Lisboa no século XVI era um importante ponto de encontro de culturas devido ao comércio marítimo português. A cidade era descrita como uma "rainha dos oceanos" e um local onde se cruzavam pessoas de diversos continentes. Autores como Damião de Góis enfatizavam o papel central de Lisboa como porta de entrada entre a África e Ásia para os portugueses. A cidade era vista como um símbolo do império português e de seu poder marítimo.
1. MOOC LISBOA E O MAR – TEMA 1 | LISBOA NO SÉC. XVI: ESPAÇO DE ENCONTRO DE
CULTURAS NA HISTÓRIA GLOBAL
1
Lisboa no séc. XVI: espaço de
encontro de culturas na
história global
Ana Paula Avelar
MOOC - LISBOA E O MAR
TEMA 1
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CULTURAS NA HISTÓRIA GLOBAL
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“Duas são as cidades que, nos nossos tempos, poderíamos
designar por senhoras do Oceano e como que suas rainhas. Às
suas ordens e sob sua dominação, nos nossos dias, Oriente e
Ocidente em conjunto estão abertos à navegação.”
Damiao de Gois1
Lisboa e, no seculo XVI, como escreve entao um cronista portugues, uma das rainhas
dos oceanos, a par de Sevilha, nela se cruzando uma multidao de novas e desvairadas
gentes, vindas de varios continentes. Importa, no entanto, ter em atençao, quando
historiografamos um tempo, que, como sistematiza A. G. Hopkins no seu livro, Global
History- Interactions between the Universal and the local:“(…) the study of history develops
in two ways. One impulse derives from revisions proposed by scholarly body itself as a
result of dissatisfaction with dominant approaches and interpretations; the other reflects
the influence of events in the wider world, which help to give each generation of historians
its priorities and distinctive character. When the two influences are brought together,
conditions are set for fundamental change.”2 Assim, compreender a cidade como um
privilegiado lugar de encontro e a nossa proposta.
Desvendemos, ainda que em breves traços, o espaço de onde os portugueses saíam.
Esbocemos o quadro do reino de Portugal, considerando que, na Europa de entao, o espaço
terrestre e ainda intuído de um modo descontínuo.
Sera gradualmente que os europeus se vao apercebendo das continuidades
espaciais.
1Damiao de Gois, Elogio da Cidade de Lisboa- Urbis Olisiponis Descriptio,Lisboa, Guimaraes Ed., 2002, p.83.
2 A. G. Hopkins, Global History – Interactions between the Universal and the local, New York , Palgrave –
Macmillan, 2006, p. 3.
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CULTURAS NA HISTÓRIA GLOBAL
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A descriçao dos lapoes, como nervosos, de estatutura medíocre, mas possuidores de
admiravel destreza, na Lappiae Descriptio,3 feita por Damiao de Gois, ou as expediçoes deste
autor por terras dos tartaros, constituem, a este nível, discursos relevantes para a
compreensao da forma como se elogia os que, ainda por terras da Europa, se aventuram no
desconhecido. E um contemporaneo de Gois, Andre de Resende, que o enaltece por este ter
vivido entre uma tribo de tartaros a qual: “ (...) nao temia a Deus e estava sempre pronta
para a carnificina num acesso de paixao (...) ”4.
A densidade populacional apresentava, ao longo do seculo XVI, diferenças
acentuadas. A populaçao era predominantemente rural e as cidades eram de pequena
dimensao, destacando-se, no início deste seculo, sem contar com Constantinopla, so Paris e
Napoles que teriam mais de 100 000 habitantes, estando Veneza e Milao proximas deste
numero.
As capitais dos reinos, centros administrativos, ou importantes portos sofrem um
crescimento privilegiado. Neste contexto o comercio oceanico permite que, as importantes
cidades italianas, emporios comerciais mediterranicos, se juntem, ainda no seculo XVI, as
cidades de Lisboa, Sevilha e Antuerpia.
Note-se, igualmente, que nos nucleos urbanos persiste uma ambiencia rural atraves
da manutençao das hortas, da criaçao de aves e de porcos… . Assiste-se, todavia, a uma certa
estratificaçao na estruturaçao social urbana. A tipologia da organizaçao do espaço urbano
esboça-se, encontrando-se intervençoes para a sua melhoria. Por vezes estas acontecem na
sequencia de surtos epidemicos. Na sua Da FABRICA que falece ha cidade de Lisboa
Francisco d’Holanda assinala a forma como a cidade evoluiu, referenciando, entre outros
3 Traduçao de Dias de Carvalho. Damiao de Gois, Opúsculos Históricos, Porto, Livraria Civilizaçao, 1945,p. 205.
4Citado por Elisabeth Feist Hirsch, Damião de Góis, Lisboa, Fundaçao Calouste Gulbenkian, 1987, p. 32.
