”.
Figo (1999: 43)

“Estou convencido de que os jogadores não ganham os troféus de forma
individual; os troféus ganham as equipas”.
José Mourinho (2004b)

"A formação de um jogador é uma história interminável”.
Louis van Gaal (1996: 19)
Agradecimentos

AGRADECIMENTOS
Este trabalho representa o culminar de um conjunto de experiências e
vivências onde outras pessoas tornaram-se fundamentais para a realização do
mesmo. Assim, aproveito este espaço para lhes prestar o meu agradecimento.
Ao Professor Vítor Frade, pela sua sabedoria e pela forma apaixonada
como comunica os seus conhecimentos que levaram à mudança da minha
forma de pensar o futebol.
Ao Professor José Guilherme, pelos seus ensinamentos e pela sua
disponibilidade que permitiram enriquecer os meus conhecimentos e,
consequentemente, este trabalho.
Ao Pedro Sá pela positividade e conhecimentos transmitidos ao longo
destes últimos dois anos e meio e, também, pela sua ajuda e disponibilidade
para a participação neste trabalho.
Ao Eugénio Cunha, pela amizade e pelo exemplo de vida que representa.
Aos meus amigos e companheiros de faculdade, Tiago Leandro, José
Tavares, Ana Luísa Campos, Bruno Guimarães, Daniela Godinho, Bruno
Nogueira e Vera Diogo, pelo constante apoio e compreensão.
A todos os jogadores com os quais convivi e que me fizeram crescer como
pessoa.

III
Resumo

RESUMO
A formação é um aspecto fundamental para os clubes de futebol, pois pode
representar um conjunto de vantagens financeiras, desportivas e sociais.
Assim, o processo de formação deve ser orientado por objectivos e regras bem
definidas, tendo por base um modelo de jogo, com o objectivo de formar
jogadores multifuncionais e tacticamente cultos.
Deste modo, no presente trabalho, procurou-se focar os aspectos
supracitados através de uma revisão bibliográfica e a posterior confrontação
com a informação obtida a partir da entrevista realizada ao Coordenador
Técnico do Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense. Assim,
a informação recolhida e seleccionada visou responder aos seguintes
objectivos que orientaram este estudo: (1) verificar a importância da formação
para o clube; (2) verificar que valores são transmitidos aos jovens jogadores do
clube; (3) verificar a importância que os responsáveis técnicos atribuem à
formação integral dos seus jogadores; (4) identificar os aspectos fundamentais
para se obter um processo de formação de qualidade; (5) identificar as
principais dificuldades na implementação do projecto de formação; (6)
identificar as funções do Coordenador Técnico e a sua importância para a
construção do processo de formação; e, (7) verificar que ligação existe entre o
Departamento de Formação e o Departamento Sénior do clube.
Com base na revisão bibliográfica e na entrevista realizada é possível
afirmar: (1) a formação é um aspecto fundamental para o clube dado estar a
promover jogadores para o plantel sénior; (2) a implementação de um Projecto
de Formação é importante para se verificar continuidade de processos; (3) o
processo de formação deve fomentar a cultura táctica e a formação integral dos
seus jovens jogadores; e, (4) o Coordenador Técnico assume um papel
fundamental, sendo o garante da implementação da filosofia do Projecto de
Formação.

Palavras-chave: – FUTEBOL – FORMAÇÃO – PROJECTO DE FORMAÇÃO –
COORDENADOR TÉCNICO.
IV
Índice

ÍNDICE
AGRADECIMENTOS....................................................................... III
RESUMO .........................................................................................IV
ÍNDICE..............................................................................................V
1. INTRODUÇÃO ............................................................................. 1
2. REVISÃO DA LITERATURA........................................................ 4
2.1. A importância da formação. A formação como um meio de
optimizar financeiramente os recursos humanos .............................4
2.1.1. O futebol como um factor económico ................................................................. 4
2.1.2. A formação como uma das soluções para a viabilidade económica dos clubes
de futebol ............................................................................................................ 6

2.2. A necessidade de construir o processo de formação tendo
como primado a organização de jogo sustentada por uma cultura
de exigência, de vitória e de colectivo ..............................................9
2.2.1. Trabalho, disciplina, rigor.................................................................................. 10
2.2.2. Espírito ganhador, ambicioso e positivo ........................................................... 12
2.2.3. O clube, a equipa e o colectivo acima de tudo ................................................. 13

2.3. Da formação meramente futebolística à preocupação com a
formação integral ............................................................................14
2.3.1. A importância da formação escolar e académica ............................................. 15
2.3.2. A relação Sistema Desportivo/Sistema Educativo............................................ 18

2.4. A procura de identidade através da implementação de uma
filosofia de clube e de um modelo de formação .............................20
2.4.1. A forma de jogar e de treinar da equipa principal como referencial fundamental
do Departamento de Formação ........................................................................ 21
2.4.2. Formar jogadores tacticamente cultos e multifuncionais .................................. 23
2.4.3. Corpo técnico deve estar identificado com o modelo de jogo .......................... 25
2.4.4. Dificuldades na implementação do modelo de clube........................................ 27
2.4.5. Ajax: a escola de formação de referência......................................................... 28

V
Índice

2.5. Coordenador Técnico como regulador e dinamizador de todo o
processo de Formação ...................................................................31
2.5.1. Funções do Coordenador Técnico.................................................................... 31

3. MATERIAL E MÉTODOS........................................................... 36
3.1. Caracterização da amostra......................................................36
3.2. Metodologia de investigação ...................................................36
3.3. Recolha de dados....................................................................36
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DA ENTREVISTA .................... 37
4.1. A importância financeira, desportiva e social da formação para
o Clube Desportivo Trofense ..........................................................37
4.1.1. Vantagens da integração de jovens jogadores formados no Departamento de
Formação no plantel sénior do clube................................................................ 38

4.2. Projecto de formação: a continuidade como princípio
fundamental ....................................................................................40
4.2.1. A filosofia de clube como ideal de difícil concretização .................................... 41
4.2.2. O Projecto de Formação como solução de continuidade ................................. 42
4.2.3. Identidade ao nível de treino e de jogo ao longo do processo de formação .... 43
4.2.4. Formar jogadores de qualidade ........................................................................ 45
4.2.5. Treinadores identificados com o Projecto de Formação................................... 50
4.2.6. Principais dificuldades encontradas na implementação do Projecto de
Formação.......................................................................................................... 53

4.3. Coordenador Técnico como o garante do Projecto de
Formação........................................................................................54
4.3.1. Funções do Coordenador Técnico do Clube Desportivo Trofense................... 54

5. CONCLUSÕES .......................................................................... 57
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................... 60
7. ANEXO....................................................................................... 66

VI
Introdução

1. INTRODUÇÃO
A formação de jovens jogadores por parte dos clubes de futebol pode
representar um aspecto decisivo para o sucesso dos mesmos quer no plano
desportivo, quer no plano financeiro.
A integração de jovens jogadores nos planteis seniores dos respectivos
clubes onde realizaram a sua formação leva a uma poupança ao nível
financeiro. Pois, se o clube forma os seus próprios jogadores, acaba por não
precisar de contratar jogadores a outros clubes, sendo que, na maioria dos
casos, os jovens jogadores auferem ordenados muito inferiores a um jogador
contratado. Por outro lado, os jovens jogadores já conhecem o clube onde
trabalham, evitando a necessidade de períodos de adaptação à nova realidade
que um jogador contratado teria de se confrontar. Como refere Adriaanse
(1993: VII), no Ajax “nunca contratamos jogadores feitos: são mais caros e
trazem vícios difíceis de emendar, pelo menos para jogarmos da forma que nós
queremos”.
Parece-nos urgente o investimento forte na formação de jovens jogadores
de futebol, pois, como afirma Vale (2003b: XX), “a formação é um aspecto
rentável. Penso que esta é a via para os clubes portugueses”.
Contudo, a formação não pode ser uma formação qualquer, sendo
primordial que esse processo esteja direccionado para a excelência. Isto
porque a integração desses jovens jogadores no planteis sénior dos clubes
está altamente dependente da qualidade dos próprios jogadores. Ou seja, o
processo de formação tem de ser bem orientado e com objectivos bem
definidos.
A criação de Projectos de Formação é, desta forma, eminentemente
importante para o estabelecimento de uma cultura desportiva, com princípios e
regras coerentes e bem definidas, que tenha por base “um modelo de jogo que,
por sua vez, orientará a concepção de um modelo de treino, de um complexo
de exercícios, de um modelo de jogador e mesmo de um modelo de treinador”
(Leal & Quinta, 2001: 27).

1
Introdução

Na perseguição desse objectivo, a partir da época desportiva 2002-2003
gerou-se

no

Clube

Desportivo

Trofense

um

contexto

favorável

ao

desenvolvimento de um Projecto de Formação.
A filosofia adoptada no Departamento de Formação do Clube Desportivo
Trofense com a implementação deste novo projecto consiste numa “atitude
competitiva constante baseada no rigor e no esforço individual para um elevado
rendimento colectivo. Procura-se, assim, implementar uma forma de estar que
conduza à aquisição e desenvolvimento de comportamentos de excelência
futebolística nos jovens jogadores, contribuindo, igualmente, para a formação
integral dos jovens nos seus mais elevados valores morais, cívicos e de
urbanidade, bem como, no desenvolvimento das suas capacidades cognitivas”
(Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense, 2002: 6).
Actualmente, podemos encontrar no Departamento de Formação do Clube
Desportivo Trofense: um modelo de jogo e uma metodologia de treino comuns
a todos os escalões; um grupo de treinadores identificado com a filosofia do
projecto; um documento orientador do processo; a integração de jovens
jogadores na equipa sénior do clube formados neste Departamento de
Formação; e, a existência de um Coordenador Técnico que regula e
supervisiona todo o processo de formação.
Este estudo surge como uma oportunidade para compreender mais
aprofundadamente esta realidade. Desta forma estabelecemos como objectivos
para o estudo:
i.

Verificar a importância da formação para o clube;

ii.

Verificar que valores são transmitidos aos jovens jogadores do clube;

iii.

Verificar a importância que os responsáveis técnicos atribuem à
formação integral dos seus jogadores;

iv.

Identificar os aspectos fundamentais para se obter um processo de
formação de qualidade;

v.

Identificar as principais dificuldades na implementação do projecto de
formação;

vi.

Identificar as funções do Coordenador Técnico e a sua importância
para a construção do processo de formação;

2
Introdução

vii.

Verificar que ligação existe entre o Departamento de Formação e o
Departamento Sénior do clube.

O presente estudo monográfico será estruturado em sete pontos.
O primeiro, “Introdução”, tem como objectivo apresentar o estudo, os seus
objectivos e a sua estrutura.
No segundo ponto, pretendemos apresentar o levantamento bibliográfico
sobre temáticas relacionadas com a formação de jovens jogadores de futebol.
No terceiro ponto, apresentaremos a caracterização da amostra, a
metodologia de investigação e, por fim, a recolha de dados.
No quarto ponto, análise e discussão dos resultados, estabeleceremos uma
relação entre a literatura e a opinião do entrevistado.
No quinto ponto, serão apresentadas as conclusões do estudo.
No sexto ponto, serão indexadas todas as referências bibliográficas
mencionadas no texto dos pontos anteriores.
No sétimo ponto, será anexada a entrevista efectuada.

3
Revisão da Literatura

2. REVISÃO DA LITERATURA
2.1. A

IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO. A FORMAÇÃO COMO UM MEIO
DE OPTIMIZAR FINANCEIRAMENTE OS RECURSOS HUMANOS
“O mundo do futebol move-se ao redor de duas órbitas distintas, uma que é desportiva e outra que é a comercial. Ou
seja, por um lado é um jogo, por outro é um negócio”.
Valdano (2002: 16)
“O futebol é, na verdade, um jogo, mas também é um espectáculo. Devemos isso ao público. E é também um negócio,
não podemos perder o nosso valor”.
Robson (2003: 44)
“O Benfica deverá ter sempre jovens talentos na sua escola de jogadores uma vez que eles são o futuro”.
Camacho (in Alves, 2004: 84)
“Não gosto de um plantel extenso e quero apenas contar com 21 jogadores de campo. Se tiver uma equipa mais
reduzida também poderei ter mais atenção para as camadas jovens”.
Mourinho (2004b)

O fenómeno desportivo e, nomeadamente, o mundo do futebol estão a
tornar-se num verdadeiro negócio e este último “será cada vez mais uma
actividade económica envolvendo verbas enormes” (Carraça, 2003a: 82).
Contudo, como qualquer outro negócio da nossa sociedade, o futebol sofre
igualmente com os altos e baixos da economia nacional e internacional.
Segundo Ferreira (1999: 9), “Portugal terá sempre um futebol mediano no
plano financeiro, e um campeonato abaixo dos campeonatos mais ricos. O que
Portugal pode ter é a possibilidade de, através do talento dos seus jogadores,
conseguir que as nossas equipas sejam mais fortes financeiramente, porque
assim farão uma gestão mais correcta daquilo que investem e daquilo que
depois rentabilizam desses investimentos”.
Pensamos que será essencial que os responsáveis de clubes, treinadores e
directores, se mostram sensíveis à questão da formação e à sua importância
quer do ponto de vista desportivo, quer do ponto de vista financeiro.

2.1.1. O futebol como um factor económico
No dia 11 de Fevereiro de 2002, surgia no Jornal “O Jogo” um artigo de Rui
Oliveira (2001: 12) intitulado “O futebol português e a indústria do futebol”.

4
Revisão da Literatura

Nesse artigo, o autor apontava alguns dos motivos do fracasso a nível das
competições europeias por parte das equipas portuguesas:
“Ao longo dos últimos anos temos assistido a uma perda de poder de
competitividade dos clubes de futebol portugueses em relação aos seus
congénitos dos países mais desenvolvidos da Europa tendo como causa óbvia
a fragilidade económica dos nossos clubes em relação aos últimos. A forma
abrupta e rápida da industrialização deste fenómeno social acabou por
fortalecer os clubes mais ricos e, pelo contrário, obrigou aqueles com menor
capacidade económica a verem partir a maioria dos seus talentos, ficando,
como é lógico, mais enfraquecidos em relação aos seus opositores. O futebol
português, do ponto de vista desportivo, acabou por sofrer a erosão normal de
qualquer indústria que, pelo seu menor poder económico, não conseguiu
resistir ao poder dos grandes grupos económicos que estão por detrás da
maior parte dos grandes clubes europeus”.
Constantino (2002: 152) confirma a ideia do autor anterior afirmando que “a
livre circulação dos praticantes num mercado aberto introduziu uma dinâmica
em que a lógica dos países economicamente mais fortes prevalece sobre os
mais fracos, criando uma situação onde tendencialmente os melhores
praticantes se concentrem nos mercados com maior poder aquisitivo”.
Assim, com a conjuntura actual os clubes dos campeonatos com maior
poder económico acabam por ter os melhores jogadores tornando-se
superiormente competitivos comparados com campeonatos com menor poder
económico como o campeonato português.
Tendo em linha de conta o supracitado, concordamos com Oliveira (2001:
12) quando este afirma que “perante este contexto, consequente da
globalização, pensamos que se torna urgente encontrar medidas que permitam
minorar ou mesmo estagnar o enfraquecimento competitivo a que se tem
assistido nos últimos anos, para não corrermos o risco de, no futuro, em termos
globais, e por não termos lugar nas grandes competições, acabarmos por ver
ainda mais alargado o fosso económico e o desequilíbrio que o mesmo reflecte
ao nível da competição”.

5
Revisão da Literatura

Uma das medidas fundamentais para contrariar esta tendência seria investir
na formação e nos jovens talentos. No entanto, segundo alguns autores a
realidade está longe do que seria ideal. Carraça (2003b) e Pacheco (2001)
afirmam mesmo que em Portugal não se verifica um investimento claro e uma
aposta séria na formação. Campos (2003: 82) alerta para o facto de “num
futebol em que a crise financeira se está a fazer sentir de uma forma violenta, o
grande contra acaba por se fazer reflectir, essencialmente, na não exploração
do futebol de formação, o que seria mais económico e rentável”.
Desta forma, e em virtude da actual situação de crise económica no
panorama internacional em geral e no futebol em particular, torna-se
necessário que cada vez mais “os clubes formem jogadores de qualidade no
sentido de assim os integrarem nas suas equipas seniores evitando, dessa
forma, o pagamento de quantias elevadas na aquisição de jogadores a outros
clubes. Por outro lado, ao investirem na formação de jogadores aumentam a
possibilidade de obterem no futuro dividendos desse investimento numa
possível venda para outros clubes” (Leandro, 2003: 3).
Mediante a realidade do futebol português e da economia em que está
inserido entendemos que os clubes de futebol têm de investir na formação de
forma a rentabilizar os seus recursos humanos e, ao mesmo tempo, manteremse competitivos.

2.1.2. A formação como uma das soluções para a viabilidade
económica dos clubes de futebol
O objectivo da formação foi-se alterando ao longo dos anos. Pensamos
que, tal como no Real Madrid, o investimento na formação em Portugal estava
sobretudo relacionado com questões de origem histórica e social (Giráldez,
2003). Com a conjuntura actual podemos afirmar que “a formação desportiva
readquiriu uma nova centralidade. Ela deixou de ser apenas um processo de
assegurar a qualidade desportiva dos clubes, para ser também um meio de
optimizar financeiramente os recursos humanos” (Constantino, 2002: 153).
Na opinião de Oliveira (2001: 12), uma das grandes soluções para o
problema económico dos clubes é “apostar inequivocamente na formação,

6
Revisão da Literatura

criando estruturas, alterando conceitos e metodologias, de forma que o número
de jovens com talento seja maior ao da realidade actual”.
É necessário ter presente “que os jogadores são activos neste mundo
economicista. Pois, para além do património imobiliário que só alguns clubes
ou sociedades desportivas possuem, são exactamente estes activos [entendase jogadores] a única riqueza, o único bem de possível rentabilização (Carraça,
2003a: 82).
Mourinho (2002a: 17) refere que “um clube com a dimensão do Futebol
Clube do Porto precisa de ter os seus activos elevados [entenda-se jogadores]
ao expoente máximo, de modo a que um determinado momento tenha
condições para vender, caso isso seja necessário”.
Segundo Camacho (in Alves, 2004: 84) “o lançamento de jovens
futebolistas

está

muitas

vezes

relacionado

com

os

condicionalismos

económicos de cada clube. Equipas que não têm grande capacidade financeira
a nível internacional têm nos jogadores formados nas suas escolas a
oportunidade de reforçarem os seus planteis e de, ocasionalmente, venderem
jogadores, o que lhes podem trazer importantes contrapartidas financeiras”.
Vale (2003b: XX) confirma as ideias expressas anteriormente afirmando que
“a formação é um aspecto rentável, isto é, formar jogadores e eventualmente
vendê-los, se estes tiverem qualidade. Penso que esta é a via para os clubes
portugueses”.
Daí que um investimento forte e sério na formação acabe por ser a
médio/longo prazo um excelente investimento. É necessário apostar nos jovens
jogadores de forma a evitar gastos e, eventualmente, rentabilizá-los com a sua
venda.
Mesmo em grandes clubes e com enorme potencial financeiro, como é o
caso do Chelsea Football Club (Inglaterra), a estratégia passa pelo
investimento nas camadas jovens. Kenyon (2004: 25), director executivo do
referido clube, menciona que “a alma do clube tem de vir das Academias. Isto
para que não tenhamos de estar a gastar dinheiro em jogadores. E passa por
aqui o equilíbrio financeiro”.

7
Revisão da Literatura

Assim, uma aposta nos jovens jogadores permitirá uma melhor gestão quer
dos recursos humanos, quer dos recursos financeiros dos clubes.
Por outro lado, Oliveira (2001: 12) afirma que “é fundamental que
entendamos que, da forma como se está a desenvolver esta indústria, o nosso
país terá forçosamente de ser mais exportador do que importador e, que
quando tenha de importar, que o faça de forma pontual e com o garante de que
tais importações constituirão uma mais-valias não só desportivas, mas,
também, económicas”.
Assim, como afirma Constantino (2002: 152), “um forte investimento na
formação desportiva passa a ser, à nova dimensão internacional do trabalho
desportivo, um objectivo estratégico fundamental para aumentar o grau de
competitividade dos países com economias de desporto mais fracas”.
Os treinadores das grandes equipas portuguesas estão atentos a este
fenómeno e à importância da formação no futebol. Segundo Mourinho (2003b:
20), “em Portugal, é preciso repensar o investimento na formação, apostar em
jogadores mais novos e nacionais”. Camacho (2003b: 9) é da mesma opinião
afirmando que jogadores como “Cristiano Ronaldo ou Ricardo Quaresma não
aparecem todos os anos. Para isso é preciso apostar nas camadas jovens”.
Assim, parece-nos consensual a premência do investimento na formação e
nos jovens talentos de forma a facilitar a sanidade económica dos clubes de
futebol e, ao mesmo tempo, garantir uma maior competitividade desportiva
quer ao nível das competições internas, quer ao nível das competições com os
restantes clubes/países da Europa.

