Este documento discute a possibilidade de aposentadoria especial para guardas municipais no regime próprio de previdência municipal. Analisa as atribuições das guardas municipais e sua exposição a riscos, e conclui que eles se enquadram na possibilidade de aposentadoria especial prevista na Constituição para aqueles que exercem atividades de risco ou insalubres.
Revista Consulex nº411 matéria de capa marcelo alves
POSSIBILIDADE DE APOSENTADORIA ESPECIAL PARA GUARDAS MUNICIPAIS NO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA MUNICIPAL
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Título : POSSIBILIDADE DE APOSENTADORIA ESPECIAL PARA GUARDAS MUNICIPAIS NO REGIME PRÓPRIO DE
PREVIDÊNCIA MUNICIPAL
Autor : Marcelo Alves Batista dos Santos
DOUTRINA – 201/ABR/2018
POSSIBILIDADE DE APOSENTADORIA ESPECIAL PARA GUARDAS MUNICIPAIS NO REGIME
PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA MUNICIPAL1
MARCELO ALVES BATISTA DOS SANTOS
Pós-Graduado em Direito Público e em Direito Trabalhista e Previdenciário pela Faculdade Paraíso do
Ceará-FAP. Coordenador Operacional da Secretaria Municipal de Segurança de Juazeiro do Norte-CE.
O artigo tem como objetivo analisar a possibilidade de aposentadoria especial dos guardas
municipais conforme o art. 40, § 4º, inc. II, da Constituição Federal (CF), após o advento da Lei nº
13.022/2014, que regulamentou a categoria e o art. 1º da Lei de Crimes Hediondos.
AS GUARDAS MUNICIPAIS E SUAS ATRIBUIÇÕES
Os arts. 142 e 144 da CF delimitam o rol de todas as organizações incumbidas da defesa do
Estado, das suas instituições democráticas, da segurança pública e, bem assim, da preservação da
ordem pública no Estado brasileiro.
As Forças Armadas, as polícias federais e estaduais, as corporações de bombeiros militares e as
próprias guardas municipais estão incluídas nessa relação, conforme pode ser observado a seguir:
Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são
instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina,
sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia
dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
[...]
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens,
serviços e instalações, conforme dispuser a lei. (Grifamos.)
Após o fim do regime militar, com a redemocratização do país e o advento da Constituição de
1988, as Forças Armadas ficaram excluídas da função de policiamento, condição que foi transferida
aos estados-membros. Às Forças Armadas agora cabem a proteção de fronteiras e a vigilância a uma
ameaça externa ao Brasil.
Constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, as Forças Armadas são incumbidas
de proteger as fronteiras e a soberania do país contra uma ameaça externa e formam o aparato da
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2. União, bem como a Polícia Federal, que tem como atribuições atuar em crimes contra bens, serviços e
instalações da União, entre outras, conforme podemos observar no § 1º do art. 144 da CF:
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira, destina-se a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e
interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras
infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme,
segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o descaminho,
sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aérea e de fronteiras;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras; (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998)
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
Assim como a Polícia Federal e as Forças Armadas, no âmbito da União, temos a Polícia
Rodoviária Federal, que tem como atribuição o patrulhamento ostensivo das rodovias federais, e a
Polícia Ferroviária Federal, que tem como atribuição o patrulhamento das ferrovias federais.
Os estados-membros, que detêm a atribuição primária em relação ao dever de prover a segurança
pública, contam com a Polícia Militar, a Polícia Civil e o Corpo de Bombeiros Militares, de acordo com o
previsto nos §§ 4º ao 6º do art. 144 da CF:
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a
competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as
militares.
§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de
bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de
defesa civil.
§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército,
subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e
dos Territórios.
Por fim, os §§ 8º e 10º destinaram aos municípios a competência para constituir e regular as
guardas municipais e os órgãos municipais de trânsito:
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens,
serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
[...]
§ 10. A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das
pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 82, de 2014)
I - compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras atividades previstas
em lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente; e (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 82, de 2014)
II - compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos respectivos órgãos ou
entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados em Carreira, na forma da lei. (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 82, de 2014)
Contudo, os municípios, responsáveis apenas pela proteção dos bens, dos serviços e das
instalações, bem como pelo trânsito, participam ativamente da prevenção a delitos, uma vez que é no
território dos municípios que tudo acontece.