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CULTURAS NA HISTÓRIA GLOBAL
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aspectos, a edificaçao do Hospital por D. Joao II, a renovaçao manuelina da muralha da parte
do mar com o cais e novos paços, ou ainda a construçao do sumptuoso mosteiro de Belem,
da torre de Belem, e da Misericordia.
Ao abordar o desenvolvimento de cidades e nucleos urbanos, em Portugal, ao longo
deste seculo, deve-se assinalar aquilo que podemos designar como a capitalidade de Lisboa
em Quinhentos, a sua dimensao metropolitana e internacional. Naquele que e o retrato do
reino de Portugal neste espaço de tempo tem-se como primeiro elemento caracterizador o
numeramento de 1527-315. Antonio Borges Coelho traçou um quadro vivo onde: “O
desenho dos dados populacionais, compassados no mapa de Portugal Continental, fez
surpreender a uma luz objectiva a face do País.”6 Anotam-se tres focos atlanticos de
concentraçao populacional, os quais nao devem ser considerados como marca de um
atlantismo, pois as comarcas do interior, apesar do gigantismo de Lisboa, dominam o
traçado (53% contra 47%)7. Por seu turno, a fronteira terrestre não desertifica, desenvolve.
No ambito desta nossa analise dos discursos que, entao, se constroem, nao podemos ficar
condicionados por estes dados, por muito importante que eles o sejam para o processo
hermeneutico. Devemos, portanto, percepcionar as diferentes modalidades discursivas,
sejam estas textuais, sejam visuais.
Portugal e a sua particularidade participam, nas palavras de Duarte Nunes de Leao,
do facto de a Hispania ser: “ (...) a ultima parte de Europa assentada entre Africa e França,
rodeada de mar de tal maneira, que e quasi uma ilha cuja figura os greographos comparao
5 Antonio Borges de Coelho, Quadros para uma Viagem a Portugal no séc. XVI, Lisboa, Editorial Caminho, 1986,
pp. 137-145.
6 Ibidem, p. 142.
7 Ibidem.
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CULTURAS NA HISTÓRIA GLOBAL
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a um couro de boi volto o pescoço para a parte onde confina com França pelos montes
Pyreneos (...)” 8. Sera esta, Europa, a filha de Agenor, rei de Tiro objecto do amor de Zeus?
Flui, decerto neste signo da Hispania de Duarte Nunes de Leao o mito fundador da
Europa, aquele que iconicamente se prefigura no rapto desta corporizada na figuraçao de
uma jovem assustada que no dorso de um touro abre caminho por entre as aguas,
observada ao longe pelas suas companheiras. O texto que se serve de matriz evocadora
deste mito e o epidíctico poema Metamoforses de Ovídio. No momento em que o poeta
descreve a tapeçaria tecida por Minerva (Metamorfoses, Liv.VI:104) parece que, o touro era
real e real, o mar. Europa parecia que olhava a terra que havia deixado para trás, parecia que
gritava às suas companheiras e que temia o contacto da água que saltava junto dela.
Este jogo de espelhos repercute-se no modo como em Quinhentos se acede, ancora
e transmuta o pathos classico, na representaçao. Mas regressemos a Hispania. Se esta se
projecta na figuraçao de um touro, Lisboa na voz de Damiao de Gois figura-se na bexiga de
um peixe: “Não considero, porém, que seja fácil delinear-lhe a configuração e descrevê-la, já
que assenta em solo acidentado e desigual. Contudo, se alguém, com olhar firme e
desanuviado, quiser atentar na sua implantação e forma, a partir da povoação de Almada, (...)
verificará com certeza que, sobretudo na parte que se desenrola pela cidade, ela apresenta
uma verdadeira configuração de bexiga de peixe.”9
Este e o trabalho da imagem, o da representaçao como nodulo tematico do processo
de descriçao. Pincelar esta capital significa considerar a palavra sobre a urbe e o desenho
da mesma, estabelecendo as gradaçoes do olhar. Como Louis Marin claramente sintetizou
a representaçao na pintura consubstanciar-se-ia na transposiçao das coisas do mundo: “ (…)
into painted images: it would only inscribe the return of things that would thus come to be
8 Duarte Nunes do Leao, Descrição do Reino de Portugal, Lisboa, Centro de Historia da Universidade de Lisboa,
2002, p. 129.