8
Revisão da Literatura

2.2. A

NECESSIDADE DE CONSTRUIR O PROCESSO DE FORMAÇÃO
TENDO COMO PRIMADO A ORGANIZAÇÃO DE JOGO SUSTENTADA POR
UMA CULTURA DE EXIGÊNCIA, DE VITÓRIA E DE COLECTIVO
“Até nas peladinhas gosto de ganhar. Desfruto todos os dias e, antes dos jogos, penso sempre nos adeptos e na
necessidade de me esforçar, para lhes provar que sou um bom jogador”.
Gonzalez (2003: 50)
“Nenhum jogador está acima da equipa. Aprendi, muito cedo, essa lição”.
Casillas (2003: 50)
“Temos de melhorar a cada dia, do princípio ao fim da carreira. Quero aprender coisas novas todos os dias”.
Crespo (2005: 10)
“ [Cristiano Ronaldo] tem de continuar a ser humilde, a perceber que tem muito ainda a aprender, a evoluir e a associar
as suas qualidades à eficiência e aos condicionalismos da equipa”.
Queiroz (2005: 38)

A formação de um jogador de futebol é um processo moroso e com
particularidades com as quais os treinadores devem estar identificados de
forma a poderem rentabilizar ao máximo esse mesmo processo. Como afirmam
Leal & Quinta (2001: 20), “o futebol juvenil tem impressões digitais próprias,
isto é, possui características que lhe dão autonomia peculiar, o que pressupõe,
evidentemente, uma metodologia que se identifique com as suas necessidades
e particularidades”.
Apesar destas especificidades da formação e, nomeadamente, as
especificidades de cada escalão, somos da opinião de que o processo de
formação deve ter como principal referencial o que é exigido na equipa
principal. Esta exigência deverá atingir o seu máximo grau de rigor nos últimos
escalões de formação, isto tendo em conta que “a rentabilização da formação
passa pela capacidade de se formar jogadores com qualidade suficiente para
entrarem na equipa principal e pela introdução dos maiores talentos de forma
mais consistente na equipa principal” (Paul, 2003: XXVII). Ou seja, o objectivo
final do todo o processo de formação passa pela integração do maior número
possível de jogadores na equipa sénior dos respectivos clubes.
Assim, “a formação em futebol tem que ser uma actividade guiada pelos
mais rigorosos padrões de exigência” (Oliveira, in Leal & Quinta, 2001) de
forma a preparar os jovens jogadores para o mundo do futebol profissional.
9
Revisão da Literatura

Apesar de defendermos que, tal como para Mourinho (in Lourenço, 2003:
121), “a organização de jogo de uma equipa é o factor mais importante de
todos”, existem outros valores que têm de ser ponderados ao longo de todo o
processo de formação de forma a sustentarem essa mesma organização de
jogo.
Carraça (2005a: 46) afirma que o jovem jogador do Sport Lisboa e Benfica
deve ter as seguintes características: “um bom desenvolvimento motor,
competitividade, um pensamento bem organizado e estruturado, disciplina e
perseverança”.
Segundo Vale (2004: 16), “um jogador pode ter muito talento, mas na nossa
opinião é o carácter que conta. São esses os grandes jogadores do futuro. É
um aspecto decisivo no jogador de elite”. De acordo com o mesmo autor, o
jovem jogador de futebol tem de revelar “carácter, inteligência específica de
jogo, técnica evoluída e com princípios de educação para se comportar como
ser social. Para além disso tem de ter ambição, gostar de futebol e uma grande
vontade de se tornar um jogador de elite” (Vale, 2004: 16).
Valente (2005: II) afirma que “um jogador de futebol de alto nível tem de ter
um nível mental muito forte”.
Então, o processo de formação deve ter como primado a organização de
jogo da equipa num contexto de exigência, de vitória e de colectivo. O
Coordenador Técnico deverá fomentar estes valores intervindo junto dos
treinadores.

2.2.1. Trabalho, disciplina, rigor
Pensamos que a formação de um jovem jogador de futebol tem de ser um
processo com cunho exigente. De acordo com Giráldez (2002), “o êxito reside
no facto do jogador querer ser melhor em cada dia que passa. O Real Madrid
procura a melhoria dos jogadores desde o primeiro dia em que chegam a esta
casa”. Essa parece ser a mesma filosofia do Ajax: “O jovem jogador do Ajax
tem de possuir talento e vontade de aprender: a nossa obrigação é fazer
jogadores melhores a cada dia que passa” (Adriaanse, 1996: 21).

10
Revisão da Literatura

Vale (2003a: LXXVI) parece concordar com as ideias anteriores: “para que
um jovem jogador seja formado com sucesso este tem de ser eficaz do ponto
de vista táctico-técnico, físico e fundamentalmente mental. Para poder alcançar
este perfil o jogador tem de ter capacidade de trabalho, rigor, disciplina,
organização, grande ambição em tornar-se jogador de alto nível. Portanto, está
relacionado com o nível de empenhamento que consiga ter no dia-a-dia, no
sentido de se tornar cada vez mais forte do que no dia anterior”.
Valdano (2002: 16), reportando-se à sua experiência enquanto jogador
profissional de futebol, afirma que “teve de colocar em funcionamento a
vontade, o espírito de sacrifício, e aí houve uma aprendizagem não apenas
desportiva, mas também pessoal que lhe possibilitou fazer incursões por outros
campos”.
Para Mourinho (2003c) mais problemático que as debilidades tácticas são
as debilidades ao nível psicológico afirmando mesmo que adora “encontrar um
jogador com debilidades tácticas, receber um jogador «cru» a nível táctico. Mas
não tem pachorra para jogadores com debilidades psicológicas ao nível do
sacrifício, da crença e da entrega”. Ou seja, “os grandes treinadores pretendem
jogadores com qualidade, mas que tenham motivação em cada dia que passa
e um interesse grande em aprender aquilo que lhes é transmitido” (Mourinho,
2002a: 20).
Dada a exigência do futebol profissional, o processo de formação deve
integrar os mesmos valores. Como refere Adriaanse (in Kormelink &
Seeverens, 1997: 69) “se tu estás no Ajax tens de ser treinável e ser capaz de
entender as instruções, mesmo que só tenhas 7 anos”.
Deste conjunto de ideias supracitadas depreendemos que as competências
sociais e psicológicas estão também elas relacionadas com as capacidades
futebolísticas e que há valores e atitudes que devem ser fomentados dentro e
fora do terreno de jogo de forma a construir a personalidade e o
comportamento dos jovens jogadores.
No entanto, e de acordo com Adriaanse (1997: 66) “a sociedade está em
mudança em muitas dimensões, sendo que os jovens de hoje em dia dão mais
importância ao lazer do que ao trabalho. Porém, as regras do futebol de elite

11
Revisão da Literatura

não se alteraram”. Este aspecto pode trazer alguns entraves ao processo de
formação devido ao confronto de valores fundamentais deste processo e os
valores que os jovens jogadores vivenciam no seu dia-a-dia. Será importante
transmitir aos jovens jogadores que o fundamental numa equipa de futebol é o
rendimento individual em prol da equipa e que “somente o trabalho é que leva
ao sucesso” (Mourinho, in Lourenço, 2003: 41).
Pensamos que a exigência relativamente ao trabalho diário, à disciplina, à
correcção e à procura de uma constante melhoria deve surgir e ser fomentada
pelos treinadores ao longo de todo o processo de formação.

2.2.2. Espírito ganhador, ambicioso e positivo
Denoueix (2003: 46) afirma que o Nantes conseguiu aproximar-se das
grandes equipas francesas e ganhar vários títulos, “controlando ansiedades e
acrescentando optimismos. Quando praticamos um desporto temos que ser
optimistas, positivos e ter vontade de ganhar, para vencer os mais fortes. Isso
consegue-se com muito trabalho diário”.
Valdano (2002: 21) defende esta perspectiva afirmando que “para se atingir
o sucesso no futebol é necessário ser-se uma pessoa positiva e a descoberta
dos erros que levaram ao fracasso deve ser um exercício que nos torna
melhores”.
Para Mourinho (in Lourenço, 2003: 128) “«ser campeões» tem de ser
sempre o nosso objectivo. Um objectivo diário, uma motivação consistente e
permanente, uma luz que tem de guiar o nosso trajecto. Cada treino, cada jogo,
cada minuto da nossa vida profissional e social tem de se centrar nesse
objectivo que é nosso”.
Desta forma, “os jogadores devem ser formados dentro de uma cultura de
vitória. Os jogadores têm de estar habituados a ganhar” (Mourinho, 2002a: 20).
Mourinho (in Lourenço, 2003: 104) afirma mesmo que “uma equipa de futebol
só é digna desse nome quando todos os jogadores, sem excepção, querem
ganhar, querem ganhar muito, independentemente de jogarem ou não”.
Mas ganhar não se deve cingir ao resultado. Ganhar significa igualmente
“ganhar cada treino, ganhar capacidade para jogar, ganhar capacidade de

12
Revisão da Literatura

sofrer, ganhar vontade de jogar e ganhar, ganhar espaço para jogar, ganhar
cada duelo, ganhar cada combinação ofensiva, ganhar cada situação de
finalização, ganhar uma equipa” (Departamento de Formação do Clube
Desportivo Trofense, 2002). Ou seja, o jovem jogador de futebol deve
desenvolver a capacidade de auto-superação individual e colectiva, exigindo
sempre mais de si e da sua equipa.
Defendemos que o processo de formação tem de ter o seu enfoque na
positividade, na capacidade de ultrapassar as adversidades com determinação
e na vontade de querer ganhar todas as situações.

2.2.3. O clube, a equipa e o colectivo acima de tudo
Sendo o futebol um desporto colectivo e institucionalizado é fundamental
que os jovens jogadores privilegiem os interesses do seu clube e da sua equipa
em detrimento dos seus próprios interesses.
Para Mourinho (in Lourenço, 2003: 121) “a ideia de clube é mais importante
do que qualquer jogador tratando-se de um valor que tem de se passar por
todo o clube, em especial pelas camadas jovens. O respeito pelo clube, pelas
normas instituídas, pela filosofia de clube é mais importante do que qualquer
indivíduo, ou seja, ninguém está acima do clube”.
De acordo com Denoueix (2003: 46) “fala-se muito em craques individuais,
mas, no seu entender, o colectivo é prioritário”.
Valdano (2002: 20) corrobora com as ideias anteriores referindo que “a
estrutura e a cultura do Real Madrid têm de estar sempre acima das
pretensões dos jogadores. Aqui a mensagem foi clara: chega uma grande
figura internacional, mas aceita as regras comuns, as regras que estão
definidas no Real Madrid há muito tempo; é uma maneira de explicar que a
instituição está acima dos jogadores”.
Parece-nos fundamental que se transmita aos jovens jogadores durante o
processo de formação que o clube, as regras instituídas e a ideia de jogo
implementada são o mais importante e que têm de ser respeitados.
Segundo Mourinho (2003d: 61) “o conceito de equipa é muito mais
importante do que o conceito de individualidade e que a melhor equipa não é

13
Revisão da Literatura

aquela que tem os melhores jogadores, mas aquela que joga como equipa”.
Assim, “todos os jogadores têm de transformar as suas motivações pessoais
em motivações colectivas” (Mourinho, 2003e: 33), “sendo fundamental para
poder jogar ao mais alto nível, cada jogador sentir-se confiante, ser solidário e
cooperante com os seus companheiros e acreditar neles” (Mourinho, in
Lourenço, 2003: 141).
Valdano (2002: 22) refere ainda que “precisamos sobretudo de metas e
necessitamos de um estado de ânimo colectivo que nos permita trabalhar com
um determinado nível de entusiasmo. Necessitamos de uma retaguarda de
cultura corporativa para ter um determinado sentido de pertença”. Ou seja,
torna-se importante a partilha de objectivos e de cumplicidades de forma a
formar um grupo coeso para que todos os elementos da equipa se dirijam no
mesmo sentido.
Pensamos que o processo de formação deve ser orientado para os valores
colectivos da equipa e do clube em detrimento dos valores individuais.

2.3. DA

FORMAÇÃO MERAMENTE FUTEBOLÍSTICA À PREOCUPAÇÃO
COM A FORMAÇÃO INTEGRAL
“Retirei-me com trinta e tantos e espero viver até aos setenta e tal. Um dia pensei: o que vai ser da minha vida quando
não for conhecido, quando o meu rival for um cidadão normal que tem duas profissões? Pensai bem”.
Butragueño (in Palomino, 2002)
“Formar Homens que jogam”.
Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense (2002: 9)
“A formação desportiva não pode prejudicar a formação escolar dos jovens. Mas, por outro lado, a escola não deve
hipotecar o futuro dos jovens desportistas com talento”.
José Carvalho (2002: 12)

A formação não se trata “apenas de treinar, é muito mais do que isso: é
educar” (Leal & Quinta, 2001: 21). Desta forma, o processo de formação do
jovem integra, como não poderia deixar de ser, a componente escolar. Tal
significa que “a prestação desportiva não pode acarretar o prejuízo do
rendimento escolar. Os jovens jogadores devem entender que o desporto
contribui para a sua formação, ao ser um espaço de formação, por excelência,
promotor da auto-afirmação e da auto-superação. Todavia, tudo isto perde o

14
Revisão da Literatura

sentido se ele deixar de prestar atenção aos estudos, na medida em que estes
constituem, no presente, o acesso para a construção de um futuro sólido”
(Mesquita et al, 2002: 9).

2.3.1. A importância da formação escolar e académica
Para o jovem jogador de futebol é muito difícil conciliar a sua actividade
desportiva com a actividade escolar. Como afirma José Carvalho (2002: 13), “é
um dado adquirido que a opção pela carreira desportiva na via da alta
competição acarreta uma série de problemas na organização da vida
desportiva, escolar e social do jovem jogador”. Vale (2003a: LXXVII) confirma
esta ideia afirmando que “em Portugal, hoje em dia é extremamente difícil
conseguir obter sucesso do ponto de vista desportivo e escolar ao mesmo
tempo. Tudo isto são factores a ter em conta num processo de formação”. Daí
a emergência do apoio escolar aos jovens jogadores dada as dificuldades em
conciliar a actividade desportiva com a actividade escolar.
José Carvalho (2002: 26), afirma que “a cobertura mediática realizada aos
futebolistas profissionais torna muito atraente esta carreira para os jovens
jogadores. No entanto, esta opção, por vezes, tem como consequência a
falência da carreira académica, o que se revela negativo, principalmente se o
jovem por qualquer motivo não atinge o profissionalismo”.
Gomes (2004: 25) afirma que “seria bom que estes jovens estudassem e
obtivessem as máximas competências possíveis para que sejam homens mais
preparados para a vida, independentemente de triunfarem ou não no futebol”.
Caçador (2003: 9), afirma que os jovens jogadores e os seus pais devem
investir na formação escolar e académica dos primeiros: “Temos de nos
preocupar com a formação académica dos jogadores, sermos exigentes. Não é
possível que um jovem de 20 anos seja só futebolista e que os seus pais
tenham a feliz ideia de os apoiar quando abandonam a escola. Não há um
jovem que se possa considerar no bom caminho se abandonar a escola ao 9º
ano. Queremos que concluam o 12º [ano de escolaridade] e entrem nas
faculdades, aproveitando o estatuto de alta competição. É essa a grande
revolução que temos de fazer: apostar na qualidade de jogadores e no seu

15
Revisão da Literatura

nível cultural. Esses homens, a médio prazo, poderão transformar o futebol
português”.
Tendo em conta as ideias anteriormente descritas, “um processo iniciado
com um percurso de formação concertado e qualificado, em que o aspecto de
aprendizagem desportiva e académica ou técnico-profissional é deveras
importante. Isto porque, temos de ter a consciência de que a esmagadora
maioria dos jovens jogadores nunca serão jogadores profissionais de futebol.
Os outros, os mais aptos, aqueles que durante as várias fases de formação
demonstraram ter capacidades e potencial para poderem ser profissionais de
primeiro plano, terão de se disponibilizar para assumirem uma carreira: dura,
desgastante, arriscada, mediática. Mas compensadora e envolvente para
aqueles que a saibam gerir com inteligência e sensatez” (Carraça, 2003a: 82).
Como afirma o mesmo autor (Carraça, 2003b: 9), “apenas 5% dos profissionais
de futebol do nosso país é que no fim da carreira e se gerirem bem os seus
rendimentos não necessitam de desenvolver outra actividade. Os outros 95%
têm de assumir uma nova profissão para sobreviver. Amealharam algum
dinheiro, mas deixaram de estudar muito cedo”.
Assim, a formação escolar e académica surgem como apoio a uma melhor
gestão dos rendimentos e como uma garantia de um futuro mais estável e
seguro no caso de a carreira futebolística terminar ou não ser bem sucedida
por diversos factores, como por exemplo, as lesões.
De acordo com Rocha (2003: 39), jogador profissional de futebol da
Académica de Coimbra e licenciado em fisioterapia, “não vale a pena fazer
planos a longo prazo [no futebol], porque há imponderáveis, como as lesões. E
determinadas lesões, dependendo da sua gravidade, podem determinar o fim
de qualquer carreira”. Desta forma concordamos com Rocha (2003: 39) ao
afirmar que “parece importante que o jogador que pense no seu futuro: tem de
estar preparado para entrar no mercado de trabalho e sem uma licenciatura é
bastante mais difícil conseguir isso”.
Do ponto de vista desportivo, segundo Mourinho (2002c), “um jogador culto
não tem mais capacidade de evolução e de aproveitamento, mas antes um

16
Revisão da Literatura

jogador inteligente: quem é inteligente assimila mais depressa as coisas
acelerando a aquisição dos objectivos do treino”.
Mas, por outro lado, concordamos com Vale (2003a: LXXVII) quando afirma
que um jogador “quanto mais culto for, não só do ponto de vista táctico, mas
também intelectual, mais disponível estará para apreender coisas novas que
façam apelo fundamentalmente à sua capacidade de análise e à inteligência,
tem a ver com a inteligência táctica”. Mil Homens (2004: 6) é da mesma opinião
afirmando que “as pessoas mais cultas e melhor formadas pensam, entendem
e desempenham melhor qualquer actividade”.
Parece-nos que a formação escolar e académica têm um papel fundamental
na sociedade e que não deverá ser descurada pelos agentes orientadores do
processo de formação desportiva. E essa mesma formação escolar/académica
ajudará o jovem jogador no seu «dia-a-dia futebolístico», pois “no futebol de
hoje não basta só ser bom jogador ou pelo menos saber o que fazer em
campo. É necessário aprender ao pormenor as regras deste novo raciocínio do
espectáculo profissional, não esquecer a importância da imagem, saber
comunicar e ter sempre presente o papel fundamental que a comunicação
social pode ter na evolução (ou retrocesso) de uma carreira” (Carraça, 2003a:
82). Assim, a formação escolar/académica surge também como um meio de
apoio à carreira de futebolista. Daí a necessidade do “profissionalismo, espírito
de sacrifício, visão e uma abrangente e competente gestão da carreira,
aspectos prioritários a ter em conta pelos jogadores, por forma a poderem
acompanhar a diária evolução a que esta indústria a está sujeita” (Carraça,
2003a: 82).
Assim, ao longo do processo de formação os jovens jogadores devem ser
incentivados a empenharem-se nos seus estudos. O Coordenador Técnico
deverá intervir junto dos treinadores para que estes alertem os seus jogadores
da importância do estudo e, se necessário, desenvolver estratégias de
remediação caso se verifique insucesso escolar. Este responsável deverá
igualmente comunicar com os pais dos jogadores sempre que se verifique essa
necessidade.

17
Revisão da Literatura

2.3.2. A relação Sistema Desportivo/Sistema Educativo
Pensamos que a relação entre o Sistema Desportivo e o Sistema Educativo
não é suficientemente cooperante de forma a ajudar os jovens desportistas, em
geral e os jovens jogadores de futebol, em particular, a conciliarem as duas
actividades. Segundo José Carvalho (2002: 15), “a conciliação entre as
actividades desportivas e as actividades escolares dos jovens têm-se revelado
com um problema de difícil solução. Este problema agudiza-se de
sobremaneira quando pretendem enveredar por um percurso que os conduza a
resultados de excelência”.
Dado este problema parece-nos fundamental que a Escola e o Clube se
aproximem de forma a compatibilizar os horários das actividades escolares e
das actividades desportivas para que os jovens jogadores tenham oportunidade
de obter sucesso nos dois processos de formação.
“A lei do estatuto de alta competição prevê medidas de apoio ao nível do
regime escolar e do acesso a formação superior, especializada e profissional.
Todavia, o tempo despendido nos treinos e competições e nas respectivas
deslocações fazem com que essas medidas, como por exemplo, a relevação
de faltas e a alteração de provas de avaliação, pouco beneficiem os jovens
jogadores” (Maria Carvalho, 2002: 77). Concordamos com esta autora quando
afirma que “é tempo de equacionar novas formas de enquadramento da vida
destes praticantes desportivos” (Maria Carvalho, 2002: 77).
Assim, e no sentido de promover uma melhor conciliação entre as duas
actividades, “os programas desportivos em alguns países têm vindo a
desenvolver modelos de organização pedagógica baseados em parcerias com
escolas, sendo que escolas, clubes e federações, assumem compromissos
bem definidos nesses programas” (Marques, 1999, in José Carvalho, 2002: 47).
Alguns clubes em Portugal parecem ter adoptado medidas idênticas.
Segundo Mil Homens (2004: 6), director-geral do Futebol de Formação e da
Academia do Sporting Clube de Portugal, “o principal objectivo é formar
homens que possam vir a integrar a equipa principal, mas sem esquecer o
desenvolvimento pessoal e social dos jovens”. Desta forma, este clube criou
um curso técnico-profissional para os jovens jogadores que vivem em regime
18
Revisão da Literatura

de internato. O Sporting Clube de Portugal conta ainda com um gabinete
psicopedagógico constituído por uma professora e por uma psicóloga que têm
como tarefa o acompanhamento escolar de todos os jovens jogadores.
Para incentivar os jovens jogadores nas suas tarefas escolares foi criado
“um quadro de honra, que premeia três jovens por ano avaliando os seguintes
comportamentos: área escolar (assiduidade e avaliação académica) e área
desportiva (fair-play, assiduidade/pontualidade, comportamento nos balneários
e atitude/comportamento nos treinos)” (O Jogo, 2004: 6).
No Futebol Clube do Porto, segundo José Carvalho (2002: 26), também
parece haver essa preocupação. Este autor realizou um estudo de forma a
fundamentar a necessidade da criação de uma estrutura específica (Centro de
Formação) de apoio à formação de jogadores de futebol no Futebol Clube do
Porto. O objectivo deste centro, em termos escolares, será o de “fornecer
dentro da estrutura do próprio clube, uma alternativa à formação tradicional,
com vista ao prosseguimento de estudos. Através desta alternativa, os
problemas relacionados com a conciliação de horários escolares com os
horários dos treinos, o tempo gasto no transporte da escola para o local do
treino e a rentabilização dos espaços de treino seriam ultrapassados. Por outro
lado, um currículo mais ajustado às características e necessidades desta
população poderá favorecer uma maior motivação, evitando o abandono
escolar precoce”.
Nos grandes clubes europeus a formação académica e escolar e a
preocupação com a formação integral parecem ser aspectos fundamentais.
No Real Madrid há “a preocupação com a formação académica dos jovens
sendo necessário apontar a formação dos jovens para a formação integral”
(Valdano, 2002: 20). Inclusivamente, “este clube organizou um evento intitulado
«Jornadas de Orientação Professional» direccionado para os jogadores do
Departamento de Formação e para os pais dos mesmos. Este acontecimento
teve a presença de antigos jogadores de futebol e de basquetebol do clube
(Sanchis, Emilio Butragueño, Vicente Ramos e José Manuel Beirán) que
transmitiram o seu testemunho relativamente à compatibilização da prática
desportiva com os estudos universitários. Posteriormente, outros temas foram

19
Revisão da Literatura

abordados,

como

por

exemplo,

as

saídas

profissionais

dos

cursos

universitários” (Palomino, 2002).
No Ajax, os maus resultados na escola têm implicações ao nível do clube.
Segundo Blind (2004: 23), “os jovens jogadores para se tornarem talentos têm
de aplicar o mesmo carácter quer no clube quer na escola. Daí que, quando as
classificações escolares descem, os responsáveis do clube se dirijam aos pais
e a titularidade na equipa passa a ser muito difícil de concretizar. Mais de
metade dos jogadores do Ajax concluem o secundário e iniciam os estudos
universitários”.
Concluindo, verificamos que a formação escolar e académica são
instrumentos úteis para todos os jovens jogadores mesmo para a sua
actividade futebolística e que os clubes de maior renome nacional e
internacional não descuram esta vertente da vida social dos seus jogadores.