Essas funções envolvem aspectos de elevada periculosidade, em atividades de risco extremo à
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3. própria vida durante todas as suas jornadas de trabalho, visto que os agentes dessas instituições se
utilizam de armas de fogo e de equipamentos de proteção individual quando atuam na proteção da
integridade física das pessoas e de seus patrimônios.
Isso sem contar que, muitas vezes, por atuarem ostensivamente cerceando liberdades individuais,
acabam suscitando reações negativas de quem tem de se submeter a ordens imperativas que visam
ao atendimento do interesse público, além de tais profissões colocarem esses agentes a outras
condições insalubres e de estresse.
Por tão árdua jornada, tais categorias não foram esquecidas pelo constituinte originário, tendo
este propiciado o enquadramento da atividade policial como geradora de aposentadoria especial aos
agentes de segurança pública, sejam civis, sejam militares.
O ART. 40 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A POSSIBILIDADE DE APOSENTADORIA
ESPECIAL
A Constituição Federal trouxe, em seu art. 40, as hipóteses da aposentadoria especial no § 4º,
incs. I a III. Vejamos:
§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos
abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis
complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)
I - portadores de deficiência;
II - que exerçam atividades de risco;
III - cujas atividades sejam exercidas sobre atividades especiais que prejudiquem a saúde e a
integridade física.
A possibilidade de concessão de aposentadoria especial prevista no art. 40, § 3º, incs. I a III, da
CF, necessitava ser complementada por lei para os servidores públicos em geral, mas, no caso dos
policiais militares, já existe essa previsão em estatutos próprios para possibilitar a aposentadoria em
paralelo a outras categorias de servidores públicos.
Por ainda existir a necessidade de regulamentação das aposentadorias especiais, bem como a
necessidade de conversão de tempo laborado em condições especiais em tempo comum, muitos
mandados de injunção de servidores públicos civis começaram a tramitar no Superior Tribunal Federal,
objetivando uma resposta, que veio por meio da Súmula Vinculante nº 33 e consolidou o tema.
Vejamos:
Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre
aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de
lei complementar específica. (STF, Súmula Vinculante nº 33.)
A Súmula em questão permite a possibilidade de concessão da aposentadoria especial, mas um
ponto a ser disciplinado pelo ordenamento legislativo pátrio seria a possibilidade de conversão do
tempo especial em comum, o que não vem encontrando guarida jurisprudencial, conforme podemos
verificar no entendimento da Corte Suprema:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. MAGISTÉRIO.
CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM TEMPO COMUM: IMPOSSIBILIDADE.
ACÓRDÃO RECORRIDO EM DESARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL. RECURSO PROVIDO. Relatório 1. Recurso extraordinário interposto com base no art. 102,
inc. III, alínea a, da Constituição da República contra julgado da Turma Recursal do Juizado Especial
Federal do Rio Grande do Sul que manteve a seguinte sentença: [...]. (STF, RE nº 712.789/RS, Rel.
Min. Cármen Lúcia, j. em 25.09.2012, DJe de 04.10.2012.)
Com a edição da Súmula já mencionada, ficou evidenciada a possibilidade de os servidores
públicos que exercem atividades de insalubres e penosas galgarem a aposentadoria especial,
restando observar a possibilidade de concessão de tal benefício a servidores civis que trabalhem em
condições de risco, como as enfrentadas pela Guarda Municipal. Dessa forma, deve-se considerar a
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4. possibilidade de incluir essas instituições entre as contempladas, uma vez que a vigilância de bens,
serviços e instalações municipais pode dar um caráter meramente de vigilância patrimonial a essas
organizações, restringindo, em tese, a possibilidade de aposentadoria especial apenas a modalidade
de aposentadoria por periculosidade, caso esta ultima seja aceita como causa de aposentadoria
especial, conforme analisado adiante.
No entanto não seria a única possibilidade de aposentadoria possível para os Guardas Municipais,
pois esses profissionais também labutam em locais insalubres, como aterros sanitários, cemitérios e
com outras intempéries caracterizadoras.
Para a continuação do estudo, se faz necessário a distinção entre os termos insalubres, penosas
e perigosas, em virtude das diferenças existentes nas características desses termos e seus reflexos
nas possibilidades da aposentadoria especial.
O adicional de penosidade encontra-se previsto no art. 7º, inc. XXIII, da Constituição da República,
inserido no mundo jurídico juntamente aos adicionais de insalubridade e periculosidade:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social:
[...]