9 Damiao de Gois, Elogio da Cidade de Lisboa- Urbis Olisiponis Descriptio, p. 147.
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caught in the trap of the canvas and the painted surface, a surface that is itself already a trap
of language, a net or network of names: a dream of or a double exchange, a translation, a
transfer, a transposition in which the logic and the economy of artistic mimesis would follow
the same rules as the logic and the economy of the description of images, and the inverse would
end up, under the circumstances, being the same- a logic and economy of sameness for both
language and image, thanks to the correspondence of the mimetic figure in painting and the
descriptive name that functions only to designate.” 10 Atingir a visibilidade do real e o
proposito primeiro e final do discurso narrativo que, neste seculo XVI e em Portugal se
debruça sobre a sua capital.
E certo que a descriçao da Lisboa de Cristovao Rodrigues de Oliveira e distinta das
de Joao Brandao de Buarcos, de Damiao de Gois, ou de Francisco d’Holanda, ainda que estes
partilhem um tempo e um objecto comuns. A Vrbis Olisiponis Descriptio (1554), de Damiao
de Gois, subscreve as laudes urbium, como assinala Aires A. do Nascimento. Segue, alias,
uma modalidade discursiva que este mesmo humanista ja tinha experimentado com a sua
Urbis Lovaniensis obsidio, dedicada a Carlos V, na qual se debruça sobre a defesa da cidade.
E no quadro de um tempo concreto que esse texto deve ser lido. Andre Resende tinha em
publicado, em 1553, a sua História da Antiguidade da cidade de Évora, onde confrontava o
seu público com a vulgar importancia atribuída ao antigo: “E certo la tem a antiguidade ua
sua graça e magestade, per que todos se faz ter em reverencia.”11
A justa medida na valoraçao do antigo e do moderno que emerge das palavras de
Resende e subscrita por Gois. Os caminhos destes autores cruzam-se. Em 1530 tambem
Andre de Resende tinha dado a estampa o seu Encomium urbis et Academiae Louaniensis,
evocado por Gois no seu elogio a Lisboa. Neste texto a viagem marítima para a India, outrora
10 Louis Marin, On representation, Stanford, Stanford University, 2001, p. 254.
11 Excerto referente ao texto que abre a referida História. Andre de Resende, Obras Portuguesas, Lisboa,
Livraria Sa da Costa, 1963, p.8.
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tao temida, transmutara-se: “A verdade e que esta rota de tao larga peregrinaçao se tornou
agora tao frequente para as gentes das nossas terras, seja por instigaçao de genio
infatigavel, seja por força da fome implacavel do ouro, que nao atribuem maior importancia
a uma navegaçao dessa natureza que ao percurso que tenham que fazer por mar de Portugal
a Inglaterra ou a Belgica.”12 Na sua dedicatoria, Gois refere como tinha sido instado por
homens doutos a trazer a público uma História dos feitos da Índia. Ainda que esta nao tenha
sido elaborada, varios textos parcelares sobre a presença portuguesa no espaço do Indico
foram sendo publicados pelo autor. Lisboa e para Gois, a cidade que: “Desde a embocadura
do Tejo chama ela a si o domínio da parte do Oceano que, em amplexo imenso de mar, abarca
a África e a Ásia”.13
Mas outros sao os autores que tambem se debruçam sobre esta cidade. Em 1551
Cristovao Rodrigues de Oliveira tinha descrito a cidade, no seu Summario em que
brevemente se contem algumas cousas, assim eclesiásticas como seculares que há na cidade
de Lisboa14, para que noutras terras se soubesse: “(..) das muitas e grandes esmolas e outras
obras pias que se nesta cidade fazem e como é celebrado nela o culto divino em tantos e tão
sumptuosos templos e casas de oração, como também para se saber da grandeza e povo
doutras muitas cidades do Mundo a errada opinião que se tem, vendo a certeza desta (...)”15.
No ano seguinte Joao Brandao, dito de Buarcos, no Tratado da Magestade e grandeza e
abastança da cidade de Lisboa16, evidencia a sua capitalidade. A semelhança de Cristovao
12Damiao de Gois, Elogio da Cidade de Lisboa- Urbis Olisiponis Descriptio, p.97.
13Damiao de Gois, Elogio da Cidade de Lisboa- Urbis Olisiponis Descriptio, p.83.
14 Cf. Cristovao Rodrigues de Oliveira, Lisboa em 1551. Sumário em que brevemente se contêm algumas coisas
assim eclesiásticas como seculares que há na cidade de Lisboa, Lisboa, Livros Horizonte, 1987.
