Este artigo mostra a necessidade de a Universidade se ajustar aos novos tempos com a atualização da estrutura curricular do ensino superior que não deve responder apenas às exigências do mercado, mas também proporcionar conhecimentos para desenvolver a capacitação e a formação humanista do indivíduo, além de mostrar como conquistar a felicidade individual e coletiva.
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O papel da universidade do futuro
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O PAPEL DA UNIVERSIDADE DO FUTURO
Fernando Alcoforado*
A Universidade é uma instituição de ensino superior formada por diversas faculdades e
que confere vários graus acadêmicos. Estas instituições podem incluir, além das
faculdades, diversos departamentos, ordens, centros de investigação e outras entidades.
Segundo os historiadores, a Universidade mais antiga é a Escola Superior criada na China
de 2257 a.C. até 2208 a.C. A origem da Universidade está intimamente ligada à educação
teológica. Pelo ano 1200, alguns ambientes de catequese cristã viraram universidades na
Europa.
A Universidade de Bolonha foi criada no fim do século XI e é considerada por muitos
como a "mãe das universidades". A Universidade de Paris foi a segunda, depois veio
Oxford. Naquele tempo, a Universidade de Paris chegou a ser o centro filosófico e
teológico do mundo. A educação superior era o âmbito de atuação do clero. O erudito era
visto como o guardião da sabedoria. A universidade moderna surgiu porque os bispos
necessitavam de um lugar para prover treinamento clerical. A teologia era considerada a
"Rainha das Ciências" na Universidade. No período entre 1250 até 1500 foram fundadas
71 universidades na Europa.
A Universidade é uma instituição que, em seu modelo atual predominante, tem origem na
Europa medieval. As universidades medievais, devido às suas origens mais frequentes
em escolas clericais, eram consagradas por Bula papal e, ainda, porque a maior parte dos
professores eram clérigos. Elas herdaram vários direitos e privilégios que eram exclusivos
do clero. Mesmo quando uma universidade era criada por decreto real, como foi o caso
da de Lisboa pela Scientiae Thesaurus Mirabilis de D. Dinis de 1288, costumava adquirir
fórum eclesiástico como ocorreu nesta Universidade com a bula do papa Nicolau IV De
staturegni Portugaliae em 1290. As universidades medievais (1300-1500) estavam sob a
chancela do papado e, também, do poder laico. Mesmo assim, elas foram essenciais para
a construção do conhecimento ocidental porque haviam estudiosos nelas preocupados
prioritariamente com o desenvolvimento da ciência.
O nascimento das universidades modernas ocorreu a partir de 1520, com o movimento da
Reforma Protestante se espalhando pelos países do norte europeu e o início do
envolvimento das instituições não católicas nas universidades. Isso ocorreu também nos
Estados Unidos. Também a ideia de unir o conhecimento científico ao desenvolvimento
tecnológico se faz presente com a Escola Normal Superior e a Escola Politécnica,
fundadas em 1794 na França sob controle governamental e com a Universidade de Berlim
(hoje conhecida como Universidade Humboldt), em 1810, que pregava a necessidade das
universidades desenvolverem pesquisas e a primazia da liberdade acadêmica.
O modelo da universidade voltado também para a pesquisa, além do ensino, se estabelece
entre 1800 e 1900 e o bem sucedido modelo alemão da Universidade de Berlim se espalha
pela Europa e chega aos Estados Unidos. Em 1876, surge a americana Universidade Johns
Hopkins. A noção de universidade moderna está associada ao pensamento empírico e às
descobertas científicas que vieram na sequência da Revolução Industrial iniciada no
século XVIII. Tradicionalmente, os cursos universitários eram organizados por disciplina
e hierarquizados em termos pedagógicos, ou seja, o papel do aluno seria o de receber o
conhecimento através do professor, até receber o diploma. Porém, o novo modelo de
Universidade, posto em prática recentemente na União Europeia, com base no projeto
Bolonha, desafia esta concepção tradicional. Estabelece uma maior interação com as
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novas tecnologias, mais espaço para iniciativas individuais no âmbito da pesquisa e da
investigação de campo, e currículos flexíveis.