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;
Trata-se de uma modalidade de indenização que será destinada a todos os tipos de atividade,
que, embora não causem efetivos danos à saúde do trabalhador, possam tornar sua atividade
profissional mais sofrida, desde que não percebam qualquer outro adicional. Por exemplo:
trabalhadores que exercem sua atividade de pé, que enfrentam filas, que se sujeitam ao sol ou à
chuva, que trabalham sozinhos, que levantam muito cedo ou muito tarde ou que lidam com produtos
de odores extremamente desagradáveis.
Já as atividades ou operações insalubres foram definidas no art. 189 da Lei nº 6.514/1977, que
alterou a Consolidação das Leis do Trabalho:
Art. 189. Serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que, por sua natureza,
condições ou métodos de trabalho, exponham os empregados a agentes nocivos à saúde, acima dos
limites de tolerância fixados em razão da natureza e da intensidade do agente e do tempo de
exposição aos seus efeitos.
Com relação ao conceito de periculosidade, o art. 193 do mesmo diploma legal prevê:
Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada
pelo Ministério do Trabalho, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem o
contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado.
O presente trabalho não tem como escopo aprofundar os debates sobre a discussão da
insalubridade e da periculosidade, mostrando apenas as diferenças conceituais para utilização em um
eventual pedido de aposentadoria especial.
Tal distinção foi necessária porque, na Lei do Regime Geral de Previdência Social (Lei nº
8.213/1991), art. 57, caput, não há previsão de aposentadoria especial para “atividades de risco”,
abrigando somente as hipóteses de insalubridade.
Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao
segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade
física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
Portanto, seriam necessários novos mandados de injunção para uma interpretação jurisprudencial
diferente acerca da possibilidade de aposentadorias especiais por risco de vida aos servidores da
Guarda Municipal, em virtude das funções policiais conferidas pelo novo Estatuto Geral das Guardas,
enquadrando esses agentes na Lei Complementar nº 144/2014, que conferiu a aposentadoria especial
aos integrantes das polícias.
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5. A GUARDA MUNICIPAL, SUAS ATRIBUIÇÕES E O NOVO ESTATUTO GERAL
Para o enquadramento em uma categoria que galga o direito à aposentadoria especial, é
fundamental detalhar que o papel das Guardas Municipais na segurança pública sofreu uma mudança
constitucional, pois a atuação dessas instituições era prevista no art. 144, § 8º, da CF apenas para a
proteção de bens, serviços e instalações, até a regulamentação pela Lei nº 13.022, de 08 de agosto de
2014, com o Estatuto Geral das Guardas Municipais.
O raio de ação em que as Guardas Municipais podiam atuar já era bastante amplo mesmo antes
da aprovação do referido Estatuto, basta aprofundar a interpretação constitucional de maneira
hermenêutica que é dada para bens, serviços e instalações públicas.
Bens públicos
A Lei nº 10.406/2002 – Novo Código Civil – prescreve, em seu art. 98, que são públicos os bens
do domínio nacional, pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno: “São públicos os
bens do domínio nacional pertencente ás pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros
são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem”.
Segundo Machado (2009, p. 118), “bens públicos são aqueles que estão sob o poder público e
possuem utilidade coletiva como as águas, jazidas, subsolo, espaço aéreo, florestas, mangues, e o
patrimônio histórico”.
O conceito mais resumido e talvez mais didático seja o de Bandeira de Mello (2011, p. 103):
Bens públicos são todos os bens que pertencem ás pessoas jurídicas de Direito Público, isto é, União,
Estados e Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito Público [...] O conjunto de bens
públicos forma o domínio público, que inclui tanto bens móveis como bens imóveis.
O Código Civil de 1916 somente enumerava como públicos os “bens pertencentes à União,
Estados e Municípios”, com a clara observância que o Novo Código de 2002 se adaptou melhor às
instituições públicas que surgiram após o Código de 1916, para as quais a natureza jurídica não estava
bem ajustada. Uma dúvida importante que surge nesse caso é com relação aos bens das empresas
públicas e das sociedades de economia mista, ou seja, se seriam considerados bens públicos. Isso
porque se a resposta for afirmativa, também seria competência das Guardas Municipais a proteção
desses bens.