15 Citado o texto de Cristovao Rodrigues de Oliveira, Lisboa em 1551... in Rodrigo Banha da Silva,Paulo Guinote,
O Quotidiano na Lisboa dos Descobrimentos- Roteiro arqueológico e Documental dos espaços e objectos, Lisboa,
GTMECDP, 1998, p. 198.
16 Sobre esta relaçao manuscrita indicar-se-a a sua publicaçao pela mao de Anselmo Braamcamp Freire com
anotaçoes e comentarios de Gomes de Brito, utilizando-se a ediçao de Jose da Felicidade Alves. Cf. Joao
Brandao, Grandeza e Abastança de Lisboa em 1552, Lisboa, Livros Horizonte, 1990.
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Rodrigues de Oliveira, regista os ofícios e mede os espaços. A comparaçao possível entre os
dados transmitidos, denota o imperio da quantidade que, nestas modalidades discursivas,
acompanha a qualidade.
Esta leitura de Lisboa no seculo XVI visualiza-se na exploraçao do traçado
topografico da cidade elaborado por G. Braun e F. Hogenberg na obra Urbium proecipuarum
mundi theatrum quintum (1593). Na ediçao crítica do texto de Gois realizada por Aires A. Do
Nascimento, coteja-se a urbe goisiana e o mapa da capital portuguesa traçado por Braunio,
Gravura de Lisboa (séc. XVI) in G. Braun e F. Hogenberg
(http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Lisbon_in_1598.jpg)
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como correntemente e nomeado.17.
Evidencia-se aqui a urbe e a sinalizaçao dos varios edifícios, destacados na sua malha
retalhada e descontínua. As analogias descritivas entre este traçado de Braunio e o texto de
Gois sao por demais evidentes. Com efeito, a visualizaçao do escorço flui na prosa do nosso
humanista. Tomemos como exemplo a este nível o excerto referente a passagem de S. Roque
a Nossa Senhora do Monte: “ (...) passando a Praça Nova do Rei, que transborda de
entalhadores, joalheiros, ourives, cinzeladores, fabricantes de vasos, artistas de prata, de
bronze e de ouro, bem como de banqueiros, cortando à esquerda, chegaremos a uma outra
artéria que tem o nome de Rua Nova dos Mercadores, muito mais vasta que todas as outras
ruas da cidade, ornada, de um lado e de outro, com belíssimos edificios. Para aqui confluem,
todos os dias, à compita, comerciantes de quase todas as partes do mundo e suas gentes, em
concurso extremo de pessoas, por causa das vantagens oferecidas pelo comércio e pelo
porto.”18
Contrapondo-se a voz laudatoria de Damiao de Gois, ou aos versos de Garcia de
Resende que cantam a cidade que “ (...) vimos crescer / em povos, e em grandeza,/ e muito se
enobrecer/ em edifícios, riqueza, / em armas, e em poder (...)”19, surge a crítica do “retrato e
reverso de Portugal”, a qual marca igualmente a capital do imperio. Neste texto o viajante,
provavelmente italiano, como referencia A. H. de Oliveira Marques, a quem se deve a
descoberta e a publicaçao desta relaçao20, descreve as sombras desta urbe, onde as
17 Cf. Damiao de Gois, Elogio da Cidade de Lisboa- Urbis Olisiponis Descriptio, p.11-40. A gravura de Lisboa do
seculo XVI esta incorporado na obra de G. Braun e F. Hogenberg Urbium proecipuarum mundi theatrum
quintum de Quinhentos e e utilizada na referida ediçao.
18 Ibidem, p. 161.
19 Garcia de Resende, Crónica de D. João II e Miscelânea, Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1973,
p.393.
20 Cf. A. H. Oliveira Marques, “Retrato e Reverso de Portugal”, in Nova História, 1-Seculo XVI, Lisboa, Editorial
Estampa, 1984, pp. 83-143.
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imundícies sao lançadas para a rua, e onde nao se poderia viver senao fossem os aromas do
ambar, musgo e benjoim.
Nao sao todavia apenas os estrangeiros em visita a cidade quem referenciam aquilo
que deve ser corrigido. E a propria face da capital do Reino, o que se procura melhorar, nas
palavras, por vezes avaras, de Joao Brandao, quando se dirige ao monarca: “(...) a mais nobre
coisa que ha no Reino e a dita Casa da Suplicaçao. Pelo que devia V. Alteza mandar tirar-lhe
aquela frontaria do pescado, donde procede tanta sujidade e maus cheiros, que e muito feia
coisa para quando V. Alteza vai aos despachos. E esta so razao basta para se tirar, quanto
mais havendo tantas outras, e mudar-se para a Porta do Mar o peixe, pois tem o mesmo
aparelho do mar para se descarregar e praça tao pertencente a ele como a que em que ora
esta.”21
Apresenta-se a organicidade da cidade, procurando-se oferecer a salubridade,
constatando-se ou programando-se uma nova roupagem arquitectonica22. Emblematico e,
a este nível, o ja citado texto de Francisco d’Holanda, Da FABRICA que falece ha cidade de
Lisboa, e nao menos emblematicas sao as suas propostas de dar a “cabeça” do Reino de
Portugal, Lisboa, fortificação e ornamento.
