O documento discute a Educação Profissional e Tecnológica (EPT) no município de Anchieta no Espírito Santo. Apesar da grande demanda, a prefeitura não tem uma política pública para a EPT. As atividades de EPT são realizadas pelo SENAI e MEPES com foco na formação de mão de obra para grandes empresas locais, sem participação comunitária.
1. EPT e políticas públicas municipais
Introdução
A Educação Profissional e Tecnológica – EPT desempenha importante papel para o
desenvolvimento nacional e nas políticas de inclusão social, na medida em que
proporciona uma formação profissional qualificada e possibilita a integração
socioeconômica de jovens e adultos.
De acordo com a legislação vigente (CF, LDB e PNE) é de responsabilidade do
município, relativamente à educação, prioritariamente a educação infantil. Ocorre
que as administrações municipais vêm, paulatinamente, através de convênios com
a União, Estado, Sistema S, empresas, entre outras instituições, participando
também da oferta de Educação Profissional e Tecnológica. De acordo com o Censo
Escolar realizado pelo INEP, 5,72% das matrículas em EPT eram em rede
municipal, representando 23.545 educandos no Brasil.
O interesse precípuo destas ações é qualificar a mão de obra local como mais um
atrativo para a instalação de grandes empreendimentos econômicos e possibilitar a
inserção no mercado de trabalho de jovens e adultos habilitados. Para citar dois
exemplos, as prefeituras de Macaé (RJ) e Poços de Caldas(MG) realizam ações na
área de EPT.
Procuramos, através deste estudo preliminar, averiguar qual a situação relativa à
EPT no município de Anchieta/ES, que possui importantes empresas na área de
mineração, petróleo, gás e portuária, entre outras. E, principalmente devido a estas
atividades, foi considera a 10ª cidade mais rica do país e a 1ª do estado do Espírito
Santo em função de seu PIB (Produto Interno Bruto) per capita, conforme
estimativa do IBGE.
Diante deste cenário, qual a atuação da Prefeitura Municipal de Anchieta/ES com
relação à EPT?
Metodologia
Este é um Estudo de Caso para obter conhecimento dos
aspectos relativos à política municipal de educação no
município de Anchieta/ES em EPT. A técnica permite
compreender determinada situação e descrever sua
complexidade, não obstante necessitar de poucos recursos
humanos e materiais, bem como por sua simplicidade.
Proporciona contato direto com a realidade. Baseia-se em
entrevistas, observação, levantamento de dados e
informações, discussões, reflexão e análises. É uma
ferramenta metodológica bastante utilizada quando se
procura compreender as razões, motivos e maneiras de
determinadas situações/fenômenos específicos, sendo,
portanto, de difícil generalização.
Realizamos entrevistas com representantes da Prefeitura
Municipal de Anchieta, Secretaria Municipal de Educação e
SENAI local, além da pesquisa e do levantamento de dados
secundários.
Luciana Antonini, lantoni7@hotmail.com
Resultados
O município de Anchieta localiza-se ao sul do estado do Espírito Santo, conforme a
figura abaixo.
Sua população, estimada pelo IBGE em 2014, aproximava-se dos 24 mil habitantes.
Possui 40 escolas de ensino fundamental (38 municipais, uma estadual e uma
privada); duas escolas de ensino médio (uma estadual e uma privada) e 32 pré-
escolas (31 municipais e uma privada). Além do Centro Integrado Sesi/Senai e o
Movimento de Educação Promocional do Espírito Santo - MEPES.
De acordo com as informações obtidas, a Prefeitura de Anchieta não desenvolve
ações voltadas à EPT. Quanto à EJA, possui quatro escolas, com 422 alunos em
2013 e 559 em 2014, sendo que o município possuía 1.320 analfabetos em 2010, de
acordo com o IBGE.