2.4. A

PROCURA DE IDENTIDADE ATRAVÉS DA IMPLEMENTAÇÃO DE
UMA FILOSOFIA DE CLUBE E DE UM MODELO DE FORMAÇÃO
“A formação tem de ser a base dos plantéis [das equipas profissionais]”.
Giráldez (2002)
"Um treinador de um clube como este [Futebol Clube do Porto] não pode viver dissociado daquilo que é o futebolformação".
Mourinho (2002a: 15)
“Desde o primeiro dia que um jogador pode ver o que é o Ajax. A Academia é fantástica, porque as crianças crescem e
aprendem as coisas à maneira do Ajax!”.
Koeman (s/d)

Para que a formação tenha uma lógica coerente e racional parece-nos
fundamental que todo o processo seja norteado por objectivos bem definidos e
que estes se possam espelhar em todas as equipas do Departamento. Assim,
torna-se necessário promover “o estabelecimento de um conjunto de linhas
gerais e específicas que procuram direccionar e orientar a trajectória da
organização do mesmo” (Leal & Quinta, 2001: 27), ou seja, um modelo de
clube/filosofia de clube.
Faria (2003: LXXVIII) é da mesma opinião referindo que “um projecto de
formação é ter a definição de um conjunto de características que se pretende

20
Revisão da Literatura

que esses jogadores quando formados possuam. Portanto, tem a ver com algo
que tem de estar definido a nível estrutural no clube”. Isto porque, como
afirmam Leal & Quinta (2001: 28) “parece-nos difícil conceber que ao longo do
processo de formação sejam escolhidos determinados jogadores em
detrimento de outros, sem que haja uma definição das características do
jogador que se pretende, tendo em conta as exigências do modelo de jogo do
clube”.
Desta forma, “o ponto referencial de qualquer clube no que respeita à
formação deve ser alicerçado numa filosofia que contemple a existência de um
modelo de jogo, o qual, por sua vez, orientará a concepção de um modelo de
treino, de um complexo de exercícios, de um modelo de jogador e mesmo de
um modelo de treinador” (Leal & Quinta, 2001: 27).
Vale (2003a: LXXVIII) refere o caso do Futebol Clube do Porto. Segundo
este autor, “a formação num clube deve nortear-se por princípios bem sólidos e
se alguma coisa mudar devem mudar as pessoas, mas não devem mudar os
princípios que são aquilo que caracterizam e que são a identidade de um
clube”. Conforme o mesmo “o Futebol Clube do Porto tem uma cultura
desportiva muito própria e os jogadores têm de a entender. O clube rege-se por
valores próprios, desportivamente tem uma forma de jogar. É uma forma de
jogar do Futebol Clube do Porto e de mais ninguém” (Vale, 2004: 16).
Esta forma de trabalhar levará a que todos os intervenientes do processo de
formação assimilem ao longo do tempo uma forma de treinar e de jogar,
criando uma noção de identidade.

2.4.1. A forma de jogar e de treinar da equipa principal como
referencial fundamental do Departamento de Formação
Pensamos que o grande referencial para a implementação de um modelo
de clube ou modelo de formação passa pelo estabelecimento de um modelo de
jogo comum a todos os escalões de formação. Esta forma de trabalhar
implicaria que “todos se direccionassem no mesmo sentido e que os jogadores
se confrontassem todos os dias com uma determinada lógica. É óbvio que esse
modelo é a referência que faz com que nas diversas etapas de formação não

21
Revisão da Literatura

aconteçam coisas distintas, isto porque as ideias são comuns e os princípios
são os mesmos” (Faria, 2003: LXXXVIII). E esse referencial tem de ser o
“referencial máximo que é aquilo que se faz no topo que é a equipa principal de
um clube” (Vale, 2003a: LXXIII), pois o objectivo final da formação dos jovens
jogadores passa pela integração na equipa sénior.
Da mesma opinião, Leal & Quinta (2001: 41) afirmam que “a formação com
base na existência de um modelo de jogo vai permitir ao jovem jogador estar
rotinado numa forma de jogar e desenvolver características definidas, que lhe
permitirão, com mais possibilidades de sucesso, integrar a equipa sénior. Para
isso é importante que o modelo de jogo implantado no departamento juvenil
tenha como referência o modelo da equipa sénior porque é para esta que se
pretende formar o jogador”.
Caso o modelo de jogo do Departamento de Formação não corresponda ao
modelo de jogo da equipa principal “corre-se o risco de se estar a formar
jogadores com características diferentes daquelas que são exigidas pela
equipa sénior o que torna mais difícil a integração e aproveitamento dos
jogadores oriundos dos escalões de formação” (Leal & Quinta, 2001: 41). Ou
seja, tem de haver uma similaridade de processos ao nível do treino e do jogo
entre a equipa principal e as equipas do Departamento de Formação.
Tendo em linha de conta o anteriormente enunciado, parece-nos mais
coerente que os critérios da contratação do treinador principal da equipa sénior
do clube tenham como principal referencial a filosofia do clube e,
nomeadamente, o modelo de jogo adoptado para a formação. De acordo com
Vale (2003a: LXXIX), “a partir do momento que existe um modelo de jogo, uma
filosofia de formação, uma cultura desportiva, julgamos que seria impensável
as pessoas não pensarem no tipo de treinador que vão escolher”. Guilherme
Oliveira (2003: XXIV) é da mesma opinião referindo que se “um clube tem um
modelo de jogo para a formação deve contratar um treinador cujas ideias são
em função desse modelo de jogo”.
Assim, parece-nos fundamental que a escolha do treinador da equipa
principal deve ter em linha de conta a filosofia do clube para que não se

22
Revisão da Literatura

verifique um desfasamento entre o que é exigido nas equipas do Departamento
de Formação e na equipa sénior.

2.4.2. Formar jogadores tacticamente cultos e multifuncionais
A realidade do futebol Português mostra-nos que “o cargo de treinador
principal de uma equipa profissional de futebol faz parte de uma estrutura muito
volátil” (Paul, 2003: XXVIII), isto porque “está dependente dos resultados, e
está permanentemente exposto à comunicação social e ao público” (Camacho,
in Alves, 2004: 169).
Desta forma, “se não existir uma política de clube relativamente à
contratação do treinador sénior que vá de encontro com aspectos fundamentais
do próprio clube, há a necessidade então que o Departamento de Formação
tenha um modelo de jogo que considere ajustado à evolução dos jogadores de
forma a potenciar esses jogadores” (Guilherme Oliveira, 2003: XXXIII). Isto
porque, não nos parece coerente confrontar “os jovens jogadores com a
necessidade de ano após ano lhe serem exigidos comportamentos
completamente diferentes e em determinadas alturas mesmo antagónicos
estamos a limitar completamente as suas capacidades e a sua evolução em
toda a plenitude” (Guilherme Oliveira, 2003: XXXIII).
Desta forma concordamos com Camacho (in Alves, 2004: 86) quando
afirma que “um clube não pode depender de um treinador da equipa principal
que pode mudar todos os anos e pode mesmo ter uma filosofia diferente da do
clube. Um clube não pode ficar dependente das posições efémeras do seu
treinador principal, tem de ter uma estratégia própria”.
Paul (2003: XXVIII) é da mesma opinião afirmando que “não faz sentido que
a formação esteja constantemente a adaptar-se ao que se passa na equipa A.
O que faz sentido é que nós sejamos capazes de formar jogadores aptos para
se adaptarem a qualquer modelo ou qualquer sistema, isso sim faz sentido”.
Na realidade, parece-nos que o mais importante é que o processo educativo
na formação do jogador consiga alcançar “a formação de um jogador
inteligente, capaz de agir por ele próprio, utilizando os seus conhecimentos e
as suas experiências” (Bayer, 1994, in Leandro, 2003: 3).

23
Revisão da Literatura

Independentemente das mudanças na equipa sénior, o Departamento de
Formação deverá promover a estabilidade do projecto e formar jogadores
inteligentes com grande capacidade de adaptação a diversos modelos de jogo.
Vale (2003a: LXXIX) afirma que no Futebol Clube do Porto o objectivo não
passa somente por “formar jogadores para a equipa principal, mas jogadores
que sejam capazes de se adaptar a qualquer modelo de jogo. Porque achamos
que se dotarmos os nossos jogadores de grande riqueza do ponto de vista
táctico-técnico, eles têm condições para jogarem em qualquer modelo, em
qualquer um dos futebóis que se joga por esse mundo fora e esse é o nosso
grande objectivo”.
Mourinho (2002a: 22) afirma que “cada vez mais os jogadores de primeira
linha têm de ser multifuncionais”. Este treinador afirma mesmo que “não pode
ter um jogador no seu plantel que só sabe jogar no seu modelo de jogo, porque
no final do seu vínculo contratual vem outro treinador que, eventualmente, joga
num modelo diametralmente oposto, e os jogadores têm de se adaptarem a um
novo modelo. Assim, todos temos de nos adaptar a diversas funções, diversas
filosofias, diversos sistemas” (Mourinho, 2002a: 22), ou seja, os jogadores têm
de possuir uma cultura táctica que lhes permita desempenhar diversas funções
independentemente do modelo de jogo adoptado.
Pensamos que o processo de formação deve proporcionar ao jovem
jogador a aquisição de uma vasta cultura táctica de forma a adquirir uma maior
capacidade de adaptação aos diversos modelos de jogo que, certamente,
encontrará ao longo da sua carreira.

24
Revisão da Literatura

2.4.3. Corpo técnico deve estar identificado com o modelo de
jogo
“É cada vez mais importante este clube ter um documento com uma ideia, uma filosofia orientadora de todo esse
processo”.
Mourinho (2002a: 15)
“Porque o futebol é um jogo, pode-se ganhar ou perder. [As pessoas] Deveriam, antes, preocupar-se sobre se trabalho
bem ou mal”.
Camacho (2003a: 51)
"O homem mais importante num clube é o treinador. É quem decide, orienta, planeia e desenvolve um projecto".
Jacquet (2003: 79)

Para que haja uma linha de coerência em todo o processo de formação, “os
técnicos envolvidos num projecto de formação devem possuir uma concepção
unitária quer de clube, quer de jogo, quer de treino, quer do próprio modelo de
jogador a formar. Unificar os critérios dos diferentes treinadores dos diferentes
escalões é eliminar a possibilidade de conflitos perturbadores da normal
evolução do jovem jogador” (Leal & Quinta, 2001: 48). Isto não deverá implicar
restrições ao nível da criatividade individual dos treinadores limitando a
evolução dos mesmos. No entanto, parece-nos uma medida essencial, porque
permitirá uma harmonização das ideias acerca do modelo de jogo adoptado
fazendo com que todos tomem a mesma direcção dando continuidade e
identidade ao trabalho realizado independentemente do escalão em que o
jovem jogador se encontre.
Faria (2003: XCI) é da mesma opinião afirmando que “o importante é definir
um perfil, de forma a encontrar a ligação com uma determinada forma de
trabalhar e de treinar que permita operacionalizar as ideias fundamentais do
modelo”.
Para Vale (2003a: LXXIX) o mais importante num grupo de treinadores de
um Departamento de Formação é que estes “funcionem no mesmo
comprimento de onda, que a linguagem seja a mesma sobre as questões
fundamentais. Depois é fundamental levarem à prática aquilo que definem do
ponto de vista teórico”.
Outro aspecto importante é a formação contínua dos treinadores, mas
sendo esta promovida pelos próprios clubes. Esta medida teria como objectivo
25
Revisão da Literatura

principal “fazer com que os treinadores se identifiquem com uma determinada
forma de trabalhar” (Leal & Quinta, 2001: 48). O Coordenador Técnico poderá
assumir um papel fundamental a este nível fomentando este género de
iniciativas.
Segundo Giráldez (2002), “o Real Madrid forma os seus próprios técnicos
através de sessões onde se explicam e clarificam um conjunto de conceitos,
isto também tendo em vista a unificação de critérios dos treinadores”. Ou seja,
indo de encontro à identidade que se pretende instituir no clube.
O Sporting Clube de Portugal tem igualmente esta preocupação. Segundo
Mil Homens (2004: 6), “este clube também promove a formação dos seus
próprios técnicos através das Jornadas Técnicas da Academia onde é
abordado um conjunto de temas ministrados por técnicos do próprio clube ou
por técnicos de outros clubes, entre os quais Manchester United, Nantes e Real
Madrid”.
Um outro passo essencial para a unificação dos critérios e para uma melhor
identificação e entendimento do modelo de jogo e do modelo de treino é a
sistematização do pretendido em documento.
Segundo Mourinho (in Lourenço, 2003: 121) “um documento deste tipo é
extremamente importante porque é orientador de um processo” tendo como
objectivo “definir o modelo de jogo com que me identifico assim como os
respectivos princípios inerentes ao mesmo” e dar a conhecer a “todos os
técnicos do clube objectivamente as ideias chave que lideram todo o processo
de construção da equipa e assim possa objectivar o trabalho de formação de
jogadores compatíveis com as nossas necessidades” (Mourinho, 2003a: 19).
Com a elaboração deste documento verificar-se-á mais facilmente uma
identidade ao nível do treino e do jogo e em função do pretendido na equipa
sénior do clube ou do projecto de formação.
Posteriormente, é necessário encontrar dentro da estrutura do clube
pessoas capazes de em conjunto com o treinador principal controlar o processo
de

formação,

nomeadamente,

o

Coordenador

Técnico,

para

operacionalização do documento seja a mais aproximada possível.

26

que

a
Revisão da Literatura

2.4.4. Dificuldades na implementação do modelo de clube
São várias as dificuldades identificadas na implementação do modelo de
clube:
A não estabilização de uma estrutura directiva (Leal & Quinta, 2001);
Pouca estabilidade do treinador da equipa principal (Faria, 2003; Leal &
Quinta, 2001; Graça, in Vieira, 2004; Paul, in Vieira, 2004; Vale, in
Vieira, 2004);
Inexistência de qualquer projecto bem elaborado com regras bem
definidas (Faria, 2003);
A formação dos treinadores, a necessidade de se identificarem com um
determinado projecto e a capacidade de operacionalização condizente
com esse projecto (Faria, 2003);
O não estabelecimento de objectivos a médio e a longo prazo (Leal &
Quinta, 2001).
Todos estes factores dificultam a implementação de um projecto
direccionado para a formação.
De acordo com Guilherme Oliveira (2003: XXIV) “a estabilidade do treinador
e a política do clube deve passar por uma definição de um processo de
formação em que o modelo de jogo deve ser um dos aspectos fundamentais. E
isto tem de pertencer a uma política de clube. O clube tem de achar que isto é
importante e fazer disso um dos aspectos fundamentais da formação. Quando
um clube não tem pessoas que sejam sensíveis a este aspecto, muito
dificilmente será possível que o modelo de jogo seja implementado”. Ou seja,
tem de se desenvolver entre os diversos responsáveis do clube uma crença no
desenvolvimento do projecto para que este resulte. Neste aspecto, o
Coordenador Técnico pode desenvolver um papel fundamental como
responsável pela unificação dos critérios e verificação do cumprimento dos
mesmos.

27
Revisão da Literatura

2.4.5. Ajax: a escola de formação de referência
“Nunca nos podemos dar por satisfeitos e manter uma visão crítica de cada um de nós. Uma constante vontade para
evoluir. É este o princípio do Ajax e do Departamento de Formação do Ajax”.
Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 77)
"Um país não se mede pela dimensão das fronteiras, mas pelas ambições, valores e ideias”.
Queiroz (2003a: 10)
“A parte humana e atenção para o talento fazem do Ajax um grande clube”.
Adriaanse (2004: 21)

O Ajax é uma das melhores escolas formadoras de jogadores de futebol do
mundo, onde se formaram jogadores de renome internacional, tais como,
Johan Cruyff, Marco van Basten, Frank Rijkaard, Frank De Boer, Dennis
Bergkamp, Marc Overmars, Edgar Davids, Patrick Kluivert, Clarence Seedorf,
Edwin Van der Sar, e mais recentemente, os jovens jogadores Rafael Van der
Vaart e Van der Meyde.
A filosofia inviolável do Ajax está enraizada no clube desde os anos 30: “a
combinação de técnica, inteligência, personalidade e velocidade de execução
são melhor expressas de uma forma criativa, logo, com um futebol de ataque.
A filosofia do clube está acima de qualquer resultado: jogar um futebol ofensivo
e de risco, e não aceitar nada mais do que a expressão deste futebol no
terreno de jogo” (Kormelink & Seeverens, 1997: X).
Para fazer corresponder o processo de formação ao que é pretendido para
o jogo, o Departamento de Formação utiliza o acrónimo “TIPS” para descrever
os pontos fortes do jovem jogador do Ajax (Adriaanse, in Kormelink &
Seeverens, 1997: 63):
“T (“technique”), técnica: um jovem jogador do Ajax tem de ser
tecnicamente evoluído;
I (“intelligence” e “insight”), inteligência e perspicácia. Capacidade de
observar e de antecipar de forma a surpreender o adversário.
P (“personality”), personalidade. Um talento do Ajax terá de ser capaz de
comunicar com os outros, ser líder e criativo, demonstrar audácia, ser
receptivo aos seus companheiros de equipa e de trabalhar de forma
disciplinada.
28
Revisão da Literatura

S (“speed”), velocidade. Velocidade de marcação, de mobilidade, de
execução e velocidade em grandes distâncias”.
Desta forma, pretende-se que um jovem jogador do Ajax seja “tecnicamente
dotado, futebolisticamente inteligente, com personalidade interessante e com
boa velocidade” (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 64).
Segundo Adriaanse (1993: VI) o grande segredo da formação do Ajax está
no facto de “os nossos jogadores habituarem-se a jogar no nosso sistema
desde muito jovens. À medida que vão crescendo, vão melhorando as suas
capacidades para o lugar que lhes é destinado e quando tiverem 18 ou 19
anos, caso a equipa principal necessite deles, estão prontos, desde logo, a
integrarem-se sem estranharem diferenças na forma de jogar. Já sabem
perfeitamente quais as tarefas que têm de desempenhar”.
Por outro lado, também se defende a ideia de que “é necessário encontrar
jogadores multifuncionais. Eles têm de ter a capacidade de mudar de posições.
No futuro, não haverá lugar no futebol de alto rendimento para jogadores que
só sabem jogar numa posição” (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997:
65). Assim, dada a importância da universalidade, durante o processo de
Formação os jogadores jogam em duas ou três posições para além da posição
inicial para a qual foram seleccionados.
Outros factores de sucesso apontados por Adriaanse (1993: VII) são “a
forma de treinar em que se dá alta importância ao jogo enquanto meio de treino
e a manutenção das mesmas pessoas a trabalhar nos escalões de formação
de forma a perceberem melhor o clube e a sua mística que transmitem aos
mais novos”.
No Ajax não se descura a formação integral dos jovens jogadores. Segundo
Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 74), “o Ajax dá alta prioridade à
educação. No entanto, rejeitamos a ideia de colocar todos os jogadores na
mesma escola. É essencial para o desenvolvimento da personalidade das
crianças permitir o seu crescimento no seu meio, ou seja, com a sua família, na
sua rua, com os seus amigos e na sua escola”. É por esse motivo que “não
temos hotéis na academia. Assim, só os temos cá cerca de seis horas por dia”
(Holsheimer, 2004: 23).

29
Revisão da Literatura

Desta forma, “o clube estabeleceu protocolos entre o clube e as escolas
onde os jogadores estão matriculados que lhes permite frequentar a escola
com currículos e horários especiais. Assim, os jovens jogadores têm a
possibilidades de permanecer no clube entre as 13 e as 19 horas. Durante este
espaço de tempo, o clube é responsável por: uma refeição, um treino, um
tempo de estudo e pelo transporte escola/clube e clube/casa. Na estrutura do
clube, existem espaços próprios para o apoio escolar, onde estão colocados
um determinado número de professores, contratados pelo clube, que dão apoio
aos jogadores com dificuldades escolares e que os acompanham nas
deslocações compensando as aulas a que estes foram autorizados a faltar.
Cerca de 50 por cento dos jogadores do Centro de Formação concluem
estudos pré-universitários e alguns deles prosseguem um curso superior,
mesmo depois de integrados na equipa sénior” (A Bola, 1996: 20).
No interior do centro de treino “De Toekomst” (que significa em português
“O Futuro”) existe “uma lista de regras de disciplina que, caso não sejam
acatadas, podem, inclusivamente, levar à expulsão do clube” (Revista 10,
2004: 23). As regras principais são as seguintes: “nenhum jogador pode
participar em jogos de futsal; uma acção violenta ou anti-desportiva não
detectada pelo árbitro está sujeita a punição no interior do clube; não é
permitido usar brincos e cabelo comprido; o uso de caneleiras é obrigatório nos
treinos, para qualquer idade; as meias são obrigatoriamente puxadas para cima
e a camisola tem de estar por dentro dos calções; cada jogador é responsável
pela limpeza e manutenção das suas botas no final dos treinos; é proibida a
utilização de telemóveis” (A Bola, 1996: 20).
Assim, o sucesso do Ajax enquanto clube de formação parece estar
relacionado com uma filosofia de clube bem definida e instituída ao longo de
vários anos. Filosofia essa que tem em conta a formação futebolística e social
dos jovens jogadores – formação integral – e onde imperam regras rigorosas
de forma a criar jogadores disciplinados quer do ponto de vista táctico, quer do
ponto de vista social.

30
Revisão da Literatura

2.5. COORDENADOR TÉCNICO COMO
DE TODO O PROCESSO DE FORMAÇÃO

REGULADOR E DINAMIZADOR

“ [O Coordenador Técnico assume] uma tarefa importante e difícil”.
Mourinho (2002a: 15)

Na implementação de um Modelo de Clube/Modelo de Formação é
necessário que se verifique continuidade e similaridade de processos nos
diferentes escalões quer ao nível do treino, quer ao nível do jogo.
Mourinho (2002a: 15) é da mesma opinião ao afirmar que “um projecto de
formação quando é implementado torna-se fundamental que os treinadores das
camadas jovens saibam que direcção tomar e saibam de que maneira podem
colaborar com o futebol mais importante do clube, que é o futebol sénior. Tem
de haver uma similaridade nos processos todos e tem de haver um
acompanhamento diário do futebol de formação, para ver de que forma há, de
facto, similaridade entre o que se pretende e aquilo que é realizado”.
Assim, “é necessário que exista alguém que faça a interligação entre os
diversos departamentos, os diversos escalões e os diversos treinadores do
clube, uniformizando para isso critérios de selecção, de orientação e,
fundamentalmente, de acção” (Leal & Quinta, 2001: 49). Esse elemento deverá
ser o Coordenador Técnico (Leal & Quinta, 2001; Latorre, 2004).
Este cargo implica um grande conhecimento do funcionamento do clube e
de toda a sua filosofia. Daí que Mourinho (2002a:15) refira que “é importante
encontrar dentro da estrutura do clube pessoas capazes de estarem ao lado do
treinador principal no controlo desse processo de treino”. Adriaanse (1996: 21)
concorda com esta visão afirmando que “este cargo precisa de alguém
identificado com toda a filosofia do clube”.

