1. MODERAÇÃO E TEMPERANÇA (14/10/08)
Dizia alguém que a convivência exige um equilíbrio difícil. Também entre o corpo e a alma, matéria e
espírito. Nessa convivência que se dá em nós; de matéria e espírito, quando se dá a separação dos dois,
o resultado é a morte. Não se pode puxar demais para o lado do espírito, porque não somos anjos; nem
demais para a matéria porque não somos animais. Para entender esse equilíbrio, pensei nas balanças
antigas, com dois pratos. Colocam-se os pesos de um lado e do outro aquilo que se vai pesar. Quando o
fiel da balança chega ao meio, sabemos qual é o peso. Mas há balanças falsificadas. Em nossa vida
precisamos de balanças fiéis.
Fala-se em moderação, equilíbrio e evitar exageros; mas onde começa e termina o exagero? O grande
exemplo que temos do equilíbrio perfeito é Jesus Cristo. Jesus vai a festas, jantares; não é um radical
anti-alegria. Muitas vezes foi convidado para reuniões. Aceitava saborear as alcachofras, uvas, tâmaras,
cordeiro assado, empada de peixe. Provavelmente elogiava a cozinheira, agradecia o convite, ria com
as pessoas, num ambiente sadio e construtivo. Jesus Cristo multiplicou o vinho num casamento.
Produziu entre 400 e 600 litros de vinho; converteu a água em vinho bom e o chefe da mesa,
responsável pela bebida, elogiou o vinho. Cristo não condenou o gasto que os noivos fizeram para a
festa, equivalente a uns 200 dias de trabalho. Ele sabia a importância que se dá a essa cerimônia.
Também nós devemos buscar a autêntica moderação. Vivemos num mundo consumista, hedonista, não
podemos cair num comodismo que leva a fugir de todo esforço.
Havia um homem que dizia: “Tudo com medida”→ alimentação comedida, bebida comedida, amor à
esposa medido (tinha uma amante), religião medida (rezava uma vez por mês). Não é um moderado;
esse homem é medíocre.
A palavra TEMPERANÇA é pouco usada. (Sophrosyne, do grego → composição de partes num todo).
Temperamento é um modo de ser organizado. O clima temperado está equilibrado. O tempero da
comida dá equilíbrio no gosto do alimento. Temperança é ordem e equilíbrio em nós mesmos. No
rodízio de carnes é se controlar. É medir o que se bebe, não perder o autocontrole.
Diz um autor: A Temperança é voltar-se para si próprio de forma desinteressada e generosa; mas com
abertura para Deus e os outros. A intemperança é uma autodestruição; desordem no todo. Decompõe e
estraga forças que há no ser humano, dirigindo-as para o mal.
Forças boas existentes no ser humano:
-estritamente auto-conservação: subsistência, conservação da espécie
-auto-realização. O ser humano busca realizar-se
-auto-afirmação frente aos demais.
2. Na tendência para a conservação da espécie está a sexualidade humana. Se é exagerada, leva à
decadência moral. Costuma-se dizer que foi uma das causas da queda do Império Romano.
A auto-afirmação é natural; mas seu excesso descamba para a vaidade. O exibicionismo doentio leva à
perda da naturalidade.
O desejo louco de auto-realização leva à ambição e destruição da própria pessoa.
Por que esses exércitos de defesa se tornam auto-destruidores? Porque é próprio do ser humano bem
constituído, amar a Deus em 1º lugar, aos outros em 2º e só olhar para si em terceiro. O lado doentio do
amor-próprio volta-se só para si. Os descontrolados não são virtuosos. O avaro que não fuma nem bebe
para economizar, não o faz por virtude; é egoísmo. Quem, por pura vaidade não come doce está dando
culto ao “eu”.
A Temperança vigia e corrige a atuação humana. Corrige a tendência a colocar-se na frente de Deus e
dos outros; a prevalecer sobre o próximo. Vamos ouvir o que o outro tem a dizer, pode ser que tenha
uma parte de razão... Quem busca a sensação, fica escravo dos jogos de azar. A atuação da Temperança
mostra que o justo meio é o cume entre dois abismos.