O bulício da urbe, os barulhos dos ofícios, o fumo dos cozinhados, a multidao de
gentes que invade as suas íngremes ruas, e a opulencia de alguns dos seus edifícios, sao
evocados pela voz dos que descreveram a cidade da partida. Assinalam-se os armazens
lisboetas, nomeadamente, o arsenal com os seus:“ (…) quarenta mil corpos de armas para
21 Citado in Rodrigo Banha da Silva e Paulo Guinote, O Quotidiano na Lisboa dos Descobrimentos- Roteiro
arqueológico e Documental dos espaços e objectos, Lisboa, GTMECDP,1998, p. 210.
22 Cf. Helder Carita, Lisboa Manuelina e a formação de modelos urbanísticos da época moderna ( 1495-1521),
Lisboa, Livros Horizonte, 1999.
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quarenta mil infantes, e tres mil armaduras inteiras de homens a cavalo (...) ”23, ou a Casa
da Índia, um “ (...) empório opulentíssimo de aromas, pérolas, rubis, esmeraldas e de outros
tipos de pedras preciosas que ano após ano nos é trazido da Índia; com maior verdade se lhe
poderia chamar armazém de prata e de oiro, já trabalhado ou por trabalhar, pois salta à vista
a toda a gente que ali há inúmeras dependências, dispostas com arte admirável e na devida
hierarquia (...) ”24.
Varias sao as modalidades discursivas que, entao, se manipulam, em Portugal, para
descrever a cidade e a sua capital. Foram convocadas neste texto para alem das Historias,
tratados, Sumarios... as diversas descriçoes da urbe. Evocaram-se as “Laudes Urbium”, nas
vozes de Gois ou Resende, as poetizaçoes de um Garcia de Resende na sua Miscelânea, ou
de um Duarte da Gama nas suas trovas que “fez às desordens que agora se costumam em
Portugal”, ou ainda de um Alvaro de Brito Pestana inclusas no Cancioneiro Geral. Adverte-
se o viajante da cidade de que: “Pera os ares corrutos/ dessa cydade [leia-se Lisboa] sayrem,
/ os devassos/ torpes feytos desolutos, / compre que logo se tyrem/ sem trespassos. / Ante que
o el rrey sayba, / que os mande sualteza/lançar fora/ cada hũu faça, que cayba/ bom estylo
de limpeza/onde mora.”25
Contudo, o nosso olhar permanece na Ribeira das Naus, no espaço onde se
constroem as caravelas, as naus, os galeoes que cruzam os oceanos, e se guardam os
morteiros, escorpioes, brasílicos, leoes, colubrinas, camelos, pedreiros, dispersores,
bombardas de variada grandeza e peso, falcoes, berços, escopetas … enfim as peças de
artilharia que dominam os mares.
23 Cristovao Rodrigues de Oliveira, Lisboa em 1551. Sumário em que brevemente se contém algumas coisas assim
eclesiásticas como seculares que há na cidade de Lisboa, editado por Jose da Felicidade Alves, Lisboa, Livros
Horizonte, 1987, p. 104.
24 Damiao de Gois, Elogio da cidade de Lisboa e Vrbis Olisiponis Descriptio, p. 171.
25 Garcia de Resende, Cancioneiro Geral, Lisboa, Centro do Livro Brasileiro, 1973, I, p. 214.
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A expressao de um imperio e do seu domínio materializar-se-ia neste arsenal que D.
Manuel construiu junto ao seu Paço Real. Num sem numero de salas, adornadas e
trabalhadas com arte encontrava-se o arsenal de guerra, em tudo superior aos melhores da
Europa e da Asia. O monarca aí guardava com toda a diligencia, tudo o que e necessario para
as expediçoes navais ordinarias, na Asia, na Africa e na Europa, encontrando-se, o
necessario para aparelhar, segundo os cronistas, mais de duzentos navios de todo o tipo.