2.5.1. Funções do Coordenador Técnico
Mourinho (2003e: 33) afirma que o Coordenador Técnico terá como
principal função realizar “a relação pedagógica e metodológica entre a rotina da
equipa principal e a rotina dos escalões de formação. Desta forma, este técnico
observará os treinos e dialogará com o treinador principal que forma a perceber
o que este último privilegia e o porquê de trabalhar de determinada forma”.
31
Revisão da Literatura

Posteriormente, a verificação da implantação do modelo de jogo é realizada
através da acção do Coordenador Técnico, que assiste a treinos e jogos das
diferentes equipas do Departamento de Formação (Adriaanse, in Kormelink &
Seeverens, 1997; Giráldez, 2003; Paul, 2003).
No entanto, as tarefas e funções do Coordenador Técnico ultrapassam as
questões estritamente relacionadas com o jogo e o treino propriamente ditos.
Segundo Giráldez (2002), “as funções do Coordenador Técnico do Real Madrid
estão relacionadas com a coordenação dos treinadores das equipas de
Formação, desde o Real Madrid B até aos Benjamins e com a coordenação de
todas as actividades diárias que existam na Cidade Desportiva das equipas de
Formação (treinos, formação de treinadores, comunicação com os pais,
eventos desportivos)”.
2.5.1.1. Comunicação com as equipas técnicas
Uma das tarefas fundamentais do Coordenador Técnico está relacionada
com a escolha dos treinadores do Departamento de Formação e com a
comunicação que estabelece com estes de forma a assegurar que todos
estejam bem informados e que todos se direccionem no mesmo sentido.
Desta forma, no Ajax o Coordenador Técnico realiza reuniões todas as
semanas com os treinadores e com os próprios directores de jogo (Adriaanse,
in Kormelink & Seeverens, 1997: 72): “Todas as semanas reúno-me com cada
treinador e observo cada equipa a jogar pelo menos uma vez em cada duas
semanas”. Ou seja, a comunicação entre os diferentes agentes dentro da
estrutura do próprio clube e a observação do trabalho das diferentes equipas
do Departamento de Formação por parte do Coordenador torna-se fundamental
para se verificar identidade.
Segundo Giráldez (2002), no Real Madrid esta preocupação também se
verifica: “com Jorge Valdano [director desportivo na altura] havia uma reunião
de direcção todas as semanas onde todos os treinadores expunham as
diversas situações ocorridas nos treinos e jogos. Com Vicente del Bosque
[treinador principal na altura] havia um diálogo muito directo”.
Assim, “o Coordenador Técnico do Clube deve harmonizar as expectativas
dos treinadores com os princípios e os objectivos propostos pelo clube, com o
32
Revisão da Literatura

fim de favorecer um trabalho em equipa e implicar ao máximo todos os agentes
educativos do clube no processo de formação integral do jogador de futebol. O
coordenador deve igualmente oferecer ideias contínuas de trabalho para
aumentar a qualidade dos treinadores. O trabalho em equipa determinará o
êxito do planeamento anual” (Latorre, 2004: 42).
2.5.1.2. Regulamento interno
Outra tarefa do Coordenador Técnico passa pelo estabelecimento e/ou
fazer cumprir do regulamento interno.
Este documento tem como objectivo, “através das situações tipificadas,
garantir a coerência desejável das atitudes e dos comportamentos dos jovens
jogadores” (Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense, 2002:
82).
Segundo

Adriaanse

(in

Kormelink

&

Seeverens,

1997:

66),

“o

comportamento em grupo é extremamente significante para o jovem jogador do
Ajax e isso significa que têm de aprender a ter consideração para com os
outros. Desta forma, estabeleci um conjunto de regras disciplinares às quais os
jogadores têm de aderir em absoluto. Acordos foram estabelecidos tendo em
vista o comportamento durante os jogos e os treinos. A disciplina não tem de
ser rígida, mas é essencial que as mesmas regras sejam aplicadas a todos os
níveis. Nem mesmo as regras de comportamento para a hora do almoço
podem diferir de uma equipa para outra. Daí a razão de colocar em documento
escrito o regulamento”.
Este mesmo princípio é seguido no Real Madrid, pois as regras de
comportamento “não conhecem privilégios seja qual for o jogador. As normas
dos treinos e dos jogos, nas concentrações servem para incutir nos jovens
jogadores o que significa representar o Real Madrid” (Giráldez, 2002). Ou seja,
pensamos que a cultura de clube incorpora um conjunto de valores e de
princípios que devem ser respeitado por todos e transmitido aos jovens
jogadores desde muito cedo. Isto permitirá fomentar “uma cultura distinta, não
só ligada a forma de jogar, mas, também, a um vasto sentimento próprio que
cada clube deve ter” (Neves, 2003: 37).

33
Revisão da Literatura

O estabelecimento de um regulamento interno torna-se fundamental de
forma a normalizar os comportamentos dos jovens jogadores e pelo
desenvolvimento de uma cultura específica do clube.
2.5.1.3. Comunicação com os Pais
A comunicação com os pais dos jogadores deverá também ela ser
assegurada pelo Coordenador Técnico.
No Ajax, este aspecto é considerado muito importante, pois “os pais devem
estar informados acerca do processo de formação dos seus filhos” (Adriaanse,
in Kormelink & Seeverens, 1997: 62).
Esta mesma preocupação verifica-se no Real Madrid: “os Pais são uma
figura vital para qualquer ser humano. E damos grande importância a este
facto, pois temos organizado reuniões periódicas com os pais dos jogadores
para trocarmos informações e adiantarmos os problemas que podem ter as
situações que ocorrem no processo de formação: quando um jovem jogador
chega ao clube, quando joga muito, quando não joga, quando deve abandonar
o clube, quando não vive em Madrid. São situações periódicas que se repetem
todos os anos” (Giráldez, 2002).
Desta forma, os Pais devem ser informados acerca do processo de
formação dos seus filhos e o Coordenador Técnico deverá assumir essa tarefa.
2.5.1.4. Outras tarefas
Para além das tarefas supracitadas, Latorre (2004: 35) sistematizou em dez
pontos um vasto conjunto de tarefas de coordenação:
1. “Criação de uma normativa interna geral.
2. Elaboração de organigrama técnico, horários, grupos de treino,
distribuição de espaços.
3. Organização de competições para os grupos de Escolas.
4. Formação dos técnicos.
5. Controlo dos técnicos.
5.1. Reuniões.
5.2. Mecanismos de controlo de planificação, controlo de conteúdos, de
sessões e tarefas de treino.
34
Revisão da Literatura

5.3. Desenvolvimento de sessões práticas conjuntas com base em
conteúdos táctico-técnico determinados.
5.4. Testes e sociogramas.
5.5. Assistência aos jogos.
6. Comunicação com os pais e encarregados de educação dos jogadores.
7. Organização de actividades de final de semestre e de curso.
8. Formação dos Directores de Equipa.
9. Trabalho multidisciplinar com outros agentes (médicos, massagistas,
enfermeiros, directores).
10. Autoformação”.
O Coordenador Técnico assume assim papel fundamental na construção de
todo o processo de formação sendo o regulador e o verificador da identidade
que se pretende instalar no clube ao nível do jogo, do treino e de todos os
comportamentos fora e dentro do terreno de jogo, sendo um elemento
essencial na dinamização desse mesmo processo.

35
Material e métodos

3. MATERIAL E MÉTODOS
3.1. CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA
A amostra é constituída por uma entrevista ao Mestre Pedro Sá,
Coordenador Técnico do Departamento de Formação do Clube Desportivo
Trofense.

3.2. METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO
A parte teórica deste trabalho sustentou-se numa pesquisa bibliográfica e
documental, de forma a seleccionar a informação pertinente para o estudo da
problemática seleccionada.
A nível prático, a metodologia utilizada na recolha dos dados consistiu numa
entrevista registada através de um gravador Mini-disc digital Sony MZ-NH900 e
a sua posterior transcrição para o papel com a devida autorização do
entrevistado.
É importante salientar que as questões eram abertas, de modo a que o
entrevistado pudesse expor os seus pontos de vista de uma forma clara e
pessoal. Posteriormente, as entrevistas foram transcritas para o programa
Microsoft Office Word 2003 do sistema operativo Windows XP Professional.

3.3. RECOLHA DE DADOS
A recolha de dados referente a este trabalho decorreu no dia 9 de
Novembro de 2005, na Escola Secundária da Trofa, sendo que posteriormente
tiveram lugar mais do que um encontro com o entrevistado para esclarecimento
de dúvidas.

36
Apresentação e análise da entrevista

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DA ENTREVISTA
Após a realização da revisão bibliográfica e da entrevista, será efectuada a
análise das respostas do entrevistado, no sentido de se comparar e discutir o
conteúdo das mesmas, tendo em vista os aspectos tratados na revisão
bibliográfica.

4.1. A

IMPORTÂNCIA FINANCEIRA, DESPORTIVA E
FORMAÇÃO PARA O CLUBE DESPORTIVO TROFENSE

SOCIAL

DA

“A nossa formação só faz sentido se formos capazes de a rentabilizar, se isso não acontecer, mais vale não termos
formação”.
Paul (2003: XXVII)
“A melhor e única forma de preparar e antecipar o futuro é cuidar da preparação dos jovens que estão no clube.
Assim sendo, teremos de encontrar as soluções para o presente, mas preparando o futuro deste clube”.
Queiroz (2003b)
“Esta direcção deixou bem claro que, desde que cheguei ao clube, a essência madridista devia estar presente no seu
projecto e que a sua essência é a formação. Quando chegamos seis jogadores estavam na primeira equipa; hoje estão
treze. Acredito neste modelo, que é arriscado, mas estamos convencidos que vai dar resultados”.
Butragueño (2004)

A formação no Clube Desportivo Trofense tem, segundo Sá, “uma
importância vital, porque está a formar jogadores para o plantel sénior do
clube”. Esta visão sobre a formação parece estar condizente com a revisão
bibliográfica por nós efectuada.
Como afirma Frade (2002, in Vieira, 2004: 26), “a formação é a base do
futebol profissional, por isso tem de haver uma preocupação elevada com ela”.
Giraldez (2002) é da mesma opinião afirmando que “a formação tem de ser a
base dos plantéis [das equipas profissionais]”.
Desta forma, clubes como o Ajax (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens,
1997) e o Sport Lisboa e Benfica (Carraça, 2005b) definiram como objectivo a
integração de, pelo menos, 3 jogadores por época desportiva no plantel sénior,
tal como no Clube Desportivo Trofense (Sá).
Segundo Sá, o plantel sénior do Clube Desportivo Trofense tem 10 jovens
jogadores que realizaram a sua formação no Departamento de Formação do

37
Apresentação e análise da entrevista

clube,

sendo

que,

neste

momento,

5

desses

jogadores

competem

regularmente.
Neves (2003: 34) reitera que nos clubes do seu estudo (Futebol Clube do
Porto, Vitória de Guimarães, Sporting Clube de Portugal, Celta de Vigo e Real
Madrid) “os escalões de formação têm objectivos muito claros, que se prendem
com a formação de jogadores de qualidade, para que possam competir na
equipa mais representativa do clube, ou melhor na sua equipa de elite”.
Desta forma, poderemos afirmar que o Clube Desportivo Trofense investe
na formação, nomeadamente, através da integração de jovens jogadores no
plantel sénior e da sua participação regular na competição em que o clube está
enquadrado. Este procedimento parece estar de acordo com a revisão
bibliográfica realizada.

4.1.1. Vantagens da integração de jovens jogadores formados
no Departamento de Formação no plantel sénior do clube
A integração de jovens jogadores vindos do Departamento de Formação no
plantel sénior arrasta consigo um conjunto de vantagens muito importantes
para o Clube Desportivo Trofense. Por um lado, faz com que o clube não
necessite de recorrer exclusivamente ao mercado para comprar jogadores, pois
o clube já forma os seus próprios jogadores, poupando com isso dinheiro.
Segundo Giraldez (in Neves, 2003: 36), “no momento actual de crise
financeira, os clubes, também por esta razão, têm que olhar para a formação
como uma via muito válida na tentativa de resolver os seus problemas
económicos. Neste momento, os clubes têm de pensar em ser autosuficientes”.
De acordo com Paul (in Neves, 2003: 36) “em termos de salário, um jogador
formado no clube, normalmente, aufere um vencimento inferior a um que foi
contratado, permitindo ao clube poupar financeiramente na remuneração e nos
custos que a compra de um jogador acarreta”.
Assim, a vantagem financeira é umas das vantagens apontadas por Sá para
a integração de jovens jogadores formados no clube no plantel sénior do Clube
Desportivo Trofense.

38
Apresentação e análise da entrevista

Para Paul (in Neves, 2003: 36) “outra forma de rentabilizar a formação é
vender jogadores vindos das categorias inferiores, que têm custo zero e a sua
venda vai implicar um lucro de 100%”. De acordo com Sá, essa é, também, a
perspectiva do Clube Desportivo Trofense, pois “qualquer processo de
formação seria muito limitador se só tivesse como objectivo o quadro sénior do
próprio clube. Aquilo que pensamos é que se for possível que os nossos
jogadores sejam desejados por outros clubes a meio ou no final no processo de
formação tanto melhor para nós”.
O investimento na formação para além das vantagens financeiras tem,
também, vantagens desportivas: o clube já conhece os jogadores e os
jogadores já conhecem os seus responsáveis e aquilo que vão exigir deles.
Segundo Mathé (2003), um jogador que sai das camadas jovens está sempre
mais identificado com a equipa, a instituição, as cores, a história e os de mais
valores que não deveriam perder-se. Sá segue a mesma linha de pensamento
afirmando que os jogadores formados no clube desenvolvem um sentimento
diferente de identificação com o clube, tendo mesmo por objectivo a
constituição maioritária do plantel sénior com jogadores da terra.
O entrevistado apontou, também, a formação como importante devido a
razões sociais. Segundo Sá, o Clube Desportivo Trofense cumpre a prestação
de um serviço público, pois permite que dezenas de jovens da terra tenham a
oportunidade de praticar uma modalidade que gostam num enquadramento
direccionado para a qualidade. Mathé (2003) vai ao encontro desta perspectiva
afirmando que os clubes com os seus escalões de formação devem cumprir,
também, uma função socialmente importante, que é a de permitir aos jovens
praticarem desporto com boas condições.
É possível, então, constatar que a formação é fundamental no Clube
Desportivo Trofense, verificando-se vantagens financeiras, desportivas e
sociais com este procedimento, estando em sintonia com a revisão bibliográfica
efectuada.

39
Apresentação e análise da entrevista

4.2. PROJECTO

DE FORMAÇÃO: A CONTINUIDADE COMO PRINCÍPIO

FUNDAMENTAL
“Continuidade é particularmente importante na formação. Agora estou mais concentrado no planeamento a longo
prazo”.
Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 61)
“Uma Academia como a nossa faz um trabalho de longo prazo”.
Mil-Homens (2003)
“A continuidade é o ponto mais importante em qualquer negócio. Porque seria o futebol diferente? Não é num ano que
se constrói o sucesso.”.
Kenyon (2004: 25)

O entrevistado definiu três aspectos fundamentais para se construir um
processo de formação de qualidade. Primeiro, as pessoas, pois, de acordo com
o mesmo, aquilo que dá corpo a um projecto de qualidade são as pessoas
estando

a

referir-se

aos

jogadores,

treinadores,

directores,

pais

e

espectadores. Em segundo, as condições de trabalho, porque sem campos e
sem bolas não se pode treinar, nem jogar, e quanto mais e melhores forem
essas condições, melhor se poderá conduzir o processo. Por último, a
existência de um projecto de formação, pois, segundo o entrevistado, é
necessário definir uma série de princípios e de referências que norteiem as
decisões a tomar por parte de todos os intervenientes no projecto. Caso
contrário, segundo o mesmo, será problemático.
Esta perspectiva de Sá parece estar de acordo com Garganta (1990, in Leal
& Quinta, 2001: 21) que aponta a formação de treinadores, dirigentes e pais, a
existência de estruturas materiais, humanas e financeiras e um trabalho
primado pelo rigor e pela organização, como fundamentais para elevar o
estatuto do futebol praticado pelos mais novos.
Faria (2003: LXXXVIII) é da opinião de que “a formação só é importante se
estiver definido um projecto de formação”. Carraça (2005a: 46) afirma que
aceitou o cargo de gestor para a área da formação do Sport Lisboa e Benfica
com o objectivo prioritário de “organizar um trabalho estruturado, concertado e
qualificado que possa potenciar, todos os anos, dois ou três jogadores para a
equipa principal”.

40
Apresentação e análise da entrevista

Desta forma, podemos afirmar que a posição de Sá relativamente aos
aspectos fundamentais para a construção de um processo de formação de
qualidade vão ao encontro da revisão bibliográfica.

4.2.1. A filosofia de clube como ideal de difícil concretização
Na revisão bibliográfica por nós realizada verificamos que a implementação
de uma filosofia de clube/modelo de clube, entendida como um conjunto de
linhas gerais e específicas que procuram direccionar e orientar a trajectória da
organização do mesmo, seria a melhor forma de trabalhar. Tendo por objectivo
a integração de jovens jogadores formados no Departamento de Formação no
plantel sénior dos respectivos clubes, o referencial para a implementação de
um modelo de clube passa pelo estabelecimento de um modelo de jogo comum
a todos os escalões de formação e que este fosse de encontro ao modelo de
jogo dos seniores.
Sá concorda com esta perspectiva. A implementação de uma filosofia de
clube/modelo de clube seria o ideal para se poder verificar continuidade de
processos, entendendo-se por filosofia de clube/modelo de clube como um
conjunto de princípios de actuação que têm de estar bem discriminados e
descritos e tendo de haver coerência nesses mesmo princípios.
Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 72) dá o exemplo do Ajax: “o
ponto de partida é o jogo e a base é o sistema de jogo do Ajax, o qual percorre
todos os escalões do clube. Esta é uma das nossas maiores diferenças em
relação aos outros clubes”.
No entanto, e segundo Sá, “o problema é que actualmente no nosso clube e
penso que nos demais não está implementada essa tal filosofia de clube, algo
que oriente a trajectória do clube durante algum tempo. E dado o contexto
actual o que é que acontece? A meio da época a equipa sénior não está a ter
resultados e inevitavelmente, ou tem sido a regra geral, o treinador vai embora.
Ora, vindo outro treinador e o clube não tendo essa filosofia de clube
implementada, ou seja, não dizendo do treinador para aquilo que ele vem, ele
chega cá e altera tudo”. Assim, não há garantia de continuidade de processos.

41
Apresentação e análise da entrevista

Perante este contexto, Paul (2003: XXVIII) defende que “não faz sentido
que a formação esteja constantemente a adaptar-se ao que se passa na
equipa A”. Camacho (in Alves, 2004: 86) é da mesma opinião afirmando que
“um clube não pode depender de um treinador da equipa principal que pode
mudar todos os anos e pode mesmo ter uma filosofia diferente da do clube. Um
clube não pode ficar dependente das posições efémeras do seu treinador
principal, tem de ter uma estratégia própria”. Segundo Carraça (2005b: 13), no
novo projecto para a formação do Sport, Lisboa e Benfica, “os modelos eleitos
para o trabalho na área da formação não estão dependentes das mudanças de
treinador da equipa principal”.
Mediante o exposto, parece-nos coerente a decisão de realizar um Projecto
de Formação no Clube Desportivo Trofense independente das opções do
treinador principal da equipa sénior. Ou seja, o Projecto de Formação é
autónomo do Departamento Sénior do clube. Pensamos que essa decisão vai
ao encontro das opiniões encontradas na revisão bibliográfica.

4.2.2. O Projecto de Formação como solução de continuidade
Dado o contexto actual, segundo Sá, o Departamento de Formação não
pode estar constantemente a alterar a sua filosofia em função das alterações
de treinador principal da equipa sénior. Esta perspectiva parece condizente
com a revisão bibliográfica.
Na opinião de Sá, “os projectos de formação, se são de formação, vão
demorar tempo o que significa que os seus responsáveis poderão não ser
sempre os mesmos ao longo do tempo. Portanto, o clube precisa de garantir
uma certa continuidade de processos para que haja formação”. Segundo Vale
(2003a: LXXVIII), “a formação num clube deve nortear-se por princípios bem
sólidos e, se alguma coisa mudar, devem mudar as pessoas, mas não devem
mudar os princípios que são aquilo que caracterizam e que são a identidade de
um clube”. Segundo Sá, “o processo é longo, portanto, é preciso uma certa
garantia de futuro. A garantia de futuro é dada através desses projectos”.
Assim, e segundo Sá, as linhas orientadoras do projecto de formação
passam por: um modelo de jogo adoptado comum para todos os escalões; um

42
Apresentação e análise da entrevista

modelo de treino adoptado comum para todos os escalões; conjunto alargado
de equipas em competição; e, a escolha de treinadores com espírito crítico
muito forte, dinâmicos, empreendedores e sempre disponíveis para aprender.
De acordo com Faria (2003: LXXXVIII), “a formação é importante se tiver
critérios de formação e se tiver, obviamente, objectivos concretos. Um projecto
de formação é ter a definição de um conjunto de características que se
pretende que esses jogadores quando formados possuam”.
Ao fim de 4 anos de implementação do Projecto de Formação, este parece
já estar a dar os seus frutos. De acordo com Sá, no Departamento de
Formação do Clube Desportivo Trofense “no que diz respeito aos treinadores,
jogadores e directores há um modo de proceder que está descrito e é evidente,
e, porque já tem algum tempo, já é cultural. Quando os problemas surgem,
quando é preciso tomar uma decisão, está inerente a filosofia do departamento.
Porque toda a gente conhece e reconhece essa filosofia, quer através de
documentos escritos, quer através de uma certa cultura que já está
implementada”.