Não falar nada ou falar como uma matraca. A impaciência ou o aparvalhamento. A indecisão ou a
temeridade. Mas não o equilíbrio da acomodação ou mediocridade. Desde outubro de 2001 alguns
pensadores começaram a dizer que a religião tende ao fanatismo. No que tange ao Cristianismo pode-se
dizer que leva ao equilíbrio, maturidade, autenticidade. Jesus não diz: “Se não matas ou não roubas já
és bom.” Pelo contrário, Jesus diz: “Sede perfeitos como o meu pai que está no céu é perfeito”.
“Enquanto não me curar dessa depressão não faço mais nada”. Tanta gente, mesmo deprimida,
continua agindo, vivendo. “Só em casa, não sai de casa”. A pessoa fica parecendo uma pata chocando
um ovo. “Só estudo, enquanto não passar no concurso; não faço mais nada!” E a família? Acordar mais
cedo no domingo para ir à missa não é fanatismo; é vencer a preguiça.
Na “Eneida”, Enéias encontra Dido. Ambos viúvos, são flechados por Cupido. Apaixonam-se e ele vai
ficando por ali. Reluta em partir e cumprir sua missão. Os barcos estão presos na praia, e Enéias, com
sua espada, corta-lhes as amarras para poder seguir em frente. O gosto excessivo pela internet precisa
ser cortado. O gosto exagerado pelo álcool.
Vamos observar nossa vida aos olhos da Temperança. Estamos ignorando nosso compromisso para
com Deus?
EXAME
3. - No meio de uma sociedade consumista e hedonista, dominada pelo culto ao prazer, sei viver a
moderação e o desprendimento dignos de um verdadeiro cristão?
- Pratico a falsa moderação das almas egoístas, que fogem dos ideais por medo do sacrifício?
- Percebo que o maior abuso e exagero é colocar-me no centro de tudo e Deus em último lugar?
- Sei que só haverá moderação quando eu souber conjugar todos os meus deveres sociais, familiares,
religiosos, etc.?
- Oriento a vida conjugal de acordo com a lei de Deus e o magistério da Igreja?
- Esforço-me por praticar mortificações, pequenos sacrifícios, para me ajudar a viver a temperança?
2ª PALESTRA
Vimos que a Temperança leva à ordem interior, domínio próprio, e que a intemperança leva ao
desespero. Quem busca sofregamente satisfazer seu orgulho, sua vaidade, pode ter pequenas
satisfações, mas com um tom de azedume.
“Quando minha mulher teve problema nos pés, o doutor aconselhou sapatos largos, sem saltos. Um dia,
quando se arrumava para uma festa, olhou-se no espelho e viu que ficavam mal com o vestido caro que
comprara. Calçou os elegantes sapatos altos e partiu, torcendo o pé logo a seguir. Estóica, agüentou
firme e continuou caminhando. Assim que saiu do elevador, a empregada do embaixador japonês
dirigiu-se a nós dizendo: “Será que os senhores poderiam deixar os sapatos aqui fora?”.
O comodismo esvazia a vida. A intemperança mostra que o pecado escraviza, prende, é um peso que
esmaga. São Josemaria (Caminho - 195): “Acertou quem disse que a alma e o corpo são dois inimigos
que não se podem separar, e dois amigos que não se podem ver.” São dois amigos que precisam manter
distância.
Jesus Cristo dizia: “Não vim trazer a paz, mas a espada”. A espada que tem que cortar e dizer:- “Isso
não”. A verdadeira moderação deve empunhar a espada do sacrifício. Estamos desequilibrados na
busca das sensações e do excesso de conforto. Dizia São Josemaria (Amigos de Deus - virtudes
humanas – 84): “Temperança é espírito senhoril. Nem tudo o que experimentamos no corpo e na alma
deve ser deixado à rédea solta. Nem tudo o que se pode fazer se deve fazer. É mais cômodo deixar-se
arrastar pelos impulsos que chamam naturais; mas no fim de semelhante caminho encontra-se a
tristeza, o isolamento na miséria própria.”
Campos principais para exercício da temperança na nossa vida diária:
Podemos colocar 5 pesos nessa balança para ver como funciona.
