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CULTURA RELIGIOSA PUC MINAS
NÃO NASCEMOS PRONTOS!
O sempre surpreendente Guimarães Rosa dizia: “o animal satisfeito dorme”. Por trás dessa aparente
obviedade está um dos mais fundos alertas contra o risco de cairmos na monotonia existencial, na redundância
afetiva e na indigência intelectual. O que o escritor tão bem percebeu é que a condição humana perde substância
e energia vital toda vez que se sente plenamente confortável com a maneira como as coisas já estão, rendendo-
se à sedução do repouso e imobilizando-se na acomodação.
A advertência é preciosa: não esquecer que a satisfação conclui, encerra, termina; a satisfação não deixa
margem para a continuidade, para o prosseguimento, para a persistência, para o desdobramento. A satisfação
acalma, limita, amortece.
Por isso, quando alguém diz “fiquei muito satisfeito com você” ou “estou muito satisfeita com teu
trabalho”, é assustador. O que se quer dizer com isso? Que nada mais de mim se deseja? Que o ponto atual é
meu limite e, portanto, minha possibilidade? Que de mim nada mais além se pode esperar? Que está bom como
está? Assim seria apavorante; passaria a idéia de que desse jeito já basta. Ora, o agradável é quando alguém diz:
“teu trabalho (ou carinho, ou comida, ou aula, ou texto, ou música etc.) é bom, fiquei muito insatisfeito e, portanto,
quero mais, quero continuar, quero conhecer outras coisas
Um bom filme não é exatamente aquele que, quando termina, ficamos insatisfeitos, parados, olhando,
quietos, para a tela, enquanto passam os letreiros, desejando que não cesse? Um bom livro não é aquele que,
quando encerramos a leitura, o deixamos um pouco apoiado no colo, absortos e distantes, pensando que não
poderia terminar? Uma boa festa, um bom jogo, um bom passeio, uma boa cerimônia não é aquela que queremos
que se prolongue?
Com a vida de cada um e de cada uma também tem de ser assim; afinal de contas, não nascemos
prontos e acabados. Ainda bem, pois estar satisfeito consigo mesmo é considerar-se terminado e constrangido ao
possível da condição do momento.
Quando crianças (só as crianças?), muitas vezes, diante da tensão provocada por algum desafio que
exigia esforço (estudar, treinar, emagrecer etc.) ficávamos preocupados e irritados, sonhando e pensando: por
que a gente já não nasce pronto, sabendo todas as coisas? Bela e ingênua perspectiva. É fundamental não
nascermos sabendo e nem prontos; o ser que nasce sabendo não terá novidades, só reiterações. Somos seres
de insatisfação e precisamos ter nisso alguma dose de ambição; todavia, ambição é diferente de ganância, dado
que o ambicioso quer mais e melhor, enquanto que o ganancioso quer só para si próprio.
Nascer sabendo é uma limitação porque obriga a apenas repetir e, nunca, a criar, inovar, refazer,
modificar. Quanto mais se nasce pronto, mais refém do que já se sabe e, portanto, do passado; aprender sempre
é o que mais impede que nos tornemos prisioneiros de situações que, por serem inéditas, não saberíamos
enfrentar.
Diante dessa realidade, é absurdo acreditar na idéia de que uma pessoa, quanto mais vive, mais velha
fica; para que alguém quanto mais vivesse mais velho ficasse, teria de ter nascido pronto e ir se gastando...
Isso não ocorre com gente, e sim com fogão, sapato, geladeira. Gente não nasce pronta e vai se
gastando; gente nasce não-pronta, e vai se fazendo. Eu, no ano que estamos, sou a minha mais nova edição
(revista e, às vezes, um pouco ampliada); o mais velho de mim (se é o tempo a medida) está no meu passado e
não no presente.
Demora um pouco para entender tudo isso; aliás, como falou o mesmo Guimarães, “não convém fazer
escândalo de começo; só aos poucos é que o escuro é claro”...
• CORTELLA, Mário Sérgio. Está faltando espanto. In: Não nascemos prontos – provocações
filosóficas. 5ª edição. Petrópolis: Vozes, 2007, pp 11-13.

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