4.2.3. Identidade ao nível de treino e de jogo ao longo do
processo de formação
Mediante a revisão bibliográfica podemos constatar que “o ponto referencial
de qualquer clube no que respeita à formação deve ser alicerçado numa
filosofia que contemple a existência de um modelo de jogo, o qual, por sua vez,
orientará a concepção de um modelo de treino, de um complexo de exercícios,
de um modelo de jogador e mesmo de um modelo de treinador” (Leal & Quinta,
2001: 27). E esse referencial para o Departamento de Formação deveria ser o
“referencial máximo que é aquilo que se faz no topo que é a equipa principal de
um clube” (Vale, 2003a: LXXIII). Segundo Adriaanse (1997, in Kormelink &
Seeverens: 72), “no Ajax os treinadores e os jogadores sabem exactamente
como é que a estrutura final deve ser: o sistema de jogo é totalmente familiar.
Os treinadores e os jogadores pensam o jogo a partir do sistema de jogo do
Ajax”.

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  • 1. UNIVERSIDADE DO PORTO Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física PROJECTO DE FORMAÇÃO EM FUTEBOL. UM PASSO IMPORTANTE PARA A CONSTRUÇÃO DE UM PROCESSO DE FORMAÇÃO DE QUALIDADE. Estudo realizado no Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense. Hélder Manuel Teixeira Lemos Dezembro de 2005
  • 2. UNIVERSIDADE DO PORTO Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física PROJECTO DE FORMAÇÃO EM FUTEBOL. UM PASSO IMPORTANTE PARA A CONSTRUÇÃO DE UM PROCESSO DE FORMAÇÃO DE QUALIDADE. Estudo realizado no Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense. Trabalho monográfico realizado no âmbito da disciplina de Seminário – Opção de Futebol do 5º ano da Licenciatura em Desporto e Educação Física, sob a orientação do Mestre José Guilherme Oliveira. Hélder Manuel Teixeira Lemos Dezembro de 2005
  • 3. “Não gosto do futebol dos estádios vazios, desconfortáveis e inseguros. Não gosto do futebol das ameaças e das chantagens. Não gosto dos dirigentes que têm a mania que mandam no país. Não gosto de ver os políticos de cócoras. Não gosto de ver leis atropeladas em razão de outros valores. Não gosto de um futebol sem ética. Não gosto do futebol impune. Não gosto de apelos e assomos à violência. Não gosto de ver desculpabilizado o doping. Não gosto de ver o árbitro como figura central do jogo. Não gosto de observar esta irritante mania de os jogadores se atirarem para o chão. Não gosto de ver treinadores sem pedagogia. Enfim, não gosto de um futebol em que se pretende ganhar a qualquer preço”. Rui Santos (2003: 20) “Treinar é tão importante como saber o que tenho para fazer”. Figo (1999: 43) “Estou convencido de que os jogadores não ganham os troféus de forma individual; os troféus ganham as equipas”. José Mourinho (2004b) "A formação de um jogador é uma história interminável”. Louis van Gaal (1996: 19)
  • 4. Agradecimentos AGRADECIMENTOS Este trabalho representa o culminar de um conjunto de experiências e vivências onde outras pessoas tornaram-se fundamentais para a realização do mesmo. Assim, aproveito este espaço para lhes prestar o meu agradecimento. Ao Professor Vítor Frade, pela sua sabedoria e pela forma apaixonada como comunica os seus conhecimentos que levaram à mudança da minha forma de pensar o futebol. Ao Professor José Guilherme, pelos seus ensinamentos e pela sua disponibilidade que permitiram enriquecer os meus conhecimentos e, consequentemente, este trabalho. Ao Pedro Sá pela positividade e conhecimentos transmitidos ao longo destes últimos dois anos e meio e, também, pela sua ajuda e disponibilidade para a participação neste trabalho. Ao Eugénio Cunha, pela amizade e pelo exemplo de vida que representa. Aos meus amigos e companheiros de faculdade, Tiago Leandro, José Tavares, Ana Luísa Campos, Bruno Guimarães, Daniela Godinho, Bruno Nogueira e Vera Diogo, pelo constante apoio e compreensão. A todos os jogadores com os quais convivi e que me fizeram crescer como pessoa. III
  • 5. Resumo RESUMO A formação é um aspecto fundamental para os clubes de futebol, pois pode representar um conjunto de vantagens financeiras, desportivas e sociais. Assim, o processo de formação deve ser orientado por objectivos e regras bem definidas, tendo por base um modelo de jogo, com o objectivo de formar jogadores multifuncionais e tacticamente cultos. Deste modo, no presente trabalho, procurou-se focar os aspectos supracitados através de uma revisão bibliográfica e a posterior confrontação com a informação obtida a partir da entrevista realizada ao Coordenador Técnico do Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense. Assim, a informação recolhida e seleccionada visou responder aos seguintes objectivos que orientaram este estudo: (1) verificar a importância da formação para o clube; (2) verificar que valores são transmitidos aos jovens jogadores do clube; (3) verificar a importância que os responsáveis técnicos atribuem à formação integral dos seus jogadores; (4) identificar os aspectos fundamentais para se obter um processo de formação de qualidade; (5) identificar as principais dificuldades na implementação do projecto de formação; (6) identificar as funções do Coordenador Técnico e a sua importância para a construção do processo de formação; e, (7) verificar que ligação existe entre o Departamento de Formação e o Departamento Sénior do clube. Com base na revisão bibliográfica e na entrevista realizada é possível afirmar: (1) a formação é um aspecto fundamental para o clube dado estar a promover jogadores para o plantel sénior; (2) a implementação de um Projecto de Formação é importante para se verificar continuidade de processos; (3) o processo de formação deve fomentar a cultura táctica e a formação integral dos seus jovens jogadores; e, (4) o Coordenador Técnico assume um papel fundamental, sendo o garante da implementação da filosofia do Projecto de Formação. Palavras-chave: – FUTEBOL – FORMAÇÃO – PROJECTO DE FORMAÇÃO – COORDENADOR TÉCNICO. IV
  • 6. Índice ÍNDICE AGRADECIMENTOS....................................................................... III RESUMO .........................................................................................IV ÍNDICE..............................................................................................V 1. INTRODUÇÃO ............................................................................. 1 2. REVISÃO DA LITERATURA........................................................ 4 2.1. A importância da formação. A formação como um meio de optimizar financeiramente os recursos humanos .............................4 2.1.1. O futebol como um factor económico ................................................................. 4 2.1.2. A formação como uma das soluções para a viabilidade económica dos clubes de futebol ............................................................................................................ 6 2.2. A necessidade de construir o processo de formação tendo como primado a organização de jogo sustentada por uma cultura de exigência, de vitória e de colectivo ..............................................9 2.2.1. Trabalho, disciplina, rigor.................................................................................. 10 2.2.2. Espírito ganhador, ambicioso e positivo ........................................................... 12 2.2.3. O clube, a equipa e o colectivo acima de tudo ................................................. 13 2.3. Da formação meramente futebolística à preocupação com a formação integral ............................................................................14 2.3.1. A importância da formação escolar e académica ............................................. 15 2.3.2. A relação Sistema Desportivo/Sistema Educativo............................................ 18 2.4. A procura de identidade através da implementação de uma filosofia de clube e de um modelo de formação .............................20 2.4.1. A forma de jogar e de treinar da equipa principal como referencial fundamental do Departamento de Formação ........................................................................ 21 2.4.2. Formar jogadores tacticamente cultos e multifuncionais .................................. 23 2.4.3. Corpo técnico deve estar identificado com o modelo de jogo .......................... 25 2.4.4. Dificuldades na implementação do modelo de clube........................................ 27 2.4.5. Ajax: a escola de formação de referência......................................................... 28 V
  • 7. Índice 2.5. Coordenador Técnico como regulador e dinamizador de todo o processo de Formação ...................................................................31 2.5.1. Funções do Coordenador Técnico.................................................................... 31 3. MATERIAL E MÉTODOS........................................................... 36 3.1. Caracterização da amostra......................................................36 3.2. Metodologia de investigação ...................................................36 3.3. Recolha de dados....................................................................36 4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DA ENTREVISTA .................... 37 4.1. A importância financeira, desportiva e social da formação para o Clube Desportivo Trofense ..........................................................37 4.1.1. Vantagens da integração de jovens jogadores formados no Departamento de Formação no plantel sénior do clube................................................................ 38 4.2. Projecto de formação: a continuidade como princípio fundamental ....................................................................................40 4.2.1. A filosofia de clube como ideal de difícil concretização .................................... 41 4.2.2. O Projecto de Formação como solução de continuidade ................................. 42 4.2.3. Identidade ao nível de treino e de jogo ao longo do processo de formação .... 43 4.2.4. Formar jogadores de qualidade ........................................................................ 45 4.2.5. Treinadores identificados com o Projecto de Formação................................... 50 4.2.6. Principais dificuldades encontradas na implementação do Projecto de Formação.......................................................................................................... 53 4.3. Coordenador Técnico como o garante do Projecto de Formação........................................................................................54 4.3.1. Funções do Coordenador Técnico do Clube Desportivo Trofense................... 54 5. CONCLUSÕES .......................................................................... 57 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................... 60 7. ANEXO....................................................................................... 66 VI
  • 8. Introdução 1. INTRODUÇÃO A formação de jovens jogadores por parte dos clubes de futebol pode representar um aspecto decisivo para o sucesso dos mesmos quer no plano desportivo, quer no plano financeiro. A integração de jovens jogadores nos planteis seniores dos respectivos clubes onde realizaram a sua formação leva a uma poupança ao nível financeiro. Pois, se o clube forma os seus próprios jogadores, acaba por não precisar de contratar jogadores a outros clubes, sendo que, na maioria dos casos, os jovens jogadores auferem ordenados muito inferiores a um jogador contratado. Por outro lado, os jovens jogadores já conhecem o clube onde trabalham, evitando a necessidade de períodos de adaptação à nova realidade que um jogador contratado teria de se confrontar. Como refere Adriaanse (1993: VII), no Ajax “nunca contratamos jogadores feitos: são mais caros e trazem vícios difíceis de emendar, pelo menos para jogarmos da forma que nós queremos”. Parece-nos urgente o investimento forte na formação de jovens jogadores de futebol, pois, como afirma Vale (2003b: XX), “a formação é um aspecto rentável. Penso que esta é a via para os clubes portugueses”. Contudo, a formação não pode ser uma formação qualquer, sendo primordial que esse processo esteja direccionado para a excelência. Isto porque a integração desses jovens jogadores no planteis sénior dos clubes está altamente dependente da qualidade dos próprios jogadores. Ou seja, o processo de formação tem de ser bem orientado e com objectivos bem definidos. A criação de Projectos de Formação é, desta forma, eminentemente importante para o estabelecimento de uma cultura desportiva, com princípios e regras coerentes e bem definidas, que tenha por base “um modelo de jogo que, por sua vez, orientará a concepção de um modelo de treino, de um complexo de exercícios, de um modelo de jogador e mesmo de um modelo de treinador” (Leal & Quinta, 2001: 27). 1
  • 9. Introdução Na perseguição desse objectivo, a partir da época desportiva 2002-2003 gerou-se no Clube Desportivo Trofense um contexto favorável ao desenvolvimento de um Projecto de Formação. A filosofia adoptada no Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense com a implementação deste novo projecto consiste numa “atitude competitiva constante baseada no rigor e no esforço individual para um elevado rendimento colectivo. Procura-se, assim, implementar uma forma de estar que conduza à aquisição e desenvolvimento de comportamentos de excelência futebolística nos jovens jogadores, contribuindo, igualmente, para a formação integral dos jovens nos seus mais elevados valores morais, cívicos e de urbanidade, bem como, no desenvolvimento das suas capacidades cognitivas” (Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense, 2002: 6). Actualmente, podemos encontrar no Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense: um modelo de jogo e uma metodologia de treino comuns a todos os escalões; um grupo de treinadores identificado com a filosofia do projecto; um documento orientador do processo; a integração de jovens jogadores na equipa sénior do clube formados neste Departamento de Formação; e, a existência de um Coordenador Técnico que regula e supervisiona todo o processo de formação. Este estudo surge como uma oportunidade para compreender mais aprofundadamente esta realidade. Desta forma estabelecemos como objectivos para o estudo: i. Verificar a importância da formação para o clube; ii. Verificar que valores são transmitidos aos jovens jogadores do clube; iii. Verificar a importância que os responsáveis técnicos atribuem à formação integral dos seus jogadores; iv. Identificar os aspectos fundamentais para se obter um processo de formação de qualidade; v. Identificar as principais dificuldades na implementação do projecto de formação; vi. Identificar as funções do Coordenador Técnico e a sua importância para a construção do processo de formação; 2
  • 10. Introdução vii. Verificar que ligação existe entre o Departamento de Formação e o Departamento Sénior do clube. O presente estudo monográfico será estruturado em sete pontos. O primeiro, “Introdução”, tem como objectivo apresentar o estudo, os seus objectivos e a sua estrutura. No segundo ponto, pretendemos apresentar o levantamento bibliográfico sobre temáticas relacionadas com a formação de jovens jogadores de futebol. No terceiro ponto, apresentaremos a caracterização da amostra, a metodologia de investigação e, por fim, a recolha de dados. No quarto ponto, análise e discussão dos resultados, estabeleceremos uma relação entre a literatura e a opinião do entrevistado. No quinto ponto, serão apresentadas as conclusões do estudo. No sexto ponto, serão indexadas todas as referências bibliográficas mencionadas no texto dos pontos anteriores. No sétimo ponto, será anexada a entrevista efectuada. 3
  • 11. Revisão da Literatura 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1. A IMPORTÂNCIA DA FORMAÇÃO. A FORMAÇÃO COMO UM MEIO DE OPTIMIZAR FINANCEIRAMENTE OS RECURSOS HUMANOS “O mundo do futebol move-se ao redor de duas órbitas distintas, uma que é desportiva e outra que é a comercial. Ou seja, por um lado é um jogo, por outro é um negócio”. Valdano (2002: 16) “O futebol é, na verdade, um jogo, mas também é um espectáculo. Devemos isso ao público. E é também um negócio, não podemos perder o nosso valor”. Robson (2003: 44) “O Benfica deverá ter sempre jovens talentos na sua escola de jogadores uma vez que eles são o futuro”. Camacho (in Alves, 2004: 84) “Não gosto de um plantel extenso e quero apenas contar com 21 jogadores de campo. Se tiver uma equipa mais reduzida também poderei ter mais atenção para as camadas jovens”. Mourinho (2004b) O fenómeno desportivo e, nomeadamente, o mundo do futebol estão a tornar-se num verdadeiro negócio e este último “será cada vez mais uma actividade económica envolvendo verbas enormes” (Carraça, 2003a: 82). Contudo, como qualquer outro negócio da nossa sociedade, o futebol sofre igualmente com os altos e baixos da economia nacional e internacional. Segundo Ferreira (1999: 9), “Portugal terá sempre um futebol mediano no plano financeiro, e um campeonato abaixo dos campeonatos mais ricos. O que Portugal pode ter é a possibilidade de, através do talento dos seus jogadores, conseguir que as nossas equipas sejam mais fortes financeiramente, porque assim farão uma gestão mais correcta daquilo que investem e daquilo que depois rentabilizam desses investimentos”. Pensamos que será essencial que os responsáveis de clubes, treinadores e directores, se mostram sensíveis à questão da formação e à sua importância quer do ponto de vista desportivo, quer do ponto de vista financeiro. 2.1.1. O futebol como um factor económico No dia 11 de Fevereiro de 2002, surgia no Jornal “O Jogo” um artigo de Rui Oliveira (2001: 12) intitulado “O futebol português e a indústria do futebol”. 4
  • 12. Revisão da Literatura Nesse artigo, o autor apontava alguns dos motivos do fracasso a nível das competições europeias por parte das equipas portuguesas: “Ao longo dos últimos anos temos assistido a uma perda de poder de competitividade dos clubes de futebol portugueses em relação aos seus congénitos dos países mais desenvolvidos da Europa tendo como causa óbvia a fragilidade económica dos nossos clubes em relação aos últimos. A forma abrupta e rápida da industrialização deste fenómeno social acabou por fortalecer os clubes mais ricos e, pelo contrário, obrigou aqueles com menor capacidade económica a verem partir a maioria dos seus talentos, ficando, como é lógico, mais enfraquecidos em relação aos seus opositores. O futebol português, do ponto de vista desportivo, acabou por sofrer a erosão normal de qualquer indústria que, pelo seu menor poder económico, não conseguiu resistir ao poder dos grandes grupos económicos que estão por detrás da maior parte dos grandes clubes europeus”. Constantino (2002: 152) confirma a ideia do autor anterior afirmando que “a livre circulação dos praticantes num mercado aberto introduziu uma dinâmica em que a lógica dos países economicamente mais fortes prevalece sobre os mais fracos, criando uma situação onde tendencialmente os melhores praticantes se concentrem nos mercados com maior poder aquisitivo”. Assim, com a conjuntura actual os clubes dos campeonatos com maior poder económico acabam por ter os melhores jogadores tornando-se superiormente competitivos comparados com campeonatos com menor poder económico como o campeonato português. Tendo em linha de conta o supracitado, concordamos com Oliveira (2001: 12) quando este afirma que “perante este contexto, consequente da globalização, pensamos que se torna urgente encontrar medidas que permitam minorar ou mesmo estagnar o enfraquecimento competitivo a que se tem assistido nos últimos anos, para não corrermos o risco de, no futuro, em termos globais, e por não termos lugar nas grandes competições, acabarmos por ver ainda mais alargado o fosso económico e o desequilíbrio que o mesmo reflecte ao nível da competição”. 5
  • 13. Revisão da Literatura Uma das medidas fundamentais para contrariar esta tendência seria investir na formação e nos jovens talentos. No entanto, segundo alguns autores a realidade está longe do que seria ideal. Carraça (2003b) e Pacheco (2001) afirmam mesmo que em Portugal não se verifica um investimento claro e uma aposta séria na formação. Campos (2003: 82) alerta para o facto de “num futebol em que a crise financeira se está a fazer sentir de uma forma violenta, o grande contra acaba por se fazer reflectir, essencialmente, na não exploração do futebol de formação, o que seria mais económico e rentável”. Desta forma, e em virtude da actual situação de crise económica no panorama internacional em geral e no futebol em particular, torna-se necessário que cada vez mais “os clubes formem jogadores de qualidade no sentido de assim os integrarem nas suas equipas seniores evitando, dessa forma, o pagamento de quantias elevadas na aquisição de jogadores a outros clubes. Por outro lado, ao investirem na formação de jogadores aumentam a possibilidade de obterem no futuro dividendos desse investimento numa possível venda para outros clubes” (Leandro, 2003: 3). Mediante a realidade do futebol português e da economia em que está inserido entendemos que os clubes de futebol têm de investir na formação de forma a rentabilizar os seus recursos humanos e, ao mesmo tempo, manteremse competitivos. 2.1.2. A formação como uma das soluções para a viabilidade económica dos clubes de futebol O objectivo da formação foi-se alterando ao longo dos anos. Pensamos que, tal como no Real Madrid, o investimento na formação em Portugal estava sobretudo relacionado com questões de origem histórica e social (Giráldez, 2003). Com a conjuntura actual podemos afirmar que “a formação desportiva readquiriu uma nova centralidade. Ela deixou de ser apenas um processo de assegurar a qualidade desportiva dos clubes, para ser também um meio de optimizar financeiramente os recursos humanos” (Constantino, 2002: 153). Na opinião de Oliveira (2001: 12), uma das grandes soluções para o problema económico dos clubes é “apostar inequivocamente na formação, 6
  • 14. Revisão da Literatura criando estruturas, alterando conceitos e metodologias, de forma que o número de jovens com talento seja maior ao da realidade actual”. É necessário ter presente “que os jogadores são activos neste mundo economicista. Pois, para além do património imobiliário que só alguns clubes ou sociedades desportivas possuem, são exactamente estes activos [entendase jogadores] a única riqueza, o único bem de possível rentabilização (Carraça, 2003a: 82). Mourinho (2002a: 17) refere que “um clube com a dimensão do Futebol Clube do Porto precisa de ter os seus activos elevados [entenda-se jogadores] ao expoente máximo, de modo a que um determinado momento tenha condições para vender, caso isso seja necessário”. Segundo Camacho (in Alves, 2004: 84) “o lançamento de jovens futebolistas está muitas vezes relacionado com os condicionalismos económicos de cada clube. Equipas que não têm grande capacidade financeira a nível internacional têm nos jogadores formados nas suas escolas a oportunidade de reforçarem os seus planteis e de, ocasionalmente, venderem jogadores, o que lhes podem trazer importantes contrapartidas financeiras”. Vale (2003b: XX) confirma as ideias expressas anteriormente afirmando que “a formação é um aspecto rentável, isto é, formar jogadores e eventualmente vendê-los, se estes tiverem qualidade. Penso que esta é a via para os clubes portugueses”. Daí que um investimento forte e sério na formação acabe por ser a médio/longo prazo um excelente investimento. É necessário apostar nos jovens jogadores de forma a evitar gastos e, eventualmente, rentabilizá-los com a sua venda. Mesmo em grandes clubes e com enorme potencial financeiro, como é o caso do Chelsea Football Club (Inglaterra), a estratégia passa pelo investimento nas camadas jovens. Kenyon (2004: 25), director executivo do referido clube, menciona que “a alma do clube tem de vir das Academias. Isto para que não tenhamos de estar a gastar dinheiro em jogadores. E passa por aqui o equilíbrio financeiro”. 7