O projeto Bolonha busca modificar a relação do conhecimento com os indivíduos, pois
existe o risco das competências serem interpretadas apenas na perspectiva do mercado de
trabalho como ocorre atualmente que, devido à sua natureza volátil e precária, tende a
orientar a produção e absorção do conhecimento de acordo com as necessidades do
mercado. Num momento em que os agentes políticos e econômicos da União Europeia
estão efetivamente empenhados em aumentar a competitividade dos quadros superiores
europeus face aos Estados Unidos, à China e ao Japão, a atualização da estrutura
curricular do ensino superior não deve responder apenas às exigências do mercado, mas
também proporcionar conhecimentos para desenvolver a capacitação e a formação
humanista do indivíduo. A academia do futuro na União Europeia deve privilegiar uma
formação humanística e abrangente. Nela, o aluno é sujeito, cria sua formação e sabe
resolver problemas.
Enquanto no passado, um recém-formado na Universidade europeia era considerado um
profissional pronto e tinha vaga praticamente garantida nas áreas de trabalho, hoje o
cenário é bem diferente. Se não houver atualização constante, seja por cursos em
universidades ou outras entidades de ensino ou mesmo a partir processos autodidatas,
corre-se o risco do profissional ficar defasado e não ser mais considerado adequado pelo
mercado de trabalho. As exigências do mercado e a adaptação das universidades da União
Europeia começaram lentamente na década de 1980 e explodiram nos anos 1990.
À medida que há mais pessoas se formando no Ensino Médio, há uma demanda maior
pelo Ensino Superior e, consequentemente, pela educação continuada. A sociedade vive
na era da informação, na qual os trabalhos que usavam a força física para serem feitos são
substituídos por tarefas que exigem informação técnica e abstrata, ou seja, que exigem a
capacidade de construir o próprio conhecimento. Em certo sentido, pode-se dizer que isso
aconteceu na medida em que a Internet se tornou uma poderosa ferramenta. A Internet
acelerou a acumulação e a produção de conhecimento, fazendo com que a capacidade dos
profissionais fosse ampliada e muito mais exigida. O desenvolvimento da Internet leva-
nos a pensar numa revolução das universidades no futuro, uma vez que a educação
presencial nas aulas pode ser complementada, inclusive substituída pelas aulas à
distância.
Com a ajuda de videoconferências, dos fóruns de discussão (chat), do correio eletrônico
e de outras aplicações tecnológicas, as universidades têm condições para se digitalizarem.
Desta forma, são reduzidas as limitações físicas (como a distância geográfica) para o
acesso à formação universitária. No Brasil, possuidor de um sistema de ensino
ultrapassado, impõe-se sua reestruturação em todos os níveis, do ensino fundamental ao
universitário. No caso do ensino universitário, o Brasil devia se inspirar no projeto
Bolonha que está sendo realizado na União Europeia.
Qual é o futuro das Universidades? Este tema foi objeto de debate no 21º FNESP, o maior
fórum do ensino superior da América Latina tealizado em São Paulo nos dias 26 e 27 de
setembro organizado pelo Semesp, entidade que representa mantenedoras do ensino
superior do Brasil (SEMESP, MEDIA LAB ESTADÃO. Qual é o futuro das
universidades? Disponível no website
<https://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,qual-e-o-futuro-das-
universidades,70003034417>). As principais conclusões deste evento são as seguintes:
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Pela primeira vez na história os alunos chegam à sala de aula na condição de alguém
que sabe mais até do que o professor, pelo simples fato de ter acesso à Internet e
poder “buscar” respostas para quase todos os problemas.
A Universidade deve ser o espaço de organização do conhecimento humano.
Há necessidade de rever a forma de avaliar os alunos de cursos superiores. Pesquisas
mostram que decorar os conteúdos escolares ou estudar para provas com a ajuda de
fichas só serve mesmo para isso: passar na prova. As provas tradicionais, em que
cada um precisa resolver as questões sozinho, não fazem sentido porque
estão desconectadas da realidade - principalmente do mundo do trabalho. Em
qualquer situação da vida real nós utilizamos a tecnologia (calculadoras, Internet para
fazer buscas) e, em muitos momentos, atuamos em conjunto com colegas e parceiros.
E é isso que a Universidade também deveria fazer.
Na era digital, as tecnologias têm uma “centralidade absoluta”: na economia, no
lazer, na cidadania. O maior desafio atual é construir uma nova economia
ultraconectada sem perder de vista o mais importante, que é fazer com a que
a sociedade seja cada vez melhor.
Não se deve pensar a Universidade sem pensar que ela está construindo o destino da
humanidade.