Segundo Alexandrino e Paulo (2009, p. 863), os bens das sociedades de economia mista e das
empresas públicas podem ser públicos, variando caso a caso de acordo com a finalidade – prestação
de serviços públicos ou atividade econômica:
em razão do princípio da continuidade do serviço público, os bens das empresas públicas e
sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos que estivessem sendo diretamente
utilizados na prestação de serviço público, seguem parcialmente, o mesmo regime jurídico dos bens
públicos, revestindo especialmente as características de impenhorabilidade e não onerabilidade.
Em síntese são bens públicos, integralmente sujeitos ao regime jurídico dos bens públicos, somente os
bens pertencentes a pessoas jurídicas de direito público. Os bens das pessoas jurídicas de direito
privado integrantes da administração pública não são bens públicos, mas podem estar parcialmente
sujeitos ao regime próprio dos bens públicos, quando estiverem sendo utilizados na prestação de um
serviço público. (Grifamos.)
Em consonância com os pensamentos doutrinários e jurisprudenciais expostos, entendemos que a
proteção às empresas públicas e às sociedades de economia mista não é tarefa a ser atribuída à
Guarda Municipal, em virtude do regime jurídico dessas empresas ser o de direito privado, visando
inicialmente ao lucro, por meio da disputa com outras empresas do mercado econômico, a não ser que
alguma situação nesses locais aconteça em flagrante delito e a Guarda Municipal atue na qualidade de
qualquer do povo, amparada pela Lei Processual Penal. Quanto à classificação, os bens são dispostos
no Código Civil de 2002 sob a seguinte forma, mais precisamente em seu art. 99:
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6. Art. 99. São bens públicos:
I - os de uso comum do povo, tais como rios, mares, estradas ruas e praças;
II - os de uso especial, tais como edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento de
administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive suas autarquias;
III - os dominicais, que constituem o patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto
de direito pessoal, ou real de cada uma dessas entidades.
Uma observação interessante deve ser feita no parágrafo único desse artigo, em razão de se
considerarem também como bens de uso dominical aqueles pertencentes às pessoas jurídicas de
direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado, conforme descrição do parágrafo único
do art. 99 do Código Civil: “Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens não
pertencentes ás pessoas jurídicas de direito publico a que se tenha dado estrutura de direito privado”.
A importância desse dispositivo é que, caso nenhuma lei estabeleça normas especiais sobre os
dominicais, seu regime jurídico será o de direito privado, ou seja, podem ser desafetados.
Essa medida visa facilitar a desapropriação de bens dominicais, mas devemos salientar que esses
bens, enquanto pertenceram ao Poder Público, antes da desafetação, ou até mesmo na retomada para
o Poder Público, podem vir a ser objeto de proteção por parte da Guarda Municipal, inclusive na ajuda
de cumprimento de reintegrações de posse ou na vigilância, para o impedimento de invasões.
Bens de uso comum do povo
Os bens de uso comum do povo são os mais amplos porque neles estão incluídos rios, mares,
florestas, praças, estradas ruas, mares, como citado por Meirelles (2007, p. 495) seriam “o todo, os
locais abertos à utilização pública”, e adquirem esse caráter de comunidade, de uso coletivo, de
fruição própria do povo, de sociedade. Ainda, Lima apud Meirelles (2007, p. 495) admite que “pode o
domínio público definir-se como a forma mais completa de participação de um bem na atividade de
administração pública”. São os bens de uso comum, ou do domínio público, o serviço mesmo prestado
ao público pela Administração, assim como as estradas, ruas e praças.
Para Gonçalves (2008, p. 270), os bens de uso comum do povo “são aqueles que podem ser
utilizados por qualquer um do povo, sem formalidades, não perdendo essa característica se o poder
público regulamentar seu uso, ou torna-lo oneroso, instituindo cobrança de pedágio como nas
rodovias”.
Os bens públicos de uso comum são aqueles acessíveis a todas as pessoas, mais precisamente
os locais abertos à visitação do público com caráter comunitário, de utilização coletiva com a fruição
própria do povo. Inalienável ou fora do comércio, com a observância que em determinados casos
especiais podem ter a utilização restringida ou impedida, como, por exemplo, um fechamento de uma
avenida para a realização de obras, ou a interdição de uma praça para a realização de uma
manifestação pública.
A proteção dos bens públicos de uso comum não é meramente patrimonial, pois não existe
dissociação da segurança do bem e de quem os frequenta. Como seria possível proteger um parque
público e não poder prestar socorro aos seus frequentadores quando algum deles sofresse um furto,
perdesse uma criança ou necessitasse de uma informação?