  • 15. Revisão da Literatura Assim, uma aposta nos jovens jogadores permitirá uma melhor gestão quer dos recursos humanos, quer dos recursos financeiros dos clubes. Por outro lado, Oliveira (2001: 12) afirma que “é fundamental que entendamos que, da forma como se está a desenvolver esta indústria, o nosso país terá forçosamente de ser mais exportador do que importador e, que quando tenha de importar, que o faça de forma pontual e com o garante de que tais importações constituirão uma mais-valias não só desportivas, mas, também, económicas”. Assim, como afirma Constantino (2002: 152), “um forte investimento na formação desportiva passa a ser, à nova dimensão internacional do trabalho desportivo, um objectivo estratégico fundamental para aumentar o grau de competitividade dos países com economias de desporto mais fracas”. Os treinadores das grandes equipas portuguesas estão atentos a este fenómeno e à importância da formação no futebol. Segundo Mourinho (2003b: 20), “em Portugal, é preciso repensar o investimento na formação, apostar em jogadores mais novos e nacionais”. Camacho (2003b: 9) é da mesma opinião afirmando que jogadores como “Cristiano Ronaldo ou Ricardo Quaresma não aparecem todos os anos. Para isso é preciso apostar nas camadas jovens”. Assim, parece-nos consensual a premência do investimento na formação e nos jovens talentos de forma a facilitar a sanidade económica dos clubes de futebol e, ao mesmo tempo, garantir uma maior competitividade desportiva quer ao nível das competições internas, quer ao nível das competições com os restantes clubes/países da Europa. 8
  • 16. Revisão da Literatura 2.2. A NECESSIDADE DE CONSTRUIR O PROCESSO DE FORMAÇÃO TENDO COMO PRIMADO A ORGANIZAÇÃO DE JOGO SUSTENTADA POR UMA CULTURA DE EXIGÊNCIA, DE VITÓRIA E DE COLECTIVO “Até nas peladinhas gosto de ganhar. Desfruto todos os dias e, antes dos jogos, penso sempre nos adeptos e na necessidade de me esforçar, para lhes provar que sou um bom jogador”. Gonzalez (2003: 50) “Nenhum jogador está acima da equipa. Aprendi, muito cedo, essa lição”. Casillas (2003: 50) “Temos de melhorar a cada dia, do princípio ao fim da carreira. Quero aprender coisas novas todos os dias”. Crespo (2005: 10) “ [Cristiano Ronaldo] tem de continuar a ser humilde, a perceber que tem muito ainda a aprender, a evoluir e a associar as suas qualidades à eficiência e aos condicionalismos da equipa”. Queiroz (2005: 38) A formação de um jogador de futebol é um processo moroso e com particularidades com as quais os treinadores devem estar identificados de forma a poderem rentabilizar ao máximo esse mesmo processo. Como afirmam Leal & Quinta (2001: 20), “o futebol juvenil tem impressões digitais próprias, isto é, possui características que lhe dão autonomia peculiar, o que pressupõe, evidentemente, uma metodologia que se identifique com as suas necessidades e particularidades”. Apesar destas especificidades da formação e, nomeadamente, as especificidades de cada escalão, somos da opinião de que o processo de formação deve ter como principal referencial o que é exigido na equipa principal. Esta exigência deverá atingir o seu máximo grau de rigor nos últimos escalões de formação, isto tendo em conta que “a rentabilização da formação passa pela capacidade de se formar jogadores com qualidade suficiente para entrarem na equipa principal e pela introdução dos maiores talentos de forma mais consistente na equipa principal” (Paul, 2003: XXVII). Ou seja, o objectivo final do todo o processo de formação passa pela integração do maior número possível de jogadores na equipa sénior dos respectivos clubes. Assim, “a formação em futebol tem que ser uma actividade guiada pelos mais rigorosos padrões de exigência” (Oliveira, in Leal & Quinta, 2001) de forma a preparar os jovens jogadores para o mundo do futebol profissional. 9
  • 17. Revisão da Literatura Apesar de defendermos que, tal como para Mourinho (in Lourenço, 2003: 121), “a organização de jogo de uma equipa é o factor mais importante de todos”, existem outros valores que têm de ser ponderados ao longo de todo o processo de formação de forma a sustentarem essa mesma organização de jogo. Carraça (2005a: 46) afirma que o jovem jogador do Sport Lisboa e Benfica deve ter as seguintes características: “um bom desenvolvimento motor, competitividade, um pensamento bem organizado e estruturado, disciplina e perseverança”. Segundo Vale (2004: 16), “um jogador pode ter muito talento, mas na nossa opinião é o carácter que conta. São esses os grandes jogadores do futuro. É um aspecto decisivo no jogador de elite”. De acordo com o mesmo autor, o jovem jogador de futebol tem de revelar “carácter, inteligência específica de jogo, técnica evoluída e com princípios de educação para se comportar como ser social. Para além disso tem de ter ambição, gostar de futebol e uma grande vontade de se tornar um jogador de elite” (Vale, 2004: 16). Valente (2005: II) afirma que “um jogador de futebol de alto nível tem de ter um nível mental muito forte”. Então, o processo de formação deve ter como primado a organização de jogo da equipa num contexto de exigência, de vitória e de colectivo. O Coordenador Técnico deverá fomentar estes valores intervindo junto dos treinadores. 2.2.1. Trabalho, disciplina, rigor Pensamos que a formação de um jovem jogador de futebol tem de ser um processo com cunho exigente. De acordo com Giráldez (2002), “o êxito reside no facto do jogador querer ser melhor em cada dia que passa. O Real Madrid procura a melhoria dos jogadores desde o primeiro dia em que chegam a esta casa”. Essa parece ser a mesma filosofia do Ajax: “O jovem jogador do Ajax tem de possuir talento e vontade de aprender: a nossa obrigação é fazer jogadores melhores a cada dia que passa” (Adriaanse, 1996: 21). 10
  • 18. Revisão da Literatura Vale (2003a: LXXVI) parece concordar com as ideias anteriores: “para que um jovem jogador seja formado com sucesso este tem de ser eficaz do ponto de vista táctico-técnico, físico e fundamentalmente mental. Para poder alcançar este perfil o jogador tem de ter capacidade de trabalho, rigor, disciplina, organização, grande ambição em tornar-se jogador de alto nível. Portanto, está relacionado com o nível de empenhamento que consiga ter no dia-a-dia, no sentido de se tornar cada vez mais forte do que no dia anterior”. Valdano (2002: 16), reportando-se à sua experiência enquanto jogador profissional de futebol, afirma que “teve de colocar em funcionamento a vontade, o espírito de sacrifício, e aí houve uma aprendizagem não apenas desportiva, mas também pessoal que lhe possibilitou fazer incursões por outros campos”. Para Mourinho (2003c) mais problemático que as debilidades tácticas são as debilidades ao nível psicológico afirmando mesmo que adora “encontrar um jogador com debilidades tácticas, receber um jogador «cru» a nível táctico. Mas não tem pachorra para jogadores com debilidades psicológicas ao nível do sacrifício, da crença e da entrega”. Ou seja, “os grandes treinadores pretendem jogadores com qualidade, mas que tenham motivação em cada dia que passa e um interesse grande em aprender aquilo que lhes é transmitido” (Mourinho, 2002a: 20). Dada a exigência do futebol profissional, o processo de formação deve integrar os mesmos valores. Como refere Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 69) “se tu estás no Ajax tens de ser treinável e ser capaz de entender as instruções, mesmo que só tenhas 7 anos”. Deste conjunto de ideias supracitadas depreendemos que as competências sociais e psicológicas estão também elas relacionadas com as capacidades futebolísticas e que há valores e atitudes que devem ser fomentados dentro e fora do terreno de jogo de forma a construir a personalidade e o comportamento dos jovens jogadores. No entanto, e de acordo com Adriaanse (1997: 66) “a sociedade está em mudança em muitas dimensões, sendo que os jovens de hoje em dia dão mais importância ao lazer do que ao trabalho. Porém, as regras do futebol de elite 11
  • 19. Revisão da Literatura não se alteraram”. Este aspecto pode trazer alguns entraves ao processo de formação devido ao confronto de valores fundamentais deste processo e os valores que os jovens jogadores vivenciam no seu dia-a-dia. Será importante transmitir aos jovens jogadores que o fundamental numa equipa de futebol é o rendimento individual em prol da equipa e que “somente o trabalho é que leva ao sucesso” (Mourinho, in Lourenço, 2003: 41). Pensamos que a exigência relativamente ao trabalho diário, à disciplina, à correcção e à procura de uma constante melhoria deve surgir e ser fomentada pelos treinadores ao longo de todo o processo de formação. 2.2.2. Espírito ganhador, ambicioso e positivo Denoueix (2003: 46) afirma que o Nantes conseguiu aproximar-se das grandes equipas francesas e ganhar vários títulos, “controlando ansiedades e acrescentando optimismos. Quando praticamos um desporto temos que ser optimistas, positivos e ter vontade de ganhar, para vencer os mais fortes. Isso consegue-se com muito trabalho diário”. Valdano (2002: 21) defende esta perspectiva afirmando que “para se atingir o sucesso no futebol é necessário ser-se uma pessoa positiva e a descoberta dos erros que levaram ao fracasso deve ser um exercício que nos torna melhores”. Para Mourinho (in Lourenço, 2003: 128) “«ser campeões» tem de ser sempre o nosso objectivo. Um objectivo diário, uma motivação consistente e permanente, uma luz que tem de guiar o nosso trajecto. Cada treino, cada jogo, cada minuto da nossa vida profissional e social tem de se centrar nesse objectivo que é nosso”. Desta forma, “os jogadores devem ser formados dentro de uma cultura de vitória. Os jogadores têm de estar habituados a ganhar” (Mourinho, 2002a: 20). Mourinho (in Lourenço, 2003: 104) afirma mesmo que “uma equipa de futebol só é digna desse nome quando todos os jogadores, sem excepção, querem ganhar, querem ganhar muito, independentemente de jogarem ou não”. Mas ganhar não se deve cingir ao resultado. Ganhar significa igualmente “ganhar cada treino, ganhar capacidade para jogar, ganhar capacidade de 12
  • 20. Revisão da Literatura sofrer, ganhar vontade de jogar e ganhar, ganhar espaço para jogar, ganhar cada duelo, ganhar cada combinação ofensiva, ganhar cada situação de finalização, ganhar uma equipa” (Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense, 2002). Ou seja, o jovem jogador de futebol deve desenvolver a capacidade de auto-superação individual e colectiva, exigindo sempre mais de si e da sua equipa. Defendemos que o processo de formação tem de ter o seu enfoque na positividade, na capacidade de ultrapassar as adversidades com determinação e na vontade de querer ganhar todas as situações. 2.2.3. O clube, a equipa e o colectivo acima de tudo Sendo o futebol um desporto colectivo e institucionalizado é fundamental que os jovens jogadores privilegiem os interesses do seu clube e da sua equipa em detrimento dos seus próprios interesses. Para Mourinho (in Lourenço, 2003: 121) “a ideia de clube é mais importante do que qualquer jogador tratando-se de um valor que tem de se passar por todo o clube, em especial pelas camadas jovens. O respeito pelo clube, pelas normas instituídas, pela filosofia de clube é mais importante do que qualquer indivíduo, ou seja, ninguém está acima do clube”. De acordo com Denoueix (2003: 46) “fala-se muito em craques individuais, mas, no seu entender, o colectivo é prioritário”. Valdano (2002: 20) corrobora com as ideias anteriores referindo que “a estrutura e a cultura do Real Madrid têm de estar sempre acima das pretensões dos jogadores. Aqui a mensagem foi clara: chega uma grande figura internacional, mas aceita as regras comuns, as regras que estão definidas no Real Madrid há muito tempo; é uma maneira de explicar que a instituição está acima dos jogadores”. Parece-nos fundamental que se transmita aos jovens jogadores durante o processo de formação que o clube, as regras instituídas e a ideia de jogo implementada são o mais importante e que têm de ser respeitados. Segundo Mourinho (2003d: 61) “o conceito de equipa é muito mais importante do que o conceito de individualidade e que a melhor equipa não é 13
  • 21. Revisão da Literatura aquela que tem os melhores jogadores, mas aquela que joga como equipa”. Assim, “todos os jogadores têm de transformar as suas motivações pessoais em motivações colectivas” (Mourinho, 2003e: 33), “sendo fundamental para poder jogar ao mais alto nível, cada jogador sentir-se confiante, ser solidário e cooperante com os seus companheiros e acreditar neles” (Mourinho, in Lourenço, 2003: 141). Valdano (2002: 22) refere ainda que “precisamos sobretudo de metas e necessitamos de um estado de ânimo colectivo que nos permita trabalhar com um determinado nível de entusiasmo. Necessitamos de uma retaguarda de cultura corporativa para ter um determinado sentido de pertença”. Ou seja, torna-se importante a partilha de objectivos e de cumplicidades de forma a formar um grupo coeso para que todos os elementos da equipa se dirijam no mesmo sentido. Pensamos que o processo de formação deve ser orientado para os valores colectivos da equipa e do clube em detrimento dos valores individuais. 2.3. DA FORMAÇÃO MERAMENTE FUTEBOLÍSTICA À PREOCUPAÇÃO COM A FORMAÇÃO INTEGRAL “Retirei-me com trinta e tantos e espero viver até aos setenta e tal. Um dia pensei: o que vai ser da minha vida quando não for conhecido, quando o meu rival for um cidadão normal que tem duas profissões? Pensai bem”. Butragueño (in Palomino, 2002) “Formar Homens que jogam”. Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense (2002: 9) “A formação desportiva não pode prejudicar a formação escolar dos jovens. Mas, por outro lado, a escola não deve hipotecar o futuro dos jovens desportistas com talento”. José Carvalho (2002: 12) A formação não se trata “apenas de treinar, é muito mais do que isso: é educar” (Leal & Quinta, 2001: 21). Desta forma, o processo de formação do jovem integra, como não poderia deixar de ser, a componente escolar. Tal significa que “a prestação desportiva não pode acarretar o prejuízo do rendimento escolar. Os jovens jogadores devem entender que o desporto contribui para a sua formação, ao ser um espaço de formação, por excelência, promotor da auto-afirmação e da auto-superação. Todavia, tudo isto perde o 14
  • 22. Revisão da Literatura sentido se ele deixar de prestar atenção aos estudos, na medida em que estes constituem, no presente, o acesso para a construção de um futuro sólido” (Mesquita et al, 2002: 9). 2.3.1. A importância da formação escolar e académica Para o jovem jogador de futebol é muito difícil conciliar a sua actividade desportiva com a actividade escolar. Como afirma José Carvalho (2002: 13), “é um dado adquirido que a opção pela carreira desportiva na via da alta competição acarreta uma série de problemas na organização da vida desportiva, escolar e social do jovem jogador”. Vale (2003a: LXXVII) confirma esta ideia afirmando que “em Portugal, hoje em dia é extremamente difícil conseguir obter sucesso do ponto de vista desportivo e escolar ao mesmo tempo. Tudo isto são factores a ter em conta num processo de formação”. Daí a emergência do apoio escolar aos jovens jogadores dada as dificuldades em conciliar a actividade desportiva com a actividade escolar. José Carvalho (2002: 26), afirma que “a cobertura mediática realizada aos futebolistas profissionais torna muito atraente esta carreira para os jovens jogadores. No entanto, esta opção, por vezes, tem como consequência a falência da carreira académica, o que se revela negativo, principalmente se o jovem por qualquer motivo não atinge o profissionalismo”. Gomes (2004: 25) afirma que “seria bom que estes jovens estudassem e obtivessem as máximas competências possíveis para que sejam homens mais preparados para a vida, independentemente de triunfarem ou não no futebol”. Caçador (2003: 9), afirma que os jovens jogadores e os seus pais devem investir na formação escolar e académica dos primeiros: “Temos de nos preocupar com a formação académica dos jogadores, sermos exigentes. Não é possível que um jovem de 20 anos seja só futebolista e que os seus pais tenham a feliz ideia de os apoiar quando abandonam a escola. Não há um jovem que se possa considerar no bom caminho se abandonar a escola ao 9º ano. Queremos que concluam o 12º [ano de escolaridade] e entrem nas faculdades, aproveitando o estatuto de alta competição. É essa a grande revolução que temos de fazer: apostar na qualidade de jogadores e no seu 15
  • 23. Revisão da Literatura nível cultural. Esses homens, a médio prazo, poderão transformar o futebol português”. Tendo em conta as ideias anteriormente descritas, “um processo iniciado com um percurso de formação concertado e qualificado, em que o aspecto de aprendizagem desportiva e académica ou técnico-profissional é deveras importante. Isto porque, temos de ter a consciência de que a esmagadora maioria dos jovens jogadores nunca serão jogadores profissionais de futebol. Os outros, os mais aptos, aqueles que durante as várias fases de formação demonstraram ter capacidades e potencial para poderem ser profissionais de primeiro plano, terão de se disponibilizar para assumirem uma carreira: dura, desgastante, arriscada, mediática. Mas compensadora e envolvente para aqueles que a saibam gerir com inteligência e sensatez” (Carraça, 2003a: 82). Como afirma o mesmo autor (Carraça, 2003b: 9), “apenas 5% dos profissionais de futebol do nosso país é que no fim da carreira e se gerirem bem os seus rendimentos não necessitam de desenvolver outra actividade. Os outros 95% têm de assumir uma nova profissão para sobreviver. Amealharam algum dinheiro, mas deixaram de estudar muito cedo”. Assim, a formação escolar e académica surgem como apoio a uma melhor gestão dos rendimentos e como uma garantia de um futuro mais estável e seguro no caso de a carreira futebolística terminar ou não ser bem sucedida por diversos factores, como por exemplo, as lesões. De acordo com Rocha (2003: 39), jogador profissional de futebol da Académica de Coimbra e licenciado em fisioterapia, “não vale a pena fazer planos a longo prazo [no futebol], porque há imponderáveis, como as lesões. E determinadas lesões, dependendo da sua gravidade, podem determinar o fim de qualquer carreira”. Desta forma concordamos com Rocha (2003: 39) ao afirmar que “parece importante que o jogador que pense no seu futuro: tem de estar preparado para entrar no mercado de trabalho e sem uma licenciatura é bastante mais difícil conseguir isso”. Do ponto de vista desportivo, segundo Mourinho (2002c), “um jogador culto não tem mais capacidade de evolução e de aproveitamento, mas antes um 16
  • 24. Revisão da Literatura jogador inteligente: quem é inteligente assimila mais depressa as coisas acelerando a aquisição dos objectivos do treino”. Mas, por outro lado, concordamos com Vale (2003a: LXXVII) quando afirma que um jogador “quanto mais culto for, não só do ponto de vista táctico, mas também intelectual, mais disponível estará para apreender coisas novas que façam apelo fundamentalmente à sua capacidade de análise e à inteligência, tem a ver com a inteligência táctica”. Mil Homens (2004: 6) é da mesma opinião afirmando que “as pessoas mais cultas e melhor formadas pensam, entendem e desempenham melhor qualquer actividade”. Parece-nos que a formação escolar e académica têm um papel fundamental na sociedade e que não deverá ser descurada pelos agentes orientadores do processo de formação desportiva. E essa mesma formação escolar/académica ajudará o jovem jogador no seu «dia-a-dia futebolístico», pois “no futebol de hoje não basta só ser bom jogador ou pelo menos saber o que fazer em campo. É necessário aprender ao pormenor as regras deste novo raciocínio do espectáculo profissional, não esquecer a importância da imagem, saber comunicar e ter sempre presente o papel fundamental que a comunicação social pode ter na evolução (ou retrocesso) de uma carreira” (Carraça, 2003a: 82). Assim, a formação escolar/académica surge também como um meio de apoio à carreira de futebolista. Daí a necessidade do “profissionalismo, espírito de sacrifício, visão e uma abrangente e competente gestão da carreira, aspectos prioritários a ter em conta pelos jogadores, por forma a poderem acompanhar a diária evolução a que esta indústria a está sujeita” (Carraça, 2003a: 82). Assim, ao longo do processo de formação os jovens jogadores devem ser incentivados a empenharem-se nos seus estudos. O Coordenador Técnico deverá intervir junto dos treinadores para que estes alertem os seus jogadores da importância do estudo e, se necessário, desenvolver estratégias de remediação caso se verifique insucesso escolar. Este responsável deverá igualmente comunicar com os pais dos jogadores sempre que se verifique essa necessidade. 17
  • 25. Revisão da Literatura 2.3.2. A relação Sistema Desportivo/Sistema Educativo Pensamos que a relação entre o Sistema Desportivo e o Sistema Educativo não é suficientemente cooperante de forma a ajudar os jovens desportistas, em geral e os jovens jogadores de futebol, em particular, a conciliarem as duas actividades. Segundo José Carvalho (2002: 15), “a conciliação entre as actividades desportivas e as actividades escolares dos jovens têm-se revelado com um problema de difícil solução. Este problema agudiza-se de sobremaneira quando pretendem enveredar por um percurso que os conduza a resultados de excelência”. Dado este problema parece-nos fundamental que a Escola e o Clube se aproximem de forma a compatibilizar os horários das actividades escolares e das actividades desportivas para que os jovens jogadores tenham oportunidade de obter sucesso nos dois processos de formação. “A lei do estatuto de alta competição prevê medidas de apoio ao nível do regime escolar e do acesso a formação superior, especializada e profissional. Todavia, o tempo despendido nos treinos e competições e nas respectivas deslocações fazem com que essas medidas, como por exemplo, a relevação de faltas e a alteração de provas de avaliação, pouco beneficiem os jovens jogadores” (Maria Carvalho, 2002: 77). Concordamos com esta autora quando afirma que “é tempo de equacionar novas formas de enquadramento da vida destes praticantes desportivos” (Maria Carvalho, 2002: 77). Assim, e no sentido de promover uma melhor conciliação entre as duas actividades, “os programas desportivos em alguns países têm vindo a desenvolver modelos de organização pedagógica baseados em parcerias com escolas, sendo que escolas, clubes e federações, assumem compromissos bem definidos nesses programas” (Marques, 1999, in José Carvalho, 2002: 47). Alguns clubes em Portugal parecem ter adoptado medidas idênticas. Segundo Mil Homens (2004: 6), director-geral do Futebol de Formação e da Academia do Sporting Clube de Portugal, “o principal objectivo é formar homens que possam vir a integrar a equipa principal, mas sem esquecer o desenvolvimento pessoal e social dos jovens”. Desta forma, este clube criou um curso técnico-profissional para os jovens jogadores que vivem em regime 18