Em tres das suas dependencias resguardavam-se: “ (…) quarenta mil corpos de armas de
infantaria e mais de três mil armaduras de homens de cavalo, completas e inteiras, fora as que
são tomadas para exercícios diários e extraordinários.”26
Neste mundo da Ribeira fervilha toda a azafama duma capital da partida. Labutam,
na preparaçao das armadas, todo um sem numero de gentes: ao lado dos calafates e outros
mesteirais que reparam as embarcaçoes, estao os que preparam as peças de carne
decepadas necessarias para a viagem, esfola-se, corta-se salga-se. Descobrem-se os
pescadores e as suas mulheres que abrem e salgam um sem numero de peixes, e pressente-
se os tanoeiros a reparar as vasilhas para os vinhos, carnes e outros mantimentos; os
alfaiates, a costurar todo o tipo de roupas em algodao ou la grosseiros; os carpinteiros, a
encaixar bombardas e outra artilharia; e os cordoeiros, a preparar toda a cordoalha
necessaria a equipagem das embarcaçoes... convocam-se os ritmos agitados de uma urbe,
rainha dos mares.
E no quotidiano da cidade da partida que se desenham os quadros impressivos de
uma urbanidade, lembrando os cheiros do ambar e benjoim, dos cozinhados feitos entre
portas, dos fumos dos fogareiros de barro, dos sons constantes do martelar dos artesaos a
trabalhar nas estreitas ruas, dos pregoes das varinas e dos aguadeiros que preparavam a
cidade e as armadas portuguesas para outras paragens.
26 Damiao de Gois, Elogio da cidade de Lisboa e Vrbis Olisiponis Descriptio, p. 175.
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O numero dos que partiam e referenciado pelos que estudam a Historia da Carreira
da India. De acordo com os elementos recolhidos por Paulo Guinote, Eduardo Frutuoso e
Antonio Lopes, podemos afirmar que, entre 1497e 1505, teriam partido 93 embarcaçoes,
77 das quais durante o primeiro vice-reinado. Nos anos seguintes os dados estabilizam,
assistindo-se entre 1511 e 1515 a 46 partidas, entre 1516 e 1520 a 48, e entre 1521 e 1525
Chafariz d’el-rei em Alfama (c.1570-80)
Lisboa, Colecçao Berardo
(http://lecoolisboa.blogspot.pt/2013/06/lisboa-pelos-seus-pintores.html)
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a 46. Ate 1580 observa-se que os numeros nao mais atingem os níveis verificados ate 1510.
Observemo-los27:
Anos Partidas Anos Partidas Anos Partidas
1526-1530 37 1546-1550 41 1566-1570 25
1531-1535 42 1551-1555 30 1571-1575 23
1536-1540 38 1556-1560 26 1575-1580 27
1541-1545 26 1561-1565 23
As equipagens que serviram as diferentes embarcaçoes variam. Luiz de Figueiredo
Falcao no seu livro em que se contém toda a Fazenda... lista os 130 tripulantes que
usualmente seriam necessarios para servirem uma nau. A variaçao dos dados recolhidos
sobre o numero de pessoas que teriam embarcado em cada armada e, todavia, consideravel;
por exemplo, na armada de 1500, comandada por Pedro Alvares Cabral, e composta por 13
velas, teriam embarcado entre 1200 a 1500 pessoas, entre tripulaçao e soldados. Ja na de
1501, chefiada por Joao da Nova, e composta por 4 navios, teriam seguido entre 350 a 400
homens28. Contudo, e possível considerar que, em media, entre tripulantes, passageiros e
militares, as velas da Carreira da India transportariam entre 400 a 500 pessoas, ainda que
nalguns casos pudessem ultrapassar o milhar de pessoas29.
Como Francisco Contente Domingues e Inacio Guerreiro concluem ao se debruçarem
27 Tabela construída neste trabalho a partir dos dados anteriormente referidos.
28 Cf. Paulo Guinote, Eduardo Frutuoso,Antonio Lopes, Naufrágios e outras perdas da “ Carreira da Índia”-
séculos XVI e XVII, Lisboa, GTMECDP, 1998, p. 50.