O Estatuto Geral das Guardas veio acabar com tal diferenciação perante todos os bens de
domínio publico, porque não era mais possível imaginar que delitos ocorrem, que há necessidade de
auxílio, de informações e de prestação de socorro a transeuntes de uma rua onde a Guarda está
presente, e que esta mantivesse sua atuação voltada apenas ao local, pois este é o meio voltado para
o fim de garantir lazer, trânsito ou locomoção. E a Guarda Municipal deve garantir que essa finalidade
seja atingida pela população sem a interferência de terceiros, além de que a segurança dos
frequentadores das praças, ruas, estradas, rios, mares, florestas e outros também é de sua
competência em virtude de a segurança, a liberdade ou a vida dos frequentadores sopesar a
importância daquele bem no momento em que o Guarda Municipal se encontra de serviço e ali se
defronta primeiramente com o problema.
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7. Bens de uso especial
Os bens públicos de uso especial são aqueles que as entidades públicas respectivas destinam
aos fins determinados ou a seus serviços, como terrenos ou edifícios aplicados a seu funcionamento.
Tendo como características ser inalienável e imprescritível como os bens de uso comum do povo e
quando não mais se prestam à finalidade à qual se destinam, é possível suspender essa condição de
inalienabilidade legalmente por meio de concorrência pública.
Para Gonçalves (2008, p. 271), os bens de uso especial são os que se destinam especialmente à
execução dos serviços públicos: “São os edifícios onde estão instalados os serviços públicos, inclusive
os das autarquias, e os órgãos da administração (repartições públicas, secretarias, escolas, ministérios
etc., sendo exclusivamente usados pelo poder público)”.
Nesse tipo de bem fica mais fácil visualizar a ação dos guardas municipais, que estão organizando
as filas de um hospital ou prestam segurança aos usuários de um mercado público, orientam com
informações a quem tem dúvidas em uma repartição, ajudam no cumprimento dos atos administrativos
emanados por esses órgãos aos particulares, ressaltando o caráter da vigilância aos guardas civis
municipais para colaborar com o ideal funcionamento dos logradouros públicos e a correta aplicação
das posturas públicas.
Bens de uso dominical
Os bens dominicais, segundo Alexandrino e Paulo (2009, p. 864), “são aqueles que constituem o
patrimônio das pessoas jurídicas de direito público, como objeto de direito pessoal ou real de cada
uma dessas entidades”. O autor ainda especifica que “são todos aqueles que não têm uma
destinação pública definida, que podem ser utilizadas pelo estado para fazer renda ¨através dos
tramites legais”.
Os bens de uso de uso dominial, ou dominical, partem dessa premissa de que são todos aqueles
que não são de uso comum do povo, nem de uso especial, porque sobre os demais recai uma
destinação específica. Alguns exemplos de bens dominicais são a dívida ativa, os móveis inservíveis,
os prédios desativados e os terrenos de marinha.
A ação da Guarda Municipal sobre esses bens se restringe normalmente à vigilância, por
exemplo, fiscalização de terrenos baldios em que não se possa jogar lixo, evitar furtos contra esses
bens que estão inutilizados, ou subutilizados, contra a ocupação.
Instalações públicas
Ao inverter a ordem de apresentação do art. 144 da Constituição Cidadã, analisando as
instalações públicas de maneira secundária, por entendermos que o leque de significados quando se
fala em serviços públicos é mais amplo, o tema merece uma atenção especial mais adiante neste
estudo.
As instalações municipais são o patrimônio físico da municipalidade, como os prédios que sediam
os serviços públicos de uso especial e bens dominicais. Portanto, as instalações públicas conferem
esse caráter eminentemente patrimonial aos guardas municipais tanto estigmatizados pela população
e pela classe política municipalista, não cabendo prolongamentos pela própria facilidade em
conceituação.
Serviços públicos
Os serviços públicos são, sem sombra de dúvidas, o campo mais abrangente na atuação das
Guardas Municipais. Segundo Frederico, (2010, p. 230), “Serviço Público é considerado como
atividade essencial e necessária a sociedade, é toda ação destinada a obter determinada utilidade de
interesse para a coletividade, como a saúde, a educação, o transporte e a segurança pública”. Essas
atividades são exercidas pelo Estado ou, em alguns casos, por particular via concessão ou permissão.
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8. Como exposto em tal conceito, a segurança pública também faz parte do rol de serviços prestados
pelo Estado. Se a Constituição da República confere às Guardas a função de proteger os serviços
públicos, tais organizações não estariam excluídas do mister de participar do policiamento de
segurança pública.