  • 26. Revisão da Literatura de internato. O Sporting Clube de Portugal conta ainda com um gabinete psicopedagógico constituído por uma professora e por uma psicóloga que têm como tarefa o acompanhamento escolar de todos os jovens jogadores. Para incentivar os jovens jogadores nas suas tarefas escolares foi criado “um quadro de honra, que premeia três jovens por ano avaliando os seguintes comportamentos: área escolar (assiduidade e avaliação académica) e área desportiva (fair-play, assiduidade/pontualidade, comportamento nos balneários e atitude/comportamento nos treinos)” (O Jogo, 2004: 6). No Futebol Clube do Porto, segundo José Carvalho (2002: 26), também parece haver essa preocupação. Este autor realizou um estudo de forma a fundamentar a necessidade da criação de uma estrutura específica (Centro de Formação) de apoio à formação de jogadores de futebol no Futebol Clube do Porto. O objectivo deste centro, em termos escolares, será o de “fornecer dentro da estrutura do próprio clube, uma alternativa à formação tradicional, com vista ao prosseguimento de estudos. Através desta alternativa, os problemas relacionados com a conciliação de horários escolares com os horários dos treinos, o tempo gasto no transporte da escola para o local do treino e a rentabilização dos espaços de treino seriam ultrapassados. Por outro lado, um currículo mais ajustado às características e necessidades desta população poderá favorecer uma maior motivação, evitando o abandono escolar precoce”. Nos grandes clubes europeus a formação académica e escolar e a preocupação com a formação integral parecem ser aspectos fundamentais. No Real Madrid há “a preocupação com a formação académica dos jovens sendo necessário apontar a formação dos jovens para a formação integral” (Valdano, 2002: 20). Inclusivamente, “este clube organizou um evento intitulado «Jornadas de Orientação Professional» direccionado para os jogadores do Departamento de Formação e para os pais dos mesmos. Este acontecimento teve a presença de antigos jogadores de futebol e de basquetebol do clube (Sanchis, Emilio Butragueño, Vicente Ramos e José Manuel Beirán) que transmitiram o seu testemunho relativamente à compatibilização da prática desportiva com os estudos universitários. Posteriormente, outros temas foram 19
  • 27. Revisão da Literatura abordados, como por exemplo, as saídas profissionais dos cursos universitários” (Palomino, 2002). No Ajax, os maus resultados na escola têm implicações ao nível do clube. Segundo Blind (2004: 23), “os jovens jogadores para se tornarem talentos têm de aplicar o mesmo carácter quer no clube quer na escola. Daí que, quando as classificações escolares descem, os responsáveis do clube se dirijam aos pais e a titularidade na equipa passa a ser muito difícil de concretizar. Mais de metade dos jogadores do Ajax concluem o secundário e iniciam os estudos universitários”. Concluindo, verificamos que a formação escolar e académica são instrumentos úteis para todos os jovens jogadores mesmo para a sua actividade futebolística e que os clubes de maior renome nacional e internacional não descuram esta vertente da vida social dos seus jogadores. 2.4. A PROCURA DE IDENTIDADE ATRAVÉS DA IMPLEMENTAÇÃO DE UMA FILOSOFIA DE CLUBE E DE UM MODELO DE FORMAÇÃO “A formação tem de ser a base dos plantéis [das equipas profissionais]”. Giráldez (2002) "Um treinador de um clube como este [Futebol Clube do Porto] não pode viver dissociado daquilo que é o futebolformação". Mourinho (2002a: 15) “Desde o primeiro dia que um jogador pode ver o que é o Ajax. A Academia é fantástica, porque as crianças crescem e aprendem as coisas à maneira do Ajax!”. Koeman (s/d) Para que a formação tenha uma lógica coerente e racional parece-nos fundamental que todo o processo seja norteado por objectivos bem definidos e que estes se possam espelhar em todas as equipas do Departamento. Assim, torna-se necessário promover “o estabelecimento de um conjunto de linhas gerais e específicas que procuram direccionar e orientar a trajectória da organização do mesmo” (Leal & Quinta, 2001: 27), ou seja, um modelo de clube/filosofia de clube. Faria (2003: LXXVIII) é da mesma opinião referindo que “um projecto de formação é ter a definição de um conjunto de características que se pretende 20
  • 28. Revisão da Literatura que esses jogadores quando formados possuam. Portanto, tem a ver com algo que tem de estar definido a nível estrutural no clube”. Isto porque, como afirmam Leal & Quinta (2001: 28) “parece-nos difícil conceber que ao longo do processo de formação sejam escolhidos determinados jogadores em detrimento de outros, sem que haja uma definição das características do jogador que se pretende, tendo em conta as exigências do modelo de jogo do clube”. Desta forma, “o ponto referencial de qualquer clube no que respeita à formação deve ser alicerçado numa filosofia que contemple a existência de um modelo de jogo, o qual, por sua vez, orientará a concepção de um modelo de treino, de um complexo de exercícios, de um modelo de jogador e mesmo de um modelo de treinador” (Leal & Quinta, 2001: 27). Vale (2003a: LXXVIII) refere o caso do Futebol Clube do Porto. Segundo este autor, “a formação num clube deve nortear-se por princípios bem sólidos e se alguma coisa mudar devem mudar as pessoas, mas não devem mudar os princípios que são aquilo que caracterizam e que são a identidade de um clube”. Conforme o mesmo “o Futebol Clube do Porto tem uma cultura desportiva muito própria e os jogadores têm de a entender. O clube rege-se por valores próprios, desportivamente tem uma forma de jogar. É uma forma de jogar do Futebol Clube do Porto e de mais ninguém” (Vale, 2004: 16). Esta forma de trabalhar levará a que todos os intervenientes do processo de formação assimilem ao longo do tempo uma forma de treinar e de jogar, criando uma noção de identidade. 2.4.1. A forma de jogar e de treinar da equipa principal como referencial fundamental do Departamento de Formação Pensamos que o grande referencial para a implementação de um modelo de clube ou modelo de formação passa pelo estabelecimento de um modelo de jogo comum a todos os escalões de formação. Esta forma de trabalhar implicaria que “todos se direccionassem no mesmo sentido e que os jogadores se confrontassem todos os dias com uma determinada lógica. É óbvio que esse modelo é a referência que faz com que nas diversas etapas de formação não 21
  • 29. Revisão da Literatura aconteçam coisas distintas, isto porque as ideias são comuns e os princípios são os mesmos” (Faria, 2003: LXXXVIII). E esse referencial tem de ser o “referencial máximo que é aquilo que se faz no topo que é a equipa principal de um clube” (Vale, 2003a: LXXIII), pois o objectivo final da formação dos jovens jogadores passa pela integração na equipa sénior. Da mesma opinião, Leal & Quinta (2001: 41) afirmam que “a formação com base na existência de um modelo de jogo vai permitir ao jovem jogador estar rotinado numa forma de jogar e desenvolver características definidas, que lhe permitirão, com mais possibilidades de sucesso, integrar a equipa sénior. Para isso é importante que o modelo de jogo implantado no departamento juvenil tenha como referência o modelo da equipa sénior porque é para esta que se pretende formar o jogador”. Caso o modelo de jogo do Departamento de Formação não corresponda ao modelo de jogo da equipa principal “corre-se o risco de se estar a formar jogadores com características diferentes daquelas que são exigidas pela equipa sénior o que torna mais difícil a integração e aproveitamento dos jogadores oriundos dos escalões de formação” (Leal & Quinta, 2001: 41). Ou seja, tem de haver uma similaridade de processos ao nível do treino e do jogo entre a equipa principal e as equipas do Departamento de Formação. Tendo em linha de conta o anteriormente enunciado, parece-nos mais coerente que os critérios da contratação do treinador principal da equipa sénior do clube tenham como principal referencial a filosofia do clube e, nomeadamente, o modelo de jogo adoptado para a formação. De acordo com Vale (2003a: LXXIX), “a partir do momento que existe um modelo de jogo, uma filosofia de formação, uma cultura desportiva, julgamos que seria impensável as pessoas não pensarem no tipo de treinador que vão escolher”. Guilherme Oliveira (2003: XXIV) é da mesma opinião referindo que se “um clube tem um modelo de jogo para a formação deve contratar um treinador cujas ideias são em função desse modelo de jogo”. Assim, parece-nos fundamental que a escolha do treinador da equipa principal deve ter em linha de conta a filosofia do clube para que não se 22
  • 30. Revisão da Literatura verifique um desfasamento entre o que é exigido nas equipas do Departamento de Formação e na equipa sénior. 2.4.2. Formar jogadores tacticamente cultos e multifuncionais A realidade do futebol Português mostra-nos que “o cargo de treinador principal de uma equipa profissional de futebol faz parte de uma estrutura muito volátil” (Paul, 2003: XXVIII), isto porque “está dependente dos resultados, e está permanentemente exposto à comunicação social e ao público” (Camacho, in Alves, 2004: 169). Desta forma, “se não existir uma política de clube relativamente à contratação do treinador sénior que vá de encontro com aspectos fundamentais do próprio clube, há a necessidade então que o Departamento de Formação tenha um modelo de jogo que considere ajustado à evolução dos jogadores de forma a potenciar esses jogadores” (Guilherme Oliveira, 2003: XXXIII). Isto porque, não nos parece coerente confrontar “os jovens jogadores com a necessidade de ano após ano lhe serem exigidos comportamentos completamente diferentes e em determinadas alturas mesmo antagónicos estamos a limitar completamente as suas capacidades e a sua evolução em toda a plenitude” (Guilherme Oliveira, 2003: XXXIII). Desta forma concordamos com Camacho (in Alves, 2004: 86) quando afirma que “um clube não pode depender de um treinador da equipa principal que pode mudar todos os anos e pode mesmo ter uma filosofia diferente da do clube. Um clube não pode ficar dependente das posições efémeras do seu treinador principal, tem de ter uma estratégia própria”. Paul (2003: XXVIII) é da mesma opinião afirmando que “não faz sentido que a formação esteja constantemente a adaptar-se ao que se passa na equipa A. O que faz sentido é que nós sejamos capazes de formar jogadores aptos para se adaptarem a qualquer modelo ou qualquer sistema, isso sim faz sentido”. Na realidade, parece-nos que o mais importante é que o processo educativo na formação do jogador consiga alcançar “a formação de um jogador inteligente, capaz de agir por ele próprio, utilizando os seus conhecimentos e as suas experiências” (Bayer, 1994, in Leandro, 2003: 3). 23
  • 31. Revisão da Literatura Independentemente das mudanças na equipa sénior, o Departamento de Formação deverá promover a estabilidade do projecto e formar jogadores inteligentes com grande capacidade de adaptação a diversos modelos de jogo. Vale (2003a: LXXIX) afirma que no Futebol Clube do Porto o objectivo não passa somente por “formar jogadores para a equipa principal, mas jogadores que sejam capazes de se adaptar a qualquer modelo de jogo. Porque achamos que se dotarmos os nossos jogadores de grande riqueza do ponto de vista táctico-técnico, eles têm condições para jogarem em qualquer modelo, em qualquer um dos futebóis que se joga por esse mundo fora e esse é o nosso grande objectivo”. Mourinho (2002a: 22) afirma que “cada vez mais os jogadores de primeira linha têm de ser multifuncionais”. Este treinador afirma mesmo que “não pode ter um jogador no seu plantel que só sabe jogar no seu modelo de jogo, porque no final do seu vínculo contratual vem outro treinador que, eventualmente, joga num modelo diametralmente oposto, e os jogadores têm de se adaptarem a um novo modelo. Assim, todos temos de nos adaptar a diversas funções, diversas filosofias, diversos sistemas” (Mourinho, 2002a: 22), ou seja, os jogadores têm de possuir uma cultura táctica que lhes permita desempenhar diversas funções independentemente do modelo de jogo adoptado. Pensamos que o processo de formação deve proporcionar ao jovem jogador a aquisição de uma vasta cultura táctica de forma a adquirir uma maior capacidade de adaptação aos diversos modelos de jogo que, certamente, encontrará ao longo da sua carreira. 24
  • 32. Revisão da Literatura 2.4.3. Corpo técnico deve estar identificado com o modelo de jogo “É cada vez mais importante este clube ter um documento com uma ideia, uma filosofia orientadora de todo esse processo”. Mourinho (2002a: 15) “Porque o futebol é um jogo, pode-se ganhar ou perder. [As pessoas] Deveriam, antes, preocupar-se sobre se trabalho bem ou mal”. Camacho (2003a: 51) "O homem mais importante num clube é o treinador. É quem decide, orienta, planeia e desenvolve um projecto". Jacquet (2003: 79) Para que haja uma linha de coerência em todo o processo de formação, “os técnicos envolvidos num projecto de formação devem possuir uma concepção unitária quer de clube, quer de jogo, quer de treino, quer do próprio modelo de jogador a formar. Unificar os critérios dos diferentes treinadores dos diferentes escalões é eliminar a possibilidade de conflitos perturbadores da normal evolução do jovem jogador” (Leal & Quinta, 2001: 48). Isto não deverá implicar restrições ao nível da criatividade individual dos treinadores limitando a evolução dos mesmos. No entanto, parece-nos uma medida essencial, porque permitirá uma harmonização das ideias acerca do modelo de jogo adoptado fazendo com que todos tomem a mesma direcção dando continuidade e identidade ao trabalho realizado independentemente do escalão em que o jovem jogador se encontre. Faria (2003: XCI) é da mesma opinião afirmando que “o importante é definir um perfil, de forma a encontrar a ligação com uma determinada forma de trabalhar e de treinar que permita operacionalizar as ideias fundamentais do modelo”. Para Vale (2003a: LXXIX) o mais importante num grupo de treinadores de um Departamento de Formação é que estes “funcionem no mesmo comprimento de onda, que a linguagem seja a mesma sobre as questões fundamentais. Depois é fundamental levarem à prática aquilo que definem do ponto de vista teórico”. Outro aspecto importante é a formação contínua dos treinadores, mas sendo esta promovida pelos próprios clubes. Esta medida teria como objectivo 25
  • 33. Revisão da Literatura principal “fazer com que os treinadores se identifiquem com uma determinada forma de trabalhar” (Leal & Quinta, 2001: 48). O Coordenador Técnico poderá assumir um papel fundamental a este nível fomentando este género de iniciativas. Segundo Giráldez (2002), “o Real Madrid forma os seus próprios técnicos através de sessões onde se explicam e clarificam um conjunto de conceitos, isto também tendo em vista a unificação de critérios dos treinadores”. Ou seja, indo de encontro à identidade que se pretende instituir no clube. O Sporting Clube de Portugal tem igualmente esta preocupação. Segundo Mil Homens (2004: 6), “este clube também promove a formação dos seus próprios técnicos através das Jornadas Técnicas da Academia onde é abordado um conjunto de temas ministrados por técnicos do próprio clube ou por técnicos de outros clubes, entre os quais Manchester United, Nantes e Real Madrid”. Um outro passo essencial para a unificação dos critérios e para uma melhor identificação e entendimento do modelo de jogo e do modelo de treino é a sistematização do pretendido em documento. Segundo Mourinho (in Lourenço, 2003: 121) “um documento deste tipo é extremamente importante porque é orientador de um processo” tendo como objectivo “definir o modelo de jogo com que me identifico assim como os respectivos princípios inerentes ao mesmo” e dar a conhecer a “todos os técnicos do clube objectivamente as ideias chave que lideram todo o processo de construção da equipa e assim possa objectivar o trabalho de formação de jogadores compatíveis com as nossas necessidades” (Mourinho, 2003a: 19). Com a elaboração deste documento verificar-se-á mais facilmente uma identidade ao nível do treino e do jogo e em função do pretendido na equipa sénior do clube ou do projecto de formação. Posteriormente, é necessário encontrar dentro da estrutura do clube pessoas capazes de em conjunto com o treinador principal controlar o processo de formação, nomeadamente, o Coordenador Técnico, para operacionalização do documento seja a mais aproximada possível. 26 que a
  • 34. Revisão da Literatura 2.4.4. Dificuldades na implementação do modelo de clube São várias as dificuldades identificadas na implementação do modelo de clube: A não estabilização de uma estrutura directiva (Leal & Quinta, 2001); Pouca estabilidade do treinador da equipa principal (Faria, 2003; Leal & Quinta, 2001; Graça, in Vieira, 2004; Paul, in Vieira, 2004; Vale, in Vieira, 2004); Inexistência de qualquer projecto bem elaborado com regras bem definidas (Faria, 2003); A formação dos treinadores, a necessidade de se identificarem com um determinado projecto e a capacidade de operacionalização condizente com esse projecto (Faria, 2003); O não estabelecimento de objectivos a médio e a longo prazo (Leal & Quinta, 2001). Todos estes factores dificultam a implementação de um projecto direccionado para a formação. De acordo com Guilherme Oliveira (2003: XXIV) “a estabilidade do treinador e a política do clube deve passar por uma definição de um processo de formação em que o modelo de jogo deve ser um dos aspectos fundamentais. E isto tem de pertencer a uma política de clube. O clube tem de achar que isto é importante e fazer disso um dos aspectos fundamentais da formação. Quando um clube não tem pessoas que sejam sensíveis a este aspecto, muito dificilmente será possível que o modelo de jogo seja implementado”. Ou seja, tem de se desenvolver entre os diversos responsáveis do clube uma crença no desenvolvimento do projecto para que este resulte. Neste aspecto, o Coordenador Técnico pode desenvolver um papel fundamental como responsável pela unificação dos critérios e verificação do cumprimento dos mesmos. 27
  • 35. Revisão da Literatura 2.4.5. Ajax: a escola de formação de referência “Nunca nos podemos dar por satisfeitos e manter uma visão crítica de cada um de nós. Uma constante vontade para evoluir. É este o princípio do Ajax e do Departamento de Formação do Ajax”. Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 77) "Um país não se mede pela dimensão das fronteiras, mas pelas ambições, valores e ideias”. Queiroz (2003a: 10) “A parte humana e atenção para o talento fazem do Ajax um grande clube”. Adriaanse (2004: 21) O Ajax é uma das melhores escolas formadoras de jogadores de futebol do mundo, onde se formaram jogadores de renome internacional, tais como, Johan Cruyff, Marco van Basten, Frank Rijkaard, Frank De Boer, Dennis Bergkamp, Marc Overmars, Edgar Davids, Patrick Kluivert, Clarence Seedorf, Edwin Van der Sar, e mais recentemente, os jovens jogadores Rafael Van der Vaart e Van der Meyde. A filosofia inviolável do Ajax está enraizada no clube desde os anos 30: “a combinação de técnica, inteligência, personalidade e velocidade de execução são melhor expressas de uma forma criativa, logo, com um futebol de ataque. A filosofia do clube está acima de qualquer resultado: jogar um futebol ofensivo e de risco, e não aceitar nada mais do que a expressão deste futebol no terreno de jogo” (Kormelink & Seeverens, 1997: X). Para fazer corresponder o processo de formação ao que é pretendido para o jogo, o Departamento de Formação utiliza o acrónimo “TIPS” para descrever os pontos fortes do jovem jogador do Ajax (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 63): “T (“technique”), técnica: um jovem jogador do Ajax tem de ser tecnicamente evoluído; I (“intelligence” e “insight”), inteligência e perspicácia. Capacidade de observar e de antecipar de forma a surpreender o adversário. P (“personality”), personalidade. Um talento do Ajax terá de ser capaz de comunicar com os outros, ser líder e criativo, demonstrar audácia, ser receptivo aos seus companheiros de equipa e de trabalhar de forma disciplinada. 28
  • 36. Revisão da Literatura S (“speed”), velocidade. Velocidade de marcação, de mobilidade, de execução e velocidade em grandes distâncias”. Desta forma, pretende-se que um jovem jogador do Ajax seja “tecnicamente dotado, futebolisticamente inteligente, com personalidade interessante e com boa velocidade” (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 64). Segundo Adriaanse (1993: VI) o grande segredo da formação do Ajax está no facto de “os nossos jogadores habituarem-se a jogar no nosso sistema desde muito jovens. À medida que vão crescendo, vão melhorando as suas capacidades para o lugar que lhes é destinado e quando tiverem 18 ou 19 anos, caso a equipa principal necessite deles, estão prontos, desde logo, a integrarem-se sem estranharem diferenças na forma de jogar. Já sabem perfeitamente quais as tarefas que têm de desempenhar”. Por outro lado, também se defende a ideia de que “é necessário encontrar jogadores multifuncionais. Eles têm de ter a capacidade de mudar de posições. No futuro, não haverá lugar no futebol de alto rendimento para jogadores que só sabem jogar numa posição” (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 65). Assim, dada a importância da universalidade, durante o processo de Formação os jogadores jogam em duas ou três posições para além da posição inicial para a qual foram seleccionados. Outros factores de sucesso apontados por Adriaanse (1993: VII) são “a forma de treinar em que se dá alta importância ao jogo enquanto meio de treino e a manutenção das mesmas pessoas a trabalhar nos escalões de formação de forma a perceberem melhor o clube e a sua mística que transmitem aos mais novos”. No Ajax não se descura a formação integral dos jovens jogadores. Segundo Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 74), “o Ajax dá alta prioridade à educação. No entanto, rejeitamos a ideia de colocar todos os jogadores na mesma escola. É essencial para o desenvolvimento da personalidade das crianças permitir o seu crescimento no seu meio, ou seja, com a sua família, na sua rua, com os seus amigos e na sua escola”. É por esse motivo que “não temos hotéis na academia. Assim, só os temos cá cerca de seis horas por dia” (Holsheimer, 2004: 23). 29
  • 37. Revisão da Literatura Desta forma, “o clube estabeleceu protocolos entre o clube e as escolas onde os jogadores estão matriculados que lhes permite frequentar a escola com currículos e horários especiais. Assim, os jovens jogadores têm a possibilidades de permanecer no clube entre as 13 e as 19 horas. Durante este espaço de tempo, o clube é responsável por: uma refeição, um treino, um tempo de estudo e pelo transporte escola/clube e clube/casa. Na estrutura do clube, existem espaços próprios para o apoio escolar, onde estão colocados um determinado número de professores, contratados pelo clube, que dão apoio aos jogadores com dificuldades escolares e que os acompanham nas deslocações compensando as aulas a que estes foram autorizados a faltar. Cerca de 50 por cento dos jogadores do Centro de Formação concluem estudos pré-universitários e alguns deles prosseguem um curso superior, mesmo depois de integrados na equipa sénior” (A Bola, 1996: 20). No interior do centro de treino “De Toekomst” (que significa em português “O Futuro”) existe “uma lista de regras de disciplina que, caso não sejam acatadas, podem, inclusivamente, levar à expulsão do clube” (Revista 10, 2004: 23). As regras principais são as seguintes: “nenhum jogador pode participar em jogos de futsal; uma acção violenta ou anti-desportiva não detectada pelo árbitro está sujeita a punição no interior do clube; não é permitido usar brincos e cabelo comprido; o uso de caneleiras é obrigatório nos treinos, para qualquer idade; as meias são obrigatoriamente puxadas para cima e a camisola tem de estar por dentro dos calções; cada jogador é responsável pela limpeza e manutenção das suas botas no final dos treinos; é proibida a utilização de telemóveis” (A Bola, 1996: 20). Assim, o sucesso do Ajax enquanto clube de formação parece estar relacionado com uma filosofia de clube bem definida e instituída ao longo de vários anos. Filosofia essa que tem em conta a formação futebolística e social dos jovens jogadores – formação integral – e onde imperam regras rigorosas de forma a criar jogadores disciplinados quer do ponto de vista táctico, quer do ponto de vista social. 30