29 Ibidem, p.55.
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sobre a vida a bordo na carreira da India no sec. XVI e baseando no testemunho de
Pyrard de Laval: “ (…) podiam ir embarcados largas centenas de homens, amiúde acima do
meio milhar, e por vezes próximo do dobro. Estes números são naturalmente variáveis em
extremo, e nem sequer valerá a pena entrar em linha de conta com a possibilidade de uma
maior precisão, quer porque os dados conhecidos são muito imprecisos e não raro exagerados
( “ a gente que vai em cada uma delas naus passa de mil ou mil e duzentos homens, ou pelo
menos anda de oitocentos a novecentos”), escreve ilustrativamente Pyrard de Laval, quer
porque os únicos valores seguros que poderemos aceitar são os relativos às tripulações.”30
Grande e a quantidade das gentes que afluem a capital da partida a um ritmo mais
ou menos constante. Busca-se melhor vida. Sera, porem, a impressao da partida, que marca
os que partem e os que ficam. Gil Vicente, no seu Auto da Índia, e naquela que e uma
modalidade discursiva distinta das que nos tem ocupado, expoe os sentires arquetípicos
dos que buscam a fortuna. Tomemos, so a título de exemplo, o dialogo que se estabelece
entre o marido recem-chegado a Lisboa e a esposa que permaneceu na capital:
30 Francisco Contente Domingues, Navios e viagens –A experiência portuguesa nos séculos XV a XVIII ,Lisboa,
Tribuna, 2007, p. 170.
“ (...) MARIDO- Muita fortuna passei.
AMA- E eu, oh, quanto chorei,
Quando a armada foi de cá!
E quando vi desferir,
Que começastes de partir,
Jesu, eu fiquei finada!
Três dias não comi nada,
A alma se me queria sair.
MARIDO- E nós, cem léguas daqui,
Saltou tanto sudoeste,
Sudoeste e oeste-sudoeste,
Que nunca tal tormenta vi.”1 .
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A saída da barra e o momento, para os que partem, de enfrentar a novidade:
abandona-se o conhecido e enfrenta-se o desconhecido. A cronística da expansao explana
esse sentir, nomeadamente no momento em que e descrita a primeira viagem de Vasco da
Gama. Observemos os discursos de Gaspar Correia, Fernao Lopes de Castanheda e Joao de
Barros, e confrontemo-los com o registo epico em Luís de Camoes.
Gaspar Correia, revela o seu dar à vela, e sair do rio, indo el-rei no seu batel os
acompanhando, e falando a todos com benções e boas horas se despediu deles, ficando sobre
o remo até desaparecerem...31; Fernao Lopes de Castanheda, descreve a gente de Lisboa, a
mais dela chorava de piedade dos que se iam embarcar crendo que haviam todos de morrer32;
Joao de Barros, evoca a sua praia das lágrimas para os que vão, e terra de prazer aos que
vem33. Exemplar e a ecfractica evocaçao na epopeia camoniana da saída da barra do porto:
31 Cf. Gaspar Correia, Lendas da Índia, Porto, Lello & Irmao-Editores, 1975, I, p. 15.
32 Cf. Fernao Lopes de Castanheda, História do Descobrimento e Conquista da Índia pelos portugueses, Porto,
Lello e Irmao –Editores, 1979, I,p.11.
33Cf. Joao de Barros, Ásia...Dos feitos que os portugueses fizeram no descobrimento e conquista dos mares e terras
do Oriente-Primeira Década, Lisboa, Imprensa Nacional- Casa da Moeda, 1988, p. 125.
“ Já a vista, pouco e pouco, se desterra
Daqueles pátrios montes, que ficavam;
Ficava o caro Tejo e a fresca serra
De Sintra, e nela os olhos se alongavam.
Ficava-nos também na amada terra
O coração, que as mágoas lá deixavam.
E já despois que toda se escondeu,
Não vimos mais, enfim, que mar e céu.”
Canto V, estrofes 17-24 1
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Atraves destes textos serao as equipagens das armadas -: os grumetes, homens de
armas, bombardeiros, marinheiros, meirinhos, criados, barbeiros, calafates,
contramestres, condestaveis, feitores, boticarios, pilotos, e todos aqueles que iam servir no
Oriente - que se evocam. Posteriormente, durante a viagem procuram-se distracçoes,
travam-se brigas, celebram-se festividades religiosas, acontecem acidentes e doenças – as
quais muitas vezes ditavam a permanencia no hospital aos que chegavam ao seu porto de
destino34.
Rapidamente se domina o percurso da viagem e se estabelece o ciclo anual da partida
das armadas de Lisboa, destinadas ao Indico. Fixam-se igualmente os momentos favoraveis
a navegaçao: a saída das embarcaçoes da barra de Lisboa em finais do Inverno, inícios da
Primavera, entre Março e Abril, para deste modo aproveitar o regime favoravel de ventos
no Atlantico, e alcançar o Indico quando seria possível tomar a monçao de Sudoeste, para
atingir com sucesso, e sem grande dispendio, a costa ocidental do Indostao.
Se, por um lado, se procura cumprir o ciclo da partida Lisboa, por outro lado, a
viagem de retorno, a saída dos mares do Indico, obedece a um regime mais ou menos fixo.