Meirelles (2007, p. 320), em uma brilhante definição argumenta que “serviço público é todo aquele
prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer
necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado”.
Esses serviços, seriam próprios do Estado por se relacionarem intimamente com as atribuições do
Poder Público (segurança, polícia, higiene e saúde públicas, etc.) e para a execução dos quais a
Administração usa de sua supremacia sobre os administrados. Devem, por isso, ser prestados por
órgãos públicos, sem delegação a particulares.
É possível entender a amplitude do tema serviços públicos e toda a enorme gama que sua
proteção representa, não excluindo das Guardas Municipais a participação na segurança pública nem
em outras posturas públicas, por também se entenderem como serviços públicos todos aqueles
exercidos pelo Estado por meio do poder de polícia administrativo conferido aos municípios pelo pacto
federativo.
Competência das guardas municipais
Com o objetivo de trazer segurança jurídica, padronizar as ações e regulamentar as atribuições
das Guardas Municipais, foi editada a Lei nº 13.022/2015, instituindo o Estatuto Geral das Guardas,
que incluiu a referida instituição como força complementar no sistema de segurança pública, conforme
pode se compreender nos arts. 2º e 5º:
Art. 2º Incumbe às guardas municipais, instituições de caráter civil, uniformizadas e armadas conforme
previsto em lei, a função de proteção municipal preventiva, ressalvadas as competências da União,
dos Estados e do Distrito Federal.
[...]
Art. 5º São competências específicas das guardas municipais, respeitadas as competências dos
órgãos federais e estaduais:
I - zelar pelos bens, equipamentos e prédios públicos do Município;
II - prevenir e inibir, pela presença e vigilância, bem como coibir, infrações penais ou administrativas e
atos infracionais que atentem contra os bens, serviços e instalações municipais;
III - atuar, preventiva e permanentemente, no território do Município, para a proteção sistêmica da
população que utiliza os bens, serviços e instalações municipais;
IV - colaborar, de forma integrada com os órgãos de segurança pública, em ações conjuntas que
contribuam com a paz social;
V - colaborar com a pacificação de conflitos que seus integrantes presenciarem, atentando para o
respeito aos direitos fundamentais das pessoas;
VI - exercer as competências de trânsito que lhes forem conferidas, nas vias e logradouros municipais,
nos termos da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro), ou de forma
concorrente, mediante convênio celebrado com órgão de trânsito estadual ou municipal;
VII - proteger o patrimônio ecológico, histórico, cultural, arquitetônico e ambiental do Município,
inclusive adotando medidas educativas e preventivas;
VIII - cooperar com os demais órgãos de defesa civil em suas atividades;
IX - interagir com a sociedade civil para discussão de soluções de problemas e projetos locais voltados
à melhoria das condições de segurança das comunidades;
X - estabelecer parcerias com os órgãos estaduais e da União, ou de Municípios vizinhos, por meio da
celebração de convênios ou consórcios, com vistas ao desenvolvimento de ações preventivas
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9. integradas;
XI - articular-se com os órgãos municipais de políticas sociais, visando à adoção de ações
interdisciplinares de segurança no Município;
XII - integrar-se com os demais órgãos de poder de polícia administrativa, visando a contribuir para a
normatização e a fiscalização das posturas e ordenamento urbano municipal;
XIII - garantir o atendimento de ocorrências emergenciais, ou prestá-lo direta e imediatamente quando
deparar-se com elas;
XIV - encaminhar ao delegado de polícia, diante de flagrante delito, o autor da infração, preservando o
local do crime, quando possível e sempre que necessário;
XV - contribuir no estudo de impacto na segurança local, conforme plano diretor municipal, por ocasião
da construção de empreendimentos de grande porte;
XVI - desenvolver ações de prevenção primária à violência, isoladamente ou em conjunto com os
demais órgãos da própria municipalidade, de outros Municípios ou das esferas estadual e federal;
XVII - auxiliar na segurança de grandes eventos e na proteção de autoridades e dignatários; e
XVIII - atuar mediante ações preventivas na segurança escolar, zelando pelo entorno e participando de
ações educativas com o corpo discente e docente das unidades de ensino municipal, de forma a
colaborar com a implantação da cultura de paz na comunidade local.
