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Bolonha à portuguesa? 
Subscrita pelo governo português em 1999, a Declaração de Bolonha visa estabelecer 
um espaço europeu de educação superior harmonizado, competitivo e atractivo. Trata-se, 
sem dúvida, de uma política pública estrutural, de tipo transnacional, visando 
assegurar a legibilidade e comparabilidade dos graus, elementos de resto indispensáveis 
à organização de um sistema baseado na emulação e em propósitos de concorrência 
típicos do funcionamento dos mercados, em busca de um elevado "grau de atracção 
mundial". 
Consequentemente, a lógica da construção de um mercado competitivo exigirá, 
seguidamente, a adopção de sistemas transnacionais de padrões, de acreditação e de 
avaliação, com a possível produção de "ratings", ou mesmo de "rankings", das 
instituições a nível europeu. E também a competição por estudantes de distintos países e 
por financiamentos públicos escassos será incrementada, desde logo no interior de cada 
instituição, através da criação de "mercados internos". Esta é a face mercantil por 
muitos considerada típica das reformas do Estado e da educação pública, de há muito 
em curso em diversos contextos, fundada sobre "motivações económicas" 
(empregabilidade, competitividade, adaptabilidade, etc.). 
Entre nós, um elevado número de cursos e de escolas iniciará no presente ano lectivo 
(2006-2007) a prática do Processo de Bolonha, após um longo período marcado por 
uma manifesta falta de liderança política dos governos, dos órgãos de coordenação e 
representação de universidades e institutos politécnicos e, em muitos casos, das 
direcções das próprias instituições de ensino superior. 
Muito se encontra ainda por esclarecer e definir, num processo que cedo foi enviesado 
pelas questões do financiamento, pelo correspondente tacticismo das escolas e por 
interesses de ordem profissional. 
Em todo o caso, as escolas e os professores investiram muito na adequação dos cursos, 
cumprindo os requisitos jurídicos que lhes foram impostos. No plano formal o Processo 
de Bolonha entra em vigor num elevado número de cursos. Nuns casos resultando em 
profundas alterações estruturais e de perfil e filosofia de formação, noutros, porém, 
introduzindo mudanças mais superficiais e adaptações marcadas pelo novo léxico 
reformador e respectivas categorias (unidade curricular, resultados da aprendizagem, 
horas de contacto, etc.). 
Mas se a reforma da pedagogia universitária proposta pelo Processo de Bolonha, sem 
dúvida a sua dimensão mais positiva, ficar limitada a aspectos formais e terminológicos, 
é como se tudo tivesse mudado para que tudo ficasse na mesma em termos de ensino, de 
aprendizagem e de avaliação. Não chega o consenso genérico e aparentemente 
partilhado pela maioria de que os currículos são tradicionalmente rígidos e 
enciclopédicos, o ensino é magistral, a avaliação muito tradicional, a pedagogia 
conteúdista, as taxas de insucesso e de abandono elevadas. 
A introdução de um novo paradigma educacional exigirá uma reorganização pedagógica 
profunda, maior flexibilidade curricular, uma distinta organização do trabalho docente e 
discente, a adopção de esquemas de apoio tutorial, novas formas de avaliação 
pedagógica e novos calendários e processos de avaliação, maior articulação entre ensino 
e pesquisa, turmas mais pequenas, atenção à educação superior também nos planos 
cultural, ético-político e cívico. Enfim, uma revolução pedagógica que, sendo certo que 
foi já parcialmente iniciada em alguns cursos e escolas, se encontra longe de estar 
generalizada e de ser fácil de consolidar. 
Não é porém credível que as referidas mudanças possam ser introduzidas sem um 
grande investimento financeiro inicial, que exigirá alguns anos, com vista à formação de
docentes, às mudanças organizacionais indispensáveis, à diminuição do número de 
alunos por professor, à distinta contabilização das horas de trabalho pedagógico (lectivo 
e não lectivo) de cada docente, à introdução do ensino por equipas docentes, ao reforço 
das actividades de iniciação à investigação, à supervisão mais próxima e mais 
individualizada de trabalhos de campo, de projectos, estágios, etc.. 
