1. SOCIEDADE BRASILEIRA DE PNEUMOLOGIA E TISIOLOGIA
Resumo de Artigos
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Role of Macrolides as Immunomodular Agents.
Mario Cazzola, MD, Francesco Blasi, MD, Paolo Tarsia, MD, Maddalena Zanardelli, MD, and Luigi
Allegra, MD. Clinical Pulmonary Medicine • Volume 13, Number 5, September 2006
A utilização de macrolídeos além da sua função antibiótica é relativamente recente. A descoberta das
propriedades antiinflamatórias desta classe de medicamentos motivou a sua utilização como drogas
imunomoduladoras em diversas situações dentro da medicina, em especial no campo das doenças
respiratórias. A utilização clínica dos macrolídeos como imunomoduladores se iniciou a partir de estudos
japoneses da década de 1990 em doentes com pan-bronquiolite difusa, cuja sobrevida em cinco anos
saltou de 8% para 92% naqueles colonizados por Pseudomonas aeruginosa. Isso motivou uma série de
estudos nas diversas afecções respiratórias, dentre elas asma, DPOC, fibrose cística e bronquiectasias.
Este artigo se constitui em excelente revisão sobre o papel dos macrolídeos como agentes
imunomoduladores, revisa as propriedades desta classe de antibióticos tanto no combate direto às
bactérias como seus efeitos antiinflamatórios e conclui com as aplicações terapêuticas nas diversas
doenças.
MACROLÍDEOS E PSEUDOMONAS
Portadores de doenças inflamatórias crônicas das vias aéreas experimentam repetidas exacerbações
infecciosas e, em casos de doença avançada, podem ser colonizados por Pseudomonas aeruginosa. A
variante mucóide desta bactéria produz um biofilme de alginato que a torna de difícil erradicação e leva à
deterioração da função pulmonar ao longo do tempo. Em especial nos casos de bronquiectasias, a P.
aeruginosa mucóide leva a maior produção de escarro, maior extensão do processo, maior número de
hospitalizações e menor qualidade de vida.
Os macrolídeos não são efetivos contra a P. aeruginosa. No entanto, apesar de não possuírem o efeito
bactericida sobre esta bactéria, reduzem seus efeitos e os estragos teciduais devido à diminuição da
produção de alginato, diminui a motilidade bacteriana e interfere no seu mecanismo auto-regulador de
controlar a produção de biofilme da população bacteriana (quorum sensing).
EFEITOS ANTIINFLAMATÓRIOS
Os macrolídeos são antibióticos que atingem alta concentração no interior das células inflamatórias, o que
permite os fagócitos liberarem a droga no local da inflamação; por isso são ativos contra os agentes
chamados atípicos, conhecidos patógenos intracelulares. Dentre os macrolídeos, a azitromicina é a que
teria o maior tempo de permanência intracelular. Além disso, os macrolídeos também possuem vários
outros papéis que os caracterizam como imunomoduladores:
• diminuição da produção de uma série de citocinas em resposta a estímulos específicos;
• efeitos sobre a movimentação dos leucócitos, diminuindo a adesão e a migração para os tecidos;
estimulam a degranulação dos leucócitos; recrutam neutrófilos e células da circulação expostos à
bactéria mas suprimem as células inflamatórias na ausência de infecção; aceleram a apoptose dos
leucócitos;
• aumentam a depuração mucociliar e inibem a produção de muco in vivo e in vitro.
APLICAÇÕES TERAPÊUTICAS
Os autores revisam as aplicações dos macrolídeos nas diversas doenças respiratórias, destacando seu
papel essencial nos doentes com pan-bronquiolite difusa, cuja melhora prognóstica após o uso prolongado
2. desta droga foi marcante. Análise seriada de provas funcionais de doentes com pan-bronquiolite difusa,
tratados por quatro anos com claritromicina oral (200mg/dia), mostraram que o FEV1 saltou de uma
média de 1,74 L para 2,21 L em 3 meses e atingiu valor máximo de 2,31L em 6 meses, valor este
sustentado por até 4 anos. Esse efeito foi observado inclusive na presença de P. aeruginosa. O estudo
documentou ser necessário seis meses de tratamento com claritromicina para melhorar a condição clínica
dos doentes com pan-bronquiolite difusa. Também há estudos retratando que há melhora funcional em
portadores de bronquiolite obliterante após transplante de medula e de pulmão.