Parágrafo único. No exercício de suas competências, a guarda municipal poderá colaborar ou atuar
conjuntamente com órgãos de segurança pública da União, dos Estados e do Distrito Federal ou de
congêneres de Municípios vizinhos e, nas hipóteses previstas nos incisos XIII e XIV deste artigo,
diante do comparecimento de órgão descrito nos incisos do caput do art. 144 da Constituição Federal,
deverá a guarda municipal prestar todo o apoio à continuidade do atendimento.
Promulgação da Lei nº 13.142/2015
No dia 06 de julho de 2015, a Presidente Dilma Roussef promulgou a Lei Federal nº 13.142, que
modificou os arts. 121 e 129 do Código Penal e alterou o art. 1º da Lei de Crimes Hediondos,
aumentando a pena de quem cometer homicídios contra agentes policiais e seus parentes até terceiro
grau, senão vejamos:
Art. 1º O § 2º do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a
vigorar acrescido do seguinte inciso VII:
“Art. 121.
[...]
VII - contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do
sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em
decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em
razão dessa condição:
[...]
Art. 2º O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar
acrescido do seguinte § 12:
“Art. 129.
[...]
§ 12. Se a lesão for praticada contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição
Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da
função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até
terceiro grau, em razão dessa condição, a pena é aumentada de um a dois terços.” (NR)
Art. 3º O art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990 (Lei de Crimes Hediondos), passa a vigorar
com a seguinte redação:
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10. “Art. 1º [...]
I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que
cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI e VII);
I-A - lesão corporal dolosa de natureza gravíssima (art. 129, § 2º) e lesão corporal seguida de morte
(art. 129, § 3º), quando praticadas contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da
Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no
exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente
consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição;”.
A nova Lei foi idealizada em razão dos altos índices de violência contra policiais e objetiva maior
rigor na punição a quem cometer homicídios contra os agentes de segurança e seus parentes no
exercício da função ou em razão dela.
A Lei que qualificou o homicídio de agentes policiais como crime hediondo fundamenta o risco
constante em que os guardas municipais e demais agentes policiais correm justificando uma
aposentadoria diferenciada, igual aos demais integrantes do art. 144 da CF.
CONCLUSÕES
Para fins de concessão de aposentadoria especial, conclui-se que os guardas municipais podem
pleitear de duas maneiras a aposentadoria especial.
A primeira seria a aposentadoria por atividade policial prevista na Lei Complementar nº 144, de
maio de 2014, que confere aposentadoria especial aos policiais após o tempo efetivo exercido durante
sua profissão, pois, com o advento do Estatuto Geral das Guardas Municipais pela Lei nº 13.022/2014
e a instituição da Lei nº 13.142/2015, que qualifica o homicídio contra policiais, não sobram dúvidas
sobre o envolvimento da natureza de atividade dos guardas municipais como agentes de segurança
pública e protetores não só de bens, serviços e instalações, mas também como partícipes da
segurança comunitária, fazendo jus a essa modalidade de aposentadoria.
Se tais instituições ainda assim não forem reconhecidas, pelo Poder Judiciário, como de atividade
primária de segurança pública, por arguições de inconstitucionalidade ou entendimento jurisprudencial,
poderá ser pleiteada a aposentadoria especial idêntica à dos servidores civis, em razão da natureza
laboral insalubre, conforme preconizado no art. 40, inc. II, da CF e da Súmula Vinculante nº 33 do
Supremo Tribunal Federal.
REFERÊNCIAS
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Método, 2009.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 29. ed. São Paulo: Malheiros,
2011.
CARVALHO, Cláudio Frederico de. O que você precisa sobre guarda municipal e nunca teve a quem
perguntar. 3. ed. São Paulo: Clube dos Autores, 1997.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 6. ed. Saraiva, 2008. v. 1.
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11. 1 Texto veiculado com autorização do autor e publicado originalmente no site Jus, fev. 2018
(Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/64028/possibilidade-de-aposentadoria-especial-para-
guardas-municipais-no-regime-proprio-de-previdencia-municipal>).
Como citar este texto:
SANTOS, Marcelo Alves Batista dos. Possibilidade de aposentadoria especial para guardas municipais
no regime próprio de previdência municipal. Revista Zênite – Informativo de Regime de Pessoal (IRP),
Curitiba: Zênite, n. 201, abr. 2018.
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MACHADO, Antônio Cláudio da Costa. Código civil interpretado. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2004.
NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional. 2. ed. São Paulo: Método, 2008.