Em termos mais estruturais, o próprio estatuto da carreira docente terá de contemplar as 
mudanças referidas, tal como as regras de financiamento das instituições, questões de 
importância nuclear que se encontram por equacionar, sem esquecer os possíveis 
impactos de ordem sistémica, designadamente no que ao ensino secundário se refere. 
Trata-se, em suma, não apenas de uma mudança de ordem cultural e profissional no que 
concerne ao trabalho dos professores, nem somente da exigência de mudanças 
significativas no trabalho dos alunos e na gestão dos seus quotidianos e dos seus estilos 
de vida. Embora imprescindíveis, tais mudanças não serão suficientes para, em termos 
voluntaristas, assegurar um novo modelo pedagógico. São imprescindíveis decisões 
políticas, condições financeiras e organizacionais para induzir e apoiar as mudanças. 
Neste capítulo, não existem razões para optimismo. A redução da duração dos cursos 
parece constituir uma boa oportunidade para lógicas de racionalização e redução de 
encargos por parte do Estado, e não para reforçar condições de trabalho e perseguir a já 
conhecida retórica da qualidade. Como orientar tutorialmente pequenos grupos em 
gabinetes colectivos ou em cubículos individuais onde não se consegue receber três ou 
quatro estudantes? Como garantir e dignificar esse trabalho se se decide não contabilizá-lo 
como serviço docente? Como é possível continuar a adoptar o conceito e as práticas 
de época de exames e, mesmo, de exame final? Como continuar a insistir numa 
organização baseada em ganhos de escala, induzidos pela fórmula de financiamento, 
quando a pequena escala se revela mais congruente com as exigências pedagógicas? 
A menos que o processo evolua rapidamente de forma positiva, arriscamo-nos a 
construir Bolonha à portuguesa, o que entre nós significaria, tradicionalmente, Bolonha 
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  • 1. Bolonha à portuguesa? Subscrita pelo governo português em 1999, a Declaração de Bolonha visa estabelecer um espaço europeu de educação superior harmonizado, competitivo e atractivo. Trata-se, sem dúvida, de uma política pública estrutural, de tipo transnacional, visando assegurar a legibilidade e comparabilidade dos graus, elementos de resto indispensáveis à organização de um sistema baseado na emulação e em propósitos de concorrência típicos do funcionamento dos mercados, em busca de um elevado "grau de atracção mundial". Consequentemente, a lógica da construção de um mercado competitivo exigirá, seguidamente, a adopção de sistemas transnacionais de padrões, de acreditação e de avaliação, com a possível produção de "ratings", ou mesmo de "rankings", das instituições a nível europeu. E também a competição por estudantes de distintos países e por financiamentos públicos escassos será incrementada, desde logo no interior de cada instituição, através da criação de "mercados internos". Esta é a face mercantil por muitos considerada típica das reformas do Estado e da educação pública, de há muito em curso em diversos contextos, fundada sobre "motivações económicas" (empregabilidade, competitividade, adaptabilidade, etc.). Entre nós, um elevado número de cursos e de escolas iniciará no presente ano lectivo (2006-2007) a prática do Processo de Bolonha, após um longo período marcado por uma manifesta falta de liderança política dos governos, dos órgãos de coordenação e representação de universidades e institutos politécnicos e, em muitos casos, das direcções das próprias instituições de ensino superior. Muito se encontra ainda por esclarecer e definir, num processo que cedo foi enviesado pelas questões do financiamento, pelo correspondente tacticismo das escolas e por interesses de ordem profissional. Em todo o caso, as escolas e os professores investiram muito na adequação dos cursos, cumprindo os requisitos jurídicos que lhes foram impostos. No plano formal o Processo de Bolonha entra em vigor num elevado número de