4. 1) Curiosidade – exercitar o domínio da curiosidade. Há uma tendência a querer saber tudo,
mesmo o que é tolo e inútil. Certa pessoa contava: - Quando meu marido precisou viajar dois dias
antes do meu aniversário, deixou-me um embrulho lindo, com a recomendação de que só o abrisse
na data certa. Não resisti e abri. Em vez de perfume ou jóia, encontrei um cartão que dizia: “Vou
telefonar no dia do seu aniversário para dizer onde escondi seu presente de verdade”.
Para que olhar um cartaz ou um filme indecente? Não estar olhando para todos os lados ajuda a
não perder tempo com distrações.
2) Bens materiais – É bom refrear os impulsos do consumismo; contentar-se para viver com as
coisas básicas. Os produtos eletrônicos tornam-se obsoletos rapidamente. É preciso humildade e
realismo.
Disse alguém: “O dinheiro só proporciona os bens que podem ser comprados: coisas e serviços.
Não proporciona paz da alma, desfrute da beleza, amizade, calor do amor, pequenas delícias da
vida familiar, nem o encontro com Deus, honradez, inteligência, conhecimento, dinheiro não
torna ninguém bom pai de família ou bom cristão.”
Há os que são apegados ao que é velho e confortável. Não se desfazem nem daquela camisa que
já está puída, do chinelo esburacado. Há um momento em que se deve dizer CHEGA!
3) Bens sensíveis da Alimentação.
Observemos que Jesus Cristo tinha tudo a seu dispor e multiplicava pães e peixes para a
multidão, porém para si mesmo não usava desses recursos. O domínio sobre a comida mostra
senhorio, controle.
Escreve são Josemaria Escriva: “No dia em que te levantares da mesa sem ter feito uma
pequena mortificação, comeste como um pagão”.
Certa mãe leu esse ponto para seu filho de 6 anos. Logo o menino perguntou o que era
mortificação. A seguir indagou : -“O que é um pagão?” A mãe respondeu-lhe. (silêncio) -“Mãe,
faz 6 anos que como como um pagão”.
A pessoa que não se controla na alimentação fica mais embotada em relação às coisas do
espírito. O ser humano é assim. Numa pessoa que se diz cristã, a gula pode decepcionar aqueles
com quem convive. “Se sou inteligente, por que como tanto?” é o título de um best-seller
aparecido há alguns anos.
4) Bebida: com moderação não há problema. Passando de certo limite é ofensa a Deus. Quando
pequena, Santa Mônica gostava tanto de vinho que, ao ter que apanhá-lo na adega, ela sempre
5. experimentava; e cada vez bebia um pouco mais. Um dia foi admoestada por uma escrava que a
acompanhava:
-“És uma beberrona e nada mais!” e ameaçou denunciá-la aos pais. A menina, naquele instante,
resolveu cortar o vício.
5) Os Prazeres ligados à sexualidade
Deus quis associar um prazer forte à sexualidade para garantir a sobrevivência da espécie.
Dentro do matrimônio, o sexo é querido por Deus. Antes do casamento convém viver a
temperança através da abstinência. É difícil mas é formativo. Facilita para muitos pais e avós ter
vivido a abstinência. Para os casados inclui a fidelidade. Ter cuidado com os (as) colegas de
trabalho. Fidelidade nos olhares, nos pensamentos.
“Todo o que olhar para uma mulher cobiçando-a, já adulterou com ela”.
Um cantor famoso viveu muitos anos com sua esposa até que ela faleceu. Três anos depois
começou a namorar outra pessoa. Ele então comentou numa entrevista: “Quando ela subiu ao
palco pensei: - Como é bonita! Espantei-me pois não olhava assim para outras mulheres, já há
30 anos. Pois quando vivia com minha esposa, não olhava para outras...”. Isso é muito bonito.
Revistas, filmes, internet apresentam cenas inconvenientes, é importante cuidar-se. Temperança
também para viver o relacionamento sexual, sem negar o débito conjugal. Seria bom elevar aos
céus a oração do Eclesiástico (23, 4-6):
“Senhor pai e Deus de minha vida,
não me abandones aos seus caprichos, (do inimigo)
não me dês olhar altivo,
afasta de mim a cobiça,
não me dominem o apetite sexual e a luxúria,
não me entregues ao desejo impudico.”
No coração do cristão tem que haver a postura de agradecimento. Elevemos o coração a Maria, que
viveu a ordem plena; que ela nos guie no caminho da Temperança, para que possamos viver o amor de
forma semelhante a ela.