Mais do que nunca, a questão é fazer com que o aluno adquira a capacidade de
analisar os dados, processar e pensar. É esse o papel primordial das universidades
hoje e no futuro próximo.
É importante a Universidade considerar o uso de novas tecnologias, tanto no dia a
dia das pessoas quanto nas salas de aula (inteligência artificial, jogos, realidade
virtual, realidade aumentada etc.) porque a tecnologia intensifica a inovação. E já que
temos tanta tecnologia disponível, o melhor é usá-la.
A aprendizagem deve ser baseada em desafios (e não em conteúdos programáticos),
com flexibilidade para os alunos organizarem seu percurso acadêmico.
A Universidade deve considerar que aprender não é só adquirir mais e mais conteúdo.
Aprender é explicitar o conhecimento por meio de uma performance melhorada - na
escola, na vida, no trabalho.
Em todo o mundo, muitos jovens entram num curso superior e não se formam. Como
motivar uma Universidade inteira para trabalhar pelo sucesso de todos os alunos? A
ferramenta usada no caso é a chamada análise preditiva (uso de dados históricos para
prever resultados futuros), com informações de desempenho acadêmico e também de
engajamento, como participação nas atividades extraclasse dos alunos. Toda vez que
o sistema identifica um aumento na probabilidade de um estudante enfrentar
problemas que podem levá-lo a desistir do curso, entram em cena professores,
conselheiros e os próprios colegas, para colocar-se ao lado desse jovem e mantê-lo
estimulado.
É preciso valorizar os professores para educar cidadãos globais do século 21.
Além de fazer o que está exposto acima, a Universidade precisa educar os seres humanos
apontando os caminhos que possam conduzi-los à conquista da felicidade. Para os nossos
antepassados e filósofos gregos, a busca pela felicidade deveria ser o motor central da
nossa vida. A felicidade individual se conquista através da educação de si mesmo. A
Universidade deve dotar os indivíduos da educação necessária à conquista da felicidade.
Educação é o meio através da qual as pessoas se capacitariam para fazer as melhores
escolhas na vida.
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A finalidade da Educação deve ser a de fazer com que o indivíduo adquira competências,
desenvolva senso crítico, se aposse do patrimônio científico e cultural historicamente
construído pela humanidade, mas, acima de tudo, deve ser instrumento para promover a
felicidade de si mesmo e a felicidade coletiva. Uma das finalidades da Educação, talvez
a mais importante, é a de oferecer às pessoas oportunidades e meios para serem felizes.
O mundo está à espera de uma revolução na Educação que tenha como principal objetivo
proporcionar as condições para a conquista da felicidade dos seres humanos.
A Educação proporcionada pela Universidade para dotar os indivíduos na conquista da
felicidade deve ser complementada com o uso da Psicologia Positiva com base na qual é
possível fazer algo mais do que resolver ou minorar perturbações psicológicas, isto é,
pretende fazer-nos felizes. A Psicologia Positiva trabalha mais as forças do que as
fraquezas do ser humano, mais a busca da felicidade do que o estudo das doenças mentais.
A Psicologia Positiva é o meio através da qual as pessoas conquistariam a felicidade
individual ou coletiva (comunidade, região, país) que, em última instância, é o principal
objetivo que orienta a escolha das pessoas na vida.
Em síntese, enquanto a Educação atuaria para capacitar as pessoas para fazerem as
melhores escolhas na vida e conquistarem a felicidade, a Psicologia Positiva reforçaria o
trabalho da Educação em busca da conquista da felicidade. Para ser feliz, o indivíduo
deve se apoiar, portanto, na Educação e na Psicologia Positiva. A felicidade é uma
conquista que se faz através da educação de si mesmo. E ela jamais será encontrada fora.
Para ser feliz, o indivíduo deve buscar autoconhecimento, inclusive com ajuda do
psicólogo (LOPES, Paulo. Psicologia Positiva. Matrix Editora, 2017).
* Fernando Alcoforado, 79, condecorado com a Medalha do Mérito da Engenharia do Sistema
CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor
nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de
sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC-
O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil
(Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de
doutorado. Universidade de Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização
e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século
XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions
of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária
(Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia Sustentável- Para o
progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo,
São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV,
Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI
(Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o
Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017),
Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Baiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria)
e Como inventar o futuro para mudar o mundo (Editora CRV, Curitiba, 2019).