cursos. Nuns casos resultando em profundas alterações estruturais e de perfil e filosofia de formação, noutros, porém, introduzindo mudanças mais superficiais e adaptações marcadas pelo novo léxico reformador e respectivas categorias (unidade curricular, resultados da aprendizagem, horas de contacto, etc.). Mas se a reforma da pedagogia universitária proposta pelo Processo de Bolonha, sem dúvida a sua dimensão mais positiva, ficar limitada a aspectos formais e terminológicos, é como se tudo tivesse mudado para que tudo ficasse na mesma em termos de ensino, de aprendizagem e de avaliação. Não chega o consenso genérico e aparentemente partilhado pela maioria de que os currículos são tradicionalmente rígidos e enciclopédicos, o ensino é magistral, a avaliação muito tradicional, a pedagogia conteúdista, as taxas de insucesso e de abandono elevadas. A introdução de um novo paradigma educacional exigirá uma reorganização pedagógica profunda, maior flexibilidade curricular, uma distinta organização do trabalho docente e discente, a adopção de esquemas de apoio tutorial, novas formas de avaliação pedagógica e novos calendários e processos de avaliação, maior articulação entre ensino e pesquisa, turmas mais pequenas, atenção à educação superior também nos planos cultural, ético-político e cívico. Enfim, uma revolução pedagógica que, sendo certo que foi já parcialmente iniciada em alguns cursos e escolas, se encontra longe de estar generalizada e de ser fácil de consolidar. Não é porém credível que as referidas mudanças possam ser introduzidas sem um grande investimento financeiro inicial, que exigirá alguns anos, com vista à formação de
  • 2. docentes, às mudanças organizacionais indispensáveis, à diminuição do número de alunos por professor, à distinta contabilização das horas de trabalho pedagógico (lectivo e não lectivo) de cada docente, à introdução do ensino por equipas docentes, ao reforço das actividades de iniciação à investigação, à supervisão mais próxima e mais individualizada de trabalhos de campo, de projectos, estágios, etc.. Em termos mais estruturais, o próprio estatuto da carreira docente terá de contemplar as mudanças referidas, tal como as regras de financiamento das instituições, questões de importância nuclear que se encontram por equacionar, sem esquecer os possíveis impactos de ordem sistémica, designadamente no que ao ensino secundário se refere. Trata-se, em suma, não apenas de uma mudança de ordem cultural e profissional no que concerne ao trabalho dos professores, nem somente da exigência de mudanças significativas no trabalho dos alunos e na gestão dos seus quotidianos e dos seus estilos de vida. Embora imprescindíveis, tais mudanças não serão suficientes para, em termos voluntaristas, assegurar um novo modelo pedagógico. São imprescindíveis decisões políticas, condições financeiras e organizacionais para induzir e apoiar as mudanças. Neste capítulo, não existem razões para optimismo. A redução da duração dos cursos parece constituir uma boa oportunidade para lógicas de racionalização e redução de encargos por parte do Estado, e não para reforçar condições de trabalho e perseguir a já conhecida retórica da qualidade. Como orientar tutorialmente pequenos grupos em gabinetes colectivos ou em cubículos individuais onde não se consegue receber três ou quatro estudantes? Como garantir e dignificar esse trabalho se se decide não contabilizá-lo como serviço docente? Como é possível continuar a adoptar o conceito e as práticas de época de exames e, mesmo, de exame final? Como continuar a insistir numa organização baseada em ganhos de escala, induzidos pela fórmula de financiamento, quando a pequena escala se revela mais congruente com as exigências pedagógicas? A menos que o processo evolua rapidamente de forma positiva, arriscamo-nos a construir Bolonha à portuguesa, o que entre nós significaria, tradicionalmente, Bolonha "para inglês ver". http://www.apagina.pt/arquivo/Artigo.asp?ID=4871