Na fibrose cística, a P. aeruginosa é o patógeno mais comum por volta dos 18 anos de idade, colonizando
até 80% dos doentes nesta faixa etária. Há evidências em metanálise que o uso prolongado de baixas
doses de azitromicina melhora a função pulmonar destes doentes, embora os ensaios tenham utilizado
diferentes doses, tempo de utilização e critérios de inclusão. No entanto, é documentado que aqueles q
utilizaram azitromicina prolongadamente dimuíram o número de exacerbações, hospitalizações e a
porcentagem da variante mucóide de P.aeruginosa nas amostras de escarro.
Em bronquiectasias há menor número de estudos utilizando baixas doses de macrolídeos, com
delineamentos diversos e as evidências não são tão claras como nas afecções acima. Os estudos ainda
estão em fase de pilotos e são pequenos. No entanto, os poucos autores que descreveram tal utilização
observaram diminuição na taxa de exacerbações, do volume expectorado, estabilização da função
pulmonar e diminuição da reatividade brônquica. Um estudo de 12 semanas com 25 crianças tratadas com
baixa dose de roxitromicina (4mg/kg-2x/dia) ou placebo encontrou diminuição da purulência do escarro
por semanas e decréscimo na hiper-reatividade detectada pela broncoprovocação pela metacolina. Em
outro estudo os pacientes completaram 4 meses de tratamento com azitromicina (500mg/dia por 6 dias;
250mg/dia por 6 dias e manutenção com 250mg/3x na semana) e se observou significativa redução nas
exacerbações que necessitaram antibioticoterapia oral (0,71/mês para 0,13/mês) e intravenosa (0,08/mês
para 0,003/mês).
Há limitado número de estudos clínicos sobre a utilização de macrolídeos em baixas doses para a asma.
Os resultados preliminares mostraram uma redução da hiper-reatividade à broncoprovocação pela
histamina e supressão da inflamação eosinofílica. Revisão da Cochrane encontrou sete estudos que
envolveram 416 participantes entre crianças e adultos. No entanto, a qualidade da metodologia foi baixa e
houve poucos dados disponíveis para metanálise. Quatro estudos mostraram efeitos em diferentes tipos de
asmáticos com significativa diferença na inflamação eosinofílica e sintomas, mas sem diferença
significativa no FEV1.
Já sobre a DPOC, também há limitado número de estudos e os resultados não se mostraram tão
promissores. A utilização de claritromicina na fase estável da doença por três meses não trouxe vantagens
clínicas e não pode ser recomendada como meio de eliminar a colonização bacteriana ou prevenir as
exacerbações.
CONCLUSÕES
Macrolídeos constituem a única classe terapêutica que possui efeitos antibacterianos e antiinflamatórios.
Devido a essas características, o uso prolongado de baixas doses é considerado para o tratamento de
doenças inflamatórias crônicas das vias aéreas. Os efeitos colaterais desta utilização são mínimos, mais
localizados no trato gastrintestinal e minimizados com o uso de azitromicina e claritromicina. O
desenvolvimento de resistência bacteriana pode ocorrer, mas parece ser em baixo grau.
O papel dos macrolídeos no tratamento antiinflamatório necessita ser mais bem estabelecido, em especial
quais grupos de doentes podem se beneficiar, além da melhor dose a ser empregada e o tempo dessa
utilização.
ARTIGOS RELACIONADOS AO ASSUNTO
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Preparado por:
Mauro Gomes
• Professor da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São
Paulo;
• Médico pneumologista do Hospital Samaritano/SP;
• Diretor da Comissão de Infecções da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia e membro
da Comissão de Infecções da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.