Com efeito, a partida das armadas ocorre nos ultimos dias de Dezembro, primeiros dias de
Janeiro, para assim beneficiar da monçao do Norte. Poderiam, entao, atingir o Cabo em
Fevereiro, aproveitando os ventos que levariam a bom porto as embarcaçoes, atraves do
Atlantico Sul, ate a capital do reino de Portugal.
Dever-se-a ainda ter presente que, no início do seculo XVI, a Europa controlava
mares, nao continentes. Embora a presença europeia no mundo fosse ja uma realidade, os
domínios terrestres so seriam conseguidos seculos mais tarde. Apesar desta presença
costeira, os conflitos que deflagraram nas costas africanas, americanas e no Indico, entre
34 E de assinalar os estudos pioneiros do padre Antonio da Silva Rego citado na bibliografia ou a sistematizaçao
feita no trabalho de Paulo Guinote, Eduardo Frutuoso, Antonio Lopes Naufrágios e outras perdas da “Carreira
da Índia” séculos XVI e XVII, Lisboa, GTMEPCDP, 1998 ou ainda os trabalhos de Francisco Contente Domingues
e Inacio Guerreiro. Veja-se alias de Francisco Contente Domingues, op.cit., pp. 159-207.
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portugueses, ingleses, holandeses nunca representaram um significativo aumento de
europeus naqueles espaços.
A presença europeia na Asia, desde a primeira viagem de Vasco da Gama e nos cento
e vinte anos que se seguiram, apenas significou a concentraçao de comunidades com uma
densidade populacional de cerca de 30000 pessoas, espalhadas por 230000 Km2 de linhas
costeiras. Alem disso, no ambito do continente americano, a presença europeia permaneceu
nos índices populacionais do seculo anterior durante o período de 1600. Num computo
geral, de 57000 habitantes, 25000 eram de origem europeia e aproximadamente ¼ destes,
i.e., 120000, habitariam o espaço americano ocupado por Espanha.
Domina, assim, uma perspectiva eurocentrica na representaçao dos outros espaços
continentais. Ainda estamos muito longe de 1788 quando a Academia Francesa desafiou a
sociedade do seu tempo a responder sobre a influencia que a America teria sobre a política,
o comercio, e os costumes na Europa. Sera neste contexto que se deve propor uma reflexao
sobre o proprio conceito de mundo no seculo XVI. Com efeito, o mundo conhecido da Europa
de entao era unicamente uma parte, e o desejo de conhecer e dominar os novos espaços
comandava os desígnios nesses tempos. Ora, nos primordios do seculo XVI, Portugal
desempenhou um papel significativo na revelaçao e descriçao deste mundo novo, onde
novas e variadas gentes se cruzam nao so na Lisboa de Quinhentos, mas tambem nos
espaços extra-europeus.
A emblematica assunçao da esfera armilar, como signo do reinado de D. Manuel,
anuncia um domínio e uma cosmovisao corporizada num mundo que se espelha na sua
perfeiçao geometrizada. A descriçao dos espaços esta, ate aqui, intimamente relacionada
com os propositos qualitativos. A nova mentalidade mercantil, ancorada nas emergentes
tecnicas comerciais, providenciaria uma nova forma de aproximaçao ao objecto, onde a
quantidade tomaria o seu lugar. Enfim, esta nova forma de descrever o mundo podera ser
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entendida como a primeira manifestaçao de uma economia global35, a qual estaria
profundamente enraizada no modelo economico europeu que entao se vai desenhando e
consolidando.
Do encontro com o Outro se reconstroi o Eu onde: “ L’idee d’une «globalisation avant
l’heure» pose en effet la difficile question de l’inegale distribution sociale et politique de la
«conscience de la globalite » en un temps et un lieu donnes(…). A la question de R. Chartier,
«Penser le monde? Mais qui le pense: les hommes du passe ou les historiens du present?»,
l’on peut ainsi ajouter: «les rois et les lettres, ou les matelots et les esclaves?». La frequente
absence de temoignages en nom propre d’acteurs subalternes des situations de rencontre
imperiale semble tracer ici la limite en forme de ligne rouge de l’interpretation
historiennes.”36 Respeitando-a, desvendamos o nosso passado, cumprimos o nosso
presente.
BIBLIOGRAFIA CITADA
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portugueses, I-II, Porto, Lello e Irmao –Editores, 1979.
35 Cf. Vitorino Magalhaes Godinho, Les Découvertes XVe-XVIe: une révolution des mentalités, Paris, Edition
Autrement, 1992, pp. 61-72.
36 C. Delacroix, F. Dosse, P. Garcia, N. Offenstadt, Historiographies, I- concepts et débats, Paris, Editions
Gallimard, 2010, p. 377-376.
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