  • 38. Revisão da Literatura 2.5. COORDENADOR TÉCNICO COMO DE TODO O PROCESSO DE FORMAÇÃO REGULADOR E DINAMIZADOR “ [O Coordenador Técnico assume] uma tarefa importante e difícil”. Mourinho (2002a: 15) Na implementação de um Modelo de Clube/Modelo de Formação é necessário que se verifique continuidade e similaridade de processos nos diferentes escalões quer ao nível do treino, quer ao nível do jogo. Mourinho (2002a: 15) é da mesma opinião ao afirmar que “um projecto de formação quando é implementado torna-se fundamental que os treinadores das camadas jovens saibam que direcção tomar e saibam de que maneira podem colaborar com o futebol mais importante do clube, que é o futebol sénior. Tem de haver uma similaridade nos processos todos e tem de haver um acompanhamento diário do futebol de formação, para ver de que forma há, de facto, similaridade entre o que se pretende e aquilo que é realizado”. Assim, “é necessário que exista alguém que faça a interligação entre os diversos departamentos, os diversos escalões e os diversos treinadores do clube, uniformizando para isso critérios de selecção, de orientação e, fundamentalmente, de acção” (Leal & Quinta, 2001: 49). Esse elemento deverá ser o Coordenador Técnico (Leal & Quinta, 2001; Latorre, 2004). Este cargo implica um grande conhecimento do funcionamento do clube e de toda a sua filosofia. Daí que Mourinho (2002a:15) refira que “é importante encontrar dentro da estrutura do clube pessoas capazes de estarem ao lado do treinador principal no controlo desse processo de treino”. Adriaanse (1996: 21) concorda com esta visão afirmando que “este cargo precisa de alguém identificado com toda a filosofia do clube”. 2.5.1. Funções do Coordenador Técnico Mourinho (2003e: 33) afirma que o Coordenador Técnico terá como principal função realizar “a relação pedagógica e metodológica entre a rotina da equipa principal e a rotina dos escalões de formação. Desta forma, este técnico observará os treinos e dialogará com o treinador principal que forma a perceber o que este último privilegia e o porquê de trabalhar de determinada forma”. 31
  • 39. Revisão da Literatura Posteriormente, a verificação da implantação do modelo de jogo é realizada através da acção do Coordenador Técnico, que assiste a treinos e jogos das diferentes equipas do Departamento de Formação (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997; Giráldez, 2003; Paul, 2003). No entanto, as tarefas e funções do Coordenador Técnico ultrapassam as questões estritamente relacionadas com o jogo e o treino propriamente ditos. Segundo Giráldez (2002), “as funções do Coordenador Técnico do Real Madrid estão relacionadas com a coordenação dos treinadores das equipas de Formação, desde o Real Madrid B até aos Benjamins e com a coordenação de todas as actividades diárias que existam na Cidade Desportiva das equipas de Formação (treinos, formação de treinadores, comunicação com os pais, eventos desportivos)”. 2.5.1.1. Comunicação com as equipas técnicas Uma das tarefas fundamentais do Coordenador Técnico está relacionada com a escolha dos treinadores do Departamento de Formação e com a comunicação que estabelece com estes de forma a assegurar que todos estejam bem informados e que todos se direccionem no mesmo sentido. Desta forma, no Ajax o Coordenador Técnico realiza reuniões todas as semanas com os treinadores e com os próprios directores de jogo (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 72): “Todas as semanas reúno-me com cada treinador e observo cada equipa a jogar pelo menos uma vez em cada duas semanas”. Ou seja, a comunicação entre os diferentes agentes dentro da estrutura do próprio clube e a observação do trabalho das diferentes equipas do Departamento de Formação por parte do Coordenador torna-se fundamental para se verificar identidade. Segundo Giráldez (2002), no Real Madrid esta preocupação também se verifica: “com Jorge Valdano [director desportivo na altura] havia uma reunião de direcção todas as semanas onde todos os treinadores expunham as diversas situações ocorridas nos treinos e jogos. Com Vicente del Bosque [treinador principal na altura] havia um diálogo muito directo”. Assim, “o Coordenador Técnico do Clube deve harmonizar as expectativas dos treinadores com os princípios e os objectivos propostos pelo clube, com o 32
  • 40. Revisão da Literatura fim de favorecer um trabalho em equipa e implicar ao máximo todos os agentes educativos do clube no processo de formação integral do jogador de futebol. O coordenador deve igualmente oferecer ideias contínuas de trabalho para aumentar a qualidade dos treinadores. O trabalho em equipa determinará o êxito do planeamento anual” (Latorre, 2004: 42). 2.5.1.2. Regulamento interno Outra tarefa do Coordenador Técnico passa pelo estabelecimento e/ou fazer cumprir do regulamento interno. Este documento tem como objectivo, “através das situações tipificadas, garantir a coerência desejável das atitudes e dos comportamentos dos jovens jogadores” (Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense, 2002: 82). Segundo Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 66), “o comportamento em grupo é extremamente significante para o jovem jogador do Ajax e isso significa que têm de aprender a ter consideração para com os outros. Desta forma, estabeleci um conjunto de regras disciplinares às quais os jogadores têm de aderir em absoluto. Acordos foram estabelecidos tendo em vista o comportamento durante os jogos e os treinos. A disciplina não tem de ser rígida, mas é essencial que as mesmas regras sejam aplicadas a todos os níveis. Nem mesmo as regras de comportamento para a hora do almoço podem diferir de uma equipa para outra. Daí a razão de colocar em documento escrito o regulamento”. Este mesmo princípio é seguido no Real Madrid, pois as regras de comportamento “não conhecem privilégios seja qual for o jogador. As normas dos treinos e dos jogos, nas concentrações servem para incutir nos jovens jogadores o que significa representar o Real Madrid” (Giráldez, 2002). Ou seja, pensamos que a cultura de clube incorpora um conjunto de valores e de princípios que devem ser respeitado por todos e transmitido aos jovens jogadores desde muito cedo. Isto permitirá fomentar “uma cultura distinta, não só ligada a forma de jogar, mas, também, a um vasto sentimento próprio que cada clube deve ter” (Neves, 2003: 37). 33
  • 41. Revisão da Literatura O estabelecimento de um regulamento interno torna-se fundamental de forma a normalizar os comportamentos dos jovens jogadores e pelo desenvolvimento de uma cultura específica do clube. 2.5.1.3. Comunicação com os Pais A comunicação com os pais dos jogadores deverá também ela ser assegurada pelo Coordenador Técnico. No Ajax, este aspecto é considerado muito importante, pois “os pais devem estar informados acerca do processo de formação dos seus filhos” (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997: 62). Esta mesma preocupação verifica-se no Real Madrid: “os Pais são uma figura vital para qualquer ser humano. E damos grande importância a este facto, pois temos organizado reuniões periódicas com os pais dos jogadores para trocarmos informações e adiantarmos os problemas que podem ter as situações que ocorrem no processo de formação: quando um jovem jogador chega ao clube, quando joga muito, quando não joga, quando deve abandonar o clube, quando não vive em Madrid. São situações periódicas que se repetem todos os anos” (Giráldez, 2002). Desta forma, os Pais devem ser informados acerca do processo de formação dos seus filhos e o Coordenador Técnico deverá assumir essa tarefa. 2.5.1.4. Outras tarefas Para além das tarefas supracitadas, Latorre (2004: 35) sistematizou em dez pontos um vasto conjunto de tarefas de coordenação: 1. “Criação de uma normativa interna geral. 2. Elaboração de organigrama técnico, horários, grupos de treino, distribuição de espaços. 3. Organização de competições para os grupos de Escolas. 4. Formação dos técnicos. 5. Controlo dos técnicos. 5.1. Reuniões. 5.2. Mecanismos de controlo de planificação, controlo de conteúdos, de sessões e tarefas de treino. 34
  • 42. Revisão da Literatura 5.3. Desenvolvimento de sessões práticas conjuntas com base em conteúdos táctico-técnico determinados. 5.4. Testes e sociogramas. 5.5. Assistência aos jogos. 6. Comunicação com os pais e encarregados de educação dos jogadores. 7. Organização de actividades de final de semestre e de curso. 8. Formação dos Directores de Equipa. 9. Trabalho multidisciplinar com outros agentes (médicos, massagistas, enfermeiros, directores). 10. Autoformação”. O Coordenador Técnico assume assim papel fundamental na construção de todo o processo de formação sendo o regulador e o verificador da identidade que se pretende instalar no clube ao nível do jogo, do treino e de todos os comportamentos fora e dentro do terreno de jogo, sendo um elemento essencial na dinamização desse mesmo processo. 35
  • 43. Material e métodos 3. MATERIAL E MÉTODOS 3.1. CARACTERIZAÇÃO DA AMOSTRA A amostra é constituída por uma entrevista ao Mestre Pedro Sá, Coordenador Técnico do Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense. 3.2. METODOLOGIA DE INVESTIGAÇÃO A parte teórica deste trabalho sustentou-se numa pesquisa bibliográfica e documental, de forma a seleccionar a informação pertinente para o estudo da problemática seleccionada. A nível prático, a metodologia utilizada na recolha dos dados consistiu numa entrevista registada através de um gravador Mini-disc digital Sony MZ-NH900 e a sua posterior transcrição para o papel com a devida autorização do entrevistado. É importante salientar que as questões eram abertas, de modo a que o entrevistado pudesse expor os seus pontos de vista de uma forma clara e pessoal. Posteriormente, as entrevistas foram transcritas para o programa Microsoft Office Word 2003 do sistema operativo Windows XP Professional. 3.3. RECOLHA DE DADOS A recolha de dados referente a este trabalho decorreu no dia 9 de Novembro de 2005, na Escola Secundária da Trofa, sendo que posteriormente tiveram lugar mais do que um encontro com o entrevistado para esclarecimento de dúvidas. 36
  • 44. Apresentação e análise da entrevista 4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DA ENTREVISTA Após a realização da revisão bibliográfica e da entrevista, será efectuada a análise das respostas do entrevistado, no sentido de se comparar e discutir o conteúdo das mesmas, tendo em vista os aspectos tratados na revisão bibliográfica. 4.1. A IMPORTÂNCIA FINANCEIRA, DESPORTIVA E FORMAÇÃO PARA O CLUBE DESPORTIVO TROFENSE SOCIAL DA “A nossa formação só faz sentido se formos capazes de a rentabilizar, se isso não acontecer, mais vale não termos formação”. Paul (2003: XXVII) “A melhor e única forma de preparar e antecipar o futuro é cuidar da preparação dos jovens que estão no clube. Assim sendo, teremos de encontrar as soluções para o presente, mas preparando o futuro deste clube”. Queiroz (2003b) “Esta direcção deixou bem claro que, desde que cheguei ao clube, a essência madridista devia estar presente no seu projecto e que a sua essência é a formação. Quando chegamos seis jogadores estavam na primeira equipa; hoje estão treze. Acredito neste modelo, que é arriscado, mas estamos convencidos que vai dar resultados”. Butragueño (2004) A formação no Clube Desportivo Trofense tem, segundo Sá, “uma importância vital, porque está a formar jogadores para o plantel sénior do clube”. Esta visão sobre a formação parece estar condizente com a revisão bibliográfica por nós efectuada. Como afirma Frade (2002, in Vieira, 2004: 26), “a formação é a base do futebol profissional, por isso tem de haver uma preocupação elevada com ela”. Giraldez (2002) é da mesma opinião afirmando que “a formação tem de ser a base dos plantéis [das equipas profissionais]”. Desta forma, clubes como o Ajax (Adriaanse, in Kormelink & Seeverens, 1997) e o Sport Lisboa e Benfica (Carraça, 2005b) definiram como objectivo a integração de, pelo menos, 3 jogadores por época desportiva no plantel sénior, tal como no Clube Desportivo Trofense (Sá). Segundo Sá, o plantel sénior do Clube Desportivo Trofense tem 10 jovens jogadores que realizaram a sua formação no Departamento de Formação do 37
  • 45. Apresentação e análise da entrevista clube, sendo que, neste momento, 5 desses jogadores competem regularmente. Neves (2003: 34) reitera que nos clubes do seu estudo (Futebol Clube do Porto, Vitória de Guimarães, Sporting Clube de Portugal, Celta de Vigo e Real Madrid) “os escalões de formação têm objectivos muito claros, que se prendem com a formação de jogadores de qualidade, para que possam competir na equipa mais representativa do clube, ou melhor na sua equipa de elite”. Desta forma, poderemos afirmar que o Clube Desportivo Trofense investe na formação, nomeadamente, através da integração de jovens jogadores no plantel sénior e da sua participação regular na competição em que o clube está enquadrado. Este procedimento parece estar de acordo com a revisão bibliográfica realizada. 4.1.1. Vantagens da integração de jovens jogadores formados no Departamento de Formação no plantel sénior do clube A integração de jovens jogadores vindos do Departamento de Formação no plantel sénior arrasta consigo um conjunto de vantagens muito importantes para o Clube Desportivo Trofense. Por um lado, faz com que o clube não necessite de recorrer exclusivamente ao mercado para comprar jogadores, pois o clube já forma os seus próprios jogadores, poupando com isso dinheiro. Segundo Giraldez (in Neves, 2003: 36), “no momento actual de crise financeira, os clubes, também por esta razão, têm que olhar para a formação como uma via muito válida na tentativa de resolver os seus problemas económicos. Neste momento, os clubes têm de pensar em ser autosuficientes”. De acordo com Paul (in Neves, 2003: 36) “em termos de salário, um jogador formado no clube, normalmente, aufere um vencimento inferior a um que foi contratado, permitindo ao clube poupar financeiramente na remuneração e nos custos que a compra de um jogador acarreta”. Assim, a vantagem financeira é umas das vantagens apontadas por Sá para a integração de jovens jogadores formados no clube no plantel sénior do Clube Desportivo Trofense. 38
  • 46. Apresentação e análise da entrevista Para Paul (in Neves, 2003: 36) “outra forma de rentabilizar a formação é vender jogadores vindos das categorias inferiores, que têm custo zero e a sua venda vai implicar um lucro de 100%”. De acordo com Sá, essa é, também, a perspectiva do Clube Desportivo Trofense, pois “qualquer processo de formação seria muito limitador se só tivesse como objectivo o quadro sénior do próprio clube. Aquilo que pensamos é que se for possível que os nossos jogadores sejam desejados por outros clubes a meio ou no final no processo de formação tanto melhor para nós”. O investimento na formação para além das vantagens financeiras tem, também, vantagens desportivas: o clube já conhece os jogadores e os jogadores já conhecem os seus responsáveis e aquilo que vão exigir deles. Segundo Mathé (2003), um jogador que sai das camadas jovens está sempre mais identificado com a equipa, a instituição, as cores, a história e os de mais valores que não deveriam perder-se. Sá segue a mesma linha de pensamento afirmando que os jogadores formados no clube desenvolvem um sentimento diferente de identificação com o clube, tendo mesmo por objectivo a constituição maioritária do plantel sénior com jogadores da terra. O entrevistado apontou, também, a formação como importante devido a razões sociais. Segundo Sá, o Clube Desportivo Trofense cumpre a prestação de um serviço público, pois permite que dezenas de jovens da terra tenham a oportunidade de praticar uma modalidade que gostam num enquadramento direccionado para a qualidade. Mathé (2003) vai ao encontro desta perspectiva afirmando que os clubes com os seus escalões de formação devem cumprir, também, uma função socialmente importante, que é a de permitir aos jovens praticarem desporto com boas condições. É possível, então, constatar que a formação é fundamental no Clube Desportivo Trofense, verificando-se vantagens financeiras, desportivas e sociais com este procedimento, estando em sintonia com a revisão bibliográfica efectuada. 39
  • 47. Apresentação e análise da entrevista 4.2. PROJECTO DE FORMAÇÃO: A CONTINUIDADE COMO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL “Continuidade é particularmente importante na formação. Agora estou mais concentrado no planeamento a longo prazo”. Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 61) “Uma Academia como a nossa faz um trabalho de longo prazo”. Mil-Homens (2003) “A continuidade é o ponto mais importante em qualquer negócio. Porque seria o futebol diferente? Não é num ano que se constrói o sucesso.”. Kenyon (2004: 25) O entrevistado definiu três aspectos fundamentais para se construir um processo de formação de qualidade. Primeiro, as pessoas, pois, de acordo com o mesmo, aquilo que dá corpo a um projecto de qualidade são as pessoas estando a referir-se aos jogadores, treinadores, directores, pais e espectadores. Em segundo, as condições de trabalho, porque sem campos e sem bolas não se pode treinar, nem jogar, e quanto mais e melhores forem essas condições, melhor se poderá conduzir o processo. Por último, a existência de um projecto de formação, pois, segundo o entrevistado, é necessário definir uma série de princípios e de referências que norteiem as decisões a tomar por parte de todos os intervenientes no projecto. Caso contrário, segundo o mesmo, será problemático. Esta perspectiva de Sá parece estar de acordo com Garganta (1990, in Leal & Quinta, 2001: 21) que aponta a formação de treinadores, dirigentes e pais, a existência de estruturas materiais, humanas e financeiras e um trabalho primado pelo rigor e pela organização, como fundamentais para elevar o estatuto do futebol praticado pelos mais novos. Faria (2003: LXXXVIII) é da opinião de que “a formação só é importante se estiver definido um projecto de formação”. Carraça (2005a: 46) afirma que aceitou o cargo de gestor para a área da formação do Sport Lisboa e Benfica com o objectivo prioritário de “organizar um trabalho estruturado, concertado e qualificado que possa potenciar, todos os anos, dois ou três jogadores para a equipa principal”. 40
  • 48. Apresentação e análise da entrevista Desta forma, podemos afirmar que a posição de Sá relativamente aos aspectos fundamentais para a construção de um processo de formação de qualidade vão ao encontro da revisão bibliográfica. 4.2.1. A filosofia de clube como ideal de difícil concretização Na revisão bibliográfica por nós realizada verificamos que a implementação de uma filosofia de clube/modelo de clube, entendida como um conjunto de linhas gerais e específicas que procuram direccionar e orientar a trajectória da organização do mesmo, seria a melhor forma de trabalhar. Tendo por objectivo a integração de jovens jogadores formados no Departamento de Formação no plantel sénior dos respectivos clubes, o referencial para a implementação de um modelo de clube passa pelo estabelecimento de um modelo de jogo comum a todos os escalões de formação e que este fosse de encontro ao modelo de jogo dos seniores. Sá concorda com esta perspectiva. A implementação de uma filosofia de clube/modelo de clube seria o ideal para se poder verificar continuidade de processos, entendendo-se por filosofia de clube/modelo de clube como um conjunto de princípios de actuação que têm de estar bem discriminados e descritos e tendo de haver coerência nesses mesmo princípios. Adriaanse (in Kormelink & Seeverens, 1997: 72) dá o exemplo do Ajax: “o ponto de partida é o jogo e a base é o sistema de jogo do Ajax, o qual percorre todos os escalões do clube. Esta é uma das nossas maiores diferenças em relação aos outros clubes”. No entanto, e segundo Sá, “o problema é que actualmente no nosso clube e penso que nos demais não está implementada essa tal filosofia de clube, algo que oriente a trajectória do clube durante algum tempo. E dado o contexto actual o que é que acontece? A meio da época a equipa sénior não está a ter resultados e inevitavelmente, ou tem sido a regra geral, o treinador vai embora. Ora, vindo outro treinador e o clube não tendo essa filosofia de clube implementada, ou seja, não dizendo do treinador para aquilo que ele vem, ele chega cá e altera tudo”. Assim, não há garantia de continuidade de processos. 41
  • 49. Apresentação e análise da entrevista Perante este contexto, Paul (2003: XXVIII) defende que “não faz sentido que a formação esteja constantemente a adaptar-se ao que se passa na equipa A”. Camacho (in Alves, 2004: 86) é da mesma opinião afirmando que “um clube não pode depender de um treinador da equipa principal que pode mudar todos os anos e pode mesmo ter uma filosofia diferente da do clube. Um clube não pode ficar dependente das posições efémeras do seu treinador principal, tem de ter uma estratégia própria”. Segundo Carraça (2005b: 13), no novo projecto para a formação do Sport, Lisboa e Benfica, “os modelos eleitos para o trabalho na área da formação não estão dependentes das mudanças de treinador da equipa principal”. Mediante o exposto, parece-nos coerente a decisão de realizar um Projecto de Formação no Clube Desportivo Trofense independente das opções do treinador principal da equipa sénior. Ou seja, o Projecto de Formação é autónomo do Departamento Sénior do clube. Pensamos que essa decisão vai ao encontro das opiniões encontradas na revisão bibliográfica. 4.2.2. O Projecto de Formação como solução de continuidade Dado o contexto actual, segundo Sá, o Departamento de Formação não pode estar constantemente a alterar a sua filosofia em função das alterações de treinador principal da equipa sénior. Esta perspectiva parece condizente com a revisão bibliográfica. Na opinião de Sá, “os projectos de formação, se são de formação, vão demorar tempo o que significa que os seus responsáveis poderão não ser sempre os mesmos ao longo do tempo. Portanto, o clube precisa de garantir uma certa continuidade de processos para que haja formação”. Segundo Vale (2003a: LXXVIII), “a formação num clube deve nortear-se por princípios bem sólidos e, se alguma coisa mudar, devem mudar as pessoas, mas não devem mudar os princípios que são aquilo que caracterizam e que são a identidade de um clube”. Segundo Sá, “o processo é longo, portanto, é preciso uma certa garantia de futuro. A garantia de futuro é dada através desses projectos”. Assim, e segundo Sá, as linhas orientadoras do projecto de formação passam por: um modelo de jogo adoptado comum para todos os escalões; um 42
  • 50. Apresentação e análise da entrevista modelo de treino adoptado comum para todos os escalões; conjunto alargado de equipas em competição; e, a escolha de treinadores com espírito crítico muito forte, dinâmicos, empreendedores e sempre disponíveis para aprender. De acordo com Faria (2003: LXXXVIII), “a formação é importante se tiver critérios de formação e se tiver, obviamente, objectivos concretos. Um projecto de formação é ter a definição de um conjunto de características que se pretende que esses jogadores quando formados possuam”. Ao fim de 4 anos de implementação do Projecto de Formação, este parece já estar a dar os seus frutos. De acordo com Sá, no Departamento de Formação do Clube Desportivo Trofense “no que diz respeito aos treinadores, jogadores e directores há um modo de proceder que está descrito e é evidente, e, porque já tem algum tempo, já é cultural. Quando os problemas surgem, quando é preciso tomar uma decisão, está inerente a filosofia do departamento. Porque toda a gente conhece e reconhece essa filosofia, quer através de documentos escritos, quer através de uma certa cultura que já está implementada”. 4.2.3. Identidade ao nível de treino e de jogo ao longo do processo de formação Mediante a revisão bibliográfica podemos constatar que “o ponto referencial de qualquer clube no que respeita à formação deve ser alicerçado numa filosofia que contemple a existência de um modelo de jogo, o qual, por sua vez, orientará a concepção de um modelo de treino, de um complexo de exercícios, de um modelo de jogador e mesmo de um modelo de treinador” (Leal & Quinta, 2001: 27). E esse referencial para o Departamento de Formação deveria ser o “referencial máximo que é aquilo que se faz no topo que é a equipa principal de um clube” (Vale, 2003a: LXXIII). Segundo Adriaanse (1997, in Kormelink & Seeverens: 72), “no Ajax os treinadores e os jogadores sabem exactamente como é que a estrutura final deve ser: o sistema de jogo é totalmente familiar. Os treinadores e os jogadores pensam o jogo a partir do sistema de jogo do Ajax”. 43