As atividades de EPT são realizadas por duas instituições: MEPES Escola Família
Turismo Pietrogrande (na área de turismo, hotelaria, gastronomia e agrícola) e Centro
de Educação Profissional Anchieta – SENAI (em áreas diversas, sendo os cursos e
as respectivas vagas definidos conjuntamente pelo SENAI e SAMARCO, empresa
mineradora na região, com controle acionário dividido igualitariamente entre a
Companhia Vale e a BHP Billiton).
Com relação à EPT, o SENAI local alcançou 5.316 matrículas em 2013. Já em 2014,
no período de janeiro a outubro, chegou a 7.713 matrículas nos diversos cursos
oferecidos em educação profissional. Esse total, até outubro passado, já havia
superado em 145% a meta estabelecida para todo o ano de 2014, que era de 5.316
matrículas (a projeção apontava o mesmo total de 2013). Em junho próximo, será
inaugurada sua nova sede com capacidade para 12 mil matrículas/ano. O que
evidencia a fortíssima demanda existente pela modalidade.
Conclusão
Como observamos, não há política pública educacional
municipal voltada à EPT, apesar da enorme demanda pela
modalidade. Também percebemos que o direcionamento da
quase totalidade dos cursos oferecidos no município é
planejado pela grande empresa com o SENAI, objetivando a
formação de mão de obra basicamente para o crescimento
industrial, distanciando-se de uma formação e “prática
educativa que deveria ser um diálogo constante entre
educador e educando e dos educandos entre si de forma a
desenvolver a autonomia e autogoverno do educando. E
assim, sendo creditada a esta educação como preparadora
da mudança das estruturas socioeconômicas, possuir um
caráter altamente transformador” (FREIRE, adaptado).
Todos os esforços da sociedade brasileira, desde os anos 80,
para a construção de uma educação integral, democrática e
participativa, que possibilite a formação de sujeitos e de uma
sociedade mais justa e igualitária, são como contos de fada
ou ficção científica neste contexto em Anchieta/ES. Como
afirma GADOTTI, “a gestão democrática não é só um
princípio pedagógico. É também um preceito constitucional.
[...] A participação popular e a gestão democrática fazem
parte da tradição das chamadas ‘pedagogias participativas’.
Elas incidem positivamente na aprendizagem. Pode-se dizer
que a participação e a autonomia compõem a própria
natureza do ato pedagógico. A participação é um pressuposto
da própria aprendizagem. Mas, formar para a participação é,
também, formar para a cidadania, isto é, formar o cidadão
para participar, com responsabilidade, do destino de seu
país.”
Todos os avanços e conquistas de uma notável legislação não
trouxeram a respectiva evolução para uma sociedade mais
justa e igualitária. Aqui a educação é instrumentalista,
servindo tão somente ao capital, acumulação, globalização,
aprofundando os processos de desigualdade e exclusão
social. O inevitável e trágico resultado deste processo
acompanhamos todos os dias nas manchetes dos jornais e
indicadores sociais.
Existe uma grande oportunidade para a construção de uma
política pública educacional efetivamente comprometida em
Anchieta/ES, que não objetive apenas uma formação
profissional stricto sensu, mas uma formação ampla,
permitindo a toda/o cidadã/o viver digna, integral e
plenamente. Para tanto, é preciso vontade política e
compromisso ético com a cidadania conscientizadora e
emancipatória dos grupos destinatários.Bibliografia
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra. 2005.
GADOTTI, Moacir. Gestão democrática com participação popular: planejamento e organização da educação nacional. São Paulo, Instituto Paulo Freire. 2013.
INSTITUTO Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Produto Interno Bruto dos Municípios 2011 (PIB2011). Rio de Janeiro: IBGE, 2013.
MINISTÉRIO da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP). Censo Escolar 2005. Brasília: MEC/SEB, 2005.
_________. Censo Educacional 2012. Brasília: MEC/SEB. 2012.
PREFEITURA Municipal de Anchieta. Município de Anchieta: dados socioeconômicos, potencialidades & oportunidades. Prefeitura Municipal de Anchieta/Secretaria de Integração
Econômica e Regional. 2010.